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Utilização de Ligninas em Resinas Fenólicas.
T
1. Preparação de Novolacas a Partir de
I
Lignossulfonatos*. G
Fernando dos Santos e Antônio Aprígio S. Curvelo
O
Resumo:: Este trabalho descreve uma utilização mais nobre para a lignina obtida de processos industriais de T
polpação. Foram preparadas resinas fenólicas tipo novolaca, utilizando-se lignossulfonato de amônio e
lignossulfonato de sódio (com diferentes teores de açúcares residuais) como correagentes, em substituição É
parcial ao fenol. As resinas foram preparadas mantendo-se o processo utilizado industrialmente. As resinas
foram caracterizadas por análises químicas, quanto à distribuição de massa molar e análises térmicas. As C
resinas preparadas com lignossulfonatos apresentaram maior reatividade com hexametilenotetramina (agen-
te de reticulação). Isto é uma vantagem, pois pode-se ter ciclos de moldagem de peças mais curtos, o que N
economicamente é favorável.
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Palavras-chave:: Lignossulfonato, resina fenólica, novolaca. C
O
Introdução A madeira e outros materiais lignocelulósicos são
matérias-primas formadas de fibras em múltiplas ca- C
O uso de matérias-primas não renováveis, por si madas, ligadas entre si por forças interfibrilares e pela
só limita qualquer processo industrial, quer pelo sim- lignina que age como ligante. Para a separação dessas I
ples esgotamento das reservas naturais e/ou pelo ele- fibras, unidas por forças coesivas intermoleculares, é
vado custo de aquisição e transporte, necessariamente necessário despender uma certa quantidade de ener- E
crescentes em função da limitação de estoques. gia. Os processos de polpação podem ser definidos
A alternativa mais viável para geração de com- como sendo processos de separação das fibras dos N
postos orgânicos é a utilização de biomassa vegetal materiais lignocelulósicos mediante a utilização de
derivada de plantas de rápido crescimento (até 10 energia química e/ou mecânica, sendo que a polpação
T
anos) as quais podemos considerar como recursos
naturais renováveis. Nesta categoria podem ser clas-
química é a mais extensivamente utilizada para pro-
dução de diferentes tipos de polpas celulósicas. Nes-
Í
sificadas as árvores oriundas de reflorestamento, as
gramíneas, as plantas anuais (por exemplo, a cana-
ses processos a madeira é tratada com reagentes
químicos específicos que degradam tanto as polioses
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de-açúcar e bambu) e os resíduos ou subprodutos da como as ligninas, produzindo derivados solúveis no I
agricultura intensiva. licor de cozimento[1]. Portanto, as tecnologias de
C
Fernando dos Santos e Antônio Aprígio da Silva Curvelo, Instituto de Química de São Carlos - Universidade de São Paulo, C.P. 870, São Carlos, CEP:
13560-250, São Paulo, SP.
*Dedicado ao Prof. Edson Rodrigues por ocasião de seu 70º aniversário
O
Polímeros: Ciência e Tecnologia - Jan/Mar - 99 49
polpação química têm por objetivo fracionar a madei- fratários; fricção (lonas e pastilhas de freio); colas
ra em seus componentes estruturais (celulose, para madeira; fundição (blocos de motores e polias);
hemiceluloses ou polioses e ligninas) da maneira mais tintas, vernizes e esmaltes; compostos de moldagem
eficaz e econômica[2]. Os principais processos quími- ou pós de moldagem (peças em geral para a indústria
cos de polpação, atualmente em operação industrial, automobilística e eletro-eletrônica)[7].
