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Raios X Difração PDF
Raios X Difração PDF
Apontamentos
RAIOS X:
DIFRAÇÃO E ESPECTROSCOPIA
Aluno:
- -- - -- - - - - -- -----------
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
Conselho Editorial
João Carlos Massarolo
José Mindlin
José Roberto Gonçalves da Silva
Lucy Tomoko Akashi
Maria Luísa Guillaumon Emmel
Marly de Almeida Gomes Vianna
Maurizio Ferrante
Modesto Carvalhosa
Paulo Sérgio Machado Botelho
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva
Oswaldo Mário Serra Truzzi (Presidente)
São Carlos
f dUf SCar
2005
-
© 2005 José de Anchieta Rodrigues
Preparação e Revisão
Meiry Ane Agnese
Ingrid Pereira de Souza Favoretto
Produção Gráfica
Luís Gustavo Sousa Sguissardi
Júlio Cezar Bastoni da Silva
Marco Antônio Militão de Lima Prieto
Impressão e Acabamento
Departamento de Produção Gráfica da Universidade Federal de São Carlos
ISBN 85-7600-061-X
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por
qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônicos ou mecânicos, incluindo fotocópia e gravação)
ou arquivada em qualquer sistema de dados sem permissão escrita da editora.
SUMÁRIO
2 .1Espalhamento ......................................................................................................................................... 6
Os chamados raios X são ondas eletromagnéticas cuja faixa de freqüência varia entre 3 x 10 16 Hz
e 3 x 1023 Hz. Em termos de comprimento de onda, a faixa vai de 10· 15 m (10· 6 nm ou 10-5 Â) a
10-s m (10 nm ou 100 Â). Em difração de raios X, a faixa de comprimento de onda mais freqüente-
mente utilizada vai de 0,5 A a 2,5 A. A Figura 1 mostra as faixas mais popularmente conhecidas do
espectro completo da radiação eletromagnética e a faixa específica dos raios X. Estes descobertos
pelo cientista alemão Rõntgen, em 1895.
São inúmeras as aplicações dessa radiação no estudo dos materiais, porém duas delas têm
importância geral: a difração de raios X, com a qual podemos identíficar fases nos materiais, e a
espectroscopia de raios X, com a qual é possível fazer uma análise química elementar. Este Apon-
tamento apresenta uma breve introdução a essas duas áreas de caracterização de materiais.
Infravermelho Ultravioleta
Mm km m cm mm µm nm pm fm am
106 10 3 10º 10- 3 10-6 10-9 10-12 10-15 10-18
[~~:qüêoc;a
E~omprimento {Hz;o•
de Onda (m)
1
º"
1
º"
1020 1025
Rontgen: Wilhelm Conrad Róntgen, 1845-1923, nascido na Prússia, onde atualmente se situa a
Alemanha, descobriu os raios X em 1895, em Würzburg, e, por isso, recebeu o primeiro prêmio
Nobel de Física, em 1901. A descoberta dos raios X revolucionou o estudo experimental dos ma-
teriais e o diagnóstico médico (Enciclopaedia Britannica).
Nota: em português, às vezes, pode-se encontrar Róntgen grafado como Roentgen. A literatura
técnica alemã geralmente usa o termo "raios Rontgen", em vez de raios X.
2 GERAÇÃO DE RAIOS X
Antes de começarmos a estudar como os raios X são tão úteis na área de materiais, vamo::
primeiramente conhecer como esses raios são gerados.
6 EdUFSCar- Apontamentos
Existem pequenos dispositivos, chamados "tubos de raios X", relativamente baratos, acessí-
veis a qualquer laboratório de materiais. São práticos e versáteis.
Existem também grandes máquinas geradoras de raios alocadas em grandes laboratórios,
demandando custos que somente um país como um todo pode arcar. Veremos, ao longo deste Apon-
tamento, um exemplo nacional de um desses fantásticos equipamentos que está a nossa disposição.
São as "fábricas" de luz síncrotron.
Dois fenômenos físicos, de naturezas distintas, são responsáveis pela emissão de onda ele-
tromagnética. Ambos envolvem cargas e, por isso, precisamos pensar especificamente em termos
de elétrons.
