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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL

ROBSON DE AGUIAR OLIVEIRA

A INVISIBILIDADE DA SUBJETIVIDADE NO SERVIÇO


SOCIAL

Rio de Janeiro
2019

NOME DO AUTOR:
ROBSON DE AGUIAR OLIVEIRA

TÍTULO DO TRABALHO:
A INVISIBILIDADE DA SUBJETIVIDADE NO SERVIÇO
SOCIAL

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de


Serviço social da Universidade Federal do Rio de janeiro, como
parte de requisitos necessários à obtenção do grau de bacharel
em Serviço social.

ORIENTADOR:
Prof. Dr. Marcos Botelho
AGRADECIMENTOS

Agradeço todos os ensinamentos que me foram apresentados na academia, seja na sala


de aula, nos corredores, nas polêmicas e nos debates.

Agradeço aos diferentes estudantes, nesses longos períodos que estive na universidade,
pela troca, pela solidariedade e também por me ensinar como conviver e respeitar outros
pontos de vista.

Agradeço também aos professores pela paciência em ter um aluno, inquieto e muitas
vezes arrogante em sala de aula. O tempo passa, sai a arrogância e surge a vergonha.
Obrigado a todos os professores!

Agradecimento especial aos professores: Marcos Botelho. A sua solidariedade vem de


longa data, com uma construção teórica sólida e ao mesmo tempo generosa, que me ensina
muito. À professora Verônica, sempre sagaz nas observações e com muita competência tem
me ajudado a olhar a academia por outras lentes, pela produção acadêmica e pela pesquisa.

Agradeço as construções fora dos muros da universidade, são muitas as pessoas que
me ajudaram e ainda ajudam.

Agradeço ao povo do Sebastião Lan, o acampamento mais antigo do Brasil, por seus
ensinamentos, principalmente nas dificuldades e nas alegrias.

Agradeço a Claudia e ao Henrique, nova família construída em meio a fé e a


solidariedade.

Agradeço a minha mãe, figura sempre presente na minha vida, mulher guerreira.

Agradeço a minha companheira Rosa, pela paciência, cumplicidade e leveza nessa


construção conjunta pela fé e pelo amor.
Resumo: Trata-se de um trabalho que busca refletir sobre a ausência temática da
subjetividade no processo de formação profissional e o desdobramento desse processo no
cotidiano do assistente social. Apresenta-se um conjunto de referências teóricas em torno do
tema da subjetividade enfatizando o processo de subjetivação do homem moderno e algumas
experiências, na área de saúde mental, em que assistentes sociais atuaram em atividades que
expressam uma dinâmica de atendimento atravessado pela temática da subjetividade, em um
passado recente. Por fim, um conjunto de entrevistas com assistentes sociais descrevem as
percepções dessas profissionais sobre o tema da subjetividade a partir do processo de
formação acadêmica até o cotidiano da atividade profissional. Dessa maneira, compreende-se
que trazer o tema da subjetividade permite uma nova leitura crítica, podendo resultar em um
novo entendimento teórico sobre o tema. Por outro lado, este trabalho proporcionou perceber
que há muitas incertezas e distorções quanto ao significado e a dimensão prática do tema da
subjetividade no exercício profissional.

Palavras-chave: Subjetividade. Serviço Social. Saúde Mental. Formação. Atividade


Profissional.
SUMÁRI

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 5

CAPÍTULO 1 A SUBJETIVIDADE E SEU DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO


SOCIAL.....................................................................................................................................9
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24
35
35
2.4 O movimento porta de entrada e porta de saída............................................................37

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2.6 39

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41
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43
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46
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ANEXOS..................................................................................................................................65
5

INTRODUÇÃO
O presente trabalho pretende dialogar sobre um tema pouco discutido no interior da
formação do assistente social. Estamos nos referindo à subjetividade. Entre as motivações que
me levaram a escolha do tema e a produção desta monografia, destaco a necessidade de
desvincular a temática da subjetividade como uma categoria “apropriada” pelo Serviço Social
conservador em especial o Serviço Social Clínico e proporcionando assim uma ampliação do
tema.
Reconhecemos a importância da temática da subjetividade no processo de formação
profissional do assistente social como um elemento importante na prática profissional no que
se refere a atuação frente a questão social. No entanto, discordamos que o assistente social
exerça atividades clínico terapêutica como sustentam os partidários do Serviço Social Clínico.
Avaliamos que a temática da subjetividade é um tema complexo e que esteve presente
nos debates do movimento de Reconceituação. Neste sentido, julgamos pertinente trazer
elementos do debate me torno da subjetividade no interior do pensamento marxista já que
reconhecemos a validade dessa teoria crítica como um princípio para a formação do
profissional do serviço Social. Assim temos, na primeira parte deste trabalho, uma introdução
sobre a temática da subjetividade a partir da literatura marxista onde esperamos comprovar
que o tema da subjetividade é relevante para está teoria crítica. Esta introdução nos parece
importante sob dois aspectos. No primeiro, uma série de autores marxistas apontam par a
importância do tema como parte da teoria crítica marxista e sua atualidade . O segundo, diz
em relação a contribuição que esses autores podem dar enquanto conteúdos para a formação
profissional dos assistentes sociais.
Ainda na primeira parte, optamos por apresentar uma leitura sócio histórica sobre a
subjetividade, destacando a caracterização da subjetividade privada, presente no homem
burguês. O objetivo nesta parte do trabalho, foi apontar para o desenvolvimento e
consolidação da subjetividade privada na sociedade burguesa, e sua relação com a decadência
deste modelo todo o procedimento de desenvolvimento e consolidação da chamada
subjetividade privada também coincide com o fracasso desse modelo. Outro desafio
colocado foi pesquisar a temática da subjetividade na literatura do serviço social. Neste caso,
buscamos livros, dissertações, artigos e linha de pesquisa que trouxessem a temática da
subjetividade. Para nossa surpresa, percebemos que o tema da subjetividade no interior do
serviço social não produz uma massa crítica capaz de desenvolver uma literatura específica.
Este novo quadro de ausência de material para a pesquisa, nos levou a reorientar o nosso
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trabalho utilizando outras contribuições de diferentes áreas como, historia da arte e a


psicologia. Essa nova pesquisa gerou um conjunto de dúvidas e diferentes possibilidades de
campo de pesquisa. Em relação à psicologia foi necessário conhecer as diferentes correntes de
pensamento e o desenvolvimento histórico social desta ciência. Em relação à história da arte,
optamos por conduzir a nossa leitura a partir da expressão artística em referência a
determinados períodos históricos. O resultado foi uma descrição histórica social sobre o
desenvolvimento da subjetividade privada.
No segundo capítulo, relatamos a influência do movimento higienista brasileiro
organização conservadora que defendia uma ação moral no combate a “pobreza” ignorando as
questões sociais e econômicas envolvidas naquele contexto histórico. Este discurso da
higienização, rapidamente ganha força política constituindo a Liga Brasileira de Higiene
Mental – LBHM e atuando no governo daquele período. O movimento de higiene mental
brasileiro influencia o Serviço Social brasileiro através da presença nas duas primeiras escolas
de serviço social localizadas no Rio de Janeiro e São Paulo. Descrevemos a relação entre
setores da igreja católica e o movimento de higiene mental. Analisamos o conteúdo do
discurso higienista e suas implicações dentro daquele período histórico para o Serviço Social.
O objetivo, desta longa descrição, sobre a presença do movimento de higiene mental junto ao
Serviço Social, foi de trazer alguns elementos sobre a influencia deste movimento em relação
à temática da subjetividade e os aspectos psicológicos na base curricular dos primeiros cursos
de formação profissional. E neste sentido, contribuindo com uma formação conservadora. Em
seguida, apresentamos algumas experiências relacionadas à saúde mental em que temos a
participação de assistentes sociais. Infelizmente nossa pesquisa não conseguiu materiais que
trouxessem avaliações e análises sobre a prática profissional, restando apenas uma descrição
das “tarefas” desenvolvidas. Já no segundo momento buscaremos trazer uma leitura crítica
sobre a atuação do serviço social junto ao movimento da reforma manicomial e como este
processo rebate na prática deste profissional no interior da saúde mental.
No terceiro e último capítulo, tratamos da relação da subjetividade no processo de
formação e na atividade profissional. Entrevistamos um conjunto de assistentes sociais que
desenvolveram um diálogo em relação ao período de formação, tendo como referências
questões sobre as disciplinas, campo de estágio e relação com usuário. Nossa finalidade, a
partir de um roteiro de questões, é levantar dados capazes de ajudar na reflexão em torno do
processo de formação destes profissionais. Neste sentido, o último capítulo apresenta a
transcrição dos depoimentos destes profissionais. Tendo como referência um roteiro de
questões, as entrevistas foram desenvolvidas com cinco profissionais. O roteiro foi formulado
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para auxiliar nas entrevistas sendo composto por duas partes. Na primeira, temos os dados
quantitativos relacionados à idade, período da formação, estágio, tendo como objetivo ajudar
no desenvolvimento de um perfil das assistentes sociais entrevistadas. Na segunda parte do
roteiro faremos uma análise a partir das respostas e posicionamentos das assistentes sociais.
Essa parte do roteiro é composta de quinze questões que foram divididas tematicamente em
quatro blocos: instituição de ensino e formação profissional, instituição de ensino e formação
individual, formação e dia a dia do trabalho e, por fim, serviço social e subjetividade.
Avaliamos que os diferentes comentários e percepções geram um grande painel, com a
presença de vários temas transversais, que por sua vez geram várias “janelas”. Garantir o foco
no tema da subjetividade foi o grande desafio do terceiro capítulo. Por outro lado, as
entrevistas possibilitaram trazer elementos importantes sobre o campo de estágio e a
influência da supervisão de campo no processo de formação profissional. Outro aspecto
presente nos depoimentos foram as diferentes interpretações de um mesmo termo, como o
caso da palavra “escuta”. Palavra carregada de sentidos, que ganha significado e importância
a partir da interpretação de cada assistente social, porém permitindo uma reflexão sobre o
quanto este termo é ambíguo e genérico. No último bloco da segunda parte do roteiro,
trabalhamos o tema da subjetividade a partir de algumas questões e assim finalizando o
quadro de transcrições das falas das assistentes sociais. A parte seguinte do capítulo,
desenvolvemos uma análise qualitativa sobre o conteúdo das entrevistas, destacando as
principais questões apresentadas pelas profissionais entrevistadas.
Por fim, apresentamos as considerações finais deste trabalho, refletindo sobre o
processo de subjetivação na atividade profissional do assistente social. Optamos por
desenvolver uma análise sobre o processo de formação profissional, já que a maior parte das
falas das entrevistadas está relacionada a este período. Também trazemos contribuições da
atividade profissional, com menor peso, estabelecendo algumas relações com alguns aspectos
da questão social. Nosso primeiro objetivo quanto a este trabalho foi fomentar o debate em
torno do tema da subjetividade. Por outro lado, compreendemos que a condução da própria
pesquisa já possibilita um direcionamento quanto a uma prévia opinião. Neste caso, não
fugimos a regra, pois acreditamos que o principal objetivo deste trabalho é desmistificar a
temática da subjetividade, garantindo assim uma reflexão atual e necessária sobre a
importância do tema no processo de formação profissional como também no cotidiano
profissional.
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CAPÍTULO 1 A SUBJETIVIDADE E SEU DESENVOLVIMENTO


HISTÓRICO SOCIAL

1.1 A teoria marxista e a subjetividade

Reconhecemos que nossa pesquisa em torno da temática da subjetividade, no interior


do Serviço Social, apontou diferentes questões que consideramos serem pertinentes ao nosso
trabalho. Neste sentido, optamos por apresentar nesta primeira parte deste capítulo dois
movimentos que consideramos importantes; o primeiro está relacionado ao tema da
subjetividade no interior do pensamento marxista, para isso utilizamos alguns autores que de
modo geral buscam valorizar o tema como uma elemento importante na concepção marxiana
da essência humana. Sem condições de aprofundar as reflexões dos autores, optamos por
desenvolver um painel relacionando o tema da subjetividade e a teoria marxista1.

Discutir a relação entre Serviço Social e subjetividade exige que se reflita tal relação
sob a perspectiva teórica, neste sentido, pretendemos desenvolver a temática da subjetividade
a partir da teoria crítica marxista. Assim, apresentamos alguns autores que “resgatam” o tema
da subjetividade estabelecendo um rico mas ainda insuficiente debate em torno desta temática.
Vale destacar que em nossa pesquisa encontramos um movimento, por parte de diferentes
autores, de registrar que a temática da subjetividade foi combatida por algumas correntes do
marxismo. Essas correntes produziram uma crítica contundente rebatendo no interior do
Serviço Social: “Não podemos ignorar que o marxismo-leninismo produziu uma espécie de
recalcamento da subjetividade que atingiu amplos setores da esquerda e, em certa medida, o
próprio Serviço Social reconceituado”. (RODRIGUES, 1997, p.95).

A autora prossegue destacando que o Serviço Social brasileiro estabeleceu, na década


de 80, a incorporação de um marxismo crítico assimilado pelo movimento de reconceituação
que, numa leitura contrária ao conservadorismo ao mesmo tempo que estabelece vínculos com
a teoria marxiana.

Ao abordar o tema da subjetividade na teoria marxista nos deparamos com o processo


que estamos denominando de estigmatização. Trata-se da difusão, a partir do senso comum,
de que a teoria crítica marxista toma como base as dimensões econômicas e a perspectiva

1 A nossa pesquisa proporcionou o encontro com diversos autores marxistas e seus trabalhos
sobre a subjetivação o que sem dúvida merecia uma pesquisa especifica e ampla..
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coletiva ao mesmo tempo em que condena o individualismo e menospreza a questão da


subjetividade. Esta leitura estigmatizadora, segundo alguns autores, ganha maior amplitude
em decorrência da contribuição de correntes marxistas que limitam a importância da
subjetividade, alimentando assim uma interpretação até hostil em relação ao tema.

A temática da subjetividade no campo do marxismo tende a ser tratada com


estranhamento, não só porque no âmbito do senso comum difunde-se um
antagonismo entre o campo da singularidade e o dos projetos coletivos, mas porque,
igualmente, no interior da própria esquerda, a questão da produção dos sujeitos vem
sendo considerada de forma preconceituosa e/ou reducionista. (SILVEIRA, 2002,
p.103).

Para Silveira (2002), o reconhecimento das imprecisões sobre a temática da


subjetividade no interior do marxismo, é o primeiro passo para retomar essa reflexão já que o
contexto social em que vivemos a dimensão humana vem sendo solapada permanentemente
por uma presente “ lógica mercantil, acoplada à égide ao consumo e a uma dimensão de
historicidade cristalizada no plano da imediaticidade e de um tempo presente eternizado.”

Ao apontar os problemas relacionados entre a subjetividade e algumas correntes


marxistas, Saviani (2002) afirma que esses grupos teóricos acabaram por fundamentar suas
elaborações apenas na base econômica, o que segundo o autor reduziu “a subjetividade a mero
reflexo das determinações materiais” desenvolvendo assim um estereótipo equivocado do
pensamento marxista. Na introdução do seu artigo, Perspectiva Marxiana do Problema da
Subjetividade- Intersubjetividade, o autor destaca a importância da subjetividade na obra de
Marx e a importância de se estudar o tema.

O problema da subjetividade cujo conceito será considerado, neste texto, como


correlato da individualidade, é central no pensamento de Marx, fazendo-se presente
desde suas primeiras reflexões até as formulações mais amadurecidas expressas nas
notas que prepararam a obra sistemática d’OCapital. (SAVIANI, 2002, p. 2).

Com a proposta de “resgatar” a teoria da subjetividade no marxismo o livro Elementos


para uma Teoria Marxista da Subjetividade reúne autores de diferentes formações, três
filósofos, um médico psiquiatra, um psicólogo e um sociólogo, que compreendem que a
subjetividade trata da questão da individualidade na história e das formas de subjetivação que
lhe correspondem. Esta obra, organizada por Paulo Silveira e Bernad Doray, demonstra todo
um vigor teórico em pautar a temática da subjetividade no campo do pensamento marxista. Já
na introdução do livro um dos organizadores busca situar historicamente o debate em torno da
individualidade e aponta as dificuldades e desafios em torno do tema.
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A questão da individualidade na história é teórica, mas também política. Se os textos


criticam a individualidade tal como ela é posta praticamente sob o capitalismo, isto
não quer dizer que pretende uma dissolução da individualidade nas formações
coletivas: visam antes, como projeto, o desenvolvimento da livre individualidade,
que só pode constituir-se, enquanto tal, pela abertura das dimensões sociais e
coletivas da atividade humana. (SILVEIRA, DORAY, 1989, p.11)

Segundo os autores, o tema da subjetividade permaneceu “congelado” durante o


período histórico identificado com o regime stalinista. Como resultado deste processo, ainda
hoje algumas correntes no interior do pensamento marxista associam o debate em torno da
subjetividade com o individualismo desenvolvido na sociedade capitalista. O que, a nosso
ver, impede o debate teórico em torno do tema e consequentemente fortalecendo o senso
comum onde a máxima do pensamento marxista é a supremacia do coletivo sobre a
individualidade.

É certo que a subjetividade e a questão mais ampla da individualidade foram


tratadas, por parte das mais diversas correntes do pensamento, de uma forma geral,
sobe a perspectiva hipostasiante. Isso, contudo, está muito longe de justificar o
abandono ou, melhor ainda, a supressão dessas questões no interior do pensamento
marxista. (SILVEIRA, DORAY, 1989, P.11)

Se por um lado, a temática da subjetividade é tratada como um tema hostil ao campo


marxista, por outro, temos um conjunto de autores marxistas que sinalizam a importância do
tema para uma maior compreensão da sociedade capitalista. Neste sentido, a subjetividade
não deve ser pensada como sendo algo natural, uma espécie de essência interna dos homens, e
sim como um processo que se constitui pela prática. Ressaltando assim o caráter histórico e
prático da subjetividade. Para Silveira (2002) a subjetividade não deve ser considerada como
imanente ao indivíduo, mas sim como processo que vai se constituindo a partir das expressões
concretas da sociabilidade hegemônica nos diferentes cruzamentos dessas dimensões dentro e
fora do indivíduo não havendo separação entre o plano individual e coletivo. Ou seja,
podemos afirmar que a subjetividade é socialmente construída, pois é o resultado de um
determinado momento histórico e também de expressão cultural determinada. Para a autora,
Marx é o responsável por vincular essa reflexão quando afirma que o homem está ligado ao
processo produtivo na medida em que está produzindo e produzindo-se. Está análise ajuda na
percepção que tanto o processo de formação da subjetividade quanto da personalidade do
homem se dá na vida social e dentro de um determinado processo histórico que atravessa e
tensiona o sujeito. “A sua análise vai desvendando como objeto exterior á mercadoria, atua
como sujeito mistificador que, ao encobrir o lugar real do sujeito produtor, encobre em
11

verdade o poder de sua atividade que permanece obliterado no processo de sua objetivação”.
(SILVEIRA 2002, p.105)

Neste sentido, expropria-se o trabalho coletivo, que segundo a autora é o produto da


força humana num movimento singular de cooperação, limitando essa experiência para o
trabalhador, no mesmo instante que é desenvolvida uma outra forma de perda. Estamos nos
referindo a perda no campo subjetivo imaginário. Na “cooperação” outra perda ainda é
enfatizada. Refere-se à expropriação do poder criador coletivo, na dispersão desse campo
através da necessária desestruturação individual.