são os processos kraft e sulfito. A literatura dos últimos 20 anos vem descreven-
As polpas celulósicas constituem o produto comer- do a possibilidade técnica da utilização da lignina em
cialmente mais importante obtido nos processos de novos materiais. Na síntese de resinas fenólicas em
polpação, sendo as ligninas o subproduto mais abun- meio alcalino (resol), já é bastante conhecida a utili-
dante. Com uma produção mundial de aproximada- zação de ligninas[8-11] para fabricação de colas de
mente de 1,2 x 108 ton/ano de polpa, a produção de madeira na confecção das placas de compensados e
lignina pode ser estimada em 5,0 x 107 ton/ano, sendo aglomerados. Alguns trabalhos utilizando ligninas
que apenas 2% da lignina contida nos licores de organossolve de bagaço de cana-de-açúcar na síntese
cozimento são isoladas e empregadas na preparação de resóis foram desenvolvidos no Brasil[12-14].
de produtos comerciais[3]. Os licores produzidos nos As resinas fenólicas obtidas sob catálise ácida –
processos de polpação kraft contém ainda uma grande novolaca- são polímeros termoplásticos em um pri-
quantidade de compostos inorgânicos, os quais são meiro estágio, tornando-se termofixas após adição de
recuperados pela concentração e queima dos licores um agente de cura em um segundo estágio do proces-
de cozimento, sendo a lignina o combustível do pro- so de fabricação. A produção de novolacas a partir da
cesso de recuperação. O calor de combustão da lignina incorporação da lignina é ainda pouco estudada, exis-
gera em torno de 25 MJ/kg e o custo desta energia é tindo poucos dados na literatura[15-17] em relação à pre-
estimado em US$ 2.00/GJ, o que corresponde a apro- paração e caracterização físico-química das mesmas.
ximadamente US$ 0.05 por quilograma de licor; valor O objetivo principal deste trabalho foi a prepara-
este inferior ao custo estimado para a recuperação da ção de resinas fenólicas utilizando-se lignossulfonatos
lignina (US$ 0,11 por quilograma)[4]. em substituição parcial do fenol, que é proveniente
A maioria dos produtos à base de lignina é deri- de um recurso fóssil e portanto não renovável. A via-
vada de lignossulfonatos produzidos pelos processos bilidade desta substituição foi estudada utilizando-se
de polpação sulfito ou a partir da sulfonação das diferentes quantidades e tipos de lignossulfonatos,
ligninas produzidas pelos processos kraft. Enquanto determinando-se a alteração que estes provocaram nas
o processo kraft opera necessariamente em meio bá- características dos produtos obtidos.
sico, a polpação sulfito pode ser realizada em meio Considerando-se que lignossulfonatos com dife-
ácido, neutro ou alcalino, em função do reagente uti- rentes teores de açúcares residuais podem apresentar
lizado no processo. Em meio ácido utiliza-se sulfito características distintas, foi estudado o efeito dos mes-
(bissulfito) de cálcio e em meio neutro sais de mos nas propriedades finais das resinas fenólicas. As
magnésio; sais de sódio e de amônio podem em prin- ligninas e as resinas utilizadas foram caracterizadas
cípio, ser utilizados em qualquer meio (ácido, neutro por diferentes técnicas analíticas: cromatografia de
ou básico). Os lignossulfonatos são em geral recu- exclusão por tamanho (SEC), análise térmica (TG e
perados por processos de secagem por atomização DSC), análises de controle de processo, tais como teor
(Spray Dryer), estando portanto “contaminados” pela de formaldeído livre, fluidez, temperatura de amoleci-
presença de diferentes açúcares provenientes dos mento e análises do produto acabado, como teor de
polissacarídeos existentes na madeira. O teor de açú- fenol livre.
cares pode ser reduzido por tratamentos oxidativos
aplicados ao licor antes do processo de secagem[5].
