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0 MUSEUCOMO LUGARDE REPRESENTAÇÃO

DO OUTRO

Procedendo à historiografia do conhecimento antropológico é legítimo equacionarmos o grau de


associaçrio/dissociação entre a antropologia e os museus antropológicos, relacionando-o com os diferentes
mecanismos de objectivapio do saber a que a disciplina recorreu ao longo do seu desenvolvimento.
Centrando a nossa atenfão sobre as duas últimas décadas, neste artigo propomo-nos analisar o recente
moviniento de reaproximafão, verificado a partir do início dos anos 80,entre a antropologia e a instituição
museológica/prática museográfica, equacionando-o com as reformulações disciplinares contemporâneas.
Ou seja, relacionando-o com as ruptnras epistenlológicas e ideológicas contemporâneas e com o tipo de
conhecimento antropológico a elas subjacente.

While zoorking in historiography of the anthropological knowledge it appears as coherent to study the
level of association/dissociation between anthropology and anthropological museums, relating this level to
the different mechanisms ofobjectivation of knowledge which the discipline has bem utilizing during its
development. Focusing our attention on the tzoo last decades, this paper ainls to analize the recent
movement of approach of anthropology and the museological institution/museographic practice, zohich
took peace in the beginning of the 1980s, studying it together with the contemporary reformulations of
the discipline. Thus relating the approach movement to the epistemological and ideological contemporary
disruptures as weI1 as to the type ofanthropological knowledge they underlying.

A RENOVAÇÃO DOS ESTUDOS MUSEOL~GICOS socio-cultural, podendo ser apreendida como


NOS ANOS 80 uma entidade unitária cuja caracterização é
possível definir a partir de um conjunto unificado
Apesar das variações segundo os diferentes de princípios teórico-substantivos e metodoló-
contextos nacionais, com as suas influências gicos. Ao nível substantivo, ainda que no
intelectuais e institucionais particulares, e do período imediatamente a seguir à I1 Guerra
facto da disciplina antropológica resultar ela Mundial alguns antropólogos, sobretudo ameri-
própria de "uma imperfeita fusão de diferentes canos, tenham realizado as suas investigações
tradições de pesquisa: biológica, histórica, em terreno europeu, a "antropologia interna-
linguística, sociológica" (Stockùig, 1982: 172), cional", traduzindo o domínio da tradição
nas décadas de 50/60 do século XX a disciplina anglo-americana, tem como seu foco substantivo
tinha atingido uma substancial unidade quer o estudo do "Outro" extra-europeu. Ao nível
conceptual e ideológica quer metodológica, teórico-conceptual a unidade é detectável quer
patenteando aquilo a que G. S t o c h g (ibidem) no preterir das abordagens históricas quer na
chama a "emergência da antropologia interna- afirmação do valor de abordagens holísticas no
cional". Por esta altura, a disciplina antropológica estudo das entidades alvo do conhecimento
como um todo é dominada pela antropologia antropológico. Esta convergência teórica sobre-
põe-se às especificidades inerentes a cada uma aquela tendência inverte-se, passando a ser
das escolas coexistentes, abrangendo não só a detectável um movimento de reaproximação da
"antropologia social" britânica e a "antropologia antropologia aos museus e a cultura material.
cultural" americana, mas também o mais recente Deixando para mais tarde a identificação das
estruturalismo francês. Estreitamente relacionado rupturas teóricas e ideológicas subjacentes a tal
com estes posicionamentos teórico-substantivos, inflexão, importa por agora dar conta dos sinais
o trabalho de campo com observação participante de mudança que nos permitem perceber a sua
torna-se uma exigência metodológica generica- existência.
mente aceite e praticada pelos antropólogos. A
esta modalidade de investigação intensiva e Uma das manifestações mais evidentes
inter-subjectiva é atribuído um valor fundamental daquela tendência reaproximativa é o recente
quer para a formação do antropólogo quer para re-interesse patenteado pelos antropólogos aca-
a constituição do conhecimento antropológico, dérnicos relativamente a instituição museológica,
tornando-se o estilo de pesquisa identificador da o que contraria a partilha de competências mais
própria disciplina. Tendo como seu corolário o ou menos rígida entre antropólogos e museólogos
estudo monográfico, esta modalidade de pesquisa anteriormente existente (Duarte, 1997). Esse
contribui para a apreensão das sociedades como reinteresse desdobra-se em várias vertentes,
entidades isoladas e únicas que se identificam traduzindo-se uma delas no estudo do museu
pelas suas instituições e crenças particulares enquanto instituição social. Nesta perspectiva,
(Shelton, 1992). as actividades de colecta, conservação e exibição,
tradicionalmente atribuídas ao museu, são
equacionadas enquanto práticas culturais das
Esta caracterização, ainda que genérica, da
quais importa perceber as subjacentes mensagens
antropologia dos anos 50/60 permite-nos evi-
ideológicas, questionando-se quer a museologia
denciar o seguinte: o aparelho conceptual e em geral quer, mais especificamente, a mu-
metodológico emergente na antropologia dos seologia antropológica. Como exemplo deste
anos 20/30, não só se consolidou nas décadas tipo de abordagem, que traz os estudos do
seguintes, como se tomou mesmo o generica- museu para a área dos estudos socio-culturais,
mente identificador da disciplina como um podemos referir o trabalho de N. Merriman
todo. Nestas circunstâncias estavam criadas as (1989), ou os de P.Bourdieu (1984; 1991)' que,
condições para a manutenção, senão mesmo o partindo da análise da influência da classe
reforço, da dissociação da antropologia relativa- social, da educação e do habitus na formação do
mente aos museus e aos estudos de cultura "gosto artístico" e no comportamento dos
material como mostraram, em termos mais visitantes, acaba caracterizando o museu como
gerais, M. Strathern (1988) e, atendendo mais uma instituição social suportadora da ideologia
especificamente ao contexto britânico, A. capitalista. No mesmo sentido mas equacionando
Shelton (1992). A ratificação dos pressupostos o papel dos museus na glorificação do colonia-
epistemológicos e metodológicos sancionadores lismo é de referir o artigo de E. Hooper-
de tal tendência dissociativa permitiu que ela se -Greenhill(1989) e o texto de T. Bemet (1995).
mantivesse, de facto, sensivelmente até à década
'Ainda que estes ilustrem uma abordagem mais
de 70. A partir do início dos anos 80, no entanto, especificamente sociológica.
