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Fernanda Dalberto

MINHA CASA MINHA VIDA, UM ESTUDO DE CASO: O


CONJUNTO RESIDENCIAL EMÍLIO BOSCO NO
MUNICÍPIO DE SUMARÉ/SP

CAMPINAS

2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

Fernanda Dalberto

MINHA CASA MINHA VIDA, UM ESTUDO DE CASO: O


CONJUNTO RESIDENCIAL EMÍLIO BOSCO NO
MUNICÍPIO DE SUMARÉ/SP

Monografia apresentada à Comissão de Graduação do Instituto


de Economia da Universidade de Campinas, para a obtenção do
título de Bacharel em Ciências Econômicas, sob orientação da
Profa. Dra. Mariana Fix na área de pesquisa Desenvolvimento e
Políticas Públicas.

CAMPINAS

2015

ii
Resumo:
Na periferia do capitalismo, a urbanização é o resultado de processos em que se
alimentam as contradições específicas da condição de subdesenvolvimento. As
heterogeneidades estruturais, oriundas de um passado colonial, se reproduzem e tomam
novas formas no decorrer da história. As cidades no Brasil refletem e reproduzem a
desigualdade social formada na esfera da produção. A política habitacional, por sua vez,
está condicionada às conjunturas econômicas e ao acesso aos fluxos de capitais
externos.

O MCMV atinge a população de baixa renda, essa historicamente não atingida


pela política habitacional, porém o programa apresenta fragilidades, reproduzindo e
criando novos problemas. O caso do Conjunto Emílio Bosco, localizado no município
de Sumaré, e destinado à faixa de menor renda, exemplifica algumas dessas questões,
principalmente relacionadas ao acesso às infraestruturas da cidade e da geração de
novos gastos que pesam no orçamento familiar.

Palavras chave: Política habitacional; Urbanização; Periferia; Programa Minha Casa Minha Vida;
Conjunto Emílio Bosco.

Abstract:
On the periphery of capitalism, urbanization is the result of a process that feeds
on specific contradictions from the condition of underdevelopment.. Structural
heterogeneity, coming from a colonial past, have reproduced and taken new forms
throughout history. Cities in Brazil reflect and reproduce the social inequality formed on
the sphere of production. The housing policy, is subject to economic situations and
access to external capital flows.

The 'MCMV' program reaches the low-income population (0-3 minimum


wages), that were historically not affected by the housing policy. But the program has
it´s weaknesses, reproducing and creating new problems. The case of 'Emilio Bosco',
located in Sumaré and destinates to the lower income families exemplifies these
questions , mainly related to access to infrastructure of the city.

Key-words: Housing Policy; Urbanization; Periphery; 'Minha Casa Minha Vida' Program; Emílio Bosco.

iii
Lista de Gráficos:

Gráfico 1: Números do Minha Casa Minha Vida ........................................................ 27

Gráfico 2: Conjunto Emílio Bosco - Origem das Famílias .......................................... 36

Gráfico 3: Conjunto Emílio Bosco - Faixa etária dos primeiros titulares .................... 36

Gráfico 4: Conjunto Emílio Bosco - Grau de escolaridade do primeiro titular ............37

Gráfico 5: Conjunto Emílio Bosco - Grau de escolaridade do Cônjuge ...................... 37

Gráfico 6: Conjunto Emílio Bosco - Situação de emprego .......................................... 37

Gráfico 7: Conjunto Emílio Bosco - Renda Familiar ................................................... 38

Gráfico 8: Conjunto Emílio Bosco - Quantidade de pessoas por família ..................... 39

iv
Lista de Figuras:

Figura 1: Mapa da Região Metropolitana de Campinas ............................................. 30

Figura 2: Mapa do Município Subdividido em Regiões ............................................. 30

Figuras 3: Conjunto Residencial Emílio Bosco I ........................................................ 32

Figuras 4: Conjunto Residencial Emílio Bosco II ....................................................... 33

Figuras 5: Conjunto Residencial Emílio Bosco III ...................................................... 33

Figuras 6: Conjunto Residencial Emílio Bosco IV ...................................................... 33

Figuras 7: Região do Residencial Emílio Bosco I ....................................................... 34

Figuras 8: Região do Residencial Emílio Bosco II ...................................................... 34

Figuras 9: Região do Residencial Emílio Bosco III .................................................... 34

Figura 10: Região do Residencial Emílio Bosco IV..................................................... 35

Imagens 11: Visão da chegada ao Emílio Bosco em 2011 ......................................... 38

Imagens 12: Visão da chegada ao Emílio Bosco em 2015 .......................................... 38

Imagens 13: Visão da outra perspectiva da Av. Emílio Bosco, sentido centro de Matão
em 2011 ......................................................................................................................... 40

Imagens14: Visão da outra perspectiva da Av. Emílio Bosco, sentido centro de Matão
em 2015.......................................................................................................................... 40

Figura 15: Distância Jardim Basilicata - Conjunto Emílio Bosco ............................... 41

Figura 16: Distância Parque Franceschini - Conjunto Emílio Bosco........................... 42

Figura 17: Distância Jardim Alvorada - Conjunto Emílio Bosco................................. 42

Figura 18: Distância e Tempo de Carro: Origens - Conjunto Emílio Bosco ............... 43

v
Lista de Quadros:

Quadro 1: Déficit Habitacional por Região - Valores Absolutos, 2008 ...................... 02

Quadro 2: Porcentagem do Déficit Habitacional por renda e região, 2008.................. 02

Quadro 3: Faixas de renda do PMCMV por fases do programa................................... 23

Quadro 4: Metas quantitativas (unidades e investimento) por fases, faixa de renda e


modalidade..................................................................................................................... 26

Quadro 5: Faixas de atuação do MCMV 3 e taxas de juros a serem cobrada .............. 26

Quadro 6: Resultados do questionário realizados com as 21 famílias residentes do


Conjunto Residencial Emílio Bosco ............................................................................. 48

Quadro 7: Média nacional dos empreendimentos de faixa I nas Regiões Metropolitanas


por Região em 04/05/2010: ........................................................................................... 55

vi
Lista de Siglas:

BNDES: Banco Nacional do Desenvolvimento


BNH: Banco Nacional de Habitação
CDHU: Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano
CEF: Caixa Econômica Federal
Cohab: Companhia de Habitação
FAR: Fundo de Arrendamento Residencial
FCP: Fundação Casa Popular
FGTS: Fundo de Garantia de Tempo de Serviço
FHC: Fernando Henrique Cardoso
FMI: Fundo Monetário Internacional
FNHIS: Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
FJP: Fundação João Pinheiro
IAP: Instituto de Aposentadorias e Pensões
MCMV: Minha Casa Minha Vida
MCMV-E: Minha Casa Minha Vida Entidades
OGU: Orçamento Geral da União
OPR: Oferta Pública de Recursos
PAC: Programa de Aceleração do Crescimento
PAR: Programa de Arrendamento Residencial
PMCMV: Programa Minha Casa Minha Vida
PNHR: Programa Nacional de Habitação Rural
PNHU: Programa Nacional de Habitação Urbana
RM: Região Metropolitana
SBPE: Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
SFH: Sistema Financeiro de Habitação
SM: Salário Mínimo
SNH: Sistema Nacional de Habitação
TS: Trabalho Social
UH: Unidade Habitacional

vii
SUMÁRIO:

INTRODUÇÃO: ........................................................................................................................... 1

CAPÍTULO 1: URBANIZAÇÃO E POLÍTICA HABITACIONAL NO BRASIL ..................... 8

1.1 Processo de urbanização brasileiro ..................................................................................... 8


1.2 Política habitacional e conjuntura econômica no Brasil antes do Minha Casa Minha Vida
................................................................................................................................................. 12
1.3 Introdução ao Programa Minha Casa Minha Vida ............................................................ 22

CAPÍTULO 02: O CONJUNTO RESIDENCIAL EMÍLIO BOSCO E AS FRAGILIDADES


DO MINHA CASA MINHA VIDA ........................................................................................... 28

2.1 A Região Metropolitana de Campinas e o município de Sumaré ..................................... 28


2.2 Metodologia ...................................................................................................................... 31
2.3 O Conjunto Residencial Emílio Bosco:............................................................................. 32
2.3.1 Perfil e origem das famílias:....................................................................................... 35
2.3.2 Localização e estruturas ............................................................................................. 39
2.3.3 Gastos e organização condominial ............................................................................. 45
2.3.4 Conclusões e observações sobre o caso ..................................................................... 46
2.4. Análise nacional ............................................................................................................... 49

CONCLUSÃO ............................................................................................................................ 57

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ............................................................................................ 61

Anexo I: ....................................................................................................................................... 64

viii
INTRODUÇÃO:

O Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) deu uma nova dimensão à
política habitacional no Brasil. O programa foi lançado em 2009 como resposta à crise
financeira de 2008 iniciada nos Estados Unidos. Os objetivos divulgados pelo Governo
Federal foram de estímulo à construção civil, como parte de uma política anticíclica, ao
mesmo tempo em que o programa se apresenta como solução ao problema da habitação.
O MCMV não só mobiliza recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
(FGTS) para o crédito, como direciona um volume inédito de subsídios diretos com
recursos do Orçamento Geral da União (OGU) destinados à moradia de famílias de
baixa renda (aproximadamente 0 a 3 salários mínimos).

Defende-se neste trabalho que a política urbana e habitacional deve estar


compromissada com o direito à moradia em sua concepção ampla. As necessidades de
habitação não se restringem a um teto e quatro paredes, para viver e se reproduzir em
meio urbano a população trabalhadora tem exigências que vão para além de seu
consumo individual. São meios de consumo coletivos como transporte, educação,
saneamento, mobilidade, cultura e lazer. A questão da habitação, portanto, é relacionada
a questão da integração e acessibilidade aos recursos urbanos.

Às vésperas do lançamento do programa, em 2008, o déficit habitacional no


Brasil, calculado pela Fundação João Pinheiro (FJP) (2011) era de 5,5 milhões de
famílias, envolvendo, principalmente, famílias de baixa renda. A fundação considera
que o déficit habitacional do país está ligado a deficiências no estoque de moradias. O
déficit abrange: moradias em condições precárias; a coabitação forçada por dificuldade
de pagamento de aluguel; casas e apartamentos em que se vive em grande densidade e;
moradias em locais com fins não residenciais.

A FJP (2011) também destaca a inadequação de domicílios, ou seja, construções


que não oferecem condições aceitáveis de habitabilidade, impactando na qualidade de
vida dos moradores, dos quais se encontram: o adensamento excessivo de moradores em
domicílios próprios, a carência de serviços de infraestrutura, a inadequação fundiária, a
cobertura inadequada e a inexistência de unidade sanitária domiciliar exclusiva. (FJP
2011)

1
Quadro 01: Déficit Habitacional por Região - Valores Absolutos, 2008

Região Urbano Rural Total


Norte 448.072 107.058 555.130

Nordeste 1.305.628 641.107 1.946.735


Sudeste 1.969.424 76.888 2.046.312
Sul 519.080 61.813 580.893
Centro-
387.628 29.612 417.240
Oeste

BRASIL 4.629.832 916.478 5.546.310

Fonte: BRASIL, 2011, p. 31 (elaboração própria)

Quadro 02: Porcentagem do Déficit Habitacional por renda e região, 2008

Região 0à3 03 à 05 05 à 10 mais de 10

Norte 88,6 7,8 3 0,6


Nordeste 95,6 2,8 1,2 0,4
Sudeste 87,5 8,7 3,2 0,6
Sul 83,4 11,4 4,5 0,7

Centro-Oeste 89,9 5,3 3,3 1,4

BRASIL 89,6 7 2,8 0,6

Fonte: BRASIL, 2011, p. 37 (elaboração própria)

O déficit habitacional em 2008, calculado pela FJP (2011), se concentrava em


peso na faixa entre 0 e 3 salários mínimos, essa em que o MCMV se propõe a subsidiar
a moradia. A FJP (2011) aponta que a carência de infraestrutura é o critério que mais
afeta os domicílios do país, seguido da inadequação fundiária, adensamento excessivo,
domicílio sem banheiro e cobertura inadequada. A Fundação também destaca em seu
estudo que o estoque de domicílios vagos em condições a serem ocupados ou em
construção ou reforma era, em 2008, mais do que suficiente para cobrir o déficit
habitacional do país (FJP, 2011, p.112). Diante dos fatos, podemos verificar que o
problema da habitação está conectado não só a falta de unidades habitacionais e que,

2
assim, pode apresentar diferentes soluções, não somente ligadas à construção de novas
moradias, mas também à melhoria e ocupação de outras já existentes.

No MCMV a indústria da construção civil é aliada e coautora do programa,


como resultado muitas pesquisas vêm apontando para a prioridade dada à lógica
produtivista, por sua maior possibilidade de auferir lucros. O presente trabalho busca
contribuir para a discussão que tem sido feita na literatura, na qual aponta-se que a
forma como o programa MCMV é delineado tende a aprofundar a periferização,
havendo a reprodução da exclusão das populações de baixa renda da fruição plena das
infraestruturas e oportunidades que a cidade tem a oferecer. Com esse intuito, foi
realizado um estudo de caso no Conjunto Emílio Bosco localizado na Região
Metropolitana de Campinas, no município de Sumaré.

O Conjunto foi escolhido devido à faixa de renda a qual se destina - 0 a 3


salários mínimos -, já que essa é a mais afetada pelo déficit habitacional no país e por
suas famílias possuírem menor poder de barganha no programa, uma vez que a demanda
por moradia é maior que a oferta. Outro fator que influenciou a escolha foi o fato do
Conjunto ser o primeiro entregue no município de Sumaré, o que torna possível analisar
um período maior de uso. E, por fim, também despertou interesse pelo caso, o Emílio
Bosco estar nas imediações do maior empreendimento do programa MCMV na cidade,
de forma com que na pratica sejam extrapolados os limites de UHs permitidas nas
regras do programa.

É importante também para o trabalho entender qual o contexto estrutural em que


o programa Minha Casa Minha Vida está inserido. De um modo geral, para
compreender o desenho do programa e suas consequências, temos que entender os
modelos de cidade e de política habitacional que emergem na periferia do capitalismo
ao longo da história.

A necessidade constante de expansão no sistema capitalista tem como forma


espacial correspondente a urbanização (MIOTO 2015, p.01). O mercado de terras no
capitalismo é determinado pela compra e venda da terra capitalizada. O preço da terra é
regulado pela taxa de juros e pelas expectativsa de rendas futuras o que, como Mioto
(2015) demonstra, coloca a terra como parte integrante do mercado financeiro e, assim,
como fonte de ganhos especulativos.

3
Singer (1982) aponta que o solo urbano é confundido com capital, mas este é
assentado na propriedade privada dos meios de produção e não de habitação. Assim, o
"capital imobiliário" constitui um falso capital. Ele se valoriza, mas a origem de sua
valorização não é a atividade produtiva, e sim a monopolização do acesso a uma
condição indispensável à produção, a moradia1. Como todo espaço urbano é
propriedade privada, mesmo as piores localizações têm de ser compradas ou alugadas, a
população sem renda o suficiente para fazer frente aos preços de mercado é, dessa
forma, progressivamente excluída dos mercados formais (SINGER, 1982, p.21).

Os proprietários de terra urbana dispõem de liberdade para reter terrenos na


expectativa de suas futuras valorizações, deteriorando ainda mais a condição das
populações de baixa renda (SINGER, 1982, p.22). Exemplo disso é a questão dos
centros esvaziados. As edificações muitas vezes abandonadas pelas camadas ricas e
empresas nos centros não são aproveitadas por grupos de menor renda carentes de
moradia. Singer (1982) explica que o funcionamento do mercado imobiliário não
facilita esse aproveitamento, já que a capacidade de pagamento dos trabalhadores é
baixa. O preço reduzido dos imóveis também não é suficiente para atrair investidores,
pois dificilmente as camadas ricas e médias se disporiam a morar em bairros que
ganharam "má fama". O mercado imobiliário os deixa, então, em reserva, aguardando
políticas do Estado que resultem em sua valorização.

A disputa pelo solo para habitação é pautada por vantagens locacionais,


determinadas principalmente pela acessibilidade aos serviços urbanos como:
saneamento básico, transportes, escolas, comércio e lazer (VILLAÇA, 1998). Os
indivíduos entram na disputa pelo espaço urbano não de forma isolada, mas enquanto
classes sociais lutando pelas condições materiais da sua sobrevivência (HARVEY,
1982). Os grupos mais ricos tendem a se segregar em pontos específicos das cidades,
trazendo para si os investimentos em infraestrutura do Estado. A tendência é que quanto
menor a renda da população mais escassos serão os serviços oferecidos (SINGER,
1982, p.33).

