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DO OUTRO
While zoorking in historiography of the anthropological knowledge it appears as coherent to study the
level of association/dissociation between anthropology and anthropological museums, relating this level to
the different mechanisms ofobjectivation of knowledge which the discipline has bem utilizing during its
development. Focusing our attention on the tzoo last decades, this paper ainls to analize the recent
movement of approach of anthropology and the museological institution/museographic practice, zohich
took peace in the beginning of the 1980s, studying it together with the contemporary reformulations of
the discipline. Thus relating the approach movement to the epistemological and ideological contemporary
disruptures as weI1 as to the type ofanthropological knowledge they underlying.
objectos em si que comunicam significado, mas crítica exactamente porque é entendida como
tàmbém e sobretudo o ordenamento e arranjos uma actividade implacavelmente datada e
.impostos a esses objectos. Porque são "casas pertencente a uma época. Ao museu e as suas
classificadoras" (ibidem), aquilo que os museus práticas não pode ser concedido o privilégio da
mostram é altamente selectivo e os objectos neutralidade e/ou da universalidade porquanto
conservados e exibidos, longe de serem "factos" o que nele se pode ver são representações/inter-
objectivos, são antes suportes de grupos de pretações.
ideias que através deles se transmitem.
Paralelamente a este quadro pós-positivista
Esclarecido este ponto, percebemos agora que orienta a atenção crítica dos antropólogos
mais claramente o sentido e o intuito das reflexões para a desconstrução dos "sub-textos" produ-
antropológicas produzidas sobre os museus e a zidos pelo museu, também o quadro político e
cultura material, referidas na primeira parte deste ideológico pós-colonial estabelece um novo
artigo. Encarando o museu como uma instituição contexto de discussão das actividades da
cultural, as suas práticas expositivas podem ser instituição museológica. Para além da maior
olhadas como constru~õesde histórias, como consciência política e ética das implicações do
narrativas que longe de serem neutras são antes seu trabalho por parte dos antropólogos em
condicionadas pelos contextos político e ideoló- resultado da crítica geral ao colonialismo que
gico em que estão inseridas. "A exposição é um envolve a disciplina, o desenvolvimento das
acto político. O patrocínio é um acto político. A nações "subdesenvolvidas" e a maior capacidade
curadoria é um acto político. Trabalhar num de auto-afirmação dos grupos étnicos obrigam
museu é um acto político." (Ames, 1991: 13). a reequacionar algumas práticas daquela insti-
Suportadas por uma posição fortemente crítica tuição, estendendo-se a actual crítica à própria
em relação ao sistema colonial, assim como forma de designar os objectos que é discutida e
ao papel da antropologia enquanto suporte alterada. As relações tradicionalmente estabe-
ideológico das relações de dominação daí lecidas no museu entre os objectos e as culturas
resultantes, as recentes reflexões antropológicas que eles dariam a ver, para além de toda a
sobre os museus interessam-se sobretudo pelos discussão em tomo do seu carácter fragmentário
"sub-textos" (Vergo, 1989: 3), que compreendem e do tipo de representações assim produzidas,
por vezes mensagens contraditórias, subjacentes são questionadas também pelo facto de através
a todas as actividades da instituição: colecta, delas esses Outros surgirem como que suspensos
conservação e exibição de artefactos. Ao realizar no tempo, segregados da história mundial sem
essas múltiplas tarefas o museu efectua escolhas se equacionar as relações de poder a que
que são julgamentos de valor, não exclusivamente estiveram submetidos. Reequacionados também
determinados pelas tecnologias museológicas, em termos políticos, os museus são agora olhados
mas também por opções ideológicas e políticas como instituições que senão legitimaram pelo
de que importa, portanto, rtão só perceber o menos beneficiaram do sistema colonial. Do
sentido mas também as implicações. Dito de debate assim gerado um dos pontos mais