Desmultiplicando esta nova linha de abor- particulares (van Keuren, 1989, para a Inglaterra;
dagem, as actividades do museu tornam-se Orosz, 1990, para os Estados Unidos; Harms,
cada vez mais o alvo de análises críticas 1990, para a Alemanha; Dias, 1991, para a
produzidas por antropólogos académicos. Sobre França), quer trabalhos cujo âmbito de análise é
a prática expositiva do museu é assinalável o mais alargado, proporcionando um enqua-
t
número crescente de trabalhos que, realizando dramento genérico do desenvolvimento dos
detalhadas desconstruções de exposições museoló- museus com a história passada da disciplina
!
gicas concretas, das suas montagens e respectivos antropológica (Barber, 1980; Lurie, 1981; Home,
catálogos, debatem e questionam os aspectos 1984; Stocking, 1985 e 1987). Em continuidade
ideológicos e políticos implicados nos modos de com esta linha de abordagem, mas levando-a
representação accionados no museu (Jordanova, mais longe, surgem ainda trabalhos que,
1989; Clifford, 1991; Bouquet, 1991; Amoldi, associando uma profunda reflexão teórica à
1992; Bal, 1992). Igualmente assinalável é o história dos movimentos dos museus, focam de
número de pesquisas realizadas por antropólogos modo mais específico as implicações ideológicas
sobre as práticas de colecta da instituição da "antropologia dos museus". O ponto central
museológica. Podem-se referir quer trabalhos destas reflexões é a relevância atribuída a
centrados no estudo da actividade de antigos consideração do contexto político nos estudos
colectores e/ou conservadores específicos históricos dos museus (Clifford, 1988; Ames,
(Jackins, 1985; Chapman, 1985; Mack, 1990), 1992).
quer estudos que, de uma forma mais crítica,
discutem as motivaqões dos antigos colectores Para além deste expressivo entusiasmo por
(Chfford, 1988; Thomas, 1989))quer ainda outros aquilo a que genericamente podemos chamar
que, em termos mais genéricos, questionam e os "estudos museológicos", nos anos 80, os
discutem o carácter, muitas vezes ilícito, das antropólogos acadérnicos manifestavam também
expedições de colecta efectuadas pelos museus um renovado interesse pelos estudos de cultura
no passado (Jamin, 1982; Cole, 1985). material. A revivificação desta área de estudos
traduz-se na emergência de "uma revitalizada
Uma outra das vertentes da atenção dispen- antropologia das coisas" (Appadurai, 1986: MII),
sada aos museus é o seu estudo em termos na qual o estudo dos artefactos em termos esté-
históricos. Dando-se conta de que a perspectiva ticos e/ou formais é substituído por inovadoras
museológica tinha sido negligenciada nos problemáticas de estudo. Em termos genéricos
estudos relativos à história da própria diciplina, tais inovações podem ser apresentadas do
um número cada vez maior de investigadores seguinte modo. Enquanto as anteriores pers-
antropólogos procede a historização da consti- pectivas de abordagem da cultura material
tuição e desenvolvimento dos museus de história partiam do pressuposto do valor intrínseco dos
natural e de antropologia, equacionando esses objectos, o que permitia atingirem-se avaliações
aspectos com momentos anteriores do desenvol- "objectivas" dos mesmos sem levar em linha de
vimento institucional e teóricô da antropologia. conta as respectivas mudanças de contexto; as
No interior desta linha de abordagem é possível novas perspectivas de abordagem enfatizam o
assinalar quer estudos mais especificamente carácter contingente e relativo, no tempo e no
centrados na análise de contextos nacionais espaço, do valor dos objectos, o que implica
passar-se a atribuir relevância teórica quer ao com instituições museológicas como acontece
estudo dos movimentos históricos dos objectos entre o Museu Pitt-Rivers e a Universidade de
(ou classes de objectos), quer a análise das Oxford, cuja Licenciatura em Antropologia
contingências históricas, políticas e ideológicas, contempla uma variante em Museologia. Quer
implicadas na sua avaliação e interpretação. Em se trate de cursos de licenciatura ou de pós-
função desta alteração de perspectiva, os estudos graduação, o quadro institucional da sua criação,
de cultura material orientam-se no sentido de assim como os respectivos programas curriculares
uma nova história social dos artefactos, deslo- e conjunto de docentes que os leccionam, reme-
cando o seu interesse para tratamentos mais tem de modo inequívoco para uma proximidade,
teóricos. Entre a literatura antropológica surgida antes inexistente, entre aquelas duas áreas de
a partir dos anos 80 é possível assinalar trabalhos estudo.
centrados quer no debate das qualidades objecti-
vas detidas ou não pelos objectos (Hodder, 1989; Por outro lado, a própria actividade expositiva
Tilley, 1990; Handler, 1992), quer na análise da dos museus, antes não merecedora de qualquer
produção e utilização de objectos enquanto atenção por parte dos antropólogos académicos
emblemas de classe ou de identidade nacional e e nesse sentido relegada enquanto alvo de
étnica (Trevor-Roper, 1983; Handler, 1985). reflexão antropológica, alcança agora legitimação
Enquadrando-se na problemática geral do estudo académica. Publicações antropológicas especia-
das mudanças do estatuto, do valor e das lizada~,como as revistas American Anthropologisf,
interpretações dos objectos, surgem também Gradhiva ou Tewain, passam a incluir nos seus
trabalhos que exploram os aspectos da números secções dedicadas a recensão de
"descontextualização" ou "recontextualiza~ão" exposições concretas, realizadas pelos mais
e "mercadorização" (commoditization) dos diversos museus nacionais e estrangeiros.2
objectos (Appadurai, 1986; Hinsley, 1991;
Thomas, 1991), assim como diversos outros Perante o conjunto de ocorrências e inflexões
reconstituindo biografias culturais de artefactos acabadas de relatar, parece-nos indiscutível a
(Appadurai, 1986; Kopytoff, 1986). constatacão da inversão, sensivelmente a partir
dos anos 80, da anterior tendência dissociativa
Para além da existência de uma abundante.
da antropologia relativamente aos museus e a
e sempre crescente, literatura antropológica
cultura material. Partindo dessa constatação o
versando diversos temas relacionados com a
nosso objectivo central é, então, identificar e
instituição museológica e o estudo dos artefactos,
aquela tendência reaproximativa da antropologia explicitar as linhas de ruptura, epistemológicas
dos anos 80 manifesta-se também ao nível da e ideológicas, subjacentes a tal inversão. Podemos
própria instituição académica. Uma evidência desde já adiantar que a clarificação dos factores
sintomática desse facto é a criação, na univer- que contribuem para movimento
sidade e nos departamentos de antropologia, de rea~roximativO a de
"museum studies", como aliás pode ser ilustrado
pelo próprio panorama académico português. 2Ainda que náo perseguindo exactamente os mesmos
objectivos não deixa de ser sintomático que a própria
Outra é facto revista ANTROPO-, em que agora escrevemos, tenha
sitários passarem a manter estreitas ligações uma secção intitulada Apresentnçco de um Museu.
transformações ocorridas em arnbas as entidades, as tradicionais estruturas técnico-económicas, o
assim como das suas interferências mútuas. Por que por si só não pode deixar de implicar
uma questão de comodidade expositiva, no transformações múltiplas também nas restantes
entanto, dessa mistura de factores abordaremos estruturas socio-culturais.