Quando o capital intervém sobre o meio construído em geral o faz através da


intermediação do poder do Estado. Uma dessas formas de intervenção é o fornecimento

1
A habitação é um dos componentes da cesta básica de subsistência do trabalhador, ou seja, é necessária
a reprodução da força de trabalho, alicerce da reprodução capitalista (SINGER, 1982).

4
de propriedade privada e da casa própria para a classe trabalhadora. "A vulgarização da
casa própria, individualizada, é vista como vantajosa para a classe capitalista porque ela
estimula a fidelidade de pelo menos uma parte da classe operária ao princípio da
propriedade privada" (HARVEY, 1982 p.13), o que funciona como uma forte
ferramenta ideológica, através de falsa elevação dessa parcela da classe trabalhadora à
classe proprietária.

"Os trabalhadores colocam suas economias sob a forma física de uma


propriedade. Eles procurarão preservar o valor dessas economias e se
possível aumentá-lo. Estimula fragmentação dentro da classe trabalhadora, a
medida que parte dela ingressa na casa própria e se torna profundamente
preocupada com a preservação e se possível elevação de seu valor".
(HARVEY, 1982, p.14)

Na América Latina a urbanização possuiu características e problemas


particulares ao subdesenvolvimento, principalmente devido a persistência de
heterogeneidades estruturais. A modernização econômica, traduzida na industrialização
que tomou força no Brasil a partir da década de 1930, não significou a redução dos
atrasos sociais do país (MIOTO, 2015).

Mais do que convivência entre o atraso e moderno, a evolução dos


acontecimentos no Brasil se deu com relações que resultaram, como frisa Maricato
(1995), no "desenvolvimento do atraso" e "arcaização do moderno" (MARICATO 1995,
p.05). O avanço da indústria não implicou nem no fim da dependência externa nem a
quebra com a segregação social2. Esse foi com base na progressiva diminuição de
salários reais e concentração de renda, aumentando a exploração sobre o trabalhador.
(MARICATO 1995)

Assim, as grandes cidades brasileiras refletem o processo industrial de intensa


exploração da força de trabalho na formação e crescimento exacerbado de periferias.
Mas, como ressalta Maricato (1995), o ambiente construído faz muito mais que refletir a
segregação social construída na esfera da produção, ele também a agrava na medida em
que a menor acessibilidade aos benefícios da cidade como escolas, transporte, hospitais,
lazer, cultura e a maior exposição à violência e ambientes precários de habitação pioram
a situação da classe trabalhadora.

2
A dependência externa, que persiste nas economias latino-americanas, tem seu cerne no passado
agroexportador dos países, que foi montado pelo modelo de colonização de exploração. A segregação
social, também marca dessas sociedades, tem sua origem inicial no campo com o latifúndio e histórica
exploração do trabalhador.

5
O problema habitacional não pode ser analisado isoladamente de outros
processos socio-econômicos e políticos mais amplos. Kowarick (1993) chama atenção
para dois processos interligados. O primeiro refere-se as condições de exploração do
trabalho, ou seja, à pauperização à qual estão sujeitos diversos segmentos da classe
trabalhadora. O segundo processo decorre do anterior, é o que o autor se refere como
Espoliação Urbana (KOWARICK, 1993, p.62), ou seja, o somatório de extorsões que
se operam através da inexistência ou precariedade de consumos coletivos socialmente
necessários à subsistência do trabalhador e que só exacerbam a exploração nas relações
de trabalho.

"A existência de um vasto exército de reserva, tem constituído numa das


principais alavancas de acumulação dos países de capitalismo tardio, entre os
quais o Brasil é um caso exemplar, pois permite dilapidar, através da
superexploração do trabalho e da espoliação urbana, boa parte da mão-de-
obra engajada nas engrenagens produtivas, na medida em que os segmentos
desgastados podem ser substituídos pelos vastos reservatórios disponíveis".
(KOWARICK 1993, p.63)

Mioto (2015) defende que o padrão de política habitacional adotada dependerá


do padrão econômico, ou seja, da forma de acumulação vigente. Até o final dos anos
1970, que apresentaram desenvolvimento baseado na industrialização por substituição
de importações, o Estado participa como protagonista da política habitacional de
diferentes formas: na criação de um sistema financeiro, como promotores imobiliários,
como reguladores dos preços fundiários, alugueis e etc. Nos anos 1980, com a crise e
consolidação do padrão neoliberal a política transforma-se, passando a responder
principalmente aos interesses dos setores da construção civil, dos proprietários
fundiários e do capital financeiro (MIOTO, 2015, p.13).

Nos anos 2000, o Brasil passou por um ciclo expansivo de emprego e renda,
estimulado principalmente pelo aumento do preço das commodities e pelo aquecimento
da economia mundial. Quando a crise de 2008 se deflagra a resposta do governo foi de
continuar e aumentar as medidas de estímulo ao gasto. É nesse contexto que o programa
Minha Casa Minha Vida é lançado.

As fragilidades do programa, abordadas na segunda parte do trabalho com o


estudo de caso, estão intrinsecamente relacionadas ao contexto histórico, econômico e
institucional do Brasil e à condição subdesenvolvimento do país, gerando urbanização e
políticas habitacionais específicas. Com isso, para maior alcance da análise, o primeiro
capítulo do trabalho examinará essas questões. No capítulo também apresentaremos

6
uma introdução ao programa MCMV e seu funcionamento, para depois, no segundo
capítulo, avaliarmos com mais propriedade tanto o estudo de caso quanto algumas
análises nacionais.

7
CAPÍTULO 1: URBANIZAÇÃO E POLÍTICA HABITACIONAL NO BRASIL

1.1 Processo de urbanização brasileiro

As cidades na América Latina tiveram a dominação colonial como seu


fundamento. Caio Prado Jr. (2011) nos mostra que a colonização dos trópicos foi um
dos episódios da expansão comercial europeia, assim, seu sentido voltou-se para a
extração do máximo de proveito para a empresa mercantil das metrópoles. No Brasil a
saída mais lucrativa foi a instalação de um sistema agrário baseado no latifúndio
monocultor e no trabalho escravo. Dessa forma, na colônia o dinamismo econômico do
país se concentrou muito mais nas áreas rurais que urbanas. As cidades eram escassas e
serviam basicamente como proteção de território e entrepostos comerciais, também se
concentravam no litoral para facilitar o escoamento da produção (MIOTO, 2015, p.15).
Assim, a mentalidade fundadora das cidades na colônia foi a mentalidade da expansão
da metrópole.

Com a Independência não houve quebra estrutural com as oligarquias de poder e


manteve-se o latifúndio. Maricato (1995) em Metrópole na Periferia do Capitalismo
ressalta a ambiguidade como marca fundante da nossa sociedade. Após a
independência, em meio a um mundo em que se afirmavam os direitos civis,
contraditoriamente houve a continuidade do trabalho escravo no país (MARICATO,
1995, p.13).

Mesmo após a emergência do trabalho livre, as relações sociais e econômicas


continuavam a ser baseadas nas mesmas "regras" da na época colonial, ou seja, no
mando, na dominação pessoal e no favor (MARICATO, 1995, p.14). A convivência de
ideal liberal europeu com relações de trabalho que o contradiziam marcou
profundamente a formação ideológica e moral da sociedade brasileira. Tratava-se, como
aponta Maricato (1995, p.14), de um liberalismo dos possuidores.

"O conteúdo do liberalismo brasileiro se definia ao nível econômico por:


comercio, produção escravista, compra de terras (após 1850). E ao nível
político por: eleições indiretas e censitárias. Tratava-se do liberalismo dos
possuidores, ou do respeito à individualidade e autonomia do cidadão
proprietário. Um liberalismo adaptado às 'circunstâncias' e às 'peculiaridades'
nacionais”. (BOSI, 1992 em MARICATO, 1995, p.15)

"O surgimento da burguesia brasileira não se faz em oposição aos privilégios


do sistema colonial, mas sim em oposição ao jugo colonial. Com a destruição
da ordenação jurídico política deste, os demais privilégios não só subsistiram,

8
mas foram até reforçados". (FERNANDES, 1977 em MARICATO, 1995,
p.15)

No Brasil, o processo de definição da terra como mercadoria caminhou


paralelamente à emergência do trabalho assalariado e não por acaso. A promulgação da
Lei de Terras em 1850 acompanhou a proibição do trafico de escravos, esta que já
anunciava a abolição de 1988 (MARICATO, 1995, p.17). Até então, os senhores de
escravos e demais fazendeiros obtinham a terra mediante concessões no regime de
sesmarias coordenados pela metrópole. O concessionário não era exatamente um
proprietário como entendemos hoje, mas sim um beneficiário da Coroa (FIX, 2011,
p.57).

A partir da Lei de Terras, entretanto, toda terra devoluta só poderia ser ocupada
através dos processos de compra e venda a preços que dificilmente seriam acessíveis ao
trabalhador livre. Dessa forma, a lei garantia a sujeição do trabalhador aos postos de
trabalho antes ocupados por escravos. (FIX, 2011, p.58)

"A renda, até então capitalizada no escravo, tornava-se renda territorial


capitalizada. Se no regime sesmaria, o da terra livre, o trabalho tivera que ser
cativo; num regime de trabalho livre a terra tem que ser cativa". (MARTINS,
2010 em FIX, 2011, p.58).

Com a emergência do trabalho livre, também houve a criação de um mercado de


trabalho urbano e a ampliação de atividades comerciais e financeiras nas cidades.
Formavam-se, assim, demandas crescentes por habitação e serviços urbanos (FIX, 2011,
p.60). No final do século XIX as principais cidades brasileiras começavam a mudar de
fisionomia, as migrações e o aumento no crescimento vegetativo aceleraram a
diferenciação do espaço urbano (MIOTO, 2015, p.18).

Mesmo com uma economia industrial incipiente, o aumento da população


urbana era significativo. A cidade foi tornando-se fronteira de investimentos e se
expandiam atividades como a construção de casas de aluguel (MIOTO, 2015, p.25), que
acabaram por se tornar um segmento econômico importante, inclusive para alocar os
excedentes das elites rurais.

"Configura-se, assim, um campo de investimentos de capitais excedentes,


nacionais e internacionais. O meio ambiente construído começa a se
constituir como uma fronteira de valorização dos lucros e dos excedentes
obtidos em outras atividades pelo capital agrário, comercial, e, futuramente,
industrial" (FIX, 2011, p.60)

9
O acesso ao mercado de terras urbanas em formação era, porém, restrito.
Mariana Fix (2011) aponta que em um primeiro momento a precariedade dos
transportes nas cidades associada à mercantilização da terra, que excluía grandes
camadas da população do seu acesso, obrigou o trabalhador urbano a se localizar perto
dos locais de emprego em péssimas condições. O cortiço foi a primeira solução
encontrada pelo trabalhador para a habitação no Brasil. Esses, porém, foram um dos
principais alvos das políticas higienistas do final do século XIX (MARICATO, 1995,
p.18).

O início da República afirmou um urbanismo segregador. Com os objetivos de


erguer um cenário modernizante e consolidar o mercado imobiliário, as reformas
urbanísticas promoveram a gentrificação dos centros urbanos e demais localidades
valorizadas. Os pobres nesse processo foram expulsos para as periferias, morros e
várzeas das cidades. (MARICATO, 1995, p.18)

Depois da crise de 1929, que atingiu com força os países centrais, o Brasil inicia
um novo período econômico impulsionado pela industrialização por substituição de
importações. Maricato (1995, p.19) ressalta que a industrialização brasileira combinou
crescimento urbano industrial com regimes arcaicos de produção agrícola. O
desenvolvimento econômico do país, e a consequente acentuação da urbanização, foram
processos marcados pela heterogeneidade. Houve prevalência do capital mercantil e
continuidade da importância da propriedade fundiária na estrutura econômica e política
do país (MIOTO, 2015, p.25).

Assim, a industrialização no Brasil não foi sinônimo de superação de atrasos


estruturais. Perdurou-se a dependência externa na economia e a segregação social. A
urbanização oriunda desse processo não transformou nem latifúndio nem as relações de
produção pautadas em altas taxas de exploração do trabalho. "Não resultou de uma
transformação revolucionária da antiga estrutura de dominação, mas de uma
acomodação da mesma" (MIOTO, 2015, p.28). As oligarquias, o latifúndio e a pobreza
do homem no campo não foram tocadas. O desenvolvimento industrial acabou por gerar
uma forte migração do campo para à cidade (MIOTO, 2015, p.29).

As migrações internas garantiam exército de reserva suficiente para que a


industrialização fosse feita com baixos salários (MARICATO, 1995, p.19). O

10
desenvolvimento industrial reproduziu a pobreza do trabalhador no país. O processo foi
marcado por sucessivos apertos salariais e forte presença do subemprego e desemprego
(MIOTO, 2015, p.31). Como resultado, grande parte da camada trabalhadora não tinha
condições de acesso ao mercado formal de moradia. A saída histórica, uma vez que não
constituem demanda para pagar por esses bens e serviços é a autoconstrução3 (MIOTO,
2015, p.36).

Autores como Ferro (2006) e Maricato (1995), tendo em vista os apertos


salariais ocorridos após a década de 1960, apontam para o fato de que o barateamento
da moradia gerado pela autoconstrução não trouxe melhorias na qualidade de vida do
trabalhador, no sentido de liberar seu orçamento para outros consumos, já que os
salários eram sistematicamente contraídos. Os autores defendem que a autoconstrução
significou, em última instância, um rebaixamento da subsistência do trabalhador e,
assim, barateamento de sua reprodução.

Esses processos que excluem parte significativa dos trabalhadores do mercado


imobiliário formal também gera um fenômeno descrito por Maricato (1995, p.22) como
o surgimento de um extenso "produtivo excluído". Parte dos trabalhadores da moderna
indústria não auferiam renda o suficiente para suprir todas suas necessidades. Em 1980
57,3% dos chefes de família moradores de favela eram trabalhadores do setor
secundário (MARICATO, 1995, p.22).

O aumento dos assentamentos em terrenos ilegais faz com que exista uma cidade
legal, que consta ao planejamento urbano, em contraste a cidade real (MARICATO,
1995, p.11). O uso do solo na periferia se dá com profundo deslocamento entre norma e
fato. Enquanto os imóveis não têm valor como mercadoria, ou têm valor irrisório, a
ocupação ilegal se desenvolve sem interferências do Estado. A partir do momento em
que os imóveis adquirem valor de mercado as relações passam a ser regidas pela
legislação e pelo direito oficial. "A lei do mercado é mais efetiva do que a norma legal"
(MARICATO, 1995, p.12).

3
Na autoconstrução os trabalhadores, com ajuda de parentes e amigos, erguem suas casas em seus tempos
de folga em terrenos próprios legais ou ilegais quase sempre nas franjas das cidades fortalecendo o
movimento de periferização nas cidades (KOWARICK, 1993). "A casa é mínima, é um abrigo, dotado
somente do indispensável" (FERRO, 2006). Há sempre um endividamento, que dado os baixos salários, é,
em grande parte dos casos, coberto através do aumento da já extensa jornada de trabalho. Se a esse tempo
forem adicionadas as horas gastas na locomoção diária e as referentes à confecção da casa, tem-se um
quadro claro do desgaste daqueles que "ingressam na aventura de possuir uma propriedade"
(KOWARICK, 1993)

11
A periferia como fórmula de reproduzir nas cidades a força de trabalho é
consequência direta do tipo de desenvolvimento econômico que se processou na
sociedade brasileira (KOWARICK, 1993). Possibilitando de um lado altas taxas de
exploração de trabalho e de outro forjando formas espoliativas que se dão ao nível da
própria condição urbana de existência a que foi submetida a classe trabalhadora
(KOWARICK, 1993).

As restrições orçamentárias e a entrada do país no neoliberalismo só agravaram


a segregação social. A periferização foi aprofundada nas grandes metrópoles e os
problemas urbanos começaram a vir à tona com muito mais força na forma de predação
do meio ambiente, baixa qualidade de vida, gigantesca miséria social e aumento dos
índices de violência (MARICATO, 1995, p.27). O desenvolvimento urbano desigual
reproduziu e deu novas conformações à herança do atraso. (MARICATO, 1995, p.28)

"O processo de industrialização e sua sucessiva urbanização sob o lema


positivista da ordem e do progresso, parecia representar um caminho para a
independência de séculos de dominação da produção agrária e de mando
coronelista. A evolução dos acontecimentos mostrou que ao lado de intenso
crescimento econômico, o processo de urbanização com crescimento da
desigualdade resultou numa inédita e gigantesca concentração espacial da
pobreza". (MARICATO, 1995, p.29)

O problema habitacional no Brasil não pode ser analisado isoladamente de


outros problemas sociais. Devido às conformações especificas do subdesenvolvimento,
especialmente ligadas à pauperização dos trabalhadores, o modelo de cidade construído
é, geralmente, desigual e segregador.

