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de Athena
Οι ματητές της Αθηνά
Thiago R. Miziara
Os Cavaleiros de Athena
Οι ματητές της Αθηνά
As Lendas do Grande
Hipermito
CAPÍTULO 1 – A TEOGONIA
1
“Big Will”. Em inglês, significa “Grande Vontade” ou “Suprema Vontade”. Também conhecido pelos fãs pelo termo “Suprema
Virtude”. Big Will é um termo idealizado por Kurumada, em sua obra intitulada Hipermito (que na verdade se trata de um
compêndio ou apêndice de Saint Seiya). Nesta obra, trata-se da Vontade Divina, um Poder capaz de realizar qualquer coisa.
Curiosamente, esse termo coincide com o conceito teológico de Vontade Divina ou Divina Providência, oriundo da Tradição
judaico-cristã.
2
“Big Bang”. Evento a partir do qual teria começado a existir o Universo, segundo a teoria científica mais aceita atualmente. Essa
teoria também foi acolhida pela Obra de Kurumada, segundo o que consta do Hipermito.
3
“Cosmos” em grego significa “Ordem”, “Mundo”, “Universo”. Ou seja, é o antônimo de “Caos”.
tudo aquilo que desejam. O Poder de fazer “milagres”. Isso mesmo. As
primeiras criaturas do universo herdaram a “Suprema Vontade” do Criador.
Por esse motivo, essas criaturas passaram a ser posteriormente
denominadas de “deuses” ou “anjos de Deus”, pois em muito se pareciam com
Deus, embora frequentemente não tivessem o mesmo comportamento ético e
amoroso que sempre apresentava o “Ser Supremo”. Esse comportamento
sempre correto e constante os deuses não herdaram de seu Criador. Eles
poderiam fazer o que quiser, seja bem ou mal. Isso era chamado “Livre-
Arbítrio”4.
Essa foi a origem dos primeiros “deuses” do Universo. E eles surgiram
mais ou menos junto com a emanação de toda a matéria e energia que formou
o Cósmos. Por esse motivo, era impossível dizer exatamente quando eles
surgiram. Mas é consenso que os primeiros “deuses” surgiram há cerca de uns
14 bilhões de anos, junto com os primeiros resquícios do Universo que
conhecemos. Os deuses, assim, tiveram um início. Não são seres eternos,
como Deus. São seres eviternos5, isto é, são imortais. Apesar de criados, sua
predestinação precípua é não ter um fim.
Da mesma forma que o Universo foi evoluindo e se aperfeiçoando, os
deuses foram evoluindo e às vezes até mesmo gerando novos deuses. É assim
que a Teogonia6 não pode ser, de modo algum, separada da Cosmogonia7.
Então, no princípio do Universo, a Teogonia se deu da seguinte
maneira:
Deus criou primeiramente 2 casais de seres imortais, cada casal para
presidir um aspecto do recém-criado Cósmos. O primeiro casal deveria presidir
a “matéria clara”, enquanto que o segundo casal deveria presidir a “matéria
escura”.
Então, esta era a Vontade de Deus: que o primeiro casal desejasse e
amasse a parte da criação relacionada à “matéria clara”, enquanto que o
segundo casal desejasse e amasse a parte da criação relacionada à “matéria
escura”. O primeiro casal de deuses era Urano e Gaia. O segundo casal de
deuses era Érebo8 e Nix.
4
“Livre-Arbítrio”. Esse termo é oriundo da Teologia cristã, e significa a capacidade que os seres racionais têm de escolher fazer
tanto o bem quanto o mal. Diferencia-se do termo “Liberdade”, que significa a capacidade de poder fazer o que quiser, mas só
querer fazer o bem. Enquanto o Criador detém a Liberdade perfeita, as criaturas racionais (sejam elas mortais ou imortais) detêm
apenas o “Livre-arbítrio”.
5
“Eviterno”. Termo teológico que significa “aquilo que tem início, mas não tem fim”. Diferencia-se de “Eterno” pelo fato de que
este é “aquilo que não tem início nem tem fim”. “Temporal” é aquilo “que tem início e fim”. Enquanto o Ser Supremo é Eterno, os
deuses criados são eviternos, e as demais criaturas são temporais.
6
“Teogonia”. Palavra grega que significa a “Origem dos deuses”, evento que na mitologia grega se refere às gerações dos
primeiros deuses e de seus descendentes.
7
“Cosmogonia”. Palavra grega que significa “Origem do Cosmo”, evento que na mitologia grega se refere ao início de todas as
coisas do Universo, isto é, do Universo em si.
8
“Érebo”. É o deus das trevas na mitologia grega. É o mesmo deus “Apsu” da mitologia sumeriana.
E de fato, assim que passou a existir, Urano conheceu tudo sobre a
matéria clara e passou a amar e a desejar as coisas claras. Urano era um deus
que inclinava sua SV9 sobre todas as coisas abstratas e invisíveis da matéria
clara, isso incluía todo o tipo de energia e força invisível, como o magnetismo,
a gravidade, a eletricidade e o próprio espaço profundo em si mesmo. O
conjunto de todas essas coisas materiais que não se podem ver é chamado
tradicionalmente de “céu” ou “firmamento”, pois são a “base estrutural invisível”
das coisas concretas que se podem ver na matéria clara. Desse modo, Urano é
considerado o “deus-céu” ou o “pai-céu”.
Sua esposa era Gaia. E, de fato, conforme determinado pela Suprema
Vontade de Deus, assim que Gaia passou a existir, ela passou a conhecer e a
amar todas as coisas claras. Como Urano se inclinou sobre a parte abstrata da
matéria clara, Gaia se debruçou sobre a parte mais concreta, visível e passiva
da matéria clara. O conjunto de todas essas coisas concretas, brutas e visíveis
da matéria clara é tradicionalmente chamado de “terra”. Desse modo, Gaia é
considerada a “deusa-terra” ou a “mãe-terra”.
Urano e Gaia se relacionavam intimamente, como verdadeiro casal.
Urano agia ativamente (arquétipo masculino), enquanto Gaia agia
passivamente (arquétipo feminino). Era muito evidente a forma como o desejo
de Urano de estruturar algo complementava o desejo de Gaia de ser
estruturada por algo. De fato, a parte visível da matéria clara era
constantemente influenciada e moldada pela outra parte invisível da matéria
clara. E, assim, a energia gravitacional, a eletricidade, o magnetismo e as
demais outras forças ocultas e invisíveis da natureza começou a estruturar e a
dar forma a átomos, a moléculas, que mais tarde formaram estrelas, que mais
tarde formaram galáxias, planetas, satélites e demais corpos brutos e visíveis
do Universo Cósmico.
Desse modo é que, desde o princípio do Cósmos, Urano e Gaia
colaboraram com o Ser Supremo na formação e na estruturação da principal
parte da Criação. Deus ia criando tudo. Urano e Gaia iam ajudando, pois seu
desejo se inclinava para essas coisas. Não que Deus não pudesse fazer tudo
sozinho. Ele podia. E muitas vezes Ele realmente teve que concluir os
trabalhos, enquanto seus deusinhos se distraíam com as curiosidades da
matéria. Mas Ele permitia que os seres imortais participassem da Criação,
porque queria humilhar ainda mais o Caos ao permitir que outras criaturas que
não fossem onipotentes pudessem moldar e formar algo onde antes não havia
nada. Sim, digo “criaturas” porque os deuses (os primeiros espíritos imortais),
embora fossem muito poderosos, não existiram desde todo o sempre. Foram
9
SV, abreviação de “Suprema Vontade” ou “Suprema Virtude”.
criados por Deus a partir do Nada, assim como todas as outras coisas do
Universo.
Quanto ao segundo casal de imortais, como já dito, foi-lhes ordenado
por Deus que presidissem a matéria escura. Essa matéria escura é algo ainda
totalmente desconhecido pela humanidade. Mas em termos de retórica,
podemos dizer que a “matéria escura” é a “antimatéria”, ou seja, é o exato
contrário-oposto da “matéria clara”. Por exemplo, sua mão direita é exatamente
igual à sua mão esquerda, exceto pelo fato de que a esquerda é o inverso da
direita. Assim, analogicamente falando, pode-se dizer que a antimatéria é como
a existência espelhada e inversa da matéria.
De fato, conforme determinado pela Suprema Vontade de Deus, assim
que Érebo foi criado, esse deus conheceu e desejou a “matéria escura”. Érebo
amava mais que tudo a “matéria escura”, e seu desejo se inclinava para as
partes mais abstratas e invisíveis da “matéria escura”. De modo grosseiro,
pode-se dizer que Érebo é o avesso espelhado de Urano.
Ademais, conforme previsto e querido por Deus, assim que Nix passou
a existir, essa deusa conheceu e desejou profundamente a “máteria escura”,
inclinando-se para a parte mais bruta, concreta e visível da “matéria escura”.
Também de modo analógico, pode-se dizer que a deusa Nix é o avesso
espelhado da deusa Gaia. Assim, enquanto Urano é o “deus-céu”, Érebo
passou a ser conhecido como o “deus-trevas”. De modo semelhante, enquanto
Gaia era conhecida como “deusa-terra”, Nix passou a ser chamada de “deusa-
noite”.
Érebo e Nix também se relacionavam intimamente e de forma
complementar, assim como Urano e Gaia se relacionavam. E esse
relacionamento deu origem a estruturas desconhecidas e ocultas da “matéria
escura”, um Universo inteiro formado de “antimatéria”. Nenhum humano
chegou a compreender como funciona esse universo invertido. Muitas vezes
ele parece muito real, outras vezes parece ser formado apenas de ilusões e
fantasias.
Por fim, do relacionamento de Urano e Gaia nasceram também outros
deuses primordiais, deuses poderosos que ajudavam seus pais a organizar o
Universo Cósmico. De modo genérico, essa primeira geração de deuses
nascidos de Urano e Gaia passou a ser conhecida como Titãs ou “deuses
titânicos”, pois seus poderes regulavam uma porção de forças do Cósmos.
Os primeiros titãs a surgirem no universo foram os gêmeos Chronos e
Kairós, os deuses do tempo. Isso porque a existência da matéria e da cadeia
de causas e efeitos fez surgir uma sucessão de eventos que iam de um início,
passavam por um meio e chegavam ao seu fim. Essa cadeia de eventos se
chamou tempo. Pela primeira vez em toda a Eternidade, o tempo passou a
existir.
Enquanto Chronos regia o tempo linear, Kairós fazia pontes
intertemporais, ia ao passado e voltava ao presente, visitava o futuro e voltava
dizendo qual era o melhor presente a ser escolhido. Chronos passou a ser
conhecido como o “deus do tempo linear”, enquanto Kairós passou a ser
conhecido como o “deus do tempo oportuno”. Portanto, de Urano e Gaia
nasceram Chronos e Kairós, os Titãs do tempo.
Ademais, após o nascimento dos titãs gêmeos, Gaia desejou ter um
filho apenas seu, sem que Urano colaborasse com a geração. Foi a primeira
Partenogênese10 da teogonia. Assim, da Suprema Vontade de Gaia nasceu um
deus chamado Pontos, o deus das profundezas da matéria sem forma.
Após o nascimento de Pontos, Urano e Gaia se relacionaram muitas
vezes novamente. Eles deram origem juntos ainda a outros Titãs, como o deus
Oceano, a deusa Clímene, a deusa Téia, a deusa Tétis, o deus Kéios, o deus
Kreiós, o deus Hypérion, o deus Jápeto, a deusa Feíbe, a deusa Mnemôsine, a
deusa Têmis, a deusa Afrodite11, e, por fim, a deusa Réia.
Esses eram todos os Titãs. Se houve mais ou menos Titãs dos que
acima foram mencionados, ou se alguns desses surgiram de modo diferente,
não é sabido de modo específico, pois a teogonia titânica ocorreu há bilhões de
anos antes do surgimento da raça humana, e muitos dos eventos desse
passado longínquo não se tornou conhecido ou simplesmente foi esquecido.
Mas de modo genérico, pode-se dizer que todos os deuses Titânicos nasceram
do primeiro casal de deuses imortais, Urano e Gaia.
Mas não pensem que o segundo casal primordial de deuses imortais
ficou atrás de Urano e Gaia, pois Érebo e Nix também colocaram em seu
“universo escuro” uma porção de seres sombrios e poderosos, que regiam
aspectos curiosos daquela antimatéria. Essa primeira geração de deuses
nascidos de Érebo e Nix ficaram conhecidos como os AntiTitãs12. Assim como
Urano e Gaia deram origem primeiramente a uma dupla de deuses gêmeos,
Érebo e Nix também deram origem primeiramente a uma dupla de deuses
gêmeos chamados Thânatos e Hypnos.
Se Chronos controlava linearmente o tempo, Thânatos controlava um
aspecto bizarro desse “anti-tempo” ou “tempo invertido”, a chamada
efemeridade. Desse modo, Thânatos arrastava todas as coisas criadas a um
10
“Partenogênese”. Gaia foi a primeira deusa primordial a gerar um filho sem a participação de um consorte.
11
Classicamente, Afrodite surgiu dos testículos decepados de Urano. Porém, essa adaptação foi feita para simplificar o enredo e
torná-lo mais coerente com a narrativa do hipermito, no qual Chronos atrai o antagonismo para si só.
12
“AntiTitã”. Termo cunhado apenas para esta ficção, para relacionar melhor o tipo de poder que esses deuses tinham em
referência aos Titãs.
fim estranho, silencioso e irremediável conhecido como Morte. A Morte era o
fim de qualquer coisa criada, e, no princípio, até mesmo os deuses tiveram
medo da Morte, pois não sabiam ao certo se poderiam ou não estar sujeitos a
esse fim misterioso.
13
“Erínias”. Palavra grega que significa “fúrias”. Estão associadas aos acessos de raiva e ira dos deuses e dos homens.
14
“Keres”. Palavra grega que significa “desgraças”. Estão associadas aos infortúnios, ao azar, à violência e aos desastres
suportados pelo mortais.
15
“Moíra”. Palavra grega que significa “destino”, “fado” ou “fatalidade”, algo do qual não se pode escapar.
16
“Éres”. Segundo a tradição de Homero, Éris seria uma filha de Zeus. Porém, segundo a tradição de Hesíodo, Éris é filha de Nix.
Evidentemente, os filósofos se referiam à mesma entidade, dando-lhe, contudo, origens diferentes e causando uma grande
confusão até hoje não resolvida. Aqui nesta obra, para evitar a mistura, optei por manter as duas origens, mas grafando a filha de
Nix com a vogal “e”, ficando Éres. Já a filha de Zeus, optei por grafar com a vogal “i”, ficando Éris. Portanto, nesta história, Éres e
Éris são deusas diferentes que controlam o mesmo aspecto da realidade: o ódio e a discórdia.
geração de deuses obscuros que voltavam sua Vontade para as coisas da
“matéria escura” (ou antimatéria) se chamava “AntiTitãs”.
O primeiro dos deuses Titânicos e AntiTitânicos a descobrir que
possuía o poder de gerar outros filhos por si mesmo, sem se relacionar com um
outro deus ou deusa, foi o AntiTitã Hypnos. Ele descobriu que o Titã Pontos
não havia nascido da relação entre Urano e Gaia, mas tão somente de Gaia, e
procurou se informar sobre o processo da Partenogênese. Ele descobriu como
realizar a gênese de deuses por si só. Ele então começou a desejar possuir
ajudantes para acompanhá-lo na tarefa de comandar o reino do Sono. E por
meio da sua SV, Hypnos deu origem a quatro outros deuses do sono, que
saíram unicamente dele mesmo. São os chamados “deuses oníricos”. O mais
velho deles é Morpheus (o deus do torpor), seguido por Oneiros (o deus dos
sonhos), seguido por Íkelos (o deus das ilusões), seguido, ao final, por
Phântasos (a deusa das fantasias). Portanto, Hypnos foi o primeiro a iniciar a
segunda geração dos imortais.
Dizem que Jápeto, um dos Titãs, filho de Urano e Gaia, observando
como Hypnos havia gerado filhos, desejou ele também a ter alguns filhos por si
mesmo, sem ajuda de uma outra deusa. Foi Assim que Jápeto deu origem a
Prometheus (deus da estratégia e do treinamento racional e espiritual), a
Epimetheus (deus do treinamento emocional), e a Atlas (deus do treinamento
corporal). Esses 3 deuses agiam sempre em conjunto.
Dizem que muito tempo depois que foram gerados por Jápeto, após a
criação da humanidade (na sexta idade do Universo), esses 3 deuses se
apaixonaram pelos referidos humanos mortais e desejaram melhorá-los e fazê-
los parecidos com os deuses. Enquanto Atlas desenvolvia e tornava robustos
os corpos dos humanos, Epimetheus desenvolvia suas mentes e emoções, e
Prometheus treinava o lado espiritual e racional dos homens. A ação desses 3
deuses raramente era vista com bons olhos pelos demais deuses, pois estes
eram ciumentos e não queriam que a humanidade se parecesse com eles. Mas
isso é assunto para um outro momento. Voltemos para o assunto da Teogonia.
Por exemplo, podemos citar também que Hypnos e Jápeto não foram
os únicos deuses a quererem ter filhos. Dizem que o Titã Oceano (um dos
filhos de Urano e Gaia) tomou como esposa a Titânide chamada Clímene
(também filha de Urano e Gaia). Do relacionamento entre os Titãs Oceano e
Clímene nasceram os deuses sátiros, as deusas Ninfas, as deusas Melíades e
as deusas Musas17. Esses deuses e deusas são tão numerosos que seria
impossível citar pelo nome todos eles. Mas um dos sátiros mais famosos foi
17
Uma outra versão mitológica considera que as Musas são filhas de Zeus. Porém, uma vez que Zeus deu origem a outros tantos
deuses, resolvi seguir uma outra tradição menos popular.
Filoctetes (o treinador de heróis), e algumas das Ninfas e Musas mais
conhecidas pela humanidade foram Melissa, Ninfadora, Calíope, Clio, Tália,
Urânia, Plêione, etc.
