Você está na página 1de 7

CAPÍTULO 15

Hipertensão na gravidez
1 Introdução mulheres com eclâmpsia foram “cobertas de bolhas, sangra-
2 Profilaxia das, purgadas, envoltas em lençóis, submetidas a lavagem,
2.1 Medidas dietéticas irrigadas, puncionadas, privadas de alimento, sedadas,
2.2 Diuréticos
anestesiadas, paralisadas, tranqüilizadas, tornadas hipotensas,
2.3 Agentes antitrombóticos e antiplaquetários
2.4 Vitaminas antioxidantes afogadas, receberam diuréticos, submetidas a mastectomias,
3 Hipertensão gestacional leve ou moderada e pré-eclâmpsia desidratadas, forçadas a dar à luz e negligenciadas”. Felizmen-
3.1 Repouso no leito te, a maioria desses “remédios” agora é obsoleta. Neste capí-
3.2 Agentes anti-hipertensivos tulo, avaliamos os dados disponíveis sobre condutas atuais para
3.3 Outros tratamentos evitar ou tratar a hipertensão gestacional, a pré-eclâmpsia e a
4 Pré-eclâmpsia grave e eclâmpsia eclâmpsia.
4.1 Agentes anti-hipertensivos
4.2 Expansão do volume plasmático
4.3 Agentes anticonvulsivantes 2 Profilaxia
4.4 Conduta intervencionista versus conduta expectante
5 Conclusões 2.1 Medidas dietéticas
Como foi discutido no capítulo sobre modificação da dieta,
não há sinais de que qualquer modificação da ingestão protéica
ou calórica possa proteger contra a hipertensão gestacional.
Dois estudos realizados na Holanda compararam a recomen-
1 Introdução dação de restringir o sal na dieta com a manutenção de uma
Dois distúrbios etiologicamente distintos são responsáveis pela dieta normal. Esses estudos não foram grandes, e há poucas
maioria dos distúrbios hipertensivos na gravidez. Um deles é sugestões de qualquer efeito sobre o desenvolvimento de hi-
induzido pela gravidez, que, neste capítulo, denominamos pertensão gestacional ou pré-eclâmpsia. Portanto, o consumo
“hipertensão gestacional” se não for acompanhado por de sal durante a gravidez deve ser uma questão de gosto e
proteinúria, “pré-eclâmpsia” se houver proteinúria associada preferência pessoal.
e “eclâmpsia” se causar convulsões e/ou coma. O outro é a hi- Alguns ácidos graxos de cadeia longa, contidos em óleos
pertensão crônica que precede ou coincide com a gravidez, de peixe, mostraram efeito antiplaquetário e antitrombótico
e algumas vezes está associada a um distúrbio subjacente co- semelhante ao da aspirina. Estudos de observação, bem como
nhecido, tal como a doença renal. Além disso, pode haver uma os resultados de um estudo suplementar realizado há mais de
associação dos dois distúrbios; essa é denominada “pré- cinqüenta anos, sugeriram a possibilidade de um efeito
eclâmpsia superposta”. profilático do óleo de peixe e motivaram estudos controlados
A evolução das gestações complicadas por distúrbios mais rigorosamente. Esses estudos mais recentes mostram uma
hipertensivos freqüentemente é boa, mas algumas vezes esses redução promissora da incidência de hipertensão, pré-
distúrbios podem ter conseqüências devastadoras para a mãe eclâmpsia proteinúrica e parto prematuro, mas não há dados
e o bebê. Por exemplo, a mulher pode apresentar insuficiên- suficientes para mostrar qualquer diminuição da mortalidade
cia renal ou hepática, coagulação intravascular disseminada ou ou morbidade perinatal. O óleo de prímula, outra fonte de
hemorragia cerebral. O bebê pode sofrer restrição do cresci- ácidos graxos, também foi sugerido para a prevenção da pré-
mento intra-uterino, sofrer as conseqüências de nascer cedo eclâmpsia. Foi testado em alguns estudos, mas estes foram
demais, ou morrer no útero. pequenos demais para orientar a prática clínica.
O risco de efeitos adversos é conhecido há muito tempo, e A suplementação de cálcio durante a gravidez parece redu-
um atordoante conjunto de tratamentos clínicos e cirúrgicos zir o risco de as mulheres desenvolverem pré-eclâmpsia, parti-
tem sido proposto ou usado para a prevenção e o tratamento cularmente se corriam grande risco e consumiam pouco cálcio
da pré-eclâmpsia e da eclâmpsia. Um autor relata que as no início da gravidez. Há pequenos indícios de qualquer efeito

