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15/07/2020 Grupo de Whatsapp exalta Hitler e faz chacota com morte de Marielle - Ponte Jornalismo
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Imagens de Adolf Hitler, de soldados da Alemanha nazista com o braço direito levantado e o símbolo
máximo do nazismo: a suástica. Esses são símbolos compartilhados em um grupo de WhatsApp. Para
estudiosos, está configurado o crime de divulgação do nazismo.
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Integrantes do grupo Ultradireita, cujo nome é seguido de figurinhas da bandeira nacional do Brasil e o
símbolo de masculino, compartilham as imagens e ideais nazistas.
A Ponte teve acesso a parte das mensagens trocadas entre o fim de maio e o começo de junho. Uma fonte
permaneceu no grupo por aproximadamente uma semana antes de ser descoberta e expulsa. O canal
permanecia ativo no sábado (11/7), quando um dos moderadores conversou com a reportagem. O símbolo
usado como imagem principal é o sigma com o mapa do Brasil em azul, referência ao movimento integralista
brasileiro.
Na década de 1930, o jornalista Plínio Salgado liderou movimento cujo lema era “Deus, pátria e família”,
com ideais conservadores futuramente utilizados no golpe militar de 1964. Os seguidores desses ideais se
mantém na ativa atualmente, mas agora, com a abundante tecnologia disponível, se articulam no WhatsApp.
É possível confirmar no Ultradireita a presença de integrantes de ao menos cinco estados diferentes das
regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
“Aí, meus amigos. Que o sangue e honra estejam com vocês”, diz o dono de um número com DDD de Minas
Gerais ao entrar na conversa. “Estou me sentindo em casa, pois odeio LGBTs, feministas, comunistas e
socialistas”, comemora outra pessoa, com número do Rio de Janeiro. “Esse povo nem é gente”, recebe em
resposta de um homem chamado Marcus (não há detalhes sobre sua identidade), com telefone registrado em
Goiás. Ainda há membros com DDDs de São Paulo e Rio Grande do Sul.
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Em meio a figurinhas de Hitler e suásticas, os integrantes tiram sarro da vereadora do Rio de Janeiro Marielle
Franco (Psol), morta junto com o motorista Anderson Gomes, em março de 2018. Uma foto compartilhada no
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canal mostra um carrinho da marca Hot Weels com várias perfurações de balas e o comentário “brinquedo de
Marielle”. O autor é de São Paulo e utiliza a identificação “Aristocrata”, acompanhada de uma bandeira da
Itália.
Os membros exaltam a Polônia por “proibir o comunismo”. “Os poloneses são foda. País regrado na
ultradireita, anticomunista e antimimimi. Lá o pau come solto com quem tenta bater de frente com neonazis”,
escreve um perfil identificado como Pedro Rodrigues, em número com DDD de Minas Gerais.
O escritor e publicitário Ale Santos, colunista da Ponte Jornalismo, destaca que o integralismo da década de
1930 é a expressão nacional de supremacia branca, já em meio ao processo de embranquecimento da
população brasileira. “Tínhamos discussões abertas nessa época, essa ideia de raça biológica superior. Isso
perdurou até 1990. Era um consenso científico que negros eram uma raça diferente, inferior”, explica.
Crime inafiançável
Segundo a antropóloga Adriana Abreu Magalhães Dias, professora da Universidade Estadual de Campinas e
estudiosa de organizações neonazistas, está claro no grupo o crime de divulgação do nazismo. A profissional
analisou os prints das conversas a pedido da Ponte.
A lei 7.716/89, sobre racismo, caracteriza o crime no artigo 20: “fabricar, comercializar, distribuir ou veicular
símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins
de divulgação do nazismo”. Sua pena é de dois a cinco anos de reclusão e multa.
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“A suástica é proibida quando for utilizada num contexto de apologia à doutrina nazista. Não procedem as
alegações muito comuns de que é permitido a divulgação do nazismo sem a suástica: o crime existe”, explica
a professora. “O racismo é crime sem direito à fiança”, completa.
Em 16 de abril de 2020, três jovens foram abordados pela PM de São Paulo por usarem indumentárias
nazistas em camisas da banda norueguesa Burzum. Varg Vikernes, criador do grupo, defende a supremacia
branca e foi preso após matar um companheiro de sua antiga banda, a Mayhem.
A Polícia Civil liberou o trio sem indiciar pelo cometimento do crime citado pela especialista, atitude
considerada “conivente” com a prática, segundo especialistas.
Segundo a professora, existem mais de 350 células com ideais neonazistas no Brasil na atualidade. A falta de
punição contribui para existência e crescimento. “Essas pessoas se sentem extremamente confortáveis para
destilar ódio. Antes estavam apenas lendo material. Agora se sentem seguras de formar outros grupos e
células”, avalia Adriana.
O escritor e publicitário Alê Santos explica não ser novidade a existência e propagação de ideais embasados
na extrema-direita no Brasil. As primeiras referências de movimentos conservadores surgiram com Dom
Pedro II, quando houve convite de americanos para o país na segunda metade do século 19.
“Dom Pedro II era abolicionista, mas convidou os confederados a morar no país quando acabou a Guerra
Civil nos Estados Unidos”, exemplifica. Os confederados, que povoavam a região sul do país, defendiam a
escravidão do povo negro, a linha de pensamento eugenista (existência de uma raça superior) e defendiam
ideais conservadores.
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Conversas exaltam Polônia e cobram que Brasil proíba o comunismo | Foto: Reprodução
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O colunista cita a presença de nazistas fugidos da Alemanha, após a Segunda Guerra Mundial, como outro
episódio de apoio nacional aos supremacistas. Atualmente, identifica pensamentos similares nos ideais
bolsonaristas. Lembra quando, em uma live, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) bebeu leite,
simbologia usada pelos supremacistas brancos fora do país.
