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1 - INTRODUÇÃO
Um dos passos mais importantes em planejamento de aeroportos é a escolha do sítio onde vai ser
implantado o aeródromo. O lugar ideal, na prática, dificilmente pode ser encontrado, e a tarefa
consiste em se selecionar a opção que gere menos inconvenientes para o aeroporto e a
comunidade.
Na realidade, hoje, são raras as oportunidades de se implantar um novo aeroporto. Quando isso
acontece são muitos os grupos de interesse envolvidos. Alguns exemplos recentes: Chep Lap Kok
(Hong Kong), Macau, Seul, Kansai (Osaka), Haneda (Tóquio), Nagasaki, Chubu (Japão) e
Kingsford Smith (Sydney) mostram uma nova tendência, a de "criar" espaços sobre a água
(construções off-shore), em seus projetos de construção ou ampliação.
Em qualquer caso é fundamental se conhecer as finalidades para as quais o aeroporto vai ser
implantado e se definir, a priori, os critérios para a seleção do melhor sítio. Isto ajuda a evitar que o
processo seja “direcionado”.
2 – CRITÉRIOS GERAIS
Com o avanço da tecnologia nos mais diversos ramos da engenharia, o principal problema que
surge nos dias de hoje para a implantação de aeroportos recai sobre os aspectos relativos à
comunidade, não apenas em termos de relacionamento urbano mas também envolvendo aspectos
ambientais e de preservação de cultura e história. O aeroporto, para melhor cumprir suas
atribuições, deve se constituir em um nó da malha viária, se harmonizar com a comunidade a ser
servida. Distar próximo o suficiente garantindo boa acessibilidade. Distar longe o bastante para
evitar que os inconvenientes gerados pela atividade aérea perturbem a comunidade.
Evidentemente, torna-se muito difícil atender a todos esses requisitos. Alguns são mesmo
contraditórios. Antes de se iniciar a escolha, portanto, é indicado se definir os critérios adequados
e, a partir disso, proceder à seleção. Ao tomador de decisão cabe analisar os aspectos políticos
envolvidos, mas a análise técnica deve procurar se ater somente aos aspectos relacionados com
os critérios adotados previamente.
O então Ministério da Aeronáutica, na década de 80, utilizou, na definição do sítio de Confins para
acolher o Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, a seguinte lista de critérios:
3 - PROCEDIMENTOS
Através da análise da literatura percebe-se que o procedimento mais indicado, quando estão
envolvidas grandes quantidades de recursos (e implícitas intensas pressões políticas), são aqueles
pautados em modelos matemáticos. O segundo aeroporto para Sydney na Austrália em Badgery
Creek e o terceiro aeroporto para Londres da Roskill Commission são exemplos que, porém, não
se concretizaram.
Outro procedimento, a ponderação de critérios, é utilizado em maior escala para situações onde
existem poucas alternativas e que, à primeira vista, já se imagina a melhor solução. O relatório da
Hidroservice de 1973 para São Paulo é um claro exemplo do emprego desse método.
Recentemente, a escolha do sítio para o segundo aeroporto de Lisboa também se utilizou dessa
abordagem.
Comparativamente, os critérios:
Um dos critérios ou fator que pode entrar na ponderação é o custo do empreendimento. Como
idéia geral, que pode variar de caso a caso, tem-se, em média, observados os seguintes
percentuais de custo total (estes índices estão baseados nos gastos do projeto e da construção do
Aeroporto de Mirabel, Montreal, Canadá):
Logicamente, em função do tipo de aeroporto a ser implantado e das características locais, esses
percentuais podem variar bastante. Vide a Tabela 1 que mostra os percentuais de custos do
aeroporto de Oslo, divulgado pela IATA.
4 – DOCUMENTOS PRELIMINARES
Para iniciar o trabalho de seleção tendo concluído as duas fases anteriores, definição de critérios e
sua ponderação, alguns documentos preliminares devem ser consultados: cartas de configuração
geográfica (relevo), cartas geológicas (estimativa de natureza do solo e custo de terraplenagem),
planos de urbanização existentes (infraestrutura existente e projetada), cadastro para avaliação de
desapropriações, documentações sobre zonas interditadas, perigosas ou reservadas e relatórios
sobre as condições meteorológicas regionais (ventos, nevoeiros, chuvas, neves etc.). A plataforma
de imagens do Google Earth tem sido bastante empregada nos estudos mais recentes.