Marx vai revelando como por meio do processo de intercâmbio de mercadorias, vai
sendo constituída uma relação que aparece entre objetos, sendo obliterado o pano de
fundo da relação determinante - entre os próprios sujeitos. Essa aparente
desvinculação, essa “ignorância” invisível socialmente, determinará produções
subjetivas particulares nos homens que o vivenciam. (SILVEIRA 2002, p.105).

Para Saviani (2003), é nos Manuscritos Econômico – Filosóficos que Marx


desenvolverá as ideias centrais em torno do trabalho alienado e da essência humana. Nesta
obra, o filósofo alemão inicia uma pesquisa em que procura entender em que consiste a
essência humana. A resposta a essa questão é o trabalho.

O conteúdo da essência humana reside no trabalho. Portanto, já se encontra aí de


forma clara a ideia que será desenvolvida depois de forma sistemática, objetiva e
científica: o ser do homem, a sua existência, não é dada pela natureza mas é
produzida pelos próprios homens. Deixado a si mesmo, submetido ao jugo da
natureza, o homem perece. Diferentemente dos outros animais que têm sua
existência garantida pela natureza bastando-lhes adaptar-se a ela para sobreviver, o
homem necessita fazer o contrário. Precisa agir sobre a natureza transformando-a e
ajustando-a às suas necessidades. Em lugar de adaptar-se à natureza, tem de adaptar
a natureza a si. (SAVIANI, 2003, p.5).

Ao agir sobre a natureza e consequentemente alterando-a, o homem desenvolve o


trabalho. Neste sentido, é através do trabalho que os homens se produzem a si mesmo. O
trabalho é a essência humana. Saviani (2003) acrescenta que, ao analisar a realidade histórica
social Marx encontra o homem realizando o trabalho alienado. Assim, a essência humana se
apresenta como essência alienada.

Analisando as teorias de alienação em Marx e Feuerbach, Saviani (2003) destaca que


enquanto Feuerbach compreende que a alienação no homem é identificada em sua natureza
sensível e limitada. A alienação neste caso é necessidade antropológica, independente das
condições históricas e sociais. Já em Marx alienação é vista como um processo a ser
12

constituído já que faz parte da natureza do homem mas decorrente de razões históricas. O
autor no apresenta um exemplo.

O operário aliena sua própria essência na relação prática, isto é, material, com a
natureza (o trabalho) que, por sua vez, determina a relação entre os homens que aí se
apresentam como o operário e o não-operário. Portanto, o conceito de trabalho
alienado já remete à produção material. A alienação ocorre na história onde também
se criam as condições para a sua eliminação. Assim, ao contrário de Feuerbach, para
Marx a alienação não é algo decorrente de uma essência universal e abstrata, um
conceito meramente antropológico. (SAVIANI, 2003, p.5).

Diante das considerações do autor, podemos afirmar que o processo de alienação trata
do não reconhecimento de si de sua obra e na relação com outros homens. O resultado é que
homem enquanto criador não reconhece o que produz, como também não se encontra no
trabalho como um ato seu, sua realização. Neste sentido, afirmamos que essa caracterização
da alienação é descrita sob os aspectos subjetivos e que a nosso ver, repercute diretamente na
não realização dos homens quanto capacidade criadora. O trabalho alienado traz em sua
constituição o aspecto subjetivo e objetivo. O conteúdo objetivo do trabalho alienado se dá
pela miséria material do homem diante de um mundo que perde valor e sentido na medida que
se valoriza as coisas.

Com efeito, objetivamente o trabalho alienado, ao mesmo tempo que produz


mercadorias, produz também o próprio operário como mercadoria. Vê-se que a
concepção marxiana da essência humana se distingue da concepção corrente, de
caráter especulativo e metafísico que se contrapõe, portanto, à existência histórica e
social dos homens. Marx se empenha em compreender a essência humana no
desenvolvimento histórico onde ela se manifesta, primeiro como negação e, depois,
como realização. (SAVIANI, 2003, p.9)

Por fim, o autor reafirma que esta concepção não deve ser limitada à ideia, também
abstrata e universal, da essência humana como se fosse parte original de todo indivíduo, uma
vez que para Marx os indivíduos só deixarão de viver na negação de sua essência quando
operarem a união entre a existência e essência.

Mantendo a pauta da subjetividade no interior do marxismo, Doray (1989), faz um


apelo ao marxismo militante para que ele reconheça na atual conjuntura a necessidade de
elaborar seu projeto e sua visão ética junto ao campo da subjetividade. Com certa
preocupação, o autor, afirmará;
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Para o movimento revolucionário coloca-se, portanto, a questão das condições de


um investimento possível de uma subversão do terreno assim descoberto por um
antagonismo de classes. Isto não é óbvio. Não insistirei sobre as legitimas
desconfianças, mas também sobre as economias de procedimentos, que as vezes,
conduzem a que, por exemplo, o movimento sindical pareça atribuir uma
importância menor ao terreno da subjetividade. (DORAY, 1989, p.80)

Em seu esforço teórico em relacionar a concepção marxista com a psicanálise, Doray


(1989), reconhece na subjetividade como o conjunto dos processos pelos quais o indivíduo, a
partir de uma relação orgânica com as estruturas simbólicas, tenta conduzir e abrir um acesso
a forma genérica de seu ser.

Dizer isto, é inicialmente, dizer que os indivíduos humanos são atravessados por
uma contradição estrutural principal, incontornável, uma contradição que também
trabalha, como vimos amplamente, sobre todas as “coisas sociais” ( precisamente
por que como as mercadorias elas são humanizadas), e que lhes confere uma
estrutura formal comum, uma estrutura simbólica: é a contradição entre sua forma
natural ( seu corpo próprio, com os programas biológicos que nele se realizam, suas
capacidades concretas, sua duração de vida própria, etc) e de sua forma genérica
essencial, aquela que resulta do fato de que sua existência realiza relações sociais. É
esta forma genérica essencial, que, seguindo Lucien Sève, chamaremos a
personalidade. (DORAY,1989, p.99)

Neste sentido, o que designa o homem é que sua personalidade original não está
definida pela forma natural que o identifica, justamente, como homem. Pois essa forma
natural está impregnada de um interior principal que está ligada as formas externas que a
ultrapassam, nas dimensões espaciais e temporais. Assim chegamos a situação de um corte
estrutural, através de um intricado processo de formas contraditórias entre o nosso tempo
( real, instantâneo) ou como afirma Doray (1989), o tempo programado da expressão dos
códigos genéticos e o tempo da acumulação irreversível do patrimônio social.

Será esse o ponto de partida para o que Doray (1989) chama de uma teoria
materialista da subjetividade. Para o autor, o pensamento revolucionário e materialista
carrega em si, a partir de um compromisso ético, uma responsabilidade em compreender o
sentido dos atos humanos a fim de libertar, na prática, as vias de uma reapropriação
subjetiva da história por aqueles que são seus atores.

Em Personalidade em Gestação, Lucien Sève (1989) faz um alerta sobre uma


confusão, ainda presente nos dias atuais, entre materialismo e objetivismo históricos ou, para
alguns, entre o materialismo e o “anti-humanismo teórico”.

Ao humanismo moralizante - que há milênios repete que não se mudará a sociedade


se não mudarem inicialmente os homens - esse tipo de marxismo acreditava
responder pelo axioma inverso, como se a transformação dos indivíduos não fosse
14

intimamente concomitante com a da sociedade – e de hoje de maneira mais decisiva


do que nunca. (SEVÈ, 1989, p. 147)

Enfatizando a necessidade de um estudo profundo sobre a constituição do indivíduo,


que leve em conta percorrer um caminho ainda pouco explorado da ciência da personalidade,
utilizaremos a obra de SEVÈ (1989) para apresentar o indivíduo como humano como uma
variável histórica. Tendo como referência a obra de Marx A Ideologia Alemã, o autor, atenta
para a importância que o tema da individualidade sempre esteve presente nas obras do
filósofo Alemão.

Os indivíduos sempre partiram de si mesmos, partem sempre de si mesmos. As suas


relações são as relações do processo real de sua vida. Como chega a ocorrer que suas
relações atinjam a autonomia contra eles ? Que os poderes de sua própria vida se
tornem onipotentes contra eles? Isso decorre, responde Marx, do fato de que, com a
divisão do trabalho, a apropriação privada e o antagonismo das classes, se instaurou
um profundo divórcio entre os homens e suas condições objetivas de existência,
metamorfoseadas em poderes independentes e cegos que os subjugam: trata-se da
alienação em sentido histórico da palavra. (SEVÈ, 1989, p. 149)

Na citação acima, notamos o quanto é necessário ao marxismo superar um


determinismo sociológico para assim avançar em uma elaboração crítica sobre a dominação
dos homens que revela as relações de classes e que visa ser dissolvida pelo confronto radical.
Portanto abordar sob o aspecto do marxismo o tema da personalidade, é antes de tudo,
desenvolver uma radical crítica do nosso objeto para assim voltar a refletir sobre uma
realidade teórica e prática que pode ser sistematizada nessa sentença abaixo.

O que um homem faz de sua vida e o que a sua vida faz dele: eis a substância de um
conceito de personalidade digno desse nome e digno de uma ciência que se empenha
em estudar as suas lógicas fundamentais as suas condições de transformação.
(SEVÈ, 1989, p. 156).

A subjetividade está presente no interior do pensamento marxista enquanto um tema


atual sendo desenvolvido com grande vigor intelectual e através de diálogo com outras
ciências humanas. Todo esse movimento teórico sobre a subjetividade vem ao encontro a uma
necessidade de pautar a questão da individualidade do homem moderno frente a um modelo
de sociedade que o acorrenta, que o mutila. Estamos nos referindo a sociedade capitalista.
Neste sentido, é impossível não relacionar essa construção crítica da subjetividade individual
com uma análise crítica do capitalismo e do processo de civilidade conduzindo por este
modelo econômico.

Em termos teóricos a subjetividade nos é apresentada em uma variedade de teorias e a


partir de estudos desenvolvidos em diferentes áreas das ciências humanas. Neste sentido,
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avaliamos que ser pertinente uma breve descrição dessa temática por alguns autores do
Serviço social que dialogam com a psicologia mantendo uma referência na teoria marxista.

No campo do Serviço Social, Nicacio (2006) nos alerta sobre a complexidade do tema:

Quando falamos de subjetividade estamos nos referindo ao indivíduo, à pessoa, ao


eu, ao inconsciente, ao sujeito de direitos ou à identidade? Portanto, é necessário
indicar a necessidade de delimitar este conceito para que possamos avançar neste
debate. (NICACIO 2006, p. 2).

No campo da psicologia, Silva (2009) aponta que o termo subjetividade é utilizado


com as mais diferentes definições, resultando na ausência de um consenso sobre o que se
entende, de fato, por ela. Mas segundo a autora, essa falta de um consenso sobre o tema não
impede que se tenha um entendimento genérico sobre o que é subjetividade.

Geralmente, subjetividade é entendida como aquilo que diz respeito ao indivíduo, ao


psiquismo ou a sua formação, ou seja, algo que é interno, numa relação dialética
com a objetividade, que se refere ao que é externo. É compreendida como processo e
resultado, algo que é amplo e que constitui a singularidade de cada pessoa. (SILVA
2009, p. 170).

A autora alerta para que o fato da subjetividade identificar-se com a dimensão do


único e singular do sujeito não determina que sua origem esteja no interior do sujeito. Ao
contrário.

O fato de a subjetividade referir-se àquilo que é único e singular do sujeito não


significa que sua gênese esteja no interior do indivíduo. A gênese dessa parcialidade
está justamente nas relações sociais do indivíduo, quando ele se apropria (ou
subjetiva) de tais relações de forma única (da mesma maneira ocorre o processo de
objetivação). Ou seja, o desenvolvimento da subjetividade ocorre pelo intercâmbio
contínuo entre o interno e o externo, relação essa que Vigotski (1995) descreve
quando se refere à gênese das funções psicológicas superiores. (SILVA, 2009, p
170).

No Serviço Social, o tema da subjetividade vem sendo introduzido por alguns autores
que alertam para a relevância do assunto para o profissional da área. Na introdução do texto
“Da Hiperpsicologização Normatizadora ao Recalcamento da Subjetividade: notas históricas
sobre o Serviço Social, subjetividade e saúde mental no Brasil e no Rio de Janeiro”,
VASCONCELOS (2002) nos apresenta um quadro analítico sobre a ausência da temática da
subjetividade no interior do Serviço Social.

Esta continuidade se deve em parte ao aspecto geracional dos profissionais de


Serviço Social, que tendem a reproduzir os padrões hegemônicos de sua formação
universitária nos cerca de trinta anos médios de vida ativa, principalmente tendo em
vista a dificuldade da cultura do Serviço Social brasileiro dos últimos vinte anos em
abordar a temática da subjetividade, como veremos adiante... (VASCONCELOS
2002, p.182).
16

Mantendo uma visão crítica em relação ao período hegemonizado pelo “marxismo


enviesado” a professora Mavi Pacheco Rodrigues (2002), destaca que o Serviço Social não
apenas ultrapassou esta interpretação dogmática do marxismo como também estabeleceu
novas bases teóricas para o estudo da subjetividade.

Além disso, é legítimo considerar ainda que, embora o tema da subjetividade não
tenha sido objeto de discussão significativa no interior da categoria profissional até
os fins do século XX, a cultura profissional dos anos 80 e 90, superando o marxismo
enviesado que penetrou o serviço Social reconceituado, lançou os fundamentos
ontológicos necessários à análise dessa temática. (RODRIGUES,1997, p. 95)

Para Duarte ( 2010), existe um movimento de determinados autores no Serviço Social


que vem pesquisando e produzindo sobre o tema da subjetividade e consequentemente
contribuindo criticamente na formação profissional.

O núcleo comum com relação à crítica elaborada por eles e do qual compartilho
funda-se, principalmente, com o que já introduzimos aqui, mas que tentamos
sintetizar, pois concordamos que o Serviço Social, enquanto ramo do saber, não
tinha a capacidade intelectiva e crítica de fazer naquele momento o que pode fazer
hoje, sem reprodução mecânica do idealismo moral do ser social burguês na sua
intervenção profissional e produção científica, o que só está sendo possível no
contexto da renovação profissional em solo brasileiro. (Duarte,2010,p. 15)

Por fim, avaliamos que existem fundamentos teóricos sobre a temática da


subjetividade no interior do pensamento marxista, que merecem ser divulgados e
revistos. Objetivando assim um referencial teórico identificado com o combate a figura
de um homem não emancipado, de um sujeito submisso a uma ordem social que o
descaracteriza, arrancando seus traços de humanidade e o igualando como mercadoria.

1.2 A subjetividade no homem moderno – Do desenvolvimento a crise do


homem burguês

Optamos por trazer alguns acontecimentos históricos sociais que contribuíram para o
desenvolvimento da subjetividade do homem moderno. Nesta primeira parte, apresentaremos
uma breve descrição da formação da subjetividade a partir da concepção da psicologia com
ênfase na psicanálise. O objetivo aqui é fazer o percurso, da psicologia, no desenvolvimento
até a crise da subjetividade no homem moderno. Avaliamos que tal roteiro nos fornece
alguns elementos que irão subsidiar a segunda parte deste capítulo, onde iremos descrever em
17

que contexto histórico se desenvolve a subjetividade do homem moderno e consequentemente


a sua crise.

Para Figueiredo & Santi (2008), a experiência de sermos sujeitos com condições de
tomar decisões, dotado de sentimentos e de emoções privados, só se desenvolve, se consolida
e se amplia numa sociedade com determinadas características.

De forma simplificada, podemos dizer que nossa noção de subjetividade privada


data aproximadamente dos últimos três séculos: da passagem do Renascimento para
a idade Moderna. O sujeito moderno teria se constituído nessa passagem e sua crise
viria a se consumar no final do século XIX. (FIGUEIREDO & SANTI 2008, p. 24).

Assim, temos no Renascimento uma experiência de perda de referências. No mundo


Medieval, o homem se via como parte de uma ordem superior. A aproximação com Deus
trazia uma sensação ao mesmo tempo de amparo e de constrangimento. A descoberta do
“novo mundo” e a abertura do Ocidente a outras culturas e povos trouxe uma sensação de
liberdade ao homem europeu. Mas se de um lado as novas experiências levam o homem a ter
uma sensação de liberdade e a uma abertura sem limites para o mundo, por outro, o deixa
confuso e vacilante: como fazer escolhas sobre o que é certo ou errado sem uma referência,
sem um ponto de apoio?

Não podendo esperar pelo conselho de uma figura de autoridade, o homem viu-se
obrigado a escolher seus caminhos e arcar com as consequências de suas opções.
Nesse contexto, houve uma valorização cada vez maior do “homem”, que passou a
ser pensado como centro do mundo. (FIGUEREIDO & SANTI 2008, p 24).

