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Atualmente, tem-se observado uma intensa preocupação com o número crescente de pessoas que
vêm sofrendo transtornos de humor, que incluem os transtornos depressivos e bipolares, os quais
podem interferir seriamente no dia-a-dia e na qualidade de vida dos indivíduos afetados
(TAYLOR, 1992). O estudo tem por objetivo demonstrar a relevância da Sistematização da
Assistência de Enfermagem no tratamento de pacientes com transtorno de humor. É uma pesquisa
descritiva com abordagem qualitativa, realizada com um paciente com depressão no período de
setembro à dezembro de 2003, na qual os dados foram coletados de acordo com as fases da
sistematização: Histórico (Anamnese e Exame Mental), Diagnósticos, Planejamento, Intervenções
e Evolução. Identificaram-se variados Diagnósticos de Enfermagem, com uma predominância
daqueles incluídos no Padrão Sentir; sendo, em seguida, executadas diversas intervenções de
enfermagem, de modo que contemplassem aquelas necessidades encontradas, constatando-se
primeiramente um alívio nos sintomas e posteriormente, uma melhora geral no quadro do paciente.
Conclui-se, portanto, a relevância de ser utilizada de forma mais abrangente a Sistematização da
Assistência de Enfermagem, a fim de contribuir para o restabelecimento de pacientes que vêm
sofrendo transtornos de humor.
Palavras-chave: depressão, sistematização, enfermagem
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ABSTRACT
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SISTEMATIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM AO
1. INTRODUÇÃO
Atualmente, tem-se observado uma intensa preocupação com o número crescente de pessoas
que vêm sofrendo transtornos de humor, assim chamados por afetar o humor, o estado emocional
interno de uma pessoa; que incluem os transtornos depressivos e bipolares. Kaplan e Sadock1
definem transtornos de humor como um grupo de condições clínicas caracterizadas por uma
perturbação no humor, uma perda daquele senso de controle e uma experiência subjetiva de grande
um grau profundo de alegria ou tristeza aparentemente não relacionado com estímulos externos, de
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longa duração; podendo, assim, interferir seriamente no dia-a-dia e na qualidade de vida dessas
pessoas 2.
predomínio anormal de tristeza, com perda do interesse por atividades anteriormente consideradas
Todas as pessoas, de qualquer faixa etária, homens ou mulheres, podem ser afetadas, porém
sabe-se que as mulheres são duas vezes mais afetadas que os homens. As razões podem incluir
variados estresses, partos, efeitos hormonais etc1. Em crianças e idosos a doença tem
características particulares.
As causas de depressão são múltiplas, de maneira que somadas podem iniciar a doença.
cerebrais) somados a fatores ambientais, sociais e psicológicos, como: estresse, estilo de vida,
acontecimentos vitais, tais como crises e separações conjugais, morte na família, climatério, crises
Na depressão a intensidade do sofrimento é intensa, durando a maior parte do dia por pelo
menos duas semanas, nem sempre sendo possível saber porque a pessoa está assim. O mais
importante é saber como a pessoa se sente, como ela continua organizando a sua vida (trabalho,
cuidados domésticos, cuidados pessoais com higiene, alimentação, vestuário) e como ela está se
eficaz.
Como já foi dito, os principais sintomas da depressão são: o humor deprimido e a perda do
negam a existência de tais sentimentos, que podem aparecer de outras maneiras, como por um
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sentimento de raiva persistente, ataques de ira ou tentativas constantes de culpar os outros, ou
mesmo ainda com inúmeras dores pelo corpo, sem outras causas que as justifiquem1 .