Ademais, Chronos foi outro dos deuses da primeira geração que
desejou ter descendentes, dando origem a uma outra segunda geração de
deuses. Mas ele quis ter descendentes das duas formas: por geração
espontânea e individual (como fizeram Gaia, Hypnos e Jápeto), e também por
geração relacional e familiar (como fizeram os 2 casais primordiais, Urano/Gaia
e Érebo/Nix, bem como fizeram também o casal de Titãs, Oceano e Clímene).
Isso porque Chronos era um dos deuses mais orgulhosos, poderosos e
obstinados. Ele não queria ser menor ou ter menos feitos que os outros
deuses. E de fato, desde quando nasceu, Chronos demonstrou ter a maior SV
de todos os “deuses” até então gerados. O Poder de sua Vontade era maior até
que a de Urano. Portanto, quando Chronos decidia fazer algo, nenhum outro
deus conseguia desfazer ou ir contra. Os casais primordiais evitavam contrariá-
lo. Os Titãs e AntiTitãs o temiam e até mesmo obedeciam suas ordens.
Então, utilizando o tremendo Poder de sua SV, Chronos deu origem
por geração espontânea, aos 3 Hecatônquiros e aos 3 Ciclopes18. Os
Hecatônquiros eram criaturas bizarras, cheias de braços, pernas e um desejo
louco de girá-los infinitamente num redemoinho mortífero e destruidor.
Pareciam verdadeiros tornados em ação. Nenhum dos deuses gostava de ficar
perto dos Hecatônquiros, pois eles destruíam tudo o que chegava próximo a
eles. Já os Ciclopes eram gigantes com um único olho em seu rosto. Esse
olho, porém, era capaz de sugar tudo o que havia ao seu redor, semelhante a
um aspirador de ar, que sugava toda a energia e matéria cósmica ao seu redor.
Portanto, igualmente nenhum dos deuses queria ficar próximo dos Ciclopes.
Por esse motivo, após a reclamação de todos os outros deuses, o
próprio deus Chronos resolveu capturar e aprisionar seus filhos destruidores
em um local longínquo do Universo Cósmico, uma prisão chamada Tártaro. Era
um local interdimensional e intransponível, trancado pela SV de Chronos. O
Tártaro19 era um buraco negro dentro do espaço-tempo, uma prisão criada por
Chronos, da qual era impossível de se escapar por dentro. Só era possível ter
acesso ao Tártaro pelo lado de fora, e, mesmo assim, para abrir o Tártaro, era
preciso ter um poder tremendo, um poder que superasse a SV de Chronos. E,
até o momento, Chronos era o imortal mais poderoso conhecido.
18
Classicamente, os Hecatônquiros e os Ciclopes são filhos de Urano, e não de Chronos. Porém, uma adaptação foi feita neste
romance para que servisse melhor ao propósito do enredo e para simplificar de modo geral a história.
19
Classicamente, o Tártaro fica dentro de Gaia, a simbolizar o interior do planeta terra. Porém, uma vez que, nesse momento da
história, o planeta terra sequer havia sido criado, essa adaptação foi feita para servir melhor ao propósito do enredo e para dar
um alcance maior ao poder dos titãs.
Após a prisão dos Hecatônquiros e dos Ciclopes, milhares de anos
depois, por volta da sexta Era do Universo, Chronos resolveu que era hora de
gerar filhos pelo método relacional. Então, o deus Chronos (o filho mais velho
de Urano e Gaia) tomou como esposa a deusa Réia (a filha mais nova de
Urano e Gaia). E do relacionamento entre os dois nasceram os deuses da
terceira geração da matéria clara (que futuramente seriam chamados de
deuses Olimpianos). O nascimento da terceira geração de deuses se deu na
Sexta Era do Universo, após a origem da humanidade.
“Seriam” eles, na ordem de nascimento, a deusa Hera, a deusa Héstia,
a deusa Deméter, o deus Hades, o deus Poseidon, e por fim o deus Zeus.
“Seriam” três deusas e três deuses. Disse “seriam” porque na verdade esses
deuses foram gerados por Chronos e Réia, mas nunca foram vistos por mais
ninguém desde sua geração até o dia em que, dizem, a humanidade recém-
criada descobriu sobre a existência do “Poder do Cosmos”20.
Onde estavam os filhos de Chronos?? Todos os deuses começaram a
achar que esses deuses eram de mentira, que Chronos não foi capaz de gerar
filho nenhum. Chronos, contudo, se gabava frequentemente de ter dado origem
a outros seis deuses. De fato, segundo Chronos, ele havia dado origem a 12
deuses, seis dos quais estavam aprisionados no Tártaro e mais outros seis,
cujo paradeiro era desconhecido até então. Dizia que um dia iria superar a
capacidade de seu pai Urano de gerar muitos deuses, e iria gerar mais filhos
deuses que o número de Titãs gerados por Urano e Gaia. Essa afirmação
enchia de indignação os outros deuses. Será que Chronos teria uma SV tão
potente assim? Se era verdade, então onde estavam os outros 6 deuses?
O que aconteceu a esses 6 deuses e o motivo pelo qual nunca foram
vistos antes de os humanos despertarem para o “Poder do Cosmos” serão
contados no capítulo seguinte deste livro. Por hora, voltemos à Teogonia, a fim
de completar a lista da origem de todos os deuses conhecidos pela
humanidade.
Dos 12 filhos de Chronos, ao que se sabe, apenas Poseidon, Zeus e
Hera tiveram filhos. E Zeus teve tantos filhos que sequer se sabe a identidade
e o paradeiro de todos eles. Nesse quesito da geração, Zeus parece ter
superado seu Pai Chronos e seu avô Urano (ademais, como veremos no
próximo capítulo, Zeus irá superar seus ascendentes divinos em muitos outros
aspectos).
20
“Poder do Cosmos”. É como os homens conhecem o poder de realizar grandes feitos com base na sua própria vontade e
esforço. É o mesmo poder da Suprema Vontade, porém muito mais reduzido. Isso porque aos homens não basta apenas desejar.
Eles precisam explodir essa vontade, levando-a ao extremo. E mesmo assim o efeito é ainda muito menor que o causado pelos
deuses. Para conseguirem utilizar o poder cósmico ao seu favor, os homens precisam aprender a controlar o seu sétimo sentido.
Retomando, Zeus teve tantos filhos que sequer se sabe a identidade e
o paradeiro de todos eles. Dizem que Zeus chegou a ter cerca de 114 filhos,
sendo que, dentre eles, muitos foram até mesmo chamados de heróis pelos
humanos.
Porém, ainda que tenham sido numerosos os filhos de Zeus, vale a
pena lembrar os nomes dos filhos mais ilustres e conhecidos de Zeus e Hera21.
São eles os seguintes deuses da terceira geração: os gêmeos Apolo e Ártemis
(deuses do sol e a da lua, respectivamente), Ares (deus da guerra), Éris22
(deusa da discórdia), Hermes (deus dos ventos), Hefestos (deus da forja),
Dionísio (deus do vinho), Perséfone (deusa da primavera), Hércules (deus da
resiliência), Perseu (deus dos reis persas), Hebe (deusa da juventude), Estige
(deus dos rios), Pallas (deusa dos ciúmes), Kratos (deus da força física), Bia
(deusa da violência), Zelos23 (deus da rivalidade e do entusiasmo), e as
gêmeas Athena e Nike24 (as deusas das batalhas e da vitória,
respectivamente).
Quanto a Poseidon, dizem que, durante a Titanomáquia, esse deus
teve relações com a sua tia, a Titânide Tétis, dando origem a Chrysaor (deus
da lança dourada) e a Pégasos (deus que criou uma raça de cavalos alados,
que se tornaram conhecidos por esse mesmo nome)25.
No que se refere aos filhos de Zeus, sabe-se que, após a
Titanomáquia, o deus Hefestos se casou com a deusa Afrodite. Porém, como
Hefestos era feio e taciturno, a mencionada titânide nunca quis se deitar com
ele. Ao invés disso, tinha secretamente relações sexuais com o deus Ares, pois
este era belo e musculoso como seu pai Zeus. Da relação entre Ares e sua tia-
avó Afrodite nasceram Eros (deus do amor), Harmonia (deusa da concórdia),
Fobos (deus do medo) e Deimos (deus do pânico). Eros e Harmonia herdaram
a beleza e o temperamento de sua mãe Afrodite. Já Fobos e Deimos herdaram
o temperamento e a impetuosidade de seu pai Ares. Dizem que, quando Ares
21
Na verdade, na mitologia clássica, nem todos esses deuses listados são filhos de Zeus e Hera, mas apenas alguns são filhos dos
dois, outros são só de Hera, já outros são filhos do adultério de Zeus com outras deusas e até com humanas (semideuses). Por
exemplo, Perséfone é filha de Zeus com Deméter, já Hércules é filho de Zeus com a humana Alcmena, etc. Mas para simplificar a
história, evitar discussões morais, retirar o foco dos relacionamentos dos deuses e colocar o foco na história dos cavaleiros, optei
por adaptar os mitos e considerar que todos esses personagens são deuses (ignorando que entre os filhos de Zeus há semideuses)
e que são todos filhos do casamento entre Zeus e Hera.
22
Ver a nota de rodapé de número 14.
23
Uma outra corrente mitológica considera que o deus Pallas (macho) e a deusa Estige (fêmea) teriam gerado os deuses Kratus,
Bia, Zelos e Nike. Porém, na obra SS Ômega, Pallas é uma deusa (fêmea) e é chamada de irmã de Athena. Portanto, para
simplificar o mito, optei por seguir a adaptação feita pela Toei, por ser mais coerente com o panorama imaginado por Kurumada.
Nesse sentido, considerei Pallas como deusa (fêmea), Estige como um deus (macho) e que todos os filhos de Pallas seriam na
verdade seus irmãos (portanto, filhos de Zeus). Apenas uma simplificação que não traz prejuízo algum ao mito.
24
Ninguém nunca viu a deusa Athena sem estar ao lado da deusa Nike. Uma vez que, em todas as obras de saint seiya, e até
mesmo em todos os mitos, as duas deusas estão sempre juntas, considerei Athena como irmã gêmea de Nike. Apenas uma
adaptação, bem intuitiva e natural.
25
Na verdade, o mito clássico diz que Chrysaor e Pégasos são filhos de Poseidon com a Medusa. Nessa versão, Pégaso seria o
próprio cavalo alado. Porém, preferi adaptar a história do mito grego clássico para melhor atender às expectativas do hipermito.
Aqui, os dois deuses são filhos de Poseidon e Tétis, sendo que Pégasos é o criador dos cavalos alados, mas não o próprio cavalo.
saía para lutar nas suas guerras, seus filhos Fobos e Deimos iam à frente para
desestabilizar as tropas dos inimigos, garantindo a vitória para seu pai.
Portanto, foram mencionadas quatro gerações de deuses, que foram
surgindo desde a criação do Cósmos até depois do surgimento da
humanidade. Via de regra, sabe-se que o Poder Cósmico da SV dos deuses é
grande na primeira geração e vai enfraquecendo conforme se passam as
gerações, de modo que os deuses mais antigos são mais poderosos que os
deuses mais novos. Até hoje, as exceções a essa regra são Chronos e Zeus.
Isso porque Chronos superou o poder de seu pai Urano, e Zeus superou o
poder de seu pai Chronos. Assim, apenas na linhagem desses 3 deuses
(Urano -> Chronos -> Zeus), o poder cósmico da SV só foi aumentando com o
passar das gerações.
Ao que se sabe, essas foram as quatro gerações de deuses que
formam a lista da Teogonia, conforme se lembram os humanos mais sábios da
era clássica, bem como os nobres filósofos. Se existiram ou ainda existem
outros deuses além desses, é porque não chegaram a ser conhecidos pelos
humanos ou então foram esquecidos. Como já dito, o próprio Zeus parece ter
tido inúmeros outros filhos que sequer são lembrados nos contos antigos do
hipermito.
CAPÍTULO 2 – A COSMOGONIA
A Origem do Universo
e o Surgimento da Humanidade
26
Considerando “ano” a mesma unidade de tempo humano na Terra, muito embora a Terra ainda não existisse neste momento
primordial. Obviamente, usa-se a contagem humana de tempo para tornar a história do Cósmos compreensível ao próprio
homem, ainda que de modo abstrato.
menos de 1 segundo até ter o tamanho de galáxias, se parecia com um ovo.
Um Ovo cósmico, feito de pura energia e matéria superdensas e superquentes.
De repente, no segundo imediatamente após a expansão do ovo de luz, toda
essa energia e matéria acumuladas ali explodiu.
BUUUMMM...
27
Big Bang.
28
Os humanos chamam esse elemento primitivo de “átomo de Hidrogênio”. Mas antes do surgimento dos homens, ele era
conhecido pelos imortais como “éter”.
Aqueles sete espíritos primordiais olharam para o Ser Supremo,
esperando a aprovação daquela imensidão de “sopa cósmica”. Para felicidade
dos deuses, a chama vermelha e invisível do Ser Supremo saiu de Deus e
começou a pairar sobre todo aquele “mar primordial” de éter. O Espírito de
Deus pairava sobre as águas primordiais29, abençoando aquele éter,
preenchendo o Universo inteiro com a Sua Presença necessária, sem a qual
toda a matéria e toda a energia voltariam ao Nada.
A partir do momento em que Deus emanou-Se para preencher o
Universo, a Chama Divina emanada de Deus fez átomo se aproximar de
átomo. Logo, em alguns milhões de anos, uma quantidade enorme de átomos
primordiais se juntou, e se aqueceu tanto, que começou a brilhar e a pegar
fogo numa grande bola incandescente.
Nascia, então, a primeira estrela do Universo.
O nascimento da primeira estrela foi como uma nova criação da luz.
Pois desde o evento do Big Bang, nada mais havia brilhado no Universo. Com
o surgimento da primeira estrela, a luz voltou a brilhar pelo Cósmos30.
Aquela primeira estrela era supergrande, superquente e muito
brilhante. Ela iluminou toda a vastidão do Universo que havia próximo a ela,
revelando a cor e a forma do éter. E então, os 7 seres começaram a imitar o
Ser Supremo. Assim, eles criaram milhões e milhões de outras estrelas.
Enquanto os sete iam construindo estrelas, o Ser Supremo ia fazendo as
estrelas interagirem entre si. Ele as agrupava em montes de bilhões, e outros
montes de bilhões, enquanto a energia da explosão inicial afastava os grupos
de estrelas, espaçando-as umas das outras. Érebo e Nix ajudaram Criador
nessa tarefa de espalhar os conjuntos de estrelas uns dos outros, com o poder
da matéria/energia escura. Foi assim que surgiram as grandes galáxias do
Universo.
Muitos milhões de anos depois, secretamente, no interior de cada uma
das estrelas, os átomos de éter eram tão comprimidos pelo peso da própria
estrutura estelar que acabavam se fundindo entre si. Assim, 2 átomos de éter
(cada um formado por 1 próton e 1 elétron) eram comprimidos tão
violentamente que se fundiam em um novo átomo (formado agora por 2
prótons e 2 elétrons). No interior das estrelas, o éter do universo se
transformava em etérium31, o segundo elemento do Cósmos. Em termos
modernos, o hidrogênio se fundia no interior das estrelas e dava origem ao
29
É esse o sentido cosmológico do verso contido em Gn 1,2.
30
Gn 1,3. A criação da Luz começou no Big Bang, mas se consumou com o surgimento da primeira estrela. Interpretando o relato
bíblico, só nesse pequeno verso parece ter-se transcorrido bilhões de anos cósmicos.
31
Esse é o mesmo elemento que os humanos mais tarde chamariam de “átomo de Hélio”. Isso porque os homens antigamente
davam ao Sol o nome de Hélio. Como o elemento surgiu dentro das estrelas, os homens deram a esse elemento o nome “hélio”.
hélio. É que, por serem muito grandes, as estrelas queimavam hidrogênio
como combustível. Porém, a massa de hidrogênio era tão grande que a
gravidade da estrela a mantinha em compressão, evitando que a energia da
fusão atômica explodisse a estrela de dentro pra fora. A gravidade esmagava
os átomos no núcleo. Os átomos do núcleo se fundiam, gerando novos
elementos e liberando energia e calor em forma de explosões que iluminavam
e aqueciam os arredores de cada estrela. Mas a estrela continuava viva e
redonda, porque a gravidade a comprimia de volta. Um equilíbrio entre
explosão de fogo e compressão de massa gravitacional. Uma estrela brilhando
no universo.
Desse mesmo modo, conforme as estrelas iam ficando maiores e as
camadas de fora da estrela iam esmagando as camadas de hidrogênio em seu
interior, novos átomos de hidrogênio e hélio se fundiam entre si, dando origem
a outros elementos mais pesados, um a um: lítio, berílio, boro, carbono,
nitrogênio, oxigênio, flúor, neônio, sódio, magnésio, alumínio, silício, fósforo,
enxofre, cloro, argônio, potássio, cálcio, escândio, titânio, vanádio, cromo,
manganês e ferro...
As estrelas daquele universo primitivo produziram milhares de novos
átomos em seu interior, camada por camada, estando os elementos mais leves
nas camadas superiores, e os mais pesados nas suas camadas mais internas.
Contudo, quando o núcleo da primeira estrela a fundir átomos
finalmente produziu pela primeira vez o elemento “ferro”, então algo muito
bizarro aconteceu. As forças que mantinham a estrela viva acabaram
colapsando. Isso porque o ferro é um elemento que suga e acumula a energia,
porque absorve e conduz maior calor. É um metal com ótimas características
de condução de calor. Isso significa que o núcleo de ferro das estrelas puxou
mais energia do que liberou em explosão. O equilíbrio entre a gravidade que
esmaga as camadas da estrela e a energia que as expande se desfez. A
gravidade venceu a batalha, fazendo as camadas externas da estrela
literalmente desabarem subitamente sobre todas as camadas inferiores do
núcleo. A estrela literalmente virou do avesso. Essa inversão foi tão grande que
as camadas de fora da estrela foram para dentro violentamente, enquanto que
as de dentro simplesmente liberaram de uma vez toda aquela energia
acumulada pelo ferro, fazendo explodir a estrela de dentro para fora.
BUUUMMM...
Uma supernova.
Isso aconteceu quando Érebo e Nix geraram Thânatos e Hypnos no
Universo. Foi Thânatos quem sugeriu a morte da estrela. A primeira morte do
Universo. Até aquele momento, nada havia sido destruído no Universo. Apenas
construído. Mas a morte da primeira estrela não foi em vão. Estava nos planos
do Ser Supremo.