Ainda segundo Figueiredo & Santi (1997), a valorização e a confiança no homem, por
ele ser o centro do mundo e ao mesmo tempo livre, possibilita o surgimento do humanismo
moderno. No século XVI, o tema do homem em conflito entre a obediência de Deus e a
confiança nas próprias qualidades ganha espaço, por exemplo, em expressões artísticas.
Assim, temos no século XVI as figuras de personagens literários como Dom Quixote e
Hamlet inaugurando o mundo “interno” e fortalecendo a interioridade de seus leitores. Na
tragédia de Shakespeare, por exemplo, o príncipe dinamarquês se lamenta e se questiona
diante do dever de vingar o assassinato do pai:

Ó, vingança!
Mas que asno eu sou! Bela proeza a minha.
Eu, filho querido de um pai assassinado,
Intimado à vingança pelo céu e o inferno,
Fico aqui, como uma marafona,
Desafogando minha alma com insultos; é, como uma meretriz;
Ou uma lavadeira!
18

Maldição! Oh! Trabalha, meu cérebro! (SHAKESPEARE 1999, p. 64).

A prática da leitura individual também contribuiu para promover o desenvolvimento


de uma reflexão privada. Essa leitura individualizada permite a construção de um diálogo
interno que leva à consolidação de uma opinião própria. O trabalho intelectual vai aos poucos
se tornando uma atividade individual, assim como a religiosidade, já que agora uma parte da
população começa a ter acesso de forma direta aos textos sagrados, sem a mediação das
autoridades religiosas. Neste sentido, a leitura e as interpretações individuais dos textos
sagrados são experiências fundamentais para a realização da Reforma Protestante e sua
consolidação a propósito da primeira tradução da Bíblia e do Novo Testamento para o inglês
entre 1515-1536 por William Tyndale. Neste fluxo de movimentos, a Reforma é um momento
fundamental para a formação do sujeito que se preocupa em articular a crença em um Deus
onipotente em conjunção com o livre-arbítrio humano.

Já o século XVII, traz toda uma produção intelectual em torno da centralidade do


homem. O movimento crescente em torno da individualidade inaugura novas e retoma antigas
questões filosóficas sobre a existência e o sentido da vida humana, tornando-as pautas
naturais. Surge assim a preocupação com o método na produção dos pensamentos científico e
filosófico, de evitar a dispersão dos pensamentos e dos sentidos, de construir um caminho
onde se pudesse chegar à verdade inquestionável. Neste sentido, os pensadores René
Descartes (1596-1650), com o racionalismo moderno, e Francis Bacon (1561-1626), criador
do moderno empirismo, nos apresentam importantes concepções:

O homem moderno não busca a verdade num além, em algo transcendente; a


verdade agora significa adquirir uma representação correta do mundo. Essa
representação é interna, ou seja, a verdade reside no homem, dá-se para ele. O
sujeito do conhecimento (o ‘eu’) é tornado agora um elemento transcendente, ‘fora
do mundo’, pura representação sem desejo ou corpo, e por isso supostamente capaz
de produzir um conhecimento objetivo do mundo. (FIGUEIREDO & SANTI, 1997,
p.33)

Assim, o século XVII alimenta um homem capaz de dialogar com o seu “eu”. De
dedicar-se às suas reflexões primeiro de forma individual, para depois submetê-la aos demais
campos da experiência. Através de um método, o homem consegue desvendar os mistérios em
torno de sua existência e o convívio entre a fé e a razão torna-se uma realidade, ainda que em
muitos casos gerando conflitos.

No século XVIII, o Iluminismo, segundo Berlin (2015), concebe a vida ou a natureza


como uma espécie de quebra-cabeça, onde as peças soltas estão à espera de uma forma de
19

encaixe. E quem pode encaixar essas peças? O homem sábio, o ser onisciente – seja ele Deus
ou uma criatura terrena onisciente (cada um concebe a sua escolha) – poderiam encaixar as
peças e formar assim um desenho coerente.

Qualquer um que fizer isso vai saber como é o mundo: o que as coisas são, o que
elas já foram, o que elas serão, quais as leis governam, o que é o homem, qual a
relação do homem com as coisas e, portanto, de que o homem precisa, o que ele
deseja, e também como pode obter tudo isso. (BERLIN 2015, p.51).

O Iluminismo não foi um movimento uniforme, no sentido que todos os seus membros
acreditavam nas mesmas coisas. Assim alguns pensadores do Iluminismo acreditavam na
imortalidade da alma, outros já afirmavam que a alma era uma superstição e que essa entidade
não existia, outros creditavam que a elite esclarecida deveria governar o povo, outros ainda,
que a ética e a política deveriam ser concebidas por cada homem a partir de seu entendimento.
Nesse caso, cada homem seria um especialista, pois ao consultar seu coração ele poderia saber
a diferença entre o bem e mal, o certo e o errado. O ponto comum entre esses diferentes
pensadores é que a virtude consistiria no conhecimento. Assim,

...que, se sabemos o que somos, e sabemos de que precisamos, e sabemos onde obtê-
los, e o obtemos com os melhores meios em nosso poder, então podemos viver uma
vida feliz, virtuosa, justa, livre e contente; que todas as virtudes são compatíveis
entre si... (BERLIN 2015, p.54).

É em contraposição ao Iluminismo que surge o Romantismo. Este movimento combate


a ideia da civilização com suas regras, seus métodos ao afirmar que os impulsos e desejos
nunca poderão ser totalmente calados pela razão.

Além da autocrítica iluminista, o século XVIII trouxe outras formas de crítica às


pretensões totalizantes do "eu", da razão universal e do Método. O Romantismo
nasceu no final do século XVIII exatamente como uma crítica ao Iluminismo e, mais
particularmente, à vertente racionalista do Iluminismo (com a vertente empirista, os
românticos puderam até estabelecer uma convivência muito mais amistosa). Ou seja,
à ideia cartesiana de que o homem é essencialmente um ser racional (o ser pensante
do Cogito) é contraposta a ideia de que o homem é um ser passional e sensível.
(FIGUEIREDO & SANTI, 1997, p.7)

Ao final do século XVIII, a crítica desenvolvida pelo Romantismo ao racionalismo


vigente ganha diferentes formas. Nas artes, segundo o Romantismo, devem-se expressar as
necessidades, os impulsos e desejos. Além de demonstrar que o homem está diante de
aspectos profundos e obscuros em relação à vida, à natureza e ao universo. Neste sentido, a
obra do pintor inglês William Turner é considerada um clássico do Romantismo. Em seus
quadros, eram recorrentes as tempestades no mar e mal se definem os limites entre céu, mar,
chuva e neblina. Também aparece sempre a figura de um pequeno barco à deriva, sendo
20

levado pela força do mar. O barco seria a tentativa da intervenção humana, o controle racional
e metódico do mundo. Controle esse que é o tempo todo questionado pela natureza, por isso
sempre a figura do barco prestes a naufragar.

O Romantismo nos aponta a crise do homem iluminista. Mas a contraposição à


racionalidade extrema, à burocracia e à ordem institucional seriam feitas primeiro
internamente, para depois ganhar expressão no mundo concreto. O Romantismo traz inúmeras
obras onde o homem é obrigado a reconhecer que ele mantém uma certa profundidade que ele
próprio desconhece. Como por exemplo, o romance Os Sofrimentos do Jovem Werther, de
Goethe. Apaixonado por uma mulher prometida a outro homem, Werther escreve cartas a um
amigo descrevendo seus sentimentos e contando sobre sua incapacidade de adaptar-se à
rotina, já que não pode concretizar seu amor: “Sim, é isso mesmo. Do mesmo modo como a
natureza declara agora o outono, também dentro de mim o outono se manifesta. As minhas
folhas amareleceram, e as folhas das árvores vizinhas já caíram”. (GOETHE 1999, p. 90)

Essa constatação amplia ainda mais a importância da individualidade e da intimidade.


Ao analisarmos a dimensão do individualismo e solidão presentes no século XX é impossível
não pensarmos na presença em nós do sujeito romântico.

Outra característica da cultura ocidental presente nos séculos XVIII e XIX que reflete
diretamente na experiência da subjetividade é a ideologia Liberal Iluminista. A Ideologia
Liberal tem sua maior expressão na Revolução Francesa, em que as ideias de que os homens
são iguais em capacidade são propaladas juntamente com a certeza que os homens também
devem ser iguais em direitos. Neste sentido, todos os homens são livres, contudo para que
essa liberdade (de cada um) não provoque um descontrole é necessário que todos nós
possamos ser solidários uns com os outros. Assim, se todos os homens são livres para lutar
pelos seus interesses e necessidades por serem iguais, todos nós também deveríamos ser
fraternos. O reconhecimento e o exercício da liberdade pelos homens tem se tornado um
grande desafio. Conciliar o exercício da liberdade individual com os interesses coletivos não é
algo fácil. Pelo contrário, os conflitos gerados pela liberdade de cada um em tratar seus
negócios têm desencadeado crises, lutas e guerras.

Neste sentido, tanto a ideologia Liberal Iluminista quanto o Romantismo apresentam


problemas quanto à experiência da subjetividade. No liberalismo iluminista todos são iguais,
porém têm interesses próprios, as buscas são individuais. No Romantismo o homem é
21

diferente do outro, porém este mesmo homem necessita de um tempo passado em


comunidade. As soluções apresentadas no liberalismo a crença na fraternidade, no
romantismo os grandes e nobres sentimentos, poderiam trazer unidade aos homens.

A liberdade individual acabou por não ser tão boa como pregavam o liberalismo
iluminista e o Romantismo. A imensa pressão que se carrega por ser diferente, ser livre, ser
singular e ter interesses particulares, assim como o desamparo e a solidão levam
frequentemente os homens a se defenderem. Figueiredo & Santi (1997), afirmam que com
objetivo de reduzir os “inconvenientes” da liberdade, da diferença, da singularidade, foi se
constituindo junto ao homem ocidental e moderno um complexo sistema. Sistema esse que,
dada a sua natureza, acaba pôr colocar em perigo as ideias românticas e liberais.
Fundamentado em bases científicas que gera por sua vez uma elaboração e técnicas de
controle social e individual, esse sistema será conhecido como Regime Disciplinar 2 e
encontra-se nas atividades desenvolvidas por todas as grandes agências sociais, como as
escolas, as fábricas, as prisões, os hospitais, os meios de comunicação de massa, os órgãos
administrativos do Estado, etc.

Embora essas Disciplinas reduzam em muito efetivamente o campo de exercício das


subjetividades privatizadas, impondo padrões e controles muito fortes às condutas, à
imaginação, aos sentimentos, aos desejos e às emoções individuais, faz parte de seu
modo de funcionamento dissimular-se, esconder-se, deixando-nos crer que somos
cada vez mais livres, profundos e singulares. É certo que vai instalando um certo
mal-estar e vão criando condições para a suspeita dos homens em relação a si
mesmo. (FIGUEIREDO & SANTI, 1997, p. 49)

A crise da subjetividade ocorre quando se descobre que a liberdade e as diferenças são


na maioria das vezes ilusões. Ilusões essas decorridas da presença, sempre disfarçada, das
Disciplinas em todas as esferas da vida, em especial nas mais profundas e íntimas. Assim, o
movimento do homem ao passar pelas experiências da subjetividade se dá ao tempo que ele
percebe não ser livre em sua totalidade e tampouco ter a sua singularidade. O resultado é um
homem perplexo e indefeso que passa a refletir de forma intensa e caótica sobre qual o
sentido de tudo que pensa, faz e sente sobre si mesmo. Por outro lado, o Estado necessita de
técnicas de contenção e de previsão, mas o objetivo aqui é tratar os sujeitos individuais. Ou
seja, o Estado busca a melhor forma de educar, de treinar o sujeito individual a fim de formar
um ser “domesticado” para o mundo do trabalho e para a sociedade de consumo onde a

2 As técnicas científicas de controle social e individual são frequentemente denominadas


Regime Disciplinar. Ver FIGUEIREDO & SANTI, 1997.
22

liberdade e desejos muitas vezes são apresentados como algo ao alcance de quem “vence” na
vida.

Em todas essas questões se expressa o reconhecimento de que existe um sujeito


individual e a esperança de que é possível padronizá-lo segundo uma disciplina,
normatizá-lo, colocá-lo, enfim, a serviço da ordem social. Surge desse modo, a
demanda por uma psicologia aplicada, principalmente nos campos da educação e do
trabalho. Ou seja, o Regime Disciplinar, em si mesmo, exige a produção de um certo
tipo de conhecimento psicológico de forma a tornar mais eficazes as suas técnicas de
controle. Mas também as subjetividades formadas pelos modelos liberais e
românticos, são atraídas pelos estudos psicológicos. (FIGUEIREDO & SANTI
1997, p.51)

No século XIX, encontraremos um homem centrado na busca por autoconhecimento,


por fazer as mediações necessárias entre a sociedade e indivíduo. Porém este homem já não se
reconhece como livre, como diferente, como singular. Ele suspeita que a liberdade e a
singularidade dos indivíduos são falsas, na medida em que o colapso das ideias liberais e
românticas permitem a consolidação dos projetos de previsão e controle científicos do
comportamento individual.

1.3 Capitalismo monopolista e crise da subjetividade

A constituição e desenvolvimento da subjetividade estão inseridos no próprio


desenvolvimento da ordem capitalista. Neste sentido, a crise da subjetividade corresponde a
um dos muitos aspectos do atual estágio da sociedade humana, o capitalismo monopolista.
Portanto um estudo sobre a subjetividade não deve abster-se de uma análise do capitalismo e
da sociabilidade que este produz.

Para Silveira (2002), que relaciona a teoria crítica marxista com outras áreas de
conhecimento, em especial a psicanálise, afirma que devemos compreender os processos
subjetivos a partir de apontamentos das condições internas de cada sujeito, pressionados e
questionados através das representações reais no processo de civilidade dominante, leia-se
capitalismo monopolista. A subjetividade não é inseparável do homem, ela vai se construindo
mediante aos encontros das dimensões, internas e externas desse homem, não sendo possível
separação entre o plano individual e o coletivo, entre os registros de indivíduo e sociedade.

Neste sentido, pressuposto que se impõem diz respeito à consideração de que a


subjetividade é socialmente produzida, operando numa formação social
23

determinada, sob crivo de um determinado tempo histórico e no âmbito de um


campo cultural.( SILVEIRA 2002, p.105).

A autora relaciona o desenvolvimento da subjetividade, enquanto realização


individual, dentro de um processo histórico e cultural aqui identificado como capitalismo
monopolista e aponta para a dimensão dos mecanismos utilizado por esta forma de
organização social.

Esse é, portanto, um processo que implica em sujeição real, desapropriação da


própria condição de indivíduo perante um poder que, para além de tornar estranho o
produto do trabalho, torna igualmente estranho o trabalho para o trabalhador,
internalizando esta relação. Tal poder que se institui despoticamente, se evidencia
não só objetivamente, mas também no campo simbólico ao processar o
desenvolvimento da forma mercadoria em fetiche. (SILVEIRA 2002, p.105).

Para Netto (1996), o século XIX foi palco de grandes transformações do capitalismo,
mudanças a partir da sua organização econômica que trazem rebatimento para estrutura social
e política, refletindo também na organização individual.

As profundas modificações sofridas então pelo capitalismo — que, enquanto


tendências, foram objeto da prospecção teórica marxiana — não infirmaram em
nenhuma medida substantiva as análises elementares de Marx sobre o seu caráter
essencial e o da ordem burguesa: O capitalismo monopolista recoloca, em patamar
mais alto, o sistema totalizante de contradições que confere à ordem burguesa os
seus traços basilares de exploração, alienação e transitoriedade histórica, todos eles
desvelados pela crítica marxiana. (NETTO, 1996, p.15)

Vale destacar que a análise desenvolvida por FIGUEIREDO & SANTI (1997),
estabelece uma narrativa histórica onde temos uma mobilização crescente e acumulativa em
relação a formação da subjetividade individual, nesta exposição, o ápice do desenvolvimento
da subjetividade também é o seu momento de crise. Assim, um estudo sobre a subjetividade
não pode desconsiderar uma análise sobre o capitalismo e todos os seus reflexos junto a
sociabilidade por ele produzida.

Neste sentido, é necessário denunciar os aspectos presentes na convivência social, hoje


hegemonizados como um tributo imprescindível para a auto realização do homem moderno.

Essa racionalidade que preside as relações sociais, por meio da reificação do


presente, não só reforça a perspectiva de manutenção do ordenamento capitalista,
como investe na destruição de vínculos que ocasionem a humanização dos sujeitos.
Ao fazê-lo, busca um tipo de formatação das subjetividades numa perspectiva de
imediaticidade, na qual o efêmero e o fragmentário, a produção de curto prazo e a
insensibilidade perante o outro são componentes fundantes. (SILVEIRA, 2002,
p.103)
24

Por fim, afirmamos que o marxismo combate a subjetividade alienada, vigente na


sociedade burguesa , que naturaliza a cruel desigualdade humana e avança no extermínio dos
vínculos de humanização dos sujeitos.

CAPÍTULO 2 SUBJETIVIDADE NO SERVIÇO SOCIAL: DA


INCORPORAÇÃO À INVISIBILIDADE

O tema da subjetividade no interior do serviço social, seja no que se refere a literatura


seja no debate em torno da prática profissional é, a nosso ver, pouco abordado. Neste sentido,
este capítulo aborda elementos que pensamos que possam a vir contribuir no debate desta
temática. Assim, iremos apresentar alguns dados sobre a influência do movimento de higiene
mental, nos conteúdos das disciplinas das primeiras escolas de Serviço Social nos estados do
Rio de Janeiro e São Paulo no período de 1940 a 1946 e a relação entre o movimento de
higiene mental e o serviço social doutrinário-católico brasileiro na busca de identificar
questões e formulações históricas que possam contribuir para o nosso trabalho. Em seguida,
apresentaremos outras influências e experiências no campo da psiquiatria junto ao Serviço
Social em saúde mental, identificando a presença de assistentes sociais com funções de gestão
e coordenação de programas vinculados a essa área.

2.1 O Movimento de Higiene Mental e o Serviço Social Brasileiro

O estudo sobre o movimento de higiene mental faz parte de um processo de pesquisa


que busca apontar a importância deste movimento na elaboração de alguns princípios
presentes nas formulações teóricas do Serviço Social Conservador e consequentemente o
desenvolvimento de uma caracterização da temática da subjetividade em consonância com a
prática do Serviço Social clínico.

A forte presença de conteúdo e disciplinas identificadas com o movimento de higiene


mental nas primeiras escolas de serviço social é, certamente, um fenômeno pouco pesquisado
25

ou debatido junto à profissão. Autores identificados com a temática na saúde mental no


interior do serviço social tem sinalizado a falta de registro e mesmo de pesquisa sobre essa
questão.