Untitled-16 67 25.08.2004, 09:18


68 HIPERTENSÃO NA GRAVIDEZ

sobre outros resultados importantes, como cesariana, restrição do miocárdio e ataques isquêmicos cerebrais. Por essas ra-
do crescimento intra-uterino ou morte perinatal, embora os zões, o uso de agentes anticoagulantes ou antiplaquetários,
estudos não tenham sido suficientemente grandes para excluir e de aspirina em particular, foi considerado para a preven-
um benefício pequeno, mas clinicamente válido. A suplemen- ção de pré-eclâmpsia e de restrição ao crescimento intra-
tação de cálcio pode ser válida, particularmente no caso de uterino associada.
mulheres de alto risco que consomem pouco cálcio. Alguns pequenos estudos da profilaxia antiplaquetária na
A suplementação de magnésio, zinco e selênio também pré-eclâmpsia e restrição ao crescimento intra-uterino suge-
pareceu reduzir o risco de pré-eclâmpsia, mas os estudos que riram que a incidência desses dois distúrbios poderia ser sig-
avaliaram esses minerais foram pequenos demais para ofere- nificativamente reduzida. Infelizmente, essa promessa inicial
cer uma base segura para a prática clínica. não foi confirmada em estudos maiores. Agora existem quase
A busca de algo que evite a pré-eclâmpsia, e também seja 40 estudos, que incluem mais de 30.000 mulheres. Em geral,
barato e fácil, continua. esses estudos confirmam que há uma pequena (15%) redução
da pré-eclâmpsia. Esta é refletida por uma redução semelhan-
2.2 Diuréticos te (14%) do risco de natimortalidade ou de morte neonatal e
Não há sinais de que a retenção excessiva de água ou mesmo o uma redução de 8% do risco de um parto prematuro. As dú-
edema franco cause pré-eclâmpsia, ou defina um grupo de vidas remanescentes incluem a possibilidade de a aspirina ser
mulheres sob risco específico de apresentar o distúrbio. To- mais útil nas mulheres com risco muito alto de desenvolver
davia, muitas tentativas foram feitas e, na verdade, ainda são pré-eclâmpsia, como aquelas com história de doença grave de
feitas por alguns obstetras e parteiras para evitar a retenção início precoce, e a necessidade de se iniciar o tratamento na
de sal e água na gravidez mediante a prescrição de diuréticos primeira metade da gravidez. As pesquisas atuais sobre
ou de uma dieta rigorosamente sem sódio na crença de que trombofilias hereditárias e sua possível relação com a pré-
isso evitará a pré-eclâmpsia. eclâmpsia de início precoce podem ajudar a identificar um
Os efeitos do uso profilático de diuréticos em gestantes com subgrupo de mulheres nas quais o papel da aspirina pode
pressão arterial normal (com ou sem edema ou ganho ponderal merecer reexploração no futuro.
excessivo), e de seu uso terapêutico em mulheres com hiper- A aspirina em baixa dosagem parece ser razoavelmente se-
tensão moderada, foram analisados em diversos estudos ran- gura. Agora se sabe mais sobre a segurança da aspirina a curto
domizados realizados há muitos anos. Os resultados refletem e médio prazos do que sobre a maioria das outras drogas usa-
a capacidade de os diuréticos reduzirem a pressão arterial, mas das na gravidez, e temores iniciais de que poderia estar asso-
não mostram qualquer melhora de resultados essenciais. Não ciada a aumento do risco de sangramento não foram confir-
há indicações claras de benefício em relação à prevenção de pré- mados. Embora o uso amplo rotineiro de aspirina profilática
eclâmpsia ou ao risco de morte perinatal. Isso poderia signifi- não seja apoiado pelos resultados dos estudos, parece que a
car que o tratamento foi ineficaz, ou que os números estuda- aspirina em baixas doses tem utilidade clínica limitada. São
dos foram pequenos demais para se detectar algum benefício necessárias outras pesquisas para determinar quais mulheres
pequeno, porém válido. Nenhum dos efeitos colaterais gra- devem ser beneficiadas.
ves do tratamento com diuréticos na gravidez descritos em A heparina requer administração subcutânea (ou intrave-
relatos de casos episódicos foi observado nesses estudos. Esses nosa), o que a torna uma forma inconveniente de tratamento,
achados sugerem que tanto os benefícios quanto os riscos da e seu uso pode ser associado a efeitos colaterais perigosos. Foi
administração de diuréticos podem ter sido exagerados. testada em alguns estudos, mas estes foram pequenos demais
para orientar a prática clínica. A varfarina também foi usada
2.3 Agentes antitrombóticos e antiplaquetários profilaticamente na tentativa de evitar pré-eclâmpsia recor-
As alterações do sistema de coagulação sanguínea são bem rente em mulheres multíparas. Relatos de seu uso, baseados
documentadas na hipertensão gestacional. A extensão dos em observações casuais, não mostram quaisquer sinais de be-
distúrbios da coagulação parece estar relacionada à intensi- nefício para a mãe ou o bebê, e há algumas sugestões de que
dade da doença, e a ativação precoce do sistema de coagula- pode ter efeitos colaterais graves.
ção pode contribuir para a patologia da pré-eclâmpsia. Foi
demonstrado que a aspirina evita a oclusão trombótica de 2.4 Vitaminas antioxidantes
shunts arteriovenosos e derivações da artéria coronária e re- Um pequeno estudo avaliou o uso de altas doses de vitaminas
duz a morte e o reinfarto na angina instável e após infarto C e E como antioxidantes para a prevenção de pré-eclâmpsia.