1.2 Política habitacional e conjuntura econômica no Brasil antes do Minha Casa


Minha Vida
Antes da década de 1930 as políticas urbanas praticadas no Brasil foram
principalmente higienistas de embelezamento urbano. Ao longo dos anos de 1930, com
o primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945), a presença estatal amplia-se e há a
regulação das relações capital-trabalho (FIX, 2011, p.74)."Dissemina-se a visão de que
a iniciativa privada era incapaz de enfrentar o problema da habitação sozinha, tornando
inevitável a intervenção do Estado" (FIX, 2011, p.74).

12
A principal política habitacional do período veio da regulamentação das
condições de reprodução da força de trabalho, com a criação dos Institutos de
Aposentadoria e Pensões (IAPs) para cada categoria profissional. Os IAPs foram as
primeiras instituições públicas de importância a tratar da questão habitacional, embora
essa não fosse sua função central (FIX, 2011, p.76).

Os três planos adotados pelos institutos eram independentes e não tiveram um


padrão uniforme de atuação. Foram: i) Locação ou venda de unidades em conjuntos
residenciais adquiridos ou construídos pelos IAPs; ii) financiamento aos associados para
aquisição de moradia ou construção em terreno próprio e; iii) empréstimos hipotecários
feitos a qualquer pessoa física ou jurídica, assim como outras operações imobiliárias
que o instituto julgasse conveniente. Os dois primeiros tinham objetivos sociais,
enquanto o último financiava construções de todos os tipos, principalmente habitações
de classes médias e altas (FIX, 2011, p.76).

Embora importante, a experiência dos IAPs foi insuficiente, exemplo disso foi o
fato de as taxas de prestações de ajuda ao inquilino não se ajustarem com a inflação. O
seu impacto também foi desigual entre as regiões do país, o atendimento se concentrou
sobretudo no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Essa primeira política
habitacional funcionou mais como suporte ao circuito imobiliário nascente do que como
resposta ao problema da falta de habitação ou dos direitos sociais das populações de
baixa renda (FIX, 2011, p.78).

No período também foi instaurada a Lei do Inquilinato (1942) que


regulamentava as relações entre locadores e inquilinos em favor dos últimos. A inflação
corrente corroia os aluguéis, a lei buscava frear os aumentos causados por suas
correções. De fato, foi a Lei do Inquilinato a política habitacional do governo Vargas de
maior impacto, ela conseguiu diminuir o encarecimento dos aluguéis, mas como
consequência também houve a queda na oferta global de imóveis (MIOTO, 2015, p.43).

A primeira tentativa de constituição de um sistema federal na área de habitação


veio com a Fundação Casa Popular (FCP) criada durante o governo Dutra em 1946. A
FCP tinha o intuito de centralizar os recursos destinados à habitação (FIX 2011, p.80).
Contudo, o setor imobiliário passava por um boom e ofereceu resistência, já que era de
seu interessante continuar no modelo descentralizado dos IAPs. A crise habitacional,
porém, não era solucionada por esse aquecimento imobiliário, este na verdade gerava

13
aumento dos preços e dificultava ainda mais o acesso da casa pelo trabalhador (FIX
2011).

Entre as tentativas de transformação da política habitacional se destaca a criação


de um banco hipotecário em 1953. Esse não teve força para se estabelecer dada a
precariedade do sistema financeiro brasileiro e por falta de viabilidade política. A
produção de casas pela FCP foi irrisória, não chegaram a ser construídas mais do que 17
mil unidades em todo o país, número menor inclusive do que o produzido pelos IAPs
(FIX 2011, p.80).

Com a expansão da população assalariada e o surgimento de grandes metrópoles


nos anos 1950 o processo de urbanização assumiu uma nova intensidade. A população
paulistana, por exemplo, aumentou 74% na década de 1950 (FIX 2011, p.83). O Plano
de Metas de JK (1956-1961) foi decisivo para a indústria da construção, principalmente
a construção pesada. Enquanto vários ramos da industria de transformação se
internacionalizaram, na atividade construtora aumentou-se a dominação do capital
privado nacional, com a ampliação de grandes projetos de infraestrutura. O circuito
imobiliário, por sua vez, permaneceu como órbita reservada das elites brasileiras. As
desigualdades de renda se colocavam como um constrangimento ao setor de edificações,
já que continuavam a impedir o acesso de grandes massas ao mercado imobiliário (FIX
2011, p.85).

O período entre 1960 e 1980 foi de crescimento da economia brasileira. O PIB


do país cresceu de 1960 a 1970 em uma média de 6,08% ao ano e entre 1970 e 1980
8,6% (MIOTO 2015, p.46). O crescimento, entretanto, não significou o rompimento
com dependência externa do país, principalmente do ponto de vista financeiro. Esse foi,
na verdade, acompanhado de grande endividamento externo.

O Regime Militar (1964-1985) trouxe mudanças significativas para política


urbana do país. A política econômica do "milagre" foi calcada na concentração de
renda. O crescimento do período não se baseou no aumento da produtividade e
generalização do consumo, mas sim na diferenciação de bens sofisticados destinados a
uma minoria da população (MARICATO 1995). A estrutura de consumo interno se
modernizou conforme os padrões de consumo dos países centrais. O quadro de alta
concentração de renda sustentou para o estrato superior da população um estilo de vida

14
que não condiz com estrutura produtiva do país e excluí camada significativa de sua
fruição (MIOTO 2015, p.09).

A massa excluída desse consumo, se por um lado não servia de mercado para
esses bens, por outro constituiu ampla oferta de mão de obra barata para sua produção
(MARICATO, 1995, p.21). A queda do poder aquisitivo do trabalhador correspondeu,
entre a década de 1960 e 1970, a uma acentuação na concentração de renda. 50% da
população Brasileira que se apropriava em 1960 de 17,7% da renda total passou, em
1970, a apropriar-se de 13,1%. (MARICATO 1982)

O Regime Militar (1964-1985) assumiu o compromisso de estabilizar a inflação


que assolava o país sem que fossem deprimidas as taxas de crescimento econômico
(BOLAFFI 1982). Para poder praticar política inflacionária regressiva o governo
dependia de projetos de estimulo à demanda. Bolaffi (1982) aponta que o principal foco
escolhido de política anticíclica, em um primeiro momento, foi a habitação.

A habitação tem muita força ideológica. A casa própria é uma das principais
aspirações do brasileiro em razão de seu peso subjetivo e objetivo (BOLAFFI 1982,
p.43). Subjetivamente, a aquisição de um imóvel se constitui na principal evidência de
sucesso e conquista de posição social mais elevada. Objetivamente a casa própria
facilita a obtenção de crédito e libera o orçamento familiar do aluguel (BOLAFFI 1982,
p.43).

O Banco Nacional da Habitação (BNH) e o Sistema Financeiro da Habitação


(SFH) foram criados em 1964 com a retórica de "promover a construção e aquisição da
casa própria especialmente para as classes de menor renda" (BOLAFFI 1982, p.44).
Seus objetivos eram de coordenação da política habitacional, investimentos em
infraestruturas urbanas e criação de empregos na construção civil4, além da busca de
estabilidade política. O modelo teve como única opção a casa própria com a construção
de novas unidades. (FIX, 2011, p.90)

"Independente das motivações - que mudam inclusive ao longo do tempo - a


montagem de um sistema de financiamento habitacional, e posteriormente de

4
O BNH inaugurou um novo momento para a construção civil. Porém quanto à seus efeitos
multiplicadores, esses são altos para trás, ou seja, para atividades pouco qualificadas, e muito baixos no
estimulo da atividade industrial como um todo. Quando em 1967 iniciou-se a recuperação o pedal do
crescimento foi a indústria de bens duráveis e não a construção civil (BOLAFFI, 1982). Quanto ao
estimulo ao setor também preciso pesar as suas condições para o trabalhador. Nossa construção civil,
como mostra Ferro (1969), tem altas taxas de exploração do trabalho.

15
infraestrutura urbana e nacional, por meio do Banco Nacional de Habitação
(BNH), do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFHAU), e do
Sistema Financeiro de Habitação (SFH), iniciou uma nova fase na articulação
entre Estado e indústria da construção, particularmente para o subsetor de
edificações." (FIX, 2011, p.90)

A primeira fonte de recursos do BNH veio da criação do Fundo de Garantia por


Tempo de Serviço (FGTS) instituído em 1966 como garantia de recursos para a
manutenção do trabalhador em tempos de desemprego. A segunda veio com o início do
funcionamento do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos (SBPE). O sistema
reúne entidades públicas e privadas encarregadas de captar poupanças voluntárias do
público e canalizá-las para o setor habitacional. (FIX, 2011, p.93)

Desde sua constituição, a orientação que inspirou as operações do BNH foi a de


transmitir todas as funções para a iniciativa privada. O banco mobilizava recursos e os
transferia a uma variedade de agentes. Drenava os recursos do FGTS para o setor
privado a fim de alimentar os mecanismos de acumulação (BOLAFFI, 1982, p. 49). O
BNH mudou a estrutura do mercado imobiliário privado e transformou as paisagens
construídas nas grandes cidades brasileiras (FIX, 2011, p.92).

O atendimento era diferenciado por três faixas de renda, popular, econômica e


média, cada uma delas a cargo de um agente específico. O segmento popular, atendido
pelas Companhias de Habitação (Cohabs), foi constituído inicialmente para beneficiar
famílias que recebiam até 3 salários mínimos, mas posteriormente foi ampliado para 5
SMs e acabou, na prática, atingindo famílias com rendimentos ainda um pouco maiores
(FIX, 2011, p. 97).

Progressivamente o BNH afastou-se das aplicações em habitação popular para


investir em habitações de alto e médio custo e em obras de infraestrutura. O governo
buscava atingir um mercado com poder aquisitivo que pudesse fazer frente aos preços
dos imóveis, às taxas de juros e correções monetárias que aumentavam anualmente mais
do que o aumento do salário mínimo (MARICATO, 1982, p. 80). Dessa forma,
Maricato (1995, p.23) afirma que a política habitacional do Regime Militar acabou por
constituir mais um fator de concentração de renda, já que privilegiou a produção de
habitação subsidiada para a classe média em detrimento dos setores de mais baixa
renda.

16
A política foi fundamental para a estruturação de um mercado imobiliário nos
moldes capitalistas. As empresas privadas ligadas ao mercado imobiliário saíram dessa
experiência fortalecidas na medida em que houve subsídios à demanda e também houve
a criação de sistemas de financiamento habitacionais que ampliavam seus capitais de
giro (MIOTO, 2015, p.51).

O governo militar ao criar o BNH preocupava-se em formular projetos capazes


de conservar o apoio das massas, apesar da política de contenção salarial e repressão
dos movimentos sociais (BOLAFFI, 1982). Bolaffi (1982) defende que a política
habitacional instaurada não passou de um artifício político formulado para enfrentar um
problema econômico conjuntural, a inflação, e para buscar apoio popular. A moradia em
si não era a prioridade. A ampliação da política habitacional teve no período "forte
conteúdo econômico e um pano de fundo social ideológico" (MIOTO, 2015, p.51).

Os anos 1980 encerram o ciclo desenvolvimentista no Brasil iniciado na década


de 1950 com o governo JK. As políticas de investimento público e as altas taxas de
crescimento econômico foram substituídas por políticas recessivas de estabilização. Os
1980 a metade dos anos 1990 foram marcados pela crise da dívida externa, por baixas
taxas de crescimento do PIB, por restrições de financiamento, restrições cambiais, crise
monetária e inflação galopante. Instaurou-se no período grave crise no setor público.
(CARNEIRO, 2002)

Na década de 1980 também se consolidou a hegemonia do capital financeiro no


sistema capitalista mundial (CARNEIRO, 2002). O movimento de globalização foi
acelerado. Progressivamente foram eliminadas as restrições à mobilidade de capitais.
Marcou-se o fim da ordem reguladora comandada por Bretton Woods e deu-se início à
era da desregulamentação. Enquanto o processo de globalização crescia, cada vez mais
a América Latina mantinha-se excluída desse novo ciclo. Vivia a dura crise da dívida
externa (CARNEIRO, 2002).

A absorção de recursos financeiros que o Brasil presenciara até a década de


1970, se viu revertida, transformando-se em transferência de recursos para o exterior
pelo pagamento dos serviços da dívida (CARNEIRO, 2002). Essa situação só se
agravou com o tempo. As economias periféricas, em face da ruptura do financiamento
externo, foram obrigadas a realizar crescentes transferências de recursos reais para o
exterior. Tal fato afetou profundamente a capacidade de crescimento econômico do

17
Brasil, ainda mais pela necessidade de moldar sua política macro de acordo com a
cartilha recessiva do Fundo Monetário Internacional (FMI) (CARNEIRO, 2002).

A recuperação começou a ocorrer na década de 1990, essa, no entanto, não


significou a retomada do dinamismo do período desenvolvimentista (CARNEIRO,
2002). Durante a industrialização por substituição de importações, o crescimento foi
baseado na diversificação produtiva num movimento de catching up, que procurava
aproximar a indústria periférica à indústria dos desenvolvidos (CARNEIRO, 2002).
Após década de 1990, Brasil abria seus capitais e entrava participativamente da
globalização. Os segmentos mais dinâmicos da economia nacional, porém, passaram a
não coincidir com os mais dinâmicos dos desenvolvidos. O Brasil não conseguiu
incorporar a onda tecnologia em sua matriz industrial. (CARNEIRO, 2002)

Na passagem para a era financeira, o neoliberalismo firmou-se ideologicamente


como receita de política econômica. Houve transformação do paradigma da rigidez,
calcado nas políticas keynesianas e acumulação fordista, em flexibilidade, tanto no
âmbito da produção quanto do mercado (HARVEY, 1999). A equidade foi trocada pela
eficiência. O padrão de reprodução do capital e as atribuições do Estado foram
fortemente afetadas. A primeira preocupação nacional passou, então, a ser a atratividade
financeira5.

Tavares (2002) aponta que o potencial de crescimento endógeno das economias


foi esterilizado e os interesses do capital financeiro internacional consolidados. Nos
anos 1980 o projeto desenvolvimentista baseado na industrialização, integração e
diversificação da economia se dissolveu. O novo projeto neoliberal esvaziou
mecanismos de planejamento e intervenção estatal (MIOTO, 2015, p.66).

Com a mudança de padrão mundial de acumulação e, mais objetivamente, com a


crise da dívida, o BNH foi extinto em 1986 (CARDOSO, 2013, p.17). A formulação da
política habitacional e de desenvolvimento urbano ficou a cargo do Ministério de
Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (FIX, 2011, p.111). O crédito imobiliário
passou por período de grande escassez. No período que vai do fim do BNH até o

5
As medidas restritivas estão endossadas pelo tripé macroeconômico que vem sendo a regra da política
econômica no Brasil desde o Plano Real (1994): regime de metas de inflação, fiscais (regime de restrições
aos gastos de governo) e pelo câmbio flutuante.

18
lançamento do Programa Minha Casa Minha Vida em 2009 as políticas habitacionais
implementadas foram escassas e pontuais.

A crise do financiamento habitacional pode ser identificada através das


variações do indicador que mede a relação entre o crédito habitacional e o PIB, que caiu
progressivamente de 10%, em 1998, para 4% no final dos anos 90, passando
abruptamente para 2% em 2001. (CARDOSO, 2013, p.20)

A redução da participação do Estado no financiamento habitacional fez com que


os capitais que permaneceram no setor da habitação procurassem desenvolver novas
formas de atuar. Essa redução tornou a produção mais dependente do capital financeiro
privado. As empresas do imobiliário passaram a lançar "planos de autofinanciamento
por meio dos quais o promotor centralizava e integrava os recursos financeiros dos
usuários antecipados à produção, independentes do SFH". (FIX, 2011, p.119)

Embora este período seja marcado por uma expressiva redução na capacidade de
financiamento, ocorreram também algumas inovações institucionais importantes (FIX,
2011). Uma delas foi a criação da Carta de Crédito, tanto para o FGTS quanto para o
SBPE, o que ampliou o poder de barganha dos tomadores de empréstimos frente às
empresas construtoras e aos vendedores de imóveis em geral (CARDOSO, 2013, p.22).
Esse movimento de ampliação do crédito, porém, foi limitado pelas altas taxas de juros
que prevaleceram no período. Com isso, praticamente se inviabilizou o financiamento
de longo prazo para as camadas de baixa renda e mesmo para parcela dos setores
médios (CARDOSO, 2013, p.23).

