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RESULTADOS PRELIMINARES DO TESTE DA EFICIÊNCIA DE DUAS

ESTRATÉGIAS DE DEFESA DE CUPINS CONTRA A PREDAÇÃO PELO


TAMANDUÁ - BANDEIRA, MYRMECOPHAGA TRIDACTYLA.

Rezende, P.B. 1

Faleiro, F.A.M.V. 1 ; Santos, T. 1 ; Carrijo,T.F. 1 ; Brandão,D. 1 ; Oliveira, D.E. 1 .


1-Universidade Federal de Goiás. Instituto de Ciências Biológicas. Departamento de Biologia Geral. pollyane rezende@hotmail.com

INTRODUÇÃO dos soldados de Nasutitermes contêm terpenos voláteis


que agem como feromônios de alarme e podem ser poucos
Dentre os cupins que fazem parte da fauna do Cerrado, palatáveis ou irritar a pele (Montgomery & Lubin, 1977;
destacam - se as espécies pertencentes à subfamı́lia Nasu- Moore,1964). Podemos falar também de defesa móvel: há
titermitinae (Termitidae); essa subfamı́lia representa mais um grande efluxo de soldados para a área de ataque (o re-
da metade das espécies de cupins do bioma. Cerca de 60% crutamento dos soldados é estimulado por uma mistura de
das espécies e quase todos os ninhos epı́geos são perten- fatores externos como cheiro do predador, choque mecânico
centes a Nasutitermitinae, dentre essas espécies estão al- e movimentos de ar) e de alarmes produzidos pelos solda-
gumas dos gêneros Cornitermes Wasmann e Nasutitermes dos (sinalização mecânica e feromônios), com consequente
Dudley. aumento da proporção soldados/operárias, o que poderia in-
Em uma colônia, os operários são responsáveis pela con- ibir a predação pelo tamanduá - bandeira (Drumond, 1992).
strução e manutenção dos ninhos, pelo cuidado com os in- Neste tipo de defesa, ninhos com paredes mais finas são fa-
setos jovens e pelo forrageamento e alimentação das out- vorecidos (Noirot & Darlington, 2000), sendo também pare-
ras castas, enquanto que os soldados são responsáveis pela des frágeis e de estrutura cartonada, construı́dos de matéria
defesa da colônia (Stuart, 1969). Estes últimos possuem orgânica mascada e cimento fecal (Lubin & Montgomery,
cabeça fortemente esclerotizada, dotada de estruturas es- 1981).
pecializadas para a defesa. Essas estruturas podem ser Vários estudos (Bermejo & Illera 1999) apontam os cupins
mandı́bulas (de várias formas e tamanhos) e/ou poros-estes como fontes alimentares importantes para muitas espécies
podendo ou não estar na extremidade de um tubo frontal de mamı́feros (cerca de 200 espécies) como, por exem-
denominado nasus-que são aberturas externas da glândula plo, roedores, carnı́voros e alguns primatas. Para algumas
frontal. dessas espécies, cupins representam a principal fonte de al-
As estratégias de defesa apresentadas pelos cupins possuem imento. Entre estes mamı́feros estão os tamanduás (Xe-
três componentes básicos: estrutura dos ninhos, soldados e narthra, Myrmecophagidae), grupo composto por quatro
operários. Para Cornitermes, podemos identificar o uso dos espécies, dentre elas o tamanduá - bandeira (Myrmecophaga
três componentes e classificar o tipo de defesa como uma tridactyla), que, assim como as outras, são especializadas na
defesa estática, ou seja, baseada na resistência elevada do predação de formigas e cupins.
ninho, no baixo ou ausente recrutamento dos soldados (os Trabalhos sobre as relações entre cupins e mirmecófagos
soldados ficam, na sua maioria, no interior do ninho im- são escassos (Lubin & Montogomery 1981; Oyarzun et al.,
pedindo a entrada do predador nas galerias) para a área 1996), resultando em pouca informação sobre a biologia de
de ataque e na tentativa dos operários de fecharem o mais ambos os grupos. Trabalhos nesse sentido podem gerar no-
rápido possı́vel a abertura do ninho. Registra - se, porém, vas informações sobre a biologia dos cupins tanto quanto
predação ativa sobre esses ninhos pelo tamanduá - bandeira, sobre a interação destes com seus predadores, além de aux-
mesmo sendo muito resistentes (Redford, 1985). iliar no manejo dos tamanduás em cativeiro.
O gênero Nasutitermes apresenta defesa quı́mica (Prest-
wich, 1983; 1984; Coles 1980), e seus soldados têm uma
projeção tubular na cápsula cefálica (nasus) e mandı́bulas OBJETIVOS
rudimentares. As glândulas cefálicas secretam produtos
quı́micos repelentes que são esguichados através do nasus O objetivo deste trabalho é testar a eficiência de duas es-
(Leonardo & De Salvo, 1987; Moore, 1964). As secreções tratégias de defesa empregadas pelos gêneros Nasutitermes