2.1 ESPALHAMENTO
p (parãmetro de impacto)
aceleraçã'
hv
(fóton emitido)
Embora todos os elétrons incidam sobre esse alvo com a mesma velocidade, haverá um enor-
me número de valores diferentes para o parâmetro de impacto, pois cada elétron passará aleatoria-
mente, com uma certa distância de um dado núcleo.
Alguns elétrons terão certa chance de incidirem frontalmente contra um certo núcleo. Seu
parâmetro de impacto será zero. Esses elétrons perderão toda sua energia cinética, a qual será con-
vertida em energia fotônica. Se a energia cinética do elétron for Ec, então o fóton emitido por essa
desaceleração radical será o mais energético possível. A sua energia será a máxima energia fotônica
possível de ser emitida, Emax' estando, portanto, associada à máxima freqüência emitida, vmax' e ao
mínimo comprimento de onda emitido, Àmm
.. A equação a seguir relaciona essas grandezas entre
SI.
e
E max = h· -Ã. = h·v max = E,
e
(1)
mm
em que e denota a velocidade da luz e~ 3 X 10 8 m/s) eh, a constante de Planck (6,626 X 10-34 J.s).
A Figura 3 mostra os espectros brancos emitidos por um alvo de molibdênio para feixes de
elétrons com diferentes energias cinéticas, desde 5 keV até 25 keV (1keV =1 ,602 x 10-19 J).
-e
~
Q)
~3f--~~+--+~+---,...,-....-+----\-~--t-~~--j-~~--j
"O
·u;
e
2e
estende, sem limites, a comprimentos de onda longos, já que os elétrons podem passar muito longe
dos núcleos e, portanto, podem sofrer pouco desvio de sua trajetória original e, conseqüentemente,
emitir fótons de baixa energia.
Como existe um parâmetro de impacto mais provável de ocorrer (existe uma distância média
típica entre os núcleos), haverá um número maior de fótons emitidos com um determinado com-
primento de onda. O comprimento de onda mais provável é aquele correspondente ao máximo dos
espectros brancos mostrados na Figura 3.
Já estamos familiarizados com a estrutura eletrônica dos átomos e sabemos que os elétrons
ocupam orbitais com energia discreta. Quando existem orbitais vazios ou semipreenchidos, sabe-
mos, também, que podem ocorrer transições do elétron entre níveis de energia. Essas transições,
quando permitidas, provocam absorção ou emissão de fótons. Se um elétron é promovido para um
nível de energia maior, ele o faz às custas da absorção de um fóton. Se, no entanto, ele "desce" para
níveis de energia mais baixos, ele emite um fóton.
A Figura 4 mostra um átomo com as camadas eletrônicas K, L, M e N. A figura é apenas es-
quemática e não mostra os subníveis de energia de cada camada. Vemos, ainda, a promoção de um
elétron da camada L para a camada M, por causa da absorção de um fóton, o qual precisa ter ener-
gia, no mínimo, igual à variação de energia que o elétron precisará para a transição de L para M.
Na Figura 4, pode ser vista, também, uma transição eletrônica da camada N para L que um
elétron faz emitindo um fóton. A energia desse fóton será exatamente igual à variação de energia
que o elétron sofre na transição.
hv'
l -
(Emissão
de um fóton)
+Z
K e
M
(Absorção / L N
de um fóton)
Figura 4 Esquema de transição entre camadas eletrônicas de um átomo. Absorção e emissão de fótons.
Reforcemos mais uma vez o conceito de que as duas transições ilustradas na Figura 4 só
podem ocorrer se: primeiramente, for uma transição permitida, que dependerá dos orbitais inicial
Raios X: difração e espectroscopia 9
e final (conceitos da fisica atômica); e, em segundo lugar, tiver "vaga" no orbital de chegada, obe-
decendo, assim, ao Princípio de Exclusão de Pauli.
Para provocarmos, propositadamente, a emissão de radiação pelos átomos de um dado ma-
terial, podemos usar o artificio de "arrancar" elétrons dos átomos, bombardeando-os com elétrons
externos acelerados contra eles. Com isso, forçaremos a "abertura de vagas" nas diversas cama-
das eletrônicas. As transições deconentes disso gerarão radiação emitida, que poderá ser X, se a
transição envolver os valores de energia típicos dessa radiação. A Figura 5 mostra um esquema da
emissão de radiação provocada pelo anancamento de elétrons da camada K de um certo átomo, por
meio do bombardeamento por elétrons externos ao átomo.