Após extinção do BNH, os programas federais que sobraram passaram a


privilegiar os municípios (CARDOSO, 2013, p.23). Essa tendência foi reforçada pela
centralidade dos municípios na reforma institucional e política promovida pela
Constituição de 1988 e também pelo fato de que a crise do sistema de financiamento e a
instabilidade institucional das políticas federais pós-BNH levaram vários municípios e
alguns estados a assumirem por conta própria iniciativas no campo da habitação social
(CARDOSO, 2013, p.24).

Entre 1994 e 2002 as crises financeiras internacionais que atingiram a economia


brasileira levaram o governo federal à adoção de maiores medidas de austeridade fiscal,
incluindo-se a limitação ao endividamento do setor público (CARDOSO, 2013, p.23). O

19
que teve como consequência forte restrição dos empréstimos do FGTS para a produção
de moradias por Estados e Municípios, o que levou à redução quase absoluta dos
financiamentos previstos pelo Programa Pró-Moradia, que se delineava até 1997 como
o principal programa para apoio à atuação dos governos locais no setor habitacional
(CARDOSO, 2013, p.24).

Para substituir o Pró-Moradia como alternativa para o financiamento da


produção de novas unidades habitacionais, o governo FHC criou o Programa de
Arrendamento Residencial (PAR) (CARDOSO, 2013, p.25). Com recursos do FGTS e
do OGU o programa permitiu certo grau de subsídios, reduzindo o valor das prestações
dos financiamentos sem prejudicar a saúde financeira do FGTS. Do ponto de vista
institucional o programa era operado pela Caixa Econômica Federal e o crédito era
repassado para companhias construtoras que, após a produção, entregavam os
empreendimentos para a Caixa, responsável pela alocação da população a ser
beneficiada. Nesse modelo cabia aos municípios o cadastramento da demanda, que
depois seria "filtrada" pela Caixa a partir dos seus critérios de risco (CARDOSO, 2013,
p.25).

A criação de incentivos para novos empreendimentos era realizada basicamente


através da redução das exigências urbanísticas e, eventualmente, através da cessão de
terrenos (CARDOSO, 2013, p.25). Outra inovação do programa foi a cessão dos
imóveis através do sistema de arrendamento, o que reduzia o risco, permitindo acelerar
as retomadas em casos de inadimplência. O PAR se destinava à faixa de renda de 3 a 6
salários mínimos, mas, segundo CARDOSO (2013, p.25), os primeiros estudos
avaliativos mostram que as populações atendidas se concentravam em limites
superiores.

Seja através dos mecanismos de autofinanciamento, seja através do PAR,


Cardoso (2013, p.26) aponta que uma consequência importante desse processo foi a
progressiva consolidação de um conjunto de empresas que passaram a se especializar
em produtos direcionados aos os setores de renda média baixa, desenvolvendo técnicas
específicas de barateamento dos custos de construção.

Outra inovação do governo FHC foi a criação do Sistema de Financiamento


Imobiliário (SFI), cujo objetivo era criar no Brasil um sistema de securitização de
hipotecas semelhante ao existente nos Estados Unidos. No Brasil, uma lei promulgada

20
em 1997 instituiu a possibilidade de criação de companhias securitizadoras. Mas a
tentativa de reproduzir o modelo americano não prosperou (CARDOSO, 2013, p.26).

Com eleição de Lula 2002, surgem novas expectativas para a institucionalização


da política habitacional (CARDOSO, 2013, p.28). A proposta de Lula em sua campanha
para o Projeto Moradia propunha sobretudo:

"i. Criação do Sistema Nacional de Habitação, formado pelos três entes da


Federação (União, Estados e Municípios), que atuariam de forma estruturada
sob a coordenação de um novo ministério.

ii. Gestão Democrática da Política Habitacional e Urbana, a partir da criação


dos conselhos nacional, estaduais e municipais de habitação que deveriam
definir as diretrizes e realizar a alocação de recursos da política habitacional
nos 3 níveis de governo.

iii. Aprovação do projeto de lei de iniciativa popular de instituição do Fundo


Nacional de Habitação, bandeira do movimento de moradia que tramitava
desde 1991 no Congresso Nacional.

iv. Retomada do financiamento habitacional para as camadas médias (SBPE),


visando concentrar ao máximo os recursos do FGTS no financiamento para a
baixa renda.

v. Articulação da política habitacional com a política de controle e


recuperação da valorização fundiária e imobiliária". (CARDOSO, 2013, p.28)

A criação do Ministério das Cidades em 2002 veio a dar continuidade a essas


propostas. A Secretaria Nacional de Habitação, ao longo do ano de 2003, desenvolveu
as bases normativas e institucionais da política de habitação, propondo a estruturação do
Sistema Nacional de Habitação. No entanto, a capacidade de atuação do Ministério era
limitada, principalmente pela falta de recursos para investimento (CARDOSO, 2013, p.
29)

Em 2005 foi aprovado o projeto de lei de criação do fundo de moradia


denominado de Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS)
(CARDOSO, 2013, p.30). A lei que instituiu o FNHIS também estabeleceu os
elementos institucionais básicos para a criação do Sistema Nacional de Habitação
baseado em uma distribuição das atribuições entre os 3 níveis de governo,
estabelecendo um papel fundamental para os municípios na implementação da política
de habitação. Para aderir ao sistema os estados e municípios deveriam se comprometer
com a criação de um fundo de habitação a ser gerido por um conselho com participação
popular, além da elaboração de um Plano Local de Habitação de Interesse Social

21
(PLHIS) que deveria estabelecer as diretrizes e prioridades da política em nível local.
(CARDOSO, 2013 p.31)

É importante ressaltar a mudança que se opera na política econômica do governo


a partir de 2006, com uma progressiva liberalização dos gastos públicos viabilizada pela
ampliação internacional das reservas que, por sua vez, foram possibilitadas pela
ampliação da exportação de commodities e pelo aumento expressivo de seu preço
internacional. (CARDOSO, 2013, p.33)

1.3 Introdução ao Programa Minha Casa Minha Vida

A reação do governo à crise internacional em 2008 foi rápida. Foram adotadas


medidas de expansão de créditos pelos bancos públicos (Banco do Brasil, BNDES e
Caixa Econômica), de forma a compensar a retração do setor privado. Medidas
anticíclicas foram aprovadas, como a continuidade dos investimentos em infraestrutura
previstos do PAC e Petrobrás (CARDOSO, 2013, p.20).

Como parte das tentativas do combate à crise o programa Minha Casa, Minha
Vida (MCMV) foi lançado em março de 2009. O pacote habitacional foi divulgado
como uma das principais políticas anticíclicas do governo Lula. Tinha o intuito de
fomentar a indústria da construção civil e manter o desenvolvimento do setor
imobiliário. Trata-se de um programa de financiamento e subsídios que aposta na
iniciativa privada como agente motora do processo (ARANTES e FIX, 2009, p.01).

"O programa foi aprovado pela Medida Provisória nº 459, publicada em 25


de março de 2009, posteriormente convertida na Lei no 11.977, de 7 de julho
2009, e pelo Decreto no 6962, de 17 de setembro de 2009. Tinha como meta
a construção de um milhão de moradias, em curto prazo, tendo para isso
alocado R$ 34 bilhões. Desse total, R$ 25,5 bilhões originavam-se do
Orçamento Geral da União e R$ 7,5 bilhões do FGTS. Foi ainda previsto um
investimento de R$ 1 bilhão para complementação de infraestrutura urbana, a
ser distribuído através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social". (CARDOSO, 2013, p.36)

O programa foi criado para atender a população de rendimento familiar entre 0 e


10 salários mínimos. "O objetivo declarado do governo federal é dirigir o setor
imobiliário para atender à demanda habitacional de baixa renda, que o mercado por si só
não alcança" (ARANTES e FIX, 2009, p.02). As “classes C e D", que no governo Lula

22
foram descobertas como "mercado", ainda possuíam grandes dificuldade no acesso à
moradia (ARANTES e FIX, 2009, p.02).

O MCMV tem atuação diferente conforme três faixas. A faixa 1 refere-se às


famílias com renda mensal bruta entre 0 e 3 salários mínimos; a faixa 2: 3 e 6 SMs; e a
faixa 3: 6 e 10 SMs. O programa, entretanto, não é "indexado" ao salário mínimo, o que
poderia ter provocado distorções e a exclusão dos mais pobres diante da política de seu
aumento sistemático que vem sido praticada desde o governo Lula. Por isso, as faixas
de renda foram definidas em reais, sem correção, cada qual associada a diferentes
fundos, níveis de subsídio, tetos de financiamento e custos de produção (AMORE,
2009, p.19).

Quadro 03: Faixas de renda do PMCMV por fases do programa


Fase Faixa Renda Familiar
Faixa 1 Até 1.395,00 reais
Fase 1 Faixa 2 De 1.395,01 a 2.790,00 reais
Faixa 3 De 2.790,01 a 4.650,00 reais
Faixa 1 Até 1.600,00 reais
Fase 2 Faixa 2 De 1.600,01 a 3.100,00 reais
Faixa 3 De 3.100,01 a 5.000,00 reais
Fonte: AMORE, 2015, p.22 (elaboração própria)

A meta da primeira fase do programa foi de contratação de um milhão de


unidades habitacionais divididas entre as 3 faixas, sendo 40% delas destinadas à faixa 1;
40% destinadas à faixa 2 e; 20% à faixa 3 (CARDOSO, 2013, p.42). Operacionalmente
o MCMV se estruturou, além de pelas faixas de renda, por modalidades de
subprogramas (PNHU, PNHR, MCMV Entidades, MCMV abaixo de 50.000) seguindo
o seguinte modelo apresentado por Cardoso (2013):

1) Faixa 1 - execução via FAR: a produção é "por oferta", ou seja, a construtora


define o terreno e o projeto, que são aprovados junto aos órgãos competentes e depois
vendidos integralmente para a CAIXA, sem gastos de incorporação imobiliária e
comercialização, e sem risco de inadimplência dos compradores ou de que as unidades
não sejam ocupadas. A CAIXA define o acesso às unidades a partir de listas de
demanda, elaboradas por cadastro efetuado pelas prefeituras. Os municípios também
participam a partir de doação de terrenos, isenção tributária e desburocratização nos
processos de aprovação e licenciamento e na flexibilização das normas urbanísticas para

23
permitir aumentar os índices de utilização do solo nos empreendimentos. (CARDOSO,
2013, p.37)

2) Faixa 1 - execução via MCMV Entidades: Financiamento ocorre pelo Fundo


de Desenvolvimento Social (FDS). Entidades sem fins lucrativos, como cooperativas e
associações de moradia, apresentam projetos à CAIXA, que podem ser em parceria com
estado e município. A CAIXA analisa, e após conclusão, envia ao Ministério das
Cidades a relação de projetos para a seleção. O Ministério das Cidades faz a seleção e
reencaminha à CAIXA que aguarda o envio, pela entidade selecionada, da lista de
beneficiários a serem atendidos. A CAIXA efetua a análise de enquadramento dos
beneficiários indicados, contrata a operação e acompanha a execução da obra.
(CARDOSO, 2013, p.38)

3) Faixas 2 e 3 - financiamento via FGTS: As construtoras e incorporadoras


apresentam projetos de empreendimento à CAIXA, que realiza pré-avaliação e autoriza
o lançamento e comercialização. Após a conclusão da análise e comprovação da
comercialização mínima exigida, é assinado o Contrato de Financiamento à Produção.
A comercialização é feita pelas construtoras ou através dos "feirões" da Caixa, havendo
a possibilidade de que os pretendentes à aquisição consigam uma carta de crédito na
Caixa para ir ao mercado buscar uma moradia. (CARODOSO, 2013, p.39)

4) Municípios com menos de 50 mil habitantes/ sub 50: o financiamento é


operado através de Agentes Financeiros Privados (e não pela Caixa Econômica). A
operacionalização dessa modalidade é feita via oferta pública de recursos. As
instituições financeiras se inscrevem e são selecionadas pela CAIXA, que em conjunto
com o Ministério das Cidades, define e publica o volume de recursos destinado a cada
Agente Financeiro, ficando cada um responsável por uma determinada região. O
Ministério das Cidades também recebe, via site, o cadastro de propostas dos entes
federados, que são então selecionadas tendo como referência o déficit habitacional
municipal. Os agentes financeiros são os responsáveis pela análise de risco e
contratação das propostas selecionadas, e por manter o Ministério das Cidades
informado sobre as contratações. (CARDOSO, 2013, p.40)

Podemos entender o MCMV como um programa de crédito tanto ao consumidor


quanto ao produtor. No caso da produção o construtor solicita crédito à CAIXA para
construção de empreendimentos direcionados ao público, divididos nas três faixas de

24
renda (CARDOSO, 2013, p.40). Para cada tipo de empreendimento construído, as
unidades devem ser comercializadas no valor definido dentro de limites estabelecidos
conforme características especificas de cada cidade e região, envolvendo níveis
diferentes de subsídio de acordo com a faixa de renda. (CARDOSO, 2013, p.41)

Quanto ao seu financiamento, Mariana Fix (2011) aponta que o MCMV não
trouxe grandes inovações. Foram do BNH as mudanças mais significativas no
financiamento imobiliário, com a criação do FGTS e do SBPE, que continuam a ser as
principais fontes de recurso. A grande novidade do programa são os subsídios diretos
com recursos do Orçamento da União destinados à faixa de menor renda. (FIX, 2011,
p.144)

Contratada a meta de um milhão de unidades habitacionais (UHs) estabelecida


em seu lançamento, em maio de 2011 dá-se início o Programa Minha Casa Minha Vida
2, alocando novos recursos e ajustando seu funcionamento a partir das críticas
realizadas por pesquisadores da área e movimentos sociais em sua primeira etapa
(AMORE, 2015, p.19), essas principalmente referentes à falta de exigências às
construtoras e a desproporcionalidade da divisão dos recursos, tendo em vista o que
cada faixa abrange do déficit.

Em sua segunda fase, o MCMV passa a integrar o Programa de Aceleração do


Crescimento (PAC) em sua vertente de investimentos em infraestrutura social e urbana
(BALBIM e KRAUSE 2015, p.09). Aumentou-se o custo máximo permitido por
unidade e incorporou-se especificações mínimas que incluíram a exigência de
acessibilidade universal, especificações sobre as dimensões dos cômodos e sobre
padrões mínimos de acabamento. A meta para a faixa 1 passou de 40% para 60% das
contratações, número mais condizente com a proporção do déficit habitacional. O
programa ainda incluiu a habitação rural pelo Programa Nacional de Habitação Rural
(PNHR)6. (AMORE, 2015, p.21)

6
Os investimentos no PNHR são a partir de recursos orçamentários e do FGTS, contratados com
entidades governamentais e sociais – sindicatos, associações, cooperativas. Nesse caso, não valem os
critérios de por renda familiar mensal, mas pela renda anual, dado a sazonalidade das safras ou produção
agropecuária. (AMORE 2015, p.19)

25
Quadro 04: Metas quantitativas (unidades e investimento) por fases, faixa de renda e
modalidade:
Fase Faixa Modalidade Uhs % Investimento
FAR s/ esp.
Faixa 1 FDS (Entidades) 30.000 3%
Rural (PNHR) s/ esp.
Fase 1
Faixa 1- total 400.000 40%
Faixa 2 FGTS 400.000 40%
Faixa 3 FGTS 200.000 20%
Fase 1 - Totais 1.000.000 100% R$ 28 bi
FAR 860.000 43%
FDS (Entidades) 60.000 3%
Faixa 1
Rural (PNHR) 60.000 3%
Fase 2 Oferta pública 220.000 11%
Faixa 1 - total 1.200.000 60%
Faixa 2 FGTS 600.000 30%
Faixa 3 FGTS 200.000 10%
Fase 2 - totais 2.000.000 100% R$ 125 bi
Fonte: AMORE, 2015, p.22

A segunda fase do programa também se completou e atingiu sua meta. O


MCMV3, acaba de ser lançado e traz mudanças para as próximas contratações. As
principais são a introdução de uma faixa intermediária, a faixa 1,5 de renda entre
R$1.800 e R$2.350 e o aumento dos juros cobrados para as famílias que recebem a
partir de R$2.350 por mês (LAPORTA, 2015).

