Você está na página 1de 32

Sequência Didática

Gênero Textual Literatura de Cordel

Acadêmica:
Orientadora:
Professora Regente:
Turma: Ano:
Escola:
Total de aulas estipuladas: 25 h/a

1. Apresentação da situação e do Gênero Textual:

O objetivo da seguinte análise é abarcar diversas visões a respeito dos textos


escolhidos, entendendo-os através de seu contexto social de produção, e
função. Compreendendo assim as características do gênero Literatura de
Cordel.
Além de que com tal gênero é possível abordar a variação linguística, pois a
linguagem oral, em determinadas regiões brasileiras, apresenta variações e
dessa maneira, valorizando, portanto, não apenas as variantes consideradas
cultas, mas também as populares.

2. Reconhecimento do Gênero:

Para começar instigando o interesse dos estudantes, é importante que o


professor explique a necessidade de estudar o gênero proposto. Nesse
sentido, sendo ele a Literatura de Cordel, começaremos pontuando alguns
desses motivos:
 Aprender sobre as características do gênero Literatura de Cordel;
 Ter a oportunidade de conhecer, através da palavra, a realidade e a
cultura de outro povo;
 Ter conhecimento de outras variantes linguísticas, a do norte do país,
região em que o cordel é mais produzido;
 Ampliar o vocabulário do estudante;
 Manter contato com as gírias próprias da cultura cordelista (geralmente
é divertida, cômica, o que atrairá o público jovem);
 Compreender que ficção não está necessariamente impressa apenas
em livros;
 Valorizar a língua de cada ser humano como sua produção histórica.

3. Contextualizando o Gênero:

Em seguida é necessário que o professor conte a história do surgimento do


Cordel e a origem de seu nome, sabendo-se que a análise será principalmente
histórico-social.
Este gênero literário surgiu em Portugal, país que colonizou o Brasil. É escrito
em forma de versos e é popular. Ganhou esse nome, pois antigamente os
folhetos ficavam expostos pelas ruas e mercados portugueses, pendurados em
cordões.

Foi assim que essa literatura, muito popularizada principalmente no nordeste


brasileiro, chegou ao Brasil.
Ela caracteriza-se por ser de baixo custo e geralmente as histórias são
cômicas.

É característica do povo nordestino, ser alegre e, muitas vezes, apresentar


dificuldades econômicos. Esses fatores contribuíram para que o povo desta
região se familiarizasse e recebesse melhor o Cordel do que em outras regiões
do país.

O povo nordestino visualizou nos pequenos folhetos uma forma de levar suas
histórias para outros povos. A Literatura de Cordel hoje é um elemento
importantíssimo da cultura nacional.
Informação: relatar aos alunos que no Brasil existe a Academia Brasileira
de Literatura de Cordel, ABLC. (explicar e relacionar com a Academia
Brasileira de Letras)

Duas aulas levando em consideração apresentação e clima e confiança


do primeiro dia

 Após a rápida explicação, mostrar aos alunos um vídeo sobre


Literatura de Cordel para complementar o conhecimento:
http://www.youtube.com/watch?v=80eX1e0NVzw

 Lembrar aos alunos sobre as novelas que dão ênfase à Literatura de


Cordel.

4. Caracterizando o Gênero Literatura de Cordel:

Junto à turma, o professor irá destacar características na Literatura de Cordel


que especificam esse gênero textual da esfera literária:
 A característica mais visível é a forma de impressão, sendo de papel
barato, ilustrado com xilogravuras (explicar aos alunos o significado de
xilogravura), praticamente num processo artesanal;
 As expressões linguísticas são visivelmente regionais;
 É um gênero poético que sempre narra uma história;
 É escrito em versos, rimados, e tem número ilimitado de estrofes;
 Geralmente este gênero é escrito em primeira pessoa;
 Os principais temas do gênero literatura de cordel são: Cangaço,
histórias regionais, crítica social e política, entre outros.
 O texto do cordel, na maioria, expressa crítica social;
 É de fácil compreensão;
 Normalmente não utiliza palavras "cultas";
 A imagem geralmente é de um personagem específico do nordeste do
país, o cangaceiro;
 A linguagem geralmente tem tom humorístico;
 O gênero é exposto ao público pendurado em um barbante, denominado
cordel, principalmente em praça pública.

5. Seleção e amostra do Gênero Cordel:

Leremos o Cordel Afonso Arinus, de Crispiniano Neto. O que os oportuniza


conhecer o autor, que utilizava como tema principal de sua poesia a história de
homens importantes para o Brasil, como Rui Barbosa e Barão do Rio Branco.
O que também podemos perceber neste caso é que Crispiano Neto, com sua
poética cordelista, com linguagem de fácil acesso, oportuniza ao público
conhecer mais sobre a história do Brasil.

Uma aula

5.1 Função social do Gênero:

Após esta análise, partiremos para análise do contexto no qual este gênero é
produzido:
• Quando o texto escolhido foi produzido?
• Onde esse texto foi produzido?
• Por quem?
• Quem são geralmente os leitores de tal texto?
- A temática do cordel está relacionada a fatos sociais? Quais?
- Destacar oralmente as características do Gênero Cordel.

6 Pesquisa de textos do gênero:

TAREFA DE CASA
Pedir aos alunos que pesquisem sobre a vida e a obra de Patativa do Assaré e
sua importância para o cordel no país.
Pensar numa atividade para expor essa pesquisa
Pedir aos alunos que pesquisem quais são as semelhanças e a diferenças
entre cordel e repente.
7 Atividades em grupo:

♦ Antes de qualquer outro exercício proposto, pediremos à turma que façam


quantos versos acharem necessário para contar uma história rimada. A
proposta poderá parecer complicada, mas será apenas como avaliação do que
mudou antes e depois de começarmos os próximos exercícios.

♦ Em seguida a turma será dividida em três grupos, cada grupo trabalhará com
um Cordel.