(Elétron acelerado) N co
(Elétron expulso
do átomo)
Figura 5 Emissão de fótons pelo arrancamento de um elétron da camada K de um átomo. O elétron foi arrancado por
bombardeamento com elétrons externos ao átomo.
do tempo, e cada transição que ocorrer fornecerá um fóton de determinado comprimento de onda.
Essas transições são específicas de cada elemento químico e, por isso, o espectro emitido identifica
esse elemento. Daí o nome espectro característico.
Assim, um dado alvo, sob bombardeamento de elétrons, toma-se fonte de radiação. Porém,
apenas comprimentos de onda discretos serão gerados por esse processo de transição eletrônica.
Haverá muitos valores de comprimento de onda emitidos, porém discretos. Cada comprimento de
onda emitido terá uma certa intensidade, porque cada transição tem uma probabilidade específica
de ocorrer, regida pelas leis da física atômica. A Figura 6 mostra um esquema de transições eletrô-
nicas possíveis.
Na Figura 6 aparece a nomenclatura usada na espectroscopia para designar cada linha de
emissão. A notação, basicamente, é representada por uma letra latina maiúscula, que indica a ca-
mada para a qual o elétron transiciona, e uma letra grega minúscula, que indica o orbital do qual o
elétron saiu. Ainda pode aparecer algarismo arábico para ajudar nessa distinção. Tomemos como
exemplo a linha de emissão Kª 1, que é gerada pela transição do orbital LIII para K; K1B denota a
linha resultante da transição de MII para K; Lf.l 4 representa MTI para LI; e assim por diante.
n. notação notação
n l j
e. óptica R-X
Desligado do átomo
l i 11
5 2 5/2 6 52 05/2 QV
5 2 312 4 52 03/2 QIV ~
3 2 5/2 6 32 05/2 MV
,__
3 2 3/2 4 32 03/2 MIV
3 1 3/2 4 32 P3/2 Mlll
.____.
32 P1/2
1/
~~J
3 1 1/2 2 M!I
1 1
3 o 1/2 2
(18M)
32 s112 MI
Liabs. Lllab. Lp1 1 Llliabs. La1 1
Lz
L~4 ~
2 1 3/2 4 22 P3/2 1,111 ,__
l
1
1
1 1
1
1
1
1
'
1
1 ! 1
2 1 1/2 2 2 2 P1/2 l,11
o 1/2 22 s112
.___
K~1 1
2 2 l,I
(86)
Kabs. Kp1
1 l Kr l Kr
1 o 1/2 2 12 s112 K
Núcleo
o////////////////////////////////////~/////////////////
cado, pois a linha chamada Kª é uma linha média, ponderada entre as linhas verdadeiras Kª 1 e Kª 2 •
Essas duas linhas são tão próximas, em termos de comprimento de onda, que, para detem1inados
propósitos, o uso de Kª não causa maiores problemas. O mesmo vale para Krr
<0,001Â
À (À)
Façamos uma discussão envolvendo as Figuras 6 e 7 para aprendermos algumas coisas inte-
ressantes sobre o comportamento espectroscópico dos materiais. No esquema de energia da Figura 6,
podemos observar que o fóton emitido da linha K 13 é mais energético do que o fóton da Kª. É por
isso que a linha KP aparece com menor comprimento de onda à esquerda da linha Kª na Figura 7.
No entanto, a linha Kª é bem mais intensa do que a KP' conforme mostra a Figura 7. Isso significa,
p01ianto, que a probabilidade de oconer as transições LIII, para K, e LII, para K, é muito maior do
que para as transições MII, para K, e MIII, para K. Isso compensa a menor energia de cada fóton
K . Em outras palavras, por unidade de tempo, são emitidos muito mais fótons de baixa energia K
a -
do que fótons de alta energia Krr
12 EdUFSCar -Apontamentos
Vamos definir o comprimento de onda de um fóton que tenha a energia mínima e necessária
para arrancar um elétron de uma determinada camada de um dado elemento químico como aresta
de absorção. Usaremos como símbolo da aresta de absorção a letra que representa a camada eletrô-
mca com o subscrito "abs". Por exemplo: para a aresta de absorção da camada K, será Kabs; para
a camada LIII, será Llllabs· É possível ver o significado fisico da aresta de absorção na Figura 6.