As parcelas pagas pelas famílias que tem a casa subsidiada também aumentaram,
e esse aumento foi setorizado. Para as famílias que recebem até R$800, a parcela será
fixa de R$80. As que recebem entre R$800 e 1.200 pagarão 10% da renda. Famílias
com renda entre R$ 1.200 e 1.600 terão percentual de 15%. E para as de renda entre
R$1.600 e 1.800 será de 20%. (LAPORTA, 2015). A nova meta é de 3 milhões de
contratações (BALBIM, 2015).

Quadro 05: Faixas de atuação do MCMV 3 e taxas de juros a serem cobradas:


Faixa Renda Juros
Faixa 1 Até R$ 1.800 0
Faixa 1,5 Entre R$ 1.800 e R$ 2.350 5%
Faixa 2 Entre 2.350 e R$ 3.600 6% a 7%
Faixa 3 Entre R$ 3.600 e R$ 6.500 8%

Fonte: LAPORTA, 2015 (elaboração própria)

26
No segundo semestre de 2015, a crise internacional chega ao Brasil com mais
força, e a reação do governo tem sido contrária à anticíclica de 2008. A resposta dada,
até o momento, foi por meio de medidas de austeridade traduzidas pelo ajuste fiscal. O
Ministro do Planejamento Joaquim Levy anunciou corte no Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) de R$ 7 bilhões. Em seu trecho que trata do Minha Casa, Minha
Vida, esse será R$ 4,8 bilhões (FOLHA, 2015). Foi decidido que o FGTS passará a
direcionar recursos para o pagamento das despesas da faixa 1, para desonerar o
orçamento da União (FOLHA, 2015). Mesmo com os cortes, o governo mantém sua
meta estabelecida de 3 milhões de contratações. A reação dos movimentos sociais tem
sido de protesto aos cortes e retrocessos que a política recessiva trará.

Gráfico 01: Números MCMV em UHs (faixa 1)

4,022,695

2,775,260
2,364,112

855,971
391,464

Contratado Preparação Obra Concluídas Entregues

Fonte: CAIXA, 2015 (elaboração própria)

É inegável a grande proporção de famílias atingidas pelo programa. O Gráfico 1


descreve os números alcançados pelo programa até agosto de 2015. Já foram
contratadas mais de 4 milhões de unidades e mais de 2 milhões de moradias já foram
entregues. Esses números são inéditos na história da habitação do país, ainda mais por
se referirem às unidades destinadas às famílias de baixa renda. No entanto, não se pode
analisar os dados somente quantitativamente, o MCMV possuí também fragilidades,
que este trabalho busca abordar com o estudo de caso.

27
CAPÍTULO 02: O CONJUNTO RESIDENCIAL EMÍLIO BOSCO E AS
FRAGILIDADES DO MINHA CASA MINHA VIDA

2.1 A Região Metropolitana de Campinas e o município de Sumaré

A Região Metropolitana de Campinas (RMC) foi institucionalizada no ano 2000


e, conforme estimativa populacional do IBGE, chega em 2015 à marca de 3,09 milhões
de habitantes7, distribuídos em 3.791 km². Esta unidade regional do Estado de São
Paulo é constituída pelo agrupamento de 19 municípios: Americana, Artur Nogueira,
Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Holambra, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba,
Jaguariúna, Monte Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Barbara d'Oeste, Santo
Antônio de Posse, Vinhedo, Valinhos e Sumaré. (BRANDÃO, 2002, p.400)

A herança de antigo e precoce entreposto mercantil e, posteriormente, do mais


importante núcleo do complexo cafeeiro paulista, criou as bases para o futuro
dinamismo da agricultura, para a eficiente infraestrutura de transporte e para a qualidade
da rede urbana do que viria a ser a atual RMC. Esse processo, desde início, fortaleceu a
centralidade de Campinas consolidando-a como capital regional (BRANDÃO, 2002,
p.401). A diversificada agricultura regional implementou alta complementaridade
articulada das atividades agropecuárias com as industrias terciarias de serviços. A RMC
é marcada pela densidade de conexões e interdependências desses serviços
(BRANDÃO, 2002, p.401)

A partir dos anos 1960 e principalmente depois década de 1970, a RMC recebeu
grandes investimentos governamentais, tornando-se um dos maiores eixos de expansão
industrial no interior do Estado (CUNHA, 2009, p.339). A região atraiu modernas
plantas de grandes empresas e as relações intersetoriais com agropecuária e o setor
terciário se intensificaram (BRANDÃO, 2002 p.402). Tal fato levou a um crescimento
desordenado da mancha urbana, criando para Campinas problemas típicos de grandes
metrópoles, como falta de moradia e o consequente processo de favelização,
especulação imobiliária desenfreada e baixos salários. Este processo gerou um padrão
de crescimento físico em áreas intermediárias vazias e horizontalização com grande
ação especulativa mercantil (CUNHA, 2009, p.441). Durante a década de 1980, a

7
Fonte: IBGE - disponível em: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=
1&idnoticia=2972

28
população desconcentrou-se da cidade de Campinas, dirigindo-se aos municípios
vizinhos, o que acabou por transformar alguns deles em cidades-dormitórios.

A dinâmica de expansão horizontal na RMC produziu espaços descontínuos com


ocupação rarefeita, principalmente na direção sul e sudoeste. Os principais eixos de
expansão foram seguindo a direção das principais vias de acesso regional. As áreas em
que a população tem crescido de forma muito mais intensa são: a oeste (especialmente
Hortolândia), norte (direção de Paulínia) e sudoeste (direção de Indaiatuba) seguindo a
Rodovia Dom Pedro I. Existe na região marcante heterogeneidade estrutural. A situação
desfavorável dos eixos Oeste e Sudoeste da região, em termos da infraestrutura
domiciliar, se contrapõe com a formação de uma “cordilheira da riqueza” (CUNHA,
2009, p.345) nos demais eixos. Segundo Cunha (2009) a Via Anhanguera se estabelece
como um verdadeiro divisor de águas concentrando espacialmente a riqueza e a pobreza
na RMC.

O município de Sumaré foi instituído em 1954 por desmembramento do


município de Campinas. Localizado a oeste da RMC, abrange área de 153 km² e limita-
se com Hortolândia, Campinas, Santa Bárbara, Nova Odessa, Monte-Mor e Paulínia. O
município é dividido em 6 distritos: distrito-sede, Jardim Dall’Orto, Picerno, Maria
Antonia, Área Cura e Matão8. A população do município, estimada em 2015 pelo IBGE,
é de 265.955 habitantes9. Sumaré insere-se no grupo de municípios da RMC que
apresenta maior dinamismo econômico, ditado por sua diversificada indústria10, mas
também se caracteriza por abrigar uma expressiva massa de população de média e baixa
renda, que se valeu de preços mais baixos de terras urbanas. Com a intensificação da
industrialização na década de 1970, novos contingentes imigraram e se fixaram no
município (BRANDÃO, 2002, p.188).

8
Fonte: Prefeitura de Sumaré - disponível em: <www.sumare.sp.gov.br/mapas.htm>
9
Fonte: IBGE - disponível em <www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=355240>
10
Com a expansão industrial na Via Anhanguera muitas empresas de grande porte instalaram plantas no
município de Sumaré. Os ramos com maior expressão são metalúrgico, químico, elétrico e têxtil e dentre
as principais empresas podemos destacar: Honda, 3M do Brasil, Villares, Adere, Amanco, Buckman,
Wabco, Pastifício Selmi, Pirelli, Sata Brasil, Quinta Roda, Desleeclama, Syngenta, Sherwin Williams,
Schneider, Transitions Opticals, Sotreq, PPG. (PREFEITURA DE SUMARÉ, 2015)

29
Figura 1: Mapa da Região Metropolitana de Campinas

Fonte: www.sumare.sp.gov.br/mapas.htm

Figura 2: Mapa do Município de Sumaré Subdividido em Regiões

Fonte: www.sumare.sp.gov.br/mapas.htm

Segundo Brandão (2002, p.188), embora a estrutura industrial de Sumaré conte


com grandes empresas de ramos mais dinâmicos, seus efeitos positivos e reflexos
urbanos tendem a ser drenados para Campinas, onde reside a mão-de-obra
especializada. O município apresenta quadro preocupante de indicadores sociais, que
tanto limitam a qualificação de seus trabalhadores quanto reforçam o atendimento de
demandas mais sofisticadas do próprio município por Campinas (BRANDÃO, 2002,
p.189).

30
Conforme dados disponibilizados pela Prefeitura, Sumaré em 2011 tinha um
déficit habitacional estimado em 8.743 unidades, porém, desde que o MCMV começou
a atuar no município esse número vem caindo significativamente. O município já tem
5.636 unidades do programa entregues à faixa 1, essas divididas em 20 condomínios e 3
empreendimentos. Desde 2013 o programa tem sido o foco da secretaria da habitação e
o primeiro conjunto entregue foi o Emílio Bosco, o caso selecionado para a pesquisa.

2.2 Metodologia

A metodologia do estudo de caso baseou-se em trabalho de campo,


complementado pela análise de relatórios do Trabalho Social realizado no Conjunto
estudado.

Foi realizada entrevista com a secretária suplente da habitação do município de


Sumaré, Débora Araujo, e a assistente social responsável, Adriana de Oliveira. Foram
consultados os vinte e um relatórios do Trabalho Social (TS) realizado com os
moradores, cada um referente a um mês de trabalho. Desses, três foram feitos antes da
posse das famílias e dezoito após ocupação do conjunto. O regime do TS foi misto,
sendo nos dez primeiros meses realizados pelos assistentes sociais da própria secretaria
da habitação, e nove meses pela empresa privada Sane Hambiental.

Dos relatórios retirou-se informações referente ao diagnóstico social das famílias


selecionadas pelo programa, localização anterior e condições das estruturas locais do
Conjunto Emílio Bosco. Ademais foram realizadas visitas técnicas ao local, e
entrevistas com vinte e uma famílias. O questionário aplicado focou na percepção dos
moradores quanto à localização e estruturas de serviços privados e públicos das
proximidades do conjunto. As entrevistas nesta pesquisa têm caráter mais qualitativo
que quantitativo, uma vez que algumas das perguntas obtiveram resultados
inconclusivos devido ao tamanho da pesquisa e à variedade de respostas. Em parte das
questões, as famílias deveriam avaliar sua percepção do item perguntado entre cinco
opções: péssimo, ruim, regular, bom e ótimo, e será dessa forma que serão dispostos os
resultados ao longo deste trabalho.

31
2.3 O Conjunto Residencial Emílio Bosco:

O Conjunto Residencial Emílio Bosco localiza-se no município de Sumaré, no


distrito do Matão. O conjunto foi um empreendimento da segunda fase do programa e
enquadra-se na modalidade MCMV-FAR. A construção foi realizada pela construtora
Cury e as unidades foram entregues às famílias em outubro de 2013. A assistente social
Adriana de Oliveira relatou em entrevista que a composição da demanda foi feita
totalmente por indicação, em razão de pressões oriundas de políticas de reintegração de
posse que ocorriam no município11, o que se diferencia da forma que posteriormente
veio a ser usual no município, composta de 50% indicação e 50% sorteio.

Os 560 apartamentos estão divididos em 28 blocos/torres, cada um com 5


pavimentos (térreo mais quatro andares) e 20 unidades habitacionais, ou seja, 4 UHs por
pavimento, sendo 16 dessas adaptadas para deficientes. O conjunto também possui 476
vagas de garagem, 2 salões de festa e 4 churrasqueiras. O conjunto é um condomínio
com grade e portaria, os apartamentos possuem: dois dormitórios, um banheiro, sala,
cozinha e área de serviço, o fornecimento de água e gás é individual. O tamanho das
unidades é de 43,24 m² de área privativa e 20,485 m² de áreas comuns. As unidades
adaptadas para deficientes possuem 49,68 m² de área privativa e 23,536m² de área
comum. O valor total do empreendimento contabilizou R$21.401.747,45, sendo que 6%
desses recursos do FAR foram destinados à investimento nas estruturas urbanas locais.

Figuras 3, 4, 5 e 6: Conjunto Residencial Emílio Bosco

Fonte: http://www.sumare.sp.gov.br/

11
Conforme informado pela secretaria da habitação, em 2013 foram realizadas no município de Sumaré
uma série de políticas que envolveram a reintegração de posse de áreas de risco e demolição de moradias
precárias. Ainda segundo a secretaria as regiões das quais as famílias são originárias se encontravam às
margens do curso de água e sofriam com alagamentos constantes.

32
Foto da portaria e área comum do conjunto Emílio Bosco. Fonte: GoogleMaps

Fotos da autora do Conjunto Emílio Bosco tiradas em visita realizada em outubro de 2015

É importante resaltar que após a implantação do Conjunto Emílio Bosco o maior


empreendimento do MCMV do município foi construído nas imediações. Do lado
oposto da Avenida Emílio Bosco foram implantados mais 8 conjuntos, esses que
terminaram de ser entregues em outubro de 2015, totalizando com o Residencial Emílio
Bosco 9 condomínios e 2.736 famílias. O Emílio Bosco é o primeiro deles e o único
localizado do lado oeste da Avenida Emílio Bosco, sendo os demais localizados à leste
da avenida, em terreno contíguo.

33
Figuras 7, 8, 9 e 10: Região do Residencial Emílio Bosco

Imagem da Av. Emílio Bosco, com Conjunto Residencial Emílio Bosco à esquerda e Conjunto Poços de
Caldas em frente (Foto retirada do GoogleMaps)

Imagem da Av. Emílio Bosco, à esquerda temos a portaria Conjunto Residencial Emílio Bosco e todas as
edificações que podemos ver a direita são condomínios do MCMV (Foto retirada do GoogleMaps)

Imagem tirada a partir da perspectiva que se têm da portaria do Conjunto Emílio Bosco (Foto retirada do
Google Maps)

34
Foto de uma das torres do conjunto Poços de Caldas com bandeira do MTST (Movimento dos
Trabalhadores sem Teto). (Foto da autora, maio de 2015)

2.3.1 Perfil e origem das famílias:

Este subitem apresenta e analisa dados do diagnóstico social elaborado pela


pesquisa do trabalho técnico social realizado pela Prefeitura de Sumaré em julho de
2013. Serão abordados os seguintes aspectos: origem das famílias, faixa etária, grau de
escolaridade, situação empregatícia, renda familiar e quantidade de membros por
família.

O Conjunto Emílio Bosco tem sua demanda composta inteiramente por


indicação. Das famílias indicadas 22% estavam dependentes do auxílio aluguel, mas
viviam antes em áreas de risco e tiveram sua moradia destruída ou interditada
geralmente por deslizamentos e desmoronamentos. As demais 78% vieram da política
de remoção de favelas no município e são oriundas de três bairros: o Parque
Franceschini, o Jardim Basilicata e o Jardim Alvorada, todos localizados na região
central de Sumaré. A assistente social Adriana de Oliveira relatou que parte das famílias
ofereceu resistência à mudança, por estarem acostumados a região de suas antigas
moradias e pela existência de laços de vizinhança não queriam sair dos locais de
origem. O Gráfico 2 dispõe as origens das famílias em porcentagem no Conjunto:

35
Gráfico 2: Conjunto Emílio Bosco - Origem das Famílias

22% 25%
Pq. Franceschini
Jd. Basilicata
Jd. Alvorada
17%
Auxílio Moradia

36%

Fonte: Primeira Medição do Trabalho Técnico Social MCMV (elaboração própria)

Dos titulares da casa12 75,9% são mulheres. Como é regra o Cadastro Único ser
feito em nome das mulheres, os 24,1% titulares homens são provavelmente sozinhos e
sem companheiras. Declararam-se ser chefiadas por mulheres 43,75% das famílias. A
faixa etária dos titulares e cônjuges revela que há um alto índice de jovens chefes de
família (faixa etária de 25 a 39 anos). O conjunto também tem 11% de titulares idosos,
atendendo ao pré-requisito estipulado nas regras do programa de 3%.