em primeiro lugar aqueles cujas repercussões
mais directamente se fizeram sentir ao nível do
campo antropológico. Para o que aqui nos interessa podemos
resumir sinteticamente os efeitos da descoloni-
zação a alguns aspectos. Em primeiro lugar, dado
que as relações de poder foram completamente
alteradas, no contexto pós-colonial passa a
haver mais restrições ou maiores dificuldades
Iniciando a análise desses factores importa de acesso aos terrenos empíricos tradicionais da
referenciar as alterações do panorama político- investigação antropológica. Em segundo lugar,
social e ideológico mundial ocorridas com o de uma forma relativamente brusca, emergem
fenómeno da descolonização. O domínio colonial unidades nacionais que poderíamos designar
europeu, que se tinha mantido por longos anos por "sociedades mistas", i.e., países onde lado a
e até reforçado com especial vigor no período lado passam a coexistir elementos organizativos
de afirmação da "antropologia internacional" e socio-culturais característicos das "sociedades
antes caracterizada, entra rapidamente em total modernas" e das "sociedades tradicionais", sem
ruptura. Independentemente de em muitos que o conjunto obtido seja, no entanto, idêntico
casos ele ter sido substituído por situaqões de aos modelos anteriormente conhecidos de cada
neo-colonialismo económico, o facto é que a uma delas. É a emergência do Terceiro Mundo
independência política das ex-colónias europeias e dos "países em vias de desenvolvimento". Em
implicou alterações significativas nas relações terceiro lugar e consequentemente, os "povos
entre os países ocidentais, donde eram originários primitivos" ou "povos tribais" como tal anterior-
os antropólogos, e as sociedades que tradicio- .mente definidos desaparecem, surgindo esses
nalmente se tinham constituído como o seu grupos incorporados em novas unidades
objecto de estudo. Além disso, a descolonização políticas. Por fim, poucos anos depois da
trouxe também grandes transformações nas independência daquelas novas nações, a Europa
próprias condições socio-culturais, económicas que até aí se tinha mantido essencialmente como
e políticas dos territórios agora independentes. centro de emigração passa a lugar de destino de
Por um lado, os anteriores "povos tribais" surgem imigrantes vindos das suas ex-colónias.
agora incorporados em Estados-nação que se
esforçam - mau grado a existência de tensões Se, como Geertz (1983), aceitarmos que a
e lutas internas, ou por isso mesmo - por disciplina antropológica é uma "instituição
construir e desenvolver identidades nacionais cultural", i.e., uma entidade fatalmente situada
unificadas. Por outro, na tentativa de se libertarem num tempo e num espaço, facilmente somos
da dependência económica herdada do regime levados a reconhecer a inevitabilidade daquelas
colonial, estes novos países procuram alterar novas realidades influírem nos desenvolvimentos
posteriores da disciplina. Ao nível da definição secundarizadas e sem participação directa na
do objecto de estudo deixa de ser "( ...) realista, cena internacional, com o fim do colonialismo a
sequer normativamente, olhar a recuperação do conjuntura política e económica mundial passa
puro, da incontaminada aalteridade)) não- a ter que contar com um número considerável
-europeia como o foco substantivo privilegiado de novos intervenientes. Simultaneamente, o
da investigação antropológica." (Stoclung, 1982: reposicionamento das relações de poder entre
176). Perante esta nova situação, que alguns as nações conduz à extinção das anteriores
(Fabian, 1983; Clifford, 1986) designam como zonas de influência exclusiva de alguns países
"a crise do objecto de estudo", a disciplina sobre outros e ao crescimento, em diversidade e
movimenta-se no sentido do alargamento desse complexidade, das relações entre os diversos
objecto que passa agora a englobar também o Estados. Além disso, as rápidas transformações
estudo das sociedades complexas. Este alarga- socio-culturais e económicas porque passam as
mento não significou, obviamente, a exclusão nações recém-independentes vêm demonstrar o
do anterior objecto de estudo e mesmo na quanto a sua "imobilidade" anterior era condi-
antropologia "at home", dado o facto das cionada pela sua situação de colónias.
sociedades ocidentais terem passado a incluir
como suas partes componentes minorias étnico- O facto de todas estas mudanças e suas
-culturais não-europeias, o interesse por esse múltiplas consequências, nacionais e internacionais,
"Outro" pôde manter-se. Para além, no entanto, terem sido desencadeadas por um único fenó-
da possibilidade dos antropólogos realizarem meno, que foi o processo de descolonização,
as suas investigações centrando-as ou não no obriga como que ao confronto com a evidência
estudo do "Outro" extra-europeu, o que aquela de que entre o local e o global, assim como entre o
ampliação do objecto de estudo claramente presente e o passado, as interdependências são
facilita é uma percepção mais abrangente e múltiplas e relevantes. Neste sentido, a descolo-
menos isolada das sociedades e dos fenómenos nização ela própria contribuiu para a emergência
socio-culturais. Ou seja, a nova abrangência do de uma nova percepção dos fenómenos socio-
objecto de estudo favorece a emergência de culturais que, ao implicar a adopção de novas
uma nova noção de globalidade que, extravasando perspectivas de abordagem, gerará um movimento
a anterior concepção atomista e compartirnentada de reorientação teórico-conceptualna disciplina
das sociedades, ou tipos de sociedade, remete antropológica. Ou seja, o entendimento de que
agora para as intrincadas articulações entre o é necessário atender às múltiplas, dinâmicas e
local e o global ao nível do planeta. Por outro complexas relações existentes entre as sociedades,
lado, em concomitância com o alargamento acaba por desencadear a ruptura do quadro
substantivo, a própria realidade mundial pós- teórico estnituro-funcionaliçta.
