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VITÓRIA DA CONQUISTA - BA
2015
ROSANGELA DOS SANTOS MARQUES
VITÓRIA DA CONQUISTA - BA
2015
ROSANGELA DOS SANTOS MARQUES
BANCA EXAMINADORA
Miguel e Anésia
(Meus pais)
Amo vocês!
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora, Professora Dra. Valéria Viana Sousa, pela sua incomensurável
contribuição para meu crescimento pessoal e intelectual. Suas lições de ser humano-
pesquisador são inenarráveis. Somente com uma convivência mais próxima para
compreendermos quão grande é o seu amor, sua dedicação, sua sabedoria e sua presteza em
nos direcionar. Jamais esquecerei esses ensinamentos, que foram tão essenciais e que me
conduziram com mais segurança e estímulo para desenvolver esta dissertação.
Ao meu coorientador, Professor Dr. Jorge Augusto Alves, pelas palavras de incentivo,
pelo exemplo de ordem, dedicação à pesquisa e pelo conhecimento que, humildemente,
transmitiu-me. Uma arte que pertence só aos sábios.
Aos amigos que cultivei durante todo percurso, em especial, Elenita Barbosa, Cristiane
Nogueira e Zélia Alves, anjos de luz em minha vida.
Aos meus irmãos, cunhada e sobrinhos, pelo carinho e, sobretudo, pela confiança
risonha dos olhares cúmplices.
Aos demais familiares, em especial, minha tia Denísia, pelas orações dedicadas a mim.
Aos amigos e colegas de profissão das escolas CMEAS (Centro Municipal de Educação
Agamenon Santana) e EMPRS (Escola Municipal Professor Roberto Santos), que muito me
apoiaram, mormente, à Diretora Cínzia Aglaê, pela amizade e compreensão.
O ensino da gramática é realizado, a rigor, nas instituições escolares, com atenção mais
voltada às atividades prescritivas em que há uma valorização dos aspectos morfossintáticos
em detrimento aos semânticos, pragmáticos e discursivos da língua. Dessa forma, a variação
linguística, tão presente na comunidade de uso, é pouco ou raramente retratada. Concebendo
que é essencial, no ensino de língua materna, o desenvolvimento da competência
comunicativa para que o falante utilize a língua como instrumento de interação social, nesta
dissertação, objetivamos, através da investigação do estudo do verbo e, sobretudo, do modo
imperativo, apresentar uma proposta para o ensino do modo imperativo em uma perspectiva
que, além da morfossintaxe, esteja voltada também às questões de natureza semântica,
pragmática e discursiva. Em análises a livros didáticos da Língua Portuguesa, percebemos que
esse modo verbal, apesar de ser abordado através de gêneros textuais diversos, próximos à
linguagem cotidiana dos discentes, encontra-se ainda aprisionado a uma sistematização
imposta pela tradição gramatical, na qual não é explorada uma infinidade de possibilidades
que podem ser geradas no ato da comunicação/interação, com o propósito de
pedir/solicitar/ordenar. Para comprovar tais afirmações, (i) observamos e analisamos o verbo
e, em particular, o modo imperativo em cinco compêndios da Tradição Gramatical, em cinco
compêndios da tradição linguista, em três coleções de livros didáticos do 6º ao 8º ano; (ii)
aplicamos atividades nas quais os discentes foram incentivados a empregar o modo
imperativo, atentando-se para seus múltiplos sentidos e intenções no ato das várias situações
comunicativas, a fim de verificar o desempenho dos escolares quanto ao uso dos recursos que
a língua lhes disponibiliza. Após essa etapa, (iii) elaboramos uma proposta de intervenção
pedagógica, abordando o modo imperativo, ressaltando a exploração dos aspectos semânticos
pragmático-discursivos para o maior desenvolvimento da competência sociocomunicativa dos
educandos. Nesse sentido, valemo-nos das contribuições de gramáticos e linguistas, com
ênfase na gramática reflexiva e em propostas sugeridas por Travaglia (2009; 2011; 2013) e
por Ferrarezi Junior (2014). Acreditamos na relevância da nossa proposta de intervenção, cujo
objetivo é explorar as habilidades e competências do falante para empregar os recursos
linguísticos, de modo a adaptá-los à produção de sentido e à interação social, e, ainda,
permitir-lhe o acesso ao maior número possível de variedades faladas e escritas de sua língua,
colaborando, assim, para que ele melhor desenvolva a competência sociocomunicativa.
Almejamos, portanto, contribuir para a construção do processo de ensino-aprendizagem mais
significativo, pertinente e eficaz.
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 13
1 UM PERCURSO ENVOLTO PELA LINGUAGEM HUMANA ................................. 17
1.1 CORRENTES DA LINGUÍSTICA ............................................................................. 17
1.2 CONCEITOS E TIPOS DE GRAMÁTICA ................................................................ 26
1.2.1 Gramática Tradicional ou Normativa ............................................................... 28
1.2.2 Gramática Descritiva ......................................................................................... 30
1.2.3 Gramática Internalizada .................................................................................... 32
1.2.4 Gramática Reflexiva........................................................................................... 33
1.3 NORMA E VARIAÇÃO ............................................................................................ 35
2 COLOCAÇÕES E ANÁLISES SOBRE VERBO E MODO IMPERATIVO .............. 40
2.1 GRAMÁTICAS TRADICIONAIS ............................................................................. 42
2.1.1Torres (1972) ....................................................................................................... 42
2.1.2 Cunha (1986), Cunha e Cintra (2013) ............................................................... 43
2.1.3 Luft (1990) .......................................................................................................... 46
2.1.4 Rocha Lima (2007) ............................................................................................. 47
2.1.5 Bechara (2009).................................................................................................... 49
2.2 GRAMÁTICOS DA TRADIÇÃO LINGUÍSTICA ..................................................... 50
2.2.1 Bagno (2011) ....................................................................................................... 51
2.2.2 Neves (2011, 2012) .............................................................................................. 54
2.2.3 Travaglia (2011, 2013) ...................................................................................... 555
2.2.4 Castilho (2012) .................................................................................................... 58
2.2.5 Ferrarezi Junior (2014) ...................................................................................... 60
2.3 LIVROS DIDÁTICOS ............................................................................................... 63
3.3.1 Português Linguagens – Cereja e Magalhães (2012) ........................................ 63
2.3.2 Projeto Teláris – Borgatto, Bertin e Marchezi (2012) ....................................... 70
2.3.3 Vontade de Saber Português – Tavares e Conselvan (2012) ............................. 74
3 METODOLOGIA ........................................................................................................... 78
3.1 A ESCOLA ................................................................................................................ 79
3.2 AS ATIVIDADES ...................................................................................................... 82
3.3 A análise das atividades ........................................................................................ 84
3.4 A proposta de intervenção pedagógica ................................................................. 85
4 UM BALANÇO DO OBJETO DE ESTUDO: USOS DO MODO IMPERATIVO NA
ATIVIDADE APLICADA ................................................................................................. 86
5 UMA NOVA PROPOSTA PARA O ENSINO DO MODO IMPERATIVO ................ 96
5. 1 A RELEVÂNCIA DOS ASPECTOS SEMÂNTICOS, PRAGMÁTICOS E
DISCURSIVOS DA LÍNGUA ......................................................................................... 97
5.2 Sequência didática: o ensino do modo imperativo abordando os aspectos
semânticos, pragmáticos e discursivos ..................................................................... 102
5.3 Relatório da atividade aplicada .......................................................................... 109
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 1223
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 126
ANEXOS .......................................................................................................................... 129
13
INTRODUÇÃO
discentes quanto pelos docentes, somente como um mapa taxonômico de categorias, alheio à
língua em funcionamento. Nas palavras de Matos e Silva (2004, p. 129), a impressão que
temos é de que, para os alunos, “O português são dois; o outro mistério.”
Em relação à classe gramatical “verbo”, a situação não é diferente. A grande maioria,
principalmente dos discentes apresenta ojeriza a esse conteúdo, pois, na prática, o trabalho
pedagógico está voltado quase sempre para a obediência ao seguinte ritual: conceituação,
identificação e flexão verbal. E, nesse ritual, há uma valorização dos aspectos
morfossintáticos em detrimento dos semântico-pragmático-discursivos, e, na aplicação das
atividades, não é considerada, em momento algum, a variação linguística tão presente na
comunidade de uso. Destarte, formas obsoletas são ensinadas não porque pertençam à
realidade do utente da língua, mas porque, um dia, foram empregadas por autores que sempre
estiveram categorizados entre os clássicos.
Por meio de uma metodologia mecanicista, aos escolares, é, a rigor, designada a tarefa
de memorizar, decorar conceitos através de palavras ou frases descontextualizadas, sem a
devida reflexão de seu efetivo uso. O ensino da regra pela regra compromete o
desenvolvimento da capacidade linguística e o interesse por parte dos discentes.
Diante dessa realidade, na condição de docentes de Língua Portuguesa, algumas
questões costumam nos inquietar:
1
Constatamos que “A competência comunicativa implica duas outras competências: a gramatical ou linguística e
a textual” (TRAVAGLIA, 2009, p. 17).
2
A partir do projeto Gramática: verbo numa perspectiva semântica e pragmática, aprovado pelo CEP (
Conselho de Ética em Pesquisa) com o número CAAE 34285214.7.0000.0055, desenvolvemos esta dissertação.
16
No presente texto, temos como finalidade realizar uma breve abordagem sobre os
estudos relacionados à linguagem humana, mais especificamente, sobre as correntes da
Linguística, que analisam os fatos da língua proporcionando conhecimento e reflexões acerca
da sua natureza e de seu funcionamento, através das visões distintas de pesquisadores e
estudiosos dessa área.
Nessa perspectiva, na subseção Correntes da Linguística, discorremos sobre o
Estruturalismo, com o propósito de, a partir das dicotomias língua/fala, sintagma/paradigma,
discutirmos o estudo do verbo, sob o ponto de vista dessa corrente teórica, realizando uma
sucinta abordagem europeia, através de Saussure (2012), e brasileira, através de Câmara Jr.
(2013) Logo após, abordamos o Gerativismo, expondo as ideias de Chomsky (2005) sobre a
linguagem, bem como sua distinção entre competência e desempenho, e como o verbo é visto
nessa corrente; em seguida, apresentamos o estudo da língua em uma perspectiva social, a
exemplo da Sociolinguística e do Funcionalismo. Na subseção Conceitos e tipos de
gramática, apresentamos os conceitos e objetivos das gramáticas Normativa, Descritiva,
Internalizada e Reflexiva para que, após a discussão sobre os tipos de gramática, possamos
mostrar o tipo que melhor dialoga com a nossa proposta de intervenção; e, para finalizar a
seção, trazemos para a discussão os conceitos de Norma e Variação na subseção 1.3,
evidenciando que os fatos linguísticos em uso são maleáveis, adaptáveis às diferentes
situações de uso e que é assim que o ensino do modo imperativo, a nosso ver, precisa ser
conduzido, ou seja, nós docentes de Língua Portuguesa, devemos oportunizar o contato do
discente com práticas significativas para que ele possa produzir e interpretar diferentes
situações de interação nas quais as maneiras de ordenar, aconselhar, solicitar etc.
desencadeiem a produção de sentido no outro.
Desde os tempos mais remotos, muitos são os estudiosos das Ciências Humanas que
procuram investigar e desvendar todos os mistérios que envolvem a linguagem humana.
Como ela surgiu? Como se desenvolveu? O ser humano já nasce com as capacidades prontas
para que a linguagem se realize ou ela emerge em decorrência da vida em sociedade? Tais
questionamentos são relevantes para compreendermos esse fenômeno, que é imprescindível
para a comunicação entre os indivíduos na sociedade.
18
Séculos depois, ainda sem uma definição precisa de qual seria o objeto da ciência que
investiga os fatos da língua, surge, entre os gregos, a gramática, que era um guia para
distinção de formas consideradas certas ou erradas.
Depois aparece a Filologia que, além de estudar fatos da língua, ocupa-se basicamente
com a interpretação de textos, sendo seu método de estudo a crítica textual. Períodos mais
tarde, os estudiosos constatam que as línguas podiam ser comparadas entre si. Assim,
originou-se a Filologia comparativa ou gramática comparada. Posteriormente, nasce a
Linguística propriamente dita, do estudo das línguas românicas e das línguas germânicas.
Consideráveis avanços dos estudos linguísticos ocorreram no final do século XIX e
início do século XX, por influência do linguista suíço Ferdinand de Saussure (1857 – 1913),
cujas ideias deram início ao Estruturalismo na Linguística.
Saussure, em seu Curso de Linguística Geral, focalizou seus estudos no sistema
subjacente da linguagem, ou seja, na língua. O linguista abordou o estudo dos signos
(semiologia), concentrando-se em examinar como os elementos da linguagem se
relacionavam, dentro de uma perspectiva sincrônica, e como se constituíam internamente os
signos linguísticos, que, para Saussure, eram compostos por duas partes: significante (padrão
sonoro, seja na sua projeção mental ou na realização física como parte do ato de falar) e
significado (o conceito ou o que aquela palavra quer dizer). Desse modo, “o signo linguístico
une não uma coisa e uma palavra, mas um conceito e uma imagem” (SAUSSURE, 2012, p.
106).
Por tal visão, o sistema linguístico seria formado por signos, que são resultados de
associações entre um conceito e uma imagem. Para Saussure (2012) “o signo linguístico é
arbitrário” (SAUSSURE, 2012, p. 106), e, portanto, no Estruturalismo, a compreensão é de
que não haja uma motivação natural entre o significado e o significante, ou seja, nessa
19
Assim sendo, a linguagem possui um lado social, representado pela língua, e um lado
individual, representado pela fala. Calvet (2002) avalia, na leitura que faz de Saussure, que,
para este, a língua é criada pela comunidade e é, exclusivamente, na comunidade que ela é
considerada como social. Calvet (2002) também cita Meillet (1866 -1936), que assume uma
posição antissaussuriana, afirma o autor, aborda a língua com um fato social.
Vemos, então, que o tema da língua como fato social, central em Meillet, é
um tema profundamente antissaussuriano, de modo seguramente
inconsciente antes da publicação do Curso, mas consciente depois, e a
história da linguística estrutural pós-saussuriana se caracteriza por um
afastamento constante desse tema. Surge assim, desde o nascimento da
linguística moderna, em face de um discurso de caráter estrutural e insistindo
essencialmente na forma da língua, outro discurso que insiste em suas
funções sociais. E, durante quase meio século, esses dois discursos vão se
desenvolver de modo paralelo, sem nunca se encontrar (CALVET, 2002, p.
17).
sintáticas, levanta-se, com vigor, uma corrente que buscava um modelo teórico formal para
explicar como a linguagem humana se efetivava.
A princípio, o Gerativismo entra em oposição às ideias formuladas pelo Estruturalismo
americano de Bloomfield, cujos limites teóricos não iam além da frase. Ademais, na corrente
Estruturalista defendida por Bloomfileld, influenciada pelo behaviorismo, havia uma defesa
de que a linguagem era externa ao indivíduo, ou seja, o ser humano só adquiriria a linguagem
se fosse estimulado pelo meio social no qual interagia. Para os gerativistas, por sua vez, a
linguagem é compreendida como inata ao ser humano, deste modo, nessa teoria, a
compreensão era de que o indivíduo já nascesse dotado de uma capacidade genética de
produzir linguagem. E, para comprovar esse fato, Chomsky enfatiza a questão da criatividade,
assegurando que todos nós usamos criativamente a língua, a partir do momento que
construímos frases novas. A esse respeito, Kenedy (2013) afirma:
Por isso, todos os falantes são criativos, desde os analfabetos até os autores
de clássicos da literatura, já que todos criam infinitamente frases novas, das
mais simples e despretensiosas às mais elaboradas e eruditas. [...] Chomsky
chegou a afirmar, inclusive, que a criatividade é o principal aspecto
caracterizador do comportamento linguístico humano, aquilo que mais
fundamentalmente distingue a linguagem humana dos sistemas de
comunicação animal (KENEDY, 2013, p. 128).
Nessa perspectiva é que surgiu o primeiro modelo gerativista que ficou conhecido
como gramatica transformacional. Tal modelo apresentava como intuito o propósito de
descrever e explicar como as unidades linguísticas formavam sentenças e como essas
sentenças sofriam alterações quando eram submetidas a regras. Esse entendimento das regras
que promovem a construção de frases gramaticais representava o conhecimento linguístico
armazenado na mente do falante. A esse conhecimento internalizado da língua, que orienta a
organização de frases, Chomsky nomeou de competência linguística, que ele diferenciou de
desempenho linguístico (também chamado de performance ou atuação), que é o uso concreto
da língua, e envolve muitas outras habilidades, como o conhecimento de mundo, o aspecto
emocional, a memória etc.
É interessante registrar que o interesse dos estudos da corrente gerativista, como bem
informa Kenedy (2013), centraliza-se na competência linguística dos falantes, ou seja, o
essencial é o funcionamento da mente, que possibilita a construção de estruturas linguísticas
analisadas nos dados de qualquer corpus de fala. Nessa teoria, há a valorização do falante com
base em sua competência linguística, pois é através dessa, segundo Chomsky, que o indivíduo
consegue interagir em seu meio, empregando a fala e entendendo a língua. Nesse sentido, é
válido ressaltar que Chomsky, assim como Saussure, apresenta posições análogas em relação
ao objeto de estudo da linguística. Ambos não reconhecem o indivíduo, falante concreto da
língua, como sendo essencial dentro das pesquisas linguísticas e abstraem o utente da língua
de seu contexto de uso. Desse modo, a variação linguística está alheia ao Estruturalismo e ao
Gerativismo, haja vista que a língua é, em tais correntes, compreendida como homogênea.