Gráfico 03: Conjunto Emílio Bosco - Faixa etária dos titulares e cônjuges

60 ou mais 11%

40 - 59 anos 35%

25 - 39 anos 43%

18 - 24 anos 11%

Fonte: Primeira Medição do Trabalho Técnico Social MCMV (elaboração própria)

Quanto ao grau de escolaridade do titular e cônjuge, a pesquisa realizada pelo


trabalho social pode observar que o grau de escolaridade é baixo, sendo predominante o

12
Por titulares entende-se o membro da família no nome de quem é feito o castro no Cadastro Único, o
qual o MCMV está integrado.

36
ensino fundamental. Os primeiro titulares e cônjuges que chegaram a concluir o Ensino
Médio são poucos, aproximadamente 13%.

Gráfico 4 e 5: Conjunto Emílio Bosco - Grau de escolaridade do primeiro titular (à


esquerda), Grau de escolaridade do Cônjuge (à direita):

Não Informou 6.07% Não Informou 6.56%


Superior Completo 0.18% Superior Completo 0.00%
Superior Incompleto 0.54% Superior Incompleto 0.00%
Ensino Médio Completo 12.50% Ensino Médio Completo 13.52%
Ensino Médio Incompleto 8.21% Ensino Médio Incompleto 8.61%
Ensino Fundamental 42.50% Ensino Fundamental 39.34%
Educação Infantil 24.29% Educação Infantil 25.41%
Analfabeto 5.71% Analfabeto 6.56%

Fonte: Primeira Medição do Trabalho Técnico Social MCMV (elaboração própria)

A situação empregatícia de titulares e cônjuges conjuntamente, às vésperas da


posse do conjunto, mostra uma grande concentração na opção trabalhador autônomo
(34,5% dos entrevistados), o que sugere um grande índice de famílias que vivem do
trabalho informal. Tal fato impõe uma fragilidade a mais às famílias, por na
informalidade não estarem assegurados direitos e seguranças que o trabalho formal
oferece. Dos demais beneficiados 26% declararam estar registrados e 10% declararam
ser aposentados ou pensionistas.

Gráfico 6: Conjunto Emílio Bosco - Situação de emprego

Não Informou 2.0%

Desempregados 9.5%

Aposentadoria e Pensão 10.0%

Trabalho Registrado 26.0%

Lar 18.0%

Autônomos 34.5%

Fonte: Primeira Medição do Trabalho Técnico Social MCMV (elaboração própria)

37
A renda das famílias beneficiadas está concentrada principalmente entre 1 e 2
salários mínimos, mostrando que o programa no caso realmente abrange as famílias de
baixa renda. Vale ressaltar que 8% das famílias declaram-se sem renda durante a
pesquisa realizada pelo TS em 2013, o que aponta para uma grande dificuldade no
cumprimento com as obrigações que a mudança para o conjunto do MCMV traz. Essas,
principalmente relacionadas ao pagamento da taxa condominial, que no caso do Emílio
Bosco é de R$80, a prestação mínima de R$25 mensais, e as contas de água, energia e
gás, contas novas, que as famílias, antes vivendo em ocupações irregulares, não
enfrentavam. Podemos estender essa dificuldade às famílias que também declararam
receber até 1 SM (18,39% das famílias), já que em sua soma as contas associadas a casa
comprometem uma porcentagem significativa do orçamento familiar.

Gráfico 07: Conjunto Emílio Bosco - Renda Familiar

56.25%

18.39%

8% 9.64% 7.67%

Sem renda 0 - 1 SM 1 - 2 SMs 2 e 3 SMs não


informou
.

Fonte: Primeira Medição do Trabalho Técnico Social MCMV (elaboração própria)

Sobre a quantidade de moradores por UH, 81,4% das famílias declararam ter até
4 membros, o que condiz com as dimensões do apartamento. Mesmo com essa grande
concentração de famílias relativamente menores não se pode ignorar o fato de existirem
no conjunto famílias de até 10 membros (20,2% delas). Assim, considerada a rigidez do
programa quanto à tipologia e tamanho da unidade, que no caso do Conjunto Emílio
Bosco é padrão - 2 quartos, sala, cozinha, 1 banheiro e área de serviços -, as
necessidades das famílias com mais membros podem não estar sendo plenamente
atendidas.

38
Gráfico 08: Conjunto Emílio Bosco - Quantidade de pessoas por família

1 pessoas 15.54%

2 pessoas 20.18%

3 pessoas 24.82%

4 pessoas 20.89%

5 pessoas 11.07%

6 pessoas 3.75%

7 pessoas 1.07%

8 pessoas 1.07%

9 pessoas 0.36%

10 pessoas 1.80%

Não informou 1.07%

Fonte: Primeira Medição do Trabalho Técnico Social MCMV (elaboração própria)

2.3.2 Localização e estruturas

O Conjunto Emílio Bosco está localizado em zona periférica da cidade. O Matão


é o distrito de Sumaré localizado mais à leste do município, ou seja, no sentido oposto
ao centro. A Av. Emílio Bosco tem início na centralidade do Matão, e possuí extensão
de 4,8 km. O Conjunto Emílio Bosco localiza-se à 3,6 km do início da avenida. A
localização, entretanto, tem a vantagem de dar fácil acesso à Via Anhanguera e está
muito próximo ao limite de Sumaré com Paulínia e Campinas

A Emílio Bosco é uma avenida movimentada e comercial em sua porção inicial.


Conforme segue-se em direção ao conjunto os comércios e serviços vão ficando cada
vez mais escassos e a densidade da ocupação urbana vai diminuindo. Em uma das
visitas realizadas ao conjunto entrevistei um morador que já vivia na região. O
entrevistado contou que antes da construção do conjunto o terreno onde se encontra o
Emílio Bosco era uma plantação de cana e que "dali pra frente não tinha mais nada".

As imagens a seguir mostram a região em 2011, à direita, e em 2015, à esquerda.


A comparação sugere o limite da ocupação cidade no ponto em que hoje se encontra o
Conjunto Emílio Bosco. As imagens 11 e 12 mostram a Av. Emílio Bosco e a sua
margem esquerda na qual se localiza hoje o Conjunto Emílio Bosco. As imagens 13 e

39
14 mostram o sentido oposto, ou seja, a Av. Emílio Bosco, em uma mesma altura, mas a
perspectiva é em direção ao centro de Matão, onde em 2011 ainda há ocupação,
diferente da imagem 11.

Imagens 11 e 12: Visão da chegada ao Emílio Bosco 2011 e 2015

Fotos da região do Emílio Bosco em dois períodos 2011 à esquerda e 2015 à direita. Na Imagem 12,
vemos ao fundo à esquerda o conjunto Emílio Bosco. (Fotos retiradas do GoogleMaps)

Imagens 13 e 14: Visão da outra perspectiva da Av. Emílio Bosco, sentido centro de
Matão, 2011 e 2015

Fotos da região do Emílio Bosco, capturadas na mesma altura da Av. Emílio Bosco, das Imagens 13 e 14,
porém no sentido contrário ao conjunto. A imagem 13 refere-se à 2011 e a imagem 14 à 2015. (Fotos
retiradas do GoogleMaps)

A infraestrutura local de comércio, dada a quantidade de famílias que hoje vive


na região, é bastante limitada, com apenas um supermercado de médio porte e algumas
outras poucas lojas e lanchonetes. Todos os moradores entrevistados declararam que ao
mudarem não havia nenhuma rede de comércio local e para fazer compras básicas da
casa chegavam a caminhar cerca de 45 minutos.

Tanto o Jd. Basilicata, quanto Pq. Franceschini e o Jd. Alvorada, origens


principais dos moradores do Emílio Bosco, estão localizados em áreas centrais da

40
cidade, supridas de vasta rede de comércio e serviços. Durante a aplicação dos
questionários, os entrevistados mostraram-se insatisfeitos com a localização do
conjunto. Relataram que ainda voltam ao local de origem para atividades como lazer,
compras e trabalho. Todas as famílias entrevistadas avaliaram a localização de regular a
péssimo, sendo que 28,57% avaliaram como regular, 42,86% como ruim e também
28,57% como péssimo.

Abaixo estão descritos os deslocamentos sofridos pelas famílias da moradia de


origem para o Conjunto. O Jardim Basilicata fica a um raio de distância de 11,5 km do
conjunto Emílio Bosco, o parque Franceschini 11,3 km e o Jardim Alvorada 10,9 km. Já
a distância realizada pelo trajeto de carro é respectivamente 17 km, 22 km e também 17
km13.

Figura 15: Distância Jardim Basilicata - Conjunto Emílio Bosco

Fonte: Google Maps (elaboração própria)

13
O calculo do deslocamento é aproximado e foi feito a partir das coordenadas do bairros em questão.

41
Figura 16: Distância Parque Franceschini - Conjunto Emílio Bosco

Fonte: Google Maps (elaboração própria)

Figura 17: Distância Jardim Alvorada - Conjunto Emílio Bosco

Fonte: Google Maps (elaboração própria)

42
Figura 13: Distância e Tempo de Carro

Fonte: Google Maps (elaboração própria)

As famílias entrevistadas declararam utilizar o transporte público local, o ônibus.


Todas avaliaram este como ruim ou péssimo (98,48% das famílias avaliaram como
péssimo e 9,52% como ruim). As reclamações mais frequentes foram em relação ao
grande tempo de espera e lotação dos ônibus.

Os entrevistados que estavam empregados no momento da entrevista declararam


que os deslocamentos para o trabalho aumentaram desde a mudança para o Conjunto
Emílio Bosco. Os resultados, porém, são inconclusivos a esse respeito já que a maioria
dos moradores entrevistados estava desempregado.

O relatório do trabalho técnico social descreveu que três meses antes da entrega
do conjunto (em julho de 2013) foram realizadas diversas reuniões com responsáveis
pelas Secretarias da cidade. O TS deu destaque à participação das Secretarias da
Educação, Saúde e Segurança, que se mostraram as mais preocupadas com as novas
demandas que o conjunto iria gerar. Observou-se, no relatório de julho de 2013 que os
equipamentos públicos estavam, no geral, com suas capacidades de atendimento já
extrapoladas.

No que tange a rede de ensino, a Secretaria da Educação declarou que as escolas


já atendiam um número excessivo de crianças e adolescentes e não seria possível a
absorção de novos alunos. O 4º Distrito Policial de Sumaré, responsável pela região do

43
Matão, alegou que não havia policiais suficientes para atender a nova demanda gerada
pelo conjunto. Já a Saúde declarou ter o equipamento completo, mas que também não
tinha capacidade para atender o novo contingente de 560 famílias.

O primeiro relatório do TS, também ressaltou a quase inexistência lugares


destinados à cultura e lazer e poucos equipamentos comunitários. Foi mapeado somente
um espaço, o Centro Cultural Matão, localizado à aproximadamente 1.650 metros do
Conjunto, e que dificilmente supriria a demanda gerada pelas novas 560 famílias na
região. Próximo da região não há parques, praças ou outra área pública de lazer.

A conclusão gerada a partir das reuniões com as secretarias foi de que


construção do conjunto significaria um estrangulamento dos serviços públicos
oferecidos na região. Foi necessário, assim, um reordenamento dos investimentos na
região para poder servir minimamente essa nova população. Dos recursos do FAR 6%
foram destinados ao investimento nos equipamentos públicos e urbanos. Atualmente foi
declarado pela secretaria da habitação que, apesar do estimulo aos outros serviços
relatados, a cultura e o lazer continuam escassos e nenhum novo espaço foi implantado.

Todas as famílias entrevistadas avaliaram as opções de cultura e lazer da região


como ruins ou péssimas. Um fato observado é que grande parte dos entrevistados
ficaram confusos com a pergunta, principalmente no referente à cultura, o que aponta
para completa falta de acesso. Muitos responderam que ficavam em casa vendo
televisão, ou desciam para conversar nas áreas comuns do conjunto, que é basicamente
o estacionamento. Os moradores com filhos ainda crianças reclamaram da ausência de
lugares para as crianças brincarem, e que os filhos acabam jogando futebol ou na rua ou
no hall e estacionamento do conjunto, o que eles não consideram nem seguro e nem
adequado.

Quanto à saúde e educação, atualmente não há falta de vaga. Sobre a


infraestrutura de educação, a maioria dos entrevistados está satisfeito. Sobre a saúde as
opiniões foram muito divididas. O serviço existe e é utilizado, a maior reclamação foi
em relação ao "postinho" que atende a região, foi apontado a falta de profissionais
capacitados para atender a população. No entanto, dentre as entrevistas, conversamos
com duas moradoras gestantes, as quais afirmaram que para elas o atendimento é muito
bom, e há total apoio, com o acompanhamento ambulatório.

44
2.3.3 Gastos e organização condominial

O programa MCMV beneficia as famílias, mas também exige compromissos. As


famílias, que antes moravam em áreas irregulares, hoje se deparam com novos gastos.
Quanto ao valor da casa, os beneficiários têm de cumprir, por 10 anos, com o
pagamento mensal da taxa de 5% da renda familiar, sendo a prestação mínima de
R$2514. As demais novas responsabilidades dos moradores são com, principalmente, as
contas de água, energia elétrica, gás e a taxa condominial, todas individuais por
unidade. Há por enquanto como outro benefício ao Conjunto a isenção do IPTU.

Além dessas novas contas, as famílias se defrontam também com maiores gastos
com transporte, já que hoje se locomovem mais, voltando ao seu local de origem para
atividades relacionadas a algumas compras, lazer e trabalho, e várias localidades
necessitam de duas conduções para chegar. Das famílias entrevistadas, 90,5%
declararam que as contas aumentaram desde a mudança para o condomínio, sendo os
principais componentes desse gasto a conta de gás, o condomínio, e transporte.

Em primeira reunião com os moradores do Emílio Bosco, foi acordada a


terceirização da gestão condominial, e a taxa foi estabelecida em R$90. Um mês antes
da posse das famílias foi organizado um curso de organização condominial, sendo a
empresa Bonen Consultoria responsável, e onde foram dialogadas com as famílias as
formas de gestão. O relatório do trabalho social descreveu que o anuncio do preço do
condomínio gerou tumulto na assembleia e muitos reclamaram do valor. Após três
meses a gestão condominial passou a ser organizada pelos próprios moradores e foi
eleito um sindico local, o valor do condomínio passou para R$80.

A assistente social Adriana Oliveira e a suplente da secretária da habitação


Débora Araujo relataram que o Emílio Bosco está com sérios problemas quanto ao que
se refere a sua organização condominial. Isto, para elas é o maior problema do conjunto.
Nas visitas realizadas, percebeu-se, e foi relatado pelos entrevistados, que o condomínio
encontra-se atualmente sem porteiro, e o "parquinho" destinado as crianças esta fechado
por falta de manutenção.

14
Vale resaltar também, que pelas regras do programa MCMV não pode haver venda, troca ou aluguel
das unidades durante esses 10 anos. Se, após o período, a família resolver deixar o imóvel esta não poderá
mais ser beneficiada por nenhum programa habitacional no país

45
Dos questionários realizados, 100% avaliaram a gestão do condomínio como
ruim ou péssima, sendo muito recorrente frases como: "A gente paga e não tem
retorno". Dos 21 entrevistados 4 responderam à pergunta "o que mudaria" em primeiro
lugar com: o síndico. Os moradores no geral reclamaram que o condomínio "não
oferece nada". Uma das moradoras ressaltou considerar que "eles tinham sido jogados
ali", não tendo sido explicado às famílias o que realmente significava viver em um
condomínio, uma reunião não era suficiente para essa adaptação. Sendo assim, ela
afirmou que a maioria das famílias não paga, o que dificulta ainda mais a gestão e acaba
estimulando ainda mais famílias à inadimplência, dada a falta de retorno.

Adriana de Oliveira relatou que o tempo disponível no cronograma da Prefeitura


para o trabalho social não era o suficiente para a adaptação. Ela também afirmou que a
inadimplência no Emílio Bosco é hoje de mais da metade dos condôminos e que o
conjunto, desde que passou para a gestão própria, não paga as contas de água e luz das
áreas comuns e está acumulando essa dívida. A secretaria está com sérias desconfianças
sobre conjunto, e está iniciando uma intervenção. A suspeita é de que o síndico tenha
feito desvio de recursos, e que tem se mantido na posição através de ameaças, elas
também citaram a sublocação de unidades, que são proibidas pelas regras do programa.
Tais fatos não foram observados durante a pesquisa de campo, mas o fato é que o
formato do programa acaba por criar problemas sociais complexos que a secretaria
parece não ter condições de enfrentar.