Untitled-16 68 25.08.2004, 09:18


HIPERTENSÃO GESTACIONAL LEVE OU MODERADA E PRÉ-ECLÂMPSIA 69

Os resultados foram muito promissores, mas exigem confir- no leito. Os dois pequenos estudos que abordaram essa ques-
mação em estudos maiores antes que essas vitaminas possam tão não forneceram respostas claras. Até hoje não há bons
ser recomendadas na prática clínica. Estão sendo planejados indícios que apóiem uma política de repouso rigoroso no leito
dois estudos desse tipo. em hospital para uma mulher com pré-eclâmpsia leve ou
moderada.
3 Hipertensão gestacional leve ou moderada e
3.2 Agentes anti-hipertensivos
pré-eclâmpsia
A medicação anti-hipertensiva para tratamento da hiperten-
A hipertensão crônica e a hipertensão gestacional leve ou são gestacional leve a moderada ou da hipertensão crônica na
moderada representam pequeno risco para a mãe ou o feto, gravidez reduz a pressão arterial, mas os efeitos sobre outros
exceto se houver hipertensão grave, pré-eclâmpsia ou resultados importantes são menos claros. É possível que re-
eclâmpsia. Por essa razão, o objetivo do tratamento da doença duza o risco de morte perinatal e parto pré-termo, mas as de-
hipertensiva leve a moderada na gravidez tem sido adiar ou monstrações disso ainda são fracas. Não há indicações de que
evitar o desenvolvimento de doença hipertensiva grave. Fo- o tratamento anti-hipertensivo com qualquer uma das drogas
ram usados repouso no leito e vários medicamentos. disponíveis evite a proteinúria, e há mostras insuficientes de
conclusões fidedignas sobre os efeitos do tratamento anti-
3.1 Repouso no leito hipertensivo sobre outros resultados importantes, como cesa-
As mulheres com hipertensão ou pré-eclâmpsia leve ou mo- riana ou morbidade neonatal. Poucas crianças expostas a dro-
derada freqüentemente são aconselhadas a repousar no leito gas anti-hipertensivas in utero foram acompanhadas além do
em casa, ou podem ser internadas para facilitar o repouso no período perinatal.
leito e permitir investigação e supervisão mais rigorosas de suas A metildopa é a droga mais usada em mulheres com hi-
gestações. A extensão em que as mulheres são aconselhadas a pertensão gestacional leve a moderada. Uma parte das crian-
repousar no leito em casa ou no hospital varia consideravel- ças em um estudo foi acompanhada até os sete anos de idade.
mente, mas essa recomendação é muito comum em alguns Esses dados oferecem alguma tranqüilidade em relação à se-
lugares. A intervenção não é inócua. Tanto o confinamento gurança da metildopa, não disponível em relação a outras dro-
ao leito em casa quanto a hospitalização durante a gravidez gas. O uso de metildopa em mulheres com hipertensão mo-
podem resultar em custos financeiros e sociais para as gestan- derada reduz o risco de elas desenvolverem hipertensão grave.
tes e suas famílias e causam o risco adicional de doença Também há forte sugestão de que pode reduzir o risco de morte
tromboembólica. A hospitalização antenatal freqüentemente perinatal, embora os resultados dificilmente atinjam
é uma experiência perturbadora e estressante, e a adoção des- significância estatística. Da mesma forma que ocorre em rela-
sa conduta aumentou significativamente os custos dos servi- ção aos diuréticos, não há indícios de um efeito sobre a inci-
ços de saúde. Só seria justificada se a prática trouxesse benefí- dência de proteinúria, restrição do crescimento intra-uterino,
cios claros para a saúde. parto pré-termo ou cesariana. A clonidina é semelhante à
A efetividade do repouso no leito na hipertensão não- metildopa na maioria dos aspectos, exceto por um início mais
proteinúrica foi avaliada em três estudos controlados. Infeliz- rápido da ação (cerca de 30 minutos em comparação com 4
mente, esses estudos não apresentam um quadro claro sobre a horas no caso da metildopa).
utilidade dessa prática. Um estudo sugere que a hospitaliza- Os betabloqueadores, incluindo o labetalol, também estão
ção pode ter um efeito benéfico sobre a evolução da pré- bem estabelecidos na prática clínica. Embora haja alguns es-
eclâmpsia, enquanto outro tende a sugerir o oposto. Também tudos em mulheres com doença hipertensiva leve a moderada
há padrões contrastantes na freqüência de parto pré-termo na gravidez, mesmo quando são considerados juntos não há
entre os estudos. informações suficientes para permitir avaliação fidedigna de
Quando há desenvolvimento de proteinúria além de hi- seus efeitos sobre resultados clinicamente importantes ou so-
pertensão na gravidez, os riscos tanto para a mãe quanto para bre o agravamento da doença. A administração de betabloque-
o feto aumentam significativamente. Então, a internação hos- adores reduzirá a incidência de hipertensão grave, mas há su-
pitalar é considerada necessária para avaliação e melhor su- gestão de que pode aumentar o risco de restrição ao crescimento
pervisão, a fim de detectar qualquer agravamento da condi- intra-uterino. Os betabloqueadores são anti-hipertensivos efe-
ção materna ou fetal logo que possível. Não está bem claro tivos, que reduzem o débito cardíaco, e é possível que esse
se a hospitalização deve ser relacionada ao repouso rigoroso efeito seja desfavorável na gravidez, pois a perfusão adequada