Entre nós, alguns estudiosos, como Mário Perini, defensor e propagador da Linguística
Descritiva, debruçou-se em interpretar a teoria padrão chomskyana, adaptando-a à realidade
da Língua Portuguesa. Em sua obra Gramática Gerativa: introdução ao estudo da sintaxe
portuguesa, Perini (2004) aborda o problema do verbo auxiliar. Para a teoria que esposa,
importa-lhe a passivização, a presença de dois verbos formando uma única oração e a ordem
do auxiliar.
Em meados do século XX, aproximadamente uma década após o surgimento do
Gerativismo, despontam, na linguística, algumas mudanças significativas resultantes da
influência salutar da convivência de diversos pesquisadores para enfrentar as novas realidades
24
vistas no mundo: línguas em contato e diferentes estratos de uma língua em contato. É nesse
período que o estudioso William Labov demonstra seu interesse pelo estudo da língua em
uma perspectiva social, surgindo daí a Sociolinguística.
Verificamos que nessa teoria há a abordagem dos aspectos sociais e culturais da
produção da língua, ou seja, a fala em seu aspecto social e não individual. Sendo assim, para
a Sociolinguística, são fundamentais: o falante, sua fala, o local onde se produz a fala
(comunidade linguística), o momento em que se fala e o modo da fala.
Do ponto de vista teórico, é natural que a língua sofra variação e que seja empregada
de diversas formas, logo, uma criança e uma mulher a utilizam diferentemente de um adulto e
de um homem, respectivamente, um jovem não a empregaria da mesma maneira em uma
entrevista para um emprego e em um bate papo com amigos, entre outras ocorrências. Dessa
forma, a situação comunicativa, a idade, o sexo, a região, a situação socioeconômica e o
estilo, entre outras questões, podem contribuir para a diferenciação da forma de uso da língua.
Nesse sentido, a forma como a língua é falada constitui, efetivamente, o objeto de
estudo da Sociolinguística. Em tal teoria, com essa finalidade, utilizam-se como corpus para
análise entrevistas e/ ou amostragens da língua em situações reais de uso. Cezario e Votre
(2013) sintetizam deste modo o papel do pesquisador da área:
A partir desse ponto de vista, podemos afirmar que, somente, priorizar o aspecto
interno da língua, como língua/estrutura, competência do falante, ideias defendidas por
Saussure e por Chomsky, são insuficientes para explicar fenômenos que se apresentam na
língua em uso, como nos propomos nesta dissertação.
Para explicação dos fenômenos referentes ao verbo, proposta do nosso estudo,
valemo-nos da Gramática de usos do português, de Maria Helena Moura Neves, que tem
como um de seus objetivos orientar o falante comum acerca do uso eficiente dos recursos da
língua. E a base para que seja contemplada a língua em uso é explorar o verbo e o modo
imperativo em duas perspectivas: a unidade maior de funcionamento é o texto; e os itens são
multifuncionais, de modo que os aspectos morfossintáticos e semânticos sejam contemplados.
Analisaremos, dando continuidade ao pensamento que prioriza o estudo da língua em
situações reais de uso, o Funcionalismo, que vem ao encontro da Sociolinguística, à luz,
sobretudo, do Funcionalismo norte-americano de Hopper (1993). Os funcionalistas
concentram suas pesquisas na relação entre a estrutura gramatical das línguas e as diferentes
situações comunicativas de uso da língua. Destarte, compreendemos que analisar um
enunciado atentando apenas para a classificação das estruturas sintáticas pode ser insuficiente
para o Funcionalismo, teoria na qual a linguagem é considerada como um instrumento de
interação social, portanto, a análise da situação comunicativa é relevante em suas pesquisas.
Cunha (2013), em relação a essa afirmação, apresenta dois interessantes exemplos que
refletem um fenômeno relativamente comum no nosso dia a dia sobre as regularidades no uso
interativo da língua. Neles o autor analisa as condições discursivas em que se verifica esse
uso: “a) Você é desonesto e b) Desonesto é você.” (CUNHA, 2013, p. 157). Ao expor as duas
frases, o linguista quer nos mostrar que o enunciado em (b) só faz sentido em uma situação de
interação, na qual o interlocutor produza uma sentença típica de contestação do que foi dito
antes. Assim, somente a análise dos itens linguísticos isolados que compõem esse enunciado
não é suficiente para indicar como são gerados os fatos da língua.
Fica bem claro, então, o que é fundamental para o Funcionalismo: o contexto real de
uso da fala ou da escrita. Logo, frases soltas e descontextualizadas não servem de base para
uma análise de cunho funcionalista. Os enunciados, nessa corrente teórica, devem ser reais e
não ideais, devem ser frutos de uma busca por parte do falante de uma maior expressividade
em um contexto sociocomunicativo. Compreendemos que a língua fica subordinada ao
comportamento social, ou seja, ela será a prova viva de que o falante consegue se adaptar às
diferentes situações de uso para que a comunicação aconteça de forma mais adequada
possível.
26
Tal prática pedagógica, entretanto, deve iniciar-se com pesquisa in loco que deve ser
seguida de elaboração de propostas factíveis em sala de aula a fim de “ressignificar” o ensino
dos recursos semântico-pragmático-discursivos que o aparato verbal oferece ao discente. Essa
ideia é a norteadora de nosso estudo.
verifica a materialização do conservar para não corromper. Pânini redigiu aquela que seria
aceita por muitos historiadores como a primeira gramática a registrar uma língua na história
das civilizações.
Contudo, muitos pesquisadores defendem que o estudo mais formal de uma gramática
eclodiu na Grécia Antiga, como era de esperar, pois, como já registramos neste trabalho, os
gregos se preocuparam em estudar a linguagem humana. E, em uma perspectiva filosófica,
desvendaram a estrutura da língua e decidiram registrá-la em forma de gramática. No entanto,
a filosofia grega não permaneceu imune ao julgamento social de quem escrevia o texto. A
alcunha de “bárbaro”, designando aquele que não falava grego ou usava uma forma não
prestigiada, por exemplo, passou para nossa ideologia gramatical, originando a enumeração
dos vícios de linguagem sob a antonomásia de “barbarismos”.
Ademais, a gramática latina, herdeira dos fundamentos lançados pelos gregos,
aprofundaria os aspectos conservadores da gramática helênica, a ponto de surgir o Appendix
Probi, cuja fórmula de expurgação garantia a pureza da língua: “XXX non”. 3
Já na esfera da Língua Portuguesa, data do século XVI a Grammatica da lingoagem
portuguesa, primeira gramática escrita, publicada em Lisboa, em 1536. Fernão de Oliveira, o
autor, propôs-se a produzir a obra para uma cultura letrada urbana.
A respeito dessa gramática, Perini (2004) reconhece a sua importância e registra o
seguinte comentário:
E em pelo menos uma coisa ela é nitidamente superior a quase todas as suas
sucessoras: Fernão de Oliveira procurou, em todos os momentos, descrever a
realidade linguística que o cercava, em vez de formular prescrições mais ou
menos fantasiosas sobre o que se deve e não se deve dizer. Por exemplo, um
bom foneticista pode reconstituir com muita exatidão a pronúncia da época,
baseando-se nas descrições dadas na Gramática (PERINI, 2004, p. 116 grifo
do autor).
3
A fórmula “XXX non...” apresenta em si a reprovação da forma “correta” e a imediata indicação da forma
“errada”: “speculum non speclum”.
28
outro, limita-se ao caracterizar o que era um “bom” uso da linguagem, forma usada pelas
pessoas da corte, que “bem” empregavam a linguagem, ou o que era um “mau” uso da
linguagem, forma utilizada pelo povo. Subjacente a essa diferenciação, obviamente, estavam
impregnados diversos preconceitos, inclusive o linguístico em um revestimento social.
Logo, frente a essas reflexões, enfatizamos que, neste estudo, não buscamos, de forma
alguma, rejeição a propostas das gramáticas prescritivas, mas, sobretudo, investigar e analisar
o uso do modo imperativo, através de atividades respondidas pelos discentes do 6º ao 8º ano,
à luz de uma descrição linguística, como um meio de ajudar a desenvolver a competência
sociocomunicativa, ampliando seus usos nas diferentes situações de interações.
Diante do que foi discutido até então, perguntamo-nos, assim como fez Franchi
(2006): “Mas o que é mesmo gramática?”. A resposta para tal questionamento depende da
ideologia de quem a responde, visto que pensar em gramática é, entre outras questões, (i)
pensar em uma “idealização” de língua; (ii) priorizar uma concepção em relação a outras, (iii)
materializar a formulação do inconsciente coletivo que em nós habita; (iv) por fim, desvelar o
que subjaz de tal ideologia em nossa prática pedagógica. Por isso, para que possamos nos
assenhorar do discurso que empregamos, passamos a analisar os diversos conceitos de
gramática a fim de subsidiarmo-nos na construção de uma nova proposta sobre o ensino de
verbo e sua aplicabilidade em sala de aula.
Se avaliarmos o conceito citado, notaremos que, segundo tal concepção, quem não
domina as normas existentes na gramática não domina a arte do bem falar e do bem escrever.
Fica evidente que a língua oral, conforme postulada, é ignorada, e o prestígio incide sobre
29
aqueles que são autoridades, os bons escritores. Travaglia (2009) corrobora com essa
discussão, afirmando que:
Constatamos que esse tipo de gramática tem bases bem antigas, como menciona
Franchi (2006): “A primeira forma de construir uma gramática normativa (que certamente
tem origens mais antigas) aparece nos gramáticos de Port-Royal, no século XVII, que
vinculavam o uso da linguagem à arte de pensar”. (FRANCHI, 2006, p.17) Esses gramáticos
pretendiam construir uma gramática baseada em princípios gerais que seriam universais a
todas as línguas. Portanto, a linguagem é vista como reflexo da razão e a sua base seria a
lógica, esse seria, então, o esquema universal da linguagem.
Sobre o surgimento da gramática com esse valor normativo, de servir como modelo
para o bem falar e o bem escrever, Neves (2005) menciona que:
Com essas reflexões, podemos constatar que, motivada por um raciocínio ordenado e
lógico, nasceu a gramática normativa e, além disso, com o arquétipo da arte do bem dizer.
Talvez, por apresentar esse arquétipo, ela seja, simultaneamente, tão valorizada, vista como
instrumento que resguarda prestígio, e, como consequência, tão censurada também por
aqueles que não compreendem a lógica de seus conceitos, carregados de metalinguagem e
que, na maioria das vezes, não dão conta da língua em uso. Ao mesmo tempo, na Tradição
Gramatical, há a valorização somente da variedade padrão, por conseguinte, o menosprezo e o
não reconhecimento das demais variedades.
O conjunto desses fatores acarreta aversão em muitos educadores, além de muita
preocupação por parte dos linguistas que trabalham na área da linguagem. Franchi (2006), a
esse respeito, apresenta algumas razões pelas quais a gramática normativa recebe tantas
críticas:
30
Haja vista que não são poucas as críticas relacionadas à gramática normativa, urge a
necessidade de educadores e profissionais da área da linguagem realizarem reflexões sobre
formas mais inovadoras de se trabalhar com a gramática, baseadas, a nosso ver,
principalmente, na língua em uso. Chegamos à conclusão, diante dessas reflexões, de que a
gramática tradicional estará sempre no liame entre padrões normativos formais, conceitos,
regras. Como muitos educadores ainda estão presos a uma gramática restritiva que
simplesmente classifica e segmenta, fica difícil estimular a criatividade e o interesse pelo
estudo da gramática, em questões tão árduas como compreensão da estrutura verbal. Ademais,
a própria metalinguagem que envolve o verbo (regular, irregular, defectivo, anômalo,
abundante) demanda um nível de abstração, um embasamento para a compreenderem que
nem sempre possuem os discentes do Ensino Fundamental. Se não possuem esses requisitos o
que caberia a nós falarmos sobre a condição de aplicarem tais conhecimentos na prática,
como, por exemplo, no momento de produção de texto? Essa questão discutiremos na
próxima subseção.
No que diz respeito à Gramática Descritiva, Possenti (2012) afirma que se configura
como o estudo de “um conjunto de regras que são seguidas [é este modelo de gramática] que
orienta o trabalho dos linguistas, cuja preocupação é descrever e/ou explicar as línguas tais
como elas são faladas”. (POSSENTI, 2012, p.65).
Assim, no trabalho dos estudiosos da gramática descritiva, são focalizadas as análises
dos elementos linguísticos que constituem as orações, as diferentes classes gramaticais que se
associam para formar enunciados coerentes e coesos e, finalmente, são examinadas quais são
as situações de uso de determinadas expressões para que não fujam das expressões
explicitadas pela gramática da língua.
Em Franchi (2006), encontramos a seguinte definição para a gramática descritiva:
Precisamos ter cuidado, no entanto, como observa Franchi (2006), para que a
gramática descritiva não seja transformada/metamorfoseada em uma gramática prescritiva,
mas, sim, que ela continue a desenvolver o objetivo de registrar a língua em conformidade
com o seu uso. É percorrendo este caminho, que desejamos realizar nossa análise.
Nessa perspectiva, os indivíduos são dotados de uma gramática interna que deve ser
acionada progressivamente para que ela se desenvolva. Compreendemos, desse modo, que
não devemos priorizar uma forma linguística em detrimento de outra, pois, de acordo com
essa gramática, todos têm a capacidade interna/inata de produzir a linguagem. Assim, não nos
cabe julgar qual a de maior prestígio, mas, sim, possibilitar o contato da criança com a
diversidade linguística para que ela possa empregar a variedade adequada à situação
comunicativa em que estiver exposta.
Nesse sentido, entendemos que o trabalho do educador, nas séries iniciais, deve ser o
de manusear atividades diferenciadas de linguagem que abordem processos da oralidade, da
escrita, da leitura, da compreensão, da interpretação, entre outros, para que o aluno perceba a
utilidade e a importância do conhecimento e a empregabilidade de cada uma delas.
Em relação ao ensino de verbo, objeto de nosso estudo, o professor deve estar atento
para a concorrência entre gramáticas, considerando que alunos de outros estratos sociais
(especialmente da zona rural) são expostos aos dados de uma língua que apresenta alguns
elementos diferenciados do seu vernáculo. Dessa forma, o trabalho com verbo, mormente,
com o modo imperativo, será feito com a exposição das diversas possibilidades de dizer
inserida em um contexto comunicativo, a partir também do contato com uma diversidade de
gêneros textuais.
outras gramáticas, a nossa atenção está mais direcionada ao “processo” que ao “produto” em
si.
corrente. Inúmeros são os casos, a título de exemplo, de verbos sendo utilizados por variadas
pessoas, independentemente do seu nível de escolaridade, sem o acompanhamento da
prescrita regência “necessária”, como o caso tão comum de “Assista o vídeo agora”,
construção usada por pessoas, independentemente da condição de informante do Português
Popular ou do Português Culto4. Afinal, isso é/significa ser um informante com traços de
naturalidade, usando a sua língua em situações de pouco monitoramento.
Mas o que é norma culta? Como e quando surgiu esse termo? Lendo a introdução de
um livro de Faraco (2008), constatamos que, na década de 1960, no Brasil, com a propagação
do Estruturalismo Linguístico e a consequente reflexão advinda dos estudos linguísticos, a
gramática tradicional perde prestígio na esfera dos estudos da área da linguagem. Esse fato
abrangeu as diversas instituições de ensino, tanto no âmbito do nível Médio como no
Fundamental, abrigando uma crise no âmago tradicional do ensino de Português, que sempre
conduziu o trabalho com a gramática como o cerne do ensino da Língua Portuguesa. Afirma
Faraco (2008):
Apesar das críticas e da atribuição de juízo de valor como “errada” à maneira como se
trabalhava com a gramática, a nova roupagem do ensino não apresentou avanços
significativos em sua prática pedagógica. Entretanto, a nomenclatura gramática foi substituída
a fim de escamotear um aprendizado considerado ultrapassado. Nesse contexto, no qual o
ensino da gramática era politicamente incorreto, “foi preciso enfrentar a depreciação
semântica do termo gramática e encontrar um novo nome para o velho saber e as velhas
práticas.” (FARACO, 2008, p. 23). Assim, a expressão norma culta surgiu em um momento
oportuno. Esse termo era do discurso científico, o que lhe garantia credibilidade. A nova
expressão trouxe uma atmosfera de modernidade ao ensino de Português.
Retornemos à indagação sobre o que é norma. Segundo Bagno (2009), ao analisar a
dubiedade de sentidos existentes para norma no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, é
necessária muita cautela ao empregarmos esse termo. No mencionado dicionário, afirma
4
Usamos, na presente pesquisa, os termos Português Popular e Português Culto, fazendo referência,
respectivamente, aos informantes sem escolaridade ou com menos de 5 anos de escolarização e aos informantes
com mais de 11 anos de escolarização.
37
Bagno, há conceitos de norma como “preceitos estabelecidos” e “uso corrente”, ou seja, para
um mesmo termo, dois adjetivos diferentes, que ora sinaliza o normal, ora sinalizam o
normativo. Para uma melhor compreensão do leitor, o autor dispõe essas diferenças em duas
tabelas lado a lado. Aqui listaremos as características, conforme o linguista. Vejamos:
A partir dessa perspectiva, ao usarmos a expressão norma, devemos estar atentos a qual
das acepções estamos nos referindo, ou seja, quando dizemos que “Joãozinho não fala de
acordo a norma culta”, estamos falando do que é normal na língua ou da língua idealizada e
prescrita pela tradição gramatical, isto é, do que é normativo?
Faraco (2008) também designou norma na acepção de normal, ou seja, como “um
determinado conjunto de fenômenos linguísticos (fonológicos, morfológicos, sintáticos e
lexicais) que são correntes, costumeiros, habituais numa dada comunidade de fala.”
(FARACO, 2008, p.35). O autor expõe que, independente da abordagem teórica adotada para
conceituar a norma, sempre haverá no seu âmago a organização, pois “[...] nenhuma teoria
deixa de reconhecer o fato básico: não há norma sem organização.” (FARACO, 2008, p. 36).