diminuição do apetite, ou mesmo o oposto, seu aumento, havendo perda ou ganho de peso. Em
relação ao sono, pode ocorrer insônia, com a pessoa tendo dificuldade para começar a dormir, ou
acordando no meio da noite ou mesmo mais cedo que o seu habitual, não conseguindo voltar a
dormir2. São comuns ainda a sensação de diminuição de energia, cansaço e fadiga, injustificáveis
sentirem sem valor, culpando-se em demasia, sentindo-se fracassadas até por acontecimentos do
passado. Muitas pessoas podem ter ainda dificuldade em pensar, sentindo-se com falhas para
exagerando os efeitos de suas possíveis decisões erradas. É comum a pessoa pensar muito em
morte, em outras pessoas que já morreram, ou na sua própria morte. Muitas vezes, há um desejo
suicida, com tentativas de se matar, achando ser esta a única solução para o sofrimento. Esse
aspecto faz com que a depressão seja uma das principais causas de suicídio, principalmente em
pessoas deprimidas que vivem solitariamente. A própria tendência a isolar-se é uma conseqüência
da depressão, a qual gera um ciclo vicioso depressivo que resulta na perda da esperança em
A depressão pode afetar seriamente qualidade de vida da pessoa. Para o indivíduo afetado,
torna-se difícil iniciar o dia, pelo desânimo e pela tristeza, cuidar das tarefas habituais pode tornar-
se um peso: trabalhar, dedicar-se a uma outra pessoa, cuidar de filhos, entre outros afazeres ,podem
sintomas. Dessa forma, o relacionamento com outras pessoas pode tornar-se prejudicado:
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desinteresse por amizades e por convívio social podem fazer o indivíduo tender a se isolar, até
dos problemas que a doença traz. Pode haver depressões leves ou pode haver depressões bem mais
leves ou mais graves necessitam de tratamento, seja ele medicamentoso (com medicações
com transtorno de humor. Dessa forma, decidimos realizar esse estudo de caso.
2.OBJETIVO
3. METODOLOGIA
- SUJEITO DO ESTUDO
Participou da pesquisa um senhor, identificado com transtorno de humor, o qual havia sido
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A pesquisa foi realizada no período de setembro à dezembro de 2003, por meio de encontros
semanais na própria residência do sujeito em estudo, na qual foram coletados os dados a partir da
complementado pela observação livre dos aspectos apresentados pelo participante durante a
entrevista.
prioridades daquele paciente e, por fim, executadas as intervenções. Ao final da sistematização, foi
realizada uma avaliação do estado geral do paciente, na qual observa-se a evolução do quadro.
diretrizes das pesquisas que envolvem seres humanos. O participante do estudo foi informado
4. DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
outubro de 1911, 92 anos, sexo masculino, pele cor morena, reside na Aldeota num apartamento
com 6 cômodos; mora com uma filha e duas netas, respectivamente: M.C. 54 anos, P., 23 anos, I.,
Ceará. Sua mãe nunca fez acompanhamento pré-natal. É o terceiro de 3 filhos. Na infância, refere
ter brincado como uma criança normal, apesar de ter passado por muitas necessidades, dentre elas
a fome.
Com apenas 7 anos de idade, mudou-se para Fortaleza para estudar e ter melhores
oportunidades, porém só estudou até a 5ª série. Durante esse período, foi criado por um tio, uma
pessoa que ele afirma ter marcado sua vida, por toda a dedicação que ele o proporcionou. O pai
faleceu cedo, e a mãe depois de muitos anos, mudou-se para Fortaleza também.
Começou a trabalhar com 16 anos numa empresa como office-boy, foi-se destacando cada
vez mais até atingir o cargo de diretoria dessa mesma empresa. Casou-se com 31 anos e teve 7
filhos, cinco homens e duas mulheres. Eles não estão muito presentes na vida do Sr. J. e ele se
sente muito isolado por isso. Afirma ter tantos netos e bisnetos que até já perdeu a conta, porém
mal o visitam.
Com o passar dos anos, teve de ser submetido à cirurgia de catarata e cirurgia de próstata.
No ano do 2002, sofreu uma grande perda, da sua esposa ( L., 85 anos), depois de 60 anos
de casados; uma morte muito sofrida na qual L. passou um ano em pré-coma, a família teve de
vender vários bens para pagar os custos do tratamento, houve uma verdadeira crise na família tanto
financeira como nas relações afetivas, e tudo isso contribuiu para que o senhor J. se sinta muito
triste, abalado, inconformado. Relatou sentir muita solidão e isolamento, já que sua filha passa o
dia trabalhando e suas netas passam o dia na faculdade. J. fica o dia inteiro em casa sozinho com a
empregada, fez um verdadeiro santuário com os santos de que sua esposa era devota no antigo
quarto do casal (e que, atualmente, dorme o senhor J. e sua filha M. C.), relata que várias vezes ao
dia fica rezando em frente ao santuário junto às fotos da sua ex-esposa, recusa-se a sair de casa, e
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não sentir mais vontade de viver, comentava que a vida havia perdido o sentido e que ele, naquela
idade, não poderia ter mais nenhuma expectativa. Chorou várias vezes ao citar a morte da ex-
esposa.