2.3.4 Conclusões e observações sobre o caso

A entrevistada Débora Araújo considera o Emílio Bosco um Conjunto que


reflete as falhas que o programa MCMV apresenta nacionalmente. Dos conjuntos no
município, segundo a secretária suplente, o Emílio Bosco é o que tem "dado mais
problema". Para a assistente social um dos principais motivos do caráter crítico do
Conjunto é o fato de 100% da demanda ser composta por indicação referente a políticas
de remoção de favelas. Adriana Oliveira também apontou para a incapacidade do TS de
adaptar as famílias em casos como esse, no cronograma disponível da Prefeitura.

A questão que mais exige adaptação e que vem se mostrando problemática é o


modelo condominial. Este, inspirado nos condomínios dos mercados de classe média,

46
impõe um modelo que privatiza espaços que poderiam ser públicos. As ruas do
Conjunto e seus ambientes de convivência passam a ser de responsabilidade dos
condôminos, o que torna sua manutenção frágil dada a baixa renda de seus residentes. A
taxa de R$80, no caso do Emílio Bosco, representa uma fração significativa do
orçamento familiar dos moradores, o que se observou foi um alto índice de
inadimplência. Se, por exemplo ao invés de haver o "parquinho" do condomínio,
houvesse uma praça pública, sua manutenção seria de responsabilidade da prefeitura, e
o espaço hoje não estaria fechado por falta de conservação. Segundo Paz (2015), o
modelo tem-se mostrado inadequado por exigir um gasto a mais as famílias, esse
também não favorece o convívio, a participação e sociabilidade.

"A verticalização da moradia e os projetos arquitetônicos são definidores


desse modelo, ao reforçarem o condomínio como espaço fechado, privado,
murado e não aberto e público. As ruas e todos os espaços livres do conjunto
habitacional são de responsabilidade do condomínio e não da prefeitura, pois
se configuram como espaços privados, reforçados pela presença do muro".
(PAZ, 2015, p.280)

As regras de convivência dos condomínios provocam mudanças profundas no


modo de vida e convívio das famílias e nas relações com os novos vizinhos. Paz (2015),
também destaca o fato de as famílias oriundas de áreas irregulares e de risco têm o
desafio de construir um novo modo de vida, que transite da informalidade para a
formalidade, o que traz dificuldades, e não necessariamente tem de se encaixar em
modelos pré-concebidos.

Buscou-se, na pesquisa, observar se os princípios que norteiam a política


habitacional afirmam o direito à moradia, em sua compreensão mais ampla, como
direito à cidade. O Conjunto Emílio Bosco apresenta-se afastado e pouco articulado
com o centro de Sumaré. Os arredores têm poucas estruturas de comércios e serviços, e
as opções públicas de lazer são inexistentes. A região em que se encontra o Emílio
Bosco era antes marcada pelo vazio. O conjunto perpetua a periferização, característica
da urbanização no Brasil. Sua implantação não favorece acesso democrático à terra
urbanizada, ou seja, com transporte, acesso à postos de empregos, comércio, serviços e
equipamentos de educação, saúde cultura e lazer.

A pergunta final feita às famílias, durante as entrevistas, foi: o que gostaria que
fosse modificado na situação atual. As respostas foram várias, desde reivindicações
simples, como a colocação de um farol em frente ao conjunto para ficar mais segura a

47
travessia pela Av. Emílio Bosco, passando pela mudança de síndico, a importância de
espaços seguros de lazer tanto parar as crianças quanto para os adultos, e de uma melhor
estrutura de comércio local.

Os entrevistados demonstraram sentir falta das estruturas que tinham acesso no


centro, principalmente quanto a transporte, serviços e consumo. As famílias se
mostraram satisfeitas com o apartamento em si, mas insatisfeitas com a localização, as
estruturas de lazer e cultura locais e principalmente com a organização condominial.
Abaixo estão descritos os resultados gerais da pesquisa.

Quadro 06: Resultados do questionário realizados com as 21 famílias residentes do


Conjunto Residencial Emílio Bosco

Não soube
Péssimo Ruim Regular Bom Ótimo responder ou
não se aplica

Transporte 90,48% 9,52% 0% 0% 0% 0%

Comércio 0,00% 19,05% 71,43% 9,52% 0% 0%

Saúde 19,05% 28,57% 19,05% 23,81% 0% 18,18%

Escola 0% 0% 19,05% 66,67% 0% 14,29%

Cultura 52,38% 28,57% 0% 0% 0% 19,05%

Lazer 61,90% 28,57% 0% 0% 0% 9,52%

Relação com a
0% 19,05% 38,10% 23,81% 19,05% 0%
vizinhança
Organização do
71,43% 28,57% 0% 0% 0% 0%
condomínio
Satisfação
0% 23,81% 47,62% 23,81% 4,76% 0%
Geral
Satisfação com
serviços 9,52% 66,67% 14,29% 9,52% 0,00% 0%
urbanos
Satisfação com
28,57% 42,86% 28,57% 0% 0% 0%
localização

Fonte: Trabalho de campo realizado no mês de outubro de 2015 (elaboração própria)

48
Os entrevistados declararam que as atividades de lazer realizadas pelas famílias
que não envolvem a própria casa, são ainda realizadas nos bairros de origem, mas um
grande desestimulo é a infraestrutura de transporte demorada, e pelos gastos implícitos.

A ausência de espaços de convivência e lazer é clara na região e nas respostas


dos entrevistados. As visitas foram todas realizadas durante o final de semana, e muitas
famílias se encontravam nas ruas sentado próximos a alguns ambulantes, que vendem
de comidas rápidas à DVDs. Conversando com um dos ambulantes, morador do
Conjunto Poços de Caldas localizado em frente ao Emílio Bosco, foi declarado que a
prefeitura não facilita o estabelecimento dos comércios de rua no local e os que estão
ali, segundo ele, "estão por teimosia", o que ele considera um problema, porque além de
constituir uma renda para famílias, já que muitas dessas viviam de pequenos comércios
onde moravam antes, quanto seria um espaço de convivência para os moradores.

Apesar da insatisfação com localização e as estruturas urbanas, a opinião dos


moradores sobre a casa foi, em grande maioria, ambígua. Muitos afirmaram que a casa
antiga estava em área de risco, que enchia e estava constantemente sob risco de
desmoronamento, o que faz com que a mudança para o Emílio Bosco tenha significado
uma melhora significativa na qualidade de vida das famílias. Todos, menos um dos
entrevistados, ponderaram esse fato ao fazer as críticas ao conjunto.

As famílias entrevistadas destacaram três grandes problemas do conjunto. O


primeiro se relaciona a organização condominial, tanto no seu formato, quanto na sua
gestão. O segundo foi referente a localização desarticulada do centro com pouco acesso
à estruturas sociais e comercias. Por último, foi apontado problemas com o custo de
morar, que impõe dificuldades às famílias pelo surgimento de novas contas e aumento
dos gastos com transporte.

2.4. Análise nacional

O volume de R$34 bilhões de subsídios, proposto no lançamento do programa


Minha Casa Minha Vida, foi inédito para a habitação no país. Nem mesmo o BNH
dirigiu tantos recursos à população de baixa renda em uma só operação (ARANTES E
FIX, 2009). Segundo Cardoso (2013, p.43), a reação dos empresários ao lançamento do

49
pacote foi eufórica, já que esses se colocavam como coautores e parceiros do programa.
Enquanto a de setores de esquerda foi cautelosa.

Cardoso (2013, p.44) sintetiza as principais fragilidades do programa em 8


pontos15: (i) falta de articulação do programa com a política urbana; (ii) ausência de
instrumentos para enfrentar a questão fundiária; (iii) os problemas de localização dos
empreendimentos; (iv) excessivo privilégio ao setor privado; (v) a grande escala dos
conjuntos; (vi) a baixa qualidade arquitetônica e construtiva das moradias; (vii)
descontinuidade do programa em relação à políticas anteriores e por final; (viii) as
desigualdades na distribuição dos recursos como fruto do modelo institucional adotado.

O Minha Casa Minha Vida foi elaborado sob liderança da Casa Civil e do
Ministério da Fazenda em diálogo direto com representantes da construção e sem
participação popular. As estruturas de política urbana do Ministério das Cidades não
foram mobilizadas nem o Conselho das Cidades consultado. O Fundo Nacional de
Habitação de Interesse Social (FNHIS) também ficou de fora, exceto na modalidade
MCMV Entidades, que abrange somente 1,5%16 dos subsídios públicos. No sentido
contrário das políticas anteriores, o pacote direciona os recursos para um fundo público
secundário e sem conselho, o FAR, que é mais maleável e desregulado. (FIX, 2011,
p.139)

O poder público municipal deixou de ter controle sobre a implantação dos


empreendimentos habitacionais de interesse social, direção que a política habitacional
tomava até o lançamento do MVMC. Segundo o LabCidade (2015), o que se tem
observado nas análises é que os municípios, em geral, influenciam muito pouco nos
aspectos morfológicos e na localização da produção, já que a estrutura de provisões
passou a ser a de mercado.

Supostamente o controle municipal se daria por mecanismos regulatórios, já que


os projetos, elaborados pelas construtoras, passam por aprovação municipal
(CARDOSO, 2013, p.49). Entretanto, a pressão por resultados e o despreparo
municipal, em geral, fazem com que as administrações locais se tornem meros
coadjuvantes desse processo atuando mais no sentido do relaxamento dos controles e
flexibilização de leis para adaptá-las ao modelo do programa, permitindo, assim, o

15
CARDOSO 2013, p.44
16
FIX 2011, p.139

50
barateamento das construções, como, por exemplo, a alteração os perímetros urbanos
das cidades (AMORE, 2015, p. 419).

O Ministério das Cidades foi criado em 2003 para formular e apoiar a


implementação de uma política urbana integrada, de forma que essa não fosse limitada a
programas de financiamento de obras (AMORE, 2015, p.420). O programa Minha Casa
Minha Vida, no entanto, representou uma descontinuidade com as políticas praticadas
até então pelo governo Lula. Balbim e Krause (2015) apontam que a política de
habitação de interesse social (HIS) vive hoje um paradoxo, uma vez que o MCMV não
está incluído no Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS) e,
portanto, não está submetido ao Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
(FNHIS), ambos criados pela Lei Federal n 11.124, de 16 de junho de 2005 (BALBIM,
2015, p.07). Essa lei, anterior ao MCMV, busca assegurar que programas e ações para
HIS sejam executados segundo marcos jurídicos específicos, relativos ao controle e à
participação social.

A elaboração e implementação da política urbana e a distribuição de recursos


deixa de passar por mecanismos de participação e controle social, conquista do
Ministério das Cidades17. A justificativa é a da agilização dos processos de alocação e
utilização de recursos para viabilizar os objetivos econômicos do programa. Por outro
lado, a descentralização e a gestão do programa através das agências da Caixa
apresentam-se como mais fácil ao setor privado em relação a operação através de
contratações e licitações públicas, como seria caso a iniciativa dos programas fosse das
administrações municipais (CARDOSO, 2013, p.63).

"Nesse sentido, pode-se afirmar que a quebra dos mecanismos de controle


social sobre a política habitacional reflete, de forma exemplar, as
contradições de um programa com objetivos ao mesmo tempo econômicos e
sociais e que busca “resolver’ o déficit habitacional unicamente através da
atuação da iniciativa privada." (CARDOSO 2013, p.63)

A rede LabCidade (2015), observou em pesquisa realizada nos municípios de


Campinas, Hortolândia, Osasco e São Paulo, que o MCMV introduziu nesses uma
homogeneização das políticas habitacionais, tendo uma lógica que inibiu o engajamento
dos municípios na formulação de alternativas para atender as especificidades locais.

17
Segundo o Estatuto da Cidade (artigo 2, II da Lei 10.257 de 2001), é diretriz geral da política urbana a
gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários
segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos
de desenvolvimento urbano.

51
Programas habitacionais específicos anteriores ao MCMV foram, em geral,
desmobilizados para "fazer rodar" o novo programa (LABCIDADE, 2014, p.03).

Para Cardoso (2013), o programa MCMV apresenta uma contradição


fundamental. A de se propor ao combate a crise estimulando a economia,
principalmente através da criação de empregos18 ao mesmo tempo em que busca fazer
política habitacional. Cardoso (2013, p.47) ressalta que a urgência em flexibilizar o
acesso aos recursos para garantir a eficácia econômica muitas vezes acaba atropelando o
necessário para se obter eficácia no ponto de vista habitacional. Fix (2011) chama a
atenção para o nome do programa: Minha Casa Minha Vida, que já indica o tipo de
imaginário que se pretendia produzir em torno da ideologia da casa própria, assim como
foi durante o BNH.

"Essa ideologia - que tem um campo material amplo para prosperar no Brasil,
diante da escassez de alternativas, das ameaças de despejos nas favelas e
cortiços, da instabilidade econômica, da insegurança no emprego, da
debilidade das redes de proteção social- foi requisitada como parte de um
arranjo que ajudou as empresas no enfrentamento a problemas do setor,
anteriores à crise, como reconheceram os próprios agentes econômicos" (FIX
2011, p.141).

Em outro paralelo com a política habitacional do regime militar, no MCMV não


são explorados mecanismos de política fundiária que impeçam que os investimentos
gerem pressão de demanda sobre os preços, estimulando a especulação imobiliária, o
que inviabiliza, no longo prazo, a produção de novas moradias.

Um dos pontos críticos do MCMV é a falta de articulação da política


habitacional com a política urbana. Não há exigência para os municípios utilizarem
instrumentos do Estatuto da Cidade19, capazes de cercear a especulação imobiliária. A
dinâmica que rege o sistema é a de mercado, e com o encarecimento do preço da terra,

18
Arantes e Fix (2009) também entram no mérito da qualidade dos empregos gerados pelo MCMV e o
baixo grau dos efeitos multiplicadores da construção civil. O trabalho em obra no Brasil, apesar de
contratar em grande escala, possuí condições de trabalho precárias e baixíssimos salários. O programa
não coloca nenhum requisito sobre o trabalho, e o modelo de exploração é reproduzido. Arantes e Fix
(2009) afirmam que pelo tempo lento dos investimentos habitacionais e a preocupação com a
rentabilidade privada descaracterizam o pacote como política anticíclica em seu sentido keynesiano.
19
O Estatuto da Cidade (Lei 10.257 de 2001) foi promulgado em julho de 2001 para regulamentar os arts.
182 e 183 da Constituição Federal e estabelecer diretrizes gerais da política urbana. Nele, além de outras
questões urbanas, foram definidos instrumentos para combater a especulação imobiliária, como o
parcelamento, edificação ou utilização compulsórios do solo urbano; a aplicação de IPTU progressivo de
até 15% em caso de propriedade ociosa; e possibilidade de demarcação de Zonas Especiais de Interesse
Social (ZEIS), que, dentre suas funções, podem ser destinadas à construção de moradia social.

52
os terrenos buscados são cada vez mais afastados dos centros urbanos. (CARDOSO,
2013)

"Na ânsia de poder viabilizar o maior número de empreendimentos, o poder


local ficará refém de uma forma predatória e fragmentada de expansão da
cidade. O “nó da terra” permanecerá intocado e seu acesso se dará pela
compra de terrenos por valores de mercado (ou ainda acima destes). O
modelo de provisão mercantil e desregulada da moradia irá sempre procurar a
maximização dos ganhos por meio de operações especulativas. Não há nada
no pacote, por exemplo, algo que estimule a ocupação de imóveis construídos
vagos (que totalizam 6 milhões de unidades, ou 83% do déficit), colaborando
assim para o cumprimento da função social da propriedade. A existência
desse imenso estoque de edificações vazias é mais um peso para toda a
sociedade, pois são em sua maioria unidades habitacionais providas de
infraestrutura urbana completa, muitas delas inadimplentes em relação a
impostos. Não há dúvida de que o pacote irá estimular o crescimento do
preço da terra, favorecendo ainda mais a especulação imobiliária articulada à
segregação espacial e à captura privada de investimentos públicos. Assim, a
política habitacional de interesse social se tornará cada vez mais inviável, a
menos que o governo siga dirigindo subsídios aos proprietários de terra."
(ARANTES e FIX 2009, p.11)

O programa certamente atingiu uma camada historicamente não atingida pela


política habitacional no país - a faixa de 1 à 3 SMs -, porém, os trabalhos sobre o
assunto apontam que esse não chegou a interferir em sua localização histórica. Em
pesquisa realizada nas Regiões Metropolitanas de São Paulo e Campinas, a rede
LabCidade (2015) relatou que entre as 3 faixas de renda atendidas pelo programa há
uma diferença de localidades. A terceira faixa localiza-se mais próxima do centro
enquanto a faixa 1 está mais afastada.