Quando muitos elétrons de uma determinada camada são arrancados, são geradas todas as linhas
espectrais possíveis, decorrentes de outros elétrons que decaem para essa camada. Por isso, vamos
usar a expressão aresta de absorção da série K ou da série LIII, e assim por diante.
A Tabela 1 mostra os valores de comprimento de onda das linhas Kª 1, Kª 2, Kª e Lª 1 de al-
1
guns materiais importantes para alvo. Essa tabela também mostra as arestas de absorção das séries 1
KeL.
Agora que conhecemos os dois tipos de espectros emitidos por um alvo que está sendo
bombardeado por um feixe de elétrons, podemos, então, visualizar o espectro total de emissão. A
Figura 8 mostra o espectro de emissão total, que é a superposição do espectro branco ao espectro
característico. Nesse espectro, o mínimo comprimento de onda emitido, Àllllll"
.. é função da energia
cinética dos elétrons incidentes. As posições das várias linhas características dependem do elemen-
to químico que constitui o alvo.
i
1
1
a "S X: -;,.ação e espectroscopia 13
+ -
K~
K~
Ãmin . Ãmin.
Espectro branco Espectro característico Espectro total
(a) (b) (e)
Figura 8 Espectro de emissão total (e), que é a superposição do espectro branco (a) ao espectro característico (b).
Um dos dispositivos mais simples e baratos para produzir raios X em laboratório é o chama-
do tubo de raios X, "tubo emissor de raios X". Ele lembra uma lâmpada incandescente. A invenção
que estabeleceu os modernos tubos de raios X foi patenteada, em 1916, por Coolidge.
O tubo de raios X é formado por quatro partes principais, a saber: filamento, alvo, câmara de
refrigeração e janela de saída da radiação. A Figura 9 mostra um esquema de tal dispositivo. Tem a
forma de um cilindro de aproximadamente 5 cm de diâmetro por 30 cm de comprimento.
14 EdUFSCar -Apontamentos
Raios-X
Filamento de W
Vácuo
Refrigeração
T Fonte de
corrente
i__
Alvo metálico
(Cu, Mo, W, Cr etc. ) Fonte de
tensão
Todo o espaço interno do tubo fica sob alto-vácuo. O filamento, normalmente feito de fio de
W, recebe uma corrente elétrica de alguns poucos amperes. O filamento se aquece por efeito Joule e
atinge altas temperaturas, promovendo, assim, a emissão termiônica de elétrons. Entre o filamento
e o alvo é aplicada uma grande diferença de potencial, da ordem de algumas dezenas de kV, que
força os elétrons emitidos do filamento a se acelerarem contra o alvo. A corrente elétrica típica
entre o filamento e o alvo é da ordem de algumas dezenas de mA. Desse modo, o alvo é bombar-
deado por um feixe de elétrons que "voam" através do vácuo e cuja energia cinética será função da
diferença de potencial aplicada.
O alvo tem a forma de uma pequena placa retangular feita de metal monoelementar, que fica
instalada numa extremidade do tubo, em contato com uma câmara refrigerada por água pressuriza-
da. Este forte resfriamento é necessário para que o alvo não funda com a grande energia dissipada,
em seu interior, pelo bombardeamento dos elétrons. Isso quer dizer que, além dos fenômenos de
espalhamento e arrancamento de elétrons dos átomos, grande parte da energia cinética dos elétrons
incidentes é perdida na fonna de calor. Só por curiosidade, é bom saber que existe uma máquina
para fusão de materiais de alto ponto de fusão com base na ação de um feixe de elétrons acelerados.
É o chamado electron beam.
Uma ou várias janelas permitem a saída da radiação para fora do tubo. Ela é normalmente
feita de Be, que é transparente aos raios X.
O material que constitui o alvo dá o nome ao tubo. Assim, por exemplo, falamos do tubo de
Cu, do tubo de Cr, e assim por diante.