Ao tentarmos mapear o conteúdo da formação do assistente social nas primeiras


escolas brasileiras, no Rio de Janeiro e em São Paulo, chamou-nos imediatamente a
atenção o volume de disciplinas e conteúdos claramente identificados com
temáticas colocadas pelo movimento de higiene mental, constituindo um fenômeno
ainda não identificado pela literatura e historiografia do Serviço Social brasileiro.
(VASCONCELOS 2000, p. 128)

É importante situar o significado do movimento de higiene mental e localizá-lo


geográfica e temporalmente junto a constituição da emergência do serviço social no Brasil.
Segundo pesquisa organizada por Vasconcelos (2000) o movimento de higiene mental tem
referências no higienismo ligado à medicina social, mas é na psiquiatria onde o movimento
tem suas raízes. Data de 1857, na França, o livro O Tratado das Degenerescências de
Benedict-Augustin Morel de 1857. Antes da obra de Morel a psiquiatria centrava-se no estudo
e descrição dos sintomas e sinais perceptíveis da doença. A partir do Tratado da
Degenerescência muda-se o foco, se no passado a técnica e literatura ocupavam-se dos
doentes definindo medidas para o tratamento, agora a preocupação é sobre as causas e origem
da doença, principalmente as mais obscuras. Neste sentido, as Degenerescências seriam uma
espécie de desvios “doentios em relação ao tipo normal da humanidade, transmitidas
hereditariamente” (VASCONCELOS, 2000, p.129). A atuação no tratamento moral
psiquiátrico no século XIX tinha como base o paciente internado, confinado no asilo. Em sua
obra de 1857, Morel afirma que as degenerescências são um desvio e que contrariam a
harmonia da humanidade, segundo o autor as degenerescência são hereditárias. Neste sentido,
tem início outro campo de atuação da psiquiatria. Morel lidera um movimento no qual a
atuação psiquiátrica se expande para fora dos asilos.

Segundo Morel, a medicina atuava com ações preventivas que tinham por objetivo
o confinamento de pessoas “perigosas” em espaços fechados para tratá-las. Nesse
confinamento, a ação focava no combate as causas da doença e na prevenção de seus efeitos.
De acordo com o autor, as medidas de profilaxia tinham como meta aspectos defensivos, na
medida que isolavam e tratavam pessoas consideradas perigosas em espaços fechados e sem
qualquer contato com a sociedade. A proposta que o autor apresenta é da ação preventiva,
tendo como meta “atacar” as causas das doenças e assim antecipar os seus efeitos. O campo
de atuação, segundo Morel, seria a sociedade, onde o profissional da medicina atuaria como
26

uma espécie de conselheiro para as demais profissões que tivessem como foco o trabalho com
as “massas”. Para Castel (1978) o discurso amplo e abrangente de Morel esconde uma
classificação e identificação sobre a classe da sociedade que se deve priorizar.

Mas apesar da sociedade inteira estar no horizonte de uma intervenção preventiva,


são evidentemente seus pontos fracos, os focos de desordem e de miséria, que serão
prioritariamente visados. E sobretudo para uma "moralização das massas" que a
medicina mental deve contribuir ajudando no encargo dessas "classes declinantes
que mal entreveem o movimento ascendente das classes superiores e que não podem
atingi-lo se forem abandonadas as suas próprias forças" (MOREL, 1857, apud
CASTEL 1978, p. 187).

O movimento de higiene mental surgiu na França no final do século XIX , mas foi nos
Estados Unidos onde se consolidou e passou a irradiar as suas teorias para outros países 3.
Segundo a historiografia do movimento de higiene mental americano, um momento
importante para a propagação da organização foi através da biografia de Cliffords Beers,
considerado profissional liberal, por ser vendedor de seguros e serviços associado a um
escritório de arquitetura em Nova York. Este trabalhador em crise foi internado inúmeras
vezes entre o período de 1900 a 1903, essa experiência foi transformada em livro com ajuda
de um grupo de psiquiatras, entre eles Adolf Meyer psiquiatra renomado e diretor do hospital
psiquiátrico de Nova York. Assim foi lançado, em 1908, o livro “Uma mente que encontrou a
si mesma”, promovendo uma nova e grande cruzada contra a doença mental. Como resultado
desta campanha, surgiu o movimento de higiene mental, organizando as chamadas ligas locais
que se alastraram por todo país. Tais ligas acabaram tornando-se parte da estrutura do
movimento de higiene mental, que rapidamente organizou um comitê nacional pela higiene
mental alcançando seu ápice, em 1920, em solo norte americano, tendo na maioria dos países
europeus a constituição das chamadas ligas nacional de higiene mental.

Ainda segundo o autor, o Serviço Social de caso americano sofreu forte influência do
movimento de higienização mental. O livro Diagnóstico Social de Mary Richmond, em 1917,
já trazia referências aos psiquiatras que formularam e militaram a favor do movimento de
higiene mental.

No Brasil, o período histórico e político de desenvolvimento dos serviços sociais, a


partir da iniciativa do Estado, como também emergência das primeiras escolas de Serviço
Social, na década de 1930, teve forte presença do movimento de higiene mental.
Apresentando-se sob dois aspectos, na abordagem e na ação política. Segundo Vasconcelos

3 Segundo Vasconcelos (2000), foi a partir dos Estados Unidos que o movimento de higiene
mental alcança países europeus como também a América latina, neste caso chegando ao Brasil.
27

(2000), data deste período a construção de uma relação entre o Serviço Social católico e o
Movimento de Higiene Mental. Essa relação entre duas concepções teóricas, segundo o autor,
possibilitou uma atuação pragmática de ambas as partes constituindo assim uma relação de
complementaridade.

O Serviço Social doutrinário católico brasileiro, inspirado diretamente nos serviços


sociais belga e francês, além de ter embutida uma influência higienista indireta em
suas bases conceituais e metodológicas, abriu um espaço para uma formação
higienista explicita e direta no currículo de suas escolas, através de um forte
conjunto de disciplinas do curso de graduação que apresenta clara correlação com a
parte significativa da plataforma higienista, conteúdo este integrado de forma
complementar e/ou subordinada à abordagem doutrinária católica na escola
paulistana. (VASCONCELOS, 2000, p. 151).

O movimento de higiene mental no Brasil se caracterizou por tentar difundir suas


ideias e princípios através do Estado. As principais lideranças do movimento, gozando de
grande prestígio junto à classe política, ocuparam diversos cargos nas estruturas
governamentais implementando as principais diretrizes do movimento.

Se por um lado o desenvolvimento de novas técnicas e tecnologias criavam uma


euforia contagiante quanto ao crescimento e modernização das cidades, por outro, gerava uma
violenta deterioração da vida de boa parte da população trabalhadora (em especial dos
assalariados) em relação à higiene e ao saneamento. As condições cada vez mais precárias das
habitações faziam com que famílias inteiras fossem alvos de doenças infecciosas, e ainda, no
mesmo quadro, havia uma multidão de pessoas vivendo nas ruas aguardando trabalho. Esse
quadro caótico preocupava a elite dirigente.

Aos dirigentes republicanos interessavam o desenvolvimento de um projeto de


controle higiênico dos portos, a proteção da sanidade da força de trabalho e o
encaminhamento de uma política demográfico-sanitária que contemplasse a questão
racial. Abriu-se campo para a proliferação de tecnologias e para o trabalho de
especialistas que investigavam sobre a saúde dos imigrantes, a situação sanitária dos
portos, o dia-a-dia das cidades, a higiene infantil, os hábitos e costumes populares, a
eugenia ou “ideal de branqueamento” do povo brasileiro, o trabalho fabril, o mundo
do crime, etc. O discurso médico-higiênico acompanhou o início do processo de
transformação política e econômica da sociedade brasileira em uma economia
urbano-comercial e expressou o pensamento de uma parte da elite dominante que
queria modernizar o país. (MANSERA & SILVA, 2000, p. 117)

Podemos afirmar que de maneira geral o movimento de higiene compreendia que o


mau funcionamento e a desarmonia da sociedade eram resultados de doenças, e, como tal,
cabia à medicina elaborar e agir sobre os vários aspectos, naturais, institucionais e
urbanísticos, objetivando eliminar todo perigo (as doenças). Nesse cenário, a medicina
ganhou status “medicina de analistas das instituições”. Os hospitais foram transformados em
28

máquinas de curar, e o hospício tornou-se um espaço de confinamento disciplinar do doente


mental. Também teve início a elaboração das propostas para reorganizar à prisão, por outro
lado, a escola necessitou de cuidados especiais. Neste sentido, o aspecto preventivo da
medicina mental, ganhou força, intervindo antes das manifestações das doenças, junto às
populações consideradas público alvo. No Primeiro Congresso Brasileiro de Higiene em
1924, em diferentes textos, foi ressaltada a grande tarefa do movimento, a proteção higiênica
da coletividade, a defesa da ordem, o enfrentamento a anarquia, os ideais igualitários, a
promiscuidade e decadência urbanas.

Considerou sua atribuição a criação dos hábitos sadios, o combate às ‘taras sociais’ e
a realização das grandes aspirações sanitárias do Estado: a robustez do indivíduo e a
virtude da raça. Segundo a concepção higienista, não era possível fazer uma grande
nação com uma raça inferior, eivada pela mestiçagem, como eram os brasileiros.
Nesta questão, o higienismo se fundamentava na Eugenia 4 (MANSERA & SILVA,
2000, p. 119).

Do ponto de vista organizativo, o movimento higiênico funda a Liga Brasileira de


Higiene Mental (LBHM) em 1923 na cidade do Rio de Janeiro. Um dos principais
responsáveis pela fundação da liga foi Gustavo Riedel, que afirmou que um dos objetivos da
liga era produzir programas de higiene mental com os princípios teóricos da prevenção
eugênica. Em seu estatuto de 1925 a Associação Brasileira de Higiene Mental (ABHM)
reconheceu a Liga (LBHM) com os seguintes objetivos:

a) prevenção das doenças nervosas e mentais pela observância dos princípios da


higiene geral e, em especial, do sistema nervoso;
b) proteção e amparo no meio social aos egressos dos manicômios e aos
deficientes mentais passíveis de internação;
c) melhoria progressiva nos meios de assistir e tratar os doentes nervosos e
mentais em asilos públicos, particulares ou fora deles;
d) realização de um programa de higiene mental e de eugenética no domínio das
atividades individuais, escolares, profissionais e sociais.

Em sua obra Ordem Médica e Norma Familiar, Jurandir Freire Costa (1999) afirma
que a prevenção eugênica se destinava a formar um indivíduo brasileiro mentalmente sadio,

4 Eugenia foi o termo “inventado” por Francis Galton (1822-1911), fisiologista inglês, para
designar a ciência que trata os fatores capazes de aprimorar as qualidades hereditárias da raça humana.
Afirmava ele que os seres humanos, assim como os animais, poderiam ser melhorados através de
seleção artificial. Entre seus estudos, Galton buscou demonstrar que a genialidade individual estava
ligada diretamente a composição familiar, nesse caso uma família de intelectuais com frequência
tinham filhos intelectuais. Neste sentido, Galton entendia que se deveria encorajar o nascimento de
indivíduos com maior capacidade, e evitar o nascimento dos incapazes. Ver mais em Mansera & Silva,
2000.
29

reconhecidamente branco, racista, xenófobo, puritano e antiliberal. Neste sentido, os


psiquiatras acreditavam que “O Brasil se degradava moral e socialmente por causa dos vícios,
da ociosidade e da miscigenação racial do povo brasileiro” (Costa, 1999, p. 93). Assim, o
alcoolismo tornou-se causa da pobreza e decadência moral, por que era mais encontrado nas
camadas pobres da sociedade. A sífilis tornou-se atributo genético dos negros, por ser mais
generalizada entre eles. A miscigenação racial tornou-se a causa da desorganização política e
social, neste sentido, a mistura de raças tornou-se um problema social que deveria ser
combatido.

Mesmo tendo representantes no congresso nacional de 1927 e mobilizando boa parte


da sociedade em suas campanhas antialcoólica, foi com a chegada de Vargas ao poder, que o
movimento de higiene mental ganha maior organicidade junto ao governo. Em suas
publicações, as Ligas de Higiene Mental, saudavam o governo Vargas como chegada do
progresso e da racionalidade ao país, pelas mãos do Estado. Comportando-se como um
verdadeiro partido político, a relação do movimento higienista com o novo governo foi
intensa e orgânica, o que resultou em ocupação de cargos-chaves na assistência pública e
também no legislativo. O movimento higienista não poupou esforços em participar da
Assembleia Nacional Constituinte, um dos fundadores da liga nacional e também da liga
paulista de higiene mental, Antônio Carlos Pacheco e Silva, indicado como deputado classista
(representante dos empresários de São de Paulo) liderou uma bancada coesa que pleiteava a
coordenação de serviços sociais, o estímulo à educação eugênica com ênfase na proteção da
juventude contra todo o tipo de abandono, moral, físico e intelectual. Neste sentido, o
movimento através das diferentes frentes de atuação, buscava ser reconhecido pelo Estado
como o responsável pelas tarefas de higiene mental junto à população. Assim o movimento
começou a sistematizar as questões acerca dos serviços sociais e do papel do Estado na sua
execução. O principal responsável por esta sistematização foi o próprio Antônio Carlos
Pacheco e Silva, que após uma longa pesquisa publicou em 1937 o livro Serviços Sociais.
Considerado um dos principais formuladores do movimento de higiene Pacheco e Silva
também fundou o Instituto de Organização Racional do Trabalho e a Escola Livre de
Sociologia e Política de São Paulo onde lecionou a cadeira de Serviços Sociais. Como
parlamentar constituinte de 1934, pelo movimento higienista, contribuiu na redação do artigo
138.

Art 138. Incumbe à União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis
respectivas:
30

a) assegurar amparo aos desvalidos, criando serviços especializados e animando os


serviços sociaes, cuja orientação procurarão coordenar;
b) estimular a educação eugenica;
c) amparar a maternidade e a infancia;
d) soccorrer as familias de prole numerosa;
e) proteger a juventude contra toda exploração, bem como contra o abandono
physico, moral e intellectual;
f) adoptar medidas legislativas e administrativas tendentes a restringir a mortalidade
e a morbidade infantis; e de hygiene social, que impeçam a propagação das doenças
transmissiveis;
g) cuidar da hygiene mental e incentivar a lucta contra os venenos sociaes

Com uma atuação compacta no parlamento e com grande capilaridade no governo, o


movimento de higiene mental se expande para outras frentes, como assinala Vasconcelos
(2000).

É importante notar que a influência desse grupo de parlamentares no Serviço Social


não se deu apenas no plano doutrinário e legislativo, mas marcou claramente a
iniciativa concreta de fundação da primeira escola carioca de Serviço Social, através
da deputada constituinte dra. Carlota Pereira de Queiroz, como descrevemos a
seguir. Entretanto, vale assinalar ainda aqui a filiação teórica-ideológica desta ao
ideário higienista, quando defendia a formulação do texto constitucional e outras
iniciativas em relação aos menores abandonados. (VASCONCELOS 2000, p. 145).

Considerar os fatos sobre a presença e a influência do movimento de higiene mental


no Serviço Social, leva Vasconcelos (2000) a levantar uma questão que atravessa parte da
historiografia oficial do serviço social, que é o projeto católico.

Se essas indicações acerca da influência do movimento de higiene mental no Serviço


Social brasileiro são corretas, caberia, então perguntar: Como esse projeto higienista
se relacionava com o projeto católico de restauração de seu prestígio e poder na
sociedade republicana brasileira, então enfatizado pela historiografia do Serviço
Social brasileiro ? (VASCONCELOS, 2000, p. 145).

Um dos pioneiros na pesquisa do higienismo e do movimento de higiene mental no


Brasil, Jurandir Freire (Costa, 1999), nos informa que entre os dois movimentos existia uma
certa confluência ideológica. O autor afirma que o moralismo católico é um elemento central
na produção da ideologia moral da Liga Brasileira de Higiene Mental. Os psiquiatras
utilizavam-se duplamente do moralismo católico, em primeiro lugar a moral servia como um
fator de integração entre o “sistema deliróides5 à cultura” (Costa, 1999, p.211). Em segundo

5 As Idéias Deliróides, notadamente aquelas organizadas e sistematizadas, constituem tentativas


de manipular os problemas e as tensões da vida através de fantasias elaboradas para fornecer aquilo
que a vida real nega, entretanto, devido ao seu aspecto mórbido, tais fantasias não são construídas
31

lugar, o moralismo católico servia como fonte inspiradora, numa espécie de pedagogia do
exemplo, na medida que os psiquiatras na sua grande maioria acabavam fazendo votos de
abstinência de álcool. Como também, constituíam todo um vocabulário em sintonia com a
igreja católica, como as referências que eles próprios faziam para suas campanhas, a que
chamavam de cruzadas e também se intitulavam apóstolos da higiene mental. Por fim,
Vasconcelos (2000), observa que existia certa relação de complementariedade e também de
demarcação de áreas de competência entre o catolicismo e higienismo.

Tendo como inspiração os serviços sociais belga e francês, acrescido da influência do


movimento higienista de forma indireta junto as suas bases conceituais e metodológica, o
serviço social doutrinário católico acabou por desenvolver uma base curricular de suas escolas
de forte conteúdo higienista junto as disciplinas do curso de graduação. Vasconcelos (2000)
destaca que, na escola de São Paulo o conteúdo higienista era assimilado de forma
complementar ou mesmo subordinada às diretrizes doutrinárias católicas. No Rio de Janeiro,
o conteúdo doutrinário católico não foi absorvido, o que estabeleceu uma hegemonia do
conteúdo higienista, nitidamente médico. Essa situação permanece, nas escolas do Rio de
Janeiro até 1970, quando ocorre a mudança organizada pelo Conselho Federal de Educação.

Se na origem do processo de formação do assistente social, no início do século XX, o


movimento de higiene mental teve certa organicidade influenciando a base curricular das
primeiras escolas de serviço social, por outro lado, a presença da influência norte americana
nos anos 1940 no interior da categoria não significou uma ruptura com o pensamento
higienista.

Os aspectos teóricos da influência do movimento de higiene mental, que através da sua


capilaridade torna-se parte do currículo das primeiras escolas de serviço social, permite
avançar no referencial teórico-metodológico e técnico-instrumental para o interior da
profissão. O que contribuiu para uma prática fundada em intervenções individualizantes,
priorizando na maioria das vezes as questões psicológicas.