O Brasil possui cerca de vinte fabricantes de re- Experimental
sinas fenólicas, sendo que a produção é relativamen-
te baixa, quando comparada aos grandes produtores
Matérias-primas
(EUA e Japão)[6]. Estas resinas podem ser aplicadas
nos seguintes segmentos: abrasivos (rebolos, discos Os dois lignossulfonatos utilizados nesse experi-
de corte e lixas); impregnação (elementos filtrantes, mento foram cedidos por MELBAR Produtos de
separadores de bateria e componentes elétricos); re- Lignina Ltda, sendo: um lignossulfonato de amônio
H+
+ HOCH2OH H3CO
- H2O OH
H3CO H3CO CH2OH H3CO CH2 OCH3
- H2O
OH OH OH OH
OH HCOH
HC-SO3
OH 2 HCOH
-H2O HC-SO3 - H2O
H 3 CO
HC OH
-H2O C
H 3 CO
HC-SO3- OH C
C HC SO3H
HCOH C
HC-SO 3 - HC SO2 OCH3
OH OH
H3CO CH2
HC OCH3
OH OH HCOH
HC-SO 3
- HC-SO 3 - H3CO
OH
HMTA
alifático. Em ambos os casos, o rompimento destas metileno-glicol e adição deste às posições livres no
ligações ocasiona uma correspondente diminuição da anel aromático do lignossulfonato. A utilização de
massa molar média dos lignossulfonatos. ligninas (e do próprio lignossulfonato) em meio áci-
do pode levar também a participação da cadeia late-
ral nas reações de substituição. A presença de grupos
Resinas
metoxila nos anéis aromáticos permite, igualmente,
Resinas tipo novolaca são obtidas através da a ocorrência de substituição nas posições meta (rela-
catálise ácida e com limitação estequiométrica de tivas as grupos hidroxila) devido aos efeitos
formaldeído. As resinas novolaca possuem poucos orientadores dos grupos metoxila, que em meio áci-
grupos metilóis-fenóis (hidroximetilfenóis) reativos do são similares ao da hidroxila não dissociada.
em sua estrutura, sendo incapazes de se condensar Deve-se observar que o carbono α da cadeia late-
entre suas moléculas se não houver aquecimento e a ral de uma fração das unidades fenilpropânicas do
presença de agente de cura ou de endurecimento. lignossulfonato está ocupado com o grupo sulfonato.
Possuem massa molar entre 500 e 5000 g/mol e tem- Na reação de formação de resinas novolacas, o grupo
peratura de transição vítrea (Tg) situada entre 45 e sulfonato e os carbono α e β da lignina e o for-
70ºC, sendo sólidos quebradiços à temperatura am- maldeído são, portanto, centros eletrofílicos e o fenol
biente[7]. e o anel aromático da lignina, centros nucleofílicos.
As estruturas aromáticas fenólicas são centros Segundo Allan[10], que estudou a preparação de
nucleofílicos menos ativos em pH ácido, devido à resinas fenólicas tipo resol, a mistura de lignos-
protonação do grupo hidroxila. Em compensação, o sulfonato, fenol e formaldeído não incorpora uma
formaldeído protonado (na forma de metileno-glicol), quantidade substancial de lignossulfonato, porque o
dá origem a um íon carbônio e proporciona a ocor- fenol e formaldeído reagem rapidamente, enquanto
rência de uma substituição eletrofílica aromática nas o lignossulfonato reage mais lentamente. O produto
posições 2, 4, ou 6 do anel aromático. final então seria um resol diluído com lignossulfonato
O mecanismo de reação de resinas fenólicas tipo que não reagiu. A alternativa encontrada por esse au-
novolaca, utilizando lignossulfonatos como reagente tor para preparar resóis com lignossulfonatos foi a
(Figura 2), é similar ao mecanismo operante quando reação com fenol em meio ácido, na qual acontece a
se usa apenas fenol. Consiste na protonação do fenolação do lignossulfonato (através da cadeia late-
polímeros de maior massa molar (acima de 10 ané is resinas com características finais similares à resina
fenólicos ligados por pontes metilênicas), têm-se a não modificada.
