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VIAJOLOGIA
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Passei para o mundo vegetal. Ressalto que essa pesquisa aconteceu em 1986,
quando a internet não existia para o grande público. Os primeiros mecanismos
de busca, como Lycos ou AltaVista, só apareceram a partir de 1994. Se hoje buscar
no Google “árvore do viajante” significa encontrar cerca de 50 mil sites – e na
versão em inglês mais de 300 mil –, naqueles tempos a única saída era procurar
na biblioteca ou conversar com algum botânico para saber que planta melhor
se encaixaria na minha indagação.
Não demorou muito para que uma amiga paisagista de Campinas, Catarina
Menucci, me recordasse que uma espécie da família Strelitziaceae, a ravenala,
tinha como nome popular árvore-do-viajante. Prima de primeiro grau das
plantas aves-do-paraíso (Strelitzias) originárias da África do Sul, prima de
segundo grau das nossas conhecidas helicônias da América tropical e parente
longínqua das bananeiras, a ravenala possui folhas verdes, grandes e largas,
dispostas em uma posição de leque aberto. Apesar de possuir um tronco ereto
que pode chegar a 20 metros de altura e de também ser chamada “palmeira-do-
viajante”, a ravenala não pertence, nem de longe, à família Arecaceae das
palmeiras.
Uma ravenala no pôr do sol na costa oeste de Madagascar (Foto: © Haroldo Castro/ÉPOCA)
A ravenala é endêmica de Madagascar, ilha reconhecida por possuir uma alta
porcentagem (entre 80% a 90%) de plantas que só existem em seu território. Seu
nome científico completo Ravenala madagascariensis expõe não apenas o lugar
de origem, mas também seu nome local, uma vez que ravi em malgaxe significa
folhas e ala equivale à floresta. Assim, as “folhas-da-floresta” crescem muito
bem nos ecossistemas úmidos tropicais que existem na costa leste da ilha,
embora também possam ser encontradas em habitats mais secos na região
oeste e até mesmo em lugares descampados.
O gênero Ravenala possui apenas uma espécie. Uma prima da ravenala,
originária da Guiana, recebeu no passado o nome incorreto de Ravenala
guyanensis. Mas esta foi, depois, devidamente rebatizada como
Phenakospermum guyanensis. A forma das folhas levaram os paisagistas a
chamar essa planta de “ravenala-anã”.
Um grupo de ravenalas em uma floresta tropical perto de Toamasina, na costa oeste do país
(Foto: © Haroldo Castro/ÉPOCA)
A tradição malgaxe conta que a planta tem como missão prover água aos
viajantes sedentos. Isso aconteceria quando as hastes das folhas, bem próximas
ao tronco, ao formar um recipiente cônico, recebem e guardam a água da chuva.
De fato, é quase sempre possível encontrar líquido nesses espaços naturais
criados pelas bainhas das folhas. Mas a qualidade desta água pode estar
comprometida pela quantidade de matéria orgânica que ali se acumula. É
preciso estar literalmente morrendo de sede para beber essa água suja que só
alimenta insetos e bactérias.
Outra possível função da ravenala seria guiar o viajante. Seu leque de folhas
abertas em um semicírculo estariam quase sempre indicando, como uma
bússola, a direção de leste a oeste. Mas quando encontramos muitas plantas
juntas em estado selvagem, notamos que nem todas estão com suas folhas no
mesmo plano. Qual delas estaria no eixo correto?
Um grupo de ravenalas em uma floresta tropical perto de Toamasina, na costa oeste do país
(Foto: © Haroldo Castro/ÉPOCA)
Escolhi a árvore-do-viajante como símbolo para meu conceito de Viajologia (e,
mais tarde, para a Viajologia Expedições) no final da década de 1980. Mas não
fui o único a pensar nessa analogia. Antes do que eu, a companhia aérea
malgaxe, Air Madagascar, também havia selecionado a ravenala para
representar a empresa e todas as aeronaves levam o desenho estilizado da
planta em roxo nas suas caudas. Já a Sociedade Internacional de Ecoturismo
(TIES, na sigla em inglês), fundada em 1990, preferiu um desenho com uma
perspectiva em diagonal da ravenala, sempre unindo os princípios da viagem
com os da natureza, base do ecoturismo.
O verso do bilhete de 100 Ariary mostra uma imponente ravenala, junto às formações rochosas
do Tsingy de Bemaraha (Foto: Reprodução)
Meu primeiro encontro com uma ravenala ocorreu nas florestas tropicais de
Andasibe, durante minha primeira viagem à Madagascar em 1993. Eu já havia
visto dezenas de ravenalas em jardins brasileiros, mas encontrar uma árvore
tão emblemática como esta em seu habitat natural, rodeada de tantas outras
espécies diferentes, transformou-se em um belo motivo para fazer um
agradecimento especial à Mãe Natureza! A iniciativa Viajologia já estava em
seus primeiros anos de vida e ver a árvore escolhida como logotipo, ali na
minha frente, em carne e osso – ou melhor, em folhas e ramos – chegou a me
emocionar.
A partir daquele momento, não consegui mais andar em nenhum bosque,
floresta, jardim ou cidade sem imediatamente reconhecer a presença de uma
ravenala. No bairro onde moro no Rio de Janeiro, sei exatamente onde vivem as
ravenalas cariocas, seja nos canteiros de edifícios ou nas calçadas esburacadas.
Na saída do Túnel Rebouças, do lado da Lagoa, há uma bela ravenala no início
do Viaduto Saint Hilaire.
Detalhe dos ramos de uma ravenala na floresta de Andasibe (Foto: © Haroldo Castro/ÉPOCA)
Por se adaptar muito bem aos climas quentes, a ravenala rapidamente passou a
ser uma estrela no paisagismo tropical, sendo plantada sempre em lugares de
honra e com um bom espaço em volta. Gramados de fazendas, jardins e parques
acolhem bem plantas ou touceiras que precisam ser cultivadas em pleno sol e
em solo de boa qualidade. Como as folhas da planta são relativamente frágil, a
ravenala aprecia lugares protegidos dos ventos fortes para que suas longas
folhas não sejam rasgadas pelos ares nervosos.
Seja no Mar Caribe, no Oceano Índico ou nas ilhas do Pacífico, é difícil
encontrar um jardim de um hotel ou de um resort que não contenha
exemplares de ravenalas com seus esplêndidos leques abertos.
Duas ravenalas no jardim da piscina do hotel Avani Barbarons em Mahé, Seicheles (Foto: ©
Haroldo Castro/ÉPOCA)
Independentemente do hemisfério que a planta esteja vivendo, a floração
acontece geralmente no final do verão ou no outono. Em Madagascar e no Brasil
ocorre entre abril e maio. As flores de seis pétalas brancas nascem entre os
ramos da ravenala e abrem-se para ser polinizadas. No habitat nativo são os
lêmures-marrons e os morcegos que fazem esse trabalho de levar o pólen até a
próxima flor. Mas, aqui no Brasil, onde não há lêmures soltos em jardins, a
polinização é feita por aves.
Escolhi a ravenala como tema deste post, pois este será o último no blog
Viajologia do portal de ÉPOCA. Encerramos esse ciclo de dez anos e oito meses
com mais de 680 publicações e trouxemos milhões de leitores ao site da revista.
Para manter contato com o autor, visite o site viajologia.
Ravenala em flor no Jardim Botânico Pamplemousses na ilha Maurício (Foto: © Haroldo Castro/
ÉPOCA)
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