colonização facilita a percepção da interde-
pendência dos fenómenos que afectam as O quadro teóricoconceptual até aí dominante
diferentes sociedades e que é aliás traduzida assentava no primado das estruturas, sociais ou
pelo novo conceito de globalização. Se até aí a mentais, vistas como constrangedoras dos
vigência do sistema colonial tinha permitido comportamentos individuais e elegia, portanto,
manter extensas áreas do globo como que a identificação e a explicação do funcionamento
dessas estruturas como o seu objectivo primordial. agentes sociais que interagem entre si, constran-
O seu carácter exclusivamente sincrónico e o gidos agora pelas redes de relações sociais em
facto das práticas e simbolizações sociais, mesmo que participam. Tal redefinição teórico-conceptual
que variáveis, serem apreendidas em todos os traduz-se na adopção de novas perspectivas de
casos como reproduções das estáveis estruturas abordagem dos fenómenos socio-culturais,
>i
sociais3 tem como seu reverso, por um lado, a conduzindo uma delas aquilo a que podemos
não concessão de pertinência epistemológica a chamar a reabilitaçiio da diacronia como instrumento
I
análise das possíveis mudanças ou transformações de saber antropológico. -Conceber a acção dos
do sistema social e, por outro, a apreensão da actores sociais como potencialmente geradora de
realidade socio-cultural como uma realidade mudanças sociais implica percepcionar os
fechada sobre si mesma. Dito de outro modo, a sistemas sociais como entidades essencialmente
adopção do quadro teórico estruturo-funcio- dinâmicas e em constante transformação, em
nalista tinha conduzido a uma concepção dos relação aos quais uma perspectiva exclusivamente
sistemas sociais vistos essencialmente como sincrónica de abordagem só pode ser redutora e
estáticos e a sua apreensão como entidades insuficiente. A consideração da dimensão temporal
auto-suficientes aos quais era possível aceder surge, portanto, como necessária para que se
através do conhecimento isolado da sua respectiva possa aceder a uma realidade apreendida
cultura. essencialmente como dinâmica. Por outro lado,
conceder relevância teórica a interacção dos
Em termos genéricos4 e para o que aqui nos agentes sociais implica também apreender os
interessa, que é a identificação dos factores fenómenos sociais como não-redutíveis a
que contribuíram para a reaproximação da quaisquer estruturas formais em função das
antropologia aos museus, a ruptura teórico- quais os seus significados seriam revelados. Se
conceptual operada nos anos 60 assenta na a sociedade é concebida como uma rede
inversão de um pressuposto fundamental: entre complexa de sub-sistemas que mantêm entre si
o social e o individual há uma interdependência relações mais ou menos fluidas e em constante
constante. Ou seja, embora os comportamentos mobilidade, a explicitação e compreensão dos
dos actores sociais sejam condicionados por fenómenos sociais só pode ser atingida pela
determinações sociais, as suas acções passam a elucidação do sentido daquelas relações e daquela
ser percebidas como capazes de provocar mobilidade. Ou seja, a inteligibilidade dos
transformações e mudanças no sistema social. fenómenos sociais, dado o seu carácter irninente-
O quadro teórico-conceptual emergente passa a mente dinâmico, depende da elucidação dos
explicar a produção do social pela acção dos contextos ideológicos e políticos que enquadram
e/ou desde há tempos vêm enquadrando a
3 No caso específico do modelo teórico estruturalista, elas acção dos agentes sociais. Concluindo, a ruptura
remeteriam para as eshuturas mentais do pensamento do quadro teórico estruturo-funcionalista
humano, mas tal diferença para a questão em análise não é
significativa. traduz-se, por um lado, na reinserção da
4 Isto é, náo atendendo às especificidades de cada um dos importância da história e, por outro, no
modelos teóricos surgidos depois dos anos 60, cuja surgimento de problemáticas que concedem
proliferação é aliás significativa: dinamista, interaccionista,
interpretativista, pós-estruturalista, pós-modemo... especial atenção aos condicionalismos ideológicos
e políticos. Passamos, portanto, a estar em participante reorientando-a para a análise de
presença daquilo a que G. Stocking refere como uma série de "casos" ligados uns aos outros e,
a mudança do quadro teórico da antropologia portanto, processados na mesma área da vida
"(...)em direcção a problemas mais sociológicos social, tem subjacente a substituição da anterior
e históricos." (1982: 177). observação de uma "sociedade" pelo estudo de
um "campo social" concreto, assim como a
Por definição dependentes das opções substituição das anteriores descrições mono-
teórico-conceptuais, as posições metodológicas gráficas, incapazes de dar conta dos dinamismos
não podem deixar de sofrer reajustamentos por sociais, pela análise dos processos sociais que se
forma a que em termos de investigação concreta desenvolvem no tempo.
aquelas novas problemáticas possam ser equa-
cionadas. Para além do recurso a fontes escritas Ao longo dos últimos parágrafos tentamos
que o próprio alargamento substantivo possibilita dar conta das alterações substantivas, teóricas e
e da exploração de diversos materiais históricos, metodológicas ocorridas na disciplina antropo-
incluindo por vezes a re-análise de anteriores lógica nos anos imediatamente posteriores ao
colectas etnográficas, a concessão de importância processo de descolonização, relacionando aliás
a dimensão temporal implica a introdução de essas alterações com este fenómeno político.
algumas modificações na própria prática da Acontece, porém, que nem as reformulações
observação participante. Segundo a fórmula internas da disciplina se resumem àqueles
tornada clássica desde B. Malinowski, a aspectos nem os efeitos da descolonização se
observação participante assentava de modo reduzem às transformações socio-políticas e
exclusivo na abordagem sincrónica pelo que, económicas referidas. Para lá destas mudanças,
suprimindo o factor tempo, impossibilitava a sem dúvida significativas e favorecedoras das
análise dos processos evolutivos e conduzia a redefinições teóricas e metodológicas antes
construção de um modelo geral identificativo enunciadas, é necessário atendermos também
da cultura e da sociedade. Designando esta ao novo contexto intelectual e ideológico que,
modalidade de exercício da observação partici- activado pelos acontecimentos pós-coloniais,
pante por "método da ilustração adequada", M. conduzirá pelo final dos anos 70 a uma ruptura
Gluckman (1959 e 1963)propõe a sua substituição epistemológica. Incrementada por urna profunda
pelo "método de casos", consistindo este na reflexão sobre os próprios fundamentos do
consideração d e uma série de incidentes conhecimento científico, essa ruptura traduzir-se-à
específicos que afectem as mesmas pessoas na ultrapassagem do paradigma positivista.
e/ou os mesmos grupos durante um longo
período de tempo. Deste modo seria possível Caracterizado por uma posição fortemente
verificar de que forma aqueles incidentes estão crítica em relação ao colonialismo, o novo
ligados ao desenvolvimento e a mudança das contexto ideológico e intelectual promove na
relações sociais entre essas pessoas e/ou grupos, disciplina uma ampla auto-reflexão centrada na
inserindo a análise de tais transformações no discussão do papel da antropologia enquanto
quadro do seu respectivo sistema socio-cultural. suporte ideológico do sistema colonial. Embora
Esta modificação no exercício da observação a discussão não seja pacífica nem o sentido das
suas conclusões unanime? o que surge como que designamos como renbilitnçiio da dincronin, a
inegável da controvérsia gerada é uma reavaliação reinserção da história e, por outro, o equacio-
profunda das posições teórico-conceptuais até namento atento dos condicionaliçmos ideológicos
aí dominantes, sobretudo ao nível das suas e políticos. Mas com este novo contexto intelectual
implicações ideológicas e epistemológicas. impõe-se a consideração dos processos históricos
A
Percebendo, ou não, o anterior quadro teórico- e seus correlativos campos de forças ideológicas
conceptual da disciplina, sobretudo o modelo não apenas para que desse modo se possa
funcionalista, como "( ...) o contraforte ideológico alcançar um conhecimento mais válido dos
de um colonialismo maduro (...)" (Stocking, fenómenos sociais, dando conta do seu carácter
1982: 176), o que genericamente se passa a dinâmico e do sentido desse dinamismo, mas
reconhecer é que o anterior tratamento das também porque a consideração daqueles factores
"sociedades tribais" como entidades isoladas e surge como fundamental para que se possa
passivas em relação ao processo histórico apreender as influências históricas e ideológicas
mundial, sendo um tratamento reducionista foi que condicionam a própria produção do saber
ele próprio condicionado pela situação colonial. antropológico. Ou seja, na antropologia dos
Ou seja, desta discussão interna resulta sobretudo anos 70 a reabilitação da diacronia tem subjacente
uma maior auto-consciência de que o conhe- o reconhecimento da importância da história
cimento antropológico é, também ele, um quer como processo quer como modo de
produto historicamente condicionado, cujas conhecimento antropológico. A reacção contra
orientações problemáticas dependem de influ-
o sincronismo estruturo-funcionalista é acompaG
ências históricas e ideológicas específicas. nhada por uma nova postura epistemológica,
verificando-se para além da superação dos
Invertendo o ângulo de análise podemos
anteriores modelos teóricos a emergência de
perceber o quanto este novo contexto intelectual um paradigma pós-positivista na antropologia.
reforça o sentido das reformulações teóricas
antes enunciadas: por um lado e implicando o

Veja-se, por exemplo, a diferença significativa entre G.