Untitled-16 69 25.08.2004, 09:18


70 HIPERTENSÃO NA GRAVIDEZ

da circulação materna e uteroplacentária depende da manu- tantes objetivos na hipertensão gestacional grave é reduzir a
tenção do débito cardíaco elevado da gravidez. pressão arterial a fim de evitar encefalopatia hipertensiva e
Comparações diretas dos betabloqueadores com a hemorragia cerebral na mãe. Por essa razão, o objetivo no tra-
metildopa, a hidralazina e o nifedipino não indicam diferen- tamento de gestantes com hipertensão grave é manter a pres-
ças significativas quanto ao efeito, mas os estudos foram pe- são arterial abaixo de níveis perigosos (abaixo de 170/110
quenos demais para fornecer informações fidedignas sobre a mmHg) e manter volume sanguíneo circulante adequado.
segurança relativa e a eficácia desses agentes.
Estudos randomizados dos bloqueadores dos canais de cál- 4.1 Agentes anti-hipertensivos
cio na hipertensão gestacional, em comparação com placebo A hidralazina é o anti-hipertensivo mais usado para mulheres
ou com betabloqueadores, foram pequenos demais para per- com hipertensão gestacional grave e pré-eclâmpsia, seguida
mitir estimativas úteis de seus efeitos. pelo labetalol e o nifedipino. A metildopa também é usada,
Outra dúvida quanto ao uso de anti-hipertensivos é se existe embora tenha a desvantagem de um início de ação relativa-
qualquer vantagem em se iniciar o tratamento precocemente. Em mente lento (cerca de quatro horas). Os agentes avaliados em
um estudo recente, foi administrada quetanserina, um antago- estudos que comparam os medicamentos incluem hidralazina,
nista seletivo do receptor de serotonina tipo 2, a mulheres com labetalol, antagonistas do cálcio (nifedipino, nimodipino e
hipertensão leve durante a primeira metade da gravidez. Embo- isradipino), diazóxido, prostaciclina, quetanserina e sulfato de
ra o estudo fosse pequeno, houve uma tendência a menor pré- magnésio. A quetanserina foi associada à hipertensão mater-
eclâmpsia nas mulheres submetidas ao tratamento precocemente. na persistente com maior freqüência que a hidralazina. En-
Os pequenos números de mulheres avaliadas em estudos ade- tretanto, todos esses estudos são pequenos, e atualmente não
quadamente controlados de medicação anti-hipertensiva para a há dados para justificar uma forte preferência por qualquer um
prevenção e o tratamento da doença hipertensiva moderada im- dos vários medicamentos disponíveis para tratamento da hi-
pedem conclusões definitivas sobre seus efeitos, mesmo quando pertensão grave na gravidez.
os resultados de todos os estudos são considerados juntos. Parece Portanto, na prática clínica a escolha do medicamento pro-
provável que o tratamento anti-hipertensivo evite o desenvolvi- vavelmente deve depender da familiaridade de um clínico