Percebe-se claramente que o senhor J.se sente muito culpado pelo fato de “ter usufruído
muito bem da sua juventude” e ter causado muito sofrimento à sua ex-mulher. Ele é ex-fumante,
sentimento de dor e para a não-superação da morte da sua ex-esposa. Além disso, a morte dela fez
com que J. “abrisse os olhos” para a proximidade em que ele também se encontra do fim, como se
ele ainda não houvesse pensado no assunto até aquela morte do ente querido.
desde a morte da esposa, e também toma remédio para pressão alta (Nifedipina- Adalat). Mesmo
com o uso do ansiolítico, apresenta ciclos de sono perturbado e disse acordar várias vezes durante
a noite.
5. EXAME MENTAL
1. Aparência geral
a) Aparência
Cabelos brancos pintados de cor preta, sem sujidade, pele higienizada, barba por fazer, peso
2. Fala
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Expressava-se articulando bem as palavras, com velocidade normal, falando mesmo sem ser
solicitado.Com frases longas e com seqüência lógica, num tom de voz um pouco acima dos
parâmetros de normalidade.
3. Humor e afeto
vezes ao relatar todo o processo de morrer da sua esposa e ao lembrar dos momentos passados
juntos.
4. Pensamento
a) Forma de pensamento
A forma de pensar do cliente era lógica, coerente e compreensível. Não havia afrouxamento de
b) Conteúdo
Ao ser questionado sobre sua vida atual e seus planos, afirmava não ter mais planos, nem
5. Memória
O cliente apresentou os quatro tipos de memória: remota, para eventos passados recentes, para
6. Inteligência
Satisfatória.
7. Julgamento e Insight
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Total conscientização acerca dos seus problemas, mas não consegue superá-los sozinho. Não
aceita ajuda.
6. DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
* Sentimento de pesar disfuncional relacionado à perda real ou percebida de objeto( p. ex. pessoas)
destruição súbita da própria casa ou comunidade, ameaça séria ou lesão da própria pessoa ou de
seres amados.
de morrer.
* Isolamento Social relacionado às alterações no estado mental e fatores que contribuem para a
* Padrão de sono perturbado relacionado à depressão, solidão, tristeza, perda do parceiro de sono,
7. PLANEJAMENTO
forma, foi estabelecido como prioridade o seguinte plano assistencial: aumentar a auto-estima do
participante do estudo, de modo que ele possa voltar à vida normal, valorizando e vendo um
sentido no viver, como também fazê-lo entender que a morte faz parte do ciclo natural da vida; e
8. INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
- Ensinar as etapas normais do luto e auxiliar a pessoa a reconhecer em que etapa está
estabelecimento de metas).
raiva ou da tristeza)
- Auxiliar a identificar as atividades que tenham sido ignoradas ou abandonadas desde a perda.
- Proporcionar oportunidades para que o paciente se envolva em tarefas que ajudem a aliviar os
sentimentos de culpa.
vítima.
pensa ou vê a si mesma.
- Ensinar a pessoa sobre os recursos comunitários disponíveis (centros de saúde mental, grupos de
auto-ajuda...).
9. EVOLUÇÃO
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O paciente foi acompanhado durante 2 meses em média três vezes por semana, sua auto-
estima e vida social eram analisados freqüentemente, sendo observado inicialmente uma certa
relutância do paciente em cooperar com as intervenções prestadas. Porém, aos poucos, fomos
presenciando uma maior participação, o qual foi essencial para a adequada execução das
intervenções. A análise era feita por meio da observação do humor do paciente no decorrer dos
dias, a sua aceitação em se reintegrar à vida social e a admissão dos fatos tristes em sua vida,
admitindo que eles acontecem e fazem parte do ciclo biológico do ser humano.
10. CONCLUSÃO
Como pôde-se observar, foram encontrados mais de 10 diagnósticos de enfermagem, com uma
necessidades não atendidas, ou seja, um estado indesejável no indivíduo. Sendo assim, foram
melhora efetiva no quadro geral do paciente: aumento da sua auto-estima, alívio dos sintomas e
uma gradual reintegração à vida social. Conclui-se, assim, a relevância de ser utilizada de forma
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3. ALMEIDA, O.P.; DRATEU, L.; LARANJEIRA, R. Manual de Psiquiatria. Rio de
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