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Cinco problemas do neopentecostalismo

Desde que escrevi o artigo A preocupação com o


neopentecostalismo: o caso da Igreja Universal do
Reino de Deus, publicado na revista Ultimato nº 328
(jan-fev/2011), senti que deveria apresentar as
razões que o justificam. Mencionei que a Igreja
Universal do Reino de Deus (IURD) e demais igrejas
similares têm contribuído para a “crise soteriológica
no Brasil, imunizando muitos contra o Evangelho,
embora pensem ser crentes”. Tanto o presente artigo quanto o anterior não têm o
propósito de fragilizar os seguidores do neopentecostalismo, pelo contrário, a
minha intenção é abençoá-los. Além disto, desejo chamar a atenção de meus
colegas evangélicos para o ensino de base não evangélica proveniente de certos
segmentos religiosos.

O termo “evangélico” só deveria ser concedido a um grupo cujo ensino fosse


coerente com o Evangelho de Jesus Cristo conforme revelado nas Escrituras.
Embora algumas igrejas possam levar seus adeptos a experimentar certos
benefícios, contam com falsos mestres que deveriam ser descartados como
evangélicos, juntamente com seus respectivos grupos, por distorcerem o
Evangelho (Gl 1.6,7). Não há ensino que deva ser comunicado com mais
fidelidade do que a mensagem evangélica da salvação. Devemos nos lembrar do
que está em jogo na vida das pessoas: o céu e o inferno. Portanto, este não é um
assunto qualquer (1 Tm 4.16).

Procurei destacar cinco problemas existentes na mensagem da salvação pregada


pela IURD, que também podem ser encontrados, com algumas alterações, em
denominações similares. Minhas evidências se baseiam no intenso
acompanhamento de programas de rádio, sermões, conversas com adeptos e
leitura de livros do Bispo Edir Macedo.

Jesus disse que podemos identificar uma árvore por seus frutos. Então,
examinemos o fruto com base no que realmente é propagado pela denominação.

1º problema: estudo da salvação = teologia = paradoxo


Em "Libertação da Teologia", Macedo afirma que o estudo teológico é uma
atividade fútil e contraproducente aos esforços evangelísticos. No entanto, tal
afirmação consiste em um dos muitos paradoxos desta denominação.
Primeiramente, a IURD apresenta, em sua página na Internet, uma declaração de
fé que demonstra a importância de suas crenças. Em segundo lugar, Macedo
alega ter concluído diversos graus, alguns dos quais em Teologia, e é chamado de
teólogo na capa de seus livros. Por último, em alguns de seus livros como, por
exemplo, nas "Doutrinas da Igreja do Reino de Deus Vol. 3", o Bispo adverte seus
seguidores contra falsas doutrinas. Além do mais, os líderes eclesiásticos são
responsáveis, perante Deus, pelo conteúdo de sua pregação, independente do que
pensem acerca da reflexão teológica.

2º problema: A ênfase exagerada na prosperidade gera complicações


Macedo afirma, com frequência, que o Evangelho inclui: bênçãos financeiras,
benefícios físicos e salvação eterna, sendo estes três elementos promessas
divinas e direitos de todos os seguidores de Cristo. Além disto, alega que o
Evangelho é a chave para a libertação de sofrimentos demoníacos tais como a
“desgraça” e a “miséria” ("Orixás, caboclos e guias: deuses ou demônios?", 2006,
p. 120). Esta premissa compõe o enredo principal e a especialidade ministerial da
IURD. O problema é que tal ênfase acaba por redefinir a mensagem evangélica da
salvação, colocando-a, dramaticamente, em segundo plano. Mesmo que esta
distorção possa parecer sem importância, veremos que suas implicações são
muito sérias.

