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A autora relata que nas reuniões da revista feminista Nós, Mulheres, fundada em 1976, já
havia fissuras entre as feministas com relação à temática lésbica (1990). Nos anos oitenta,
Moraes (1996) considera que dois eventos foram paradigmáticos em relação a esse assunto: o
Congresso Feminista de Valinhos, em 1980, e o 3º Congresso da Mulher Paulista, em 1981. A
partir daí, as lésbicas teriam começado a consolidar a participação delas dentro do movimento.
A resistência por parte das feministas pode ser entendida dentro de
um quadro teórico mais amplo. Há uma enorme discordância entre teóricas do
chamado feminismo radical e daquelas envolvidas com a teoria queer, muitas
vezes chamadas de transfeministas.
Os argumentos para a inclusão de travestis e mulheres trans podem
ser encontrados no documento que tais ativistas fizeram circular antes do
encontro e que ainda hoje podem ser utilizados no debate travado entre as
transfeministas e as feministas radicais.
O documento Por que queremos a abertura dos Encontros
Feministas às Pessoas Trans é composto de seis pontos que justificam a
inclusão desta demanda e, ao mesmo tempo, permitem uma reflexão acerca do
movimento feminista. O primeiro ponto do documento afirma que o feminismo é
um movimento social e, dessa forma, ser feminista dependeria de ações e
idéias e nunca de anatomia. O terceiro ponto nos lembra de que há homens,
pessoas trans e mulheres com visão feminista de mundo, não sendo
prerrogativa daquelas que possuem uma vagina.
O segundo ponto diz respeito às identidades. Se gênero é uma
construção e se as identidades são auto-definidas e políticas, alguém que se
define como mulher torna-se mulher, sem que ninguém possa dizer o contrário.
O quarto ponto retoma a questão da identidade, trazendo a reflexão de que
várias travestis e mulheres trans reforçam os estereótipos de gênero e muitas
outras os questionam (e o que o mesmo ocorre entre as cisgêneros).
Os últimos pontos do documento (5 e 6) abordam a necessidade de
espaços abertos à diversidade e de um feminismo mais plural.
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O ativismo digital utiliza os termos radfem (feminista radical) e transfem (transfeministas).
“(...) o feminismo radical como uma tradição política que
produziu, entre outras coisas, um corpo de textos feministas que
vieram a ser considerados como clássicos..." (Cameron, 2010)
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O livro The Transsexual Empire foi originalmente publicado em 1979 e até hoje serve de
referência às análises feministas radicais.
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Aspas dela.
transexualidade emperra a libertação do individuo e proíbe que ele experimente
vivências diversas.
O movimento #RadFem
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A rede que se formou em torno da hashtag #RadFem2013, no Twitter, é difícil de
compreender e estudar. Alguns recortes são feitos neste trabalho, mas há possibilidade de
perceber que o webativismo que se desenrolou com o episódio traz novos desafios para o
O movimento #RadFem2013 trouxe visibilidade às ideias e
manifestos de um grupo que se coloca como uma vertente radical do
feminismo, baseado na segunda onda, que combate a pornografia, a
prostituição e etc. Através do twitter, a hashtag em questão provocou um
“racha” com as webativistas feministas que se posicionam a favor da inclusão
das transexuais, apoiando e divulgando textos transfeministas.
De acordo com as ativistas do Deep Green Resistance6, as mulheres
trans não podem alegar que perderam os privilégios masculinos, pois os efeitos
da socialização masculinas são imutáveis. Tentam, dessa forma, evitar
acusações de que seriam biologizantes e essencialistas. Se a transexualidade
é cada vez mais entendida pelo viés sociológico, é, também, sociologicamente
que a crítica das feministas radicais está sendo feita.
O relato de Transcultist, uma transexual e ativista que milita ao lado
das feministas radicais, em seu tumblr ilustra a impossibilidade das mulheres
trans lutarem nas fronteiras do feminismo de maneira igualitária:
estudo dos movimentos sociais, uma vez que não há coesão entre as propostas e os membros
de determinada corrente se agrupam e rompem uns com os outros de maneira contínua.
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Grupo ecofeminista internacional.
eu acabei desenvolvendo um estranho complexo de
superioridade: Eu me odiava, mas ainda me achava superior
que as garotas do meu círculo social porque eu aceitei a ideia
de que eu era mais inteligente e mais bonita que elas.
(TRANSCULTIST, 2013)
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Não há um consenso sobre o uso da palavra, mas o webativismo feminista encampa a ideia
das transfeministas a fim de chamar a atenção para a estigmatização dos “tipos” transgêneros.
Além da inescapável socialização masculina, as feministas radicais
se incomodam com o fato de que as transexuais reforçam estereótipos
femininos, que elas combatem, para realizar suas performances. Para serem
reconhecidas como mulheres, as transexuais exacerbam características
consideradas femininas e estariam, segundo as feministas radicais, reforçando
valores e características que não deveriam ser associados como naturalmente
femininos. Ora, se por um lado as transexuais subvertem a ordem considerada
natural dos gêneros, por outro reforçam a divisão de gêneros através de suas
performances “radicalmente” femininas. Sandy Stone, em seu manifesto “The
Empire Strikes Back”8, diz:
8
Manifesto em resposta ao livro de Janice Raymon: “Transsexual Empire”.
excesso de caracterização feminina ou masculina na tentativa de ser
reconhecida (o).
Conclusões
9
Disponível na página pessoal da autora e em http://iconoclastia.org/2013/06/10/indianara-
siqueira-a-trans-que-pode-mudar-a-lei-brasileira/ Acesso 02/08/2013.
Se Debbie Cameron tem razão e a meta do feminismo radical é a
erradicação dos gêneros enquanto que a teoria queer pretende vê-los
multiplicados, é hora de pensarmos nos efeitos de tais posturas. Talvez a
multiplicidade seja um tipo de erradicação. Ao nos confrontarmos com uma
infinitude de possibilidades estaremos mais perto do fim do sistema binário de
gêneros. Pois talvez seja ele, o sistema binário, que deva ser discutido.
Bibliografia
MORAES, Maria Lygia Quartim de. A Experiência Feminista dos Anos Setenta.
Araraquara: UNESP, 1990.
MORAES, Maria Lygia Quartim de. Vinte Anos de Feminismo. Tese de Livre
Docência. Campinas: IFCH/UNICAMP, 2006.
RESUMO
ABSTRACT
The conflict between identity politics created by the movements (the feminist
and the LGBTT ones) and the identification politics that is currently proposed by
the gender studies, is what we intend to study in this article. To this end, we will
analyze two web-activism movements that have been gaining visibility in social
networks: Transfeminism and Radical Feminism (RADFEM).