formação de ramificações. Simulações computacionais No presente trabalho as quantidades dos reagentes
revelam que 2 ramificações podem ser formadas para e o processo foram mantidos obtendo-se resinas com
10 unidades fenólicas e 3 ramificações podem ser for- propriedades finais diferenciadas (Tabela 1). Para que
madas para 15 unidades fenólicas[7]. as características finais das resinas fossem mantidas,
A razão molar fenol/formaldeído utilizada neste o processo deveria ser alterado e as quantidades de
trabalho foi de 1:0,625, empregando o método de formaldeído diminuídas, sendo esta redução mais
adição controlada de formaldeído. Quando se adicio- acentuada para Rexilex SD do que para Rexil III que
na formaldeído aos poucos, também pode-se obter possui maior teor de açúcares (a presença de açúca-
um polímero com cadeias mais lineares. Em síntese, res diminui a massa de material reativo – lignina). O
o fato da reação de condensação ser mais rápida que mesmo tempo de reação para as resinas com
a reação de adição de formaldeído ao fenol e a defici- lignossulfonatos resultou num produto com fluidez
ência momentânea de formaldeído em estágios mais menor (“flow” mais curto) devido à alta reatividade
avançados da condensação, faz com que haja uma dos grupos metilóis-fenóis presentes.
predominância da reação de crescimento da cadeia. A análise do grau de fluidez, nos fornece infor-
Esta razão molar (fenol/formaldeído 1:0,625) foi ado- mações quanto à linearidade da molécula, quanto à
tada porque os lignossulfonatos participam como reatividade da resina com o agente de entre-
“macromonômeros” nesta reação e proporcionam o cruzamento (HMTA) e quanto à presença de com-
mesmo grau de condensação que o obtido para a re- postos de baixa massa molar (por exemplo, fenol e
sina que utiliza apenas fenol. água). O grau de fluidez e o tempo de cura das resi-
No intuito de obter cadeias com linearidade si- nas com lignossulfonatos são menores do que para a
milar à resina sem lignossulfonato, foi adotada a adi- resina que utiliza apenas fenol, indicando que a resi-
ção controlada de formaldeído. O lignossulfonato na Rexilex SD é mais reativa que Rexil III e mais
participa de reações de adição de formaldeído ao anel ainda que a fenólica. Isto se deve ao fato da maior
fenólico (nas posições orto desimpedidas –sem quantidade de metilóis-fenóis em Rexilex SD. O grau
metoxilas- e posições meta) e reações de adição de de fluidez é menor para as resinas com lignos-
fenol à cadeia lateral. Estes fatos contribuem para uma sulfonatos que para a resina que utiliza somente fenol,
resina mais ramificada. Controlando o formaldeído, também pelo fato do lignossulfonato, por apresentar
temos a predominância das reações de adição de fenol a estrutura de um “macromonômero”, aumentar a
na cadeia lateral do lignossulfonato e da reação de viscosidade das resinas.
condensação entre os grupos metilóis-fenóis forma- Considerando que a presença de fenol e a possí-
dos pela reação de adição de formaldeído tanto ao vel maior ramificação da cadeia levariam a um maior
fenol como ao lignossulfonato. grau de fluidez, o aumento na reatividade de Rexilex
Dependendo do produto desejado pode-se alterar SD foi significativo para diminuir o valor do grau de
a quantidade dos reagentes e o processo para obter fluidez. Este fato foi comprovado por SEC que indi-
resinas com características finais similares às da re- ca a presença de grupos metilóis-fenóis reativos em
sina não modificada, ou manter a formulação e o pro- maior quantidade que a resina fenólica sem lignos-
cesso originais de modo a se obter uma resina com sulfonato. É conveniente lembrar que o cálculo da
propriedades finais diferenciadas. massa molar média das resinas estão parcialmente
Keslarek[16] alterou a formulação e processo na alterados pelo pico dos metilóis-fenóis, pelo fato do
síntese de resinas fenólicas tipo novolaca, utilizando mesmo estar sobreposto ao intervalo de eluição da
lignina de bagaço de cana-de-açúcar, obtendo assim, resina.
Conclusões