O privilégio dado ao setor privado cria várias consequências sobre as


características da oferta. As famílias pertencentes à faixa 1, por terem demanda maior
que a oferta, tem pouquíssimo poder de barganha. As construtoras, mesmo sem ou
pouquíssimo risco e sem gastos de incorporação imobiliária, irão sempre buscar a
maximização dos seus lucros (CARDOSO, 2013, p.54). Nessa lógica, a primeira forma
encontrada pelas empresas para aumentar suas taxas de retorno é a redução dos custos
de produção20 com: padronização de projetos, ampliação da escala de produção e
encurtamento do tempo de execução das obras (LABCIDADE, 2015, p.06).

20
O alto grau de exploração do trabalho na construção civil, ou seja, os baixos salários do setor, fazem
com que, na busca por maximização de lucros, os empresários não tenham a opção de aumentar a pressão
o trabalho. Os ganhos de escala pressionam por inovações no canteiro de obras, mas essas demoram a
acontecer. "O elemento central passa a ser o comando sobre o preço da terra e o uso do solo urbano. (...)
A pressão se impõe, assim, sobre a organização espacial: nas decisões de localização, de forma
arquitetônica e urbana" (FIX 2011, p.222)

53
O modelo favorece, principalmente, a produção de condomínios nas periferias
urbanas ou em áreas rurais que serão transformadas em urbanas. Fix (2011) aponta que
as operações do programa MCMV dependem de alterações nos limites do perímetro
urbano. Esse espraiamento da mancha urbana impõe um alto custo ao poder público, na
medida em que torna necessário levar infraestruturas urbanas a lugares que antes não as
detinham, como serviços de saneamento básico e transporte.

Cardoso (2013, p.54) ressalta que na busca por terrenos mais baratos cria-se
problemas de acessibilidade para a população adquirente, o que gera um "custo social",
para além dos gastos do governo com infraestrutura. As famílias atendidas pelo MCMV
acabam tendo incremento em suas despesas relacionadas ao transporte e a problemas de
infraestrutura, além de terem seus tempos de deslocamento aumentados. O programa
não estimula à ocupação de imóveis vagos construídos (FIX 2011). Tem-se observado a
construção de conjuntos nas fronteiras urbanas, "reafirmando o modelo de espoliação,
que caracteriza o processo de urbanização brasileiro" (CARDOSO, 2013, p.54).

Como são as construtoras que definem o projeto e sua localização, as pesquisas


apontam para a prevalência de um padrão de produção com fortíssima homogeneização
das soluções de projetos arquitetônico e urbanístico e das técnicas construtivas,
independentemente das características físicas dos terrenos ou das condições
bioclimáticas locais (AMORE, 2015, p.418). Tem-se reproduzido em escala nacional
um projeto padrão que não corresponde à diversidade regional e que nem sempre
responde às necessidades das famílias atendidas pelo programa.

Nascimento (2009) aponta que, no que se refere aos espaços internos da


habitação, as variações no tamanho e na tipologia - casa ou apartamento - resultam de
uma mesma concepção geral baseada na pré-determinação do modo de morar, baseado
em um perfil específico, a família nuclear, ignorando famílias de outros perfis, como as
chefiadas por mulher sem cônjuge, ou as famílias ampliadas, compostas de membros
com vários graus de parentesco e ligação (NASCIMENTO, 2009, p.03).

Outro ponto crítico é a escala dos empreendimentos. Para enfrentar esse


problema, a regulamentação do programa propôs um limite de 500 unidades por
conjunto habitacional. No entanto, as construtoras contornam esse requisito ao
subdividir os megaempreendimentos, aprovando projetos em terrenos contíguos, mas

54
com as mesmas tipologias arquitetônicas, soluções construtivas e implantação nos
terrenos (CARDOSO, 2013, p.56).

Analisando a distribuição dos investimentos habitacionais nas metrópoles,


Cardoso (2013) identificou os empreendimentos contíguos e com isso reclassificou as
escalas médias dos empreendimentos nas metrópoles, conforme a tabela abaixo,
demonstrando que esses ultrapassam, em muito, o limite estabelecido:

Quadro 07: Média nacional dos empreendimentos de faixa I nas Regiões


Metropolitanas por Região em 04/05/2010:

Número médio de UHs


por empreendimento
Norte 555,17
Nordeste 1421,08
Centro-Oeste 724,9
Sudeste 894,1
Sul 878,63
Total 1027,31

Fonte: Cardoso 2013, p.57 (elaboração própria)

A forma condominial, encontrada como solução para aumento de escala e


barateamento da construção, também é preocupante por gerar gastos condominiais aos
adquirentes. Além do condomínio, e os referidos, possíveis gastos a mais com
transporte e infraestruturas, o programa também impõe às famílias o pagamento da
prestação mensal.

Em sua primeira fase o programa, instituiu o pagamento de 10% da renda


mensal pelas famílias que tiveram a casa subsidiada, sendo a prestação mínima de 50
reais. Na segunda fase do programa essa caiu para 5%, e a prestação mínima foi para
25, o que apresentou uma melhora (ROYER, 2013). A professora Silvia Maria Schor
(2009), analisando a primeira fase do programa, aponta que as famílias cuja renda está
abaixo de um salário mínimo também devem pagar transporte, água, gás, energia e
alimentação, o que dificulta o pagamento da prestação.

"Para se avaliar o alcance dos incentivos dados às famílias com rendimentos


até três salários mínimos, é interessante examinar a distribuição da renda
desse grupo e identificar o impacto que o pagamento de 10% da renda ou
R$50,00 mensais acarreta sobre as suas condições de sobrevivência. Ou seja,
na capacidade de arcar com as despesas de moradia, habitação, saúde,
educação e demais gastos complementares" (SCHOR, 2009, p.04)

55
O MCMV não toca na lógica de mercado, e acaba estimulando a propagação do
modelo histórico brasileiro de segregação urbana. Análises nacionais tem mostrado que
instalação dos conjuntos habitacionais é dada, principalmente, em áreas distantes e
desarticuladas do conjunto estruturado da cidade, com insuficiência de transporte
público e infraestruturas urbanas ligadas à serviços e consumos.

O MCMV se apresenta como um grande avanço de política habitacional no


Brasil, principalmente no que se refere as populações de baixa renda, a quantidade de
recursos a fundos perdidos destinados a elas é uma grande novidade. Porém, não há no
programa discussão que trate sobre a desmercantilização da moradia. Como aponta o
estudo da FJP (2011), apresentado no início do trabalho, o problema da habitação pode
ter soluções para além da lógica produtivista, como a ocupação de habitações ociosas e
reforma de outras já existentes.

Não se pode negar que a experiência do programa tem sido positiva, muitas
famílias hoje deixaram de viver em condições materiais extremamente precárias, mas o
programa apresenta restrições, principalmente quando pensamos no problema da
habitação em seu sentido amplo, como parte integrante do direito à cidade.

56
CONCLUSÃO

O programa Minha Casa Minha Vida é inédito tanto em termos de volume de


recursos destinados para a habitação, quanto da população atingida. Até então, a faixa
de baixa renda não era abrangida amplamente pelas grandes políticas habitacionais
federais. Na prática a falta de poder aquisitivo a impedia de participar. As políticas eram
baseadas principalmente na facilitação do crédito, com taxas de juros que, mesmo
subsidiadas, eram incompatíveis com o seus orçamentos. As grandes dimensões do
programa podem ser traduzidas em seus números: até agosto de 2015, mais de 2
milhões de famílias com renda até 3 salários mínimos tiveram suas casas subsidiadas
com recursos diretos do OGU, que diferente dos do FGTS, são a fundos perdidos, mais
um avanço trazido pelo programa.

Defendeu-se no trabalho que não se pode analisar a política habitacional


descolada de seu contexto histórico, econômico e institucional. As políticas
habitacionais, como argumentou Beatriz Mioto (2015, p.258), são condicionadas
principalmente por dois fatores relacionados: o padrão de reprodução do capital e a
atuação dos Estados Nacionais. No Brasil, a condição de subdesenvolvimento é
constantemente reproduzida com a manutenção de heterogeneidades estruturais. Assim,
a dependência externa e a segregação social sistematicamente não são superadas.

A urbanização na periferia tem uma cara própria e gera problemas específicos da


nossa formação social, tornando o problema da habitação ainda mais complexo,
envolvendo fatores que vão além do provimento de novas moradias. A industrialização,
fato que impulsionou as migrações internas e o crescimento das cidades no Brasil, não
foi baseada na popularização do consumo, mas sim na diversificação de bens
sofisticados destinados a uma parcela pequena da população. A concentração de renda
foi estratégia do desenvolvimento e a industrialização se deu com baixos salários.

O resultado sobre as cidades foi a progressiva exclusão de grandes parcelas da


população do mercado imobiliário formal. A solução encontrada pelo trabalhador deu-
se às margens do sistema, com a autoconstrução em terrenos legais ou ilegais, que via
de regra se encontravam nas periferias das cidades, em lugares que ainda não figuravam
como fronteiras de investimento do capital imobiliário, e que, geralmente, são marcados
pela precariedade das estruturas de serviços públicos e privados.

57
Historicamente, as políticas habitacionais brasileiras atenderam aos interesses de
determinadas frações do capital, principalmente pela montagem e sustentação de um
sistema de financiamento capaz de estruturá-las. No subdesenvolvimento, a falta de
dinamismo econômico próprio faz com que o Estado e o fundo público sejam motores
fundamentais do sistema. As políticas habitacionais de grande dimensão no Brasil,
marcadamente o BNH e o MCMV, também tiveram alto cunho ideológico, atrelando
questões econômicas ao fomento do sonho da casa própria.

A situação econômica do país condiciona as dimensões da política habitacional.


Tanto o BNH quanto o MCMV foram lançados em períodos de crescimento econômico,
esses, porém, baseados em fundamentos diferentes e inseridos em contextos históricos e
institucionais distintos. No caso do Regime Militar (1964-1985), período do BNH,
dava-se o auge da industrialização por substituição de importações, e a ideologia
dominante era desenvolvimentista. Na segunda metade dos anos 2000, quando foi
implementado o MCMV, a conjuntura econômica era favorável ao Brasil,
principalmente pelo alto preço internacional das commodities e pelo aquecimento da
economia global.

O que se observa é o fato da política habitacional se expandir quando o acesso à


liquidez internacional é amplo, entretanto, quando esses canais se fecham, como foi o
caso da década de 1980 com o fim do acesso do país aos mercados internacionais de
crédito, as políticas sociais, em geral, se restringem. Tal fato reflete a persistência da
dependência externa, ou seja, a vulnerabilidade do país à volatilidade dos capitais
internacionais, o que traz dúvidas sobre a sustentabilidade do programa MCMV, já que
em 2015 o país entra com mais força na crise internacional e vivencia fuga de capitais.

Os anos 1980 encerram o ciclo desenvolvimentista no Brasil. As políticas


massivas de investimento público foram substituídas por políticas recessivas de
estabilização. O período que durou até meados dos anos 1990 foi marcado pela crise da
dívida externa, por baixas taxas de crescimento do PIB, por restrições econômicas e alta
inflação (CARNEIRO 2002). Com isso, instaurou-se grave crise no setor público.

A recuperação da década de 1990 não significou retomada do dinamismo do


período desenvolvimentista. O paradigma desenvolvimentista foi substituídas pela
ideologia neoliberal. Nessa lógica, em que o equilíbrio das contas públicas e a política
inflacionária são obsessões, parte do aparato estatal é desmontado para seguir-se as

58
regras do FMI. Ao Estado passa a caber o papel de abrir caminhos e facilitar a atuação
do capital, e é dessa forma que, geralmente, são implementadas as políticas sociais
desde então.

Assim, tendo em vista esse contexto histórico e econômico, o MCMV foi criado
em grande medida para atender demandas do setor de construção pelo fornecimento de
subsídios e garantias de créditos, fazendo frente aos efeitos restritivos da crise de 2008.
Ao mesmo tempo, a política se apresenta como solução ao problema da habitação. A
iniciativa privada, dessa forma, entra no programa como parceira e coautora, obtendo
grandes liberdades em sua atuação. Como consequência, tem-se observado nas análises
nacionais a prevalência da lógica produtivista no programa, desalinhada da política
fundiária. O resultado visível é a tendência a reprodução de problemas típicos da nossa
urbanização: a periferização e falta de acesso pleno às estruturas da cidade.

Pode-se observar que o caso do Conjunto Emílio Bosco possuí uma série de
problemas similares aos que vêm sendo apontados em análises nacionais e regionais do
programa. O conjunto é afastado e pouco integrado ao centro do município de Sumaré.
Sua construção foi realizada às margens do urbano e as infraestruturas locais de serviços
e consumos públicos e privados não são satisfatórias para a população que ali reside,
principalmente quanto à lazer, cultura e infraestrutura comercial, assim, reproduzindo
problemas típicos da urbanização no Brasil.

Não há apenas a reprodução de problemas antigos como também a criação de


novas contradições. A mudança para o Conjunto causa novos gastos aos beneficiados,
relacionados principalmente as contas de água, energia, gás, prestação mensal,
transporte e taxa condominial. Esses geram problemas de permanência ao moradores,
sobretudo para as famílias de renda até 1 salário mínimo, que no Emílio Bosco, em
julho de 2013, representavam 26,4% do total.

Outro novo problema está relacionado à forma condominial. Durante a pesquisa


registrei grande insatisfação dos moradores com o modelo, tanto por seu formato - "um
em cima do outro, morando tudo junto", na descrição de um dos entrevistados - quanto
pela falta de organização. A baixa renda das famílias, e a falta de adaptação a esse
modelo baseado nos mercados de classe média, estimula a grande inadimplência dos
condôminos, fragilizando a manutenção do condomínio.

59
É inegável que a mudança para o Conjunto acarretou melhorias significativas na
qualidade de vida das famílias, uma vez que essas antes moravam em áreas de risco
sujeitas a alagamentos e desmoronamentos. O programa MCMV tem muitos méritos, e
representa um grande avanço na política habitacional brasileira, porém, também possuí
restrições, algumas dessas abordadas nesse trabalho, e que vêm sendo ressaltadas por
muitos pesquisadores na busca por mudanças no desenho do programa, principalmente
quanto as poucas exigências que o MCMV ainda impõe sobre indústria da construção
civil.

O trabalho também buscou ressaltar que o MCMV está situado em um contexto


institucional que em partes pode explicar o seu formato. Sob o regime neoliberal, onde
os gastos do governo devem manter-se restritos, a política social tende a estar
subordinada aos interesses privados e o Estado apresenta-se, para esses, como agente
facilitador. A liberdade dada à iniciativa privada, oriunda desse modelo, pode ser
identificada como um dos principais fatos geradores de problemas do programa, uma
vez que a busca pela maximização dos lucros não prioriza âmbitos do direito à moradia
que envolvem a localização, a integração com estruturas urbanas de serviços públicos e
privados que promovam o acesso democrático as estruturas da cidade.

60
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63
Anexo I:

Questionário:

1. Origem:

2. Tempo de moradia:

3. Composição familiar:

4. Qual a principal atividade de lazer da família:

5. Usa o transporte público próximo? Qual modalidade?

6. Se resposta acima afirmativa como avalia?

( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

7. Qual a frequência e proximidade do transporte público:

8. Tempo de deslocamento (anterior e atual) para:

a) Trabalho:

b) Escola:

c) Lazer:

d) Hospital/ Posto de saúde:

9. Considera que seus gastos com transporte aumentaram desde a mudança:

( ) Muito ( ) Pouco ( ) Não aumentaram ( ) Diminuíram

10. E as contas em geral aumentaram:

( ) Muito ( ) Pouco ( ) Não aumentaram ( ) Diminuíram

11. Caso resposta acima afirmativa, quais os principais componentes desse aumento:

12. Quando mudaram havia comércio e serviços próximos da moradia?:

13. O que acha, hoje, do comércio e serviços próximos ao conjunto?:

( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

64
14. E dos equipamentos sociais próximos:

a) Saúde: ( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

b) Escola: ( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

c) Cultura: ( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

d) Lazer: ( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

15. Relação da vizinhança:

( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

16. Existe organização de condomínio? Se sim, como avalia:

( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

17. Satisfação com a casa em geral:

( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

18. Satisfação com os serviços urbanos em geral:

( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

19. Satisfação com a localização do imóvel:

( ) Péssimo ( ) Ruim ( ) Regular ( ) Bom ( ) Ótimo

20. Tem desejo de mudar do imóvel?

21. O que gostaria que tivesse (necessidades não atendidas)?

65

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