Você está na página 1de 6

82

I N Q U É R I T O À M I N A E I L H A D E S. T O M É

(17-3-1635)

SUMÁRIO — O ]ulz do Crime faz um Inquérito ao governo e admi-


nistração da fazenda -pública na fortaleza da Mina e
na ilha de S. Tomé, por ordem do Conselho da Fazenda.

Deligemcia feita por ordem do Conselho da Fazenda, a qual


fez o lecemceado Luis Galuam de Lemos, Juiz do C r i m e .

A o s dezassette dias do mes de março de mil seiz semtos


trimta e simquo annos foi o lecemceado Luiz Galuam de
Lemos, juiz do crime, á Rua do Pee de Ferro, alem do M o -
cambo, adomde elle juis comiguo escriuam perguntou as tes-
temunhas seguimtes. E eu Framcisco D i a z Moreira o escreuj.

Manoel do Basto, morador na Rua do Pee de Ferro, de


jdade corenta annos, q u e ora ueio da M i n a , testemunha jurada
aos santos euangelhos, e m que pôs a maõ e pergumtado pello
comtheudo na portaria do C o m s e l h o da Fazemda, disse elle
testemunha que há quatro annos e meio q u e partio deste Rejno
e todo o ditto tempo seruio de comdestable da fortaleza da
M i n a ( 1 ) e que se embarquara para S a m t h o m é c o m licença
do gouernador, o padre frej D u a r t e ( ) , da ordem de nossa
2

Senhora da L u s ( ) , e que de S a m t h o m é uiera e m huã nao da


3

( ) Não teve carta régia do cargo.


a

( ) Frei Duarte Borges, professo da Ordem de Cristo.


2

( )
3
Convento da Ordem de Cristo, em Carnide, cercanias de
Lisboa.

321
21
jlha da Madeira, mestre Manoel Mendes Madeira, natural
da mesma jlha. E uindo na altura e uista da dita jlha peleiia-
raõ c o m os olandezes das oito da m e n h a n thé o pôr do sol; na
peleja lhe metereraõ a nao e m que elle testemunha uinha no
fumdo e os tomaram e os lansaraÕ na mesma jlha na Ponta
do Sol, donde se embarquaram na carauella de Pero Brabo de
Setuual, que aportou na dita uilla auerá dez ( ) 4
dias. / /

E pergumtado do estado da M i n a pellas pergumtas qu'elle


dito juis do cryme lhe fes, disse que o gouernador da M i n a ,
que era Pero Mascarenhas, hé morto e de cento ( ) 5
e sesenta
homens que foram deste Rejno com o dito gouernador, só oito
ficauaó uiuos na dita fortaleza ao tempo de sua partida e os
mais morrerão de doenssas da terra, e que por morte do dito
Pedro Mascarenhas, que morreo e m maio passado de tnmta
e quatro, sosedeo e m seu lugar o padre frej Duarte Borges,
uigario que era da dita fortaleza, per eleissam dos soldados
delia, o qual gouernou très mezes, e morreo e per sua morte
os mesmos soldados da fortaleza emlegeram A n d r é da Rocha,
criado do gouernador Pedro Mascarenhas que lá morreo, o
qual ficaua gouernando na dita M i n a ao tempo de sua partida,
pesoa n a m sofesiente para o ditto cargo, e per esse estaua conhe-
cido entre os soldados, a qual fortaleza está muito arriscada,
asim per falta de capitam como de artelheria, e que está b e m
de munissoís. E que a feituna de Sua M a g e s t a d e está falta de
tudo o que se há mister para se gouernar b e m aquella fortaleza,
porque n e m t e m roupas n e m outra couza alguma para se poder
gouernar, porque há muitos annos que se n a m p a g u a aos sol-
dados por falta do necessário. E que hé uerdade que á sua par-
tida poderia ter a dita fortaleza oitenta homens pouco mais
ou menos, c o m as fortalezas d A c h e m e Samá, os quais dous

( ) No original: des.
4

( ) No original: sento.
5

322
fortes se prouera de gente da M i n a , os quais fortes ficam pella
costa distamcia de t n m t a legoas. E hé uerdade q u e os negros
da terra naõ commerceam c o m a nossa fortaleza per falta de
roupas e leuaõ aos olandezes e [a] os mais estrangeiros que uaõ
pella costa a fazer resgate todo o ouro e marfim e and e as
mais mercadorias da terra, e que os estrangeiros que aly uam
de ordinário alem dos olandezes, que aly t e m á uista sua for-
taleza, sam jngrezes; e isto disse elle testemunha, como pesoa
que sabe do estado da terra e [hjauer sido comdestable da dita
fortaleza, á qual t a m b é m hé nesesario acodir c o m comdestable,
porque o que lá fiqua naõ hé sofesiente, e declarou que té oye
naõ ueio da dita fortaleza outra pesoa mais [ q u e ] elle, testemu-
nha, o qual naõ sabe das couzas de S a m T h o m é nada. E assinou
c o m o juis. Framcisco D i a s Moreira a escreuj.

a) Galuaõ De M. e l
f do Basto.