O que podemos concluir, a partir dessa afirmação, é que não há falante que empregue
sua língua sem o domínio de alguma norma. Assim, compreendemos norma como algo que,
dentro do sistema linguístico, organiza-se, tornando-se “normal”, usual, habitual para os
usuários de uma determinada comunidade. Todos os falantes possuem sua gramática
internalizada, como afirmamos anteriormente, logo, possuem a norma da comunidade de fala
a que pertence. Nesse sentido, pessoas sem e ou com baixa escolaridade são amparadas por
uma norma. Igualmente, podemos afirmar que a ideia de “erro” não deve existir, pois os erros
estão estruturados dentro de outra norma e representam, sempre, possibilidades de uso dentro
de um sistema.
Podemos, então, vislumbrar que, dentro de uma mesma comunidade, há uma enorme
variedade de falares, o que é denominado, em termos labovianos, como diversos vernáculos
em convivência que ganham existência e que se estabelecem por meio das redes de contatos
sociais, quer seja através do trabalho, do lazer, do comércio, dos grupos de igreja, dos ciclos
de amizades. Essa heterogeneidade de relações possibilita, indubitavelmente, a variedade de
normas, com isso, em uma comunidade, podem existir e/ou existem diferentes normas.
38
Além disso, existe também o fato de uma mesma pessoa empregar diferentes normas a
depender da situação comunicativa em que esteja envolvida. Faraco (2008) denomina esse
falante de “camaleão linguístico” (FARACO, 2008, p.38), uma metáfora bem sucedida para
representar a adaptação dos interlocutores na diversidade dos discursos que articulam. Em
consonância com essa fala, Bechara (2009) coloca-nos como “poliglotas” da própria língua.
Diante dessas observações, atualmente, tornou-se imprescindível ao linguista analisar
também as relações sociointeracionais nas quais os falantes estão envolvidos. O conhecimento
da variedade de normas é necessário para a compreensão da norma que é utilizada como
referência para uma dada comunidade.
De acordo com o que vimos, podemos concluir que é impossível estabelecer um limite
preciso entre uma norma e outra. Pelo fato de se entrecruzarem mutuamente, o que as torna
híbridas, heterogêneas, bem como sofrerem alterações no decorrer dos anos, podemos,
categoricamente, afirmar que as normas são dinâmicas, vivas e, por se estabelecerem dentro
de um sistema, também são organizadas, o que existe de diferente, as variedades linguísticas,
é apenas aparentemente um caos, pois há, na suposta irregularidade, uma regularidade, como
já afirmava Tarallo ( 1997). Assim, naturalmente, constitui-se a língua em situações reais de
uso. Discutida a questão norma, passemos à norma culta. Ao falar dessa questão, Faraco
(2008) sinaliza a necessidade de alguns critérios para uma definição. Um deles é: “Norma
culta seria a variedade de uso corrente entre falantes urbanos com escolaridade superior
completa, em situações monitoradas.” (FARACO, 2008, p. 46-47). Se assim concebermos a
norma culta, estaríamos afirmando que poucas pessoas ou somente a elite letrada detém o
domínio da norma culta. Nesse sentido, o autor, após refletir sobre esse critério, gerado pelo
grupo de pesquisas de Norma Linguística Urbana Culta (NURC), discorre:
Nessa perspectiva, podemos afirmar que a norma culta falada não difere da linguagem
urbana comum, e é esta que, de fato, representa o falar culto. A pequena minoria que está
representada no projeto NURC não deixa de indicar uma marca de elitização, de exclusão.
Isso indica que, ainda no Brasil, o acesso à cultura letrada é um bem cultural de uma ínfima
parcela da população, pois, como muitos sabem, no nosso país ainda é grande o número de
pessoas sem escolaridade.
39
Na era da sociedade industrial, a migração do campo para a cidade foi bem expressiva,
fato que acabou ocasionando um avanço na educação básica, na medida em que os envolvidos
deviam se qualificar para um melhor desempenho no trabalho. Não foi pequeno também o
avanço tecnológico, que proporcionou a criação dos meios de comunicação de massa. Esses
fatores interferiram diretamente no funcionamento da língua. Nas palavras de Faraco (2008),
Notamos, então, que as variedades urbanas, por uma necessidade vigente, passam a
assemelhar-se a uma norma próxima à culta. A norma culta deixa de representar a norma de
poucos, das elites e passa a funcionar dentro do contexto da sociedade moderna, envolta por
relações socais complexas e, como consequência, a trazer marcas que antes não eram
consideradas como próprias de falantes cultos.
No âmbito da sociedade moderna, o termo norma culta está diretamente associado ao
letramento, à escolarização. Assim, são irrelevantes as discussões da mídia relacionadas a
algum problema linguístico, bem como é pouco produtiva a atitude das instituições de ensino
de priorizarem correções de “erros” de português. O que é imprescindível mesmo é o
desenvolvimento e a implementação de políticas públicas que ofereçam um ensino de
qualidade a todas as camadas da população, abolindo o analfabetismo do nosso país e,
consequentemente, os preconceitos relacionados ao emprego das normas.
Podemos concluir que não existe uma norma única, mas, sim, uma multiplicidade de
normas distintas, de acordo a Sociolinguística e com as situações de comunicação. Sobre a
norma padrão Callou (2013) afirma:
predominância desta ou daquela corrente teórica. Por fim, reconhece que “o conhecimento
científico tem avançado juntamente com a história da humanidade” (BORTONI-RICARDO,
2008, p.12).
Sensíveis a tais provocações, fomos levados a refletir sobre os pressupostos teórico-
metodológicos que permeiam o fazer docente no século XXI, no interior do estado da Bahia,
bem como a propor metodologias que possam “dar conta” de novas realidades histórica e
socialmente formadas no Brasil.
Ensinar a Língua Portuguesa, atualmente, tem provocado angústia em muitos
profissionais da área, haja vista que muitos docentes norteiam a sua prática pedagógica
baseando-se em compêndios que não oferecem um estudo contextualizado e eficaz sobre os
reais usos do verbo. Nesse sentido, o desenvolvimento da competência sociocomunicativa,
por meio da qual os discentes tornam-se sujeitos de interação ao aprenderem a usar a língua
como um instrumento de interação social, fica comprometido. Apesar de esses objetivos
estarem claramente delimitados nos Parâmetros Curriculares Nacionais, a maioria dos
professores não consegue efetivá-los, devido ao fato de estarem presos a conceitos e regras
expostos em manuais de gramáticas e livros didáticos. Assim, consideramos relevantes a
realização de um estudo reflexivo de como a tradição gramatical vem tratando o verbo,
sobretudo o modo imperativo, bem como apresentar visões científicas que possam
fundamentar o trabalho do professor.
Nessa seção, guiados por esse sentimento, abordamos o verbo em sua complexidade
teórico-prática a fim de propormos novos enfrentamentos para questões pautadas na
compreensão de normas linguísticas e da gramática reflexiva. Para tanto, optamos por
realizar, inicialmente, uma consulta às gramáticas tradicionais, analisando, cronologicamente,
nesses compêndios, as definições de verbo e a forma como explanam o modo imperativo. Em
seguida, também na ordem cronológica, apresentamos a mesma temática na visão dos
pesquisadores da tradição linguística, suas maneiras de abordar a linguagem na
contemporaneidade e, finalmente, verificamos em três coleções de livros didáticos de Língua
Portuguesa, do 6º, 7º e 8º anos (editados em 2012, aprovados pelo Ministério da Educação e
sugeridos para serem adotados em escolas públicas do município de Brumado-Bahia), a forma
como o conteúdo “verbo”, especialmente do “modo imperativo”, é desenvolvido.
Em nossa discussão, analisamos a morfossintaxe do verbo, com ênfase no modo
imperativo, centrando-nos em aspectos semânticos, pragmáticos e discursivos, eleitos como
foco de nosso estudo. Iniciando o estudo dos verbos a partir da tradição gramatical, com os
gramáticos: Torres (1972), Cunha (1986), Luft (1990), Rocha Lima (2007), Bechara (2009),
42
Cunha e Cintra (2013), avaliamos como esses aspectos vão aparecer em gramáticas
normativas da Língua Portuguesa; notadamente, a ideologia que subjaz a cada texto revela,
sensivelmente, a postura que o autor assume a respeito do tema.
2.1.1Torres (1972)
Iniciamos nossa abordagem por Torres (1972) que, ao expressar-se sobre a natureza do
verbo na Moderna Gramática Expositiva de Língua Portuguesa, manual de sua autoria,
enseja enquadrar-se no rol da exposição gramatical. Para a época, traz dois adjetivos
considerados de “vanguarda”: moderna e expositiva. À parte tal adjetivação, Torres (1972)
apresenta concepções arraigadas aos valores prescritivos, como se segue:
Torres (1972) define o verbo como palavra que expressa ação, estado ou fenômeno da
natureza. Curiosamente, o gramático esforça-se por fazer de imediato a distinção entre ação
na voz ativa e na voz passiva, bem como apresentar as nuances do estado: transitório vs
permanente. Por meio de enunciados, procura apresentar uma especificação dos elementos
classificatórios.
Quanto ao enfoque semântico-discursivo, Torres (1972) aborda uma categoria
gramatical que manifesta o ponto de vista do qual o locutor considera a ação expressa pelo
verbo: o aspecto. Vejamos: “[...] Ao lado dos tempos, há também os aspectos, que denotam
matizes muito delicados relativamente ao processo de duração ou desenvolvimento da ação
verbal” (TORRES, 1972, p. 87). Uma análise crítica da definição de Torres (1972) nos leva a
algumas ponderações: primeiro, a alocação do aspecto é feita “ao lado dos tempos”, isto é,
haveria uma relação tempo-aspecto que deveria ser observada; segundo, o autor anuncia as
dificuldades de categorização, pois “denotam matizes muito delicados”; terceiro, a noção de
aspecto está ligada à “duração”, o que nada mais é do que a interpretação do infectum e
perfectum latinos; por fim, parece que cabe apenas ao verbo apresentar a noção aspectual. No
43
Cunha (19865) define verbo como: “1.Verbo é uma palavra de forma variável que
exprime o que se passa, isto é, um acontecimento representado no tempo”. (CUNHA, 1986, p.
366) Ainda continua:
2. O verbo não tem, sintaticamente, uma função que lhe seja privativa, pois
também o substantivo e o adjetivo podem ser núcleos do predicado.
Individualiza-se, no entanto, pela função obrigatória de predicado, a única
que desempenha na estrutura oracional (CUNHA, 1986, p. 366).
5
No âmbito de nosso estudo, citamos a edição de 1986 em 11ª que reproduz a obra publicada em 1972.
44
Depois de apresentar o primeiro conceito, Cunha (1986) limita-se a listar frases soltas,
descontextualizadas, ou seja, o contexto extralinguístico não é abordado. Para complementar,
ele apresenta o segundo conceito. O gramático traz a definição de verbo com base em sua
morfologia (“variável”), semântico (“um acontecimento representado no tempo”) e na função-
sintática (“função obrigatória de predicado”). A linguagem empregada para explicação sobre
verbo é envolta por uma metalinguagem, que obriga o leitor a fazer uma revisão comparativa
das categorias gramaticais.
É interessante frisar que Cunha (1986) escreveu essa gramática em 1972, e, em 1984,
ao lançar A Nova Gramática do Português Contemporâneo, que contou com o
auxílio/coautoria de Lindley Cintra, a definição é mantida, mas outros exemplos de autores
considerados consagrados são empregados. São exemplos igualmente isolados, como
aparecem na versão primeira. Vejamos:
Verbo é uma palavra de forma variável que exprime o que se passa, isto é,
um acontecimento representado no tempo:
Um dia, Aparício desapareceu para sempre. (A. Meyer, SI, 25)
A mulher foi educada por minha mãe. (Machado de Assis, OC, I 343)
Como estavam velhos! (A. Bessa Luís, S, 189.)
Anoitecera já de todo. (C. de Oliveira, AC, 19) (CUNHA; CINTRA, 2013,
p. 393).
Após o conceito e exemplos para identificação dos verbos em orações, Cunha e Cintra
(2013) prosseguem apresentando as flexões do verbo e mencionando as variações em
números, pessoas, modos, tempos e vozes, tal qual a primeira gramática. É relevante destacar
que há o acréscimo da variação de aspecto, que já significa avanços na direção de uma
abordagem semântica, no entanto, há uma predominância de natureza classificatória, já que o
estudo dos verbos continua a ter como prioridade a categorização em regulares, irregulares,
defectivos e abundantes.
Quando se referem aos modos, Cunha e Cintra (2013) esclarecem: “Chamam-se
MODOS as diferentes formas que toma o verbo para indicar a atitude (de certeza, de dúvida,
de suposição, de mando, etc.) da pessoa que fala em relação ao fato que enuncia.” (CUNHA;
CINTRA, 2013, p. 394). Com essa definição, eles mostram que, através dos modos, podemos
empregar os verbos de várias maneiras, a depender da significação que pretendemos dar a ele.
Nessa abordagem, é possível para nós até mencionar que os aspectos semânticos e
pragmáticos estariam sendo contemplados, pelo simples fato de a pessoa que fala optar por
45
A breve análise desses itens nos possibilita afirmar que Cunha e Cintra (2013), na
última publicação, dão um passo a mais para as questões voltadas à semântica, à pragmática e
à discursividade quando mostram que o emprego do imperativo pode indicar diversos outros
sentidos, além da ordem, e que o nosso tom de voz também pode fornecer pistas sobre o que
enunciamos. Destarte, os autores reconhecem a importância do contexto de enunciação, do
processo de interação verbal para que os atos da fala sejam pertinentes.
Avaliaremos, agora, as definições de Luft (1990), que, ao explanar sobre verbo, realiza
um paralelo entre essa classe gramatical e o nome. Essa analogia é bastante positiva, pois faz
com que o leitor compreenda a distinção de uma palavra que exprime processo de forma
dinâmica (verbo) e a que exprime as realidades de forma estática (nome). Todavia, se não nos
atentarmos, minuciosamente, à definição, empecilhos poderão obscurecer nossa compreensão,
e poderemos classificar palavras que são tidas como substantivos abstratos como sendo
verbos, tendo em vista que determinadas palavras, embora indiquem ações, como corrida,
trabalho, e exprimam processos, tal como é definida, muitas vezes, a categoria verbo, são
classificadas como substantivos. O que pode suscitar a diferença é o fato de elas sofrerem
alterações que as situam no tempo. Confiram:
Além das informações anteriores, Luft (1990) ainda faz questão de frisar esta
distinção: “O que caracteriza o verbo em oposição ao nome é, portanto, a ideia temporal (os
alemães o chamam de Zeiwort - „palavra de tempo‟): o começo, a duração ou resultado de um
processo (aspecto) ou o momento de sua ocorrência (tempo).” (LUFT, 1990, p. 107).
Percebemos que o linguista, apesar de utilizar-se da taxonomia quando se refere a algumas
categorias do verbo, busca, logo em seguida, esclarecer com palavras mais usuais,
empregadas pelos falantes, em geral, facilitando, assim, a compreensão do leitor. Quando
passa a mencionar a posição ocupada pelo verbo dentro dos enunciados, o já referido autor
reconhece o valor dessa classe gramatical dentro da oração, haja vista que, sem essa categoria,
47
não haveria a oração. Nesse sentido, não foi irrefletida a designação pelos gramáticos latinos
de “verbo, a palavra” (LUFT, 1990, p. 107).
Observemos que o gramático afirma que modo “é a propriedade que tem os verbos de
exprimir a atitude psíquica (modo de ver, encarar) do falante em relação ao processo – ação,
estado etc.” (LUFT, 1990, p. 111). Assim sendo, o modo é determinado de maneira semântica
e pragmática, contudo, o aspecto pragmático não é explorado pelo gramático, configurando,
portanto, uma lacuna em relação ao aspecto referido.
Um fator que difere Luft (1990) dos demais gramáticos pesquisados é a sua audácia
em afirmar que o imperativo não é um modo, mas, sim, “a forma que o verbo assume na
linguagem ativa.” (LUFT, 1990, p. 111). Porém, a seguir, ele declara que excluí-lo seria
quebrar a tradição. Concebemos, então que, para o gramático tradicional, é bem mais cômodo
permanecer com uma explicação que, muitas vezes, não consegue abarcar todo o significado,
tornando-se ineficaz ou até incoerente, do que romper com toda a tradição. Para finalizar sua
exposição sobre o modo imperativo, o gramático assegura que o falante, através do modo
imperativo, “impõe o processo verbal à 2ª pessoa (ouvinte), assumindo atitude ativa; é o modo
do mando.” (LUFT, 1990, p. 112). Além disso, para complementar a informação, ele traz a
etimologia de “imperativo”, que vem “de imperar, „ordenar, mandar‟.” (LUFT, 1990, p. 112).
Assim, como os demais, ele admite somente a 2ª pessoa, tanto do singular como do plural,
como sendo do modo imperativo.
Logo em seguida, apesar de relatar que essa classe gramatical é a parte mais “rica” da
oração no quesito das variações, ele não faz referência à variação de aspecto, um forte traço
semântico-discursivo, que traz mais informações sobre a ação expressa pelo verbo. Tal visão
restringe as potencialidades semânticas e discursivas do verbo.
Sobre esse aspecto, Franchi (2006) chama nossa atenção para a necessidade de
estabelecimento de relações semânticas como forma de estender as possibilidades discursivas.
Segundo ele, “As relações semânticas são noções que descrevem esquemas relacionais do
sistema de representação de que nos servimos para dar forma à „realidade‟” (FRANCHI,
2006, p.63). Assim, essas relações sugerem que os usuários da língua têm como optar pela
construção linguística que melhor explicite seus pontos de vistas e possuam variáveis formas
para administrar sua fala.