mento de hipertensão grave na gravidez, e por essa razão pode individual com um medicamento específico. Em geral, os efei-
reduzir o número de internações hospitalares e partos de emer- tos colaterais maternos não são diferentes daqueles fora da
gência. Se for verdade, esse fato pode sozinho reduzir o risco de gravidez, e são descritos em textos de farmacologia. Todos os
parto pré-termo e assim melhorar a evolução do bebê. Não há fármacos usados no tratamento da hipertensão na gravidez
indícios claros de que o tratamento anti-hipertensivo com qual- atravessam a placenta, e portanto podem afetar o feto direta-
quer uma das drogas disponíveis possa adiar ou evitar a ocorrên- mente, por meio de sua ação na circulação fetal, ou indireta-
cia de pré-eclâmpsia proteinúrica ou de problemas associados, mente, por seu efeito sobre a perfusão uteroplacentária.
como restrição ao crescimento fetal e morbidade neonatal. Tam- Pelo que se sabe a respeito dos efeitos adversos diretos e
bém não há boas indicações sobre a segurança desses tratamen- indiretos sobre o feto e o recém-nascido, a hidralazina parece
tos, particularmente no que se refere ao desenvolvimento da cri- ser relativamente segura. O labetalol pode causar bradicardia
ança. A metildopa foi o agente mais estudado. Se for usado um
fetal e neonatal grave e prolongada, particularmente após al-
anti-hipertensivo, esse provavelmente é o agente de escolha, exceto
tas doses. Esses efeitos podem ser clinicamente importantes
no contexto de comparações randomizadas com outros agentes.
na presença de hipoxia fetal e neonatal. Em um pequeno es-
tudo comparando o diazóxido com o labetalol, o diazóxido
3.3 Outros tratamentos
pareceu provocar uma queda súbita da pressão arterial mater-
Pequenos estudos tentaram avaliar a eficácia do magnésio, dos
na e foi associado a aumento do risco de cesariana. Além dis-
precursores das prostaglandinas e de antioxidantes, como as
so, foi descrita hiperglicemia no recém-nascido após tratamen-
vitaminas C e E, no tratamento da pré-eclâmpsia. Os estudos
to materno com diazóxido. Embora esse estudo seja pequeno,
são pequenos demais para fornecer informações confiáveis so-
bre a eficácia ou a segurança dessas condutas. parece prudente evitar esse fármaco e usar uma das outras
opções disponíveis.
Ainda há porém poucas informações clínicas sobre os efei-
4 Pré-eclâmpsia grave e eclâmpsia tos fetais ou neonatais do uso materno de antagonistas do
Embora não atinja o distúrbio básico, o tratamento da hiper- cálcio. Foram observados vários problemas no período
tensão ainda pode beneficiar a mãe e o feto. Um dos impor- neonatal após seu uso em estudos não-controlados, mas es-