Sebastiam Rodrigues, morador na Rua dos Emgrezinhos,


de jdade uinte simquo annos pouco mais ou menos, testemu-
nha jurada aos santos euangelhos e pergumtado pello com-
theudo na portaria do C o m s e l h o da Fazenda e mais couzas a
ella nesesanas, disse elle testemunha que elle ueio da jlha de
S a m t h o m é na nao de M a n o e l M e n d e s Madeira, que os olan-
dezes meteram a pique ao fumdo e tomarão a elle testemunha
e aos mais e os botaram na jlha da Madeira, donde se embar-
quou elle testemunha na carauella de Pero Brabo, que ueio a
Setuual [h]auerá dez ( )
4
dias. / /
E perguntado pellas couzas da M i n a , disse que delias naõ
sabe nada, só ouuir dizer e m S a m t h o m é a h u m criado de Pedro
Mascarenhas, que lá [h]auia sido gouernador, que o dito seu
amo era morto, e o Frade que emleieraõ e m seu lugar, e que
gouernaua h u m criado do dito Pedro Mascarenhas, pessoa yna-

323
bil para o dito carguo e que ouuira dizer q u e a dita fortaleza
estaua falta de todas as couzas a ella nesesarias.
E q u e de S a m t h o m é sabe q u e [h]auerá dous annos q u e
ahy foi h u m a nao emgreza e era mestre delia Joam de Soto
emgres, c o m o qual comercearao todos os da terra, e queren-
dolho defemder Lourensso Pires de Tauora, q u e e m t a m gouer-
naua S a m t h o m é , os fejtores delRej e mais mercadores da jlha
pretestaraõ ( ) 6
ao dito gouernador q u e os deixasse comerçear
c o m o dito emgres, pella nesesidade q u e tinha a terra. E e m t a m
lho comsemtio o dito gouernador Lourenso Pires de T a u o r a ;
e uindo neste tempo o gouernador nouo, Framcisco Barretto ( ) , 7

a dita nao emgreza se foi daly para meia légua abaxo do porto,
adonde o dito gouernador Framcisco Barreto lhe mandou dizer
que se fosse, senaõ q u e o jria castigar. E e m t a m se foi a dita
nao emgreza. E q u e a dezoito de setembro do anno passado,
jndo elle testemunha deste Rejno, emtrou na dita y l h a de
Samthomé e nela achou o mesmo mestte emgres Joam de
Soto, c o m outra nao maior q u e a primeira, a qual y á tinha
carregada c o m os mesmos mercadores da terra, gouernando
otro sy a terra o mesmo Lourenso Pires de Tauora, por morte
do gouernador Framcisco Barreto ( ) . 8
/ /
E que sabe q u e geralmente todos os mercadores da terra
comerseauam c o m a gente da dita nao. E q u e o dia q u e elle
testemunha partio da jlha de S a m t h o m é , deram fundo nella
duas naos emgrezas; porem naõ sabe q u e comerseasem, antes
emtende que se foraõ per falta de asuqueres. E q u e as ditas

( )
8
N o original: pertestaraõ.
( )
7
Francisco Barreto de Meneses, de seu nome completo, fidalgo
da Casa Real, foi nomeado capitão e governador de S. Tomé por fale-
cimento de André Gonçalves Maracote, por carta régia de 8 de Junho
de 1630. — A T T — - C h a n c e l a r i a de D. Filipe III, liv. 25, fls. 145 V.-146.
( )
8
De Lourenço Pires de Távora não há nomeação régia regis--
tada na Chancelaria.

324
naos que dito t e m saõ e foraÕ de Ingalaterra e n a m por comta
de n h u m p o r t u g [ u ] e s . E que o mestre Joam Soto disera a elle
testemunha q u e leuaua lysenssa de Sua M a g e s t a d e para hir á
dita jlha de S a m t h o m é , mas elle testemunha a naõ uio; e naõ
disse mais. E asinou c o m o juis. E eu Framcisco D y a s Moreira
a escreui.

a) Galuaõ a) Sebastianroíz

Balthezar Gomes, mareante e morador em Alfama, de


jdade, diguo morador na Rua Dereita de nossa Senhora dos
Remédios, de jdade trimta e oito annos pouco mais ou menos,
testemunha jurada aos santos euangelhos, e m que pôs a maõ,
e pergumtado pello comtheudo na portaria do Comsselho da
Fazenda, disse elle testemunha, que [h]auerá dez ( ) dias q u e 4

chegou a Setuual na carauella de Pero Brauo, que o tomou


na jlha da M a d e i r a e a seus companheiros, onde os olandezes
o lansaraõ da nao e m que uinhaÕ da jlha de S a m t h o m é a este
Rejno, que botarão a pique ao fumdo. E que na jlha de S a m -
thomé hé publico que Pero Masquarenhas gouernador da
M i n a , era morto. E otro sy era morto hú Frade que emlegeraõ
e m seu lugar. E que agora de prezemte serina de gouernador
hü criado do dito Pedro Mascarenhas. E que e m Setembro
passado, estando elle testemunha na jlha de S a m t h o m é , estaua
no mesmo porto h u m emgres c o m h u m a nao muito grande
que carregou de asuqueres que lhe deraÕ os mercadores por
dinheiro e fazendas, que lhes deu, comsemtindo o gouernador
da dita jlha, que emtaõ era e oje hé Lourenso Pires de
Tauora. / /

E que [h]auerá dous annos, pouco mais ou menos, fora


o dito emgres c o m outra nao e comerceara c o m os ditos mer-
cadores, comsemtindolho o mesmo Lourenso de Tauora, que
e m t a m era gouernador. E que ao tempo que elle testemunha

325
partio deram fundo duas naos, as quais naõ tinhaõ carregado
por naõ terem asuqueres, as quais naos eram emgrezas e a
gente emgreza, c o m a qual os mercadores da dita jlha tratam
quando as ditas naos lá uaõ; e naõ sabe de outras naos que
lá mais fosem. E naõ disse mais das ditas pergumtas. E asinou
c o m o juis. E eu Framcisco D i a s Moreira a escreuj.

a) Galuaõ a) Beltesar Gomes.

A H U — S . Tomé, cx. I, doc. n.° 124.

326

Você também pode gostar