A presença da influência norte-americana a partir dos anos 40 não significou uma


ruptura com os princípios fundamentais da tradição higienista e doutrinária católica
até então, e sim apenas o aprofundamento de alguns de seus componentes, por meio
da influência da psicanálise inspirada na psicologia do ego, tendo em vista que esta
última abordagem significou uma clara continuidade teórica e histórica da
perspectiva higienista nos Estados Unidos. (VASCONCELOS 2000, p. 159).

numa estrutura compatível com uma adaptação social normal.


http://psiqweb.net/index.php/psicoses/ideias-delirantes-e-deliroides/
32

Após a II Guerra Mundial, a presença norte-americana na profissão se ampliou por


meio da incorporação das teorias estrutural-funcionalista e das metodologias de intervenção,
com destaque para os métodos de Serviço Social de Caso, de Serviço Social de Grupo e de
Organização de Comunidade e posteriormente do Desenvolvimento de Comunidade.

A historiografia da psiquiatria norte-americana reconhece que existe certa


continuidade temporal entre o movimento de higiene mental e da chamada psicologia do ego
nos Estados Unidos. As obras de Anna Freud, Heinz Hartmann, Ernst Kris e Karl Lowenstein
além de referência sobre o tema, deram corpo ao movimento que foi identificado como
“psicologia do ego”6. Ainda segundo o autor, o Serviço Social de Caso tendo como referência
essa corrente de pensamento se tornou os fundamentos teóricos utilizados por Hamilton em
sua obra Teoria e Prática do Serviço Social tendo uma forte penetração no Serviço Social de
Caso.

Nicacio (2006), afirma que partir da psicologia do ego, a relação do assistente social
com o usuário adquire uma nova perspectiva já que o conhecimento psicológico deve
fortalecer o usuário a identificar as suas dificuldades subjetivas a fim de agir de forma firme
sobre eles.

E, considerando que, nesta abordagem, o dispositivo da entrevista é central, verifica-


se que o principal conceito a ser transposto para a prática do assistente social foi o
de transferência. Em termos simplificados, transferência se refere à ligação afetiva
que o analisante estabelece com seu analista e se expressa na confiança que o
paciente passa a ter por ele, mas também em associações e mesmo conduta de cunho
erótico ou hostil. Analogamente, o usuário do serviço social também projetaria
inconscientemente, no assistente social suas fantasias, seus medos e desejos. Em
contrapartida, o próprio profissional projetaria sobre o usuário suas expectativas,
desejos, medos, dirigindo a ele uma contra-transferência. (NICACIO, 2006, p. 4).

Cabe destacar que a psicanálise possui suas diferenciações internas. De origem


americana, foi a psicologia do ego que contribuiu teoricamente para o serviço social de caso.
Essa linha psicanalítica defendia o fortalecimento do ego como forma de conter suas pulsões,
condição base para a pessoa se adaptar melhor a seu espaço social. A concepção de cura para
os defensores dessa corrente seria a pessoa adulta que encontrou o sucesso na vida econômica,
a segurança e harmonia na família. No interior do universo psicanalítico, foi Jacques Lacan
um dos principais críticos da psicologia do ego, a qual chamava de “ideologia adaptacionista”.

Outro referencial teórico em que o tema da subjetividade está presente é a


reatualização do conservadorismo. Segundo Nicacio (2006), essa corrente tinha como base
6 Para os leitores interessados em conhecer mais sobre o movimento chamado psicologia do
ego, sugerimos Birmam (1994).
33

teórica a fenomenologia e buscou dar uma nova leitura a atuação do assistente social para que
o profissional ampliasse a análise do cliente para além dos aspectos objetivos, levando em
consideração a “dimensão do ‘vivido’, isto é, como ele vivencia a sua situação de pobreza,
procurando observar qual o sentido que ele atribui ao seu problema” (NICACIO 2006, p.16).
Este tipo de abordagem, ainda tem influência junto a alguns assistentes sociais constituindo a
corrente denominada Serviço Social Clínico. Mesmo sem unidade teórica, o que acaba por
impedir também uma sólida produção literária, este movimento se caracteriza por uma
reatualização do serviço social de casos, em que o assistente social também pode
desempenhar uma função terapêutica. Entre as poucas obras que se caracterizaram como
Serviço Social Clínico, está o livro de Verli Eyer de Araújo (1982) com o título Serviço
Social Clínico – Transferência e Contratransferência.

A formulação crítica ao chamado reformismo conservador no serviço social


possibilitou não apenas uma reatualização da profissão em relação a seu projeto, como
também dos fundamentos teórico-metodológicos e princípios ético-políticos. Por outro lado,
esse processo, a nosso ver, acabou eliminando alguns temas do debate no interior da
profissão, em especial o da subjetividade.

Consideramos que reproduzimos, no cotidiano do processo de trabalho do assistente


social os mesmos instrumentos de fetichização e reificação que afetam as demais relações
sociais do mundo do trabalho, em especial aqueles que não conseguem alcançar o trabalho e
garantir acesso às políticas de proteção social.

Ao analisarmos as implicações dos temas da sociabilidade e da subjetividade no


cotidiano da prática do assistente social percebemos os grandes desafios com que esse
profissional se depara na atividade específica como também nas relações junto aos outros
profissionais.

Pensar as determinações das categorias sociabilidade e subjetividade no fazer


profissional cotidiano do assistente social tem-se revelado como um grande desafio,
seja nas atividades do seu fazer específico, seja nas equipes multiprofissionais em
que participa. Tais dificuldades encontram-se principalmente na falta de consenso
sobre a necessidade de consolidar um debate sobre subjetividade na profissão.
Apesar de o Serviço Social não ter uma potente tradição nesse tema, isso não
significa que ele seja desnecessário. (GENTILLI 2013, p. 322).

Em seu dia a dia o assistente social lida com problemas e questões que na maioria das
vezes se apresentam na dimensão objetiva (macroestrutural) como também na dimensão
subjetiva. Neste sentido, o reconhecimento da dimensão subjetiva por parte do profissional do
34

serviço social não significa cair no psicologismo. Pelo contrário, reconhecer a dimensão
psíquica e subjetiva da questão social, possibilita a que o assistente social possa refletir sobre
a forma como os sujeitos percebem a sua situação social.

Uma aproximação, menor que seja, com a realidade da prática profissional, mostra
que o assistente social, no seu processo de trabalho, não lida apenas com indicadores
sociais, procedimentos formais, rotinas e normatizações. Mesmo assim, às vezes se
esquece um fato fundamental: não é ‘A questão social’ que procura o assistente
social, mas ‘indivíduos reais’ submetidos a alguma situação de sofrimento ou
fragilidade. As demandas endereçadas ao assistente social surgem para ele, no
cotidiano, concretizadas nas queixas, reivindicações e solicitações de sujeitos que se
situam em determinado contexto social. (NICACIO 2006, p. 14)

Entendemos que, na maioria das vezes, o usuário do serviço social se encontra numa
situação limite, decorrente de uma ausência ou fragilidade que o leva a conviver com seus
sintomas, fobias, incertezas e dúvidas. No entanto, não pretendemos que o assistente social
atue junto a essa realidade numa perspectiva psicoterapêutica, somos partidários de que as
atividades terapêuticas, defendidas pelo chamado serviço social clinico, não fazem parte da
atribuição do profissional do Serviço Social e caminha na contra mão do projeto ético-político
da categoria. Acreditamos que ao estabelecer uma relação atenta aos aspectos subjetivos da
realidade deste usuário nos permite construir um diálogo, com aquele que muitas vezes
encontra-se em um contexto social a margem das condições mínimas de sociabilidade
(moradia, educação, trabalho, etc.), onde quem apresenta uma demanda seja reconhecido
como um sujeito de direitos e aquele que a recebe reconheça a questão social e as
singularidades do seu impacto.

As diversas expressões da questão social não são meras entidades teóricas, mas
implicam um pathos*7, isto é, se encarnam em manifestações reais de sofrimento,
em experiências que afetam o sujeito. Os efeitos das desigualdades sociais e das
fragilidades da vida atingem os sujeitos no seu corpo, no seu psiquismo, nas suas
relações sociais cotidianas. (NICACIO, 2006, p. 15).

Por fim, a questão social se faz presente no cotidiano do assistente social, mas, a nosso
ver, ela se materializa em pessoas que carregam algum tipo de dor e estigma. O que significa
que essas pessoas pertencem a um contexto social onde a questão social é o determinante
macroestrutural.

7 Do grego: paixão, excesso, catástrofe, sofrimento, assujeitamento.


https://www.dicionarioinformal.com.br/pathos/. Acesso em 17/10/2018.
35

2.2 Algumas experiências da participação do Serviço Social em saúde


mental no Rio de Janeiro

A influência do movimento de higiene mental, a partir das primeiras décadas do século


XX, junto aos assistentes sociais que optaram pela atuação na saúde mental de fato contribuiu
para futuras formulações teórica e metodológica no interior da profissão. Porém, outras
atividades com a participação de assistentes sociais junto a saúde mental se desenvolveram
como experiência do serviço social e que podem ser lidos como modelos a serem estudados.

Vasconcelos (2000) nos apresenta três experiências históricas de atuação do serviço


social junto à saúde mental. Essas diferentes intervenções por parte do serviço social merecem
ser divulgadas e devidamente analisadas como uma expressão de uma atuação profissional
junto aos usuários da saúde mental. A primeira é o projeto coordenado pela Dra. Nise da
Silveira, a segunda foi o movimento que ficou conhecido como porta de entrada porta de
saída e por fim temos as atividades desenvolvidas pelas às comunidades terapêuticas.

2.3 As oficinas terapêutico-expressivas da Drª Nise da Silveira


Dentro de um modelo psiquiátrico predominantemente asilar, a experiência
desenvolvida pela Drª Nise da Silveira, em 1946, buscou uma alternativa a este modelo de
confinamento e tratamento muitas vezes desumano. Atendendo aos usuários do Centro
Psiquiátrico Nacional, Drª Nise e sua equipe inovaram ao proporcionar aos usuários
atividades profissionalizantes, ocupacionais e também artísticas. Essas atividades artístico-
expressivas estimulavam o usuário a projetar imagens sobre si, desenvolvendo um olhar
interior e produzindo um processo de crescimento pessoal a partir da individualização.

No que diz respeito aos assistentes sociais, a experiência da obra da Drª Nise e equipe
tiveram forte influência nos vários estagiários presentes ao longo de mais de trinta anos de
atuação. Porém essa experiência permanece restrita aos profissionais de atuação junto a saúde
mental. Tendo a influência direta do pensamento junguiano, a obra da Drª Nise acaba sendo
apresentada e referendada pelo aspecto estético e do efeito demonstrativo da divulgação do
trabalho do museu do inconsciente. O que de certa forma limita a análise dos aspectos
36

terapêuticos, já que a literatura técnica a respeito do método é bem menor que a produção
audiovisual sobre os efeitos.

Essa influência não se deu tanto no campo especificamente teórico, já que o


pensamento junguiano é complexo e se aplica mais ao campo da psicoterapia, da
terapia ocupacional e da interpretação simbólica da arte, mas sobretudo por suas
propostas de prática em ambiente aberto, em oficinas expressivas e ocupacionais, e
pela abordagem humanizada, individualizada, ética, aberta e respeitosa em relação
aos direitos dos clientes, a sua história pessoal e sua subjetividade, bem como a sua
produção artística . (VASCONCELOS 2000, p. 187)

A passagem pela obra da Drª Nise, seja como estagiária ou como profissional, é sem
dúvida uma experiência única enriquecedora do ponto de vista do profissional que tem sua
atuação junto a saúde mental. Por outro lado, a própria característica das atividades
desenvolvidas não proporciona uma produção teórica objetivando uma formulação enquanto
movimento orgânico e de representação, ou seja, as inúmeras atividades desenvolvidas não
foram devidamente sistematizadas ou replicadas enquanto um projeto pedagógico formativo.

2.4 O movimento porta de entrada e porta de saída


Chamada “porta de entrada e porta de saída” foi um movimento de transição das
enfermarias e asilos psiquiátricos que buscava “humanizar” o atendimento aos internos e seus
familiares. Tendo a frente às assistentes sociais, as primeiras turmas de formandos da escola
de serviço social, na década de 1940, foram assimilados em boa parte pelos hospitais
psiquiátricos. Esse movimento teve como principal objetivo, garantir que as necessidades
básicas (materiais) dos pacientes e seus familiares fossem supridas. Na maioria das
instituições psiquiátricas a direção era conduzida por médicos, cabendo aos assistentes sociais
atuar nos departamentos de assistência social dessas unidades. Essa organização
administrativa, levou os assistentes sociais a serem responsáveis pela coordenação do setor de
“porta de entrada e porta de saída” dos hospitais. A principal atividade destes profissionais era
o levantamento de dados dos pacientes e seus familiares objetivando o processo da alta, a
confecção do atestado social e a produção de encaminhamentos. Com base na experiência do
after-care psiquiátrico8 os assistentes sociais atuavam em um “engajamento voluntário”
organizando muitas vezes campanhas para ajudar os usuários.

8 Ainda segundo o autor, o chamado modelo de after-care americano tinha como objetivo
garantir o máximo de dados sociais e familiares dos usuários internados como um suporte para o
processo de alta e adequação do ambiente familiar e comunitário.
37

Constatamos em algumas instituições que os assistentes sociais com frequência


também se engajavam em campanhas para angariar recursos financeiros ou em
espécie para aquisição de roupas, cigarros e bem de primeira necessidade dos
internos, em uma prática nitidamente assistencialista, como ocorreu, por exemplo,
no hospital Jurujuba em Niterói, nos primeiros anos da década de 50.
(VASCONCELOS, 2000 p. 187).

Em resumo este modelo de atuação dos assistentes sociais se baseava numa relação
uniprofissional, com forte viés burocrático, sem uma rotina de estudos e trocas sobre as
intervenções de maior complexidade. Essa forma de atuação profissional é vinculada ao
modelo da chamada medicina tradicional já que mantém a separação sociotécnica do trabalho
nas instituições psiquiátricas, constituindo assim uma contradição em relação às práticas
atualmente desenvolvidas pelos profissionais em saúde mental.

2.5 As comunidades terapêuticas


Outra experiência, desenvolvida junto aos assistentes sociais com atuação em saúde
mental, foram às comunidades terapêuticas. Tendo como referência a clínica Pinel de Porto
Alegre, fundada em 1960, as comunidades terapêuticas surgem dentro dos hospitais
psiquiátricos nas décadas de 1960 e 1970 em plena ditadura militar. Em uma conjuntura em
que a censura e a repressão atingiam os movimentos e organizações políticas com atuações
mais amplas9, ações militantes direcionadas para espaços sem a tradição de luta e visibilidade
permitiram novas experiências organizativas. Neste sentido, as comunidades terapêuticas,
tendo como referência às experiências internacionais sobre saúde mental e o processo
pioneiro da clínica Pinel de Porto de Alegre em 1960, acabam por se tornar umas das
experiências mais progressistas no interior da psiquiatria consolidando assim um modelo para
inúmeros profissionais de saúde mental. Do ponto de vista estratégico podemos dizer que as
comunidades terapêuticas,

Buscavam, em resumo, a democratização e a humanização das relações entre


profissionais e usuários, através principalmente dos dispositivos grupais e coletivos
de participação (grupos operativos, assembléias, etc.), envolvendo também os
familiares, e atividades de acompanhamento externo daqueles que recebessem
licenças temporárias ou altas. (VASCONCELOS 2000, p.190).

É possível afirmar que as comunidades terapêuticas abrigavam ao menos duas leituras


sobre o sentido do movimento, de um lado, um grupo que via na função terapêutica e nas
mudanças internas do espaço (agora mais democrática e humanizadora) um fim em si, de
9 Aqui estamos nos referindo aos movimentos e organizações políticas com uma base social
com maior definição, assim como a estratégia, princípios e programas conhecidos em boa parte da
sociedade. Exemplo: a luta dos sindicatos e dos movimentos de luta por moradia.
38

outro, o entendimento de que essa experiência deveria ser a primeira etapa de um processo
maior que significava questionar a própria instituição hospitalar.

Dadas as características do movimento das comunidades terapêuticas, a atuação de


diferentes profissionais não apenas consolidou uma prática multidisciplinar como também
proporcionou a construção de lideranças fora do universo da psicologia. É o caso da assistente
social Lêda de Oliveira membro da equipe do Hospital Psiquiátrico Pedro II, que durante a
década de 1960 assumiu um importante cargo no Ministério da Saúde, a Coordenação de
Serviço Social da Divisão de Saúde Mental (DINSAM). Para Vasconcelos (2000), essa
atuação de Lêda de Oliveira, como gestora possibilitou ampliar a experiência das
comunidades terapêuticas juntos aos assistentes sociais e em especial aos estagiários numa
dinâmica de treinamentos e divulgação.

As comunidades terapêuticas mobilizavam trabalhadores e usuários para a construção


de espaços coletivos de tomadas de decisões. Tendo como principal objetivo a reabilitação
psicossocial do usuário, o movimento das comunidades terapêuticas proporcionou uma maior
presença do profissional do serviço social, já que à medida que procurava retirar o usuário do
espaço institucional para inseri-lo junto a sua família e a comunidade, demandavam ações no
campo da prática do assistente social. Reunidos em torno de um projeto político que buscava
alterações nas instituições psiquiátricas e também das práticas profissionais, diversos
trabalhadores da saúde mental inovaram ao desenvolver ações interdisciplinares que
questionavam a divisão social do trabalho em saúde mental.

Compreendemos que o movimento de higiene mental, teve uma importância ainda não
devidamente pesquisada no que se refere à sua influência no interior da profissão na década
de 1940. Assim, optamos por demonstrar alguns aspectos desse movimento e seus reflexos
juntos ao serviço social.

Destacamos também a presença de algumas experiências em saúde mental que tiveram


grande repercussão junto aos assistentes sociais. As quais nos apresentaram diferentes práticas
profissionais, proporcionando assim um conjunto de elementos e requisitos em torno da
atuação do assistente social em relação à divisão social do trabalho na saúde mental e os
desafios de prática interdisciplinares. Por fim, acreditamos que descrever essas experiências
contribui para fortalecer o debate em torno do tema da subjetividade no interior da profissão e
assim estabelecer um debate atualizado sobre o rebatimento da questão social no cotidiano da
prática profissional.
39

2.6 A presença do conservadorismo nas experiências do Serviço Social na


saúde mental

Ao destacar a importância projeto profissional na consolidação de uma direção


profissional, Iamamoto (2004), reafirma que através que a atividade do assistente social se
desenvolve na fronteira do trato entre sujeitos sociais coletivos, entre classes sociais.