Untitled-16 70 25.08.2004, 09:18


PRÉ-ECLÂMPSIA GRAVE E ECLÂMPSIA 71

ses efeitos não poderiam ser atribuídos com certeza à No caso da eclâmpsia, agora há boas indicações de estudos
farmacoterapia materna. randomizados de que o sulfato de magnésio é consideravel-
mente melhor que o diazepam ou a fenitoína para a preven-
4.2 Expansão do volume plasmático ção de outras convulsões. As tendências na mortalidade ma-
As mulheres com pré-eclâmpsia grave freqüentemente apre- terna também favorecem o sulfato de magnésio, embora não
sentam volume plasmático circulante reduzido. Isso levou a sejam estatisticamente significativas. Em comparação com o
uma recomendação de expansão do volume plasmático com diazepam, o uso de sulfato de magnésio não parece estar asso-
soluções colóides ou cristalinas, na tentativa de melhorar a ciado a quaisquer outros efeitos para a mulher ou o bebê. Em
circulação sistêmica materna e uteroplacentária. Alguns es- comparação com a fenitoína, as mulheres tratadas com sulfa-
tudos não-controlados sugeriram que a rápida reposição do to de magnésio também apresentaram melhores resultados,
volume intravascular pode resultar em diminuição da pres- necessitando de menos internações para terapia intensiva, pre-
são arterial em gestantes com hipertensão moderada no ter- cisando de ventilação com menor freqüência e correndo me-
ceiro trimestre ou pré-eclâmpsia. Embora a pressão arterial nor risco de pneumonia. Seus bebês foram menos propensos a
não tenha voltado ao normal com a expansão de volume, esses necessitar de intubação na sala de parto ou de internação em
estudos não-controlados sugerem que tal tratamento pode berçário especial.
ser um adjunto efetivo da administração de medicamentos Ainda há incerteza quanto à utilidade dos anticonvulsivan-
anti-hipertensivos e, reduzindo as doses necessárias, pode- tes para tratamento de mulheres com pré-eclâmpsia. Nos Es-
ria minimizar os riscos de efeitos colaterais maternos e tados Unidos, o sulfato de magnésio parenteral é administra-
neonatais. do a mulheres com pré-eclâmpsia grave, e também pode ser
Entretanto, deve-se ter em mente que a expansão do vo- usado na pré-eclâmpsia relativamente leve ou moderada, em
lume intravascular tem sério risco de sobrecarga de volume, geral durante o trabalho de parto e o parto. Em contraste, um
o que poderia causar edema pulmonar e talvez cerebral em quarto dos obstetras no Reino Unido e na Irlanda nunca usam
mulheres com pré-eclâmpsia nas quais a pressão coloidosmó- anticonvulsivantes profiláticos, e aqueles que o fazem geral-
tica geralmente é baixa. A expansão do volume plasmático mente reservam esses fármacos para casos de pré-eclâmpsia
pode ser particularmente perigosa após o nascimento, quando grave ou fulminante. Quando os anticonvulsivantes são con-
o volume venoso tende a aumentar. Não deve ser usada sem siderados necessários, o sulfato de magnésio agora é uma op-
monitorização cuidadosa. Também, a escolha do agente pode ção popular no Reino Unido, mas o diazepam também é muito
ter grande impacto sobre o resultado. Recentemente ficou usado.
claro que nas pessoas gravemente enfermas a expansão com Quatro estudos controlados com um total de 1.200 mu-
colóide está associada a maior mortalidade do que a não-uti- lheres compararam o sulfato de magnésio ao placebo ou à não-
lização de qualquer expansor plasmático ou a expansão com administração de anticonvulsivante para mulheres com pré-
cristalóide. Embora nenhum desses estudos tenha incluído eclâmpsia, e um pequeno estudo comparou o diazepam oral
gestantes, parece prudente evitar soluções coloidais até que ao não-tratamento. Embora haja indícios promissores de que
haja dados de estudos randomizados em mulheres com pré- o sulfato de magnésio reduz o risco de eclâmpsia, os estudos
eclâmpsia. são pequenos demais para indicar se esse efeito é suficiente-
Não há indícios suficientes de estudos controlados para mente grande para ser clinicamente válido. Também sabe-se
oferecer diretrizes fidedignas para uso de expansão do volume pouco a respeito de quaisquer outros efeitos importantes do
plasmático para tratamento da hipertensão na gravidez. São sulfato de magnésio e sua segurança para a mulher e seu filho.
necessários outros estudos para definir o lugar da expansão do Como em qualquer profilaxia, a maioria das mulheres que
volume plasmático, com ou sem tratamento anti-hipertensivo recebem esse tratamento não desenvolveria eclâmpsia de qual-
adicional, no tratamento de mulheres com hipertensão gesta- quer forma, e portanto é particularmente importante certifi-
cional grave. car-se de que ele traz mais benefícios do que prejuízos. Atual-
mente, um grande estudo internacional está comparando o
4.3 Agentes anticonvulsivantes sulfato de magnésio ao placebo para mulheres com pré-
Os medicamentos anticonvulsivantes são amplamente usados eclâmpsia.
no tratamento da eclâmpsia, assim como na doença hiperten- O sulfato de magnésio não é um medicamento inócuo. Pode
siva grave e na pré-eclâmpsia, na tentativa de evitar a ocor- alcançar níveis letais em virtude da dosagem excessiva ou da
rência de convulsões eclâmpticas. diminuição da excreção (por ex., devido a insuficiência renal).