Para uma dada voltagem aplicada entre o filamento e o alvo, a energia cinética com a qual o
elétron se choca com o alvo é expressa por:
Ra ios X: difração e espectroscopia 15
Ec = e· V (2)
em que e é a carga do elétron (1,6 x 10- 19 C) e V é o valor da diferença de potência aplicada. Note-
mos que, na Equação 2, não entra a distância percorrida pelo elétron entre o filamento e o alvo. É
um bom exercício demonstrar essa relação partindo-se da força exercida pelo campo elétrico sobre
o elétron e chegando na energia cinética final. A distância entre o filamento e o alvo será cancela-
da.
Se combinarmos, agora, as Equações 1 e 2, obteremos uma relação entre a diferença de po-
tencial aplicada ao tubo de raios X e a energia do fóton mais energético emitido pelo alvo, segundo
o modelo do choque frontal que usamos na seção 2.2. Essa relação é expressa por:
e
E ma.x = h·v max = h· -
A, =
. E e = e·V
llllll
Podemos, então, obter o valor do mínimo comprimento de onda emitido pelo tubo, que -erá
escrito como:
À.
mrn
= (~)-(2-)=
e V 1240 ' 8·(2-V ) ..!
ou seja, 1 eV.
16 EdUFSCar -Apontamentos
Coolidge: William David Coolidge, 1873-1975, americano, engenheiro e físico -químico, desen-
volveu a ductilidade de filamentos de tungstênio para lâmpadas incandescentes e tubos de raios X.
Em 1916, patenteou o tubo de raios X a vácuo, que se tornou o protótipo dos tubos modernos.
Trabalhou na General Electric (GE).
2. 7 MONOCROMATIZAÇÃO DE RAIOS X
São inúmeras as técnicas laboratoriais que empregam os raios X corno fonte de radiação.
Essas técnicas exigem diferentes características dos feixes de raios X. Algumas precisam trabalhar
com o espectro total emitido pelo tubo, e outras exigem um único comprimento de onda, isto é, um
feixe de raios X monocromático.
A monocromatização de um feixe de raios X pode ser feita de duas maneiras: por.filtragem
do feixe ou pelo próprio fenômeno da difração. No momento, temos plenas condições de entender
como funciona a filtragem, e vamos tratá-la com certo grau de detalhe.
Quando um feixe de raios X de comprimento de onda 'A incide sobre um pedaço de determi-
nado material, ocorrem diversos fenômenos. Entre eles: a) transmissão de uma parte do feixe inci-
dente, com o mesmo comprimento de onda e na mesma direção; b) emissão de elétrons, que saem
em qualquer direção; c) geração de calor; d) raios X de mesmo comprimento de onda espalhados
em diferentes direções, que não a de incidência; e e) raios X de comprimento de onda diferente do
incidente emitidos para todas as direções. Este último fenômeno é denominado emissão de raios X
por fluorescência. Em outras palavras, a fluorescência de raios X é a emissão dessa radiação, com
um determinado comprimento de onda, excitada por raios X de comprimento de onda diferente.
Os raios X fluorescentes têm comprimento de onda sempre maior do que os raios X excitadores,
ou seja, os fluorescentes têm fótons sempre menos energéticos do que os excitadores. A Figura 10
mostra um esquema desses fenômenos de interação entre raios X e matéria.
Se o feixe de raios X incidente tiver comprimento de onda 'A e intensidade 10 , do outro lado
do pedaço de material, na mesma direção de incidência e com o mesmo comprimento de onda,
sairá um feixe de intensidade 1, que é menor do que 10 • Isso ocorre porque parte do fluxo de energia
incidente (J/(m2 ·s)) foi convertida em outras formas, tais como fótons de outros comprimentos de
onda, calor, energia cinética de elétrons arrancados e outros.
Raios X: difração e espectroscopia 17
Elétrons por
recuo Compton
Elétrons
Fotoelétrons
Calor
Feixe incidente 10
Feixe transmitido
Raios X
fluo rescentes
Material absorvente
Coerente
Raios X
espalhados
1 Incoerente
(Compton)
Figura 10 Exemplos de fenômenos de interação entre radiação e matéria responsáveis pela absorção do feixe de
raios X incidente.