Deus se aproveitou da explosão da estrela para espalhar os elementos
mais pesados pelo Cósmos. Todos aqueles elementos mais pesados, que
foram fundidos no núcleo da estrela, agora estariam livres pelo espaço-tempo,
e seriam essenciais para a criação das demais coisas e da vida no Universo,
seriam usados como matéria-prima na criação de planetas, satélites e outros
corpos cósmicos, inclusive a vida humana.
Depois da morte da primeira estrela, mais e mais estrelas começaram
a explodir em supernovas no Cósmos, espalhando elementos pesados pelo
espaço-tempo e permitindo a existência da matéria-prima que seria usada na
criação dos planetas e de outras formas de criaturas e de vida.
Mas nem todos os elementos passaram a existir em quantidades iguais
no Universo. As estrelas passavam milhares de anos fundindo átomos em seu
interior, proporcionando a geração de toneladas de átomos menos pesados
que o ferro. Porém, devido à súbita e rápida explosão da supernova, o pouco
tempo que a gravidade das camadas superiores das estrelas tinham para fundir
outros elementos mais pesados que o ferro (antes que o interior da estrela
explodisse para fora) fez gerar pouquíssimos elementos mais pesados que o
ferro. Um dos últimos elementos naturais a serem criados foi o metal chamado
“ouro”. Apenas por um nano segundo antes de as estrelas morrerem, elas
conseguiam fundir mais átomos pesados e criar o elemento ouro, por exemplo.
Por isso é que na natureza acha-se em abundância uma grande quantidade de
ferro e outros elementos mais leves que ele. Mas há muito menos quantidade
de outros metais mais pesados, sendo que o mais raro de todos os metais era
o ouro, átomo cujo núcleo é tão grande e denso que possui 79 prótons e 79
nêutrons em seu interior, com uma amplíssima eletrosfera de 79 elétrons. E
nem toda estrela era tão grande e vivia tempo suficiente para conseguir fundir
ouro em seu interior. A maioria das estrelas morria antes de conseguir isso. Só
as estrelas maiores e mais pesadas conseguiam gravidade suficiente para
fundir átomos de ouro em seu núcleo comprimido.
Então o Universo conheceu o seu apogeu, a sua idade de ouro. Havia
estrelas aos bilhões, que formavam bilhões de galáxias. E agora, cada estrela
podia ver nascer ao seu redor corpos mais brutos e pesados, pois os
elementos liberados do interior das estrelas mortas permitiram a formação de
cometas, satélites, planetas, sistemas planetários inteiros. Lugares onde os
átomos criados se combinavam em variações infinitas, dando origem a novas
substâncias. Hidrogênios se juntavam com oxigênio e formavam moléculas de
água. O carbono começou a ligar-se entre si e também com outros elementos,
formando moléculas cada vez mais complexas de proteínas e aminoácidos,
que futuramente seriam a origem do DNA.
Então, mais e mais planetas começaram a existir no Todo.
Esse foi o fim da primeira Era do Universo.
Ademais, da explosão do Big Bang até o aparecimento dos primeiros
planetas, praticamente todos os deuses de primeira e segunda geração já
tinham surgido no Cósmos. Já haviam nascido os Titãs, os AntiTitãs, os
Hecatônquiros, os Ciclopes e muitos outros espíritos imortais. Foi também
nesta Era do Universo que Chronos foi obrigado a aprisionar os seus 6
primeiros filhos no Tártaro, uma prisão dentro de um buraco-negro, do qual era
impossível de se escapar.
Porém, Chronos e Réia ainda não haviam dado origem aos seus outros
6 filhos mais novos.
32
Também conhecidos como “faunos”.
Mas... e as estrelas? Já não existiam antes da Quarta Era? Sim, as
estrelas foram criadas na Primeira Era. Contudo, a luz das estrelas,
evidentemente, demorou milhares de anos para aparecer no firmamento do
mundo, dadas as grandes distâncias astronômicas que separavam aquelas
estrelas do planeta Terra. Ou seja, ainda que as estrelas tivessem surgido
apenas alguns milhares de anos após a explosão do "big bang", foi apenas na
quarta Era do Cósmos que a luz dessas estrelas efetivamente "apareceu" nos
céus da Terra.
E todos os deuses ali presentes olharam para cima e se enamoraram
de ver que aquelas enormes bolas de gás incandescente que haviam ajudado
a criar bilhões de anos atrás finalmente surgiam ali naquele lugar distante do
Cósmos, e de ver que pareciam nada mais do que apenas pequenos pontos
coloridos de luz. Era comovente e cativante. Muitos dos deuses ficaram anos a
fio contemplando as estrelas.
O segundo casal primordial de deuses, Érebo e Nix, amou flutuar nas
escuridões das sombras proporcionada pelo movimento do planeta. É que a
grande esfera da Terra girava continuamente. Ora estava voltado para o sol,
ora ficava nas sombras. Era nas sombras que Érebo e Nix passaram a habitar,
por isso é que esses deuses começaram a ser chamados pelos homens
posteriormente de Trevas e de Noite, respectivamente.
Os outros deuses gerados há bilhões de anos por Érebo e Nix também
se enamoraram desse espetáculo que era o claro e o escuro. Muitos deles
amaram mais as trevas e a noite, como Thânatos, Hypnos e as Erínias. Já
outros gostaram mais da luz das estrelas, como as Keres e as Moíras. Quanto
aos filhos de Hypnos, eles tinham fascínio pela mudança e alternância em si
entre o dia e a noite, pois essas transições favoreciam as ilusões e as quimeras
que eram de domínio de Oneiros, Morpheus, Íkelos e Phântasos.
E, então, após milhares de anos, acabou a Quarta Era do Universo.
.........................
35
A Palavra “Adão” significa em hebraico “barro”. Esse era o nome do primeiro homem, porque foi feito do barro.
36
“Adão e Eva”. Em hebraico significa “Barro” e “Vida”, respectivamente, pois a mulher é a vida de seu homem.
37
“Ândros e Pandora”. Em grego significa em “Macho” e “doadora de tudo”, pois a mulher é aquela que tudo dá ao seu marido.
jardim paradisíaco passou a ser conhecido como o “jardim do Éden” 38. Naquele
paraíso, Deus colocou os 2 casais de mortais humanos primordiais.
No restante do mundo, Deus ordenou que a Terra brotasse “embriões”
de barro. E assim foi feito. Da Terra começou a irromper bolhas, fazendo surgir
grandes “embriões” de barro em toda a extensão do planeta. Eram bolsas de
água com uma crosta de barro por cima, que subiam da Terra e depois
eclodiam como se fosse ovos rachando. Dos embriões de barro saíam homens
e mulheres, semelhantes aos originais modelados pelas mãos de Deus. Em
poucos instantes, a Terra inteira estava totalmente preenchida pela criatura que
espelhava e refletia a imagem do Ser Supremo. Homens e mulheres encheram
a face da Terra.
E Deus, então, foi morar com os 2 casais primordiais no jardim que
havia criado para eles. E, ali, eles conviviam e interagiam entre si, como uma
família. O ser humano caminhava com Deus todos os dias.
Os imortais, ao verem tudo isso acontecer, se indignaram. Como
podem esses seres inferiores possuir a imagem do Altíssimo? Não deveríamos
nós também termos essa mesma imagem? Por que não podemos nos parecer
também nós com o nosso Criador, já que somos mais perfeitos e poderosos
que os homens? Então os deuses se lembraram do discurso de Deus. Os que
já haviam assumido um corpo não poderiam escolher outra forma visível, pois a
escolha foi definitiva. Ninguém pode ter mais do que uma única imagem visível.
Foi assim que Urano, Gaia, Érebo, Nix, Pontos, Oceano e Clímene não
puderam mais mudar de corpo.
Porém, os outros deuses, embora tivessem se enamorado de outros
locais, fenômenos ou criaturas, não chegaram a literalmente assumir um corpo,
mas apenas habitaram junto àquelas realidades que mais lhes satisfaziam.
Então, esses seres que ainda não haviam assumido um corpo se reuniram
diante de Deus e Lhe falaram:
- Eis que somos imortais, superpoderosos. Eis que herdamos o poder
da Suprema Vontade. Contudo, estamos invisíveis neste planeta onde tudo é
imagem e tudo é muito belo. Queremos ter nós também corpos belos como os
dos humanos, pois eles possuem uma imagem semelhante à Tua.
- Meus queridos – respondeu Deus – A vocês eu dei a Suprema
Vontade, e tudo o que vocês desejam do fundo de seus corações é
automaticamente realizado. Aos homens, porém, não foi dada a Suprema
Vontade. Não passam de animais frágeis e vulneráveis em um planeta
38
“Jardim do Éden”. Era um jardim paradisíaco no meio de um deserto. Literalmente, significa que apenas Deus pode fazer brotar
vida em qualquer lugar, mesmo nos lugares mais ermos e desertos. Mais tarde, o próprio jardim passou a ser chamado de Éden,
por antonomásia.
perigoso e hostil. Nada mais justo que ao menos a imagem perfeita eles
tivessem herdado de Seu Criador.
- Aos nossos olhos, no entanto, não parece justo que criaturas tão
imperfeitas e débeis ostentem tamanha beleza e formosura. Achamos justo que
nós, que estamos Contigo há bilhões de anos, desde o princípio do Cósmos,
tenhamos uma imagem semelhante à Tua. Se nossos pais puderam assumir
corpos menos belos e nobres, e se nós podemos assumir também corpos de
criaturas mais selvagens e antigas, porque não podemos agora assumir a mais
bela das formas? Seria, por acaso, o Ser Supremo mesquinho a ponto de nos
negar esse dom?
- Nunca fui invejoso nem mesquinho em toda a eternidade. A prova
disso é a infinidade de criaturas diferentes em todo o Universo criado. Nem
mesmo o Meu poder eu reservei apenas para Mim, pois o dei de presente a
vocês. Pois bem. Vocês podem assumir a forma humana – respondeu o Ser
Supremo. – Contudo, se o fizerem, considerarei justo algum dia conceder o
“poder cósmico” também aos homens. E, então, os homens poderão desejar
ser deuses. E eles poderiam vir a ser, desse modo, deuses como vocês.
Consideram isso justo?
- Não nos importamos com o fato de o homem possuir a Suprema
Vontade. Porém, que isso não aconteça a todos eles, pois somos apenas
alguns poucos deuses. Eles, entretanto, são multidões de pessoas que se
espalham por toda a superfície da Terra. É preciso haver uma limitação, para
que os homens não se tornem superiores a nós, que estamos Contigo desde o
princípio do Universo.
- Então, considerem a seguinte proposta: vocês poderão assumir a
forma humana, isto é, a Minha própria forma. Porém, colocarei no coração do
homem apenas a capacidade para despertar o “poder do cosmo”, e não o
poder já operante em si. A princípio, eles não poderão usar esse poder, e
sequer saberão que possuem essa capacidade. Contudo, quanto mais
conscientes desse poder se tornarem, mais próximos poderão chegar de
alcançar o nível da Suprema Vontade. Este será o único freio: não poderão
sequer despertar para esse poder, a não ser que contemplem a Chama Divina,
que é a imagem invisível do Meu próprio Ser. Pois é justo que, já possuindo a
imagem visível do Meu Ser, os homens só venham a herdar a Suprema
Vontade ao se tornarem capazes de enxergar a imagem invisível do Meu Ser.
Deus, então, ergueu a palma de sua mão direita, e sobre a palma de
Sua mão surgiu uma pequena bola de Luz azul, que foi envolvida por uma
chama amarela, que foi envolvida por uma língua de fogo vermelha. Essa
pequenina chama visível era uma cópia da imagem invisível de Deus.
- Eis aqui a Chama Imperecível. Aqueles humanos que contemplarem
essa chama poderão despertar para o poder do cosmos, o poder da Vontade
Divina.
Deus fez uma pausa em seu discurso. Os deuses ficaram admirados
de ver, pela primeira vez, uma cópia visível da chama invisível do Ser de Deus.
Então, Deus voltou a falar:
- Até agora, a maioria dos deuses inclinaram sua vontade sobre todas
as outras criaturas criadas. Mas há 3 entre vocês que não haviam se inclinado
sobre nenhuma outra criatura forjada antes do ser humano. São os 3 filhos de
Jápeto: Atlas, Epimetheus e Prometheus. Contudo, percebo agora que esses 3
Titãs se inclinam, desejam e amam a criatura humana mais do que todos os
outros deuses desejam. Por isso, proclamo os filhos de Jápeto como os oficiais
protetores da Humanidade. E a um deles eu confiarei a Chama Divina, para
que seja entregue aos homens no momento oportuno, isto é, no momento em
que eles tiverem maturidade suficiente para lidar com o poder cósmico.
Ao olharem a Chama Divina, os deuses que queriam assumir a forma
de um corpo humano automaticamente se tornaram visíveis. A primeira a
assumir o corpo humano foi a deusa Afrodite, e, por isso, a ela pertence o mais
belo corpo assumido pelos deuses. Em seguida, assumiram um corpo humano
os deuses Chronos, Kairós, Feíbe, Réia, Téia, Tétis, Kéios, Kréios, Hypérion,
Têmis, etc... Os últimos a assumirem um corpo humano foram os filhos de
Jápeto: Atlas, Epimetheus e, por fim, Prometheus.
Foi então que Deus chamou Prometheus à Sua presença para
entregar-lhe a cópia da Chama Divina, pois havia prometido39 que a confiaria a
um dos filhos de Jápeto. Prometheus se aproximou, mas temeu segurá-la com
suas próprias mãos, pois se considerava indigno. Usando sua SV, Prometheus
criou uma tocha de ouro puro, encrustada de diamantes. E com a tocha, ele
tomou a Chama Divina.
Havia no jardim do Éden uma quantidade enorme de árvores frutíferas
de todas as espécies. Mas no centro do jardim havia especialmente uma árvore
que Deus reservou apenas para Si mesmo. Essa árvore se chamava “árvore
do conhecimento do bem e do mal”. Isso porque Deus reservou para Si o
poder de definir o que é certo e o que é errado, tornando-Se o único justo juiz
entre todas as criaturas do Cósmos. Nenhum deus ou homem poderia chegar
próximo dessa árvore ou comer de seus frutos, não poderiam tocá-las, nem
mesmo chegar próximo a elas. Essa única árvore era o lembrete da Soberania
do Ser Supremo. As criaturas poderiam fazer o que quisessem, desde que não
39
Sim... um jogo de palavras. Deus “prometeu” a chama ao “Prometheus”. Obviamente, esse jogo de palavras não deve funcionar
muito bem em outras línguas, o que é uma pena.
tocassem na árvore de Deus, isto é, que não discordassem de Deus a respeito
do que é certo ou errado fazer. Todas as criaturas deveriam se submeter a
Deus, ou seja, ao que Deus definia como certo ou errado. E era justo que Deus
exercesse a Soberania, pois de fato Ele era o único que conhecia todas as
coisas, e tinha perfeita liberdade. Ele era o modelo de liberdade, para que as
criaturas pudessem bem exercer o seu livre-arbítrio e o seu direito de escolha
entre os bens e dons criados pelo Altíssimo.
Havia ainda, no jardim do Éden, uma outra árvore semelhante à árvore
de Deus. Essa árvore foi escolhida por Prometheus para abrigar a Chama
Divina. Por esse motivo, essa árvore se chamava “a árvore da Vida”. E a sua
localização no jardim era secreta. Ninguém, exceto Prometheus, sabia onde se
localizava a árvore da Vida40. Ela era uma árvore enorme, gigantesca, e dentro
de seu interior, Prometheus esculpiu um pequeno santuário, onde depositou a
tocha de ouro com a Chama Divina e imperecível.
Após esses eventos, os deuses com corpo humano ficaram satisfeitos
com sua bela forma, e julgaram que estavam imunes a qualquer mazela que
pudesse existir. Já os humanos prosperaram e cresceram em toda a Terra, se
tornando ainda mais numerosos e construindo cultura e civilizações grandes e
poderosas. No jardim do Éden, porém, Deus continuava habitando com os 2
casais de humanos primordiais, aos quais foi dada uma longevidade fora do
comum. Enquanto os homens ordinários viviam cerca de cem anos lá fora do
jardim, os humanos originais já tinham vivido cerca de mil anos ao lado de
Deus em seu jardim, e não apresentavam sinais de velhice ou doença. E, no
jardim, viviam apenas Deus, alguns deuses e os humanos originais. Os demais
humanos sequer sabiam da existência do Éden (ou sabiam apenas de lendas
sobre seu local), e nunca nenhum deles descobriu sua verdadeira localização.
Esse foi o fim da Sexta Era do mundo.
40
Futuramente, os povos nórdicos passaram a chamar essa árvore pelo nome “Yggdrasil”, e muito tempo depois inventaram uma
série de lendas relacionadas a essa árvore. Será que são verdadeiras tais lendas?
deseja retornar ao Nada de onde vieram. Isso prova que ninguém deseja não
ser. Todos preferem o existir. Por isso, considero cumprida a minha missão. A
partir de hoje, me retirarei do Universo e irei descansar no meu local de
Origem, naquele local que é o abrigo natural do meu Ser, naquele lugar que é
ademais o meu próprio Ser, que desde toda a eternidade existe e que já existia
antes mesmo de o Universo ser criado. Contudo, minha Presença Invisível
permanecerá aqui, junto a este planeta, observando tudo o que fizerem. E esta
árvore permanecerá aqui no centro deste jardim, como memorial da minha
Suprema Soberania. Ao olharem para a árvore, lembrem-se de Mim, lembrem-
se que Eu Sou o Único, e que ninguém poderá tomar o Meu lugar. Aqueles que
intentarem tomar do fruto da árvore certamente morrerão, mesmo que seja um
dos homens originais, mesmo que seja um dos deuses mais poderosos. Eu me
despeço hoje de vocês, mas um dia Eu voltarei e assumirei definitivamente o
Meu corpo. Quanto Eu voltar, todos me verão, não mais como uma forma de
luz espectral, mas me verão de carne e osso, como vocês mesmo são agora.
Isso acontecerá na plenitude dos tempos.