O assistente social é um profissional que trabalha com a linguagem, como elemento


fundamental de seu exercício profissional e, consequentemente, um profissional que
tem relação direta no trato com a população — que suponho respeitosa de seu modo
de vida e trabalho —, no sentido de ouvir suas reivindicações e suas necessidades,
fazer esta população pensar-se, respeitar-se, descobrir-se, como indivíduo que é
parte de uma coletividade, e avançar na sua organização. (IAMAMOTO, 2004, p.
36)

A partir de uma leitura histórica sobre o movimento de reconceituação, a autora


afirmar que este movimento jamais defendeu a fim do trabalho do assistente social seja, com
as comunidades, grupos ou a família. Neste sentido, esclarece que o movimento de
reconceituação questionou uma determinada forma de atuação, inclusive indagando sobre os
fundamentos do Serviço Social de Casos, Serviço Social de Grupo e comunidade. Este
registro nos parece importante, já que o movimento do chamado Serviço Social Clínico
aponta a falta da dimensão do indivíduo e da subjetividade, perdendo assim o espaço do
micro.

O assistente social não trabalha partes da questão social, Iamamoto (2004), mas
desenvolve sua prática profissional com indivíduos, que pela formação sócio econômica,
acabam por centralizarem as questões universais e particulares das relações de classe. Em
outras palavras, homens e mulheres se apresentam diante do profissional do serviço social a
partir da materialização da questão social, desemprego, violência familiar, etc. Neste
contexto, a questão social está presente intrinsecamente na profissão, não sendo possível
fragmentá-la como querem os partidários do Serviço Social Clínico.

Como podemos perceber, na descrição acima, o Serviço Social conservador se


manteve hegemônico no campo da saúde mental durante boa parte do século XX. Para
Pacheco (2002) o Serviço Social conservador manteve uma relação orgânica com o
conservadorismo da psiquiatria influenciando na formação de assistentes sociais. Para autora,
esse quadro sofre uma modificação nas décadas de 80 e 90.
40

O avanço e a consolidação ideopolítida da ruptura com o conservadorismo do


Serviço Social e o avanço da Reforma Psiquiátrica no país nos anos 80 e 90
possibilitaram o deslocamento de perspectivas profissionais abertamente
conservadoras do campo da Saúde Mental. (PACHECO, 2002 p. 97).

Analisando a atuação do Serviço Social no campo da saúde mental, a autora reconhece


que esse distanciamento do conservadorismo profissional não foi o suficiente para o
desenvolvimento de uma proposta com base nos problemas apresentados pelo campo da saúde
mental nos dias de hoje rebatendo diretamente no entendimento do papel do assistente social
junto as instituições psiquiátricas. Essa dificuldade em definir o papel do assistente social nos
mecanismos de assistência psiquiátrica, segundo Rodrigues (2002), refletem o ideário da
Reforma Psiquiátrica brasileira.

Uma análise panorâmica e provisória das perspectivas profissionais presentes no


campo da Saúde Mental permite indicar, ao menos no Rio de Janeiro, a
predominância de posturas “tarefeiras” ou voluntarista na atuação dos Assistentes
Sociais em diversos dispositivos de psiquiátrica. (RODRIGUES, 2002 p. 97).

Avaliamos que essa postura voluntarista do Serviço Social na saúde mental, que se
expressa nas atividades desenvolvidas nas instituições de assistência psiquiátrica é
simbolizada na prática do “acolhimento” por parte destes profissionais. O acolhimento, neste
caso, significa escutar, confortar ou “entender” o usuário. Sem uma reflexão maior sobre os
objetivos das atividades, das oficinas às entrevistas com familiares, o acolhimento se torna o
grande “coringa” na ausência de um projeto ou metodologia de trabalho.
41

CAPÍTULO 3 A FORMAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL E A


SUBJETIVIDADE

3.1 Considerações metodológicas

No primeiro capítulo, procuramos apresentar a temática da subjetividade a partir do


pensamento marxista e também através do universo da psicologia e assim estabelecer uma
referência para o leitor. Acreditamos que a apresentação de algumas referências em torno do
tema da subjetividade a partir da teoria marxista possibilitou ao eleitor perceber que o
processo de individualização do homem e sua personalidade se desenvolve na concretude da
vida social. Ainda neste capítulo, apresentamos uma descrição histórica e social do
desenvolvimento da subjetividade, buscando construir uma ligação entre as transformações
sociais vividas pelo homem moderno e o desenvolvimento dos aspectos subjetivos
individuais.
No segundo capítulo, trouxemos o tema da subjetividade para o interior do Serviço
Social, ainda muito centrado na atuação da saúde mental, onde relatamos a influência do
movimento de Higiene Mental Brasileiro nas formulações das primeiras grades curriculares
do Serviço Social e sua influência junto ao Serviço Social Conservador. Nosso objetivo, nesta
parte do capítulo dois, foi apresentar elementos que pudessem contribuir na pesquisa sobre a
temática da subjetividade no processo de formação profissional . Avaliamos que a ausência
de literatura sobre esse período no interior do Serviço Social prejudica uma análise em torno
do tema da subjetividade no processo de formação do assistente social. Dando continuidade,
apresentamos uma série de experiências da atuação de assistentes sociais em práticas que
consideramos estar relacionada à temática da subjetividade, inclusive na gestão de algumas
políticas ligadas a saúde mental. Infelizmente a ausência de uma literatura avaliativa destas
experiências restringiram a formulação de uma análise crítica sobre a atuação destes
profissionais.
A nosso ver, os dois primeiros capítulos trouxeram alguns elementos que podem
contribuir para o objetivo deste trabalho, apontando a invisibilidade do tema subjetividade no
interior da profissão e a importância do tema no cotidiano do assistente social. Neste sentido,
o primeiro capítulo teve a função de apresentar o tema, já que existe pouca literatura ou
núcleos de pesquisa sobre o tema subjetividade. O segundo buscou colaborar no sentido de
apresentar a partir de experiências recentes a presença da temática.
42

No terceiro capítulo, trazemos um debate mais atualizado sobre essa temática a partir
de entrevistas junto a assistentes sociais. Abordaremos o tema da subjetividade, formação e
prática profissional através das diferentes visões das profissionais entrevistadas. As
entrevistas permitiram replicar questões relacionadas à subjetividade e a prática cotidiana do
assistente social.

3.2 Roteiro das entrevistas: dados quantitativos e qualitativos

Neste capítulo buscamos trazer algumas considerações a respeito da subjetividade nos


processos de formação e prática profissional em Serviço Social. Neste sentido, optamos por
realizar um conjunto de entrevistas com assistentes sociais a partir de um mesmo roteiro de
questões que se encontra em anexo.
Para o processo de entrevistas foram convidadas quinze assistentes sociais via e-mail, todas
trabalhando ou morando na cidade do Rio Janeiro , entre o período de 04 a 21 de Setembro
de 2018. O principal critério de escolha dessas profissionais, foi a fato delas terem o seu
processo de formação nas duas primeiras décadas do século XXI. O convite apresentava a
proposta da monografia e solicitava o tempo de 02 horas para realização das entrevistas. Das
quinze assistentes sociais convidadas apenas seis responderam positivamente. Devido às
dificuldades de deslocamento e compatibilidade de horários apenas cinco assistentes sociais
foram entrevistadas.
O roteiro de questões formulado para auxiliar nas entrevistas é composto de duas
partes. Na primeira, temos os dados quantitativos relacionados à idade, período da formação,
estágio, tendo como objetivo ajudar no desenvolvimento de um perfil das assistentes sociais
entrevistadas. Na segunda parte do roteiro faremos uma análise a partir das respostas e
posicionamentos das assistentes sociais. Neste sentido, elaboramos quinze questões que foram
divididas tematicamente em quatro blocos: instituição de ensino e formação profissional,
instituição de ensino e formação individual, formação e dia a dia do trabalho e, por fim,
Serviço Social e subjetividade. Essa divisão por blocos possibilita que as respostas das
assistentes sociais possam ser identificadas a partir de cada questão. A fim de garantir o sigilo
destas profissionais, iremos identificá-las como Assistente Social 1, Assistente Social 2,
Assistente Social 3, Assistente Social 4 e Assistente Social 5.
43

3.3 Roteiro de questões: dados quantitativos

Segue abaixo a tabela com os dados quantitativos do roteiro de questões apresentadas às


cinco assistentes sociais.

A. IDADE FORMAÇÃO ESTÁGIO 1 ESTÁGIO 2 ATIVIDADE U.E** SEXO


S.* PROFISSIONAL
ATUAL
1 39 2003 Socioeducativa Socioeducativa Empresa Estatal UNB F
2 24 2018 Assistência Assistência Terceiro Setor UFF F
Saúde Saúde
3 34 2018 Desempregada UFRJ F
reprodutiva reprodutiva
4 33 2009 Empresarial Empresarial Empresa Estatal UFF F
5 42 2001 Assistência Assistência Terceiro setor UFRJ F
*Assistente Social
**Unidade de Ensino

Um dos aspectos apresentados a partir da análise dos dados quantitativos foi o período
de formação destes profissionais. Todas as entrevistadas se formaram nas duas primeiras
décadas do século XXI, significando que as atuais profissionais estudaram sob as Diretrizes
Curriculares para o Curso de Serviço Social, aprovada pela categoria em 1996 e aprimorada
pela Comissão de Especialistas em documento de 1999 sob a responsabilidade da Associação
Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS). A nosso ver, as Diretrizes
Curriculares para o Curso do Serviço Social reafirmou nova direção social hegemônica no
seio acadêmico-profissional, fazendo parte de um processo que buscou a revisão crítica e um
amplo questionamento interno da profissão, de suas bases teórico-ideológicas e origens
sociopolíticas. Esta mudança permitiu, portanto, uma grande reavaliação de projeto
profissional.
Outro elemento de destaque é o perfil das instituições de ensino responsáveis pela
formação dos assistentes sociais entrevistados. Todas as profissionais se formaram em
instituições públicas, o que possibilita algumas reflexões sobre a relação instituição de ensino
e aluno. As universidades públicas mantém uma política de assistência estudantil10 que
contribuem para permanência dos alunos durante o curso. Outra característica das

10 Nas universidades públicas brasileiras existe uma política de apoio aos estudantes (bolsa
auxílio, alojamentos e alimentação subsidiada) que contribui para a manutenção e permanência do
estudante até o fim do curso. Importante ressaltar que a política de auxílio estudantil não se destina a
todos os universitários, havendo um corte de renda para serem contemplados. Além disso,
compreendemos que essa política de assistência, na maioria das universidades públicas, vem
reduzindo a cada ano prejudicando muitos estudantes que necessitam deste apoio para a manutenção e
permanência no campo universitário.
44

universidades públicas são os programas e projetos de extensão possibilitando ao aluno uma


maior interação entre o ambiente acadêmico e a comunidade, indo além dos muros da
Universidade.
A área de atuação do estágio apresenta os seguintes campos: socioeducativo;
assistência, saúde reprodutiva e empresarial. A Política de Assistência aparece duas vezes
tendo períodos de formação distantes, as profissionais com formação em 2001 e 2018. Após
uma rápida pesquisa, observamos que em sua maioria as empresas que mantém convênio de
estágio com as universidades públicas do estado do Rio de Janeiro, são de economia mista e
na maioria das vezes o assistente social é vinculado ao setor de recursos humanos ou
comunicação social da mesma.
A atuação profissional das entrevistadas nos apresenta algumas particularidades, que
podemos sinalizar a ausência do Estado11 e presença das empresas e o terceiro setor como
empregadoras. Assim, neste universo de cinco profissionais, temos quatro assistentes sociais
exercendo a função e uma desempregada. A presença do terceiro setor como fonte
empregadora suscita duas reflexões: a função e dimensão do Estado e a própria natureza da
profissão. Em relação à função e dimensão do Estado, diversos autores e debates em sala de
aula, vem apontando a progressiva diminuição do agente estatal repercutindo diretamente na
questão social. Por outro lado, a presença do terceiro setor ganha espaço nas últimas décadas
no Brasil ao propor “a mediação de conflitos” ocupando um lugar jurídica e politicamente
antes administrado pelo Estado. Quanto o debate em torno da natureza da profissão, a
vinculação trabalhista dos assistentes sociais junto ao terceiro setor acaba por relacionar a
prática profissional entre a mediação de conflitos através da ações denunciantes tendo como
referências o estado de direito e os direitos humanos, como também a atuação com vistas a
construir o chamado protagonismo individual e pontual ao invés das ações coletivas 12. A
dimensão territorial e econômica também apresentam indicadores que merecem algumas
observações. Todas as entrevistadas tiveram o seu processo de formação na região sudeste
(maioria) e distrito federal. Pertencente à região sudeste, o Estado do Rio de janeiro conta
com quatro universidades federais: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ);
Universidade Federal Fluminense (UFF); Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(UNIRIO) e Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e duas universidades

11 O Estado aqui refere-se aos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário e também em
relação as esferas municipal, estadual e federal da máquina pública.

12 O chamado terceiro setor vem se destacando por constituir uma alternativa ao Estado, atuando
na mediação dos conflitos, mas sem garantir o acesso aos direitos.
45

estaduais: Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e Universidade Estadual do Norte


Fluminense (UENF), resultando assim em número de vagas bem superior em relação aos
outros estados da federação.
3.4 Questões agrupadas e respostas individuais

Segue abaixo o roteiro com as questões agrupadas por blocos seguido das respostas
das assistentes sociais. Em cada grupo de questões teremos um bloco de manifestações das
entrevistadas. O objetivo é descrever as opiniões e posicionamentos das cinco profissionais.

Bloco Questões agrupadas Tema abordado


1- Você poderia falar sobre a natureza da
formação profissional que você teve na
Universidade em que se formou?
2- Quais são os aspectos que você considera que O projeto de formação
1 profissional da instituição.
foram mais enfatizados em seu processo de
formação profissional?

3- Quais são os aspectos que em seu processo de


formação profissional foram mais significativos
para você e influenciaram o profissional que você
é hoje?

4-Durante a sua formação profissional a


instituição deixou claro o perfil de profissional
que objetivava formar?
A influência da instituição
no processo de formação
2 SIM ( ) NÃO ( ) individual.

5- Caso SIM, qual era?

6- Caso NÃO, qual você acha que era esse perfil,


pela grade curricular a partir da qual você
estudou?
7- Quais disciplinas você destacaria em seu
processo de formação profissional?

8 - Por que você as destaca?


A importância do conteúdo
3 9-Como você relaciona a sua formação das disciplinas, a prática
profissional com as questões de natureza profissional interventiva e a
interventiva com as quais tem que lidar na sua relação com o usuário.
relação com o usuário?

10- A partir dessa relação com o usuário e as


demandas que esse traz, como você avalia a
formação profissional que teve?
11- No cotidiano da relação com os usuários, que Subjetividade e a percepção
espaço tem a subjetividade no seu processo de do profissional.
intervenção profissional?

12- Em seu processo de formação profissional


46

você teve disciplinas que abordassem a discussão


sobre a subjetividade como dimensão explicativa
no processo de entendimento dos problemas
sociais?

13- Caso SIM, quais foram? Poderia falar um


pouco sobre as mesmas?

4 14-Você lembra de haver lido autores que


tratavam sobre o tema da subjetividade?

SIM ( ) NÃO ( )

Caso SIM, quais?

15-Caso NÃO, você considera que isso teve


alguma consequência significativa para sua prática
profissional?

Bloco 1 – O projeto de formação profissional da instituição

ASSISTENTE SOCIAL 1

Segundo a Assistente Social 1, a instituição de ensino na qual estudou apresentou


desde o início do curso um projeto definido de formação profissional. A proposta é formar um
profissional com base nas políticas sociais e garantir uma compreensão histórica da profissão.
Ressalta ainda que o foco da escola em políticas sociais se deve ao fato de se tratar de uma
universidade pública situada na capital federal. Neste sentido, a instituição busca formar
profissionais que possam atuar também nas elaborações de políticas públicas e projetos
relacionados à assistência social: “Por estar situada na capital federal a escola de Serviço
Social formava profissionais com qualidades de gestores e formuladores de políticas públicas.
Fui formada para ser concurseira”. (ASSISTENTE SOCIAL 1).
O aspecto mais enfatizado durante a formação foi o estudo de políticas sociais, como
seguridade social, assistência social e saúde. Ela também ressalta que o seu período de estágio
manteve a orientação da instituição: “No meu primeiro estágio que me dei conta de que o
assistente social também é responsável por elaborar e conduzir projetos relacionados à
assistência social e que eles (os projetos) podem se tornar uma política pública”.
(ASSISTENTE SOCIAL 1).
47

A Assistente Social 1 argumenta que o contato com disciplinas que apresentavam a


historiografia do Serviço Social brasileiro foram importantes para situar sua concepção da
profissão.
Para mim foi importante ter contato com o marxismo a partir da própria leitura do
movimento de reconceituação no pós 93. Lembro que essas aulas me deixavam meio
confusa, mas ao mesmo tempo já me achava meio revolucionária por estar
entendendo coisas que meus pais não entediam (risos). (ASSISTENTE SOCIAL 1)

Ela considera que sua instituição de ensino apresentou de forma direta e simples o
perfil do profissional que objetivava formar, o que julga ser positivo e facilita a compreensão
do próprio conteúdo do curso.