Untitled-16 71 25.08.2004, 09:18


72 HIPERTENSÃO NA GRAVIDEZ

Como uma superdosagem pode causar morte por parada eclâmpsia. A suplementação de cálcio pode ser útil para mu-
cardiorrespiratória, as mulheres tratadas com sulfato de lheres de alto risco que consomem pouco cálcio.
magnésio devem ser mantidas sempre sob cuidadosa A discussão individual com as mulheres deixará claro que
monitorização, e o cálcio deve ser mantido disponível como uma prescrição de repouso, seja em casa ou no hospital, algu-
antídoto. A monitorização clínica do débito urinário, dos re- mas vezes seria bem-vinda. No entanto, a hospitalização e o
flexos tendíneos e da freqüência respiratória geralmente será repouso no leito são intervenções dispendiosas e invasivas,
adequada, e normalmente não é necessário determinar os ní- ainda sem indicações claras de sua utilidade. Assim, mulhe-
veis séricos. res com hipertensão não-albuminúrica, ou com pré-eclâmpsia
Apenas uma pequena quantidade de magnésio parece atra- leve a moderada, não devem ser forçadas a repousar no leito
vessar a barreira hematoencefálica após a administração in- em casa ou a serem hospitalizadas contra a sua vontade.
travenosa de sulfato de magnésio e praticamente não exerce A medicação anti-hipertensiva para tratamento da hiper-
efeito sedativo. O magnésio atravessa facilmente a placenta, tensão leve a moderada na gravidez impede a elevação adicio-
e já foi demonstrado que altas concentrações de magnésio no nal da pressão arterial. Isso, por sua vez, pode reduzir o nú-
sangue do cordão estão associadas a depressão respiratória do mero de internações hospitalares, induções e partos de emer-
bebê. gência, embora esses efeitos não tenham sido estudados siste-
Há evidências conflitantes sobre os possíveis efeitos de maticamente. Os estudos até hoje foram pequenos demais para
longo prazo da exposição intra-uterina ao sulfato de fornecer informações fidedignas sobre outros resultados im-
magnésio. Estudos de casos-controle sugeriram que ele pode portantes. Atualmente, há indicações insuficientes para ava-
reduzir o risco de paralisia cerebral nos bebês com peso muito liar em que nível de hipertensão os benefícios do tratamento
baixo ao nascimento, uma hipótese que está sendo testada anti-hipertensivo superam as desvantagens.
em estudos randomizados. Entretanto, também há preocu- No tratamento da doença hipertensiva grave, a maioria dos
pação de que a exposição intra-uterina ao sulfato de magnésio agentes parece ser igualmente efetiva na redução da pressão
possa ser prejudicial, particularmente em altas doses. Além arterial, embora haja poucas informações sobre outros possí-
da avaliação dos efeitos do sulfato de magnésio sobre as veis efeitos. As exceções são o diazóxido, que deve ser evitado