Proezas de João Grilo, de João Ferreira de Lima,


O Cavalo que defecada dinheiro de Leandro Gomes de Barros
O testamento do cachorro de Leandro Gomes de Barros

Ao concluir as atividades listadas abaixo, cada grupo fará a exposição das


respostas:

7.1 Análise da estrutura composicional e do conteúdo temático:

1. O que você mais gostou no texto?


2. A linguagem utilizada é comum em outros textos vistos na escola?
3. Sobre que assunto ou temática o cordel aborda?
4. O cordel apresenta crítica social? Sobre que aspecto?
5. Você concorda ou discorda do cordelista? Justifique.
6. Destaque as características do gênero Literatura de Cordel, exemplificando
com fragmentos do texto.
7. Escreva um texto em qualquer gênero formal que você já conheça contando
a mesma história do cordel lido.

8. Conte quantos versos tem cada estrofe do cordel em estudo e assinale a


opção que o cordel lido se encaixa:
a) Quadra: estrofe de quatro versos.
b) Sextilha: estrofe de seis versos.
c) Septilha: é a mais rara, pois é composta por sete versos.
d) Oitava: estrofe de oito versos.
e) Quadrão: os três primeiros versos rimam entre si; o quarto com o oitavo, e o
quinto, o sexto e o sétimo também entre si.
f) Décima: estrofe de dez versos.
g) Martelo: estrofes formadas por decassílabos (comuns em desafios e versos
heroicos).
(Antes do exercício acima, deverá ser feita uma explicação sobre como
diferenciar cada um deles, fazendo uma contagem junto à turma)

Quatro aulas para as atividades propostas acima

9. Jogo de Palavras:

► Cada aluno escreverá em um papel uma palavra que acredita ser


desconhecida por seus colegas. Poderá ser uma palavra utilizada em casa,
com amigos, no bairro, na cidade natal, que conheceu através de uma leitura,
ou em viagem;
► O aluno não deverá mostrar sua palavra a ninguém;
► O professor iniciará uma sequência, anotando no quadro negro as palavras
citadas. Com tais palavras expostas e explicadas por seu locutor, o aluno
deverá iniciar um pequeno cordel oral utilizando-as.

Uma aula

8 Tarefa de Casa:

Os grupos deverão ensaiar os cordéis distribuídos, para apresentá-los


oralmente a turma, com o intuito de todos os alunos conhecerem as três
histórias. Não será necessário decorá-los, mas a apresentação terá que ter
ritmo e entonação, e se acharem necessário, a caracterização de acordo com o
tema. (Esta atividade ficará a critério da professora regente, se será avaliativa
ou não)

Uma aula para a apresentação dos grupos

9 Exercícios de Análise Linguística


(sinônimos, pronomes pessoais, ampliação de vocabulário, variação
linguística, oralidade e escrita)

1º ETAPA

1. O texto do cordel apresenta alguma palavra que você não conhecia


antes? Qual ou quais?
2. A partir dessas palavras, o aluno deverá procurar o significado e sinônimos
de cada uma delas, fazendo uma lista.
3. Cada aluno reescreverá duas estrofes do texto recebido por seu grupo,
substituindo as palavras típicas nordestinas por uma linguagem de outro
estado do país, que eles conheçam, de modo que diferenciem os
regionalismos brasileiros.
4. A atividade anterior será apresentada à turma em papel graft, exposto na
parede da sala e, após a leitura, o grupo deverá esclarecer quais palavras
foram substituídas e definir a região na qual elas são pronunciadas.
5. Debate: Ao final da leitura, comentaremos sobre a alteração na variedade
linguística do cordel, e se a substituição de palavras ou expressões alterou
ou não o sentido e a melodia do texto.

Nesta primeira etapa serão utilizadas quatro aulas

2º ETAPA

 Os alunos retomarão o texto proposto analisando os pronomes


pessoais, após uma explicação sobre pronomes retos, oblíquos e
possessivos.
 A história é contada em primeira ou terceira pessoa? Do plural ou
singular?
 Existe uma segunda pessoa? Explique.
 Cada aluno fará novamente o exercício de reescrita proposto na
primeira etapa, porém com duas estrofes diferentes das primeiras e
trocando a primeira pessoa pela terceira e vice-versa.

Esta etapa contará com duas aulas para ser realizada

Variação Linguística

Seguiremos abarcando outra questão importante para a compreensão do


gênero Literatura de Cordel, a variação linguística. Para isso, propomos a
leitura reflexiva do texto abaixo:

Variação Linguística
Por Marcos Duarte

Uma língua nunca é falada da mesma forma, sendo que ela estará sempre sujeita a
variações, como: diferença de épocas (o português falado hoje é diferente do português de 50
anos atrás), regionalidade (diferentes lugares, diferentes falas), grupo social (uso de “etiqueta”,
assim como gírias por determinadas “tribos”) e ainda as diferentes situações (fala forma e
informal).
Além das variações já citadas, há ainda outras variações, como, modo de falar de
diferentes profissionais (linguagem técnica da área), as gírias das diferentes faixas etárias, a
língua escrita e oral.
Diante de tantas variantes lingüísticas, é comum perguntar-se qual a forma mais
correta. Porém não existe forma mais correta, existe sim a forma mais adequada de se
expressar de acordo com a situação. Dessa forma, a pessoa que fala bem é aquela
que consegue estabelecer a forma mais adequada de se expressar de acordo com a situação,
conseguindo o máximo de eficiência da língua.
Usar o português rígido e sério (linguagem formal escrita) em uma comunicação
informal, descontraída é falar de forma inadequada. Soa como pretensioso, artificial. Da mesma
forma, é inadequado utilizar gírias, termos chulos e desrespeitosos em uma situação formal.
Ao se falar de variantes é preciso não perder de vista que a língua é um código de
comunicação e também um fato com repercussões sociais. Existem muitas formas de
comunicar que não perturbam a comunicação, mas afetam a imagem social do comunicador.
Uma frase como “O povo exageram” tem o mesmo sentido que “O povo exagera”. Como
sabemos o coletivo como conteúdo é sempre plural. Porém hoje a concordância é com a forma.
Nesse particular, há uma aproximação máxima entre língua e etiqueta social. Atualmente falar
“O povo exageram” deprecia a imagem do falante.