Stocking (1982 e 1985) e 1. Clifford (1986 e 1988). Enquanto
primeiro lamenta que o "humanismo crítico d o «espírito
antropológico»" (1982:176), antes usado sem controvérsia e
eficazmente, por exemplo, na luta contra o Nazismo, seja
agora percebido como uma "espécie de neo-racismo Nas décadas de 70 e 80, as preocupações
justificador d o atrasado estádio tecno-económico dos povos epistemológicas que atravessam várias áreas
colonizados" (ibidem: 177), e atribui tal bouleuerseinent disciplinares surgem unidas por uma crítica
ideológico à a m b i ~ ã od e uns tantos antropólogos marginais
que se arrogam o papel d e mediadores "entre a cultura geral ao cientismo positivista. A tendência é
dominante na qual tinham sido produzidos e os dominados agora de reacção contra a concepção da actividade
que por profissão escolheram identificar" (ibidem); o científica como absolutamente objectiva (Ong,
segundo, pelo contrário, não só aceita como indesmentível
que a antropologia suportou as relações d e poder 1982; Levine, 1993), i.e., como uma actividade
estabelecidas pelo colonialismo como também, e por isso completamente desinteressada e desligada da
mesmo, fala repetidamente d o actual "sentimento d e crise realidade histórica e social em que é produzida.
d e consciência" (Clifford, 1986: 36) que não pode deixar d e
assolar a disciplina. AO considerar os "factos" como "naturais", não
questionando portanto o seu carácter de factos possibilidade de descrever a realidade enquanto
e vendo-os como intemporais, o discurso científico tal. Qualquer descrição socio-cultural, ainda que
positivista usou a "objectividade" para naturalizar proveniente da observação participante, não é
o que era socialmente construído. A objectividade senão uma representação/interpretação da
não é uma categoria absoluta e universal; ela realidade, enquadrada pela ponto de vista do
varia em função dos diferentes momentos antropólogo e pela tradição teórica em que ele
históricos, dos diferentes campos disciplinares se insere.
e, dentro destes, segundo as respectivas formu-
lações dos objectos de estudo, sendo necessário
O abandono da ideia de que os relatos
portanto considerá-la como uma categoria
etnográficos são dados objectivos tem como seu
historicamente situada. A actividade científica
reverso a preocupação com os modos de
não é conduzida por uma lógica pura e absoluta,
sendo antes modelada pela situação económica, representação do conhecimento antropológico.
social e política do contexto cultural em que Este, como o de qualquer outra área disciplinar,
está inserida. Em resumo, porque faz parte de é um conhecimento implacavelmente datado,
um determinado quadro cultural, a ciência é em relação ao qual importa, portanto, perceber
uma produção cultural que como tal participa e/ou denunciar os seus fitos ideológicos. Se até
na construção e veicula visões da sua época. C. Geertz podíamos identificar a antropologia
como o estudo do Outro, com a perspectiva
Reproduzindo o sentido destas preocupações interpretativa ela tende a focalizar-se na
epistemológicas, na disciplina antropológica o interpretação das representações do Outro, sendo
modelo do cientismo positivista é questionado essa tendência levada ao seu extremo pelo
a partir do final dos anos 70, essencialmente movimento pós-modemo. Este, como última
através das correntes interpretativas pós-estru- etapa das antropologias interpretativas, centrará
turalistas. Simplificando, podemos afirmar que os seus esforços na análise dos aspectos discur-
até C. Geertz (1973) o conhecimento antropológico sivos da representação cultural elaborada pela
era concebido como reprodução do mundo antropologia. P. Rabinow a propósito de um
observado, descreve~doa realidade socio-cultural dos antropólogos mais representativos desta
enquanto tal. Ainda que depois dos anos 20/30 corrente pós-modema afirma: "O Outro, para
os artefactos tivessem deixado de ser os "factos" Clifford, não é mais do que uma representação
por excelência da pesquisa antropológica antropológica." (Rabinow, 1985: 94). Ou seja,
(Strathem, 1988), os antropólogos continuavam através da sua "meta-antropologia textualista"
a atribuir aos dados resultantes da observação (ibidem: 95) o que J. Clifford faz é analisar as
participante o estatuto de factos objectivos e interpretações que os Outros-antropólogos
infemporais que reproduziam apenas e tão só o elaboram sobre a realidade e as representações
real. Os esforços metodológicos iam no sentido dos Outros-nativos.