outro modo, a apresentação museográfica é, controversos é a acusação de expropriação
agora, assunto merecedor de extensa atenção cultural genericamente praticada no passado
por todos os museus, já que a esmagadora porquanto são olhadas como construções veicula-
maioria dos artefactos que detêm foram obtidos doras de imagens do Outro extra-europeu de
por meios que hoje seriam, no mínimo, que importa desconstmir as subjacentes noções
considerados ilícitos: "( ...) os museus não só teóricas e mensagens ideológicas. Entretanto,
representaram mal (misrepresented) as outras um outro conjunto de factores suporta também
culturas, como também as oprimiram e roubaram aquela reaproximação entre antropologia e
(...)." (Handler, 1985: 193). Apoiados nesta museus. O reinteresse dos antropólogos pela
acusaqão de imperialismo cultural alguns grupos apresentação e colecções museológicas, assim
étnicos auto-conscientes da sua identidade como o teor das suas reflexões, conduz os
cultural têm posto em causa a legitimidade da museólogos a uma maior auto-consciência das
posse pelos museus ocidentais de artefactos que implicações do seu trabalho. A percepção de
consideram sua propriedade cultural, como que um modo de apresentação expositiva implica
aconteceu em 1970 quando os Índios Onandaga um determinado tipo de conhecimento assim
reivindicaram ao New York State Museum a como determinadas opções ideológicas e políticas,
restituição de alguns dos seus objectos de culto. i.e., de que qualquer apresentação expositiva
nunca é neutra, conduz a que o próprio museu
Em conclusão e sinteticamente, podemos altere significativamente algumas das suas
afirmar que a reaproximação aos museus por práticas. Conscientes de que a selecção e o
parte da antropologia, nos anos 80, resulta quer modo de exposição de um objecto afecta a
da pertinência epistemológica agora concedida representação que construímos da cultura para
à desconstrução dos modos de representação que ele remete e o próprio tipo de conhecimento,
do conhecimento antropológico, quer do os museólogos introduzem inovações nas práticas
renovado interesse pelas implicações políticas museológicas que vão desde a consideração dos
dessas práticas representacionais. Para finalizar contextos políticos e dos problemas actuais do
a análise a que nos tínhamos proposto falta quotidiano do Terceiro Mundo até ao recurso a
apenas atender ao outro elemento do par novas tecnologias expositivas. Numa altura em
antropologia/museus, ou seja, as transformações que quer a posse física dos objectos etnográficos
ocorridas na própria instituição museológica e quer a representação das suas significações se
suas práticas. tomam alvo de atenção crítica, o movimento no
sentido da responsablização política das práticas
museológicas traduz-se, nomeadamente, no
passar a atender-se ao próprio processo histórico
da colecta e produção das colecções exibidas no
museu: "A história da colecta e da recontextua-
Reequacionando epistemológica e politica- lização dos objectos não-ocidentais é agora,
mente as actividades do museu, as reformulaqões idealmente, uma parte de qualquer exposição."
internas da antropologia dos anos 80 possibilitam (Clifford, 1985: 245). Através deste equacio-
e sustentam o movimento de reaproximação da narnento em termos expositivos das circunstâncias
disciplina à instituiqão museológica. As suas históricas da constituição das colecções, os
práticas passam a ser merecedoras de atenção museólogos não só se propõem o tratamento de
questões políticas que remetem inevitavelmente entre pessoas com conhecimento sobre práticas
para a análise das relações de poder estabelecidas museológicas e aquelas com conhecimento sobre
durante o período colonial, como reconhecem assuntos culturais." (1995: 336) como uma das
também o caracter construído e historicamente alterações que urge generalizar. Como via
situado das representações culturais que elaboram. alternativa refere as "exposições pós-modemas"
(ibidem) que, ao exporem intencionalmente
Esta nova postura teórica e ideológica dos fingidas realidades ou representações de repre-
responsáveis pelos museus e pelas exposições sentações, podem igualmente contribuir para a
suscita a adopção de outras inovações, tradu- renovação do papel do museu.