Para estabelecermos uma relação mais geral e prática sobre esses fenômenos, vamos consi-
derar o arranjo mostrado na Figura 11.
o X µ
''
''
''
''
''
''
t___j d
x=- -
Sen ô
Figura 11 Absorção de raios X que atravessam uma espessura efetiva, x, de um dado material.
Uma placa de espessura d, de um material cujo coeficiente de absorção linear vale µ,é atra-
vessada por um feixe de raios X, de comprimento de onda À. O caminho efetivamente percorrido
pelo raio, dentro do material, é x = d/(Sen(ô)). Nessas condições, vamos denominar feixe transmi-
tido os raios X que conseguem atravessar o material, sem qualquer interação com ele, mantendo o
comprimento de onda incidente. Esse feixe terá intensidade I < 10 • A relação entre I e 10 é expressa
por:
\
18 EdUFSCar -Apontamentos
(6)
Para praticarmos um pouco, vamos comparar a absorção causada por pedaços de berílio,
de níquel e de chumbo, todos na forma de placa, com um percurso efetivo de x = 1O µm através
dessas placas, para a radiação K" dos tubos de Mo, Cu e Cr. A Tabela 3 mostra os valores de I/I 0 ,
empregando a Equação 6.
Raios X: difração e espectroscopia 9
Tabela 3 Valor da intensidade relativa de raios X transmitidos, I/I0 , pela absorção por diferentes mate1iais, para dife-
rentes comprimentos de onda. Valor de x = 10-5 m (10 ~tm).
A partir da Tabela 3, podemos entender por que o Be é usado como janela em tubos de raios
X e por que o Pb é usado como material de proteção radiológica em laboratórios de raios X.
Filtro de raios X é todo material que absorve raios X, em parte ou totalmente. Podemos em-
pregar um filtro para a monocromatização de um feixe de raios X, tomando-se selecionado sobre
um comprimento de onda específico.
A física da filtragem como promotora da monocromatização fundamenta-se no comporta-
mento do coeficiente de absorção linear em função do comprimento de onda dos raios X do feixe
incidente. A Figura 12 mostra um gráfico de µ/p versus À, para o Ni, muito usado para filtragem do
feixe emitido por tubos de Cu. O eixo de À vai apenas até 2,0 Â; portanto, é um gráfico parcial dessa
grandeza, porém suficiente para compreendermos como funciona a seleção de um comprimento de
onda pelo método da filtragem.
~ (c~2)
Aresta de absorção
da série K (Kabs)
400
/
300
I
200 /
100 /
V
,.,/
/ /
o :
0,5 1,0 1,5 2,0 À (À)
comprimento de onda -
- energia
Figura 12 Gráfico do coeficiente de absorção mássico, p/p, versus )e, para o Ni.
20 EdUFSCar -Apontamentos
Notemos que, quando À é zero, ou seja, fótons de altíssima freqüência, já além dos raios X,
a absorção é praticamente zero, pois esses fótons atravessam o material sem interagir com ele. À
medida que o comprimento de onda vai aumentando, a probabilidade de interação vai aumentando,
e o µ/p também aumenta de valor. Para À em tomo de 1,4 A, o coeficiente de absorção aumentou
2
para quase 400 cm /g. No entanto, com um pequeno aumento de À, digamos para 1,5, o coeficiente
de absorção cai abruptamente para cerca de 50. Se continuarmos a aumentar À, o gráfico nos mostra
que a absorção volta a crescer.
O ponto importante, em relação à Figura 12, está na descontinuidade próxima a À de 1,5
(1,4880, mais precisamente). Esse comprimento de onda específico corresponde à aresta de absor-
ção da série K. Esse comprimento de onda pertence aos fótons de raios X que arrancam elétrons
da camada K dos átomos de Ni, como vimos no esquema da Figura 6. É por isso que, para valores
de À um pouco maiores do que Kabs' cujos fótons não têm energia suficiente para arrancar elétrons
K, o coeficiente de absorção é baixo (eles atravessam o Ni) e, para À um pouco menor do que Kabs'
cujos fótons têm energia suficiente para arrancar elétrons K, o coeficiente de absorção é fortemente
incrementado.