da recolha desses factos empíricos, tidos como a
base segura e verdadeira da objectividade do Não prestando atenção aos radicalismos de
saber antropológico. Com a corrente interpre- autores como Stephan Tyler (1986) que procla-
tativa instaura-se o cepticismo quanto a mando a caducidade da ciência em geral propõe
uma epistemologia irracionalista, e ultrapassando da observação dos seus objectos; depois, através
as contribuições de antropólogos como Vincent de informações recolhidas visualmente durante
Crapanzano (1980) ou Paul Rabinow (1977) que o exercício da observação participante. A
centrando-se na redefinição da praxis antropo- institucionalização do trabalho de campo inten-
lógica propõem o exercício de uma nova sivo origina uma representação etnográfica - a
A "etnografia experimental", podemos caracterizar monografia - cujas categorias analíticas são
a antropologia pós-modema como uma corrente elas próprias fundamentadas na visão e em
centrada sobretudo na análise crítica dos modos metáforas visuais (Clifford, 1988).O antropólogo
de representação do conhecimento antropológico.6 procura legitimar cientificamente as suas
Realizando uma profunda crítica - ou na sua formulações pela demonstração inequívoca de
própria terminologia uma "desconstrução" -dos que "esteve ali" (Geertz, 1983), i.e., porque pôde
recursos retóricos e "autoritários" da etnografia observar itz loco aquilo de que fala as suas
convencional e do discurso antropológico em interpretações são objectivas. Radicando na
geral, esta "antropologia da antropologia", como tradição positivista que estabelece uma correspon-
por vezes é designada, promove uma maior dência directa entre o observado e o verbalizado,
consciencialização do caracter socialmente cons- i.e., uma adequação total e completa entre a
truído e parcial do conhecimento antropológico. linguagem que verbaliza a realidade observada
Nem a cultura é um corpo unificado de símbolos e essa realidade, aquela eleição da observação
e significados a que possamos atribuir uma como o instrumento metodológico essencial da
significação definitiva, nem as interpretações objectivação do conhecimento antropológico
sobre ela elaboradas pelos antropólogos são deu origem ao "realismo etnográfico" (Marcus
"completas" e muito menos neutras (Clifford, e Cushman, 1982).Caracterizado pela utilização
1986). No processo de construção do conheci- do presente do indicativo - o presente
mento antropológico participam também factores etnográfico - o género de escrita realista é
políticos, sociais e históricos dos quais importa detectável quer em descrições textuais como as
perceber as implicações ideológicas e políticas. monografias, quer em descrições não-textuais
como-as etiquetas dos museus. Para além de
No prosseguimento das reflexões abertas por
implicarem uma concepção da realidade como
J. Fabian (1983), a desconstrução dos modos de
uma realidade vista e reproduzida tal qual é,
representação do conhecimento antropológico
essas descrições realistas suspendem a dimensão
permitiu também evidenciar o quanto a base
histórica, fazendo surgir as sociedades a que se
epistemológica do paradigma positivista assentava
referem como suspensas no tempo. Seguindo
numa lógica visual. Reproduzindo o modelo
de perto a teoria construtivista de R. Rorty
das ciências naturais, a disciplina antropológica
(1979) que questiona a capacidade de descrever
desde sempre tinha enfatizado a visualização
o real e defende a necessidade de abandonar a
como o elemento essencial para a aquisição do
tradição filosófica ocidental que associou estreita-
conhecimento sobre o Outro: primeiro, através
mente linguagem e realidade, o movimento
pós-modemo promove uma critica ao modelo
hComo principais representantes desta orientação pós- visualista da antropologia. Para os construtivistas
modema podemos referir James Clifford, George Marcus,
Manlyn Strathem e Michel Fischer, entre outros. as descrições são sempre representações da
realidade: descrevemos não o real mas as disciplina antropológica pretendemos explicitar
representações que temos dele, sendo que a o conjunto de reformulações internas que,
descrição é ela própria da ordem da repre- processando-se na disciplina ao longo de duas
sentação. Dado o caracter metafórico. e décadas, possibilitaram nos anos 80 a sua
convencional da linguagem, as descrições por reaproximação a instituição museológica e às
ela produzidas têm uma natureza arbitrária colecções. Num tempo caracterizado pela
(ibidem: 368), e elas reproduzem não a realidade revalorização do político e da epistemologia,
mas antes o modo como pensamos essa realidade. em que a disciplina se vê envolvida por uma
Assim sendo, "os textos etnográficos são inevi- constante teorização sobre as limitações do seu
tavelmente alegóricos (...)." (Clifford, 1986: 153), próprio saber, o interesse pelos museus é uma
ou seja, os antropólogos escrevem sobre culturas das resultantes daquele novo quadro epistemo-
mas não as retratam. "A alegoria faz-nos afirmar lógico e ideológico dominado, agora, pela
que qualquer descrição cultural não representa problemática interpretativa. Ou seja, nos anos
isto ou aquilo mas que se trata de «uma história 80 a atenção dos antropólogos dirige-se para o
acerca disso...n." (ibidem: 155). Museu porque ele emerge, agora, como lugar
de representação do Outro, onde é possível
Em síntese, na disciplina antropológica a descortinar momentos da própria história do
desconstrução do paradigma positivista tradu- desenvolvimento da antropologia. Çendo uma
ziu-se no questionar quer do holismo quer da instituição cultural ocidental, a história das suas
neutralidade do conhecimento por ela produzido. actividades e colecções "( ...) é central para uma
Ao reconhecer o carácter socialmente construído compreensão de como aqueles grupos sociais
e historicamente situado desse conhecimento, que inventaram a antropologia se apropriaram
assim como a impossibilidade das descrições de coisas, factos e significações exóticas."
culturais reproduzirem a realidade sociocultural (Clifford, 1985: 240). Atingimos assim o ponto
tal qual ela é, o novo quadro epistemológico e fulcral da nossa análise: a recente reaproximação
ideológico da antropologia reconhece também o da antropologia aos museus. Nos anos 80,
caracter não universal e não neutro em absoluto estando o quadro teórico e epistemológico
do saber que produz. Aquilo que em determinado orientado para a consideração dos contextos
momento é apresentado como uma "totalidade", históricos e políticos reconhecidos como condi-
para além de ser uma interpretação - e não cionadores das representações antropológicas
uma reprodução - do real, tem sempre também produzidas, a aproximação aos museus radica
um caracter fragmentário. Para reduzir estas na intenção de proceder à análise das noqões
limitações a única via possível parece ser levar teóricas e/ou mensagens ideológicas que foram
em consideração os contextos históricos, políticos e são dadas a ver através das suas colecções e
e ideológicos em que tal conhecimento é exposições, assim como pensar e pôr em questão
produzido, não descurando os aspectos intema- o próprio mundo contemporâneo. Dito de outro
listas do próprio desenvolvimento disciplinar. modo, o reinteresse pela instituição museológica
assenta na percepção de que "( ...) todos os
Com a análise do impacto da descolonização museus são exercícios de classificação" (Jordanova,
e da ruptura do paradigma positivista na 1989: 23) nos quais, portanto, não são apenas os
O Museu como Lugar ...

objectos em si que comunicam significado, mas crítica exactamente porque é entendida como
tàmbém e sobretudo o ordenamento e arranjos uma actividade implacavelmente datada e
.impostos a esses objectos. Porque são "casas pertencente a uma época. Ao museu e as suas
classificadoras" (ibidem), aquilo que os museus práticas não pode ser concedido o privilégio da
mostram é altamente selectivo e os objectos neutralidade e/ou da universalidade porquanto
conservados e exibidos, longe de serem "factos" o que nele se pode ver são representações/inter-
objectivos, são antes suportes de grupos de pretações.
ideias que através deles se transmitem.