Dito isso, sob o olhar curioso dos deuses, e mediante as lágrimas
comovidas dos casais de humanos originais, a visível forma humanoide e
espectral de Deus, que tinha estado no planeta desde a criação dos homens,
começou a se encolher. A Luz Vermelha e brilhante que emanava da forma
humanoide começou a reduzir seu brilho, a encolher e a entrar para dentro da
Luz Amarela, sumindo ao final dentro dela. Depois disso, a Luz Amarela
começou a se encolher, desfazendo o nítido formato humanoide ao entrar para
dentro do núcleo de Luz Azul no peito daquela imagem. Por fim, restou apenas
o ponto de Luz Azul espectral, que foi encolhendo progressivamente até sumir
diante dos olhos de todos.
Deus havia “desaparecido” da Terra. Ele foi “repousar” em Seu próprio
Ser, naquele local inacessível, naquele local onde nem mesmo os deuses
sabem onde fica, pois ele não fica em lugar nenhum dentro deste Universo
criado.
Os que estavam ali presentes, porém, sentiram um vento sair
subitamente do ponto onde a Luz Azul havia sumido. E esse vento se espalhou
como um forte vendaval por todo o planeta, diminuindo lentamente sua
velocidade, até se tornar uma leve brisa e finalmente parar de emanar do ponto
central. Era a prometida Presença Invisível de Deus.
Esse foi o início da Sétima Era do Universo.
CAPÍTULO 3 – A TIRANIA DE CHRONOS
41
“Sôhma”. A palavra significa literalmente “corpo” em grego. Nesta obra, trata-se de uma armadura divinamente criada a partir
do próprio corpo de um Titã, apenas pelo desejo da sua Suprema Vontade. Essa armadura nasce de dentro do corpo e se funde à
pele, tornando-se parte do próprio corpo de um Titã. Dizem ser uma das mais poderosas proteções já desenvolvidas para
batalhas.
envolvia todo o corpo de Chronos, oferecendo-lhe proteção nunca antes vista
entre os deuses.
Então, sob os olhares temerosos de todos, sentindo o medo tomar
conta de cada coração ali presente, Chronos tornou a realizar seu discurso
ameaçador e horripilante:
- Vejam agora a arma secreta com a qual irei destronar meu pai Urano,
e estabelecer definitivamente a minha Soberania sobre todo o Universo.
Naquele momento, Thânatos e Hypnos saíram da multidão e se
aproximaram de Chronos, trazendo uma urna metálica na cor dourada.
Depositaram a urna em frente a Chronos e abriram a tampa. Chronos curvou-
se e pegou de dentro da urna uma grande foice feita de uma liga metálica
superdura e resitente. No cabo da foice, havia correntes que poderiam ser
usadas para segurar a foice, atirá-la em um inimigo e depois recolhê-la de
volta.
- Esta é a Megas Drepanon42! É a Grande Foice, a arma capaz de ferir
um deus. Com ela irei castrar o poder de meu pai Urano – ameaçou Chronos,
aos brados.
Naquele instante, a multidão ali presente se desesperou e começou a
fugir correndo para todos os lados. Ninguém queria mais ficar ali e ver o que
aconteceria, principalmente sob a perspectiva de se tornar também uma das
presas da selvageria de Chronos.
Em meio à confusão de vários deuses e dos 4 seres humanos originais
fugindo, Chronos deu um grande salto para o alto, empunhando a Foice em
seu braço direito. Pairou no ar, e começou a rodar a Foice usando suas
correntes. Após um bom impulso, Chronos lançou a Foice mágica para o alto.
Ela foi subindo com grande velocidade para cima, enquanto mais e mais elos
da corrente magicamente iam sendo conjurados em sua base, o que permitiria
que Chronos recuperasse sua arma depois simplesmente puxando-a. A Foice
foi acelerando mais e mais para o alto, até que finalmente atingiu o topo do
céu, fazendo o estrondo de um trovão. Após o impacto, Chronos puxou a
corrente, fazendo a arma retornar novamente para suas mãos fortemente
protegidas pela Sôhma.
No ponto onde a Foice atingiu, abriu-se um imenso buraco na
atmosfera do firmamento, fazendo grande parte da camada de ozônio se esvair
para o espaço distante. Era como se Urano estivesse sangrando através de
uma ferida aberta. De fato, o céu havia sido rasgado pela Megas Drepanon, e
uma enorme quantidade de gases essenciais para a vida no planeta
começaram a dispersar-se pelo espaço infinito acima.
42
“Megas Drepanon”. Em grego antigo, significa “Grande Foice”.
Urano imediatamente sentiu a dor da ferida em seu imenso corpo
celeste, e, a partir daquele momento, Urano colocou toda sua atenção e
concentração divinas naquele buraco, para evitar que toda a atmosfera se
degenerasse e matasse todas as formas de vida do Planeta. Aquele buraco
passou para sempre a existir na atmosfera da Terra, e ali naquela ferida de
Urano, a camada de ozônio é superfina, motivo pelo qual uma quantidade
maior de raios ultravioletas vindas do sol acabam entrando e afetando
nocivamente o Planeta. Mas graças aos esforços de Urano, os danos não
foram maiores e a vida continuou existindo na Terra.
Chronos havia obtido seu intento. Ele tinha conseguido distrair a
atenção de Urano. A partir daquele momento, o deus do céu manteve-se
totalmente concentrado na tarefa de manter íntegro o restante da atmosfera do
Planeta, para que a vida continuasse a existir na superfície da Terra. Urano
não seria mais ameaça para os planos de dominação de Chronos.
Ainda pairando sobre o ar, Chronos segurou novamente a Megas
Drepanon, e a ergueu ao alto, fazendo que os deuses temerosos fugissem
correndo para o mais distante que pudessem. Chronos girou as correntes e
mirou em Kairós.
- Maldito! Nunca me esquecerei da sua traição! Agora chegou a hora
de pagar com a sua vida! – Bradou Chronos para o seu irmão gêmeo.
Kairós parou de correr e voltou o olhar para cima. Seu irmão girava as
correntes e mirava a foice em sua direção. Quando finalmente atirou a arma
em seu encalço, Kairós deteve-se corajosamente e esperou que a arma
chegasse bem próximo. Então, quando faltava apenas 1 segundo para ser
atingido, Kairós ergueu sua mão direita, paralisou o tempo, e moveu-se
correndo para bem longe dali. Ninguém exceto Kairós (e eventualmente Zeus)
sabia desse truque temporal. Ao chegar a um lugar seguro, Kairós descongelou
o tempo. A Foice atingiu o sopé de um monte, perfurando-o e criando uma
imensa cratera de cerca de 5 km de raio. Gaia gemeu de dor, ao sentir sua
pele ser perfurada pela Foice do enlouquecido filho. Kairós fez esse “truque de
teletransporte” para observar de longe e em local seguro o poder de destruição
da nova arma do irmão. Com os olhos arregalados, pensou:
- “Chronos não pode acertar essa arma em nenhum deus ou homem,
caso contrário, nada restará. Chegou o momento de Zeus se revelar e fazer
frente contra esse Tirano”.
Incauto, Chronos não percebeu quando Kairós sumiu da frente de seus
olhos, pois seu movimento havia sido muito rápido. Ele então imaginou ter
destruído o irmão gêmeo, e deu risadas sinistras de prazer macabro. Enquanto
isso, todos que estavam à volta finalmente fugiram para bem longe, deixando o
trio de deuses sinistros ali naquele local destruído. Thânatos, Hypnos e
Chronos se deleitaram com os estragos causados no céu e na superfície do
corpo de Gaia, a crosta terrestre. Este foi o único local em que a destruição
tocou o jardim do Éden, o que maculou profundamente o sentimento de todos
os deuses, com exceção talvez de alguns sinistros Titãs e AntiTitãs. Antes
disso, Chronos só havia destruído vilas e coisas fora do jardim de Deus.
Algum tempo depois da castração de Urano, e a ferida de Gaia, Kairós
finalmente chega ao monte Olimpo, local que ficava bem distante do jardim do
Éden, em um lugar seguro e longe dos informantes de Chronos. Chegando ali,
Kairós encontrou Zeus entretido com suas primas musas e ninfas na encosta
do monte Olimpo, nas proximidades do mar que futuramente seria chamado de
Egeu. Kairós então foi falar com seu sobrinho Zeus.
- Meu caro Zeus, chegou a hora de eu te contar a verdade. Tu és filho
do deus do tempo, Chronos, aquele Tirano que procura dominar e destruir
todas as formas de vida do Universo, a começar por este Planeta. Ele já feriu o
pai Urano e a mãe Gaia, os deuses primordiais que são teus avós. Ele
submeteu Réia, tua mãe, a um tratamento humilhante e violento. Chronos a
forçou a ter com ele relações sexuais, das quais nasceram teus 5 irmãos e, por
fim, a tua pessoa.
- Mas onde estão meus 5 irmãos? Nunca conheci nenhum deles. –
Disse Zeus.
- Teus irmãos foram engolidos inteiros e vivos por Chronos, assim que
eles nasceram. E ainda devem estar dentro do estômago daquele tirano, visto
que são imortais como tu. Porém, tu foste salvo pela esperteza de tua mãe, e
de tua tia Têmis. Elas bolaram um plano para que tu escapasses da voracidade
de Chronos. Quando teu pai procurou te devorar, tua mãe o fez engolir uma
pedra envolvida em cobertores. O tirano glutão nem percebeu que havia
devorado uma pedra, pois nunca mastigava nada do que devorava. E essa foi
a tua sorte. Eu te trouxe aqui a pedido de tua mãe, para que crescesses seguro
e livre das garras de teu pai.
- Mas por que Chronos não pode saber da minha existência agora, que
tenho 20 anos? Ele não será mais capaz de me devorar.
- Chronos foi amaldiçoado pelo Ser Supremo, depois que ele devorou o
fruto proibido. Esse fruto era símbolo da Soberania do Deus Todo-Poderoso. E
teu pai quis se apossar dessa Soberania. Então, Deus determinou que teu pai
nunca seria o dominador do Mundo, mas que um de seus filhos iria dominar o
Universo em seu lugar.
Kairós fez uma pausa em seu discurso e olhou para o rosto de Zeus,
esperando que ele entendesse. Mas como o garoto não parecia entender, ele
continuou:
- Zeus.... tu és esse filho. Tu és aquele que irá acabar com a Tirania de
Chronos. Tu és o vingador prometido pelo Todo-Poderoso, pois tu foste o único
a escapar da voracidade do deus do tempo. Por isso, mantive o segredo até
agora. Era preciso esperar que tu fosses mais forte que teu pai, caso contrário
ele viria para te destruir e evitar que a maldição se cumprisse.
Kairós parou de falar ao observar que Zeus estava com os olhos
vermelhos e húmidos. Zeus então derramou uma tímida lágrima de seu olho
esquerdo. Essa lágrima não era de tristeza. Era de puro ódio e indignação. O
olhar de Zeus era firme. Seu semblante demonstrava profundo desprezo por
aquele ser que agora sabia que era na verdade seu pai. Ele havia devorado os
próprios filhos, e não mediria esforços para destruí-lo também, caso soubesse
que não tinha sido devorado enquanto era um bebê.
Após a pausa, em que Kairós sentiu a ira de Zeus crescer, o deus do
tempo oportuno tornou a falar:
- Chronos é obstinado pelo Poder, e não cederá tão facilmente. E
agora ele possui uma armadura protetora chamada Sôhma, e possui também
uma arma poderosíssima chamada Megas Drepanon. Receio que, mesmo
mais forte que teu pai, tu não consigas detê-lo sozinho. Vais precisar da ajuda
de teus irmãos. Dos 5 que foram devorados por Chronos, e dos outros 6 que
foram aprisionados por ele no Tártaro.
- Tártaro? O que é isso? – Perguntou Zeus com assombro. – Meus
outros seis irmãos? Você não disse que minha mãe teve cinco filhos antes de
mim? Que outros seis são esses?
Kairós ficou paralisado e admirado. Esquecera completamente o
quanto Zeus cresceu isolado de todos. Enquanto todos conheciam os
Hecatônquiros e os Ciclopes e ignoravam os outros 6, Zeus agora sabia sobre
os filhos de Réia, mas ignorava totalmente a existência de seus meios-irmãos,
filhos apenas de Chronos. Kairós começou a explicar:
- Antes que o Planeta Terra fosse criado, nos primórdios da História,
durante a Primeira Era do Universo, Chronos gerou sozinho seis filhos
monstruosos. Três deles foram chamados de Hecatônquiros (porque possuíam
cem braços e pernas em seu tronco) e três deles ficaram conhecidos como
Ciclopes (porque só possuíam um único olho em seus rostos). Como os seis
filhos de Chronos eram tão selvagens e instáveis quanto seu pai, Chronos foi
obrigado a prendê-los em um buraco negro supermassivo após os pedidos
incessantes dos outros deuses. Esse buraco negro encontra-se agora no
centro desta nossa galáxia, chamada Via Láctea. Esse buraco negro é o que
chamamos de Tártaro, e é impossível sair de lá. O Tártaro só é acessível por
fora, mas não por dentro. Ou seja, o buraco devora tudo ao seu redor, mas não
permite que nada saia de dentro dele.
- Se é impossível sair do Tártaro, como poderei tirar meus seis meios-
irmãos de lá? – Indagou Zeus.
- Há algum tempo, descobri que é possível abrir o Tártaro, desde que a
Suprema Vontade seja igual ou superior à daquele que o criou. Isto é, o deus
que possuir a SV igual ou maior que a de Chronos consegue ter acesso. Eu
descobri isso porque minha SV é igual a de Chronos, pois sou irmão gêmeo
daquele Tirano. Mas para mim é possível apenas chegar próximo do Tártaro
sem ser engolido pelo buraco. Não consigo, contudo, ir além. Não consigo abrir
o buraco e puxar os seis. Porém, tu és agora o mais poderoso dos deuses. Tu
herdaste os poderes de teu pai, e também um pouco dos poderes de teus
avós. Tu serás capaz de te aproximar do Tártaro e de puxar teus irmãos de lá.
- E para que eu iria querer libertar seres tão selvagens e instáveis
quanto meu pai? Não seria uma estratégia imprudente?
- Não seria. Porque nessas aproximações que eu consegui fazer do
Tártaro, tive a oportunidade de conversar com os seis pela brecha do buraco. E
eu convenci os Hecatônquiros a combater Chronos por vingança. Eles são
ressentidos pelo fato de terem sido aprisionados pelo próprio pai. E eu também
convenci os Ciclopes a elaborarem armas capazes de combater e derrotar
aquele selvagem deus do tempo.
- Quando fizeste isso, tio?
- Eu os convenci assim que soube dos boatos acerca da construção da
arma secreta de Chronos, a Megas Drepanon. O próprio Chronos nunca fez
segredo disso, e gostava de esnobar, dizendo aos quatro ventos que um dia
iria destronar Urano. Acredite, durante estes últimos 20 anos, desde que eu
soube dos planos de Chronos, eu estive trabalhando para que tu te tornasses o
mais poderoso dos deuses, e para que os seis aceitassem colaborar com a
batalha contra teu pai.
- E que armas são essas, que serão capazes de derrotar o poder de
Chronos? – Perguntou Zeus.
- Cada um dos Ciclopes elaborou uma arma. Um deles fez um Tridente
mágico capaz de comandar todas as águas dos oceanos e dos rios do Mundo.
O segundo deles fez uma espada capaz de controlar o poder dos raios. Essa
arma eu pedi, para que tu fosses capaz de controlar o teu poder elétrico, já que
não herdaste totalmente os poderes de teu avó Urano. Tu precisarás da
espada para acertar com máxima precisão os raios em teus alvos. Ao último
dos Ciclopes eu pedi que fizesse uma arma que te permitisse te aproximar
furtivamente de Chronos, sem que ele se apercebesse. Então, ele elaborou um
capacete capaz de tornar invisível o seu usuário.
- E com essas armas poderei derrotar Chronos?
- Não sei te dizer ao certo. Mas, certamente, com tais armas tuas
chances serão bem maiores. Vamos. Chegou a hora. Deves libertar teus
meios-irmãos do Tártaro, e depois fazer teu pai vomitar os filhos de tua mãe.
Sem teus 11 irmãos, será impossível vencer Chronos. A humanidade e os
deuses esperam a libertação da Tirania do tempo.
Após a conversa, Kairós e Zeus decidiram partir imediatamente do
Olimpo em direção ao espaço sideral. Os olhos dos dois brilharam com uma luz
branca e muito clara. E então os dois deram um salto para o alto e foram
voando para cima. Ultrapassando as comportas de Urano, os dois deuses
ganharam a imensidão do espaço. Lá em cima, os dois olharam ao longe o
centro da galáxia. Seria verdade que o Tártaro estava lá? Kairós então abriu
um buraco de minhoca logo depois que passaram pelos limites da Lua.
- Que truque bizarro é esse, tio?
- O Tártaro está a aproximadamente 25 mil anos-luz de distância da
Terra. Mesmo que alcancemos a velocidade máxima do Universo (que é a da
luz), levaríamos 25 mil anos para chegarmos lá. Nesse tempo, Chronos já terá
destruído o Planeta. Precisamos de um atalho, moleque. Veja, esse buraco de
minhoca é uma distorção no espaço-tempo, uma dobra no tecido do éter. Isso
irá encurtar um pouco as distâncias, e poderemos ir e voltar bem mais rápido.
Pelos meus cálculos, levaremos duas semanas.
- Um truque genial! Só podia ter nascido da mente do deus do tempo. –
Disse Zeus.
- Teu pai é o deus do tempo, Zeus.
- Não, tio. Você que é o verdadeiro deus do tempo. Chronos nunca
seria tão esperto como você.
Kairós sentiu um pouco de orgulho com as palavras de seu sobrinho,
esboçou um sorrisinho enviesado e dirigiu-se para a dobra espaço-temporal
que criara após os limites da órbita da lua, em um local discreto e seguro, onde
os outros deuses não pudessem enxergar. Ali, os dois deuses entraram no
portal, atravessaram metade da Via Láctea pelo atalho do “buraco de minhoca”
criado por Kairós e foram parar no centro da Galáxia, às margens do buraco
negro central.