 Debater sobre as variações linguísticas que encontramos na sala de


aula, no intervalo, no bairro onde moramos, etc.
 Enfatizar que não devemos julgar e recriminar as pessoas pela forma
que elas falam, o importante é estar adequada ao meio.

Uma aula

10 Texto complementar:

Edição 13 - agosto e setembro/2010

Literatura de Cordel
Moreira de Acopiara

É que os cordéis sempre são


Histórias bem trabalhadas,
Possuem linguagem fácil,
Estrofes sempre rimadas,
Versos sempre bem medidos,
Palavras cadenciadas.(1)

A literatura de cordel chegou ao Brasil na bagagem do colonizador, ainda como poesia


oral. Por acaso se instalou no Nordeste brasileiro, a partir de Salvador, e depois de
mudanças se espalhou pelo restante do Brasil. Passou a se chamar Literatura de Cordel
por causa da forma como os livrinhos eram (e ainda são, em muitos casos) apresentados
para a venda, expostos em cordões, ou barbantes, nas feiras e mercados. As histórias são
geralmente escritas em sextilhas, septilhas e, mais raramente, em décimas, quase sempre
com versos de sete sílabas poéticas. Os decassílabos são mais comuns entre os
cantadores repentistas. Na maioria das vezes os livrinhos são impressos em papel
barato, têm o formato de oito páginas, que é justamente uma folha de papel tipo A4
dobrada duas vezes, e o mais comum é um cordel ter até 32 estrofes. Mas isso não é
regra. Se o tema é mais abrangente o folheto pode ter 12, 16, 20, 32 páginas ou mais.
Nesse caso passa a se chamar Romance.

Em Portugal, ali pelo século XVI, esse tipo de literatura era conhecida por “Folhas
soltas” ou “Volantes”. E era privilégio de cegos, que tinham licença para comercializar
seus versos em locais públicos. Na Espanha o mesmo tipo de literatura popular era
chamada de “Pliegos sueltos”, denominação que passou também à América Latina, ao
lado de “Hojas” e “Corridos”. Tal denominação ainda é recorrente no México, na
Argentina, Nicarágua e Peru, sempre envolvendo narrativas tradicionais e fatos
circunstanciais, exatamente como a literatura de cordel brasileira.

O primeiro folheto de cordel legitimamente brasileiro de que se tem notícia no Brasil,


segundo registra o jornalista e escritor Orígenes Lessa, teria sido impresso em Recife
por volta de 1865. O autor é desconhecido, assim como o título da obra. Por volta de
1890 o poeta repentista Silvino Pirauá de Lima (1848-1913) começou a publicar.
Silvino era inovador. Foi quem introduziu a sextilha no cordel, a deixa e o martelo
agalopado na cantoria. O paraibano Leandro Gomes de Barros (1865-1918) veio em
seguida e foi o grande representante dessa arte, tendo publicado centenas de folhetos. A
xilogravura (milenar arte de entalhar desenhos e letras na madeira) foi introduzida no
cordel, segundo o estudioso Joseph Maria Luyten, a partir dos anos 1940, por causa da
necessidade que os poetas sentiram de ilustrar as capas dos seus livretos com desenhos
condizentes com o enredo. Mas é sabido que muito antes disso, por volta de 1907, um
folheto do também paraibano Chagas Batista circulou com a figura de um cangaceiro,
feita em xilogravura, estampada na capa.

Esse gênero literário permanece até hoje bastante difundido no Nordeste, especialmente
nos estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte, Alagoas e Piauí,
muito embora tenha já se universalizado. Os poemas, geralmente vendidos pelos
próprios autores, ainda narram fatos do cotidiano local, como acontecimentos políticos,
festas, desastres, disputas, milagres, enchentes e secas. Já foi chamado de “o jornal do
sertanejo”, num tempo em que rádio era coisa de rico, televisão não existia e jornal só
circulava nas grandes cidades.

Feitos para serem recitados, os cordéis são muitas vezes cantados ao público, em toadas
lentas e penosas, com acompanhamento de violas ou pandeiros, para atrair o público e
estimular a venda.
Pai e mãe é muito bom,
Barriga cheia é melhor;
A moléstia é muito ruim,
A morte é muito pior,
O poder de Deus é grande
Porém o mato é maior.(2)

Um dos poetas mais famosos da história do cordel, senão o mais famoso, também
considerado um dos precursores, foi o paraibano Leandro Gomes de Barros (1865-
1918), que criou centenas de folhetos e foi o primeiro a inovar na forma e a se
preocupar com a correção do texto. Foi também quem primeiro investiu em tecnologia,
trazendo da Europa o que havia de mais moderno em equipamentos gráficos. Publicou
centenas de folhetos. “Não foi o príncipe dos poetas do asfalto, mas foi, no julgamento
do povo, rei da poesia do sertão, e do Brasil em estado puro”, disse Carlos Drummond
de Andrade em crônica publicada no Jornal do Brasil em 9 de setembro de 1976.

