talks about the new paradigm of humanity - Nov.2010 conversa sobre o paradigma da humanidade – novembro 2010
Transcrição: João Marcelo
Revisão: Bruna Crespo
Nós vamos começar com uns instantes de silêncio. Depois de
tanta bagunça, a gente vai ter que fazer agora uns minutinhos de silêncio. Então, nós estamos em um tempo interessante que é um tempo de superar a ingenuidade. O fato de nós, hoje, nos encontrarmos oriundos de muitas diferentes culturas faz com que o melhor de cada cultura possa ser trazido a cada um. No Ocidente, nós temos essencialmente a ciência como um grande diferencial. A ciência estuda profundamente aquilo que está diante de nós. Ainda assim, neste tempo de agora, nós encontramos também as tradições que olham internamente, as tradições contemplativas. As tradições contemplativas nos trazem o conhecimento do mundo interno. A superação da ingenuidade é a superação da imagem de que a compreensão do mundo externo é suficiente ou que a compreensão do mundo interno seja suficiente. Nós estamos num tempo que nos permite compreender a completa inseparatividade desses mundos. Enquanto eu trabalhava como físico, dentro da área da Física Quântica nós vamos encontrar justamente esse desafio. Nós, ao estudarmos a física quântica, encontramos a história da ciência, que é o lugar onde o orgulho do cientista mostra seu limite. Os cientistas, geração após geração, geram visões aparentemente completas sobre a realidade. Essas visões completas se mostram frágeis um pouco adiante. Quando nós estudamos a história da ciência, terminamos entendendo também, ou estudando também a filosofia da ciência. E quando nós estudamos a filosofia da ciência, nós vamos encontrar uma noção que é apresentada por Wittgenstein, que parece muito simples, que diz assim: “nós só podemos ver o que pode ser visto”. Isto introduz a noção do mundo interno. Hoje, nós falamos muito sobre a física quântica justamente por isso, porque a física quântica introduz o mundo interno inseparável do mundo externo. Assim, os cientistas quando refletem sobre a realidade, eles refletem a partir de concepções que eventualmente não estão nem muito claras a eles mesmos, são posições filosóficas e posições de compreensão da vida que não estão completamente claras a eles. E isso limita a capacidade de visão. Quando os nossos próprios olhos examinam ao redor, nós vemos uma realidade que é limitada, ela parece neutra, mas ela é limitada, limitada por essas concepções e por essas concepções emocionais também que nós portamos. A ingenuidade é nós imaginarmos que o que nós pensamos é suficientemente amplo, que aquilo que nós vemos é suficientemente amplo. Quando nós utilizamos o telescópio Hubble para olhar os confins do universo, o Hubble não é um instrumento neutro, ele está preso às concepções dos próprios cientistas que geram isso. Essa é a visão mais importante que nós podemos extrair da física quântica, ela mostra como o próprio cientista, como o próprio filósofo, eles estão presos aos seus próprios conceitos. Quando nós olhamos isso diante da nossa própria vida, nós deveríamos entender que nós dispomos de um recurso extraordinário. Esse recurso extraordinário é o fato de que, do mesmo modo que os cientistas podem construir concepções de mundo, os historiadores constroem concepções de mundo, nós temos a capacidade de construir concepções vitoriosas e positivas de mundos. Nós não estamos condenados a viver nos mundos que nós herdamos. Além do mais, os mundos que nós herdamos, eles não vêm de forma concreta, eles podem ser eventualmente algum tipo de maldição, algum tipo de mágica sob a qual nós estamos submetidos. Na visão budista, da mesma forma que na visão da quântica, o mundo é mágico. A palavra budista para isso é vajra, o mundo é vajra. Ele é plástico, nós o construímos constantemente. O mundo não é algo que está pronto e nós somos vítimas dele, o mundo é algo que nós construímos com nossos olhares, com nossos conceitos. A concepção dos budistas, a concepção contemplativa dos budistas, a benção que eles nos trazem, é falar daquilo que é chamado as seis sabedorias. Se nós quisermos treinar uma construção positiva do mundo, nós deveríamos gerar seis sabedorias. A primeira delas é entender os seres no mundo deles - e não entendê-los como parte do nosso mundo. Nós sermos capazes de entendê-los nos seus próprios mundos. A segunda concepção é nós não apenas podermos olhá-los nos seus próprios mundos, mas nós percebermos que nós somos felizes quando ajudamos eles, que algo nos sustenta, nos mantém vivos, quando nós somos capazes de olhar para os outros seres e ajudá-los nos seu próprios mundos. A terceira sabedoria, sabedoria discriminativa, de olharmos os outros e entendermos a situação real deles. Por exemplo: todos nós nascemos, vivemos por um tempo e morremos. E não levamos nada. Isso é parte da sabedoria discriminativa. Portanto, o aspecto mais importante é nós olharmos de forma ampla as realidades e podermos ajudar os outros. Quando nós fazemos isso, inexplicavelmente nós somos sustentados, a nossa energia se sustenta. Eu acredito que isso é a experiência de cada um de vocês. Nós temos ainda a sabedoria da causalidade, que mostra como as ações negativas geram sofrimento, como as ações positivas geram felicidade. Especialmente a sabedoria da causalidade nos ensina a nós, ao recebermos as ações negativas, podermos transmutá-las, aproveitando isso como uma oportunidade para fazer ações ainda melhores. E nós temos a sabedoria da transcendência, a sabedoria de Darmata, que é a sabedoria que nos faz conscientes da vida que está além da vida, da vida que está além dos ciclos. Na verdade, quando nós olhamos profundamente dentro de nós, terminamos entendendo aquilo que está no ciclo e aquilo que está além dos ciclos. Então, a sabedoria de Darmata é a sabedoria profunda sobre a realidade maior. Além disso, existe a sabedoria de Vajrasatva, a sabedoria da natural oportunidade de todas as circunstâncias. Nós deveríamos desenvolver essa habilidade de não imaginarmos que as situações que estão diante de nós são situações erradas, que elas deveriam ser transformadas em outras, mas nós deveríamos aproveitar as situações como elas vêm, como a melhor oportunidade de trazer benefício a cada um. Eu vejo que vocês têm essa habilidade e por isso me alegra muito poder compartilhar com vocês esse tempo aqui.