Leia também: Ameaça de alunos nazistas assusta professores de escola para surdos no Rio
“Por mais que Bolsonaro não tivesse consciência [do que significa a ação], influenciadores viram. Sabendo
da polêmica, a reforçam levantando suas bandeiras. Os verdadeiros supremacistas escondidos pensaram
‘vamos sair e abrir portas'”, pontua.
A Ponte conversou com três pessoas integrantes do grupo Ultradireita. Pedro Rodrigues, responsável pela
mensagem exaltando a Polônia, explica usar imagens de Hitler, da Alemanha nazista e da suástica por ser “fã
de história” e ter “interesse na Segunda Guerra Mundial”.
Sobre a presença no grupo e suas mensagens printadas, responde não ter nenhum intuito de “atingir pessoas
negras ou de origem judaica”. Questionado se tinha conhecimento do crime de divulgação do nazismo,
rebate: “E quanto ao uso da foice e do martelo? O comunismo, mesmo matando pessoas, é aceitável na
sociedade até os dias atuais”.
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Para ele, nazismo e comunismo são equivalentes. “Ambos mataram pessoas”, resume, ao criticar o uso de
camisas de Stalin, Che Guevara e Nicolas Maduro. “Se homens como eu usam uma camisa ou braçadeira
com a suástica ou a foto de Hitler nós somos criminosos”, critica.
Um homem acionou a reportagem após a Ponte conversar com alguns integrantes do Ultradireita. Ao se
denominar Matteo (apesar de usar o nome Pep como identificação no perfil), se apresentou como
administrador do grupo. Seu DDD identificava o número 54, com origem no Rio Grande do Sul. Classifica o
espaço como um local para debate de ideias.
Leia também: Depoimento | ‘Com Bolsonaro, você vai levar porrada até virar homem’
“No grupo, debatemos sobre política, não necessariamente o nacional-socialismo [referência ao nazismo].
Mandamos notícias, etc. Mostrar a verdadeira história com base em fatos, teorias e o quanto o progressismo
esquerdista é imundo”, detalha. Ao ser questionado sobre a presença de imagens de Hitler e da suástica, diz:
“Não considero um problema usar. Liberdade de expressão”.
Segundo ele, “coisas absurdas” são liberadas no Brasil, como “bandeiras do comunismo, idolatria de líderes
assassinos, como Che Guevara”. Matteo não se conforma que divulgação do nazismo seja um crime. “Não
concordo com isso. Espero que um dia mude”, deseja.
Há “desertores” do grupo, como quem se mantém ativo identifica as pessoas que saem, conforme prints
acessados pela Ponte. Marcus, o homem para quem LGBTs, feministas, comunistas e socialistas “nem é
gente” é um deles. À reportagem, explica ter saído do Ultradireita – ele não deu sua identificação por
completo.
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Marcus afirma que LGBT, feminista, comunista e socialista “nem é gente” | Foto: Reprodução
Marcus detalha que o grupo não representava suas convicções sobre o integralismo. Sustenta que a ideologia
do movimento foi “deturpada por ideias fascistas e nazistas”. “Hoje existem muitos integralistas que
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defendem a exclusão do Nordeste e seus traços culturais. Isso é impossível, vai contra o que acredito do
Brasil”, define.
O homem lembra de ver imagens exaltando Hitler e a Alemanha nazista enquanto permaneceu no
Ultradireita. “Muitas vezes. E a exclusão de negros do grupo. Quando percebi esse tipo de comportamento saí
do grupo de imediato”, afirma. “Eles montaram o grupo com a finalidade de compartilhar conteúdo
integralista, mas não era essa a pauta”, reconhece.
Segundo Marcus, o integralismo defende um país “soberano enquanto nação tanto no setor econômico quanto
social”. “Hoje o movimento integralista, cerca de 40%, virou espaço para divulgação do antissemitismo”,
estima, lamentando o que considera deturpação das ideias originais.
Tentativa de regulamentação
Um projeto de lei no Senado tenta regulamentar o uso das redes sociais. Chamado PL das Fake News, o texto
de número 2630/20, de Alessandro Vieira (Cidadania-SE), busca identificar os autores de mensagens ao
obrigar registro de documentos para uso de aplicativos. Também determina rastreamento das mensagens
pelas empresas, como WhatsApp e Telegram.
A intenção é indicar autores de possíveis crimes cometidos virtualmente, além de verificar contas
automatizadas e falsas. De acordo com texto da Agência Senado, também busca “evitar notícias falsas que
possam causar danos individuais ou coletivos e à democracia”.
No entanto, o alcance da lei não engloba grupos criados e difundidos nesta plataforma, como o Ultradireita. A
pretensão dos aplicativos perante a proposta de lei é manter “um espaço de conversação privada”, como
definiu um profissional do WhatsApp ao Uol.
Construa a Ponte!
Em entrevista publicada em junho pelo portal Uol, o diretor de políticas públicas do WhatsApp para América
Latina, Pablo Bello, sustenta que o projeto de lei cria o princípio de criminalização de todos os usuários.
“Todos somos classificados como suspeitos”, declarou. A crítica é justamente ao fato de a lei corromper o
“princípio da privacidade”.
“Fazendo uma analogia, é como se colocassem uma tornozeleira eletrônica em todos os brasileiros, de tal
forma que, ao sair na rua, podemos saber a qualquer momento com quem se reúnem, na casa de quem”,
exemplifica.
Caso aprovada, a lei determina que todas as mensagens disparadas em massa devem ser armazenadas pelos
aplicativos pelo período de três meses, com identificação dos usuários e total de pessoas atingidas.
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