Poeta como Leandro


Inda o Brasil não criou
Por ser um dos escritores
Que mais livros registro
Canções não se sabem quantas
Foram seiscentas e tantas
As obras que publicou. (3)

Houve outros grandes poetas que viveram essa fase áurea do cordel, como João Martins
de Atayde (autor da septilha acima), José Camelo de Melo, Zé Bernardo, João
Melquíades, Zé Pacheco, Expedito Sebastião da Silva, Rodolfo Coelho Cavalcante,
Firmino Teixeira do Amaral e Manoel Camilo, entre outros. Das gerações seguintes
merecem destaque Patativa do Assaré (1909-2002), Manoel Monteiro, Gonçalo Ferreira
da Silva, (atual presidente da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, ABLC),
Antônio Francisco e Geraldo Gonçalves de Alencar. Da geração ainda mais recente (que
supera em qualidade, e com folga, os da geração de Leandro) temos os cearenses
Arievaldo Viana, Zé Maria e Rouxinol do Rinaré, os baianos Marco Haurélio e Dalmo
Sérgio, o piauiense Pedro Costa, os pernambucanos Marcelo Soares, Cícero Pedro de
Assis, Luciano Dionísio e Jénerson Alves, e muitos outros. A Associação dos
Cordelistas do Crato faz um excelente trabalho de divulgação e valorização do cordel
tradicional, assim como a ABLC. Em muitas cidades do Nordeste é comum os poetas se
reunirem para falar de cordel, declamar, “trocar figurinhas”. Temos também Editoras
especializadas nesse gênero. É o caso da Luzeiro, em São Paulo; Queima Bucha, no Rio
grande do Norte; Coqueiro, em Recife; e Tupynanquim, em Fortaleza, cujo proprietário
é o também poeta Klévisson Viana.

No meu país poucos vêem


O valor da poesia,
Da cultura popular…
E até a ecologia
Não é reverenciada,
E é menos apreciada
Do que a pornografia.(4)
Antes da evolução do rádio, do jornal e da TV, a literatura de cordel prestava grande
serviço, tanto como fonte de informação quanto como servindo de cartilha onde os
sertanejos aprendiam a ler. Era através do cordel que o povo simples se alfabetizava e se
inteirava de alguns acontecimentos históricos, atualidades, fofocas, ficção, política,
romances, etc.

O repente tem muito a ver com o cordel. A diferença é que o cordel é escrito e o repente
é cantado de improviso ao som de violas. Muita gente até os confunde, e até com razão,
pois a linguagem é a mesma, em ambos os casos os poetas utilizam os mesmos
esquemas de rimas e metrificação e os dois estão presentes em muitos momentos da
cultura brasileira, principalmente na música de Luiz Gonzaga, de Zé Ramalho, Elomar,
Vital Farias, só pra citar alguns. Na boa música caipira o cordel também está presente.
“Herói sem medalha”, “Saudade de minha terra”, “Rei do gado”, “Travessia do Rio
Araguaia”, “O menino da porteira”, dentre tantas outras, são modas de viola belíssimas,
de autores do Sudeste do país, e que têm a linguagem do cordel.

No samba de roda, comum no Rio de Janeiro; na tirana, modalidade muito cantada na


Bahia; no cururu e no catira, comuns em São Paulo e Minas, vêem-se traços do cordel.
No Rio Grande do Sul há poetas populares e repentistas maravilhosos; enfim, no Brasil
todo ele está presente. Uma das músicas que mais emocionava Luiz Gonzaga, e
continua emocionando muita gente, chama-se “A triste partida”, que nada mais é do que
um cordel do genial Patativa do Assaré. Composto por dezenove oitavas de cinco
sílabas, foi publicado em formato de folheto no início da década de 1950. Em todos os
discos de Zé Ramalho, sem exceção, podem-se vislumbrar vários trabalhos na linha do
cordel e do repente.

O poeta Camões, a meu ver uma das mais brilhantes mentes do planeta, escrevia em
forma de cordel. Isso mesmo! Se você pegar cada um daqueles cantos maravilhosos de
Os Lusíadas e imprimir num folheto, ele passa a ser um cordel, com estrofes de oito
versos (oitavas) de dez sílabas poéticas (decassílabos).

Ainda hoje é comum se encontrar cordéis em feiras e mercados nas principais cidades
do Nordeste, e até fora dele. Vá a Caruaru, Recife, Campina Grande, Juazeiro do Norte,
Crato, Mossoró, Salvador e Rio de Janeiro, principalmente na feira de São Cristóvão;
em São Paulo, no Centro de Tradições Nordestinas e em outros locais, inclusive em
livrarias de renome, a gente encontra cordéis.

Os nossos antepassados
Eram muito prevenidos;
Diziam: – Matos têm olhos
E paredes têm ouvidos,
Os crimes são descobertos
Por mais que sejam escondidos.(5)

Os temas principais desse tipo de literatura foram o cangaço, a religiosidade, as


catástrofes, os contos de fada e as grandes histórias de amor. Sobre padre Cícero e
Lampião conheço dezenas de cordéis. Sobre Airtom Senna também conheço vários.
Mas escreve-se sobre qualquer tema.
Grandes escritores como Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, José Lins do Rego e João
Cabral de Melo Neto foram influenciados por essa forma de literatura popular. Toda
obra de Ariano Suassuna é baseada na literatura de cordel. A peça O Auto da
Compadecida foi escrita inicialmente em um ato, a partir do cordel “O enterro do
cachorro”, de Leandro Gomes de Barros. Mais tarde Ariano acrescentou mais dois atos,
tendo como base outros dois cordéis: “O cavalo que defecava dinheiro”, também de
Leandro, e “O castigo da soberba”, de autor não identificado. Cora Coralina, estrela da
poesia de Goiás e do Brasil, gostava tanto dessas histórias rimadas e metrificadas que
batizou o seu primeiro livro de “Meu livro de cordel”.

Desde que nasci ouço falar que a literatura de cordel está morrendo. O surgimento do
rádio provocou um susto nos cordelistas com as afirmações de que “agora o cordel está
com os dias contados”. Tudo bobagem. O rádio não conseguiu sufocar nem o cordel
nem o repente e, atualmente, é um grande aliado. O surgimento da televisão provocou
outro susto que já está passando, e o cordel continua vivo e atuante, sendo tema de
monografias, dissertações e teses, no Brasil e lá fora, nas melhores Universidades.
Assim sendo, acredito que a literatura de cordel sobreviverá para sempre como uma das
mais encantadoras manifestações da inteligência e da criatividade. É lógico, porém, que
passará por adaptações.