Quando passa a relatar sobre o modo imperativo, Rocha Lima (2007) expõe: “Com
este modo, dirigimo-nos a uma ou mais pessoas, para manifestar o que queremos que ela faça,
ou elas façam.” (ROCHA LIMA, 2007, p. 129). Podemos reafirmar, nesse sentido, que
somente as segundas pessoas deveriam existir no modo imperativo, pois damos ordem à
pessoa com quem estamos falando. Em relação às formas do imperativo, percebemos que o
gramático também menciona a existência do imperativo afirmativo e do negativo. As
definições para essas formas são semelhantes às de Cunha e Cintra (2013). Vejamos:
representar arquétipos da língua padrão?! Essa questão deve ser discutida, haja vista que a
gramática normativa representa o conservadorismo, ou seja, está presa a regras pré-
estabelecidas, enquanto que a literatura é vista como algo libertador que subverte a ordem,
que não é preso a regras, mas sim a inovações constantes para atrair o leitor contemporâneo.
Outra crítica que também fazemos ao analisarmos os conceitos de verbo nessas
gramáticas está relacionada à difusa e confusa metalinguagem que é empregada pelos
gramáticos. Será que essa forma de expor o conteúdo não dificulta a aprendizagem? Por que
não empregar uma linguagem mais concisa e clara? Estas indagações, geralmente, faz-nos
companhia a todo instante que consultamos um manual de gramática normativa. Nas palavras
de Possenti (2012): “o domínio efetivo e ativo de uma língua dispensa o domínio de uma
metalinguagem técnica” (POSSENTI, 2012, p. 53). Por conseguinte, a linguagem empregada
nas gramáticas normativas dificulta o domínio efetivo da língua.
Por fim, notamos que as gramáticas supramencionadas são repletas de regras que
devem ser seguidas, paradigmas que não devem ser ignorados por quem deseja aprender a arte
do bem falar e do bem escrever, como prescrevem os autores consagrados. O verbo, assim
abordado, é apenas uma coleção de quadros a serem memorizados e atualizados na
comunicação. Tal visão, no entanto, não consegue dar conta da língua em uso, haja vista que
se baseiam em exemplos de frases literárias ou se configuram como estruturas
“higienizadas”6, não possibilitando, assim, a devida reflexão para tornar o aprendizado
significativo. A prática docente nos leva a refletir sobre conteúdos, atividades que poderão ser
considerados como imprescindíveis e significativos para que o discente aprenda e faça sua
comunicação mais eficiente.
Bagno compartilha a mesma ideia de Castilho (2012) sobre o aspecto discursivo. Mas
o que quer esse linguista ao conceituar verbo com base nos três aspectos? Ao discutir sobre o
verbo, Bagno (2011) traz um argumento que parece bem simples e ao mesmo tempo com
características bastante complexas. Em síntese, ele quer que o aprendiz compreenda que o
verbo é uma palavra que, em alguns aspectos, sofre alterações (ponto de vista morfossintático)
para indicar o que estar acontecendo (ponto de vista semântico) nas diferentes situações de
interação (ponto de vista discursivo).
Posto isso, o linguista cita exemplos de atividades sugeridas por Magda Soares, para
serem trabalhadas em sala. O objetivo final dessas atividades é fazer com que os aprendizes
reflitam sobre o aspecto morfossintático – conjugação verbal – e apreendam-na como algo
simples, cujas terminações se alteram sem aquela complexa dificuldade da trama de
terminologias, a exemplo de flexão de pessoa, modo, tempo ou desinência verbal. Nesse
estudo Bagno (2011) conclui que
são iniciativas como essas que vão permitir uma educação linguística
eficiente, que apele para a intuição e para o conhecimento linguístico prévio
que todo aprendiz já traz para a escola, como ser humano dotado de
capacidades sociocognitivas (BAGNO, 2011, p. 512).
que era empregado no passado, o que é produtivo na atualidade e aprendem a adequar sua fala
aos diferentes contextos de usos.
Dinâmicos:
Ações ou atividade (o que alguém faz ou o que algo provoca)
Os verbos exprimem uma ação ou atividade.
Processos (o que acontece)
Os verbos envolvem uma relação entre um nome e um estado, e o nome e o
paciente do verbo afetado.
Não dinâmicos: estados
Os verbos não dinâmicos são acompanhados por um sintagma nominal
(sujeito) que é suporte do estado (NEVES, 2011, p. 26).
a gramática que vai à escola não pode descaracterizar-se por uma inocente
aceitação de que simples receitas e rótulos serão mais fáceis de digerir do
que fundas reflexões que revelem a verdadeira natureza da linguagem, a
qual, necessariamente, é complexa (NEVES, 2012, p. 192).
autor traz, de forma clara e precisa, abordagens para o ensino de língua. Nesse sentido,
observemos como ele aconselha que deva ser trabalhada a classe de palavra verbo:
a) Conceito – mostrar que o verbo tem duas funções básicas: a) ligar uma
característica a um ser (verbos de ligação: Maria
é/está/parece/ficou/permaneceu/anda bonita); b) exprimir ações, fatos,
fenômenos, sentimentos.
b) Valores dos verbos de ligação, mostrando que embora liguem uma
característica a um ser, têm diferenças de significação (TRAVAGLIA, 2013,
p. 61).
Da forma proposta por esse linguista, oportunizamos aos discentes o contato com
diversas maneiras de se usar os conteúdos linguísticos, gerando os mais variáveis efeitos de
sentidos numa interação com o outro. Assim, o estudo da língua passa a ter sentido para o
discente e os aspectos semânticos, pragmáticos e discursivos estariam evidentes em todo o
processo de aprendizagem.
No capítulo dedicado ao ensino do verbo, Travaglia (2011) apresenta algumas
recomendações no que tange ao ensino dessa classe gramatical. Dessas recomendações,
vamos mencionar algumas que não são, a rigor, contempladas e/ou enfatizadas na tradição
gramatical. Por exemplo, ao citar as categorias, Travaglia (2011) sugere que, ao menos, se
tenha consciência sobre a que plano da língua (fonológico, morfológico, sintático, semântico)
determinado fato se refere. Assim, nas palavras do autor, apresentaríamos como
Para completar a abordagem, o autor mostra que deve ser trabalhado o funcionamento
do verbo nos níveis lexical, frasal e textual.
Destacamos, entre os níveis, o último, objetivando explorar o aspecto discursivo do
verbo, pois, no nível textual, temos fatos como:
Ao defender todas essas acepções, nas quais trata da estrutura variável até a sua
relevante função dentro do contexto, o linguista busca comprovar a relevância do verbo para a
59
Língua Portuguesa. Percebemos que todos os recursos disponíveis na língua aludidos por
Castilho (2012) são importantes, porém, poderíamos acrescentar o enfoque pragmático para
que o aprendiz pudesse utilizar todos esses elementos para produzir sentidos e interagir no
meio em que vive. Assim, todos os aspectos referentes à linguagem estariam sendo
contemplados.
Todavia, cabe ressaltar que podemos retornar ao conceito de discurso e notar que a
linha que diferencia o aspecto discursivo do pragmático é bastante tênue, se é que existe, e
não representa apenas uma distinção terminológica superficial, haja vista que este último
considera o falante e o contexto, enquanto que o primeiro, o discursivo, já é a própria
representação dos atos da fala concretizados no discurso em si, sem a isenção do falante.
Quando se refere aos modos, o linguista cita o indicativo, o subjuntivo e o imperativo
e complementa: “Todos eles apresentam uma propriedade discursiva comum, a de
representarem atos de fala.” (CASTILHO, 2012, p. 437). Retomando, exclusivamente, o
modo imperativo, nosso objeto de pesquisa, temos a explicação sobre a formação do
imperativo, seguida de um questionamento: “o imperativo dispõe de morfemas próprios em
sua forma afirmativa, tomando morfemas de empréstimo ao subjuntivo em sua forma
negativa. Será que no PB as coisas se passam assim mesmo?” (CASTILHO, 2012, p. 439).
Observando o que afirmou o autor, entendemos que a definição não se diferencia das
apresentadas pelos gramáticos tradicionais, entretanto, há um questionamento do próprio
linguista, indicando uma controvérsia da sua afirmação. Será que Castilho (2012) não
concorda com essa constituição do modo imperativo? Qual seria a justificativa desse
linguista? À procura de uma resposta, continuamos a nossa análise e encontramos a seguinte
abordagem sobre o modo imperativo: “Do ponto de vista sintático, o imperativo é o modo das
sentenças simples.” e, “do ponto de vista semântico, expressamos através do imperativo uma
ordem” (CASTILHO, 2012, p. 439). Outra afirmação do autor comprova a sua indagação,
quase que irônica, mencionada por outros autores.
concisa de verbo. Para ele, “A forma mais simples de explicar para um aluno da educação
básica o que é um verbo no PB é: o verbo é a única palavra que pode ser modificada para
expressar mudanças em relação ao tempo.” (FERRAREZI JUNIOR, 2014, p. 14).
Fundamentados nessa explicação, verificamos que o linguista faz questão de expor que não é
só o verbo que expressa ideia de tempo, mas tantas outras palavras como: ontem, hoje,
amanhã etc., que não são classificadas como verbos. Contudo, ele destaca que somente o
verbo tem a capacidade de alterar-se para expressar as mudanças em relação às ideias de
tempo, como verificamos em: estudei, estudo, estudarei. Dando prosseguimento a sua
definição, Ferrarezi Junior (2014) ainda propõe:
Se o aluno for mais avançado (lá pelo 7º ou 8º ano, por exemplo), já deve ter
aprendido o que é flexão, ou seja, a modificação de uma palavra por meio de
desinências. Então, você pode dizer que “o verbo é a única palavra que pode
ser flexionada em tempo” (FERRAREZI JUNIOR, 2014, p. 15).
Notamos que, a partir desse ponto de vista, apesar de mencionar a série, respeita-se a
demanda do discente, sua maturidade em compreender enunciados mais complexos. Assim, o
trabalho flui a partir das necessidades reais que os discentes apresentam e do amadurecimento
acadêmico que já atingiram e não apenas obedecendo a uma distribuição rigorosa de períodos
ou ciclos escolares, como proposto tradicionalmente.
Ao expor sobre os modos do verbo, Ferrarezi Junior (2014) declara: “quando falamos
de modo verbal estamos falando da forma como imaginamos a realização/concretização do
evento que estamos descrevendo.” (FERRAREZI JUNIOR, 2014, p.41). Notamos que são
bem claras as definições do autor, ele não emprega toda aquela metalinguagem que, muitas
vezes, ao invés de aclarar, obscurece a compreensão dos termos linguísticos. Ao contrário
disso, exibe os modos indicativo e subjuntivo e, com veemência, assevera que o imperativo
não é modo verbal “de verdade”. Para comprovar tal afirmação, ele lista as razões:
a) primeiro, porque ele não afeta de forma alguma o sentido que atribuímos
às formas como as coisas vão se concretizar/realizar;
b) segundo, porque ele não tem formas privativas, ou seja, só dele, mas usa
formas dos presentes do indicativo e do subjuntivo;
c) terceiro, porque não utilizamos o imperativo na representação de eventos
do mundo nem temos como localizar suas formas verbais imperativas na
linha do tempo, pois sequer sabemos se eles vão mesmo acontecer. Mas aí,
já usaremos outro verbo em outro modo para dizer se as coisas acontecerem
ou não (para a ordem “Faça isso”, por exemplo, usaríamos: “Ele fez” (do
indicativo) ou “Se ele tivesse feito” (do subjuntivo)). Apenas usamos o
imperativo para dar ordens ou fazer pedidos, ou seja, para realizar os atos de
fala, que, segundo a Pragmática, são atos que se concretizam pelo falar,
62
como mentir, mandar, pedir, jurar etc. “Faça isso”, “Faz isso”, “Coma
aquilo/Come aquilo”, “Faz isso”, “Sai daqui!/Saia daqui!”, são formas de
construção chamadas de imperativas (FERRAREZI JUNIOR, 2014, p. 42-
43).
Com todas essas razões, o linguista tenta nos convencer de que o imperativo não é
precisamente um modo verbal, mas, sim, uma maneira especial de empregar o verbo,
abarcando, assim, a ideia do aspecto pragmático, aspecto este fundamental para o
desenvolvimento da competência Sociocomunicativa, proposta em nosso estudo.
Portanto, após a análise dos cinco compêndios da tradição linguística, verificamos o
quão produtivas, tomando como referência a língua em uso, são as abordagens apresentados
pelos linguistas, diferentemente das defendidas pelos gramáticos normativos. Pois, além de
abordar a temática de forma mais clara, na tradição linguística, não são empregadas frases dos
clássicos literários e, ainda, é abordada uma formação do imperativo de acordo com os utentes
da língua na atualidade. A nosso ver, os discentes e docentes, que consultarem esses
compêndios da tradição linguística, irão obter uma resposta mais satisfatória para o
conhecimento da língua.
Outra questão interessante para refletirmos, a qual Luft (1990) menciona, mas não
quer quebrar toda a regra estabelecida pela gramática normativa, diz respeito a não existência
do modo imperativo, ou seja, o que existe é o verbo na linguagem ativa. Notamos que
Ferrarezi Junior (2014) defende veemente essa mesma ideia com argumentos convincentes,
colocando o aspecto pragmático como o responsável para expressar os diversos atos da fala
que são acionados no processo da interação comunicativa. Assim, podemos compreender que
o modo imperativo não tem uma forma prototípica tal qual se encontra na gramática
normativa, isto é, uma sentença interrogativa pode muitas vezes ser interpretada como uma
intenção de dá uma ordem, uma afirmação pode representar um pedido etc. Entretanto, essas
construções somente serão significativas dentro de determinados contextos interativos de
comunicação. Nesse sentido, em estudos com tais abordagens, os aspectos semânticos,
pragmáticos e discursivos estariam sendo contemplados.
Realizada a abordagem sobre a tradição gramatical e sobre a tradição linguística,
procedemos, a partir do próximo tópico, a análise dos conceitos de verbos e do modo
imperativo em livros do 6º ao 8º ano, expostos em três coleções distintas, eleitas, entre várias
outras, por professores de Língua Portuguesa de uma escola municipal, como sendo as mais
indicadas para possível adoção, no período de 2014 a 2016, no município de Brumado,
interior da Bahia.
63
Como é sabido por muitos, o livro didático ainda é uma ferramenta que muito auxilia o
docente em sua prática pedagógica. Providos dessa informação, acreditamos ser bastante
pertinente verificar como o objeto de nossa pesquisa, o verbo e, em particular, o modo
imperativo, vem sendo abordado em livros didáticos do 6º ao 8º ano, em três coleções
distintas.
Antes de iniciarmos a análise, gostaríamos de expor que a escolha do livro didático no
município de Brumado, interior da Bahia, dá-se após a realização de: (i) reuniões de diversas
editoras que apresentam seus livros a todo corpo docente do município; (ii) análises e
votações dos docentes, por unidade escolar, do livro que acreditam ser mais produtivo e
adequado à realidade dos discentes brumadenses; (iii) comprovações, através da junção dos
votos, do livro mais votado para ser adotado pelo município, no período de 3 (três) anos.
A ordem de apresentação das análises dos livros segue o critério decrescente de
votação: 1ª coleção de livros – Português Linguagens; 2ª coleção de livros – Projeto Teláris;
3ª coleção de livros – Vontade de saber português. Dessa forma, o livro mais votado e
adotado para o uso de 2014 a 2016 foi a 1ª coleção. Contribuindo para uma melhor disposição
das análises, optamos por separá-las em três partes, sendo que cada uma dessas partes
representa uma coleção de livros didáticos do 6º ao 8º ano.
Demos início à análise acreditando que a coleção em questão, por ser a escolhida entre
tantas outras, apresentará estratégias de ensino significativas ao processo de aprendizagem
que oportunize aos discentes desenvolver as habilidades e competências necessárias em cada
fase, em conformidade com o que é estabelecido pelos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Começamos pelo livro do 6º ano. No capítulo referente a verbo, encontramos uma
narrativa em quadrinhos (história em quadrinhos ou HQ), que foi empregada para apresentar
palavras que exprimem ações que são realizadas ou mencionadas pelos personagens.
apresentado: “Verbos são palavras que exprimem ação, estado, mudança de estado e
fenômenos meteorológicos, sempre em relação a um determinado tempo”. (CEREJA;
MAGALHÃES, 2012, p.223). Notamos que a definição não se difere das adotadas pelas
gramáticas tradicionais, apenas é “adornada” por um gênero textual interessante ao público.
Prosseguindo a análise, encontramos, em outro exercício, duas questões nas quais é
possibilitada aos discentes a chance de empregarem a norma usada pelo grupo linguístico do
qual faz parte. Vejam a tela de uma pintura e a questão relacionada a ela:
A seguir, trazemos a tira através da qual foi elaborada a outra questão que merece a
nossa atenção:
para que sejam identificados os verbos existentes na receita do texto intitulado “Brigadeiro” e
indicados em quais modos se encontram. Sobre esse texto é abordada uma questão mais
reflexiva: “Considerando que as receitas culinárias orientam as pessoas sobre como preparar
determinados pratos, responda: Por que predomina nesse tipo de texto o modo imperativo?”
(CEREJA; MAGALHÃES, 2012, p.227). A questão traz, em sua essência, a possibilidade de
os discentes reavaliarem os aspectos semânticos da receita para reformularem uma resposta
condizente com o que expressa o imperativo. Nesse tipo de atividade, também poderiam ter
sido exploradas as outras formas de (re)dizer o mesmo enunciado, mostrando, assim, ao
discente que a mesma ação pode ser anunciada de diversas formas.
No livro segue a exposição do conteúdo verbo minudenciando a flexão de tempo e
finaliza a abordagem dessa classe gramatical com o tópico Semântica e discurso. Deparamo-
nos, no final, com um exercício de dez questões, entre as quais três nos chamam atenção.
Seguem as questões numeradas, conforme aparecem no livro:
epilinguísticas, são bem menos frequentes. É relevante expor que optamos por não apresentar
imagens dessa série, porque não foi diretamente abordado o verbo no modo imperativo.
Na análise do livro do 8º ano, deparamo-nos com o estudo verbal como parte de uma
análise sintática. Nessa série, os autores tratam dos verbos impessoais, que são exemplificados
em frases, para que o discente perceba semanticamente o valor dos verbos em análise. Do
mesmo modo, também são exploradas as vozes verbais. Ao citar o modo imperativo, há o
emprego de um anúncio, que serve de mote para abordar a temática.