ASSISTENTE SOCIAL 2
A Assistente Social 2 destaca que tomou conhecimento do curso de Serviço Social
quando ainda cursava o ensino médio. Foi um professor quem apresentou a ela as principais
características do curso.
Foi no ensino médio que fiquei sabendo do curso de serviço social. Foi o meu
professor que disse que eu tinha o perfil para ser assistente social, porque eu era
muito questionadora e também participativa, pelo menos eu achava (risos). Hoje
reconheço que meu professor apenas me direcionou. Da escola em que estudava não
conseguiria ser engenheira, que era meu sonho de adolescência. (ASSISTENTE
SOCIAL 2)

Ao entrar na faculdade de Serviço Social nossa entrevistada percebeu que não tinha a
“bagagem” necessária para estar no curso. Ela achava que não havia tido uma preparação
prévia sobre autores ou temas básicos a partir dos quais começavam os debates do curso. Por
outro lado, ela conseguiu identificar, já nas primeiras aulas, que a instituição tinha uma
intencionalidade quanto ao perfil do profissional que estava formando.
Na primeira semana de aula fiquei muito perdida, totalmente sem ação. Achei que
aquele lugar não era para mim. Percebi que não tinha a bagagem que o curso pedia.
Mas ao mesmo tempo me identificava com as aulas dos professores sobre aquilo que
eu vivia. Foi muito bom! Passei a estudar aquilo que vivia na minha realidade. Na
minha escola de serviço social, desde o início do curso estava presente o tipo de
profissional que ela queria moldar. A minha universidade forma para dentro, forma
professor e pesquisador. (ASSISTENTE SOCIAL 2)

Ela termina a discussão do primeiro bloco de questões com uma leitura bastante crítica
de seus colegas de estudo, na medida em que afirma que são poucos os alunos que conseguem
se apropriar dos conteúdos das disciplinas e introduzi-las na sua prática cotidiana.
“Na minha turma eram poucos os alunos que se envolviam de verdade nas discussões. Fazer
trabalho juntos era terrível. O pessoal da noite sempre foi mais responsável. Eu acabei
48

passando por todos os turnos, por isso posso falar dos outros estudantes”. (ASSISTENTE
SOCIAL 2)
ASSISTENTE SOCIAL 3

A Assistente Social 3 fez uma leitura sobre o impacto que a universidade trouxe para a
sua vida, não apenas pelos temas e discussões em sala de aula, mas principalmente pelo
convívio com alunos de diferentes cursos. Ela também afirma que desde o início sua
instituição apresentou o perfil do profissional que queria formar.
A minha entrada na faculdade mudou a minha vida. O convívio com outras pessoas,
as discussões, as conversas tiveram um impacto muito grande em minha vida.
Trouxe questões que mexeram com o meu casamento, minha sexualidade e até a
relação com a minha família. Isso me ajudou muito (pausa). Consegui me olhar, não
sou mais submissa, sou eu. (ASSISTENTE SOCIAL 3)

Para a Assistente Social 3, o fato de sua instituição trazer a todo tempo a natureza do
processo de formação profissional possibilitou não apenas a compreensão dos objetivos de
algumas disciplinas, como também permitiu uma crítica a esse modelo.
A minha universidade tem um projeto de formação profissional que é generalista e
crítico. Aprendemos que a questão social é o resultado de um modelo de sociedade,
em que o meio social onde vivemos acaba por nos definir, seja na questão
econômica ou cultural. Essa forma crítica de conceber o mundo ainda me traz
impacto. Mas ainda acho essa formação generalista não dá conta de outros assuntos
como a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) e o Sistema Único de
Assistência Social (SUAS). Temas importantes, como estes, não são aprofundados,
nos deixando sem conhecimento técnico. (ASSISTENTE SOCIAL 3).

ASSISTENTE SOCIAL 4
A Assistente Social 4 faz uma reflexão em torno da sua instituição de formação. Ao
responder o primeiro bloco de questões, demonstra que sua faculdade de Serviço Social
objetivava formar um profissional em condições de ingressar no serviço público ou seguir
carreira acadêmica.
Acho que foi no segundo ou terceiro período que consegui entender a proposta da
escola de serviço social da UFF. Foi mais uma inexperiência minha, era muito nova.
Hoje, quando olho minha graduação, vejo que era muito imatura. Simplesmente não
entendia o que estava acontecendo. Nós, os alunos, saímos preparados para fazer
concurso para qualquer prefeitura ou virar professor da escola de serviço social.
(ASSISTENTE SOCIAL 4)

A Assistente Social 4 foi a única que conseguiu comentar os aspectos que foram mais
enfatizados em seu processo de formação, já que as demais profissionais afirmaram não se
lembra.
49

Lembro que a disciplina de ética foi muito enfatizada. Só da metade do curso em


diante pude entender que essa disciplina ao mesmo tempo em que trazia um
conjunto de regras para a nossa profissão, também apresentava toda a história da
profissão. (ASSISTENTE SOCIAL 4).

Mantendo uma leitura crítica de seu processo de formação, a Assistente Social 4


reconhece a importância do curso trazer elementos históricos da profissão.

ASSISTENTE SOCIAL 5

Finalizando o primeiro bloco de perguntas, trazemos a opinião da Assistente Social 5.


Ela apresenta uma perspectiva muito particular de seu processo de formação. Em sua vida
profissional a Assistente Social 5 passou por diferentes instâncias do Estado e hoje atua no
terceiro setor:
A minha faculdade desde o início apresentou o profissional que queria formar. Era
um profissional crítico, por trazer uma leitura marxista da realidade e da questão
social. As disciplinas de prática profissional e Economia Política foram as que mais
enfatizaram esse modelo de profissional. Hoje a escola permanece do mesmo jeito.
Conheço alguns estudantes que me relatam que esse modelo ainda continua.
(ASSISTENTE SOCIAL 5)

Ainda neste bloco de perguntas a Assistente Social 5 acaba por questionar a


consolidação da própria profissão. Ela não vê grandes avanços nas condições de trabalho e
chega a ter dúvidas quanto à manutenção da carreira:
Eu acho que as universidades deveriam repensar o curso de serviço social, pensando
mesmo numa atualização. Não dá para utilizar os textos de Lênin diante de uma
sociedade que não existe mais o operário padrão, aquele que trabalha de 8 a 10 horas
por dia em uma fabrica com mais 600 companheiros. Isso não existe mais, é outra
coisa, o tal Lumpen é metade da população. No tempo que estudei, Lumpen era o
sujeito que não está inserido no mundo do trabalho. Nesse caso são os
desempregados? Sem emprego de carteira assinada? Eu não sei. (ASSISTENTE
SOCIAL 5)

Bloco 2 – A influência da instituição no processo de formação


profissional

ASSISTENTE SOCIAL 1

Para a Assistente Social 1 sua faculdade teve maior atuação nas políticas públicas,
fortalecendo assim o perfil do profissional que queria formar. Mesmo atuando hoje fora da
gestão das políticas sociais, ela considera que sua formação profissional foi influenciada pelas
políticas sociais.
50

Hoje reconheço que dos temas que estudei na faculdade foram as políticas sociais as
de que mais gostei. Falo da seguridade social, saúde e assistência. E hoje são os
temas que mais utilizo no meu dia como profissional. Considero que as políticas
sociais e meu período de estágio foram os aspectos mais importantes para minha
formação. (ASSISTENTE SOCIAL 1)

Ainda refletindo sobre o impacto do estágio na sua formação profissional, a Assistente


Social 1 afirma que a sua faculdade sempre deixou claro o perfil do profissional que pretendia
formar: “Até o meu estágio estava relacionado com a proposta do perfil profissional que a
minha faculdade queria formar. A minha supervisora de estágio dava continuidade às nossas
discussões em sala e trazia sempre questões relacionadas à gestão”. (ASSISTENTE SOCIAL
1)
ASSISTENTE SOCIAL 2

A Assistente social 2 afirma que foram muitas as disciplinas que contribuíram para sua
formação profissional e humana. Ela destaca que foi na universidade que teve conhecimento
dos movimentos sociais e da discussão de gênero.
Minha formação como pessoa e como profissional se mistura. A faculdade trouxe
muita coisa para vida. Muitas disciplinas me tocaram e eu mudei. Para mim um dos
aspectos importantes foram as discussões teóricas, mas sempre com um exemplo
prático nas aulas de Ética Profissional. (ASSISTENTE SOCIAL 2)

Em relação ao processo de formação profissional, a Assistente Social 2 reconhece que


durante o seu curso a sua instituição sempre deixou claro o perfil do profissional que queria
formar.
A minha faculdade sempre manteve seu projeto de formação. O modelo de
profissional que queria formar era sempre falado em sala de aula em diferentes
disciplinas. Mas não consegui me identificar com esse modelo. É uma formação
para dentro, para a própria universidade. (ASSISTENTE SOCIAL 2).

ASSISTENTE SOCIAL 3

A Assistente Social 3 relembra que ao entrar na faculdade encontrou uma realidade


distinta a qual conhecia. Para ela, um conjunto de elementos a influenciaram dentro da
faculdade: “A disciplina de gênero e o encontro com o Movimento Feminista teve um grande
impacto na minha vida! Naquele período tive essa sensação, e hoje ainda tenho, que sofri uma
grande transformação como mulher, como pessoa e como profissional”. (ASSISTENTE
SOCIAL 3).
A Assistente Social 3 também reconhece que a sua instituição sempre divulgou o
perfil da formação que objetivava junto aos seus alunos.
51

A minha faculdade sempre manteve seu projeto de formação profissional bem claro.
O estudante que tiver dúvidas é bastante desligado (Risos). Esse projeto generalista,
que se propõem a capacitar o estudante para que ele possa atuar nas diferentes áreas
profissionais. Para mim, esse modelo não funciona. Minha experiência no estágio
ajudou muito, lá compreendi que generalista é não aprofundar. Terminei o curso sem
aprofundar em temas como a LOAS e a SUAS. (ASSISTENTE SOCIAL 3)

ASSISTENTE SOCIAL 4

Com um olhar crítico sobre o seu processo de formação profissional, a Assistente


Social 4 reconhece que sua instituição sempre publicizou o seu modelo de profissional e
destaca o que lhe influenciou positivamente.
A minha faculdade sempre apresentou o modelo de profissional que queria formar.
Acho que isso ajuda àqueles estudantes que querem seguir a carreira dentro da
universidade. É só colar nos professores que vestem a camisa que o estudante passa
a ser monitor, fazer parte de grupo de pesquisa e já cai direto no mestrado.
(ASSISTENTE SOCIAL 4)

Em relação aos aspectos que a influenciaram, a Assistente Social 4 relembra alguns


momentos do seu processo de formação em tom nostálgico, destacando a capacidade da
professora de conduzir as discussões resolvendo as dúvidas em sala de aula.
Sim, com certeza a universidade me impactou e ajudou na minha própria concepção
de profissional que me identifico e acho que sou. A disciplina de ética me marcou
muito. Os nossos debates em sala de aula chegavam a um ponto que já não sabíamos
qual deveria ser a orientação. Nessa hora os debates paravam e a nossa professora
intervinha de forma direta e sempre utilizando o código de ética. Eu saia aliviada da
sala de aula! (ASSISTENTE SOCIAL 4)

ASSISTENTE SOCIAL 5

Com uma atuação longe da academia, a Assistente Social 5 apresenta uma perspectiva
que parte das suas diferentes experiências profissionais para olhar sua formação. Ela atuou
como gestora no Executivo, colaborou como assessora técnica no Legislativo e também no
terceiro setor.
Minha formação na universidade foi muito rica, digo isso por que foi lá que aprendi
muita coisa. Considero que um dos aspectos principais na minha formação foi o meu
processo de estágio. Busca pelo estágio, a burocracia interna da faculdade e o
choque com a realidade. Você tem que se virar sozinha. (ASSISTENTE SOCIAL 5).
52

A Assistente Social 5 comenta que desde o início a sua instituição deixou claro
durante todo o curso qual era o perfil de profissional que queria formar, o que na avaliação
dela é algo positivo para o estudante.
A minha faculdade sempre teve o seu modelo de profissional. Digo isso por que não
era só os professores que levantam essa discussão, os alunos também comentavam
sobre o perfil do profissional que queríamos ser. Essa conversa entre os estudantes
ajuda bastante. Quem está fazendo estágio conversa com aquele aluno que ainda vai
fazer. Mas a minha faculdade sempre deixou claro o profissional que queria formar.
(ASSISTENTE SOCIAL 5).

Bloco 3 – A importância do conteúdo das disciplinas, a prática


interventiva e a relação com o usuário

ASSISTENTE SOCIAL 1

Ao comentar sobre os conteúdos das disciplinas, a Assistente Social 1 descreve a


influência da sua primeira supervisora de estágio em sua formação profissional.
No meu tempo de estudante as disciplinas sobre políticas sociais eram as que mais
me interessavam. A disciplina de estágio e a minha supervisora de estágio me
marcaram muito. Foi muito importante essa relação com minha primeira supervisora
de estágio. Ela me orientou não apenas em relação às atividades do estágio, mas
também na relação com os outros profissionais. Minha primeira supervisora foi
muito importante na minha formação, agradeço a oportunidade que ela me deu.
(ASSISTENTE SOCIAL 1)

Em relação às disciplinas, ela valoriza os conteúdos que trazem temas relacionados às


políticas sociais, acrescentando que uma das atividades no estágio era discutir a relação com o
usuário: “Como disse antes, as disciplinas ligadas às políticas sociais eram as que eu mais
gostava. No estágio discutíamos como deveríamos nos relacionar com o usuário. Essas
reuniões me ajudaram a entender o caráter interventivo da profissão”. (ASSISTENTE
SOCIAL 1).
53

ASSISTENTE SOCIAL 2

A Assistente Social 2 afirmou que foram várias as disciplinas que a influenciaram


positivamente em seu processo de formação profissional e também na sua formação pessoal.
“As disciplinas que mais me marcaram foram as de OTP, Direito, Supervisão Acadêmica,
Criança e Adolescência, Gênero, Questão de família e Raça. Foi muito importante para mim.
Reconheci as práticas machistas dentro da minha própria família”. (ASSISTENTE SOCIAL
2).
Ao comentar sobre a sua prática interventiva a partir do seu processo de formação
profissional, a Assistente Social 2 apresentou alguns aspectos da sua relação com o usuário.
Acho que nossa formação profissional acaba não dando conta de tudo. Mas tem
coisas que devem ser prioridade na nossa formação. Foi a minha supervisora de
campo que me ensinou a utilizar o diário de campo. Outra coisa são as redes. É
difícil encontrar uma que funcione de forma a ter encaminhamentos práticos e
articulações institucionais. A falta de redes que funcione interfere diretamente nas
condições de trabalho do assistente social. (ASSISTENTE SOCIAL 2)

ASSISTENTE SOCIAL 3
Neste ponto da entrevista, a Assistente Social 3 apresenta disciplinas que a
influenciaram e também acaba por relatar a sua experiência no campo de estágio o que reflete
diretamente na natureza interventiva da profissão.
A minha experiência no campo de estágio me ajudou muito na compreensão de
algumas disciplinas que já havia estudado, mas que não me chamavam atenção. Já
outras disciplinas mexeram comigo, trazendo reflexões sobre a prática profissional e
nossa formação humana. Gênero, OTP e Ética Profissional foram disciplinas que me
ajudaram na minha formação. (ASSISTENTE SOCIAL 3)
Minha supervisora de campo me mostrou como deve ser nossa relação com o
usuário, tirou da minha cabeça a ideia do cuidado e trouxe o sentido do direito
proporcionando assim o conhecimento sobre a dimensão interventiva da profissão.
Ao discutir o código de ética e a lei de regulamentação da profissão percebi que no
nosso curso deixou de aprofundar vários temas. (ASSISTENTE SOCIAL 3).

ASSISTENTE SOCIAL 4

Além da disciplina de Ética Profissional, a Assistente Social 4 lembra que sempre


gostou do conteúdo e da dinâmica das aulas da disciplina de direito:
Foram duas disciplinas que gostei de estudar e que hoje fazem parte da minha
prática profissional. Ética Profissional e Direito foram essas duas. Sendo bem
sincera, só depois de formada e já atuando que pude compreender a chamada
dimensão interventiva da nossa profissão. Não lembro mesmo de ter estudado os
instrumentais. Acabei me virando sozinha. (ASSISTENTE SOCIAL 4).
54

Não sei se entendi bem essa questão, vou responder dentro da minha compreensão.
A nossa relação com o usuário é complexa. Quer ver um exemplo¿ O usuário chega
com uma demanda sobre BPC13. Ao ser informado que falta alguns documentos e
que o processo todo demora em torno de oito meses, o Usuário tem uma crise de
choro ou de raiva na minha instituição. Temos duas opções: ou chama o segurança
ou o psicólogo. (ASSISTENTE SOCIAL 4).

ASSISTENTE SOCIAL 5

Mantendo suas observações críticas, a Assistente Social 5 relaciona a sua afinidade


com algumas disciplinas ao exercício da prática profissional.