- UUAAAUU.... Que viagem louca! Depois me ensine esse truque
também, tio! Talvez eu precise saber como fazer isso para derrotar meu pai.
- Combinado, moleque.
Ali, à beira do buraco negro supermassivo no centro da galáxia, os dois
sentiram as condições mais extremas que um dia já sentiram. O lugar era
excessivamente quente e conturbado. Havia radiação sendo emitida para todos
os lados, e uma fortíssima gravidade arrastava tudo para dentro do Tártaro.
Definitivamente, era o lugar mais perigoso que Zeus já havia visto em toda sua
vida.
Então, usando o máximo de suas Supremas Vontades, Zeus e Kairós
foram aproximando-se do núcleo negro e denso. Ao chegar bem próximo,
Kairós gritou para os seis seres que estavam dentro da esfera supermassiva:
- Ó, filhos injustiçados de Chronos! Eu hoje vos trouxe o vosso
libertador. É Zeus, o vosso senhor. Prometam lealdade, e ele vos libertará e os
conduzirá à vingança contra seu pai.
Vozes grotescas e horripilantes foram ouvidas vindas de dentro do
buraco negro, semelhantes a trovões em dia de tempestade:
- Nós prometemos lealdade a Zeus, nosso senhor! Libertem-nos!
Libertem-nos!
Zeus aproximou-se mais ainda, e então, com o máximo de SV que
pode concentrar em suas mãos, começou a distorcer o espaço na superfície do
buraco negro, o que fez a singularidade cuspir uma quantidade enorme de
energia do interior do núcleo escuro. Zeus continuou forçando o espaço a se
dobrar, aliviando a força da Gravidade em um ponto específico do buraco
negro. Mais e mais energia escapava pela brecha. Essa luta durou, talvez,
umas duas semanas (em parâmetros terrenos de tempo).
Os fortes jorros de
energia gama que
escapavam do núcleo negro
iluminaram todo o redor da
Galáxia, num espetáculo
fenomenal chamado
“Quasar”. Contudo, esse
incrível efeito visual (para
sorte dos dois deuses
conspiradores), só seria
percebido lá no planeta Terra
daqui a 25 mil anos. Por isso, apesar de toda a epifania do momento, nada
denunciou a atividade de Zeus. Tudo continuou no mais absoluto segredo.
E então, o inacreditável aconteceu!
Zeus finalmente conseguiu fazer uma abertura grande o suficiente na
superfície do buraco negro pela qual os seis seres monstruosos escaparam. E
eles deram gritos terríveis de felicidade e de prazer.
- LIVRES!! ENFIM, LIVRES!!!
Zeus percebeu que eles não possuíam corpos, mas eram fantasmas
espectrais, apenas espíritos cósmicos. Ao ver a surpresa do sobrinho, Kairós
explicou que os seis haviam sido aprisionados na Primeira Era do Universo,
quando nenhum deus possuía forma visível. Apenas após a criação da
humanidade, a maioria dos deuses desejou assumir corpos carnais, para se
parecerem com o Todo-Poderoso. Da mesma forma, Kairós explicou aos seis
monstruosos espíritos o modo de obter um corpo carnal por meio da Suprema
Vontade. Se quisessem se vingar de Chronos, deveriam assumir um corpo
humano e viajar para o planeta Terra.
Foi assim que os seis terríveis filhos de Chronos assumiram as mais
bizarras e grotescas formas carnais. As formas eram exatamente um reflexo do
bizarro formato espectral, e não tinham a formosura do corpo humano, pois os
seis não tinham visto a forma do Todo-Poderoso e tampouco desejaram se
parecer com Ele. Os hecatônquiros pareciam um tronco de árvore gigante,
cheios de braços e de pernas ameaçadores. Os Ciclopes pareciam gigantescos
monstros com um só olho no meio do rosto. Eram realmente assustadores.
- Ó, terríveis monstros primordiais. Eu sou Zeus, vosso senhor. E eu
também sou vosso meio-irmão. Isso mesmo. Sou filho de Chronos com a
Titânide Réia. Porém, fui igualmente vítima da tirania do deus do tempo. E vos
peço ajuda para detê-lo. Preciso que me confiem as poderosas armas forjadas
por vós no interior do Tártaro e que vos juntem a mim na batalha contra o
terrível Ditador.
Os três Ciclopes se aproximaram de Zeus, levando as armas mágicas
nas mãos.
O primeiro Ciclope parou em frente a Zeus com uma espada forjada no
mais puro ouro, cravejada de pedras preciosas. Ele então disse:
- Esta é a espada chamada Júpiter. Ela se chama assim porque foi
forjada para o maior e mais poderoso dos imortais. Apenas o deus mais
poderoso será capaz de empunhá-la e comandá-la. Se tu possuis a convicção
de que és o mais poderoso entre os deuses, tome a espada na mão e a
domine. Mas, cuidado... se não fores o mais poderoso, a espada disparará a
mais violenta descarga de energia elétrica, e tu perderás o braço. Vá em frente!
Tente a sorte. – Falou o Ciclope em tom de deboche.
- Certamente, eu sou o maior e mais poderoso dentre os imortais
criados pelo Todo-Poderoso. A espada Júpiter será minha e apenas minha. Ela
obedecerá somente aos meus comandos. – Disse Zeus com confiança.
Ele estendeu o braço e tomou a arma dourada das mãos do Ciclope.
Em seguida, levantou a magnífica espada acima de sua cabeça. Para surpresa
e admiração de todos, a espada começou a brilhar em um tom azul claro
luminoso. E então Zeus começou a comandar raios por todos os lados. Ele
apontava a espada para a direita, e os raios que saíam de seu corpo se
direcionavam para o local apontado pela espada. Ele virava a espada para a
esquerda, e os raios se viravam juntamente com a direção indicada pela
espada segurada por Zeus. Para qualquer lugar que Zeus apontasse a espada,
os raios saíam do corpo do deus e iam para a exata direção apontada.
Por fim, Zeus fez cessar o show pirotécnico de raios e relâmpagos. Ele
girou a espada três vezes em torno do eixo de seu cabo. Quando a espada
parou de brilhar e voltou a ficar dourada, Zeus a colocou de volta em sua
bainha.
- Tu és realmente o mais poderoso dos imortais. Tu és digno de possuir
e empunhar a gloriosa espada Júpiter, a arma mais poderosa do Universo. –
Disse o primeiro Ciclope admirado.
Após a exibição de raios, relâmpagos e trovões, o segundo Ciclope
aproximou-se de Zeus com um tridente peculiarmente forjado. O cabo parecia
feito de um metal alaranjado (que mais tarde viria a ser conhecido como
oricalco) e sua lança era de pura prata afiada, enfeitada com adornos em metal
oricalco. Entre a lança e o início do cabo de oricalco, havia uma fita de tecido
lilás. Uma das pontas da fita estava presa e enrolada no cabo, e a outra ponta
da fita estava solta e acompanhava o movimento do cabo da arma.
- Este tridente se chama Netuno. Isso porque ele é capaz de comandar
as profundezas das águas mais agitadas e turbulentas de qualquer planeta do
Cósmos. O ser que a empunhar será capaz de comandar as águas conforme a
sua vontade.
Zeus tomou o Tridente chamado Netuno e o guardou ao seu lado.
Então, por fim, aproximou-se o terceiro Ciclope. Ele veio trazendo um
capacete forjado em metal preto, com detalhes em cinza e prata. Ele era todo
fechado, e seu topo era comprido e levemente inclinado para trás, na região
onde deveria ficar a nuca do usuário.
- Este elmo se chama Pluton. Isso porque o imortal que o utilizar se
tornará o mais furtivo e imperceptível ser do Universo. Ele é capaz de tornar o
seu usuário totalmente invisível, inodoro e inaudível.
Zeus tomou o capacete chamado Pluton e o colocou na cabeça.
Imediatamente, Zeus sumiu mediante os olhos de todos ali presentes. Os sete
deuses ali em volta aplaudiram a atitude corajosa de Zeus e o sucesso ao
dominar o poder das três armas. Aos gritos e urros de “viva o deus dos
deuses”, Zeus finalmente retirou o Pluton e tornou-se novamente visível.
- Agora já podemos cruzar a galáxia de volta para a Terra. – Disse
Kairós.
Os oitos deuses entraram no buraco de minhoca e foram do centro da
galáxia para as proximidades da lua em apenas algumas breves horas. Ao
chegarem um pouco mais próximos da Terra, Kairós fechou o buraco do atalho
e desfez a dobra no tecido do espaço-tempo. Os oito se dirigiram para o
planeta, atravessaram as comportas de Urano, cruzaram o firmamento e
finalmente aterrissaram no sopé do monte Olimpo.
Assim que chegaram ao Olimpo, observaram a presença de três
figuras misteriosas e encapuzadas em sua encosta.
Eram três mulheres imortais muito velhas e muito feias, com cabelos
grisalhos e parcos. Os mantos e capuzes eram cinzas e muito velhos e sujos:
- Me chamo Clóto, tecedora do passado. – Disse a mais gorda
- Me chamo Láquesis, tecedora do presente. – Disse a mais magra.
- Me chamo Átropos, tecedora do futuro. – Disse a mais jovem das três.
- Nós somos as Moíras43. As deusas do destino. E estamos ao dispor
de nosso Senhor Zeus. – Disseram as três velhas juntas em uníssono.
Kairós adiantou-se aos demais, colocando seu braço na frente dos
outros sete, como se precisasse evitar que os outros falassem antes dele. E
então disse:
- Como sabiam de nosso plano e que Zeus se abriga no Olimpo? Eu
sei quem são vocês três. E sei também que são filhas de Érebo e Nix, assim
como Thânatos e Hypnos. Como podemos ter certeza de que estão do nosso
lado, já que os vossos irmãos são comparsas de Chronos? Estou avisando,
não tentem nos enganar, ou se arrependerão.
- Ora, nós três, as Moíras, sabemos todas as coisas. Sabemos
passado, sabemos presente... e sabemos futuro!
Nesse momento, as três retiraram os capuzes e revelaram suas faces.
Elas possuíam apenas um olho, que era compartilhado pelas três. Apenas uma
delas poderia usar o único olho de cada vez. O olho delas era mágico e
revelava qualquer coisa sobre qualquer época da História do Cósmos. Quando
os oito deuses presenciaram o aspecto bizarro das Moíras, tiveram ânsias de
43
Pronuncia-se “Miras”.
vômito, porém se contiveram por educação. A cena era bizarra, nojenta e
grotesca.
Átropos, a mais nova das três, enfiou os longos dedos na sua própria
cavidade ocular, retirando o olho mágico e o repassando para sua irmã mais
velha, Cloto. Esta pegou o olho, deu uma assoprada (como se quisesse limpar
alguma sujeira) e o colocou na sua própria cavidade ocular. E então disse:
- Eu vejo Chronos sendo gerado por Urano e Gaia, e entendo como foi
que o desejo pelo Poder começou a consumir o coração do poderoso Titã.
Com um passado desses, eu entendo que Chronos não pode estar mais neste
Planeta, sob pena de destruição sem fim. Este é o fio da vida de Chronos.
Cloto meteu a mão dentro de uma bolsa que carregava ao lado e
retirou dela um fio de cabelo que parecia revestido com uma luz de aspecto
roxo e escuro.
- Eu tenho nesta bolsa o fio da vida de todos os seres do Cósmos,
exceto o do Todo-Poderoso. Vejam! Este é o fio da vida de Chronos. E eu nada
posso fazer com ele. A aura de Chronos está totalmente corrompida. Esse fio
só é capaz de trançar uma história horrível e cruel. Nenhum tapete magnífico
poderia ser trançado usando-se este fio.
Dizendo isso, Cloto passou o seu olho para Láquesis, que igualmente o
limpou com um assopro e o inseriu em sua face.
- Eu vejo Chronos tiranizando esta Terra. Nada pode prosperar
enquanto o deus do tempo quiser devorar todas as realidades existentes. Sua
fome é insaciável, e sua crueldade é sem fim.
Láquesis retirou o olho da face e o devolveu aos cuidados de sua irmã
mais nova, Átropos. Esta o pegou, o assoprou, e o inseriu novamente em sua
cavidade ocular.
- Eu vejo Chronos no amanhã. Chronos não tem fidelidade a ninguém.
Ele engana Thânatos e Hypnos, a fim de se tornar senhor até mesmo do sono
e da morte. Isso acontecerá muito em breve. Eu vejo Chronos destruindo todos
os homens e eu vejo Chronos devorando todos os deuses. Sua fome é sem
fim.
- Mas nada pode ser feito? - Perguntou Zeus – Ninguém poderá
escapar deste futuro?
- Que bom que perguntaste, meu senhor. Pois o futuro é uma nuvem
inserta de probabilidades. Não é uma visão nítida e definida como a enxergada
por Cloto e Láquesis. Eu vejo o futuro volúvel, enevoado. Os futuros que
podem vir a ser e os que nunca serão. E agora eu só preciso tirar uma última
prova, fazer uma última coisa, para saber a quem devemos ser leais e qual é o
futuro mais favorável aos deuses.
Átropos retirou o olho mágico de sua face, limpou um cisco que estava
sobre a íris e o entregou gentilmente nas mãos de Zeus.
- Veja o seu futuro, senhor do Olimpo! E nos diga se a partir de tuas
mãos podemos esperar dias melhores.
Zeus abriu as mãos, e olhou para dentro do horripilante olho das
Moíras. O olho começou a brilhar forte, com uma luz azul clara, e depois
começou a levitar alto, acima das cabeças de todos. Os que estavam ali
presentes olharam para cima, para dentro do globo brilhante. E então todos
viram cenas do futuro de Zeus se passarem dentro do olho mágico, como se
fossem miragens dentro de um globo de vidro de uma cigana.
“Raios partiam nos céus para todos os lados. A imagem de um monte
se elevou sobre todos os montes da Terra. Sobre o monte, surgiram 12
templos. Dentro dos 12 templos, moravam 12 deuses, alguns conhecidos, mas
outros antes nunca vistos. Já teriam nascido? Após a visão do monte, viram a
Terra dividida em 3 domínios. As partes secas e as florestas formavam o
domínio menor. Os mares e os oceanos formavam o domínio médio. Os
espíritos desencarnados formavam o maior domínio. No domínio dos espíritos,
viram almas de homens e também de deuses, alguns dos quais eles
conheciam, já outros nunca antes vistos. Para além dos 3 domínios, em um
lugar isolado do Cósmos, viram a alma de Chronos aprisionada em um artefato
mágico em formato de ampulheta. A alma de Chronos estava selada dentro
deste artefato misterioso, e ficava girando para sempre, junto com suas areias,
pelos séculos dos séculos, em uma hiperdimensão longe de todas as galáxias
e espaços-tempos conhecidos.”
O olho das Moíras parou de brilhar e voltou flutuando levemente para
as mãos de Zeus. Assustado, o jovem deus tremeu as mãos e deixou o
precioso olho cair ao chão. Zeus deu alguns passos para trás e quis fugir
correndo. Kairós, porém, o pegou pelo braço e o deteve.
- Se acalme! – Disse Kairós.
- E isso responde à pergunta do irmão de Chronos. Sim. Estaremos ao
lado de Zeus, ainda que nossos irmãos estejam do lado do Tirano. Essa era a
visão que faltava em nosso panorama, para termos certeza de qual caminho
devemos tomar. E Sim. Apoiaremos Zeus! Seremos fiéis a ele, pois nenhuma
outra visão mostra um futuro mais favorável do que a visão que tivemos do
futuro que vem pelas mãos de Zeus. – Falou Átropos, pegando seu olho
mágico no chão e colocando-o de novo em sua face.
- Eu não posso! Não tenho poder para realizar todas as coisas
mostradas na visão. Eu... eu não sei como... – Disse Zeus, querendo correr
dali.
- É por isso que o futuro deve ser velado para a maioria dos deuses e
dos homens, pois eles entram em choque ao conhecerem seu destino. Não se
preocupe, sobrinho. Você não estará sozinho nesta tarefa. – Disse Kairós,
abraçando Zeus, mais para impedir que ele fugisse dali do que para acalmá-lo.
- Mas o que devo fazer? – Perguntou Zeus.
- Um futuro melhor só será possível depois que você libertar seus
irmãos. Deves retirar os seus 5 irmãos das entranhas de Chronos e fazer com
eles uma aliança sobre este Monte. Jurem que a aliança feita no Olimpo nunca
deve ser quebrada, caso contrário, o futuro poderá ser bem diferente.
- Está certo. Então irei salvar meus irmãos. – Disse Zeus.
- Boa sorte, meu jovem senhor – Disse Átropos, se afastando de Zeus
e indo se juntar às suas irmãs.
Naquele momento, uma névoa espessa começou a surgir por toda a
parte. As Moíras entraram na parte mais obscura da névoa e ali sumiram. Após
alguns minutos, a névoa se dissipou, e os oito deuses viram-se novamente
sozinhos no sopé do monte Olimpo.
- Devemos agir agora, o mais rápido possível. – Disse Kairós.
- Vamos! – Disse Zeus.
...............................
- περιέτει !!!!!44
Kairós saiu do meio das árvores, onde estava escondido, girou o dedo
no ar, desenhando um circulo em volta dos 6 deuses. Nesse mesmo tempo,
uma luz saía dos dedos de Kairós e traçava um círculo de luz em torno dos
filhos de Chronos. O círculo se fechou em volta dos seis, girou formando uma
esfera de luz e lá dentro o tempo pareceu estar congelado. Chronos lançou a
Foice, porém a arma chocou-se contra a esfera de luz e tombou para o lado.
Antes que o deus do tempo pudesse recolher as correntes, Kairós falou
novamente:
44
Pronuncia-se “Periékei”, que significa, em grego, “conter”.
45
Pronuncia-se “Guiá to Méllon”, significando em grego “Pelo futuro”.
- Adivinha, irmão. Foi exatamente isso mesmo. E saiba, fui eu que
escondi teu filho mais novo na Grécia, a pedido de nossa irmã Réia. Ela
enganou-te, fazendo-te engolir uma pedra, quando na verdade o bebê já
estava seguro longe de tua gula. Pois saibas que fui eu que ajudei a criar Zeus,
teu filho, para que ele pudesse te destronar. HAHAHA!