O bom leitor é aquele


Que lê um texto e entende;
Já disse Guimarães Rosa:
“Bom guerreiro não se rende.
Mestre não é quem ensina,
Mas quem de repente aprende”. (6)
________________________________________________________________
(1) Estrofe de sete sílabas poéticas, do cordel NOS CAMINHOS DA EDUCAÇÃO, de
Moreira de Acopiara.
(2) Sextilha de Leandro Gomes de Barros, do cordel VIDA E TESTAMENTO DE
CANCÃO DE FOGO.
(3) Essa septilha, também de sete sílabas, é de autoria do poeta João Martins de Atayde.
(4) Mais uma septilha, agora do cordel O PROBLEMA SOMOS NÓS, de Moreira de
Acopiara.
(5) Essa estrofe, também de Leandro, é parte do cordel O CACHORRO DOS
MORTOS.
(6) Sextilha de Moreira de Acopiara que fecha o cordel NOS CAMINHOS DA
EDUCAÇÃO.

O poeta cearense Moreira de Acopiara mora em São Paulo. Membro da Academia


Brasileira de Literatura de Cordel, ABLC, tem dezenas de cordéis publicados, 2 CD’s e
6 livros, sendo os mais recentes, “Livro de bolso”, uma coletânea de poemas, e o
didático “Cordel em arte e versos”.
http://www.revistaoprofessor.com.br/wordpress/?p=266

O texto será entregue para leitura em casa. Os alunos trarão observações


por escrito

11 Conhecendo um cordelista
AUTO DA COMPADECIDA
Formato: Livro
Autor: SUASSUNA, ARIANO
Idioma: PORTUGUES
Editora: AGIR
Assunto: ARTES - TEATRO

11.1 Biografia do escritor Ariano Suassuna

Sexto ocupante da Cadeira nº 32, eleito em 3 de agosto de 1989, na sucessão de


Genolino Amado e recebido em 9 de agosto de 1990 pelo Acadêmico Marcos Vinicios
Vilaça.

Ariano Vilar Suassuna nasceu em Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa (PB), em
16 de junho de 1927, filho de Cássia Villar e João Suassuna. No ano seguinte, seu pai
deixa o governo da Paraíba e a família passa a morar no sertão, na Fazenda Acauhan.

Com a Revolução de 30, seu pai foi assassinado por motivos políticos no Rio de Janeiro
e a família mudou-se para Taperoá, onde morou de 1933 a 1937. Nessa cidade, Ariano
fez seus primeiros estudos e assistiu pela primeira vez a uma peça de mamulengos e a
um desafio de viola, cujo caráter de “improvisação” seria uma das marcas registradas
também da sua produção teatral.

A partir de 1942 passou a viver no Recife, onde terminou, em 1945, os estudos


secundários no Ginásio Pernambucano e no Colégio Osvaldo Cruz. No ano seguinte
iniciou a Faculdade de Direito, onde conheceu Hermilo Borba Filho. E, junto com ele,
fundou o Teatro do Estudante de Pernambuco. Em 1947, escreveu sua primeira peça,
Uma Mulher Vestida de Sol. Em 1948, sua peça Cantam as Harpas de Sião (ou O
Desertor de Princesa) foi montada pelo Teatro do Estudante de Pernambuco. Os
Homens de Barro foi montada no ano seguinte.

Em 1950, formou-se na Faculdade de Direito e recebeu o Prêmio Martins Pena pelo


Auto de João da Cruz. Para curar-se de doença pulmonar, viu-se obrigado a mudar-se de
novo para Taperoá. Lá escreveu e montou a peça Torturas de um Coração em 1951. Em
1952, volta a residir em Recife. Deste ano a 1956, dedicou-se à advocacia, sem
abandonar, porém, a atividade teatral. São desta época O Castigo da Soberba (1953), O
Rico Avarento (1954) e o Auto da Compadecida (1955), peça que o projetou em todo o
país e que seria considerada, em 1962, por Sábato Magaldi “o texto mais popular do
moderno teatro brasileiro”.

Em 1956, abandonou a advocacia para tornar-se professor de Estética na Universidade


Federal de Pernambuco. No ano seguinte foi encenada a sua peça O Casamento
Suspeitoso, em São Paulo, pela Cia. Sérgio Cardoso, e O Santo e a Porca; em 1958, foi
encenada a sua peça O Homem da Vaca e o Poder da Fortuna; em 1959, A Pena e a
Lei, premiada dez anos depois no Festival Latino-Americano de Teatro.

Em 1959, em companhia de Hermilo Borba Filho, fundou o Teatro Popular do


Nordeste, que montou em seguida a Farsa da Boa Preguiça (1960) e A Caseira e a
Catarina (1962). No início dos anos 60, interrompeu sua bem-sucedida carreira de
dramaturgo para dedicar-se às aulas de Estética na UFPe. Ali, em 1976, defende a tese
de livre-docência A Onça Castanha e a Ilha Brasil: Uma Reflexão sobre a Cultura
Brasileira. Aposenta-se como professor em 1994.

Membro fundador do Conselho Federal de Cultura (1967); nomeado, pelo Reitor Murilo
Guimarães, diretor do Departamento de Extensão Cultural da UFPe (1969). Ligado
diretamente à cultura, iniciou em 1970, em Recife, o “Movimento Armorial”,
interessado no desenvolvimento e no conhecimento das formas de expressão populares
tradicionais. Convocou nomes expressivos da música para procurarem uma música
erudita nordestina que viesse juntar-se ao movimento, lançado em Recife, em 18 de
outubro de 1970, com o concerto “Três Séculos de Música Nordestina – do Barroco ao
Armorial” e com uma exposição de gravura, pintura e escultura. Secretário de Cultura
do Estado de Pernambuco, no Governo Miguel Arraes (1994-1998).