Paralelamente a este quadro pós-positivista
Esclarecido este ponto, percebemos agora que orienta a atenção crítica dos antropólogos
mais claramente o sentido e o intuito das reflexões para a desconstrução dos "sub-textos" produ-
antropológicas produzidas sobre os museus e a zidos pelo museu, também o quadro político e
cultura material, referidas na primeira parte deste ideológico pós-colonial estabelece um novo
artigo. Encarando o museu como uma instituição contexto de discussão das actividades da
cultural, as suas práticas expositivas podem ser instituição museológica. Para além da maior
olhadas como constru~õesde histórias, como consciência política e ética das implicações do
narrativas que longe de serem neutras são antes seu trabalho por parte dos antropólogos em
condicionadas pelos contextos político e ideoló- resultado da crítica geral ao colonialismo que
gico em que estão inseridas. "A exposição é um envolve a disciplina, o desenvolvimento das
acto político. O patrocínio é um acto político. A nações "subdesenvolvidas" e a maior capacidade
curadoria é um acto político. Trabalhar num de auto-afirmação dos grupos étnicos obrigam
museu é um acto político." (Ames, 1991: 13). a reequacionar algumas práticas daquela insti-
Suportadas por uma posição fortemente crítica tuição, estendendo-se a actual crítica à própria
em relação ao sistema colonial, assim como forma de designar os objectos que é discutida e
ao papel da antropologia enquanto suporte alterada. As relações tradicionalmente estabe-
ideológico das relações de dominação daí lecidas no museu entre os objectos e as culturas
resultantes, as recentes reflexões antropológicas que eles dariam a ver, para além de toda a
sobre os museus interessam-se sobretudo pelos discussão em tomo do seu carácter fragmentário
"sub-textos" (Vergo, 1989: 3), que compreendem e do tipo de representações assim produzidas,
por vezes mensagens contraditórias, subjacentes são questionadas também pelo facto de através
a todas as actividades da instituição: colecta, delas esses Outros surgirem como que suspensos
conservação e exibição de artefactos. Ao realizar no tempo, segregados da história mundial sem
essas múltiplas tarefas o museu efectua escolhas se equacionar as relações de poder a que
que são julgamentos de valor, não exclusivamente estiveram submetidos. Reequacionados também
determinados pelas tecnologias museológicas, em termos políticos, os museus são agora olhados
mas também por opções ideológicas e políticas como instituições que senão legitimaram pelo
de que importa, portanto, rtão só perceber o menos beneficiaram do sistema colonial. Do
sentido mas também as implicações. Dito de debate assim gerado um dos pontos mais
outro modo, a apresentação museográfica é, controversos é a acusação de expropriação
agora, assunto merecedor de extensa atenção cultural genericamente praticada no passado
por todos os museus, já que a esmagadora porquanto são olhadas como construções veicula-
maioria dos artefactos que detêm foram obtidos doras de imagens do Outro extra-europeu de
por meios que hoje seriam, no mínimo, que importa desconstmir as subjacentes noções
considerados ilícitos: "( ...) os museus não só teóricas e mensagens ideológicas. Entretanto,
representaram mal (misrepresented) as outras um outro conjunto de factores suporta também
culturas, como também as oprimiram e roubaram aquela reaproximação entre antropologia e
(...)." (Handler, 1985: 193). Apoiados nesta museus. O reinteresse dos antropólogos pela
acusaqão de imperialismo cultural alguns grupos apresentação e colecções museológicas, assim
étnicos auto-conscientes da sua identidade como o teor das suas reflexões, conduz os
cultural têm posto em causa a legitimidade da museólogos a uma maior auto-consciência das
posse pelos museus ocidentais de artefactos que implicações do seu trabalho. A percepção de
consideram sua propriedade cultural, como que um modo de apresentação expositiva implica
aconteceu em 1970 quando os Índios Onandaga um determinado tipo de conhecimento assim
reivindicaram ao New York State Museum a como determinadas opções ideológicas e políticas,
restituição de alguns dos seus objectos de culto. i.e., de que qualquer apresentação expositiva
nunca é neutra, conduz a que o próprio museu
Em conclusão e sinteticamente, podemos altere significativamente algumas das suas
afirmar que a reaproximação aos museus por práticas. Conscientes de que a selecção e o
parte da antropologia, nos anos 80, resulta quer modo de exposição de um objecto afecta a
da pertinência epistemológica agora concedida representação que construímos da cultura para
à desconstrução dos modos de representação que ele remete e o próprio tipo de conhecimento,
do conhecimento antropológico, quer do os museólogos introduzem inovações nas práticas
renovado interesse pelas implicações políticas museológicas que vão desde a consideração dos
dessas práticas representacionais. Para finalizar contextos políticos e dos problemas actuais do
a análise a que nos tínhamos proposto falta quotidiano do Terceiro Mundo até ao recurso a
apenas atender ao outro elemento do par novas tecnologias expositivas. Numa altura em
antropologia/museus, ou seja, as transformações que quer a posse física dos objectos etnográficos
ocorridas na própria instituição museológica e quer a representação das suas significações se
suas práticas. tomam alvo de atenção crítica, o movimento no
sentido da responsablização política das práticas
museológicas traduz-se, nomeadamente, no
passar a atender-se ao próprio processo histórico
da colecta e produção das colecções exibidas no
museu: "A história da colecta e da recontextua-
Reequacionando epistemológica e politica- lização dos objectos não-ocidentais é agora,
mente as actividades do museu, as reformulaqões idealmente, uma parte de qualquer exposição."
internas da antropologia dos anos 80 possibilitam (Clifford, 1985: 245). Através deste equacio-
e sustentam o movimento de reaproximação da narnento em termos expositivos das circunstâncias
disciplina à instituiqão museológica. As suas históricas da constituição das colecções, os
práticas passam a ser merecedoras de atenção museólogos não só se propõem o tratamento de
questões políticas que remetem inevitavelmente entre pessoas com conhecimento sobre práticas
para a análise das relações de poder estabelecidas museológicas e aquelas com conhecimento sobre
durante o período colonial, como reconhecem assuntos culturais." (1995: 336) como uma das
também o caracter construído e historicamente alterações que urge generalizar. Como via
situado das representações culturais que elaboram. alternativa refere as "exposições pós-modemas"
(ibidem) que, ao exporem intencionalmente
Esta nova postura teórica e ideológica dos fingidas realidades ou representações de repre-
responsáveis pelos museus e pelas exposições sentações, podem igualmente contribuir para a
suscita a adopção de outras inovações, tradu- renovação do papel do museu.
zindo-se uma delas no alargamento dos
comissariados das exposições. Estes passam a Mas a problemática e a atenção dispensada
ser constituídos por equipas pluridisciplinares aos modos de representação e o debate sobre
que incluem não só diversos profissionais do as qualidades objectivas dos artefactos, ao
museu para além dos próprios conservadores e repercutirem-se no museu, suscitam também
antropólogos, mas também, em alguns casos, mudanças nas próprias práticas expositivas.
membros dos grupos étnicos a que os objectos Uma das alterações mais significativas é a
expostos pertencem.7 Incluindo ou não membros superação da ligação privilegiada, ou exclusiva,
das próprias comunidades representadas, a da exposição aos aspectos estético-formais dos
constituição destes comissariados pluridiscipli- objectos e a sua nova aptidão para exibir, agora,
nares tem subjacente o reconhecimento da temas ou problemáticas especificamente antro-
necessidade de levar em consideração vários pológicas. As novas exposições passam a
pontos de vista, ou seja, sistemas de valor e apoiar-se mais em temas-ideias do que nos
representações alternativos, através dos quais é objectos em si, substituindo-se os anteriores
possível criticar e/ou explicitar o caracter ordenamentos formais e/ou funcionais dos
construído e relativo da representação museo- artefactos por ordenamentos muitas vezes
lógica. Isso poderá ser alcançado quer recorrendo narrativos. Os objectos etnográficos passam a
a uma "negociação" ou consulta mais ou menos ser utilizados essencialmente como ponto de
efectiva com o grupo étnico representado na partida através dos quais se tenta ilustrar,
exposição, quer através de exibição de vários remeter e/ou questionar a "história" que se
contextos de significação dos mesmos objectos. pretende contar.