- Maldito! Veremos agora quem é o verdadeiro deus do tempo.
Acabarei com tua vida, e depois cuidarei de apagar da História todos os
vestígios da tua existência. Ninguém jamais se lembrará de ti, e eu serei o
único deus do tempo conhecido. Prepare-se, maldito! – Disse Chronos,
rodando as correntes e preparando um ataque com sua Megas Drepanon!
- Faça seu melhor, Chronos! Pois o futuro eu já conheço, e te garanto:
ele não é favorável a ti! Tome isto, seu miserável! – Disse Kairós, soltando uma
rajada de poder cósmico em direção ao irmão.
Chronos esquivou-se do poder com um salto, e lançou a Foice em
direção a Kairós. O gêmeo também se esquivou da arma, saltando para o lado.
Neste momento, Kairós fechou os olhos e começou a invocar a existência de
uma proteção. Luzes começaram a envolver o corpo do Titã, com um poder
cósmico assustador. Com o poder de sua Suprema Vontade, Kairós conjurou
uma armadura idêntica a de Chronos, exceto pelo fato de que era toda branca
e prata. As partes da Sôhma surgiram de dentro da pele do deus e fundiram-se
ao seu próprio corpo, como uma fortaleza sem brechas.
- NÃO!! COMO CONSEGUISTE FAZER ISSO?? Apenas eu tenho
poder suficiente para dominar a arte da defesa absoluta.
- HAHAHA! Maldito! Esqueceste que sou teu irmão gêmeo, e que tenho
os mesmos poderes que você? Por acaso acreditaste que após o horripilante
espetáculo no qual feriste Urano, eu e os demais Titãs ficaríamos sem fazer
nada? Imbecil. Ignoras que todos os Titãs possuem poderes para realizar
truques parecidos? Saibas, pois, que o teu exibicionismo foi a tua ruína. Todos
nós passamos a treinar após o bizarro espetáculo, e cada um de nós Titãs
temos agora uma Sôhma para te combater. Você não sairá livre desta, seu
Tirano!!! – Respondeu Kairós.
Então, Kairós partiu para cima do irmão gêmeo. A luta entre os dois
continuou violentamente por horas afinco. E nenhum dos dois lados parecia
querer ceder.
................
46
Em inglês, a frase significa o seguinte: “Ó, Filho do Tempo, mantenha viva a promessa de chamas que é sua para sempre”.
vingança. – Disse Zeus, soltando suas mãos, desfazendo o círculo e
apontando para os monstros ao fundo da caverna.
Os cinco deuses olharam para os seis monstruosos meios-irmãos e a
acenaram com as cabeças.
- Ao todo, somamos 12 deuses. Outrossim, temos essas três armas
mágicas forjadas pelos Ciclopes: a Júpiter, o Netuno e o Pluton. Enquanto que
do lado contrário, sabemos que Chronos conta unicamente com o apoio de
Thânatos e Hypnos. Portanto, estamos em maioria. A propósito, devemos
repartir as armas entre nós, para que a vitória sobre qualquer um de nós seja
mais dificultosa para Chronos. Como eu sou o único capaz de domar a Júpiter,
a espada mágica fica comigo. – Disse Zeus.
- Já que é assim, aceito ficar com este Tridente mágico, pois foi a
primeira arma que meu coração já teve o impulso de possuir. – Disse
Poseidon.
- Este Tridente se chama Netuno, irmão. E com ele tu serás capaz de
controlar todas as águas dos rios, dos lagos, dos mares e dos oceanos da
Terra. – Disse Zeus.
- Desse modo, como sou o mais tímido, prefiro ficar com o elmo. Já sei
que ele é capaz de me deixar completamente invisível, inodoro e inaudível. É o
disfarce perfeito para uma pessoa como eu, que não gosta de expor o próprio
corpo. – Disse Hades.
- Esse capacete se chama Pluton, caro irmão. E cumprirá
perfeitamente o propósito de sumir com os rastros do deus mais furtivo e oculto
de todos. – Disse Zeus.
Mal Zeus havia terminado de falar, e um pequeno ponto de luz surgiu
dentro da caverna. A Luz foi crescendo até virar uma esfera, estando lá dentro
o deus Kairós ferido. A bolha de luz estourou, deixando o referido deus no chão
húmido da caverna.
- TIO!! – Exclamou Zeus.
Os 12 se aproximaram em torno de Kairós ao chão. Estava
terrivelmente ferido, com um corte na barriga. Sua armadura Sôhma estava
extremamente danificada em vários locais.
- O covarde não aceitou um combate de igual para igual. – Disse
Kairós, gemendo e com enorme dificuldade. – Convocou por telepatia os seus
fiéis comparsas, Thânatos e Hypnos. E então as duas duplas de deuses
gêmeos duelaram ferozmente naquela campina. Os gêmeos do tempo e os
gêmeos da morte. Porém, não eram 2 contra 2, mas sim os três contra mim.
Pura covardia. Se não fosse a interferência daqueles gêmeos, talvez eu tivesse
conseguido... ah... aaarrr....
Kairós tossiu, cuspindo sangue.
- Zeus, não há mais tempo. Aqueles dois armaram uma armadilha para
mim. Chronos esfolou minhas entranhas. Com o meu sangue, os deuses
gêmeos fizeram um ritual para selar minha alma num sono perene por séculos
numerosos. Não tenho muito tempo. Preciso que você vá até um vilarejo nos
arredores do mar Egeu e encontre lá um rapaz chamado Méllon. Ele tem uma
marca... de nascença... no braço... arrgg...
- Não se esforce demais, tio. Tome cuidado! – Disse Zeus.
- Pode deixar que eu encontrarei o rapaz – Disse Hades.
- Ele não é um homem qualquer... ele é mais do que um mero mortal...
ele é.... meu fi.... argg. – Disse Kairós desmaiando.
A maldição estava completa. Da boca de Kairós saiu um pequeno
espectro em forma de galáxia estelar. Era a alma do deus do tempo oportuno.
A pequena galáxia cristalizou-se dentro de uma pepita polida de quartzo
branco. Essa pepita rodopiou rapidamente até ser teleportada daquele local,
provavelmente pelos deuses autores da magia de selamento.
Os 12 deuses estavam tristes em volta de Kairós. Zeus agachou-se
e segurou as mãos do corpo inerte do tio. Uma lágrima caiu de seu rosto.
CAPÍTULO 4 – A TITANOMÁQUIA
Enquanto Hades foi procurar por Méllon nos vilarejos que existiam
próximos às praias do mar Egeu, seus irmãos se reuniam em vários dias
diferentes, dentro das cavernas do Olimpo, para discutir estratégias de
combate. Como afinal, deveriam combater Chronos? Deveriam usar o
elemento surpresa? Ou deveriam chegar marchando ostensivamente? O que
causaria o fracasso do Tirano?
- Acredito que devemos chegar marchando e atrair Chronos para fora
de seu lar, para que a batalha ocorra nos campos que estão fora do Jardim do
Éden, a fim de preservar o local santo contra a profanação. – Dizia Zeus.
- Eu acho que a melhor estratégia é chegar soturnamente, com o
auxílio de Hades, para pegar o monstro desprevenido. – Sugeria Poseidon.
- Não seria melhor atraí-lo para uma grande pira de fogo e queimá-lo
vivo? Seria muito fácil realizar tal feito, pelo menos para mim. – Gabava-se
Héstia, a deusa do fogo.
- Devemos seguir os conselhos de Zeus, pois ele é o mais poderoso e
sábio dentre nós. – Dizia Hera, demonstrando de modo claro um afeto fora do
comum por seu irmão. Zeus correspondia aos afetos, pois também achava
Hera muito bonita e atraente.
- Podemos combater ostensivamente, desde que preservemos ao
máximo todas as florestas e bosques do mundo, pois amo tais criaturas – Dizia
Deméter.
...................
47
A Letra “Mi” em grego corresponde ao “M” romano, e é da seguinte forma: μ
- Sim, amigo. Não posso dizer meu nome verdadeiro. Me desculpe.
Contudo, me chame de Mido mesmo, não tem problema.
- Garoto, não precisa se preocupar. Eu já sei seu nome verdadeiro. –
Disse Hades.
O rapaz levou a caneca à boca e deu um longo gole na bebida gelada,
duvidando interiormente das palavras daquele homem à sua frente.
- Seu nome é Méllon! – Disse Hades.
Ao ouvir aquilo, o garoto engasgou-se com a bebida, e começou a
tossir freneticamente. Depois de se recompor, perguntou:
- Como descobriu meu nome verdadeiro? Você é algum espião? Foi
enviado para me destruir?
- Garoto, eu sei seu nome porque o momento da sua revelação
chegou. Não precisa mais se esconder. Eu fui enviado por Kairós para procurar
por você.
- Você conhece Kairós? – Perguntou o jovem.
- Sim. Eu vim procurá-lo a pedido de Kairós. – Disse Hades.
- Se foi Kairós quem te enviou, então você é confiável.
- Sim, Mido. Pode confiar em mim. Eu sei que seu nome verdadeiro é
Méllon. E eu tive essa certeza por causa dessa marca de nascença em seu
braço direito. Quando as faixas caíram, tive a certeza de ter encontrado a
pessoa certa. – Disse Hades.
- Minha nossa... é verdade. Eu sempre uso essas faixas justamente
para disfarçar essa marca de nascença. Meu pai me fez prometer nunca me
revelar até que chegasse o dia correto. – Disse Méllon, abaixando-se para
recuperar sua faixa. Após ter estancado o sangue, o garoto voltou a enrolar
aquela velha faixa de pano em seu bíceps.
- E me desculpe, mas também não fui totalmente sincero com você.
Meu nome verdadeiro é Hades. E isso também é um segredo. Eu sou filho do
Tirano deste Mundo, o deus Chronos. E ele não pode saber onde estou jamais,
senão virá me matar. Isso mesmo.
- Mas então, se você é filho de Chronos, você é um deus... – Disse
Méllon.
- Exatamente, garoto.
- E se é filho de Chronos, então é sobrinho de Kairós. Isso quer dizer
que somos, de algum modo, parentes... – Disse Méllon, sorrindo.
- Como é que é, garoto? – Perguntou Hades.
- Hades, o meu segredo é este: eu sou filho de Kairós, portanto, somos
primos.
- Filho de Kairós? – Espantou-se Hades. - Mas então aquele bonachão
tinha um filho esse tempo todo? Alguém mais sabe dessa informação?
- Não. Minha existência foi mantida em segredo, para minha própria
segurança e também como uma arma secreta contra Chronos. Meu pai me
disse que meu nome significa “Futuro”48. Isso porque ele desejava um futuro
melhor para todos os deuses e homens. Ele não queria que Chronos
tiranizasse o mundo por todos os séculos sem fim. Então, ele me gerou em
segredo, e me treinou como um guerreiro, a fim de me revelar ao Mundo no
momento propício, quando fosse deflagrada a revolta contra o poder de
Chronos. Ele acreditava que eu pudesse ajudar a construir um futuro melhor
para o mundo.
- Méllon, então você também é um deus... – Disse Hades.
- Não exatamente, amigo. Kairós é meu pai. Contudo, minha mãe se
chamava Astéria49. Ela era uma humana da vila portuária de Pireu.
Infelizmente, ela morreu durante o meu parto, porque eu nasci grande de mais.
Mas dizem que meu pai realmente a amava. Ele mantinha segredo sobre mim,
sobretudo por não saber se era lícito que deuses se relacionassem com seres
humanos, muito menos que tivessem filhos juntos.
- Mas, então, se não é um deus, você é um humano? – Perguntou
Hades.
- Também não, amigo. Não sou um deus, porque minha mãe é
humana. Não sou um humano, porque meu pai é um deus. Na verdade, eu sou
um Néfilim50, isto é, um semideus. E até onde sei, sou o primeiro de minha
raça. – Disse Méllon.
- Néfilim... – Murmurou Hades, digerindo a informação. – Um
semideus... Entendo... Méllon, eu tenho uma notícia triste para te dar. Seu pai
Kairós fazia parte de uma conspiração contra a Tirania de Chronos. Ele treinou
secretamente o meu irmão Zeus para liderar a revolta contra o monstro. Depois
que Zeus libertou todos os irmãos de seus cativeiros impostos por Chronos,
incluindo a mim, Kairós tomou a dianteira da batalha, a fim de enfraquecer o
deus do tempo e nos dar tempo para nos organizarmos para a guerra contra
ele. Porém, o covarde Chronos se juntou aos deuses Thânatos e Hypnos... e...
infelizmente...
48
Méllon ( μέλλον ) significa “Futuro” em grego.
49
Em grego, a palavra αστέρι (astéri) significa “estrela”. Portanto, o nome Astéria tem esse significado.
50
“Nefilim”. O termo vem do hebraico . A palavra ocorre duas vezes na Bíblia, em “Gênesis 6,4” e em “Números 13,33”,
para designar uma raça de gigantes que teria surgido a partir da relação entre os anjos (filhos de Deus) e as humanas (filhas dos
homens). Antes do dilúvio, a existência de Nefilins era encarada como natural na Antiguidade, mas a maioria deles era perversa e
cruel. Dizem que o gigante Golias, que lutou contra o rei Davi, milhares de anos após o dilúvio, era um descendente distante dos
antigos Nefilins. Pelo visto, o dilúvio não matou todas as formas de vida.
- Infelizmente o que? – Perguntou Méllon, temendo pelo pior.
- Bem... garoto... Kairós não pôde suportar o ataque de três deuses ao
mesmo tempo. Ele sucumbiu. Seu corpo foi destruído pela arma secreta de
Chronos, a Grande Foice. O Ceifador fez mais uma vítima, desta vez seu
próprio irmão gêmeo. Mas acredito que, como Kairós é um deus imortal, sua
alma ficaria livre fora do corpo. Porém, sua alma foi selada por Thânatos e
Hypnos em uma pepita de quartzo branco que simplesmente desapareceu da
vista de todos. Antes de ser selado, no entanto, ele nos pediu que
procurássemos por você. E é o que tenho feito desde então.
- Meu pai está... morto? – Murmurou Méllon.
- Bem... garoto. Eu não sei exatamente se os deuses podem morrer de
fato. Acho que não. Como eu expliquei, a alma de Kairós ainda existe, selada
em algum lugar.
- Hades, para pessoas como eu, isso equivale a dizer que houve a
morte. Se a alma de meu pai não tivesse sido selada, onde ela estaria agora?
Hades parou para pensar... Ele não sabia a resposta para essa
intrigante pergunta. Se um deus perdesse seu corpo físico, para onde iria sua
alma? Ficaria livre pelo Cósmos? Ademais, para onde iriam as almas dos
homens depois da morte? Hades também não sabia...
- Méllon... eu não sei te dizer. Não sei se essas perguntas possuem
respostas. Quando o Todo-Poderoso permitiu que os deuses tivessem corpos
físicos, Ele nunca explicou totalmente quais seriam as consequências dessa
escolha. E até então, após bilhões e bilhões de anos, nunca se ouviu dizer que
um deus pudesse ter seu corpo destruído. Dentro os imortais, apenas Kairós
sucumbiu. Portanto, não sabemos de verdade o que acontece a um deus, se
ele perde seu corpo. – Disse Hades. – De todo modo, eu lamento muito,
Méllon... pela morte... digo... pela perda... de seu pai.
- Obrigado pelas condolências, primo. Vou transformar toda minha
frustação e tristeza em força e poder para derrotar o tirano Chronos, e vingar a
alma de meu pai pela maldade que lhe foi feita pelo trio de deuses malignos.
Finalmente entendo o motivo pelo qual meu pai me treinou em artes de guerra
por todos esses anos. Devo ajudar na luta contra Chronos.
- É assim que se fala, Méllon. – Disse Hades, olhando a força de
vontade de Méllon e sua determinação em superar o luto. - Kairós tinha razão.
Se lutarmos juntos, certamente teremos um futuro melhor para todos!
(O Filho de Kairós: Méllon, o primeiro semideus)
A conversa na Taverna continuou por horas seguidas, e os dois primos
tomaram ainda muitas outras bebidas. Trocaram informações, confidências,
certezas e incertezas sobre a vida e o Cósmos. Uma grande amizade entre os
dois surgiu a partir daquele dia.
Porém, o encontro entre Hades e Méllon afetou profundamente o deus
olimpiano, irmão de Zeus. Hades subitamente começou a ter um medo intenso
de perder seu próprio corpo, por não saber ao certo o que aconteceria à alma
de um deus se seu corpo fosse destruído. E eles estavam prestes a entrar em
uma guerra. Ademais, ao contrário dos deuses mais antigos, Hades e os outros
cinco olimpianos já haviam nascido com corpos físicos, enquanto que os outros
deuses já tinham sido puros espíritos antes. Eles não podiam ter certeza
nenhuma a respeito do que lhes aconteceria se perdessem seus corpos, e a
perda de Kairós, que era um dos deuses primordiais, provava que os corpos
dos deuses não era imune à destruição. Isso aumentava ainda mais as
incertezas de Hades. Por esse motivo, Hades passou a andar cada vez mais
escondido e encoberto pelo poder mágico do elmo Pluton, pois temia com
terrível assombro perder seu corpo.
.....................
51
Trata-se da deusa Tétis, e não daquela personagem que viria a ser conhecida como uma guerreira marina de Poseidon (Tétis de
Sereia).
- Irmãos. Tenho outra boa notícia para dar a todos. Finalmente
encontrei Méllon, a pessoa que Kairós nos incumbiu de procurar. – Disse
Hades.
- Muito prazer, primos. Eu sou Méllon, filho de Kairós. – Disse o
semideus.
- Filho de Kairós? – Surpreendeu-se Zeus. – Então era esse o segredo
daquele malandro?
- Sim. – Disse Hades. – Pelo visto, nosso tio era cheio de segredos e
surpresas. Ele deixou tudo armado para o dia da luta contra Chronos.
- Então, você também é um deus, como nós? – Perguntou Zeus.
- Na verdade, sou um Néfilim... um semideus. Minha mãe era humana.
– Respondeu Méllon. – Porém, fui muito bem treinado por meu pai para ser um
guerreiro de primeiríssima qualidade.
- Engraçado, eu também fui treinado por Kairós. Aquele bonachão nos
treinou esse tempo todo e sempre nos manteve segredo quanto à existência
tanto de um discípulo quanto do outro. – Disse Zeus.