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e Cornitermes contra a predação por tamanduá - bandeira Diferentes mecanismos anti - predação de térmitas podem
e, conseqüentemente a preferência alimentar desse mamı́fero influenciar os padrões de comportamento do tamanduá -
em relação a esses gêneros. bandeira, no que se refere ao distúrbio causado aos ninhos
e o tempo dispendido no forrageamento (Drumond, 1992).
Curtos perı́odos de forrageamento seriam decorrentes do
MATERIAL E MÉTODOS rápido decréscimo do valor da presa, posteriormente ao
ataque. A limitação do tempo de ataque do tamanduá -
O trabalho está sendo realizado no Parque Zoológico de bandeira a ninhos de Nasutitermes, devido à sua defesa
Goiânia com três tamanduás - bandeira (duas fêmeas, uma quı́mica, foi levantada por Redford (1985). Os resultados
adulta e uma jovem, e um macho adulto). Até o momento desses estudos corroboram com os resultados obtidos neste
foram feitos cinco testes. Para cada teste foram utiliza- trabalho.
dos dois blocos de cupinzeiros, um de Nasutitermes e outro Mas quais particularidades das estratégias de defesa tes-
de Cornitermes, ambos de tamanhos similares e correspon- tadas garantem mais eficiência a Nasutitermes contra a
dendo à metade de um cupinzeiro inteiro (cada ninho cole- mirmecofagia?
tado foi partido ao meio). Os testes duram 30 minutos e o
Um aspecto importante a ser considerado é o fato de que os
tempo de alimentação contı́nua gasto pelo tamanduá sobre
soldados das espécies pertencentes à subfamı́lia Nasutiter-
cada um dos blocos foi medido.
mitinae produzem, em geral, terpenóides como substância
A posição dos blocos no recinto dos tamanduás foi aleator-
de defesa. Esses terpenóides são substâncias voláteis de
izada (entre os dois locais disponı́veis) e cada bloco se dis-
cheiro forte que certamente irritam o aparelho olfativo dos
tanciava do outro de 1,5 a 2,0m. Os locais onde os blocos
tamanduás. Durante os testes era possı́vel observar o com-
eram colocados foram mantidos em todos os testes.
portamento do tamanduá diante dessa irritabilidade. Di-
Algumas precauções foram tomadas, a primeira delas foi versas vezes os mesmos bebiam água após ingerir cupins do
garantir a quantidade de cupins ativos presentes nos blocos- gênero Nasutitermes.
os blocos foram coletados no mesmo dia ou no dia anterior
Além das substâncias produzidas pelos cupins, o comporta-
ao teste e eram todos com grande quantidade de insetos
mento destes em relação à predação também pode contribuir
(após o teste os blocos ainda continham uma grande quan-
para a eficiência da defesa: a grande proporção de solda-
tidade de cupins ativos). A segunda precaução foi tomada
dos produzidos por Nasutitermes (em comparação com a
para garantir que a preferência dos tamanduás não fosse
menor proporção de soldados produzidos por Cornitermes)
devido à saciedade-os testes foram realizados antes dos an-
e o rápido recrutamento destes soldados nasutos para o local
imais receberem a alimentação dada pelo zoológico e nos
onde o predador começou o ataque (isso associado à grande
dias que os animais já estavam habituados a receber o cu-
quantidade de terpenos lançados por estes soldados) deses-
pim. Houve ainda o cuidado de minimizar ao máximo a
timulam o predador. No caso de Cornitermes, os soldados
presença dos observadores durante o experimento.
não são recrutados tão rapidamente para área afetada (a
maioria permanece dentro do termiteiro).
RESULTADOS Outro ponto a ser considerado é a resistência do ninho. Era
de se esperar que a maior resistência dos ninhos de Cor-
Para a tamanduá fêmea adulta foi medido até agora, um nitermes fosse um eficaz mecanismo de defesa. Porém essa
tempo de alimentação total sobre os blocos de cupinzeiros de premissa não é verdadeira contra a predação pelo tamanduá.
2087 segundos sendo que deste total, 1518 segundos foram Como observado nos testes, esses animais não possuem qual-
medidos para os ninhos de Cornitermes o que representa quer dificuldade em depredar os ninhos.
72,73% do total e 569 segundos foram medidos para os nin- Observou - se também nos experimentos atuais que os
hos de Nasutitermes, ou seja, 27,26% do total do tempo tamanduás não destruı́am o ninho por completo. A de-
gasto pelos tamanduás para se alimentares dos cupinzeiros. struição limitada dos locais de forrageamento e a pequena
Já para a tamanduá jovem, a diferença foi muito maior: duração da alimentação sobre cada ninho, foram aponta-
para os 3403 segundos, de alimentação sobre os cupinzeiros, dos por Montgomery & Lubin (1977) e Lubin & Mont-
observados, 100% deste tempo foi gasto com os blocos de gomery (1981) como uso prudente dos recursos alimenta-
Cornitermes. Para o tamanduá macho o tempo total foi res por tamanduás, que implica em um monitoramento da
de 636 segundos, sendo que 537 segundos foram para a ali- utilização de recursos, otimizando ganhos a longo prazo às
mentação de Cornitermes, o que representa 84,43% do total custas de ganhos imediatos.
e 99 segundos para Nasutitermes, correspondendo a 15,56%
do total.
Os dados ainda estão sendo coletados, portanto nenhum CONCLUSÃO
teste foi feito para determinar a significância entre estas
diferenças. Os diferentes mecanismos de defesa dos térmitas (defesa
Como os resultados nos mostram, há uma tendência dos quı́mica no caso dos Nasutitermes; predominantemente
tamanduás de despenderem mais tempo se alimentando dos fı́sica dos Cornitermes; evasão ou superpovoação do local
blocos de cupinzeiros de Cornitermes do que dos blocos de perturbado e a defesa mecânica dos ninhos) direcionam o
cupinzeiros de Nasutitermes. Segundo (Redford 1984), o comportamento alimentar dos tamanduás - bandeira, limi-
tempo de alimentação está altamente correlacionado com o tando o tempo de forrageamento e o distúrbio causado aos
número de cupins ingeridos pelo predador. seus ninhos.