5 - INCONVENIENTES
Poluição do Ar
Apesar de muito citada, pode ser considerada como pouco significativa em função da área
ocupada pelo aeroporto. Qualquer outro tipo de urbanização acarreta uma poluição do ar maior
que a gerada pela operação de um aeroporto. Uma antiga pesquisa desenvolvida nos Estados
Unidos para o Aeroporto de Los Angeles identificou que 25 % de toda a poluição seria proveniente
dos veículos que acessavam ao aeroporto. De duas formas o problema pode ser atacado:
modificando motores e/ou combustíveis ou, ainda, modificando as operações em solo.
É polêmico ainda o malefício gerado pelas aeronaves nas altas camadas atmosféricas, durante o
período de cruzeiro, com a combinação do NO exalado pelas turbinas com o oxigênio, interferindo
na protetora camada de ozônio. Não existe um consenso sobre tal inconveniente e sua
contribuição no agravamento da situação. Mas, isso seria um problema trazido pelo transporte
aéreo e não especificamente pelos aeroportos.
Poluição da Água
Bem mais grave que a do caso anterior. A experiência tem mostrado que as medidas preventivas
são mais eficazes que os sistemas corretivos. O grande perigo é o da mistura de diversos tipos de
poluentes. A solução é o tratamento em separado de resíduos domésticos, superficiais e
industriais. Um dos melhores trabalhos desenvolvidos no setor foi o realizado pela COPAER-BH,
durante as obras do Aeroporto de Confins, evitando o assoreamento das ligações entre as lagoas
existentes na região.
Devem ser preservadas ou reservadas áreas para as espécies da vida animal e vegetal do micro-
ambiente onde o aeroporto será inserido. A relevância aumenta nos casos de sítios em que
sobrevivem espécies em extinção. Os estudos devem considerar os efeitos causados pelo
desmatamento para a execução da obra e, posteriormente, os efeitos decorrentes das operações
no aeroporto.
Perigo Aviário
As aves constituem numa grave ameaça à operação aérea. Obstrução ou danos nas turbinas ou
colisões com pára-brisas ou outras superfícies da aeronave podem causar acidentes. Dos 5059
relatórios em 1987 sobre esse tipo de ocorrência, 51% aconteceram abaixo dos 30 m de altura. 6%
causaram danos relativos e 3% , danos substanciais. Foram 1229 casos durante a corrida de
decolagem, 729 na subida, 1487 na aproximação e 971 durante a corrida de aterrissagem.
No período de janeiro de 1991 a dezembro de 2002 foram registradas 2592 ocorrências, com uma
tendência de crescimento no número de colisões observada nos últimos cinco anos na ordem de
200%.
As soluções precisam muitas vezes de estudos detalhados para identificação do habitat (e a
transferência das aves da zona de operação do aeródromo), para traçado de rotas aéreas (que
não conflitem com a trajetória de pássaros migratórios) e estabelecimento de medidas que venham
proteger as espécies. Existem reuniões/conferências mundiais que visam a troca de experiências
daqueles que tratam com esse tipo de problema. Em alguns aeroportos são dadas soluções
paliativas, como, por exemplo, o emprego de equipamentos sonoros repelentes de pássaros, nos
momentos de maior intensidade de tráfego de pouso e decolagem de aeronaves.
Fonteles (2003) apresentou um trabalho específico sobre o controle do perigo aviário nos
aeroportos pela gestão dos fatores de atração de aves.
Poluição Sonora
O ruído em aeroportos é atribuído ao barulho de jato (contato entre o ar quente egresso da turbina
e o ar frio da atmosfera) e a rotação das partes móveis do motor. O incômodo, fruto da perturbação
provocada pelo ruído, é função da duração, intensidade, freqüência, horário (efeito mascaramento)
e de elementos propagadores e atenuadores (topografia, relevo e vegetação).