- Pois bem. Estou aqui, a serviço da aliança dos olimpianos. O que
devo fazer? – Disse Méllon.
- Se foste treinado por Kairós, certamente estás pronto para ir para a
linha de frente da batalha. Estou certo de que era o desejo de Kairós. – Disse
Zeus.
- Caro irmão, temos aqui a deusa Tétis e o Néfilim Méllon. Além deles,
somos 6 olimpianos e mais os outros 6 que foram libertos do Tártaro. Acredita
que já podemos declarar guerra contra Chronos, ou mais algum preparativo
precisa ser feito? – Perguntou Poseidon.
- Acredito que, antes de declarar guerra, devemos resgatar nossa mãe
Réia das mãos do Tirano. Ela fez de tudo para me livrar do monstro, e isso é o
mínimo que devemos fazer por ela. – Disse Zeus. – Eu mesmo quero ir ao
encontro da nossa mãe, e convencê-la a se esconder nesta caverna, assim
como eu fui escondido a pedido dela aqui 20 anos atrás, para fugir da fúria do
deus do tempo. Réia já sofreu demais, ela não deve participar das batalhas.
- Concordamos. Ela é nossa mãe, e já sofreu o suficiente nessa história
toda. – Disseram os outros irmãos.
- Enquanto eu estiver fora, à procura de Réia, gostaria que Poseidon e
Tétis saíssem juntos a fim de convencer mais Titãs a entrarem na guerra ao
nosso lado. – Disse Zeus.
- Tudo bem, senhor. – Disseram Poseidon e Tétis.
- Outrossim, gostaria que Deméter e Héstia saíssem à procura dos
guardiões da humanidade. Os três filhos de Jápeto devem vir aqui e dizer se
querem envolver os homens nesta batalha que diz respeito a nós. A vida de
nenhum humano deve ser ameaçada sem a anuência dos 3 guardiões, pois
eles protegem a humanidade a pedido do próprio Ser Supremo.
- Tudo bem, senhor. – Disseram Deméter e Héstia.
- Eu e Hera partiremos ao encontro de nossa mãe. Poseidon e Tétis
vão à procura de aliados entre os Titãs. Deméter e Hestia devem encontrar e
trazer para cá os filhos de Jápeto. – Disse Zeus, repetindo o plano.
- Quanto a nós dois? – Perguntou Hades.
- Hades e Méllon podem ficar aqui na caverna e treinarem junto com os
Hecatônquiros e Ciclopes. – Disse Zeus. – Vamos, não temos tempo a perder.
Os deuses e o semideus ali presentes se juntaram formando um
círculo, tocaram suas mãos fechadas em punho ao meio do círculo, e, depois
do grito de guerra, cada um foi tratar de cumprir sua missão.
............................................
52
“Éden”. O termo em hebraico עדן significa literalmente “deserto” ou “campo aberto/vazio/amplo”. A princípio, Éden é a
região onde o jardim foi colocado, não o nome do jardim. Portanto, o “Jardim do Éden” significa “o jardim do deserto”. Era um
jardim paradisíaco no meio de um deserto. O Deus Todo-Poderoso criou esse jardim para demonstrar que pode fazer brotar vida
em qualquer lugar, mesmo nos lugares mais ermos e desertos. Mais tarde, o próprio jardim passou a ser chamado simplesmente
de “Éden”, por antonomásia.
- Dizem as lendas dos homens que a entrada para o jardim fica em
algum lugar no deserto que existe no meio do Crescente Fértil. Estou
começando a achar que as lendas sobre essa entrada sejam verdadeiras. –
Disse Zeus. - Veja bem. Começamos a procurar pelo Egito, nas terras que
ficam no delta do rio Nilo, e viemos andando ao Leste pelas terras dos
cananeus, dos fenícios e dos sírios, ao longo da faixa de terra entre o mar
mediterrâneo e o rio Jordão. Viramos à direita na Síria, para evitarmos voltar
para a Anatólia, já passamos pelas terras dos arameus53, descemos pela
verdejante Mesopotâmia e atravessamos a Caldeia, até chegarmos próximo ao
golfo dos Médos54. Portanto, desde o Egito até aqui, viemos circundando o
deserto do oriente médio e não encontramos nem sinal da entrada do jardim.
Só evitamos entrar no deserto do oriente que fica no centro do Crescente Fértil.
Com exceção do deserto, já estivemos em todos os lugares. Desse modo,
pode ser mesmo que a entrada para o jardim de Deus realmente fique em
algum lugar dentro daquele deserto.
- Mas querido, se isso for verdade, podemos perder todas as
esperanças de resgatar nossa mãe Réia. – Disse Hera. – Procurar uma
pequena entrada no meio de um vasto deserto é uma missão impossível de se
cumprir.
- Confie mais, Hera. Eu sei como encontrar o jardim. Por acaso não
sou o mais poderoso entre os deuses? Além disso, vou começar a usar alguns
dos truques que aprendi com Kairós. Só não usei antes, com receio de atrair
capangas de Chronos e estragar o elemento surpresa da missão. Vou usar o
truque, mas espero que os rastros de poder cósmico não chame a atenção dos
demais deuses, muito menos a de Chronos. – Disse Zeus.
- Está certo, Zeus. Eu preciso acreditar mais, mesmo que se tenham
passado tantos dias de missão e que só tenhamos conseguido encontrar
boatos e mais boatos. Olha... estou cansada. Vamos encontrar algum vilarejo e
descansarmos um pouco? – Disse Hera.
- Sim, querida.
Ainda que, até o momento, a missão de Zeus e de Hera não tenha
dado frutos, a viagem servira ao menos para aproximar ainda mais os dois
deuses. Cresceu um grande afeto entre os dois, a ponto de não mais se
considerarem irmãos, mas amantes. E essa viagem cansativa à procura do
Paraíso foi de vital importância para mudar todo o futuro do mundo. Isso
53
“Padã-Arã”, a terra dos arameus. Futuramente, milhares de anos depois, essa terra ficaria conhecida como Assíria, e sua
civilização se tornaria o grande império Assírio, governado por famosos reis, como o rei Senaqueribe, que tentou invadir
Jerusalém, mas teve um exército inteiro derrotado por apenas um anjo de Deus em uma única noite.
54
“Golfo dos Médos”. Os Médos são os povos ancestrais dos Persas. Portanto, trata-se daquela região que atualmente
conhecemos com golfo pérsico.
porque, naquela noite em que os dois procuraram um lugar para descansar,
Zeus e Hera finalmente deitaram juntos e tiveram relações amorosas. Naquela
mesma noite, Hera ficou grávida, muito embora ainda não soubesse disso. E
os dois continuaram a viagem nos dias seguintes, sem se aperceberem que
estavam a caminho do Mundo mais alguns deusinhos para povoar o Olimpo.
- Vamos, querida. Devemos enfrentar o duro deserto do oriente
55
médio . – Disse Zeus.
- Que o Altíssimo nos ajude. – Disse Hera.
Por muitos dias, os dois deuses vagaram a ermo pelo deserto sem
nunca encontrarem nada. E cada dia mais, a barriga de Hera ia crescendo. Os
dois começaram a desconfiar de que seriam pais em breve. Se a missão não
se completasse, eles seriam obrigados a voltar, apenas para que Hera pudesse
dar à luz.
- Chegou a hora. – Disse Zeus. – Não posso mais passar por esses
lugares com meus poderes ocultos. Se não acelerarmos a missão, podemos
entrar em apuros no meio deste deserto com você dando à luz. Tomara que
ninguém detecte o poder da minha Suprema Vontade.
- Cuidado, querido. Seja o mais discreto possível, por favor. – Disse
Hera.
Zeus começou a queimar sua cosmo-energia, invocando o poder de
sua Suprema Vontade. Uma aura branca começou a envolver seu corpo inteiro,
e seus olhos brilharam inteiramente com uma luz branco-azulada: tanto a
córnea dos olhos quanto a íris e a pupila. E então Zeus segurou a mão de Hera
com sua mão esquerda. Depois, Zeus abriu a palma de sua mão direita,
virando-a para cima. Estendeu seu braço direito à frente e disse:
55
“Deserto do oriente médio”. Trata-se do deserto envolvido pela área do Crescente Fértil, região geográfica que muitos anos no
futuro viria a ser conhecida como deserto da Arábia.
56
“έρημο! Αποκαλύψτε μυστικά”. Pronuncia-se “Érimo! Apocalyps-tê Mýstica”. Em grego, significa “Ó, deserto! Revele os
segredos!”.
- Veja, Hera! Poder de localização tempo-espacial. Um dos truques
ensinados por Kairós. Os dois pontinhos azuis somos nós dois. O ponto
vermelho deve ser a entrada secreta que procuramos. – Disse Zeus.
- Vamos seguir as indicações. – Disse Hera. – Pelo visto, ainda
estamos a centenas de quilômetros de distância do nosso objetivo.
Os dois começaram a andar em direção ao sul do deserto. Olharam
para a palma da mão de Zeus, e os pequenos pontinhos azuis se deslocaram
timidamente para baixo, em direção ao ponto vermelho. Depois de meses
perdidos, estavam finalmente indo para a direção correta.
Após 5 dias de caminhada pelo deserto escaldante do Oriente Médio,
chegaram a uma região do deserto que era chamada de Madiã57 pelos
homens. Os dois pontinhos azuis estavam agora bem perto do ponto vermelho.
Zeus e Hera olharam para sua frente e viram um monte que se agigantava em
plena areia. Havia algumas colinas em volta, mas um monte em específico se
erguia mais alto e íngreme que os demais. Ao que tudo indicava, o ponto
vermelho do mapa holográfico de Zeus apontava para uma coordenada
geográfica no topo do referido monte.
- Um monte? Mas como pode ter um jardim imenso em cima de um
monte? – Indagou Zeus. - Pelas descrições que Kairós fazia quando eu era
criança, o Jardim do Éden superaria em tamanho toda a região da Grécia.
Como pode estar em cima de um monte?
- Não faço ideia. Mas se o mapa aponta para lá, então acho que
devemos subir. – Respondeu Hera.
57
“Madiã”. Do Hebraico דן . Também traduzido algumas vezes pelo nome “Midiã”. Região desértica entre o golfo de Ácaba
(ao lado do mar vermelho) e o centro do deserto do oriente médio. Segundo estudiosos, é o local onde fica o Monte Horeb,
também conhecido como Monte Sinai, onde Moisés teria recebido as tábuas da Lei com os 10 mandamentos, milhares de anos
depois da queda de Adão no jardim do Éden.
Os dois foram subindo aquele monte íngreme no meio do deserto, que
muitos milhares de anos depois viria a ser chamado de monte Horeb pela
humanidade. A subida era difícil e o ar ia ficando quente e rarefeito. Era como
se tivesse fogo lá em cima na montanha, pois a temperatura ia subindo, ao
invés de diminuir, o que diferenciava aquele monte de todos os outros que eles
conheciam. Quando chegaram próximos ao topo do monte, ficaram
estupefatos. Atrás deles, estava o caminho que descia a encosta do monte,
voltando para sua base. À frente deles, havia um caminho que se interrompia
subitamente em um penhasco profundo. Não havia mais como subir o monte, a
não ser por meio de escalada vertical. Se voltassem, iriam parar no local de
onde começaram.
Olharam para frente. A uns 4 metros de distância do caminho que se
interrompia em um despenhadeiro, a encosta da montanha tornava a se erguer
como uma grande parede íngreme. Nesse paredão, avistaram uma depressão
na rocha da encosta. Era um vão apertado entre duas seções de pedra. Mas
estava alto, um pouco acima do caminho em que se encontravam. Logo, a
entrada só poderia estar ali dentro daquele vão esculpido na parede da rocha.
Deveriam pular ou teriam que subir em escalada, primeiro verticalmente e
depois lateralmente, dando a volta no abismo à sua frente. Mas aproximar-se
do vão era perigoso, pois ficava muito próximo ao despenhadeiro.
O casal de deuses decidiu se aproximar cuidadosamente, para ver se
conseguiam enxergar mais de perto o que havia dentro daquela depressão.
Olharam para o buraco na rocha, mas estava muito escuro lá dentro. O único
jeito de saber o que havia dentro seria pular dentro do buraco e torcer para que
nada de ruim acontecesse. Os dois miraram a fenda na rocha e saltaram para
dentro do vão, passando pela pequena abertura na encosta do monte e caindo
dentro de uma caverna totalmente escura. Mas, pelo eco que reverberou a
partir do som dos dois caindo no chão, parecia que o interior da caverna era
um local bem amplo. Não conseguiam enxergar nada.
- Pode deixar, que eu resolvo esse problema para nós. – Disse Hera.
A deusa começou a queimar sua cosmo-energia, invocando o poder de
sua Suprema Vontade. Uma aura cor-de-rosa começou a envolvê-la
completamente, e seus olhos brilharam inteiramente com um tom róseo. Hera
ergueu os braços acima de sua cabeça e exclamou:
- μεγα υφτισμο 58
58
“μεγα υωτισμο”. Pronuncia-se “Mega Photismo”, que significa “Grande Iluminação de luzes”. Phóton = Luz.
Uma esfera de luz surgiu entre os braços estendidos de Hera,
iluminando todo o interior da caverna. Foi assim que eles viram, bem à frente
deles, a tão procurada entrada para o Éden. Havia duas colunas esculpidas em
algum tipo de rocha vulcânica, que iam do chão até um arco sob o teto da
caverna. No espaço entre as colunas, havia uma espécie de portal
hiperdimensional. Esse portal era uma cortina de luz prateada que tremulava
junto com a corrente de ar. A cor da cortina de ar prata se assemelhava a um
espelho formado por mercúrio líquido. À frente do portal, bloqueando a
passagem, havia duas criaturas semelhantes a homens, mas eram alados.
- Quem pretende se aproximar do jardim secreto criado pelo Ser
Supremo? – Perguntaram as criaturas aladas.
- Somos Hera e Zeus. Queremos entrar para resgatar nossa mãe. –
Disseram os dois.
- O jardim é lacrado e proibido para os humanos normais. Apenas os
casais originais podem entrar. Vocês não são Adão e Eva, nem Ândros e
Pandora. Portanto, devem voltar. Daqui em diante, não podem atravessar. –
Disseram os guardiões do portal.
- Mas nós não somos humanos. Somos deuses! – Disse Zeus.
- Vocês são deuses? – Perguntaram os guardiões. – Nunca ouvimos
falar que entre os deuses havia aqueles que se denominam Zeus e Hera. Por
acaso existem deuses que não conhecemos?
- Somos os filhos perdidos de Chronos. Ninguém, exceto o Tirano e
nossa mãe, conhece nossos nomes. E ainda há outros irmãos nossos
desconhecidos entre vós. – Disse Hera.
- Se forem deuses realmente, podem passar. Contudo, um alerta! Se
estiverem mentindo, perderão suas cabeças. – Disseram os seres alados.
Os guardiões desembainharam suas espadas. No momento em que as
lâminas deixaram as bainhas, começaram a brilhar com uma luz alaranjada, e
depois pegaram fogo. Os dois guardiões se afastaram cada um para um lado,
abrindo passagem, mas ergueram os braços e tocaram as espadas em chamas
ao alto, formando um arco. Só seria possível passar pelo portal se
atravessassem pelo meio, através do arco das espadas.
- Estas são as espadas flamejantes dos Serafins. Se por acaso forem
humanos comuns, as espadas pesarão em nossos braços e cairão sobre suas
cabeças, decepando-as. Vão em frente. – Disseram os guardiões. Apesar do
alerta, não havia um tom irônico em suas vozes. Eram firmes em suas falas, e
falavam aquilo porque era sua função. Apenas estavam cumprindo seu dever
como guardiões, mas tampouco duvidavam da dupla à sua frente.
Zeus e Hera se aproximaram do arco de espadas. As chamas das
lâminas começaram a aquecer e a tremular violentamente, reagindo à
presença dos dois. Os deuses passaram por baixo delas, porém os braços dos
guerreiros não pesaram. Haviam conseguido passar intactos pelos arcos de
espadas flamejantes e estavam agora de frente com o portal de energia
prateada. Aliviados, os dois deuses olharam para trás. Os guardiões desceram
as espadas para baixo após os dois passarem. As chamas se apagaram. E
então eles guardaram as lâminas de volta em suas bainhas. Moveram-se para
o centro novamente, ficando na posição original, um ao lado do outro,
bloqueando a frente do portal. Os guardiões não falaram mais nada, nem
olharam de volta para Zeus e Hera. Tinham os olhos fixos à frente, para a
entrada da caverna. Lá fora, para além do buraco na parede do penhasco,
Zeus e Hera viram uma grossa chuva que começava a cair em torno da
montanha. Raios caiam e iluminavam a paisagem lá fora.
- Vamos, querida! – Disse Zeus. Os dois se voltaram e passaram o
portal prateado de mãos dadas.
Uma forte luz branca ofuscou os olhos dos deuses por alguns
segundos. E, então, quando as imagens voltaram a entrar em foco, eles se
viram em uma extensa campina amplamente iluminada. Era dia ali. Atrás de si,
estavam as duas colunas de granito, encimadas pelo arco que as unia ao topo.
No meio, estava a cortina prateada de luz vaporosa. Porém, tudo em volta, à
frente e atrás era uma campina extensa e verde. A caverna simplesmente
sumira. Não havia montanha. Não havia deserto.
Havia flores de todo tipo espalhadas pelas gramas. Bem à frente deles,
lá longe, eles viram uma grande árvore, cheia de frutos dourados. Era a maior
árvore do local, e parecia que estava no meio da campina. Ao redor da
campina, o jardim continuava em bosques, florestas, lagoas, rios, vales e
colinas. Cada um dos elementos naturais parecia ter sido colocado de modo
planejado. Era o lugar mais natural e, ao mesmo tempo, mais artificialmente
planejado que os dois deuses já haviam visto. Tudo parecia estar em uma
ordem e lugar específicos. Tudo seguia um tipo de padrão geométrico. Flores
em canteiros circulares. Canteiros de rosas seguindo desenhos e padrões
curiosos. Até mesmo as pequenas borboletas voavam em padrões específicos,
seguindo determinada ordem. Aos olhos dos mais sensíveis, parecia que elas
estavam dançando algum tipo de balé. Pássaros, pequenos animais: tudo
parecia conviver em perfeita harmonia naquele local. Uma natureza
perfeitamente alinhada e ordenada.