Tentando equacionar as mudanças necessárias
para que o museu desempenhe melhor a sua A emergência desta nova modalidade
missão educacional e promova um multicultu- expositiva que é a exposição temática e os
ralismo efectivo, M. Kahn, num artigo recente,
esforços para a sua efectiva concretização estão
advoga o estreitamento da colaboração "( ...)
estreitamente relacionados com a criação de
instalações museográficas também elas distintas,
'Veja-se a propósito o artigo de J. Clifford (1991), Four
Nortlizuest Const Museuins: Trave1 -Reflections, onde se ou até em alguns casos desafiadoramente
compara o resultado de quatro exposiçóes, entre outros distintas, das anteriormente convencionadas.
factores, em função dos níveis de participação dos membros Numa exposição em que se pretende dar a ver
das comunidades representadas na construção dessas
apresentações museológicas. não objectos em si mas sim um tema ou
problemática antropológica, cujo conteúdo são sob a orientação de Jacques Hainard naquele
ideias ou reflexões não facilmente materiali- museu. Confrontandonum mesmo espaço -uma
záveis mas para as quais se quer remeter os vitrine ou uma secção da exposição - objectos
visitantes, novas estratégias expositivas têm etnográficos "clássicos" e objectos contemporâneos
que ser accionadas. De entre elas merece destaque ocidentais -por exemplo, latas de conserva ou
o recurso a múltiplos suportes expositivos através bonecas Barbie -,esta estratégia expositiva que
dos quais se tenta, nomeadamente, integrar na rompe com os cânones tradicionais da apre-
exposição outras dimensões sensitivas que não sentação museográfica mostra-se um instnimento
apenas as visuais mas também sensações tácteis, útil para equacionar o próprio estatuto do objecto
auditivas e mesmo olfactivas. Assim, para além de museu (Hainard, 1985). Através desta
dos objectos etnográficos aparecerem expostos confrontação e das interrogações que ela pode
de forma menos distanciada, possibilitando-se provocar - os objectos utilizados no dia a dia
muitas vezes o próprio contacto físico dos são ou não objectos etnográficos? e estes podem
visitantes com eles, a exposição temática tende ou não ser objectos quotidianos? ou os objectos
a conceder uma importância acrescida aos efeitos quotidianos são-no apenas quando entram num
de luz, cor e som, passando a incluir também museu? e quem decide da sua entrada? -tenta-se
diversos registos sonoros e de imagem. Por suscitar nos visitantes uma reflexão crítica não
outro lado, para atingir o objectivo desejado só sobre o significado relativo dos objectos mas
que é a explanação em termos expositivos do também sobre quem detém a autoridade para
tema seleccionado, estas inovadoras montagens determinar o seu significado. Em resumo, a
tendem também a utilizar de forma mais emergência da exposição temática e os esforços
alargada o texto escrito, não o limitando às envidados para a sua concretização acabam por
tradicionais legendas que de modo absolutamente promover uma outra inovação que é a extensão
unívoco e redutor identificavam e/ou descreviam da noção de objecto etnográfico e, concomitan-
sumariamente os artefactos expostos. Todos temente, da própria noção de museu etnográfico.
estes suportes expositivos constituem-se como Para além dos objectos de três dimensões, cuja
outros tantos meios que, em paralelo com os categoria foi ela própria alargada pela inclusão
de objectos contemporâneos ocidentais, as novas
artefactos, contribuem para que a exposição
instalações museográficas tendem a recorrer
materialize expositivamente o seu tema.
também a uma multiplicidade de outros suportes
expositivos através dos quais se tenta concretizar
Uma outra estratégia expositiva agora
o tratamento efectivo da respectiva temática.
adoptada é a exibição de objectos etnográficos,
i.e., dos clássicos artefactos exóticos, lado a lado
com objectos quotidianos da sociedade ocidental. Uma última inovação. que importa referir é a
Utilizado de forma sistemática pelo Musée nova concepção do museu como espaço de
dfEthnographiede Neuchâtel nas suas exposições realização de exposições temporárias sucessivas.
temporárias que surgem com a regularidade de Até sensivelmente aos anos 80, mesmo que o
uma por ano, este recurso expositivo tem sido, museu pudesse abrigar pontualmente alguma
desde 1982, um dos suportes fundamentais da exposição temporária, a sua actividade expositiva
"museologia reflexiva" (Clifford, 1985) realizada era concebida como traduzindo-se essencialmente
numa exposição permanente, através da qual se
consagrava em termos mais ou menos definitivos
uma noção de museu acabado (Hainard, 1985).
AMES, MICHAEL
Esta concepção do museu, ainda que os acervos 1991. Biculturalism in Exhibitions", Museum Anthro-
pudessem ir aumentando e a situação política, pologist, 15 (2), pp 7-15.
económica e social das culturas representadas
se fosse alterando, condenava-o a uma fixidez AMES, MICHAEL
expositiva que facilmente se transformava em 1992 Cannibal Tours and Glass Boxes: The
anacrónica, quer em relação às realidades etno- Anthropology of Museurns, Vancouver.
University of British Columbia Press.
gráficas quer relativamente às reformulações do
campo disciplinar. Através da realização de APPADURAI, ARJUN, ED.
exposições temporárias sucessivas o museu é 1986 The Social Life of Things: Commodities in
obrigado a um permanente trabalho de pesquisa Cultural Perspective, Cambndge, Carnbndge
e conceptualização museográfica que favorece a University Press.
sua constante actualização, quer em termos de
perspectivas teóricas quer em termos de ARNOLDI, M J.,
1992 "A Distorted Mirror: the Exhibition of the Herbert
estratégias expositivas. Além disso, pela concre- Ward Collection of Africana", in Museums and
tização sucessiva destas exposições o museu Communities: Debating Public Culture,
toma-se o espaço de um acontecimento que, Washington, Smithsonian Institute Press, pp 428-457.
repetindo-se regularmente no tempo, faz
aumentar o seu poder atractivo sobre os BAL, MIEKE
1992 "Telling, Showing, Showing off", Critical ínquiy,
visitantes, mostrando-se também capaz de
18, pp. 556-594.
promover e suscitar o debate e a reflexão dos
próprios antropólogos, assim como a crítica BARBER, LYNN
cultural da própria sociedade. 1980 The Heyday of Natural History, 1820-1870,
Garden City, New York, Doubleday.

Tentando equacionar os factores explicativos BENNET, TONY


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redefinições internas da disciplina e as novas
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seográfica. Do exposto e em conclusão, esperamos 11(4), pp 333-356.
ter tomado claro o seguinte: -Dado os contextos
teórico, ideológico e epistemológico contem- BOURDIEU, PIERRE
porâneos, o museu 2 as suas actividades surgirão 1984 Distinction: A Social Critique of the Judgement
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