Das disciplinas, sim, tem umas que mexem com a gente. No meu caso foram as de
Ética e OTP. Essas disciplinas traziam questões reais, casos complexos, saía da aula
com a cabeça pegando fogo. Hoje reconheço que até o meu vocabulário profissional
tem muita relação com essas duas disciplinas. (ASSISTENTE SOCIAL5)

É difícil comentar sobre o que você pede, falar da minha formação em relação à
nossa prática interventiva. Não sei, acho que faltou um conteúdo específico sobre as
questões relacionadas à nossa relação com o usuário. No meu caso, foram as práticas
individuais que foram me dando a carcaça que hoje carrego. (ASSISTENTE
SOCIAL 5)

Bloco 4 – Subjetividade e a percepção do profissional

ASSISTENTE SOCIAL 1

Ao comentar sobre o tema da subjetividade a Assistente Social 1 pontua algumas questões


sobre o processo de formação profissional.
Para mim não tem espaço a questão da subjetividade na minha prática interventiva.
Acho que todo o usuário vem carregado de várias questões, mas principalmente pela
ausência do reconhecimento de que têm direitos. Por isso que a maioria dos usuários
chega a nós quase pedindo um favor, eles estão pedindo ajuda e não os seus direitos.
Não tive disciplinas que desenvolvessem o tema da subjetividade. Se tive realmente
não lembro. (ASSISTENTE SOCIAL 1)

13 O Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) é a


garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família. Para ter direito, é
necessário que a renda por pessoa do grupo familiar seja menor que 1/4 do salário-mínimo vigente. Por se tratar
de um benefício assistencial, não é necessário ter contribuído ao INSS para ter direito. No entanto, este benefício
não paga 13º salário e não deixa pensão por morte. https://www.inss.gov.br/beneficios/beneficio-assistencial-ao-
idoso-e-a-pessoa-com-deficiencia-bpc/
55

Tudo bem. Sei que nossa relação com o usuário se dá em condições muito objetivas.
Esse usuário chega a nós sem saber quais são os seus direitos e muitas vezes esses
direitos são negados de forma arbitrária. Em relação aos autores, com certeza não
tive nenhum que tratasse da subjetividade. No primeiro trabalho como assistente
social, eu pedi para sair. Era uma ONG que recebia crianças e adolescentes em
conflito com a lei. As condições de trabalho eram horríveis, na verdade não existiam
condições materiais ou subjetivas para qualquer profissional desempenhar sua
função. (ASSISTENTE SOCIAL 1)]

ASSISTENTE SOCIAL 2

Para a Assistente Social 2, o processo de escuta tem uma grande importância na


relação com o usuário. Ela reconhece que a subjetividade está presente em diferentes
momentos da atividade profissional. Por outro lado, afirma que sua formação pessoal, de
caráter mais humanista, acaba por garantir uma leitura às vezes particular da sua própria
prática: “A minha instituição me ajudou na minha formação profissional. Mas também venho
de uma formação minha, antes da faculdade. Para mim a subjetividade está presente na nossa
prática profissional, mas nem sempre percebemos”. (ASSISTENTE SOCIAL 2)
Sim, no meu curso as disciplinas de Psicologia e Ética abordaram o tema da
subjetividade. Lembro que discutíamos a repeito da singularidade do sujeito, mas
essas aulas não traziam nenhum exemplo em relação ao usuário. Os autores que
estudei durante o curso e que tratavam da subjetividade foram Maria Lucia Barroso,
Agnes Heller e Marilena Chauí. (ASSISTENTE SOCIAL 2)

ASSISTENTE SOCIAL 3

Ao refletir sobre o seu próprio processo de formação pessoal, a Assistente Social 3 faz
uma leitura sobre o seu período de estágio:
Esse tema da subjetividade nunca foi discutido ou estudado por mim em sala de
aula, mas sim pela minha supervisora de estágio em nossas reuniões de avaliação. O
tema da subjetividade era tratado na relação com o usuário, onde nossa supervisora
dizia o tempo todo que o assistente social devia ouvir o usuário. Ela repetia isso
sempre, era quase um mantra (risos). Nós temos duas orelhas e uma boca, vamos
ouvir! (ASSISTENTE SOCIAL 3)
Não me lembro de nenhum autor que tratasse da subjetividade. Hoje, mesmo sem
muito conhecimento técnico acredito que tenho incorporado à subjetividade na
minha formação profissional. É... Eu acho que ter uma escuta qualificada é
trabalhar a subjetividade, não é? Ouvir o usuário é dar um pouco de atenção. Acho
que isso faz parte do nosso trabalho. (ASSISTENTE SOCIAL 3).

ASSISTENTE SOCIAL 4

Atuando junto à uma equipe multidisciplinar, a Assistente Social 4 avalia que o tema
da subjetividade não está presente no seu cotidiano profissional.
56

Aqui no meu trabalho a nossa relação com o empregado é bem delimitada. O


Serviço Social tem a função de receber demandas e encaminhá-las em relação a
questões muito específicas. Se um empregado está um pouco mais estressado ou está
faltando ao trabalho ele é encaminhado para a psicologia, o que eu acho correto.
(ASSISTENTE SOCIAL 4).

“Na minha faculdade não tivemos nenhuma disciplina sobre subjetividade. Acho que
se tivesse seria junto com a psicologia. Também não li nenhum autor que falasse de
subjetividade”. (ASSISTENTE SOCIAL 4).
E finaliza com o seguinte comentário.

Não vejo necessidade de estudar o tema da subjetividade. Acho que esse tema tem a
ver com a área da psicologia. Temos que lidar com o cliente a partir da nossa
capacidade técnica. Hoje acho que essa separação entre as atividades do Serviço
Social e da psicologia está bem clara. (ASSISTENTE SOCIAL 4)

ASSISTENTE SOCIAL 5

Para a Assistente Social 5, a subjetividade é uma tema complexo e não existe uma
regra ou norma de como garantir, dentro da prática profissional, onde é o campo da escuta
qualificada e onde começa o atendimento da área da psicologia.

Eu acho que esse tema da subjetividade é bem complexo. Durante o meu curso não
tive qualquer professor ou disciplina que tratasse desse assunto. Acho que saber
escutar o usuário não é a mesma coisa de trabalhar a subjetividade. Eu mesma
quando estou atendendo, dependendo do caso, procuro ganhar a confiança do
usuário e com isso possamos ter uma relação direta, mas nem sempre dá certo.
Agora, se o usuário já chega tendo uma crise eu não tenho como ajudá-lo. Ele
precisa da ajuda de um profissional da área da psicologia. (ASSISTENTE SOCIAL
5)

3.5 Análise qualitativa

O primeiro bloco de questões que trata do projeto de formação profissional da


instituição tem um conjunto de temas que se destacam. Temos a leitura política da função da
universidade através da fala da assistente social 1 que aponta a função estratégica da
universidade onde se formou. Ao dialogar sobre o projeto de formação profissional da
instituição, a assistente social relaciona este projeto a uma dimensão política, neste caso, a
57

formação de um corpo técnico e dirigente do governo central. Porém, a mesma profissional


afirma que apenas no estágio “descobriu” que o assistente social é responsável também pela
elaboração de projetos sinalizando que ao fim do curso pôde perceber o projeto da instituição.
A assistente social 2 trata de momento anterior a entrada na universidade, o entendimento
sobre as disciplinas, formação profissional e vocação. Ao afirmar que foi um professor do
ensino médio que a apresentou o curso de Serviço Social, a entrevistada fornece elementos
para um debate atual no interior da profissão. Trata-se da discussão em torno da confusão que
muitos alunos ainda fazem ao escolher o Serviço Social, com a ideia da profissão no sentido
de “ajudar os pobres e fazer o bem”, vinculando a formação profissional muitas vezes as suas
origens religiosas. A assistente social 3 consegue identificar o projeto formação profissional
de sua instituição como também elabora uma crítica quanto a esse modelo, argumentando que
a formação de sua instituição de ensino é generalista. A profissional questiona alguns
conteúdos de ordem técnica não contemplados na sua formação.
Ainda no primeiro bloco de questões, a assistente social 5 ao comentar sobre o projeto
de formação profissional de sua instituição pontua uma crítica ao conteúdo de economia
política apresentado durante o curso. Aqui nos parece que a avaliação da profissional
busca uma atualização deste conteúdo do que a sua eliminação da grade do curso.
A influência da instituição no processo de formação individual é tema abordado pelo
conjunto de questões do segundo bloco. A assistente social 1 faz uma vinculação direta entre
a sua formação individual com o projeto da instituição a partir de uma leitura positiva deste
processo. A mesma destaca os aspectos profissionais da influência da instituição, ou seja,
diferente das demais profissionais, a assistente social 1 reconhece apenas a contribuição da
instituição no âmbito profissional, limitando assim o impacto da universidade na sua vida. Já
assistente social 2 conta sobre o impacto da disciplina de gênero na sua vida, resultando
numa transformação voltada para a fortalecimento e autonomia da mulher e que ela própria se
viu neste processo de transformação. Esta referência do impacto da experiência universitária
na formação da personalidade dos alunos, a nosso ver, esta diretamente ligada a temática da
subjetividade14. Porém este debate ainda não conta com massa critica suficiente para sair das
experiências individuais (o impacto e seus desdobramentos).

14 Iremos aprofundar um pouco mais essa avaliação em considerações finais.


58

A importância do conteúdo das disciplinas, a prática interventiva e a relação com o


usuário é o tema do bloco três. A partir das transcrições acima, observamos que este bloco de
questões, como no anterior, apresentam elementos que influenciam não apenas no âmbito
profissional. Neste sentido, ao comentar sobre as disciplinas que mais lhe marcaram durante o
processo de formação, as assistentes sociais sinalizaram o impacto de alguns conteúdos ou
experiências em relação à vida pessoal. Esse foi o caso da Assistente Social 2. Entre as
disciplinas mencionadas pelas assistentes sociais, ética ganha importância por tratar do
conteúdo que apresenta, na maioria das vezes, discussões com base em exemplos e questões
concretas relativas à prática profissional. O campo de estágio também é mencionado como
um espaço de formação que possibilita a primeira relação entre o profissional e o usuário. Ao
descrever a relação entre o processo de formação e o usuário, temos a afirmação da assistente
social 4 que relata de forma direta os procedimentos a fim de garantir o “enquadramento” do
usuário pela instituição. Neste sentido, percebemos que existe um conjunto de ações e
normas visando até as reações comportamentais do usuário limitando assim o próprio
atendimento. Se por lado, este procedimento garante certa “rotina” no ambiente de trabalho,
por outro, estigmatiza o usuário reduzindo o atendimento uma análise comportamental. A
assistente social 5 caracteriza a própria formação como o resultado das experiências
individuais, consolidando assim um método em relação ao usuário, que segundo a profissional
lhe permitiu “construir uma carcaça”. Nestes dois casos, temos profissionais afirmando que a
relação com o usuário pode ser desenvolvida a partir de normas e procedimentos limitando a
prática interventiva.
No quarto e último bloco, as questões tratam da subjetividade e percepção do
profissional. De forma direta a assistente social 1 comenta que o tema da subjetividade não
tem relação com prática profissional. O termo escuta qualificada, presente no vocabulário de
alguns assistentes sociais, é relacionado de forma equivocada a subjetividade gerando
diferentes interpretações. Já uma segunda interpretação afirma que o ato da escuta não está
relacionado à subjetividade. Entre as falas, temos a descrição de alguns procedimentos como
“ganhar a confiança do usuário” e assim construir uma relação “direta”.
Por fim, avaliamos que o tema da subjetividade é complexo e gera muitas dúvidas
entre os assistentes sociais, como o fato da maioria das entrevistadas trazerem questões e
conteúdos da formação profissional que não necessariamente estão relacionadas ao tema da
subjetividade. Um exemplo, é a famosa questão entre a prática e a teoria, onde temos várias
falas que alimentam o senso comum que a teoria é uma coisa e na prática é outra. Essas
afirmações, a nosso ver, expressam uma confusão teórica por parte de alguns estudantes, a
59

grande maioria no período de estágio, que buscam encontrar soluções “milagrosas” para
questões complexas, que são oriundas da questão social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Consideramos que, o processo de construção deste trabalho acadêmico buscou discutir


a importância do tema da subjetividade no processo de formação profissional e
consequentemente a sua incorporação na prática profissional. Diante da ausência de uma
literatura específica sobre a temática da subjetividade no interior do Serviço Social, tivemos
que direcionar parte da pesquisa em torno de autores marxistas pouco estudados em nosso
curso. Neste sentido, além de uma literatura com base na teoria marxista optamos também em
relacionar alguns autores do universo da psicologia. O recurso de usar a história da arte no
processo de desenvolvimento da chamada subjetividade moderna, foi uma necessidade na
medida em que os conceitos da temática da subjetividade no universo da psicologia são
muitos e complexos. Em nossa avaliação, a ausência do tema da subjetividade no interior dos
principais debates da categoria se deve a uma estigmatização do termo, que permanece
presente em algumas correntes do pensamento marxista. Este processo contribuiu para que no
interior do serviço social o tema não fosse amplamente debatido e pesquisado o que levou a
uma supervalorização de temas relacionados a psicologia ou psicanálise.
Neste sentido, optamos por conduzir este trabalho a fim de trazer o tema da
subjetividade para o debate atual, não questionando esse processo de estigmatização da
temática da subjetividade no interior do pensamento marxista. Compreendemos que trazer o
tema da subjetividade permite uma nova leitura crítica, podendo resultar em um novo
entendimento teórico sobre o tema. Ainda no primeiro capítulo, apresentamos que o processo
de formação da individualidade do sujeito está relacionada com as condições históricas e
sociais da sociabilidade coletiva. Assim, a sociedade capitalista que estabelece a troca de
mercadorias, onde é presente a relação entre os objetos, sendo apagada a relação principal e
fundante, a relação entre os próprios homens. Esse é o ponto de partida, que estabelece a
relação da subjetividade, a partir da teoria marxista, na sociedade capitalista.
Por fim, apresentamos uma caracterização da temática a partir da psicanálise que
dialoga com alguns aspectos da prática profissional, em especial a relação entre o profissional
e o usuário. Relação essa marcada pela questão social, levando inúmeras vezes o assistente
social a questionamentos éticos devido às limitações estruturais do ambiente de trabalho. Por
60

outro lado, temos o usuário, na maioria das vezes, sem a real dimensão dos seus direitos e
limitado diante das condições materiais “desabando” durante o atendimento.
Ao descrever a influência do movimento higienista brasileiro, organização
conservadora que defendia uma ação moral no combate à pobreza ignorando as questões
sociais e econômicas envolvidas naquele contexto histórico, buscamos ilustrar como a
temática da subjetividade estava presente nos primórdios da formação da profissão. O
conteúdo conservador apresentado em discursos e posteriormente na grade curricular das duas
primeiras escolas de serviço social representa não apenas uma opção conceitual, mas, uma
defesa de um modelo de sociedade. Ao estabelecer esses conteúdos defendidos e divulgados
pelo movimento higienista na grade curricular do curso de serviço social, fomentam aspectos
subjetivos que serão desenvolvidos no decorrer desse processo de formação. Fazendo um
contraponto a influência conservadora do movimento de higiene mental com uma perspectiva
mais progressista, relatamos as experiências atuais da participação de assistentes sociais
relacionadas à saúde mental. Com uma atuação mais ativa nestes processos, o serviço social
sai da condição de coadjuvante assumindo o protagonismo destas intervenções de caráter
progressista. Nosso objetivo é demonstrar exemplos de atividades que o assistente social pode
ter uma intervenção qualificada na abordagem junto ao usuário. Fortalecer o debate plural no
interior do Serviço Social sobre as experiências na saúde mental contribui significativamente
para a temática da subjetividade. No entanto, durante toda pesquisa sobre as experiências do
Serviço Social na saúde mental, ficou evidente que persistem aspectos conservadores na
atuação de parte dos assistentes sociais. A forma voluntarista e “românticas” de alguns
assistentes sociais acabam por transformar o profissional do Serviço Social em um oficineiro,
ou seja, não existe uma referência metodológica como também uma avaliação crítica sobre as
atividades desenvolvidas.
Avaliamos que foi importante trazer as experiências do Serviço Social na saúde mental
assim como a análise de PACHECO (2002) sobre o sentido das atividades destes
profissionais, já que em nosso entendimento são atividades que trazem elementos
relacionados ao tema da subjetividade.
As entrevistas, em nossa avaliação, não conseguiram alcançar uma abordagem sobre a
subjetividade adquirisse certa materialidade através dos dados objetivos e das formulações
desenvolvidas pelas entrevistadas. Neste sentido, as questões elaboradas não permitiram uma
maior reflexão sobre os aspectos relacionados a prática profissional e a temática da
subjetividade, tal processo nos parece ser o resultado da complexidade do tema. Mesmo
diante deste quadro, pontuamos questões relevantes para a nossa discussão, como o fato de
61

todas as entrevistadas terem estudado e se formado em instituições públicas de ensino, o que a


nosso ver, permite ao aluno ter acesso a alguns temas e experiências organizativas. A relação
entre supervisão e aluno também nos chama atenção pelo caráter pedagógico que a supervisão
tem junto ao aluno, chegando algumas vezes a influenciar até na escolha profissional deste.

Percebemos que o tema da subjetividade ainda é debatido de forma superficial na


medida em que não existem referências metodológicas ou teóricas que possam orientar na
formulação do tema, aqui estamos nos referindo principalmente aos autores que tratam do
tema. Por outro lado, as poucas referências que temos em relação ao tema são de ordem
negativa, relacionando a subjetividade a corrente de pensamento conservadora gerando, assim
uma forte estigmatização do tema. Essa estigmatização ficou evidenciada em algumas falas
das nossas entrevistadas. Ponderamos mais uma vez que não pretendemos resgatar elementos
conservadores presentes no início da profissão. Queremos apenas retirar o estigma colocado
na subjetividade para que o debate em torno do tema possa ser pleno. E assim garantir que o
debate em torno da questão social possa refletir em torno dos impactos individuais,
materializado na figura do usuário que além de muitas vezes não conhece os seus direitos e
tão pouco consegue garantir a sua sobrevivência material. Acessar esse usuário numa
perspectiva que fortaleça sua autonomia, em um momento que o próprio Estado deixa de
atuar nas questões básicas como educação e saúde, é um grande desafio. Neste sentido,
acreditamos que o estudo da subjetividade possa contribuir para uma melhor intervenção do
assistente social, fortalecendo assim uma leitura atualizada da questão social.
62

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VASCONCELOS, Eduardo Mourão (Org.). Saúde Mental e Serviço Social: O desafio da


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ANEXOS
65

Anexo - Roteiro de Questões

A INVISIBILIDADE DA SUBJETIVIDADE NO SERVIÇO


SOCIAL

Nome: _______________________________________________________

Período de formação: _______ Universidade: ___________

Idade: ________ Sexo _______

Estágio 1 : _______________ Estágio 2 :____________

Atividade Profissional : ___________________

1- Você poderia falar sobre a natureza da formação profissional que você teve na
Universidade em que se formou?

2- Quais são os aspectos que você considera que foram mais enfatizados em seu processo de
formação profissional?

3- Quais são os aspectos que em seu processo de formação profissional foram mais
significativos para você e influenciaram o profissional que você é hoje?

4- Durante a sua formação profissional a instituição deixou claro o perfil de profissional que
objetivava formar?

SIM ( ) NÃO ( )

5- Caso SIM, qual era?

6- Caso NÃO, qual você acha que era esse perfil, pela grade curricular a partir da qual você
estudou?

7- Quais disciplinas você destacaria em seu processo de formação profissional?

8- Porquê você as destaca?

9- Como você relaciona a sua formação profissional com as questões de natureza interventiva
com as quais tem que lidar na sua relação com o usuário?
66

10- A partir dessa relação com o usuário e as demandas que esse traz, como você avalia a
formação profissional que teve?

11- No cotidiano da relação com os usuários que espaço tem a subjetividade no seu processo
de intervenção profissional?

12- Em seu processo de formação profissional você teve disciplinas que abordassem a
discussão sobre a subjetividade como dimensão explicativa no processo de entendimento dos
problemas sociais?

13- Caso SIM, quais foram? Poderia falar um pouco sobre as mesmas?

14- Você lembra de haver lido autores que tratavam sobre o tema da subjetividade?

SIM ( ) NÃO ( )

Caso SIM, quais?

15- Caso NÃO, você considera que isso teve alguma consequência significativa para sua
prática profissional?

 
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