3º problema: fé = sacrifício
É verdade que a IURD afirma que a salvação vem “pela fé no Senhor Jesus Cristo”
e que a pessoa deve “aceitar Jesus”. No entanto, estas frases têm seu significado
bíblico alterado pelo que o Bispo Paulo Ayres Mattos chama de “teologia sacrificial”
de Macedo. Atrelada à ênfase na prosperidade e saúde, a necessária libertação
das misérias e mazelas demoníacas é obtida, principalmente, pela fé, e o sacrifício
pessoal é a principal manifestação da fé. Na verdade, a fé praticamente se
transforma em sinônimo de sacrifício, tendo como carro-chefe os dízimos e as
ofertas.

4º problema: salvação = um estado precário


Em uma das obras mais reveladoras acerca de sua visão sobre a salvação
("Nascimento Novo", 2008), Macedo afirma que “a pessoa aceita Jesus, mas, a
partir deste instante, tem que manter a salvação através do seu próprio sacrifício
com Deus até o último dia”, caso contrário, a salvação é anulada (p. 15). Esta
versão da salvação acaba por se constituir em um estado vulnerável, pois é difícil
mantê-la. Olhando deste ponto de vista, parece que a pessoa não “é salva”, mas
apenas “está salva”. Permita-me ilustrar. O bispo acredita que, provavelmente, foi
melhor ao ladrão arrependido, que fora crucificado ao lado de Jesus, ter morrido
logo após sua confissão de fé (p. 34). Por quê? Aquele homem não teve tempo de
cair no pecado, perder sua fé ou renunciar a Cristo, o que, possivelmente, teria
acontecido uma vez que ele não tinha nascido de novo. E isto nos leva ao próximo
ponto.

5º problema: visão estranha sobre o novo nascimento


Utilizando João 3.1-21 como um de seus principais textos de prova para sua
versão do novo nascimento, Macedo se concentra nas palavras “nascer da água e
do Espírito”. A primeira etapa exige que a pessoa “aceite Jesus” e depois que ela
passe pelas águas do batismo. Segundo a cosmovisão iurdiana, esta etapa
fornece alguma resistência contra as obras da carne, mas a pessoa precisa de
algo mais para lutar contra o demônio que ainda pode estar alojado em seu íntimo
(p. 24).
A segunda etapa é semelhante à experiência pentecostal do segundo batismo,
porém com uma alteração que somente o bispo pode descrever (p. 35). Quando a
pessoa entrega todo o seu ser a Jesus e está disposta a obedecer a sua Palavra,
naquele exato momento:

...Deus, na Pessoa do Espírito Santo, vem sobre o candidato e, assim como


envolveu a Virgem Maria e nela concebeu um Ser divino, também envolve o
candidato, transformando-o espiritualmente numa nova criatura, isto é, num ser
divino.
É a partir daí que a pessoa se torna, verdadeiramente, filha de Deus. Enquanto
isso não acontecer, ela pode até ser salva, mas precisa nascer de Deus.

O Espírito testifica ao seu espírito?


O Espírito Santo prometeu nos guiar a toda verdade. O Espírito testifica ao seu
espírito que minhas afirmações estão corretas? Ou seja, que a IURD e outros
grupos que ensinam este tipo de discurso contribuem para o crescimento da crise
soteriológica em nossa nação?

É importante reafirmar que meu objetivo é oferecer embasamento, mediante a


observação da IURD, para a fonte de preocupação que o movimento
neopentecostal representa ao avanço evangélico e seu futuro. Agora faz sentido
como uma obreira sincera e comprometida, que ama a Deus e a IURD, acredita,
erroneamente, em um evangelho baseado no esforço humano e nos rituais
religiosos. Infelizmente, uma pessoa pode ser sincera e, ao mesmo tempo, está
sinceramente enganada.
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Fonte:
https://www.ultimato.com.br/conteudo/cinco-problemas-do-neopentecostalismo .
Acesso em 05/03/2020.

Fonte secundária: David Allen Bledsoe é missionário batista e trabalha com


evangelismo, expansão de igrejas e educação teológica, e coordena projetos do
Southeastern Baptist Theological Seminary no Brasil. Possui D. Min. e D. Th. em
Missiologia. O neopentecostalismo foi o assunto de sua tese de doutorado na
Universidade da África do Sul, em Pretória (2010).

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