Figura 4 – Anúncio
Os recursos do gênero textual anúncio são bem explorados pelos autores do livro, a
exemplo dos aspectos referentes ao locutor, da ideia promovida pelo anúncio, da análise do
texto verbal e não verbal. Destaca-se ainda a presença do modo imperativo em algumas frases
do anúncio: “Dê um futuro melhor.”, “Junte-se ao Greenpeace.” Nessas frases, observemos as
formas verbais “dê e junte”, as quais os autores afirmam que se referem ao sujeito (você). De
acordo com a gramática normativa, essa afirmação se encontra adequada, todavia, acordados
com os reais usos da língua, encontramos situações em que o sujeito dessas formas verbais é a
segunda pessoa do singular (tu).
No anverso da página, além de expor que o modo imperativo “expressa uma ordem,
um pedido, uma recomendação”, (CEREJA; MAGALHÃES, 2012, p.108) os autores,
provocados pela pergunta “o modo imperativo é autoritário?”, esclarecem que:
Essas observações são relevantes para que, no uso concreto da língua, os falantes
utilizem o seu turno de modo adequado a fim de alcançar a interação desejada.
Dando continuidade ao estudo no referido capítulo, encontramos a explicação para a
constituição do imperativo: “é formado pelo presente do indicativo e pelo presente do
subjuntivo”. (CEREJA; MAGALHÃES, 2012, p. 108), formação essa também relatada nas
gramáticas tradicionais analisadas. Outra observação também merece destaque:
Bola de meia, bola de gude, de Milton Nascimento, e ainda trechos de notícias e reportagens.
Isso para mostrar a marca temporal dos verbos, ou seja, os tempos presente, pretérito e futuro
dos fatos relatados e ainda para mostrar se indicam ação, modo ou estado do ser ou fenômeno
da natureza.
Finalizando a explanação do assunto, com o tópico Hora de organizar o que estudamos,
as autoras resumem o conceito de verbo, a saber: “palavra que indica ação, qualidade ou
estado do ser a que se refere, fenômeno da natureza, localizando-os no tempo” (BORGATTO;
BERTIN; MARCHEZI, 2012, p. 182). Embora apresentem uma grande quantidade de
gêneros para chegar ao conceito de verbo, é inegável que as autoras deixam de lado aspectos
semântico-discursivos.
Notamos que, juntamente com a definição de indicação de ação, modo e fenômeno da
natureza, as autoras abordam as flexões de tempo, ou seja, a denominação de presente “fato
ocorrido mais próximo do momento em que a notícia é divulgada” (BORGATTO; BERTIN;
MARCHEZI, 2012, p.177) e usam o termo “hoje” na expressão “Hoje é assim”
(BORGATTO; BERTIN; MARCHEZI, 2012, p.179), reforçando a ideia de que em tal palavra
já está impregnada a ideia de presente.
No entanto, podemos questionar: será que, em situações reais de uso da língua, o
presente indicará apenas fatos relacionados ao hoje? Vejamos algumas ocorrências: “[...] é
bem difícil conseguir material escolar” (BORGATTO; BERTIN; MARCHEZI, 2012, p.177).
A forma verbal “é” se encontra no presente, porém, não indica a certeza de algo que ocorre
hoje e, sim, demonstra uma opinião do autor. Na frase “Neymar joga muito” (BORGATTO;
BERTIN; MARCHEZI, 2012, p.179), o verbo jogar no presente significa que ele joga só
agora? E, ainda, em “Sempre brinco de Nerf em casa.” (BORGATTO; BERTIN;
MARCHEZI, 2012, p. 180), a presença do advérbio “sempre”, acompanhando o verbo
“brincar”, não remete à ideia do hoje, mas a algo habitual, um processo verbal contínuo.
Assim, a ideia de presente nem sempre está restrita a situações relacionadas ao hoje e ao
agora, mas, sim, em contextos que demonstram opinião, ação habitual etc., como visto antes.
Como informado, no livro são apresentados seis gêneros textuais distintos para trabalhar
o conteúdo em questão. Embora seja bastante positiva a apresentação desse número e
diversidade dos gêneros, verificamos que esses servem apenas para responder a perguntas
referentes à identificação e classificação dos verbos. Nos trechos das reportagens estão
repletos de verbos, mas, na análise é solicitado aos discentes respostas a indagações do tipo:
“(1) Copie os verbos da fala de Tostão, jogador de futebol; (2) Copie as formas verbais que
marcam tempo passado; (3) Copie os verbos da fala da escritora Lygia Fagundes Telles.”
72
Ozzy usa o modo imperativo para fazer seu pedido, que está em uma
linguagem mais informal. Ele poderia dizer de vários modos:
_ Mãe!! Vou querer mais suco! (indicando futuro)
_ Mãe!! Quero mais suco! (indicando certeza no presente)
_ Mãe!! Queria mais suco! (indicando possibilidade)
_ Mãe!! Traga mais suco! (indicando uma ordem)
De quantos modos a mãe poderia responder usando a frase a seguir?
_ Não! Pode desligar a TV e ir dormir!
Indicando: Futuro, Possibilidade, Ordem (BORGATTO; BERTIN;
MARCHEZI, 2012, p. 234).
Finalmente, uma questão na qual o discente poderá efetivar o uso de sua língua, isto é,
a ele foi oportunizado o direito de empregar as suas falas. E, caso seja devidamente orientado,
produzirá suas frases almejando atender ao que lhe foi solicitado, procurando os efeitos de
sentidos que devem ser alcançados para uma adequada interação na situação comunicativa em
que as personagens estão envolvidas. Assim, o aprendiz poderá reconhecer na língua da
escola sua língua e aprenderá que há uma variante de prestígio, que pode ser apreendida e
empregada para fins específicos. Eis os aspectos semânticos, pragmático-discursivos sendo
contemplados no livro didático, mesmo que de maneira tímida.
74
No livro do 7º ano, são abordados os usos das conjugações (1ª- ar, 2ª- er, 3ª- ir), das
flexões de pessoa e número, dos tempos (presente, pretérito perfeito, imperfeito, mais-que-
perfeito, futuro do presente e do pretérito) e os modos (indicativo, imperativo, subjuntivo). Ao
modo imperativo é produzido o mesmo conceito exposto no livro do 6º ano. As atividades
propostas também são análogas: dispõem-se trechos de notícias para listar os verbos,
identificar os modos e a intenção do uso de cada modo. Isso é importante, porém, não
contribui muito para um processo de aprendizagem significativo.
No livro do 8º ano, somente encontramos referências à transitividade verbal ao
analisarmos o predicado verbal.
Verificamos, ao término dessa análise, que Projeto Teláris, de Borgatto, Bertin e
Marchezi, assim como o livro Português Linguagens, de Cereja e Magalhães, ainda
apresentam os gêneros textuais como pretexto para se retirar os verbos. Quanto às questões,
percebemos que o trabalho com os efeitos de sentidos, na coleção ora analisada, é bem mais
imperceptível do que na apresentada anteriormente. Não obstante, os enunciados que
elucidam conceitos das circunstâncias verbais, no Projeto Teláris, não dão conta da língua em
uso e nem do significado do conceito como um todo, deixando lacunas na compreensão
semântica.
Figura 7 – HQ
75
A partir do levantamento das ações, solicitado através das questões, as autoras definem
verbo, assim como a maioria dos autores dos livros didáticos analisados. Vejamos:
Observamos que tudo que já foi questionado e discutido neste trabalho, em relação às
definições expostas nas gramáticas tradicionais e/ou nos outros livros didáticos sobre verbo e
modo imperativo, poderia ser analisado no livro que agora está em foco. Entretanto, citaremos
apenas os conteúdos relacionados aos verbos destacados em cada livro dessa coleção.
Nesse sentido, no volume do 6º ano, além da definição já retratada, também foram
exploradas as acepções de conjugações, locuções verbais, flexões de número, pessoa, tempo e
modos. No que tange aos modos, nesse volume, foi trabalhado o modo indicativo.
No livro do 7º ano, observamos que é abordado o aspecto morfológico, ou seja, como
são formados os verbos, sua estrutura, as formas nominais, os verbos regulares e irregulares e
as particularidades dos modos subjuntivo e imperativo. Este último é representado da mesma
forma que nos demais livros.
76
persuadir, informar, distrair? Os textos foram selecionados apenas por trazerem verbos que
serviam à análise desejada, a saber, identificação e classificação do que indicam (ação, estado
ou fenômeno da natureza). Sobre tal enfoque, Marcuschi (2008) comenta:
Consideramos que seria conveniente, ao se expor um texto, que a análise fosse feita
segundo a finalidade de produção e compreensão textuais, considerando a linguagem, as
frases e imagens empregadas, suas funções discursivas, seus significados. Enfim, tornar a
observação dos recursos presentes no texto elementos-chave para a produção de sentido, que
permita aos leitores o direito à reflexão crítica dos textos. Para isso, realizaria discussões
significativas, enriquecedoras, fazendo-os perceber o texto como algo dinâmico e, só depois,
partiria para uma análise gramatical que também envolva a dinâmica do texto e dos seus
recursos.
Diante dessas considerações, a rigor, podemos afirmar que a gramática reflexiva não
faz parte da construção do conteúdo aqui analisado na maior parte dos livros didáticos
pesquisados e, ainda, que a norma que subjaz nas abordagens é a norma única, ditada pela
prescrição da Tradição Gramatical. Cabe a nós, na condição de professores de Língua
Portuguesa, refletirmos, explorarmos essas definições e não simplesmente aceitá-las e
repassá-las como paradigma a ser seguido.
Na análise das gramáticas tradicionais e dos livros didáticos mencionados, notamos
que, em todos eles, ao se conceituar verbo, há o emprego de “exprimir o que se passa” ou
“indicar ações”. É interessante refletirmos sobre o uso dessas expressões, pois, se
considerarmos o significado a que elas nos remetem, poderíamos classificar alguns
substantivos como verbos. Temos como exemplos os substantivos derivados de verbos, como
a dança, o canto, a corrida, a luta etc., que carregam semanticamente a ideia de ação, de
procedimento.
Assim, é imprescindível um ensino em que se utilize a gramática reflexiva para não
corremos o risco de realizarmos uma classificação equivocada. Valemo-nos de Neves (2013),
que, ao falar sobre o caráter “ritual” do ensino tradicional de gramática, argumenta:
78
3 METODOLOGIA
metodologia de análise das respostas dadas às atividades e, por fim, trouxemos um sucinto
comentário sobre a proposta de intervenção. É relevante mencionar que a atividade de
sondagem foi aplicada em turmas de 6º, 7º e 8º anos, entretanto a proposta de intervenção só
foi trabalhada no 8º ano7.
Acreditamos que, ao abordarmos os aspectos semânticos, pragmáticos e discursivos da
classe gramatical verbo, em diferentes contextos de interação comunicativa, estamos
contribuindo para um estudo produtivo da língua, além de estarmos promovendo uma prática
pedagógica inclusiva, na qual não só uma norma seria privilegiada, mas, sim, um rol de
variedades linguísticas seria contemplado para que os estudantes possam adequá-las às suas
demandas diante das diversas situações reais de uso da língua.
3.1 A ESCOLA
A pesquisa, para darmos conta do objeto de estudo Uma proposta para o ensino do
imperativo em uma perspectiva semântica, pragmática e discursiva, foi desenvolvida no
Centro Municipal de Educação Agamenon Santana – CMEAS, cuja foto é apresentada na
página seguinte, figura 8, localizada na Rua Donizete A. de Lima Azevedo, está situada em
um local que é bastante frequentado pelos cidadãos brumadenses, em função de ser
circundada pelo fórum, hospital, delegacia e posto de saúde do bairro.
7
A proposta de intervenção só foi trabalhada no 8º ano, devido à indisponibilidade da carga horária nas turmas
de 6º e 7º anos.
80
O colégio, relativamente grande, é constituído por quase trinta salas, cuja utilização é
feita da seguinte forma: 14 salas de aula, biblioteca, sala de informática, sala de vídeo,
laboratório de Ciências, diretoria, secretaria, sala de professores, sala de coordenação, sala de
reforço escolar, cantina, almoxarifado, entre outras dependências. A instituição também
possui uma cozinha, sanitários masculinos e femininos, um amplo auditório em sua lateral
esquerda e uma extensa quadra esportiva coberta em sua lateral direita.
Figura 9 – CMEAS
8
Disponível em: <https://www.google.com.br/maps/place/R.+Donizete+A+de+Lima+Azevedo+-
+Nobre,+Brumado+-+BA,+46100-000/@-14.203014,-
41.6752956,358m/data=!3m1!1e3!4m2!3m1!1s0x7444bf95cebd0e1:0x68108567d2bf6448>. Acesso em agosto
de 2015.
81
anos. Todas as turmas possui uma média de 30 (trinta) educandos. No noturno, encontram-se
os discentes da EJA I e II e, nos turnos diurnos, os do Ensino Fundamental II.
A grande maioria dos escolares é oriunda de bairros próximos, sendo uma pequena
minoria migrante da zona rural, que não oferece o segmento II do Ensino Fundamental. Esses
discentes são considerados procedentes de famílias de classe média baixa. O acesso à unidade
escolar é realizado através de ônibus disponibilizados pela prefeitura. Alguns discentes da
zona urbana que residem mais distantes da escola, no entanto, utilizam transportes
particulares ou coletivos (como vans) para se deslocarem à instituição.
O horário de funcionamento da escola obedece à seguinte sequência: turno matutino –
funcionamento das 7h às 11h30min; turno vespertino – funcionamento das 13h às 17h30min;
turno noturno – funcionamento das 19h às 22h. No diurno, são disponibilizados intervalos de
15 minutos para a merenda, preparada na escola. No noturno, apesar de não haver intervalo, a
merenda é servida durante as aulas, dentro da sala.
Muitos são os projetos implantados na escola, com o intuito de assessorar o processo
de ensino-aprendizagem, tais como: Projeto de leitura, Projeto de reforço escolar, Gincana
multidisciplinar, Projeto em prol do meio ambiente, Cultura literária, Esporte na escola,
Orientação educacional, Orientação familiar, entre outros.
Para a realização da pesquisa, inicialmente, conversamos com a gestão escolar sobre o
objetivo da nossa proposta e solicitamos sua autorização, através de termo escrito. Aos pais
ou responsáveis, a quem entregamos o Termo de Consentimento (Cf. Anexo 2), comentamos
sobre os eventuais riscos e desconfortos como cansaço físico e mental que os participantes
poderiam sofrer ao realizar as atividades propostas e, por notarem a presença dos
pesquisadores nas aulas, por curiosidade e para chamar a atenção, poderiam realizar conversas
paralelas prejudicando o andamento das aulas. Para amenizar estes desconfortos,
pretendemos nos apresentar a priori, informando o motivo da nossa presença a fim de
satisfazer todas as suas curiosidades. Nesse termo, também se encontram as vantagens como o
desenvolvimento da competência sociocomunicativa, a compreensão consciente e reflexiva do
conteúdo verbo, o emprego eficaz dos verbos nas diversas situações de uso etc., que os
discentes poderiam obter por participarem da pesquisa para que, depois de esclarecidos, eles
pudessem permitir ou não a participação de seus filhos. Aos discentes, foram solicitadas
assinaturas do Termo de Assentimento (Cf. Anexo 1), que continha o mesmo texto do
documento assinado pelos pais ou responsáveis. Todos foram esclarecidos de que a
participação na pesquisa era livre. Dessa maneira, os educandos e seus responsáveis tinham
consciência de que a sua participação em nossa pesquisa não era obrigatória.
82
3.2 AS ATIVIDADES
A atividade de sondagem (Cf. Anexo 3) foi aplicada em três turmas distintas de 6º, 7º e
8º anos. As atividades, assim que respondidas, foram recolhidas e analisadas, comparando as
respostas das três turmas e apresentando o resultado através de gráficos. A atividade foi
composta de 04 (quatro) questões de produções escritas.
Na questão (1), estabelecemos, como objetivo, que os discentes produzissem frases
adequando-as às situações de interações propostas, como se segue abaixo.
1. Imagine as situações descritas abaixo. Depois, produza frases que indiquem ordem e que
sejam adequadas ao contexto nas quais as pessoas estão interagindo.
a) Uma mãe muito brava e impaciente exige que seu filho indisciplinado faça a tarefa de casa.
b) Um pai carinhoso e compreensivo pede ao filho indisciplinado para que ele faça a tarefa de
casa.
c) A irmã mais nova do menino indisciplinado aconselha-o para que ele faça a tarefa de casa.
d) Um amigo rebelde do menino indisciplinado também ordena que ele faça a tarefa de casa.
Tais questões foram respondidas por escrito. Nessa atividade, o foco central da análise
pretendida, o emprego do modo imperativo, não foi informado para os discentes. Apenas a
ideia de ordem, exigência, pedido, conselho aparece de forma explícita nas questões.
É relevante expor que, após a análise das respostas de cada questão, escolhemos alguns
enunciados9, produzidos pelos discentes das três turmas, que consideramos criativos ou que já
estão sendo muito empregados no dia-a-dia.
Para a questão (2), elaboramos:
(2) Procure apontar em que condições cada uma das ordens abaixo pode e/ ou deve ser usada
e se há diferenças de sentido entre elas.
a) Façam a prova em silêncio!
b) Façam a prova, por favor!
c) Faz a prova direito!
9
Nos enunciados, a identificação dos escolares foi realizada através das inicias de seus nomes.
84
(3) Levante o maior número de frases que podemos empregar para determinar que alguém
apague a luz de uma sala de aula.
(4) Observe atentamente as imagens a seguir, retiradas das histórias em quadrinhos do escritor
Maurício de Souza. Procure escrever frases imperativas de acordo com as sugestões abaixo:
a) Ordens da professora ao personagem Chico Bento.
b) Pedidos do Cascão ao Cebolinha.
c) Conselhos do personagem Anjinho à turma.