Na década de 50, com o advento das aeronaves a jato, o incômodo tornou-se significativo, fazendo
surgir as primeiras reclamações e, conseqüentemente, os primeiros estudos. O problema inicial:
medir níveis de ruído, evento isolado, e medir nível de perturbação, evento cumulativo, exigiram a
criação de uma escala, de uma unidade de medida. Para o primeiro obteve-se consenso. Para o
outro, não.
Na prática tem-se atacado o problema através das modificações que vem sendo empreendidas
nas aeronaves em uso, na concepção dos novos aviões e na utilização de procedimentos
especiais no entorno de aeroportos.
Atualmente alguns países impõem determinados limites e para controle, desenvolvem sistemas de
identificação das aeronaves que desrespeitam as regras. Na Alemanha emprega-se o Storindex
(Q), na Holanda, o Total Noise Rating (B), na Inglaterra, o Noise and Number Index (NNI), na
França , o Isophonic Index (N) e nos Estados Unidos, o mais usado é o Noise Exposure Forecast
(NEF).
No Brasil, a CECIA (do antigo IAC, hoje SEP da ANAC) desenvolveu o Índice Ponderado de Ruído,
o IPR, cujos dados necessários para a elaboração de curvas isofônicas são:
A legislação brasileira que trata da retirada progressiva das aeronaves mais ruidosas está baseada
na classificação do Anexo 16, volume I, da OACI, que estabelece quatro categorias básicas de
aeronaves a jato, a saber:
Não Certificadas (NC) - são aeronaves fabricadas nas décadas de 50 e 60, normalmente
equipadas com a primeira geração de motores a reação, sendo consideradas
extremamente ruidosas.
Capítulo 2 - são aeronaves fabricadas até outubro de 1977, equipadas com motores de
baixa taxa de by-pass (até 3:1), sendo consideradas medianamente ruidosas.
Capítulo 3 - são as aeronaves, equipadas com motores de última geração de alta taxa de
by-pass (4-8:1)), sendo consideradas pouco ruidosas e,
Capítulo 4 - que antes compunham o Capítulo 3 mas que se distinguem pelo menor nível
de ruído, exemplos, A319, A320, B737-500, B737-800 e os jatos EMB170 e EMB190.
Industrial S S R
Residencial S R N
Comercial S R R
Escola/Hospital R N N
Igreja/Auditório R N N
Serviço Público S S R
Agricultura S S S
Pecuária S S R
Restrições Altimétricas
Para garantia de operações seguras no entorno de aeródromos foram criados perfis imaginários
para proteção ao vôo, nos espaços vizinhos ao campo de pouso. A Portaria 957/2015 recomenda a
confecção dos planos básicos de proteção. É função do tipo de operação prevista: VFR, IFR-não
precisão e IFR-de precisão e do comprimento da pista (em metros) considerando-a para a altitude
ao nível médio do mar, temperatura padrão e gradiente nulo. Os códigos 1, 2, 3 e 4 correspondem,
respectivamente, a comprimentos básicos menores de 800 m, até 1200 m, até 1800 m e acima de
1800 m. O Plano Básico de Zona de Proteção estabelece as abrangências das seguintes áreas:
faixa de pista, área de aproximação, área de decolagem, áreas de transição, área horizontal
interna, área cônica e área horizontal externa.
Além dessas restrições, outras, por exemplo, decorrentes de perturbações a sítios históricos ou
ricos em acervos/tesouros deixados por civilizações antigas ou ainda a sítios especialmente
dotados pela natureza, podem significar graves empecilhos a escolha de um bom sítio
aeroportuário.
6 - ANEMOGRAMA
Para fins de planejamento a ANAC, em seu RBAC 154/2018 recomenda que o número e a
orientação das pistas de um aeródromo seja tal que o coeficiente de utilização do aeródromo não
seja inferior a 95% para as aeronaves as quais o aeródromo foi concebido.
37 km/h (20 kt) para as aeronaves cujo comprimento de pista de referência for superior ou
igual a 1.500 m;
24 km/h (13 kt) para as aeronaves cujo comprimento estiver compreendido entre 1.200 e
1.500 m;
19 km/h (10 kt) para as aeronaves cujo comprimento for inferior a 1.200 m.