zindo-se uma delas no alargamento dos
comissariados das exposições. Estes passam a Mas a problemática e a atenção dispensada
ser constituídos por equipas pluridisciplinares aos modos de representação e o debate sobre
que incluem não só diversos profissionais do as qualidades objectivas dos artefactos, ao
museu para além dos próprios conservadores e repercutirem-se no museu, suscitam também
antropólogos, mas também, em alguns casos, mudanças nas próprias práticas expositivas.
membros dos grupos étnicos a que os objectos Uma das alterações mais significativas é a
expostos pertencem.7 Incluindo ou não membros superação da ligação privilegiada, ou exclusiva,
das próprias comunidades representadas, a da exposição aos aspectos estético-formais dos
constituição destes comissariados pluridiscipli- objectos e a sua nova aptidão para exibir, agora,
nares tem subjacente o reconhecimento da temas ou problemáticas especificamente antro-
necessidade de levar em consideração vários pológicas. As novas exposições passam a
pontos de vista, ou seja, sistemas de valor e apoiar-se mais em temas-ideias do que nos
representações alternativos, através dos quais é objectos em si, substituindo-se os anteriores
possível criticar e/ou explicitar o caracter ordenamentos formais e/ou funcionais dos
construído e relativo da representação museo- artefactos por ordenamentos muitas vezes
lógica. Isso poderá ser alcançado quer recorrendo narrativos. Os objectos etnográficos passam a
a uma "negociação" ou consulta mais ou menos ser utilizados essencialmente como ponto de
efectiva com o grupo étnico representado na partida através dos quais se tenta ilustrar,
exposição, quer através de exibição de vários remeter e/ou questionar a "história" que se
contextos de significação dos mesmos objectos. pretende contar.
Tentando equacionar as mudanças necessárias
para que o museu desempenhe melhor a sua A emergência desta nova modalidade
missão educacional e promova um multicultu- expositiva que é a exposição temática e os
ralismo efectivo, M. Kahn, num artigo recente,
esforços para a sua efectiva concretização estão
advoga o estreitamento da colaboração "( ...)
estreitamente relacionados com a criação de
instalações museográficas também elas distintas,
'Veja-se a propósito o artigo de J. Clifford (1991), Four
Nortlizuest Const Museuins: Trave1 -Reflections, onde se ou até em alguns casos desafiadoramente
compara o resultado de quatro exposiçóes, entre outros distintas, das anteriormente convencionadas.
factores, em função dos níveis de participação dos membros Numa exposição em que se pretende dar a ver
das comunidades representadas na construção dessas
apresentações museológicas. não objectos em si mas sim um tema ou
problemática antropológica, cujo conteúdo são sob a orientação de Jacques Hainard naquele
ideias ou reflexões não facilmente materiali- museu. Confrontandonum mesmo espaço -uma
záveis mas para as quais se quer remeter os vitrine ou uma secção da exposição - objectos
visitantes, novas estratégias expositivas têm etnográficos "clássicos" e objectos contemporâneos
que ser accionadas. De entre elas merece destaque ocidentais -por exemplo, latas de conserva ou
o recurso a múltiplos suportes expositivos através bonecas Barbie -,esta estratégia expositiva que
dos quais se tenta, nomeadamente, integrar na rompe com os cânones tradicionais da apre-
exposição outras dimensões sensitivas que não sentação museográfica mostra-se um instnimento
apenas as visuais mas também sensações tácteis, útil para equacionar o próprio estatuto do objecto
auditivas e mesmo olfactivas. Assim, para além de museu (Hainard, 1985). Através desta
dos objectos etnográficos aparecerem expostos confrontação e das interrogações que ela pode
de forma menos distanciada, possibilitando-se provocar - os objectos utilizados no dia a dia
muitas vezes o próprio contacto físico dos são ou não objectos etnográficos? e estes podem
visitantes com eles, a exposição temática tende ou não ser objectos quotidianos? ou os objectos
a conceder uma importância acrescida aos efeitos quotidianos são-no apenas quando entram num
de luz, cor e som, passando a incluir também museu? e quem decide da sua entrada? -tenta-se
diversos registos sonoros e de imagem. Por suscitar nos visitantes uma reflexão crítica não
outro lado, para atingir o objectivo desejado só sobre o significado relativo dos objectos mas
que é a explanação em termos expositivos do também sobre quem detém a autoridade para
tema seleccionado, estas inovadoras montagens determinar o seu significado. Em resumo, a
tendem também a utilizar de forma mais emergência da exposição temática e os esforços
alargada o texto escrito, não o limitando às envidados para a sua concretização acabam por
tradicionais legendas que de modo absolutamente promover uma outra inovação que é a extensão
unívoco e redutor identificavam e/ou descreviam da noção de objecto etnográfico e, concomitan-
sumariamente os artefactos expostos. Todos temente, da própria noção de museu etnográfico.