Nesta questão, está apresentado o mesmo objetivo da anterior, porém, para respondê-
las, os alunos precisarão produzir enunciados não apenas a partir dos textos verbais, mas
também, dos textos não verbais, como imagens da Turma da Mônica, do escritor Maurício de
Souza.
A finalidade essencial de cada questão, proposta por nós, foi a de que o aluno
produzisse um texto por meio da qual se manifestasse, livremente, mesmo seguindo um
roteiro, trazendo à tona, dessa forma, a sua compreensão de mundo. Nesse sentido, buscamos
não apenas levantar dados, mas fazer com que os participantes percebessem a língua como
forma de expressão em situações de usos diversos.
10
Ao referimo-nos à sequência didática, recorremos à concepção utilizada por Marcushi (2008) que relata ser
um tipo de metodologia de ensino, realizada a partir de gêneros textuais diversos.
86
sondagem para constatarmos o que os escolares conhecem sobre verbo e como aplicam esses
conhecimentos em relação ao modo imperativo.
Em um momento posterior, apresentamos uma proposta de intervenção pedagógica,
almejando uma prática eficaz e, consequentemente, uma tentativa de sanarmos esse trauma,
que muitos possuem da gramática da Língua Portuguesa.
É relevante expor que o foco da nossa atividade não é ensinar o discente a conjugar o
verbo e, em particular, o modo imperativo, como objetiva a gramática normativa, mas
proporcionar-lhe reflexões acerca das possibilidades de usos dos verbos, sobretudo do modo
imperativo, em cada contexto de interação que se fizer necessário. Para tanto, necessitamos
verificar como se encontram as habilidades dos escolares em produzir frases coerentes na
construção do discurso e para perceber como o modo imperativo é apresentado nesses
enunciados e refletir sobre isso. Articulamos, dessa forma, as habilidades sociocomunicativas
e os conhecimentos morfossintáticos, semânticos, pragmáticos e discursivos.
A atividade completa encontra-se em anexo nesta dissertação. Esclarecemos que a
atividade foi aplicada em três turmas distintas: 6º, 7º e 8º anos. Foi utilizada, em cada classe,
uma média de cinco aulas para a consecução da investigação. As duas primeiras aulas foram
destinadas à apresentação do discente pesquisador e, por conseguinte, dos objetivos de sua
pesquisa e à observação da turma. Além disso, aos escolares integrantes da pesquisa foram
dados os devidos esclarecimentos sobre a sua forma de participação na investigação e, por
escrito, àqueles que demonstraram interesse em participar, foram solicitadas assinaturas dos
pais ou responsáveis nos Termos de Consentimento e assinatura no Termo de Assentimento
dos participantes menores. A terceira aula teve como propósito único recolher os Termos de
Consentimento e de Assentimento e verificar, a partir do retorno, a quantidade de discentes
que participaria da pesquisa. As duas aulas que restavam foram destinadas à aplicação da
atividade de pesquisa. O 8º ano respondeu as questões em uma única aula; os demais
utilizaram integralmente as duas últimas aulas para terminar a atividade.
Nossa intenção com a atividade é, como já dito, verificar como os discentes empregam
a linguagem escrita em diversas situações. Lembrando que a elaboração se deu a partir das
leituras de diversos autores, com ênfase em Travaglia (2009; 2011; 2013) e Ferrarezi Junior
(2014). Ou seja, a atividade adota uma perspectiva mais inovadora no trabalho com a
gramática, diferente de muitas outras atividades que cobram um conhecimento linguístico
engessado por uma visão reducionista e sem nenhuma relação com o uso e funcionamento da
língua.
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(1) Imagine as situações descritas abaixo. Depois, produza frases que indiquem ordem e que
sejam adequadas ao contexto em que as pessoas estão interagindo.
a) Uma mãe muito brava e impaciente exige que seu filho indisciplinado faça a tarefa de casa.
b) Um pai carinhoso e compreensivo pede ao filho indisciplinado que ele faça a tarefa de casa.
c) A irmã mais nova do menino indisciplinado aconselha-o para que ele faça a tarefa de casa.
d) Um amigo rebelde do menino indisciplinado também ordena que ele faça a tarefa de casa.
Fonte: Dados das respostas das atividades de três anos distintos, levantados em nossa pesquisa.
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a) Uma mãe muito brava e impaciente exige que seu filho indisciplinado faça a tarefa de casa.
(1) “Larga de preguiça, caminha pro quarto e faça a tarefa.” (RFC, estudante do 8º ano)
(2) “Bora bora bora, não quero nem saber.” (FRSP, estudante do 8º ano)
(3) “Filho, vai fazer a tarefa agora, estou mandando!” (MOR, estudante do 8º ano)
(4) “Faça imediatamente a tarefa!” (IBPS, estudante do 7º ano)
(5) “Primeiro a responsabilidade, depois a brincadeira.” (AFL, estudante do 7º ano)
(6) “Anda logo, vai fazer a tarefa.” (RSR, estudante do 6º ano)
b) Um pai carinhoso e compreensivo pede ao filho indisciplinado que ele faça a tarefa de casa.
(7) “Ô pai vai fazer a tarefa vai.” (GLO, estudante do 8º ano)
(8) “Filhinho, vai fazer por favor a tarefa!” (MOR, estudante do 8º ano)
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(9) “Por favor querido vai fazer a lição de casa vai.” (NVJA, estudante do 7º ano)
(10) “Filha vamos fazer a tarefa.” (VSA, estudante do 7º ano)
(11) “Ei, fazer a tarefa de casa e estudar filho.” (KMM, estudante do 6º ano)
(12) “Filhinho faça a tarefa.” (ACCS, estudante do 6º ano)
c) A irmã mais nova do menino indisciplinado aconselha-o para que ele faça a tarefa de casa.
(13) “Faça seu dever antes que a mãe brigue.” (ACNL, estudante do 8º ano)
(14) “Menino é para o seu bem anda, vai fazer sua tarefa.” (RFC, estudante do 8º ano)
(15) “Faça a tarefa para ficar inteligente.” (AFL, estudante do 7º ano)
(16) “Faça sua tarefa, será melhor para você.” (PSS, estudante do 7º ano)
(17) “Corre o pai tá chegando faça a tarefa.” (KMM, estudante do 6º ano)
d) Um amigo rebelde do menino indisciplinado também ordena que ele faça a tarefa de casa.
(18) “Faça agora mesmo essa tarefa, cara!” (LBL, estudante do 8º ano)
(19) “I esse rolê ai tá constando, faz a lição logo doido.” (MHSS, estudante do 8º na)
(20) “Faça a tarefa e depois me passa as respostas!” (LMNA, estudante do 7º ano)
(21) “Faz logo o bagulho ai, moço!” (AFL, estudante do 7º ano)
(22) “Ô cabeça vai fazer não segue o meu exemplo.” (JESSS, estudante do 6º ano)
(23) “Sem noção faz a tarefa já.” (LRRA, estudante do 6º ano)
(2) Procure apontar em que condições cada uma das ordens abaixo pode e/ou deve ser usada e
se há diferença de sentidos entre elas.
a) Faça a prova em silêncio!
b) Façam a prova, por favor!
c) Faz a prova direito!
Fonte: Dados das respostas das atividades de três anos distintos, levantados em nossa pesquisa.
Concluímos que, por estarem num nível aquém dos outros, se bem que isso não é
determinante, visto que o conhecimento de mundo de cada um é diferente e, logo, a
capacidade de interpretação, alguns alunos ainda precisam refletir mais e melhor sobre o que é
solicitado nos enunciados. Por parte dos docentes, como consequência, é necessário que
realizem uma revisão mais rigorosa dos enunciados nas atividades que são cobradas para que
os escolares não sejam prejudicados nos exercícios em função de uma linguagem que esteja
além de sua capacidade de compreensão e interpretação e, portanto, inapropriada.
Avançando em nossa análise, com a finalidade de refletir se os discentes conseguem
empregar o imperativo adequando-o às situações de interações sugeridas, apresentamos:
(3) Levante o maior número de frases que podemos empregar para determinar que alguém
apague a luz de uma sala de aula.
Fonte: Dados das respostas das atividades de três anos distintos, levantados em nossa pesquisa.
Observamos que, nas três turmas investigadas, houve uma média acima de 76% na
análise de elaboração de enunciados no modo imperativo. No entanto, no 8º ano, encontramos
escolares que não conseguiram atender ao que foi solicitado no enunciado embora tenham
produzido sentenças imperativas. Verificamos que isso se deve à distração, pois, no enunciado
da questão, solicitamos que fossem construídas frases para determinar que alguém desligasse
a luz de uma sala de aula, e, ao invés disso, alguns poucos discentes construíram frases
determinando que se acendesse a luz. A falta de atenção, provavelmente, contribuiu para
prejudicar o desempenho em relação ao que foi proposto no exercício. Chamou-nos atenção
93
um discente do 7º ano, que respondeu ao comando da questão criando distintas ordens sobre
diferentes assuntos, atitude que também sinaliza falta de atenção ao que está descrito e é
solicitado na questão.
Esclarecemos que caracterizamos algumas respostas como “às vezes” porque, na
maior parte dos casos, ponderamos as poucas construções elaboradas pelos discentes, isto é,
havia espaço de 12 (doze) linhas para produção de, no mínimo, 5 (cinco) enunciados
diferentes sobre a proposta. Porém, seja por descaso, comodismo e/ou falta de criatividade,
fatores bastante presentes no espaço sala de aula, houve casos em que os discentes criaram
somente dois ou três enunciados. É relevante frisar que, no momento da aplicação, tanto o
discente pesquisador quanto o professor regente da classe incentivaram oralmente e até
explicavam alguns pontos para que os alunos realizassem a produção com êxito.
Fundamentamos essa questão, em específico, no seguinte exemplo apresentado por
Travaglia (2011): “(A) Levante o maior número de formas que podemos utilizar para
determinar que alguém faça algo.” (TRAVAGLIA, 2011, p. 17). Nesse sentido, pretendemos
demonstrar que nosso estudo busca promover um ensino pertinente de gramática para a vida
dos escolares, um ensino de gramática no qual os recursos linguísticos estarão disponíveis
para os interlocutores de textos construírem sentidos. Desse modo, é irrelevante a discussão
sobre a presença do verbo no modo imperativo, indicativo ou subjuntivo. O que importa é
discutir qual a diferença de sentidos nas diferentes formas de ordenar, solicitar, aconselhar
etc. e em quais situações podem ser mais adequadas à produção de sentidos e ao objetivo de
cumprir o que está sendo instigado.
Levando isso em consideração, percebemos que os discentes apresentaram um bom
desempenho ao responder essa terceira questão, pois, além de construírem muitas frases
usando o imperativo de forma explícita e direta, criaram também muitos enunciados que
dependem do contexto, dos interlocutores para que haja atribuição de sentido. Oportunizados
a desenvolver habilidades como essa, os escolares se tornarão usuários competentes da língua.
Vejamos, então, a seguir algumas dessas construções que demonstram como os discentes
conseguem articular aspectos pragmáticos/semânticos na produção de discursos coerentes:
(24) “Essas luzes estão atrapalhando a minha escrita.” (FERL, estudante do 8º ano)
(25) “Você não acha que tem que apagar esta luz não?” (BSP, estudante do 8º ano)
(26) “Tô enxergando nada, tá um clarão.” (ECCJ, estudante do 8º ano)
(27) “Meu olho está doendo, desligue a luz.” (PSS, estudante do 7º ano)
(28) “Quero que apague a luz.” (IBPS, estudante do 7º ano)
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(29) “Está muito claro aqui, minhas vistas estão doendo.” (JAS, estudante do 6º ano)
(30) “Se tivesse um pouco escuro seria melhor né.” (MSL, estudante do 6º ano)
(31) “Esta gastando energia a lâmpada ligada.” (FR, estudante do 6º ano)
(4) Observe atentamente as imagens a seguir, retiradas das histórias em quadrinhos do escritor
Maurício de Souza. Procure escrever frases imperativas de acordo com as sugestões abaixo.
É importante salientar que não estamos questionando o uso do modo imperativo, que,
diga-se de passagem, está perfeita, mas, sim, a questão semântica. O mesmo aprendiz escreve
para a mesma questão duas frases imperativas com ideias opostas. Contudo, atentando-nos
melhor para os enunciados, podemos aceitá-los como pertinentes ao que foi solicitado, pois,
de acordo com a perspectiva semântica, pragmática e discursiva, aos interlocutores é dada a
incumbência de suscitar toda uma carga de sentidos possíveis para que haja a interação.
Assim, compreendemos que, possivelmente, o escolar, ao produzir o enunciado (32)
“desenhar a Mônica errada”, talvez estivesse solicitando que desenhasse alguém ou algo que
não fosse a Mônica, confirmando, no enunciado (33), a ideia de que não era para desenhar as
meninas, ou seja, desenhasse quaisquer pessoas ou seres, menos as personagens da tira.
Para essa mesma alternativa, outro discente (NEAA, estudante do 8º ano) respondeu
empregando o discurso indireto e o modo subjuntivo, como podemos observar nas frases a
seguir. Aqui, cabe uma melhor reflexão entre o docente e o discente a fim de esclarecer a
questão com o propósito de adaptar melhor as respostas ao enunciado.
(34) “Que desenhasse a cara da Mônica com dente grande.” (NEAA, estudante do 8º ano)
(35) “Que pintasse a Mônica e a Magali feia.” (NEAA, estudante do 8º ano)
Nesse caso, criou-se uma frase exclamativa, o que foge da proposta sugerida.
Entretanto, caso você, leitor, encontre uma possível explicação para o uso desse enunciado,
pode-se afirmar que o enunciado é adequado.
Fonte: Dados das respostas das atividades de três anos distintos, levantados em nossa pesquisa.
Para as demais questões, houve criações coerentes, porém insuficientes para o que foi
solicitado.
O que esperávamos demonstrar com a análise da atividade aplicada é que,
necessariamente, não precisávamos priorizar a definição de verbo, de modo imperativo e nem
elaborar uma quantidade enorme de exercícios que abrangessem os conceitos, que
destacassem os verbos nos textos e que exigissem a elaboração das cansativas tabelas de
conjugação verbal etc.
Tão somente propomos situações nas quais os aspectos semânticos (significado), os
pragmáticos e discursivos (como e o que foi feito da linguagem, qual a intenção do falante,
que contexto de interação para produção de sentidos poderia ser utilizado) sejam
contemplados. Assim, os escolares se conscientizariam de que a língua dispõe de recursos
essenciais para a produção de sentidos e interação social. Acreditamos que a dificuldade
encontrada na efetivação da atividade aconteceu, provavelmente, devido ao fato de os alunos
não estarem habituados a atividades do tipo epilinguísticas.
fim de promover o ensino do modo imperativo de forma pertinente à vida dos educandos,
desenvolvendo a competência Sociocomunicativa. Por último, relatamos como se deu a
aplicação da proposta, a receptividade pelos discentes e o resultado final.
A linguagem é intrínseca aos seres humanos, pois qualquer indivíduo que possui
acesso à linguagem, a partir dos primeiros anos de vida, apreende todo um conjunto de regras
que lhes possibilitam acionar a gramática de sua língua. Nesse sentido, qualquer criança de 4
e 5 anos, que não apresente nenhuma irregularidade em suas faculdades cognitivas, consegue
formular frases coerentes, compreender enunciados, realizar hipóteses de interpretação,
porque domina a estrutura de sua língua. Nesse sentido, afirma Possenti (2012):
Saber falar significa saber uma língua. Saber uma língua significa saber uma
gramática. [...] Saber uma gramática não significa saber de cor algumas
regras que se aprendem na escola, ou saber fazer algumas análises
morfológicas e sintáticas. Mais profundo do que esse conhecimento é o
conhecimento (intuitivo ou inconsciente) necessário para falar efetivamente
a língua (POSSENTI, 2012, p. 30).
Franchi (2006) também compartilha dessa mesma concepção ao afirmar que todo
usuário de uma língua é dotado de “uma gramática interna (de natureza biológica e
psicológica) ou, pelo menos, a interioriza já em tenra idade, a partir de suas próprias
experiências linguísticas” (FRANCHI, 2006, p. 25). Dessa forma, cabe ao docente o
planejamento e elaboração de diferentes atividades linguísticas orais, escritas, de produção e
leitura de textos, possibilitando aos discentes atuarem, de maneira significativa, sobre elas.
Contudo, o que ocorre de fato é que o estudo com a gramática se resume a meros
exercícios de metalinguagem e as atividades epilinguísticas são deixadas à margem das
discussões. Neves (2010), em uma pesquisa realizada em São Paulo, fez o seguinte
questionamento aos professores: “Para que você ensina gramática?”. Podemos depreender
das respostas dois conceitos básicos que os professores de 1º e 2º graus (termos utilizados
pela autora na época da produção do referido texto) possuem sobre gramática: “1. Gramática
como um conjunto de regras de bom uso (gramática normativa); 2. Gramática como descrição
das entidades da língua e suas funções (gramática descritiva)”. (NEVES, 2010, p. 40).
Observamos que os participantes (na condição de docentes da instituição pesquisada)
não demonstraram conceber gramática como o próprio sistema de regras da língua em
98
funcionamento, assim, presumimos que as atividades de reflexão e ação sobre a língua em uso
ficam comprometidas. É nessa perspectiva que o trabalho com a gramática é questionado.
Travaglia (2009) expõe que:
A partir disso, podemos sugerir aos docentes que procurem produzir exercícios nos
quais os escolares possam usar verbos, com seus diferentes sentidos, em determinados
contextos. Podemos citar como exemplos: (a) “Maria, dance ao som da música!”; (b)
“Tomara que você dance dessa vez! Você nunca estuda.” Independentemente dos verbos
estarem, respectivamente, nos modos imperativo e subjuntivo, poderíamos questionar: Quais
as diferenças de sentidos ocasionadas pelo verbo “dançar” nos dois enunciados?