mulheres, são necessárias mais informações a respeito dos devido ao risco de hipotensão e cesariana, e a quetanserina, que
efeitos sobre o crescimento e o desenvolvimento das crian- foi associada com maior freqüência à hipertensão persistente
ças a longo prazo. do que a hidralazina.
O sulfato de magnésio é o anticonvulsivante de escolha para
4.4 Conduta intervencionista versus conduta tratamento da eclâmpsia. Na pré-eclâmpsia, os dados são in-
expectante suficientes para avaliar se, em geral, os anticonvulsivantes
No caso de mulheres com pré-eclâmpsia grave antes de 34 profiláticos trazem mais benefícios do que danos. Caso seja
semanas, freqüentemente é difícil decidir sobre o melhor usado um anticonvulsivante, o sulfato de magnésio é a me-
momento do parto. Os riscos do nascimento muito precoce lhor opção, e agora está sendo avaliado em um grande estudo.
devem ser ponderados em relação aos riscos para a mulher e o Em vista dos efeitos promissores dos agentes anti-
bebê se a gravidez continuar por muito tempo. Dois estudos hipertensivos na prevenção do desenvolvimento de hiperten-
compararam uma política intervencionista (parto eletivo pre- são grave, e seu uso disseminado por muitos médicos, há uma
coce) com uma conduta mais expectante entre 28 e 32 ou 34 necessidade urgente de avaliação em grande escala.
semanas. As tendências nesses estudos foram de efeitos bené- Há poucas informações fidedignas sobre a utilidade da ex-
ficos para os bebês nascidos por política expectante, mas com pansão do volume plasmático. Até que haja outros dados dis-
riscos possivelmente maiores para a mulher. Os estudos foram poníveis, caso seja realizada expansão plasmática, deve-se usar
pequenos demais para oferecer uma orientação fidedigna para cristalóide em vez de colóide.
a prática clínica. O tratamento atual dos distúrbios hipertensivos na gravi-
dez parece ser amplamente baseado em experiências clínicas
alimentadas por relatos baseados em observações casuais, e não
5 Conclusões em indicações fidedignas de estudos apropriadamente contro-
Os resultados preliminares com agentes antiplaquetários fo- lados de tamanho suficiente. Devido ao grande número de
ram promissores, mas os dados de grandes estudos recentes não mulheres que desenvolvem doença hipertensiva na gravidez,
apóiam seu uso para a profilaxia de rotina contra a pré- devem ser realizados estudos colaborativos multicêntricos

Untitled-16 72 25.08.2004, 09:18


FONTES 73

envolvendo números muito maiores de mulheres do que os


estudados até agora. Esses poderiam avaliar os efeitos dos vá-
rios tratamentos usados de forma mais fidedigna do que foi
feito até agora.

Fontes
Effective care in pregnancy and childbirth
Revisões pré-Cochrane

Biblioteca Cochrane

Outras fontes

Untitled-16 73 25.08.2004, 09:18

Você também pode gostar