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Ainda é necessária a realização de mais testes para melhor (Edentata, Myrmecophagidae). Biotropica, 13(1):66 - 76,
obtenção e confiabilidade dos dados. 1981.
Montgomery, G.G. & Lubin, Y.D. Prey influences on move-
ments of neotropical anteaters. In: Proceedngs of the
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of Montana, 1977. p. 103 - 131.
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Congo. Primates, Tokyo, v. 40, n. 4, p. 619 - 627, 1999. 375,1964.
Blum, M. S.; Jones, T. H.; Howard, D. F.; Overal, W. L. Noirot, C.; Darlington, J. P. E. C. Termite nests: archi-
Biochemistry of termite defenses - Coptotermes, Rhinoter- tecture, regulation and defense. In: Abe T., Bignell D.E.
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thesis-University of Southampton, 1980. sutitermes spp) and stomach contents from wild tamand-
Drumond, Maria Auxiliadora. Padrões de forragea- uas (Tamandua tetradactyla). Zoo Biology, Ontario, v.15
mento do tamanduá - bandeira (Myrmecophaga tri- ,n.5, 509 - 524, 1996.
datyla) no Parque Nacional da Serra da Canas- Prestwich, G.D. Chemical systematicsof termite exocrine
tra: dieta, comportamento alimentar e efeito de secretions. Ann. Rev. Ecol. Syst. 14:287 - 311, 1983.
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Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1992. 232, jan. 1984.
Leonardo, A.M.C. & De Salvo, C.R. A comparative study of Redford, K.H. Feeding and food preferences in captive and
the frontal glands in threespecies of Brazilian termite sol- wild giant anteaters (Myrmecophaga tridactyla). Journal
diers (Isoptera - Termitidae). Rev. Bras. Entomol., of Zoology, 205:559 - 572, 1985.
31(3):465 - 472, 1987. Stuart, A.M. Social behavior and communication. In: Kr-
Lubin, Y.D. & Montgomery, G.G. Defenses of Nasutitermes ishna, K.; Weesner, F. M. (Ed.) Biology of termites: Vol
termites (Isoptera, Termitidae) against Tamandua anteaters 1. New York: Academic Press, 1969. cap. 7 , p. 193 - 232.

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