Notem que, no enunciado (a), o verbo “dançar” significa desenvolver movimentos
corporais ao ritmo de uma música, enquanto que, no enunciado (b), o verbo “dançar” adquire
a ideia de fracassar, ou, conforme a gíria, “se dar mal”. Ao realizar reflexões como essas, os
aprendizes reconhecem e se apoderam dos efeitos de sentidos produzidos pelos recursos que a
língua lhes disponibiliza. É dessa maneira que pretendemos conduzir o ensino de verbo, é
dessa maneira que entendemos que deva ser o ensino da gramática.
Dito isso, podemos acrescentar no momento a questão das variedades linguísticas,
assunto abordado por nós na subseção 1.3. Necessitamos deixar evidente aos estudantes que
todas as variedades são igualmente válidas, porém, em nosso país, devido a fatores
linguísticos e extralinguísticos, a variedade culta acabou sendo transmitida nas instituições
escolares como única, como a padrão. Todavia, como afirma Travaglia (2011), é
indispensável esclarecer que a variedade culta é só mais uma entre as inúmeras variedades
que a sociedade dispõe, adaptada para o uso em uma série de situações. Assim, o falante será
um bom usuário da língua caso, numa situação de comunicação especifica, souber empregar
os recursos da língua para atingir seus objetivos comunicativos na interação com o outro.
100
Então, podemos concluir que o enfoque pragmático é relevante, pois está relacionado
ao que e como falamos, em quais situações e com quais finalidades. Para evidenciar o
aspecto pragmático, podemos imaginar uma situação que é bastante comum nas salas de aula.
Observemos o seguinte exemplo: o docente escreve algum conteúdo no quadro para que os
discentes transcrevam. A sala é bem iluminada pelos raios de sol, e, em função disso, os
estudantes reclamam: (i) “As janelas, professora!”. O docente, cônscio de que os reflexos
dificultam a visão do quadro, pacientemente fecha as janelas. Após alguns minutos, com a
sala fechada, o sol forte, e os ventiladores que, na maioria das vezes, não funcionam, o calor
aumenta, e os alunos suplicam: (ii) “As janelas, professora!”.
Nesse momento, a partir de um mesmo enunciado “As janelas, professora!”, a docente
é levada a agir de forma totalmente contrária a que agiu no momento anterior. Percebemos
que os mesmos sintagmas, a mesma estrutura sintática produziram efeitos de sentidos
antagônicos: fechar e abrir as janelas. Se analisássemos os enunciados (i) e (ii) fora desse
contexto, eles não produziriam, provavelmente, entendimento algum, não haveria
101
comunicação. Assim, analisar a língua somente sob a ótica da sintaxe pode limitar, por vezes,
as possibilidades semânticas, pragmáticas e discursivas dos enunciados.
Nessa perspectiva, Travaglia (2011) apresenta a proposta de análise seguinte, na qual
poderíamos pensar e em um exemplo de situação em que a aplicação de cada texto seria
adequado:
a - Feche a janela!
b - Feche a janela, imediatamente! (ordem peremptória)
c - Feche a janela, por favor.
d - Feche a janela, já!
e - Você pode fechar a janela?
f - Você pode fechar a janela, (para mim), (por favor).
g - Você podia fechar a janela, (por favor).
h - Você poderia fechar a janela, (para mim), (por favor).
i - Está um vento frio aqui.
j - Te incomodaria fechar a janela?
l - Te agradeço, se você fechar a janela.
m - Está frio. Não te incomoda a/esta janela aberta?
n - É conveniente fechar a janela (porque está ventando frio).
o - Eu gostaria de fechar a janela. A corrente de ar me faz mal
(TRAVAGLIA, 2011, p. 23).
Com essa sugestão de Travaglia (2011), podemos concluir em que consiste uma
educação linguística. Entendemos que passa pela abordagem de uma diversidade de
atividades formais ou informais, oferecendo ao aprendiz uma gama maior de recursos da
língua, possibilitando o conhecimento dos mesmos, a fim de capacitá-los para discernirem em
quais contextos de interação esses recursos podem ser aplicados para atingir o efeito de
sentido almejado.
Travaglia (2011) ainda prossegue argumentando sobre o que uma educação
linguística, propondo que, nesta, sejam consideradas as construções estéticas, ou seja, seria
possibilitado ao discente ampliar o gosto linguístico. Não obstante, ele esclarece que não está
propagando que se transforme o falante de uma língua em um literato, porém, é, de suma
importância, que o usuário da língua desenvolva sempre mais habilidades e disponha, assim,
de mais alternativas diante das situações as quais está exposto.
Verificamos que Bagno (2011), também propõe um estudo de língua à luz da sintaxe, da
semântica e da pragmática, objetivando um resultado mais proveitoso. Além do mais,
constatamos que o linguista é bastante categórico em apresentar, sob a visão dos estudos
funcionalistas, que o estudo do verbo nessa tríade converge para a produção do discurso. “O
discurso é a língua em uso, a língua como atividade sociocognitiva, intrinsecamente
102
dialógico.” (BAGNO, 2011, p. 483) Igualmente, podemos averiguar o que Gomes (2009)
relata sobre o estudo da língua no aspecto discursivo:
Avaliando a linguagem sob essa dimensão, entendemos o motivo de ela ser tão
encantadora e diversificada, uma vez que os efeitos de sentidos obtidos em determinadas
situações são mutáveis, mesmo porque os contextos se modificam, os falantes podem ser
influenciados pelos valores culturais, ideológicos, afetivos, e as intenções comunicativas
também variam promovendo efeitos de sentido diversos. Assim é a língua abordada numa
dimensão discursiva. Por essa ótica, a língua deixa de ser unicamente um conjunto de signos
com significado e significante, bem como deixa de ser um conjunto de regras da gramática
para tornar-se um fenômeno social vivenciado na prática interativa.
Essa abordagem é corroborada por Antunes (2009), quando afirma que “Dessa forma,
todas as questões que envolvem o uso da língua não são apenas questões linguísticas; são
também questões políticas, históricas, sociais e culturais.” (ANTUNES, 2009, p. 21). Nesse
sentido, a língua não pode ser vista apenas sob a ótica de uma gramática de normas, mas, sim,
como um conjunto sistemático, heterogêneo, móvel, na qual uma diversidade de falares é
oportunizada ao falante para propiciar uma interação verbal mais adequada entre os grupos
humanos presentes na sociedade.
Portanto, o que esperamos é que o discente consiga apreender toda essa dimensão que
a língua consegue abranger, levando em conta os aspectos semânticos, pragmáticos e
discursivos como imprescindíveis no processo de interação sociocomunicativo. Assim,
mostrando os estudos que nos ancoraram na elaboração da proposta de intervenção
pedagógica, passemos à sequência didática.
Objetivo geral
Desenvolver a competência comunicativa dos aprendizes, possibilitando, sobretudo,
que se apropriem dos diversos sentidos que os enunciados no modo imperativo possam
veicular.
Série
8º ano
Tempo estimado
06 aulas
prática pedagógica eficaz e pertinente que possibilite aos aprendizes uma interação mais
adequada às suas necessidades sociocomunicativas.
Justificativa
Tendo como premissa que a disciplina Língua Portuguesa não pode ficar alheia ao real
funcionamento da linguagem, muito menos se prender a exercícios de fixação de conteúdos,
nos quais são cobradas frases isoladas para identificação das classes gramaticais e nas quais a
língua-padrão é concebida como única e legítima, foi desenvolvida esta sequência didática,
com a finalidade de proporcionar aos aprendizes reflexões a respeito dos usos linguísticos e
da necessidade da adequação dos enunciados às distintas situações de interação
sociocomunicativas. Sobre a prática a ser repensada comenta Neves (2013):
Dessa forma, optamos por apresentar o modo imperativo dentro de uma multiplicidade
de gêneros textuais, citados anteriormente, presentes no cotidiano da maioria dos discentes,
com uma linguagem acessível, valorizando os conhecimentos prévios dos aprendizes e
articulando os conhecimentos de natureza semântica, pragmática e discursiva, a fim de
propiciar reflexões sobre o funcionamento da linguagem e, consequentemente, de seus usos
adequados dentro das mais diversas situações sociocomunicativas.
Escolhemos a sequência didática como metodologia para o desenvolvimento das
atividades, pois, caso ela seja bem planejada, com objetivos bem definidos, possivelmente,
contribuirá para a promoção de aprendizes aptos a atuar na sociedade de forma plena.
Desenvolvimento
1ª etapa: 1ª e 2ª aulas
Sorria
Não use o nome de Deus em vão, não use o nome de Deus em vão, irmão.
Não use o nome de Deus em vão, não use remédios sem orientação.
(Refrão)
Não se deixe levar! (4x)
2ª etapa: 3ª e 4ª aulas
3ª etapa: 5ª e 6ª aulas
Métodos
Sequência didática com aulas dialogadas, discussões, análises de textos diversos,
trabalho em grupo, produção individual, apresentação em grupo e individual, participação em
um jogo na sala de informática.
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O conteúdo do Quiz está disponibilizado em mídia anexa a dissertação.
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Recursos
Folhas xerografadas, papel ofício, multimídia, pen drive, cartazes, computadores.
Avaliação
A avaliação ocorreu durante todo o processo através de observações diretas, das
discussões, das apresentações em grupo, da escrita da receita e do desempenho dos discentes
no Quiz.
podendo ser apreendida de forma mais autêntica e prazerosa caso o docente empregue uma
linguagem clara e concisa, sem usar (e abusar) de toda a nomenclatura proposta na tradição
gramatical.
Reafirmando, temos: “A forma mais simples de explicar para um aluno da educação
básica o que é um verbo no PB é: o verbo é a única palavra que pode ser modificada para
expressar mudanças em relação ao tempo” (FERRAREZI JUNIOR, 2014, p.14). Verificamos
que o pesquisador definiu verbo usando apenas o critério da morfologia (estudo da palavra, de
suas partes e classificações). Usando esse critério, fomos explorando oralmente todos os
verbos da dinâmica e alterando-os para que os aprendizes percebessem como a classe
gramatical verbo se transforma em relação ao tempo.
Na sequência didática, exploramos também os diversos gêneros textuais,
principalmente, os que trazem a ideia de imperativo em sua composição e se encontram
presentes na realidade dos discentes. Estamos, dessa maneira, promovendo o letramento, a
reflexão sobre a língua e a linguagem, atividades estas que contribuem para o
desenvolvimento da competência sociocomunicativa.
Nessa perspectiva, apresentamos a mensagem Nunca deixe de voar, que foi lida por
uma discente muito solícita. Exploramos o texto com a mesma diligência que foi aplicada e
analisada a dinâmica. Identificamos os efeitos de sentidos que podem ser gerados/provocados
pelos verbos, como, por exemplo, fazendo menção aos versos “Voe sempre da direção de seus
objetivos.”; “Mergulhe fundo em seus objetivos.”. Indagamos: os verbos “Vou” e “Mergulhe”
podem produzir que efeitos de sentido? Em quais outros situações eles podem ser
empregados? Os discentes foram bastante participativos na discussão. Explicaram os sentidos
conotativos e denotativos dos verbos, explanaram que a mensagem, na íntegra, provocou
neles desejos de lutar pelos sonhos, idealizar alto e buscar, com garra e vontade, para que
esses sonhos se realizem.
Prosseguimos, exibindo os slides contendo as normas da escola. Entretanto, ao
darmos início ao primeiro slide, os alunos informaram que já tinham visto isso, pois quase
todos os professores da escola já haviam explorado essas regras no início do ano letivo e que
aquilo já estava enfadonho. Então, não passamos, somente empreendemos uma discussão oral,
na qual os estudantes iam relembrando todas as regras impostas pela escola e os direitos que
possuíam. Nesse momento, destacamos também o modo imperativo negativo e o imperativo
afirmativo em frases que os educandos mencionavam, tais como: “Não jogue lixo no chão!”,
“Não ofenda os colegas e demais funcionário!”, “Faça as tarefas de casa!”, “Seja assíduo e
pontual!”.
111
Ressaltamos, aqui, que o nosso real propósito com a exibição dos slides das regres a
serem obedecidas na escola foi a demonstração dos comandos e, assim, o uso do imperativo
negativo e afirmativo.
Em seguida, expusemos os diferentes gêneros textuais retirados da internet.
Começamos pelos anúncios, entre os quais se seguem dois.
Figura 10 – Anúncios
foram satisfatórias, denotando, assim que a nossa proposta de verificar efeitos de sentidos
produzidos pelos enunciados foi sendo efetivada de maneira produtiva.
Solicitamos, também, uma reflexão relacionada à pessoa do discurso, ou seja,
informamos a possibilidade de empregarmos o tu e o você. O que nos permite identificar qual
delas está sendo usada é a desinência verbal, associada a marcas como pronomes possessivos
ou pessoais. No exemplo “Tome, experimente”, as desinências dos verbos indicam o uso da
terceira pessoa (você) do imperativo afirmativo. Já a expressão “Se liga” faz a alusão a uma
gíria, no caso, referindo-se à segunda pessoa (tu).
Informamos ainda que o tu, no Brasil, na maioria das vezes, limita-se a localidades das
regiões Sul e Nordeste, mas, contudo, tem sido utilizado atualmente em outras regiões do
país. Alguns até afirmam que nós empregamos muito, porém, não utilizamos a concordância
de acordo com a gramática normativa. Esclarecemos que o tu ou foi substituído ou convive ao
lado dos pronomes senhor (a) e você. Chegamos à conclusão de que as propagandas possuem
divulgação ampla e querem atingir de modo direto e claro a população, assim a forma
pronominal você parece ser mais satisfatória. Nos termos funcionalistas, diríamos que essa é a
forma menos marcada e mais produtiva na língua atual.
Na sequência, apresentamos o outdoor, cuja imagem segue abaixo, e questionamos:
Nesse gênero textual, está veiculado o mesmo sentido das propagandas? Os educandos
disseram que sim e souberam expor que, na mensagem veiculada nesse outdoor, há o
propósito de convencer a fazer algo, como reduzir o consumo de água. Porém, não há o
estímulo do consumo de algum produto, como nas propagandas.
Figura 11 – Outdoor
Outras questões, como a seguinte, foram analisadas: Vocês acreditam que o enunciado
do outdoor conseguirá fazer com que os leitores reduzam o consumo? Muitos disseram que
não, que deveria ser mais “chocante”, mais apelativo. Solicitados a darem exemplos, os
educandos citaram, entre outras: “Parem de gastar água, pois ela está acabando!”, “A água do
planeta vai acabar.”, “Reduza o consumo.”, “Faça a sua parte.”. Com esses exemplos, os
aprendizes demonstraram que se atentaram para quem deve ser considerado o leitor alvo da
mensagem. Compreenderam que, para que seja agenciado sentido no texto e para que haja a
interação comunicativa, devemos pensar nos interlocutores do discurso.
Passamos para algumas placas de trânsito.
Ingredientes
3 ovos
1 lata de leite condensado
1 lata de leite (mesma medida da lata do leite condensado)
1 xícara (chá) de açúcar refinado
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Como fazer
Os estudantes leram a receita, dando ênfase aos verbos que se encontravam no modo
imperativo. Apresentamos a palavra “injunção” que muitos não sabiam o que significava.
Esclarecemos que é um tipo de texto que tem como finalidade dar uma instrução.
Verificamos, então, como podíamos fazer o pudim. Informamos que há outros textos que
também são instrucionais. Eles se lembraram dos manuais de aparelhos eletrônicos e nós
citamos as bulas de remédios, sobre as quais comentamos a respeito palavra prescrição, haja
vista se constituírem como um tipo de texto que prescreve o que deve ser feito para que o
procedimento dê certo. Ou seja, as bulas de remédios e os manuais de aparelhos são exemplos
de textos prescritivos, assim como a conhecida prescrição médica.
Foram citados também como exemplos os panfletos, cartazes, folders, que
apresentam informações para instruir o leitor ou persuadi-lo a realizar algo. Em seguida,
destacamos que, também em músicas, podemos encontrar enunciados no modo imperativo.
Fomos instigando os estudantes a relembrarem trechos de música, e eles citaram, entre outras:
“Prepara, que agora...”, cantada por Anita, “Cuida bem dela.”, por Henrique e Juliano. Logo
após, apresentamos a música Sorria para os alunos ouvirem.
Percebemos que a música era conhecida por muitos discentes. A maioria cantava,
outros acompanhavam com palmas. Depois começamos a analisar os sentidos de alguns
verbos presentes na música. Muitos disseram que hoje não temos liberdade, fazemos tudo sob
ordem de alguém, somos vigiados o tempo todo, e, às vezes, essa invasão de privacidade, essa
pressão faz com que muitos desafiem a ordem, subvertam-na e, por isso, talvez, os valores
estejam sendo tão invertidos, como canta Gabriel Pensador no final da música.
Analisamos os diferentes sentidos de alguns verbos, todos foram unânimes em afirmar
que a música, na íntegra, é composta por enunciados no modo imperativo. Além disso,
procuramos mostrar aos discentes que o valor semântico do verbo foi definido a partir dos
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discursos aqui abordados (os diferentes gêneros textuais arrolados) e apreendido nas falas
produzidas e compreendidas por eles próprios.
Por fim, para organizarmos a atividade da aula seguinte, dividimos os 33 (trinta e três)
discentes em seis grupos, a fim de que pesquisassem, na cidade de Brumado, os exemplos de
gêneros textuais que cada equipe selecionou. Seguem os grupos: grupo 1: Placas e/ou outros
textos presentes em postos e hospitais do município de Brumado; grupo 2: Outdoors
presentes na cidade de Brumado; grupo 3: Receitas; grupo 4: Placas em ônibus/ vans, que são
transportes empregados pelos escolares; grupo 5: Músicas que apresentem o modo
imperativo; e grupo 6: Placas de trânsito no município de Brumado. É salutar esclarecermos
que aplicamos essa proposta no primeiro encontro, nas duas primeiras aulas, e marcamos a
apresentação dos trabalhos para o segundo encontro, realizado dois dias depois.