O jardim era imenso, e simplesmente não parecia existir dentro da
montanha. Era como se tivessem atravessado um portal dimensional e terem
ido parar em um mundo paralelo, em um local espiritual, onde a matéria
parecia emanar uma aura pura e elegante. Aquele lugar estava ali no planeta
Terra, contudo não estava no mesmo plano dimensional. Estava em uma
dimensão escondida, em uma hiperdimensão. Ali, o tempo parecia não passar,
estava sempre claro, havia sempre uma brisa suave, a temperatura era sempre
amena, e todos os seres pareciam felizes.
Foi então que os dois deuses viram um homem altivo e elegante se
aproximar. Parecia um homem normal da Terra, porém sua pele refletia um tipo
de luz espiritual, uma aura branca e dourada. Quando chegou mais próximo, os
dois viram que aquele homem estava completamente nu. Mas a aura que
emanava dele ofuscava e cobria suas partes íntimas. Ele era de tal modo
natural, que nem parecia perceber que estava sem roupas. A luz era suas
vestes.
- Olá, senhores! Acho que é a primeira vez que os vejo por aqui. Meu
nome é Adão.
- Adão?! – Surpreendeu-se Zeus. – Então você existe mesmo. O
primeiro homem.
- Sim, os “anjos de Deus”59 que aqui vivem já me disseram que eu fui o
primeiro humano a ser criado pelo Deus Supremo. Logo depois veio minha
esposa Eva e o outro casal de humanos. Deus criou-nos e cuidou de nós aqui
neste jardim, como se fosse nosso próprio pai. Mas quem são vocês? –
Perguntou o homem.
- Nós somos apenas visitantes. Queríamos encontrar uma pessoa, mas
não sabemos onde procurar. – Disse Zeus.
- É estranho não saberem o lugar onde encontrá-la. Aqui todos sabem
tudo, e todos se conhecem. Não devem ser mesmo deste lugar. Que estranho!
De onde vocês são? – Perguntou Adão.
- Nós somos da Terra. – Disse Hera.
- Da Terra? Mas aqui é a Terra. – Respondeu Adão, exibindo uma
feição confusa. – Afinal, vocês são daqui ou não?
- Nós somos da Terra, sim. Mas de uma parte diferente da Terra. Uma
parte menos nobre, eu acho. Nós viemos da Terra que fica fora do jardim.
Talvez você não conheça. Lá vivem muitos outros homens semelhantes a
você. – Disse Zeus.
- Outros homens!? Uau. Isso é intrigante e estarrecedor. Os únicos
humanos que conheço são meus amigos Ândros e Pandora, e minha esposa
Eva. Não sabia que existiam outros seres de nossa raça.
59
“Anjos de Deus”. Os anjos e os deuses são, na verdade, o mesmo tipo de criaturas criadas pelo Ser Supremo. Mas na maioria das
culturas humanas, os imortais são chamados de “anjos” pelos homens.
- Bem... De certo modo, os outros homens também ignoram a
existência deste lugar. Para eles, tudo isso não passa de uma lenda antiga. E,
considerando como foi difícil achar a entrada, e como os guardiões não
permitem a entrada de outros homens, é fácil entender o motivo. – Disse Zeus.
- Escuta, Adão. Você poderia nos mostrar como encontrar uma
pessoa? É muito importante para nós. – Perguntou Hera.
- Acredito que não haveria problemas. – Disse Adão.
- Precisamos nos encontrar com Réia. – Disse Zeus. – Mas precisa ser
em segredo.
- Com Réia?! Poxa... logo com a pessoa mais difícil de se ver. Ela é
uma das angélicas do jardim. – Disse Adão.
- Uma das Angélicas? – Perguntou Hera.
- Sim, um dos anjos criados por Deus.
- Ah sim... de onde viemos, eles são chamados de deuses ou imortais.
Mas sim. É ela mesma. Como podemos encontrá-la? – Perguntou Hera.
- Foi o que eu disse. Dentre todos os angélicos, Réia é a mais difícil de
se ver. Acreditamos que o esposo Chronos a mantém refém em sua casa. Ela
não pode sair sempre que deseja. Aliás, Chronos pensa que pode mandar na
liberdade de todos aqui dentro. Ele vem agindo com estranha tirania e violência
há bastante tempo. As pessoas acham que ele quer tomar o lugar de Deus e
dominar sobre todos.
- Sim, Adão. Lá de onde viemos, a Tirania de Chronos é muito mais
evidente, pois lá o monstro passa destruindo aldeias, florestas, bosques e
devorando pessoas e animais. E lá o caos demora muito mais tempo para ser
desfeito. Tudo que se destrói por lá, demora a ser reconstruído. Precisamos
parar Chronos, porém a primeira que precisa de resgate é Réia.
- Entendo. – Disse Adão. – Neste caso, vou lhes contar um segredo.
Chronos proibiu Réia de falar com qualquer pessoa do jardim. Ela só tem
permissão para sair de casa uma vez por semana, para ir à beira de uma lagoa
banhar-se, devendo retornar em seguida.
- E que dia Réia sai de casa? – Perguntou Zeus.
- Se vocês pretendem nos livrar de Chronos, então acho que não faz
mal contar. Réia sai todo quinto dia da semana. Ou seja, hoje mesmo ela irá
sair para banhar-se no lago. – Disse Adão.
Zeus e Hera olharam para a linha do horizonte. Só ali perto, avistaram
cerca de uns três lagos e espelhos d’água. Deveria haver outras dezenas deles
espalhados no jardim.
- Mas qual é a lagoa correta? Não conhecemos o lugar. – Perguntou
Zeus.
- É aquela chamada “Lagoa de Cristal”. Eu posso levá-los até lá. –
Disse Adão. – Mas preciso avisar à minha esposa antes, para que ela não se
preocupe. Ultimamente, todos andam com medo das maldades de Chronos, e
qualquer atraso é visto como um mau presságio.
- Tudo bem, podemos ir. – Disseram os dois deuses em conjunto.
Os três atravessaram uma longa campina, toda enfeitada com
canteiros de flores de todos os tipos, bem como com árvores e plantas
ornamentais. A campina também era povoada por animaizinhos felizes. O mais
espantoso de tudo é que esses animais eram muito diferentes daqueles que
existiam do outro lado da Terra: eles falavam! Um ou dois coelhos deram “bom
dia” aos três, enquanto passavam por ali. Zeus e Hera acharam estranho, mas
responderam o cumprimento por cortesia.
Por fim, chegaram a uma cabana esculpida em madeira branca,
perfeitamente integrada à paisagem ao seu redor. A cabana era de tal modo
graciosa que parecia outro dos elementos artificialmente naturais do Éden. Era
de uma arquitetura genial (rebuscada e detalhada), mas ao mesmo tempo era
tão natural e bem integrada ao jardim que era difícil dizer onde começava a
construção e onde terminada a natureza. As vigas da casa estavam juntas dos
pés de grandes salgueiros. As janelas misturavam-se com as jardineiras
perfeitamente acopladas em seus peitoris, dando a impressão de que janelas e
flores eram uma só coisa. As portas exibiam batentes cobertos por hera e
flores de jade. Não era uma casa muito grande, porém era maior e mais
luxuosa do que as mansões dos homens mais ricos da região da Grécia até
aquele momento. Adão entrou pelos portais frontais e chamou por sua esposa.
- Eva! Temos visitas!
Vinda do andar de cima, uma mulher graciosa desceu as escadas em
direção ao vestíbulo da casa de madeira branca. Sua beleza superava a de
todas as mulheres humanas comuns que moravam do outro lado da Terra. Era
tão deslumbrante que sua beleza rivalizava apenas com a da deusa Afrodite.
Assim como seu marido, a mulher estava completamente nua, porém uma
espécie de aura luminosa e pura emanava de seu corpo e servia-lhe de
vestimenta luminosa.
- Meu querido! Temos visitas? Você convidou o senhor coelho
novamente para tomar um chá conosco? – Perguntou a mulher original,
enquanto descia as escadas espiraladas.
- Não, princesa. Hoje teremos em nossa presença visitantes da Terra.
Eles dizem que são do outro lado do mundo, que fica para além das fronteiras
do jardim.
- Além das fronteiras do Jardim? Isso parece ser bem longe. – Disse
Eva, finalmente chegando ao andar térreo e encontrando as três pessoas ali
paradas em sua sala.
- Eu me chamo Zeus, senhora!
- E eu me chamo Hera, senhora!
- Pessoas do outro lado da Terra?! Uau. Isso, sim, que chamo de
surpreendente visita. Nem sabia que existiam outros humanos por aí. – Disse
Eva.
- Bem... na verdade, nós dissemos que há outros humanos vivendo por
aí sim, mas não que somos humanos... Na verdade, somos filhos de Réia,
portanto somos imortais.
– Uau! Seres angélicos... aqui na minha casa?! Então vocês são
aqueles filhos que Chronos se gabava de ter tido? – Perguntou Eva.
- Chronos falava de nós? – Perguntou Zeus.
- De certo modo, sim. Há cerca de uns 20 anos que ele vem
anunciando que teve muitos filhos, mas como ninguém nunca os viu, todos
achavam que era apenas uma mentira para tentar intimidar a todos. – Disse
Adão.
- Eu me chamo Eva, e sou a mulher de Adão. O Criador nos tem como
seus filhos. – Disse Eva, estendendo a mão para cumprimentar os dois deuses.
- Filhos... d’Ele?! – exclamaram admirados Zeus e Hera, completando o
cumprimento de mãos.
- Sim... Ele mesmo nos criou com suas mãos e cuidou de nós por
longos anos. Ele viveu exatamente aqui, nesta casa, por muitas centenas de
anos. Mas um dia Ele resolveu que era hora de descansar. Apesar de não
estar mais agora neste Universo, Sua presença continua por aqui, e Ele
perscruta todos os cantos e lugares, vigilante a tudo.
- Vocês são realmente humanos incríveis. Nós somos deuses, filhos de
Réia. Porém, perto de vocês dois, parecemos não passar de criancinhas.
Nunca vivemos tanto tempo assim, nem nunca conhecemos pessoalmente o
Altíssimo, o Ser Supremo. E, infelizmente, aquele que nos gerou não merece
ser chamado de pai. – Disse Zeus, pensativo. - Vosso pai, contudo, é o próprio
Criador.
- Nós viemos de muito longe, de fora do jardim divino, em busca de
nossa mãe, a deusa Réia. – Disse Hera. – Precisamos resgatá-la das garras do
tirano Chronos, pois uma guerra vem aí, e Chronos precisa ser detido.
Adão e Eva conversaram com os deuses visitantes por bastante tempo
naquela manhã. Eva serviu-lhes um chá delicioso, parecia feito de flores e
ervas do campo. O chá aliviou todo o cansaço dos dias de viagem de Zeus e
Hera. Era como se toda a fadiga instantaneamente deixassem os corpos dos
dois. Eles pensaram que nem mesmo mil noites de sono nas terras fora do
jardim recuperariam suas energias mais do que aquele estranho chá preparado
por Eva. Deveria ser alguma receita divina ensinada pelo próprio Altíssimo,
centenas de anos antes. Quando todos estavam descansados e relaxados,
Adão olhou para fora da janela e falou:
- Chegou a hora! Réia deve estar indo se banhar neste momento,
precisamos nos apressar.
Lá fora, a luz clara do dia foi substituída por uma luz alaranjada e
suave, semelhante a um pôr-do-sol do outro lado da Terra. Era como se tivesse
chegado a noite. Porém, ali no jardim, nunca havia trevas. Era sempre claro e
luminoso. A mudança dos dias era marcada apenas por variações no brilho e
na cor da luz. No Éden, era sempre dia e a temperatura era sempre amena.
Os quatro passaram apressados por um caminho de hortênsias que
terminava em um pequeno bosque de angicos. As curiosas árvores cresciam
mais ou menos alinhadas ali. No meio do bosque, em uma clareira em meio às
árvores, havia um pequeno lago de águas cristalinas. Sua superfície refletia as
luzes de incontáveis estrelas vespertinas, fazendo parecer que havia milhares
de pedrinhas de diamante em seu leito.
- A Lagoa de Cristal! – Disse Adão. – Se escondam em meio às
árvores e esperem que a senhora Réia chegue.
Aguardaram cerca de 30 minutos. Após o pio de uma coruja, viram
aproximar-se da clareira do bosque duas pessoas muito bonitas. Eram
igualmente perfeitas, como Eva, mas usavam mantos e véus como
vestimentas. Apesar de toda a beleza, traziam um semblante triste.
- Venha, irmã! Por este lado. – Disse uma das mulheres.
- Já estou indo, Têmis, me espere... – Respondeu a que vinha mais
atrás.
A deusa Réia e sua irmã Têmis, a deusa da Justiça, vinham
caminhando em direção à lagoa. As duas chegaram à beira da lagoa e
depositaram uma cesta ao chão, cheia com toalhas e roupas limpas. Zeus
esperou para ver se não aparecia mais ninguém junto com elas, pois se
houvesse algum capanga de Chronos à espreita, o resgate seria mais
complicado. Não que para Zeus isso fosse um problema, pois era muito
poderoso. Mas uma luta antecipada em pleno jardim do Éden poderia
atrapalhar os planos de guerra e as missões dos outros olimpianos. Mas não
veio mais ninguém em escolta.
As duas começaram a se despir para entrar na lagoa de cristal, mas
antes de terminarem, Zeus saiu de seu esconderijo em meio às árvores,
revelando-se. Ao seu encalço, saíram Hera, Adão e Eva.
- Quem são vocês?! – Disse Réia, puxando a alça da blusa
novamente. – Ó!!! Adão? Eva? Vocês aqui na lagoa de cristal? Se Chronos
souber, destruirá a casa de vocês.
- Se acalme, Réia. Apesar das ameaças, Chronos nunca teve coragem
nem de chegar perto de nossa casa. Ele sabe que o Altíssimo não permitiria
isso. – Disse Adão.
- Réia, querida... veja quem nós te trouxemos! – Disse Eva. – Não os
está reconhecendo?
Réia olhou para a dupla de pessoas ao lado de Adão e Eva, apertando
os olhos como se quisesse ver melhor.
- Irmã, são eles... não percebe? – Disse Têmis.
- Quem são eles? – Perguntou Réia.
- Eles são seus filhos, querida. – Disse Eva.
- Mãe... sou eu, seu filho Zeus!
- Mãe... sou eu, sua filha mais velha, a Hera!
Por um momento, Réia pareceu gelar... de repente arregalou os olhos
em um assombro de emoção e seu rosto começou a corar. Pela primeira vez
em mais de duas décadas, Réia voltou a sorrir.
- Vocês... voltaram... Então, Kairós conseguiu te criar em segredo, meu
filho. E você, querido, conseguiu libertar seus irmãos? Onde estão todos?
- Sim, mãe. Fui criado escondido por Kairós, conforme o plano da tia
Têmis. E libertei meus irmãos cerca de alguns meses atrás. Eles estão em
missão, pois em breve entraremos em guerra contra Chonos!
- Sim!! – Disse Réia, com o olhar marejando de esperança... – A
profecia de Deus! Está se cumprindo...
- Mãe, viemos lhe resgatar e levá-la a salvo, antes que a guerra seja
declarada. Achamos justo que seja preservada de toda a violência, pois você
sofreu por nós desde o princípio. Assim como me escondeu da voracidade de
Chronos, agora viemos para escondê-la da guerra. Venha conosco para fora
do jardim, para longe da interferência de Chronos. Precisamos sair agora,
antes que ele perceba a fuga e venha atrás de nós.
- Eu também vou com vocês. Réia não pode viver sem mim. – Disse
Têmis. – Eu não quero ficar do lado de Chronos nessa guerra.
Os seis saíram escondidos da clareira do bosque, atravessaram o
caminho dos angicos em silêncio, evitando serem detectados por algum deus
ou animal curioso e fofoqueiro. Chegaram, enfim, ao caminho de hortênsias
azuis e começaram a rodear o extremo oeste da campina central do jardim.
Chegando ao sul da campina, encontraram a casa de madeira branca de Adão
e Eva. Entraram um pouco. Lá dentro, conversaram sobre todas as coisas,
sobre como Kairós planejou soltar os Hecatônquiros e Ciclopes, sobre como
Zeus os libertou do Tártaro, sobre como Zeus libertou os irmãos das entranhas
de Chronos, sobre a batalha entre Kairós e Chronos, sobre como Chronos
sucumbiu ao poder de selamento dos deuses gêmeos, sobre como Kairós
tivera um filho escondido com uma humana chamada Astéria, e sobre esse
filho iria ajudar na batalha. Conversaram sobre o juramento feito no monte
Olimpo, e sobre os medalhões que se materializaram como resposta de Deus
em aceitação ao juramento. Por fim, falarem sobre as missões de Zeus e Hera
(e sobre como foi difícil encontrar a entrada do jardim), bem como sobre as
missões de Poseidon e Tétis, e de Deméter e Héstia.
Após a conversa, mãe e filhos se abraçaram. Réia chorou todo o tempo
perdido em que não pode ser mãe deles. Têmis disse que apoiaria Zeus em
sua empreitada para destronar Chronos. Adão e Eva ofereceram-lhes ervas
medicinais para que fizessem chás especiais sempre que precisassem se
recuperar das batalhas contra Chronos. Assim, Zeus, Hera, Réia e Têmis se
despediram de Adão e Eva e rumaram em direção ao Norte. Arrodearam ao
longe a grande árvore no centro do jardim (aquela que dava os frutos
dourados, proibidos por Deus), indo em direção à borda norte da campina
central, onde ficavam as colunas do portal. Chegando ao local, finalmente
atravessaram o portal de volta, indo parar na escura caverna que havia no topo
do monte Horeb. Os querubins com espadas flamejantes que guardavam a
entrada do jardim abriram espaço para os quatro deuses passarem. Zeus
puxava sua mãe pela mão, carinhosamente, em direção ao deserto lá fora.
- Uma nova vida nos espera, mãe. – Disse ele.
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