Entre 1958-79, dedicou-se também à prosa de ficção, publicando o Romance d’A Pedra
do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta (1971) e História d’O Rei Degolado
nas Caatingas do Sertão / Ao Sol da Onça Caetana (1976), classificados por ele de
“romance armorial-popular brasileiro”.

Ariano Suassuna construiu em São José do Belmonte (PE), onde ocorre a cavalgada
inspirada no Romance d’A Pedra do Reino, um santuário ao ar livre, constituído de 16
esculturas de pedra, com 3,50 m de altura cada, dispostas em círculo, representando o
sagrado e o profano. As três primeiras são imagens de Jesus Cristo, Nossa Senhora e
São José, o padroeiro do município.

Membro da Academia Paraibana de Letras e Doutor Honoris Causa da Faculdade


Federal do Rio Grande do Norte (2000).

Em 2004, com o apoio da ABL, a Trinca Filmes produziu um documentário intitulado


O Sertão: Mundo de Ariano Suassuna, dirigido por Douglas Machado e que foi exibido
na Sala José de Alencar.

Academia Brasileira de Letras


Av. Presidente Wilson 203, Castelo | CEP 20030-021 | Rio de Janeiro | RJ
Tel: (21) 3974-2500 | E-mail: academia@academia.org.br

Professora, penso em levar uma biografia mais resumida para economizar


tempo e falar oralmente sobre os detalhes da vida do autor. O que você
acha?
12 Intertextualidade e diálogo entre gêneros:

1 - Assistir ao filme Auto da Compadecida, longa baseado em livro de Ariano


Suassuna. Informar que o escritor baseou-se nos três cordéis trabalhados
anteriormente, para escrever a peça teatral Auto da Compadecida, sendo eles:
- Proezas de João Grilo de João Ferreira de Lima
- O Cavalo que defecada dinheiro e O testamento do cachorro de Leandro
Gomes de Barros

O filme durará quatro aulas levando em consideração o tempo para ser


colocado o filme e acomodação dos alunos no local
13 Produção e reescrita do gênero:

1. Escreva um texto em primeira pessoa sobre seu personagem preferido do


filme e de acordo com os conhecimentos prévios aponte em qual dos três
cordéis ele está inserido.

2. Levando em consideração o seu conhecimento adquirido em sala sobre este


gênero textual, produza seu próprio cordel escrito, conforme seu ambiente
social. A professora sugeriu que façamos a revisão dos textos juntas

Três aulas, se necessário utilizar mais uma

14 Circulação do Gênero:

Após a produção em sala de aula, o texto deverá passar por sua fase final, a
exposição, para dar o verdadeiro sentido ao que foi estudado.
Faremos livretos de cordel, cada aluno escolherá uma imagem para a capa e
utilizaremos um cordão para expor a Literatura a todos os interessados do meio
escolar.
Para a refracção e xilogravuras são disponibilizadas duas aulas
15 Bibliografia

http://acordacordel.blogspot.com.br/2011/05/o-auto-da-compadecida.html
http://www.nacaocultural.pe.gov.br/busca_resultado.php?buscar=1&tag=cordel
http://pt.wikisource.org/wiki/O_cavalo_que_defecava_dinheiro
http://www.suapesquisa.com/cordel/ http://sociolingustica.blogspot.com.br/
http://www.youtube.com/watch?v=gFD7l0Pj4B8 http://www.youtube.com/watch?
v=7DosjK6GSUQ&feature=related