Assim sendo torna-se importante o conhecimento das direções, intensidades e freqüências dos
ventos de superfície no local. O ANEMOGRAMA é uma figura que revela essas informações num
formato gráfico.
Não dispondo de um programa computacional que automatize o processo, um método que pode
ser utilizado se baseia na rotação de uma faixa de material transparente da dimensão
correspondente a intensidade máxima permissível de ventos cruzados, buscando a posição que
deixe em descoberto as menores porcentagens. Aí estaria a melhor orientação em relação ao
norte verdadeiro. Como essa informação deve estar associada ao norte magnético, torna-se
necessária a correção da declinação magnética. Esse é um parâmetro local (bem como sua
variação anual) que pode ser obtido em publicação do Observatório Nacional. A fórmula a seguir
mostra a relação entre os rumos magnético e verdadeiro:
RM = RV - ( Do + V . ( T - To ))
onde
RM - rumo magnético
RV - rumo verdadeiro
Do - declinação magnética do ano To
V - variação anual da declinação magnética
T - ano em questão (atual)
To - ano com dado conhecido
Caso não seja possível satisfazer a recomendação da ICAO (no máximo 5%), torna-se necessário
o estudo da implantação de mais de uma pista, com direções diferentes. O trabalho de Mousa ( 4 )
mostra um programa que atende os 95% de operacionalidade numa configuração com duas pistas.
A numeração observada nas cabeceiras das pistas serve como orientação para as mesmas,
omitida a unidade. Pista 08 (significa rumo magnético da ordem de 80 graus), pista 16 (rumo de
160 graus). Obviamente que as pistas se apresentam sempre com diferença de numeração entre
cabeceiras do valor 18 (referentes aos 180 graus de variação de rumo). São José dos Campos :
15-33, Congonhas : 16-34, Rio de Janeiro : 09-27 e 14-32. Notar que o piloto ao usar a cabeceira
13, tanto para pouso como para decolagem, a sua bússola estará indicando o mesmo rumo dos
130 graus.
7 – COMENTÁRIOS FINAIS
Resumindo, cada organização, para ser mais exato, cada indivíduo postula seus critérios e os
gradua hierarquicamente conforme seus anseios e sua mentalidade. Por isso, para cada caso,
algumas soluções aparentemente contraditórias, podem surgir para um mesmo problema; cabe ao
tomador de decisões analisar os outros aspectos pertinentes, de tintura política ou estratégica,
para chegar a sua opção.
Hoje, vemos a discussão sobre o terceiro aeroporto para Paris, em Chaulnes, a 80 milhas ao norte
da capital parisiense. Seriam 6,5 bilhões de dólares até sua conclusão prevista para 2015. Contra
o terceiro aeroporto são aqueles que: - gostariam de ver o aeroporto de Lyon (Saint-Exupèry) como
divisor do tráfego de Paris, - incentivam a operação ponto-a-ponto (contra o sistema hub de Paris),
- vêem em Vatry, base aérea a 80 milhas a leste da capital, como sendo um futuro centro de
cargas, desafogando o CDG. A favor do terceiro aeroporto estão aqueles que: - consideram o
crescimento da demanda não suportável a Orly/CDG, - vêem (e continuarão a ver) a França como
a principal porta da Europa, - acreditam numa "humanização" no entorno do CDG (o que não
agrada a ADP).
No Brasil, o terceiro aeroporto para a cidade de São Paulo (o aeroporto metropolitano que dividiria
o serviço com Congonhas e Guarulhos) atraiu a atenção de vários investidores. Brasília também
surge como uma região que demanda um estudo de um novo aeroporto que venha a permitir o
desenvolvimento do transporte aéreo na capital brasileira. Vitória, no Espírito Santo, também busca
um novo sítio. Afinal o transporte aéreo cresce e a infraestrutura aeronáutica precisa estar
preparada para corresponder à demanda. O incentivo a Aviação Regional nos últimos anos gerou
a necessidade de se estabelecer um método mais objetivo para se selecionar um sítio
aeroportuário. O método AHP tem sido empregado.
Referências