No segundo encontro, os grupos apresentaram os trabalhos, todavia, por se tratar de
adolescentes e de uma atividade que não geraria nota alguma, dois grupos não realizaram a
pesquisa. Um dos grupos justificou não ter encontrado músicas com o modo imperativo, o que
provocou risos na turma. O outro grupo, dos enunciados em ônibus e vans escolares,
argumentou que não encontrou tempo para se reunir. Apesar do ocorrido, já prevíamos
situações como essas, que, infelizmente, são comuns no ambiente escolar.
Os grupos dos enunciados em placas e/ou outros textos, presentes em postos e
hospitais do município, o grupo dos outdoors presentes na cidade e o grupo das placas de
trânsito organizaram bastante o material coletado. A pesquisa foi arquivada em pen drive, cuja
apresentação foi feita em multimídia. Em função da organização e empenho desses grupos,
não houve um maior prejuízo a falta dos que não cumpriram com o acordado nos encontros
anteriores. Todos participaram explicando os sentidos dos verbos, lembraram que, às vezes,
os verbos não aparecem, mas a ideia de ordem está implícita. Somente o grupo das receitas
empregou os cartazes para exposição da pesquisa. De modo geral, todas as equipes fizeram
uma boa apresentação. Conseguiram demonstrar, nas atividades realizadas, que aprenderam o
que é verbo no modo imperativo e que sabem reconhecê-los e emprega-los.
Seguem algumas fotos dos grupos no momento das apresentações:
116
Após a apresentação dos grupos, entregamos aos discentes uma atividade, na qual eles
deveriam escrever sobre algo que soubessem fazer em forma do gênero textual receita. Houve
vários questionamentos sobre o que fariam, assim como falas que não sabiam elaborar o
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solicitado. Esclarecemos que seriam receitas simples, desde coar um café, fabricar uma pipa
ou, para os mais hábeis, quem sabe até explicitar como se prepara um bolo de festa.
Ressaltamos que, na produção das prescrições, ou seja, na maneira como desenvolver a
receita, deveriam empregar o modo imperativo. Apesar dos questionamentos, todos fizeram a
atividade.
Recolhemos essas receitas para avaliarmos o desempenho dos educandos em relação
ao uso do modo imperativo. Constatamos que conseguiram empregar os verbos adequando as
intenções de sentido que são exigidas em textos instrucionais. Verificamos, também, que a
grande maioria da turma aderiu a receitas rápidas, características do tipo de alimentação da
vida contemporânea, como macarrão instantâneo e brigadeiro de panela. Alguns, mais
habilidosos, descreveram, minuciosamente, todos os passos para a produção de um bolo de
fubá, uma farofa de carne e a confecção de uma pipa. Outros ainda relataram os
procedimentos para fritar um ovo e coar um café.
Caso essa sequência didática fosse aplicada em uma situação cotidiana de aula,
recomendaríamos que o professor, regente da classe, orientassem os discentes a realizar
entrevistas gravadas com pessoas da comunidade, relatando como se faz uma receita. A partir
dessas gravações, os discentes poderiam identificar os verbos no modo imperativo ou outras
formas de realização do imperativo presentes nas receitas. Com isso, poderiam realizar, por
exemplo, analogias aos paradigmas de conjugações verbais apresentados em gramáticas
tradicionais e linguísticas, a fim de conhecerem a norma padrão e as demais normas
empregadas pelos utentes da língua. O docente poderia, ainda, trabalhar com as receitas,
verificando, além da ortografia e da concordância, os aspectos semânticos e pragmáticos de
usos dos verbos para melhor compreensão do gênero textual receita e, consequentemente, a
eficácia comunicativa a orientar alguém a realizar algo.
No terceiro e último encontro realizado, levamos a turma para sala de informática.
Mas, como só estavam funcionando 16 computadores, optamos por levar metade da turma no
4º horário e a outra metade no 5º horário, isso, para que todos jogassem sozinhos em uma
máquina. As 20 (vinte) questões do jogo Quiz, dispostas no programa PowerPoint, foram
elaboradas a partir de exemplos de atividades sugeridos por Travaglia (2009; 2011; 2013), a
fim de oferecer aos discentes uma revisão de tudo o que foi trabalhado, para uma
aprendizagem dinâmica, lúdica e prazerosa.
Observamos que todos ficaram fascinados com a ideia de que iriam participar de um
jogo, o Quiz - Seja um gênio no imperativo, na sala de informática. Quando ocuparam os seus
devidos lugares, passamos as seguintes regras: (i) leia, atentamente, cada questão para
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escolher a opção adequada; (ii) só conseguirá passar para a questão seguinte se acertarem a
questão em que se encontra; (iii) caso errem alguma questão, o jogo, automaticamente,
retorna ao início; (4) vencerá aquele que responder, adequadamente, todas as 20 (vinte)
questões do Quiz.
Após abrirem o jogo na tela do Power Point, foram apresentados aos pesquisados uma
conceituação de verbo e de modo imperativo e alguns exemplos desse modo verbal, como se
fosse um resgate de tudo que os discentes estudaram em sala, para uma automatização do
conteúdo abordado. Solicitamos uma leitura atenta para auxiliar na compreensão do Quiz.
Ressaltamos que as questões desse jogo se encontram no anexo desta pesquisa.
No transcorrer do jogo, houve algumas discussões entre os aprendizes. Sobretudo,
quando erravam alguma questão. Eles não acreditavam que eram obrigados a retornar ao
início. Quando interferíamos, incentivando uma leitura mais atenta, notávamos que eles se
concentravam mais.
Procuramos, nas duas primeiras questões, apresentar o conceito verbo conforme
Ferrarezi Junior (2014), de forma clara e concisa, com metalinguagem adequada à demanda
da turma. Percebemos que os discentes não demonstraram muita dificuldade nessas questões.
Em seguida, na questão (3) três, os discentes analisaram o aspecto semântico do verbo cantar
em dois contextos diferentes.
Quando partiram paras as questões (4) quatro, (5) cinco e (6) seis, os educandos
demonstraram que compreenderam o que o modo imperativo expressava, ou seja, essas três
(3) alternativas traziam a ideia de que o modo imperativo indica ordem e conselho. Havia uma
alternativa de resposta da questão (6) seis com a palavra “prescrição”. Esta palavra gerou
muitos questionamentos, apesar de esclarecermos que, durante as aulas proferidas no primeiro
momento, esse termo tenha sido apresentado. Reconhecemos, porém, que necessitamos de um
maior contato com as palavras para apreendermos seus significados.
Nas questões (7) sete e (8) oito, encontramos os gêneros textuais anúncio e receita, que
exploram o modo imperativo: no anúncio, o destaque é para a questão semântica; na receita,
ressalta-se a ideia de prescrição do modo imperativo. Assim como aconteceu na questão seis,
muitos alunos questionaram o significado da palavra “prescrição”.
Quando produzimos as questões de (9) nove a (14) quatorze, a nossa intenção foi de
procurar automatizar a ideia de ordem, conselho, pedido, súplica etc., expressa pelos sentidos
do verbo no modo imperativo, sem, contudo, recorremos à nomenclatura confusa da
gramática tradicional.
120
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Acervo pessoal.
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122
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
meio. Também, a partir desse viés, iluminamos os estudos realizados sobre o modo imperativo
na presente dissertação.
Constatamos que, embora na Tradição Gramatical haja a abordagem sobre “verbo” e
“imperativo”, quase que exclusivamente, voltada para as formas de flexão, identificação e
denominação; na Linguística, há pesquisadores, como Travaglia (2009; 2011; 2013) e
Ferrarezi Junior (2014), entre outros aqui apresentados, que compreendem o imperativo como
o trabalho com as possibilidades significativas e sua adequação à produção de efeitos de
sentido e às situações de uso.
Verificamos, em alguns livros didáticos, que, ainda que de forma incipiente, já está
sendo apresentado um estudo do modo imperativo com foco na língua em uso. Apesar da
presença acentuada de uma metalinguagem não tão clara, encontramos muitos gêneros
textuais condizentes com a realidade dos alunos, necessitando apenas de análises mais críticas
e, sobretudo, nas quais sejam provocadas mais reflexão do discente sobre as possibilidades de
sentido do uso do verbo, em específico do modo imperativo em situações reais.
Realizadas todas essas abordagens, elaboramos e aplicamos uma sequência didática,
sugerida no capítulo denominado Uma nova proposta para o ensino do modo imperativo. A
nossa hipótese de que, ao propor uma atividade na qual houvesse um maior envolvimento do
aluno com situações reais de uso da língua, a interação com o estudo da linguagem seria
efetivamente mais relevante e geraria mais interesse, foi ratificada. Com a aplicação da
sequência didática, foi possível perceber que o ato de aprender tornou-se significativo,
prazeroso, pertinente para o discente, vez que os discentes perceberam a finalidade da
atividade de desenvolver a competência comunicativa para suprir as exigências da sociedade
contemporânea.
que o aluno não sinta a presença de “dois português”, mas no qual estude e pesquise a sua
língua em situações reais. Na tradição gramatical, em função da própria natureza do propósito
desse tipo de gramática, esses estudos não são atualizados, mas, nos livros didáticos e,
principalmente, nas sequências didáticas elaboradas, podemos contribuir com essa nova
proposta de ensino.
Com as ideias aqui expostas, almejamos, portanto, que os docentes de Língua
Portuguesa, ao conduzirem seu trabalho com a gramática, em particular, o verbo no modo
imperativo, sejam incentivados e/ou auxiliados a pesquisar mais para a concretização de uma
prática pedagógica efetiva, na qual a gramática da língua seja vista como o próprio fenômeno
a ser pesquisado e o trabalho com a variedade de recursos linguísticos seja colocado à
disposição dos interlocutores para produção de efeitos de sentidos, possibilitando aos
aprendizes uma inserção plena e digna no meio social.
126
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https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/11634>. Acesso em junho de 2015.
ANEXOS
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ANEXO 1
TERMO DE ASSENTIMENTO
Você está sendo convidado (a) como voluntário (a) a participar da pesquisa
“Gramática: verbo numa perspectiva semântica e pragmática”. Neste estudo
pretendemos analisar a relevância dos aspectos morfossintáticos, semântico-pragmático-
discursivos dos verbos para promover o desenvolvimento da competência sócio comunicativa;
aplicar atividades sobre verbos em turmas do 6º ao 8º anos para realizar análises reflexivas
sobre as produções dos participantes discentes atentando para o uso dos verbos; buscar
literatura adequada para desenvolver atividades significativas sobre verbo.
O meu interesse com esse trabalho é elaborar uma proposta de intervenção pedagógica
através de um estudo teórico reflexivo sobre a categoria verbo e divulgá-lo para a eficiência
do processo e ensino-aprendizagem.
A sua participação no referido estudo será no sentido de participar das aulas
respondendo as atividades propostas e permitir que seus textos produzidos em sala sejam
recolhidos para análise.
Para participar deste estudo, o responsável por você deverá autorizar e assinar um termo
de consentimento. Você não terá nenhum custo, nem receberá qualquer vantagem financeira.
Você será esclarecido (a) em qualquer aspecto que desejar e estará livre para participar ou
recusar-se. O responsável por você poderá retirar o consentimento ou interromper a sua
participação a qualquer momento. A sua participação é voluntária e a recusa em participar não
acarretará qualquer penalidade ou modificação na forma em que é atendido (a) pelo
pesquisador que irá tratar a sua identidade com padrões profissionais de sigilo. Você não será
identificado em nenhuma publicação. Com esta pesquisa é possível esperar alguns benefícios
para você, como desenvolvimento da competência sócio comunicativa; Compreensão
consciente e reflexiva do conteúdo verbo; Emprego eficaz dos verbos nas diversas situações
de uso, etc. Este estudo apresenta risco mínimo, isto é, o mesmo risco existente em atividades
rotineiras como conversar, dispersar-se das aulas, cansaço físico e mental, etc. Apesar disso,
131
_________________________________________________
Assinatura do (a) menor
__________________________________________________
Assinatura do pesquisador
132
ANEXO 2
nas aulas, por curiosidade e para chamar a atenção, podem realizar conversas paralelas prejudicando o
andamento das aulas. Para amenizar estes desconfortos, pretendemos nos apresentar a priori,
informando o motivo da nossa presença a fim de satisfazer todas as suas curiosidades.
Os pesquisadores envolvidos com o referido projeto são Rosangela dos Santos Marques,
mestranda do ProfLetras/UESB, a professora orientadora Dra. Valéria Viana Sousa, (UESB) o
professor co-orientador Dr. Jorge Augusto Alves da Silva (UESB) e com eles poderei manter
contato pelos telefones (77) 99129616, (77) 88180503 e (77) 88197295.
Os resultados desta pesquisa estarão a sua disposição quando a mesma for concluída. O nome
ou o material que indique a participação do menor não será liberado sem a sua permissão.
Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias, sendo que uma cópia será
arquivada pelo pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você.
Eu,_________________________________________________, portador (a) do documento de
Identidade___________________________, responsável pelo menor
_________________________________________________, fui informado (a) dos objetivos do
presente estudo de maneira clara e detalhada e esclareci minhas dúvidas. Sei que a qualquer momento
poderei solicitar novas informações e modificar a decisão do menor sob minha responsabilidade de
participar, se assim o desejar e que não há nenhum valor econômico, a receber ou a pagar, pela
participação. No entanto, caso haja qualquer despesa decorrente da sua participação na pesquisa,
haverá ressarcimento na forma seguinte: ressarcimento em dinheiro. De igual maneira, caso ocorra
qualquer dano decorrente da participação no estudo, este será reparado, conforme determina a lei.
Recebi uma cópia deste termo de consentimento livre e esclarecido e me foi dada a oportunidade
de ler e esclarecer as minhas dúvidas.
Brumado – BA, ________ de ________________________ de 20_____.
Impressão digital
_______________________________________________________________
Assinatura do (a) Responsável
_______________________________________________________________
Assinatura do (a) Pesquisador (a)
134
Em caso de dúvidas com respeito aos aspectos éticos desta pesquisa, você poderá consultar:
ANEXO 3
Atividades
1. Imagine as situações descritas abaixo. Depois, produza frases que indiquem ordem e que
sejam adequadas ao contexto em que as pessoas estão interagindo.
a) Uma mãe muito brava e impaciente exige que seu filho indisciplinado faça a tarefa de casa.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
b) Um pai carinhoso e compreensivo pede ao filho indisciplinado para que ele faça a tarefa de
casa.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
c) A irmã mais nova do menino indisciplinado aconselha-o para que ela faça a tarefa de casa.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
d) Um amigo rebelde do menino indisciplinado, também ordena que ela faça a tarefa de casa.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
136
2. Procure apontar em que condições cada uma das ordens abaixo pode e/ ou deve ser usada e
se há diferenças de sentido entre elas.
3. Levante o maior número de frases que podemos empregar para determinar que alguém
apague a luz de uma sala de aula.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
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___________________________________________________________________________
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___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
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137
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
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___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
138
ANEXO 4
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ANEXO 5
(1) Verbo é a única palavra que pode ser modificada para representar mudanças em
relação ao tempo. Clique na palavra que Não é verbo.
Cantar – Escrever – Ler – Hoje – Sorrir
(2) O modo imperativo está presente no enunciado a seguir. Clique na imagem
correspondente:
Não fale ao celular quando estiver dirigindo.
(3) Clique na imagem que representa a ordem na frase abaixo:
Faça silêncio
(4) Qual a imagem que melhor representa o conselho do enunciado?
Se beber, não dirija!
(5) Clique no grupo de palavras que se alteraram para expressar mudança de tempo.
a) livraria, livreiro, livresco, livro.
b) pular, pulei, pulo, pularei.
c) jogar, jogador, jogatina, jogada.
(6) Clique na imagem que representa melhor a ação presente no anúncio:
Promoção, comprem!
(7) Nas imagens abaixo, qual expressa melhor a ação presente na frase:
Corra, vamos você consegue!
(8) Todos os enunciados expressam as mesmas atitudes citadas entre parênteses. Apenas
em uma alternativa, a atitude não corresponde ao que está expresso entre parênteses.
Identifique-a:
a) Coma todas as verduras! (ordem positiva)
b) Veja as fotos depois. (ordem negativa)
c) Não fume no cinema! (proibição)
d) Tome dois comprimidos ao dia. (prescrição)
(9) Logo após o almoço, o filho levanta da mesa, pega a sua mochila e diz para a mãe:
_ Mãe, eu já estou indo para a aula. Tchau!
Qual é a maneira mais carinhosa que a mãe poderia empregar para dizer ao filho que ele
se esqueceu de escovar os dentes?
a) _ Tchau filho. Vá com Deus!
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(16) O professor disse: “Faça o exercício, por favor!” Que efeito de sentido a frase
expressa?
a) Uma ordem direta.
b) Uma ordem feita com gentileza.
c) Uma ordem que expressa um desejo.
(17) O professor disse: “Faça o trabalho!” Que efeito de sentido a frase expressa?
a) Uma ordem que se transforma em sugestão.
b) Uma ordem com tom de ameaça.
c) Uma ordem feita com gentileza.
d) Uma ordem que expressa um desejo.
e) Uma ordem direta.
18. Leia o trecho da receita. Em seguida, clique na alternativa que expressa a ação
destacada pelos verbos.
Despeje a farinha. Acrescente os ovos. Misture bastante. Jogue o leite aos poucos. Unte
a forma com óleo. Coloque para assar.
a) Proibição
b) Permissão
c) Obrigação
d) Prescrição
(19) Qual dos três enunciados indica um desejo, volição?
a) Quero que você tire boas notas.
b) Pedro, jogue o papel no lixo.
c) Maria, não leia baixo!
(20) Duas pessoas estão discutindo, brigando. Uma delas diz “A porta está aberta.” O
enunciado em destaque, expressa qual ordem?
Entre, a porta está aberta.
Saia, a porta está aberta.
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