http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=226&sid=305

http://www.revistaoprofessor.com.br/wordpress/?p=266

O Cavalo Que Defecava Dinheiro


Na cidade de Macaé
Antigamente existia
Um duque velho invejoso
Que nada o satisfazia
Desejava possuir
Todo objeto que via
Esse duque era compadre
De um pobre muito atrasado
Que morava em sua terra
Num rancho todo estragado
Sustentava seus filhinhos
Na vida de alugado.
Se vendo o compadre pobre
Naquela vida privada
Foi trabalhar nos engenhos
Longe da sua morada
Na volta trouxe um cavalo
Que não servia pra nada
Disse o pobre à mulher:
— Como havemos de passar?
O cavalo é magro e velho
Não pode mais trabalhar
Vamos inventar um "quengo"
Pra ver se o querem comprar.
Foi na venda e de lá trouxe
Três moedas de cruzado
Sem dizer nada a ninguém
Para não ser censurado
No fiofó do cavalo
Foi o dinheiro guardado
Do fiofó do cavalo
Ele fez um mealheiro
Saiu dizendo: — Sou rico!
Inda mais que um fazendeiro,
Porque possuo o cavalo
Que só defeca dinheiro.
Quando o duque velho soube
Que ele tinha esse cavalo
Disse pra velha duquesa:
—Amanhã vou visitá-lo
Se o animal for assim
Faço o jeito de comprá-lo!
Saiu o duque vexado
Fazendo que não sabia,
Saiu percorrendo as terras
Como quem não conhecia
Foi visitar a choupana,
Onde o pobre residia.
Chegou salvando o compadre
Muito desinteressado:
— Compadre, Como lhe vai?
Onde tanto tem andado?
Há dias que lhe vejo
Parece está melhorado...
—É muito certo compadre
Ainda não melhorei
Porque andava por fora
Faz três dias que cheguei
Mas breve farei fortuna
Com um cavalo que comprei.
—Se for assim, meu compadre
Você está muito bem!
É bom guardar o segredo,
Não conte nada a ninguém.
Me conte qual a vantagem
Que este seu cavalo tem?
Disse o pobre: —Ele está magro
Só o osso e o couro,
Porém tratando-se dele
Meu cavalo é um tesouro
Basta dizer que defeca
Níquel, prata, cobre e ouro!
Aí chamou o compadre
E saiu muito vexado,
Para o lugar onde tinha
O cavalo defecado
O duque ainda encontrou
Três moedas de cruzado.
Então exclamou o velho:
— Só pude achar essas três!
Disse o pobre: — Ontem à tarde
Ele botou dezesseis!
Ele já tem defecado,
Dez mil réis mais de uma vez.
—Enquanto ele está magro
Me serve de mealheiro.
Eu tenho tratado dele
Com bagaço do terreiro,
Porém depois dele gordo
Não quem vença o dinheiro...
Disse o velho: — meu compadre
Você não pode tratá-lo,
Se for trabalhar com ele
É com certeza matá-lo
O melhor que você faz
É vender-me este cavalo!
— Meu compadre, este cavalo
Eu posso negociar,
Só se for por uma soma
Que dê para eu passar
Com toda minha família,
E não precise trabalhar.
O velho disse ao compadre:
— Assim não é que se faz
Nossa amizade é antiga
Desde os tempo de seus pais
Dou-lhe seis contos de réis
Acha pouco, inda quer mais?
— Compadre, o cavalo é seu!
Eu nada mais lhe direi,
Ele, por este dinheiro
Que agora me sujeitei
Para mim não foi vendido,
Faça de conta que te dei!
O velho pela ambição
Que era descomunal,
Deu-lhe seis contos de réis
Todo em moeda legal
Depois pegou no cabresto
E foi puxando o animal.
Quando ele chegou em casa
Foi gritando no terreiro:
— Eu sou o homem mais rico
Que habita o mundo inteiro!
Porque possuo um cavalo
Que só defeca dinheiro!
Pegou o dito cavalo
Botou na estrebaria,
Milho, farelo e alface
Era o que ele comia
O velho duque ia lá,
Dez, doze vezes por dia...
Aí o velho zangou-se
Começou loga a falar:
—Como é que meu compadre
Se atreve a me enganar?
Eu quero ver amanhã
O que ele vai me contar.
Porém o compadre pobre,
(Bicho do quengo lixado)
Fez depressa outro plano
Inda mais bem arranjado
Esperando o velho duque
Quando viesse zangado...
O pobre foi na farmácia
Comprou uma borrachinha
Depois mandou encher ela
Com sangue de uma galinha
E sempre olhando a estrada
Pré ver se o velho vinha.
Disse o pobre à mulher:
— Faça o trabalho direito
Pegue esta borrachinha
Amarre em cima do peito
Para o velho não saber,
Como o trabalho foi feito!
Quando o velho aparecer
Na volta daquela estrada,
Você começa a falar
Eu grito: —Oh mulher danada!
Quando ele estiver bem perto,
Eu lhe dou uma facada.
Porém eu dou-lhe a facada
Em cima da borrachinha
E você fica lavada
Com o sangue da galinha
Eu grito: —Arre danada!
Nunca mais comes farinha!
Quando ele ver você morta
Parte para me prender,
Então eu digo para ele:
—Eu dou jeito ela viver,
O remédio tenho aqui,
Faço para o senhor ver!
—Eu vou buscar a rabeca
Começo logo a tocar
Você então se remaxa
Como quem vai melhorar
Com pouco diz: —Estou boa
Já posso me levantar.
Quando findou-se a conversa
Na mesma ocasião
O velho ia chegando
Aí travou-se a questão
O pobre passou-lhe a faca,
Botou a mulher no chão.
O velho gritou a ele
Quando viu a mulher morta:
Esteja preso, bandido!
E tomou conta da porta
Disse o pobre: —Vou curá-la!
Pra que o senhor se importa?
—O senhor é um bandido
Infame de cara dura
Todo mundo apreciava
Esta infeliz criatura
Depois dela assassinada,
O senhor diz que tem cura?
Compadre, não admito
O senhor dizer mais nada,
Não é crime se matar
Sendo a mulher malcriada
E mesmo com dez minutos,
Eu dou a mulher curada!
Correu foi ver a rabeca
Começou logo a tocar
De repente o velho viu
A mulher se endireitar
E depois disse: —Estou boa,
Já posso me levantar...
O velho ficou suspenso
De ver a mulher curada,
Porém como estava vendo
Ela muito ensanguentada
Correu ela, mas não viu,
Nem o sinal da facada.
O pobre entusiasmado
Disse-lhe: —Já conheceu
Quando esta rabeca estava
Na mão de quem me vendeu,
Tinha feito muitas curas
De gente que já morreu!
No lugar onde eu estiver
Não deixo ninguém morrer,
Como eu adquiri ela