estes suportes expositivos constituem-se como Para além dos objectos de três dimensões, cuja
outros tantos meios que, em paralelo com os categoria foi ela própria alargada pela inclusão
de objectos contemporâneos ocidentais, as novas
artefactos, contribuem para que a exposição
instalações museográficas tendem a recorrer
materialize expositivamente o seu tema.
também a uma multiplicidade de outros suportes
expositivos através dos quais se tenta concretizar
Uma outra estratégia expositiva agora
o tratamento efectivo da respectiva temática.
adoptada é a exibição de objectos etnográficos,
i.e., dos clássicos artefactos exóticos, lado a lado
com objectos quotidianos da sociedade ocidental. Uma última inovação. que importa referir é a
Utilizado de forma sistemática pelo Musée nova concepção do museu como espaço de
dfEthnographiede Neuchâtel nas suas exposições realização de exposições temporárias sucessivas.
temporárias que surgem com a regularidade de Até sensivelmente aos anos 80, mesmo que o
uma por ano, este recurso expositivo tem sido, museu pudesse abrigar pontualmente alguma
desde 1982, um dos suportes fundamentais da exposição temporária, a sua actividade expositiva
"museologia reflexiva" (Clifford, 1985) realizada era concebida como traduzindo-se essencialmente
numa exposição permanente, através da qual se
consagrava em termos mais ou menos definitivos
uma noção de museu acabado (Hainard, 1985).
AMES, MICHAEL
Esta concepção do museu, ainda que os acervos 1991. Biculturalism in Exhibitions", Museum Anthro-
pudessem ir aumentando e a situação política, pologist, 15 (2), pp 7-15.
económica e social das culturas representadas
se fosse alterando, condenava-o a uma fixidez AMES, MICHAEL
expositiva que facilmente se transformava em 1992 Cannibal Tours and Glass Boxes: The
anacrónica, quer em relação às realidades etno- Anthropology of Museurns, Vancouver.
University of British Columbia Press.
gráficas quer relativamente às reformulações do
campo disciplinar. Através da realização de APPADURAI, ARJUN, ED.
exposições temporárias sucessivas o museu é 1986 The Social Life of Things: Commodities in
obrigado a um permanente trabalho de pesquisa Cultural Perspective, Cambndge, Carnbndge
e conceptualização museográfica que favorece a University Press.
sua constante actualização, quer em termos de
perspectivas teóricas quer em termos de ARNOLDI, M J.,
1992 "A Distorted Mirror: the Exhibition of the Herbert
estratégias expositivas. Além disso, pela concre- Ward Collection of Africana", in Museums and
tização sucessiva destas exposições o museu Communities: Debating Public Culture,
toma-se o espaço de um acontecimento que, Washington, Smithsonian Institute Press, pp 428-457.
repetindo-se regularmente no tempo, faz
aumentar o seu poder atractivo sobre os BAL, MIEKE
1992 "Telling, Showing, Showing off", Critical ínquiy,
visitantes, mostrando-se também capaz de
18, pp. 556-594.
promover e suscitar o debate e a reflexão dos
próprios antropólogos, assim como a crítica BARBER, LYNN
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