Muita gente quer saber
Mas ela me está tão cara
Que não me convém dizer.
O velho que tinha vindo
Somente propor questão,
Por que o cavalo velho
Nunca botou um tostão
Quando viu a tal rabeca
Quase morre de ambição.
—Compadre, você desculpe
De eu ter tratado assim
Porque agora estou certo
Eu mesmo fui o ruim
Porém a sua rabeca
Só serve bem para mim.
—Mas como eu sou um homem
De muito grande poder
O senhor é um homem pobre
Ninguém quer o conhecer
Perca o amor da rabeca...
Responda se quer vender?
—Porque a minha mulher
Também é muito estouvada
Se eu comprar esta rabeca
Dela não suporto nada
Se quiser teimar comigo,
Eu dou-lhe uma facada.
—Ela se vê quase morta
Já conhece o castigo,
Mas eu com esta rabeca
Salvo ela do perigo
Ela daí por diante,
Não quer mais teimar comigo!
Disse-lhe o compadre pobre:
—O senhor faz muito bem,
Quer me comprar a rabeca
Não venderei a ninguém
Custa seis contos de réis,
Por menos nem um vintém.
O velho muito contente
Tornou então repetir:
—A rabeca já é minha
Eu preciso a possuir
Ela para mim foi dada,
Você não soube pedir.
Pagou a rabeca e disse:
—Vou já mostrar a mulher!
A velha zangou-se e disse:
—Vá mostrar a quem quiser!
Eu não quero ser culpada
Do prejuízo que houver.
—O senhor é mesmo um velho
Avarento e interesseiro,
Que já fez do seu cavalo
Que defecava dinheiro?
—Meu velho, dê-se a respeito,
Não seja tão embusteiro.
O velho que confiava
Na rabeca que comprou
Disse a ela: —Cale a boca!
O mundo agora virou
Dou-lhe quatro punhaladas,
Já você sabe quem sou.
Ele findou as palavras
A velha ficou teimando,
Disse ele: —Velha dos diabos
Você ainda está falando?
Deu-lhe quatro punhaladas
Ela caiu arquejando...
O velho muito ligeiro
Foi buscar a rabequinha,
Ele tocava e dizia:
—Acorde, minha velhinha!
Porém a pobre da velha,
Nunca mais comeu farinha.
O duque estava pensando
Que sua mulher tornava
Ela acabou de morrer
Porém ele duvidava
Depois então conheceu
Que a rabeca não prestava.
Quando ele ficou certo
Que a velha tinha morrido
Boto os joelhos no chão
E deu tão grande gemido
Que o povo daquela casa
Ficou todo comovido.
Ele dizia chorando:
—Esse crime hei de vingá-lo
Seis contos desta rabeca
Com outros seis do cavalo
Eu lá não mando ninguém,
Porque pretendo matá-lo.
Mandou chamar dois capangas:
—Me façam um surrão bem feito
Façam isto com cuidado
Quero ele um pouco estreito
Com uma argola bem forte,
Pra levar este sujeito!
Quando acabar de fazer
Mande este bandido entrar,
Para dentro do surrão
E acabem de costurar
O levem para o rochedo,
Para sacudi-lo no mar.
Os homens eram dispostos
Findaram no mesmo dia,
O pobre entrou no surrão
Pois era o jeito que havia
Botaram o surrão nas costas
E saíram numa folia.
Adiante disse um capanga:
—Está muito alto o rojão,
Eu estou muito cansado,
Botemos isto no chão!
Vamos tomar uma pinga,
Deixe ficar o surrão.
Está muito bem, companheiro
Vamos tomar a bicada!
(Assim falou o capanga
Dizendo pro camarada)
Seguiram ambos pra venda
Ficando além da estrada...
Quando os capangas seguiram
Ele cá ficou dizendo:
—Não caso porque não quero,
Me acho aqui padecendo...
A moça é milionária
O resto eu bem compreendo!
Foi passando um boiadeiro
Quando ele dizia assim,
O boiadeiro pediu-lhe:
—Arranje isto pra mim
Não importa que a moça
Seja boa ou ruim!
O boiadeiro lhe disse:
—Eu dou-lhe de mão beijada,
Todos os meus possuídos
Vão aqui nessa boiada...
Fica o senhor como dono,
Pode seguir a jornada!
Ele condenado à morte
Não fez questão, aceitou,
Descoseu o tal surrão
O boiadeiro entrou
O pobre morto de medo
Num minuto costurou.
O pobre quando se viu
Livre daquela enrascada,
Montou-se num bom cavalo
E tomou conta da boiada,
Saiu por ali dizendo:
—A mim não falta mais nada.
Os capangas nada viram
Porque fizeram ligeiro,
Pegaram o dito surrão
Com o pobre do boiadeiro
Voaram de serra abaixo
Não ficou um osso inteiro.
Fazia dois ou três meses
Que o pobre negociava
A boiada que lhe deram
Cada vez mais aumentava
Foi ele um dia passar,
Onde o compadre morava...
Quando o compadre viu ele
De susto empalideceu;
—Compadre, por onde andava
Que agora me apareceu?!
Segundo o que me parece,
Está mais rico do que eu...
—Aqueles seus dois capangas
Voaram-me num lugar
Eu caí de serra abaixo
Até na beira do mar
Aí vi tanto dinheiro,
Quanto pudesse apanhar!..
—Quando me faltar dinheiro
Eu prontamente vou ver.
O que eu trouxe não é pouco,
Vai dando pra eu viver
Junto com a minha família,
Passar bem até morrer.
—Compadre, a sua riqueza
Diga que fui eu quem dei!
Pra você recompensar-me
Tudo quanto lhe arranjei,
É preciso que me bote
No lugar que lhe botei!..
Disse-lhe o pobre: —Pois não,
Estou pronto pra lhe mostrar!
Eu junto com os capangas
Nós mesmo vamos levar
E o surrão de serra abaixo
Sou eu quem quero empurrar!..
O velho no mesmo dia
Mandou fazer um surrão.
Depressa meteu-se nele,
Cego pela ambição
E disse: —Compadre eu estou
À tua disposição.
O pobre foi procurar
Dois cabras de confiança
Se fingindo satisfeito
Fazendo a coisa bem mansa
Só assim ele podia,
Tomar a sua vingança.
Saíram com este velho
Na carreira, sem parar
Subiram de serra acima
Até o último lugar
Daí voaram o surrão
Deixaram o velho embolar...
O velho ia pensando
De encontrar muito dinheiro,
Porém secedeu com ele
Do jeito do boiadeiro,
Que quando chegou embaixo
Não tinha um só osso inteiro.
Este livrinho nos mostra
Que a ambição nada convém
Todo homem ambicioso
Nunca pode viver bem,
Arriscando o que possui
Em cima do que já tem.
Cada um faça por si,
Eu também farei por mim!
É este um dos motivos
Que o mundo está ruim,
Porque estamos cercados
Dos homens que pensam assim.

Você também pode gostar