A estrutura do átomo é construída de tal maneira que, para elementos químicos não muito
pesados, a aresta de absorção da série K de um dado elemento químico cai entre as linhas de emis-
são Kª e Kf:l do elemento químico de número atômico uma tmidade superior. Por exemplo, para um
tubo de raios X de Cu (número atômico 29), que emite À'K a = 0,154 nm e ÀK jl = 0,139 nm, a aresta
de absorção da série K do Ni (número atômico 28) vale O, 148 nm.
A Figura 13 mostra o efeito de um filtro de Ni colocado na frente da janela de um tubo de
raios X de Cu, sobre o espectro emitido pelo tubo. A linha K 13 , além de todo o espectro à esquerda
de Kabs' fica fortemente reduzida por causa da absorção pelo Ni. A linha Kª é levemente reduzida
(dependerá, obviamente, da espessura do filtro). Valores de À muito maiores do que Kª também
serão fortemente reduzidos, porque µ/p aumenta com o aumento de À.
Desse modo, aquele feixe de raios X emitido pelo tubo de Cu, que era a soma do espectro
branco com todas as linhas de emissão características do Cu, se tomará um feixe monocromático
após sua passagem através do filtro de Ni. Esse feixe estará monocromatizado com o comprimento
de onda da linha K a do Cu.
Raios X: difração e espectroscopia 2
Ku Ku
1, µ
. . . .i Ku
/( i
/ µ(/..) i
K~
K~ i
'
'''
'
1,2 1,4 1,6 1,8 À (À) 1,2 1,4 1,6 1,8 À (À) 1,2 1,4 1,6 1,8 À (À)
Figura 13 Efeito de um filtro de Ni colocado na frente da janela de um tubo de raios X de Cu sobre o espectro emi-
tido pelo alvo de Cu. Comparar os gráficos da parte de baixo da figura com o esquema do arranjo experimental na
parte superior da figura.
i
Figura 14 Fotografia aérea do campus do LNLS, em Campinas. Foto autorizada pelo Setor de Divulgação do LNLS,
março/2005.
(a) (b)
Figura 15 (a) Esquema do anel de emissão da luz síncrotron: XRD l , SAXSl, XPD, XRD2, XRF, XRL, DXAS,
XAFSl, MXl, DFE, DFX e SAXS2 são linhas já existentes que operam na faixa dos raios X; SGM, VUVF, TGM e
SXS são linhas já existentes que operam na faixa do ultravioleta; XAFS2 e MX2 são linhas em construção. (b) Foto
de uma vista lateral-superior elo anel, no interior do laboratório. Ambas as fotos foram autorizadas pelo Setor ele Di-
vulgação elo LNLS, março/2005.
A máquina do LNLS produz radiação de altíssima intensidade, que abrange a faixa que vai
do infravermelho até os raios X, incluindo, portanto, o espectro visível.
\
Raios X: difração e espectroscopia 23
Basicamente, quatro pai1es são importantes na fonte de luz síncrotron: na Figura 15a pode-
mos ver o acelerador circular de elétrons, ou anel de armazenamento de elétrons (storage ring),
a linha de transp011e (booster), o acelerador linear de elétrons (LINAC) e as diversas linhas de luz
(XRDI, SAXS2 etc.). O acelerador linear injeta elétrons no acelerador circular que os armazena
por algum tempo. Nas linhas de luz, instalam-se os diversos laboratórios que ocupam a radiação
para seus experimentos. Na data em que o Ll\"LS cedeu o esquema do anel para estes apontamen-
tos, março/2005, havia 12 linhas de raios X em plena operação, 4 linhas no ultravioleta, também
em plena operação, e mais 2 linhas em fase de construção.
A palavra síncrotron é derivada da expressão em inglês SYNCHROnous elecTRON accel-
erator, synchrotron. O acelerador circular é formado, basicamente, por um tubo metálico, com
alto-vácuo em seu interior, ao longo do qual existem diversos conjuntos de eletroímãs que mantêm
os elétrons numa trajetória aproximadamente circular. Como o elétron é uma carga elétrica, ao
executar uma trajetória curva, isto é, ao ser acelerado radialmente, ele emite radiação tangencial-
mente a essa curva. O comprimento de onda emitido dependerá, entre vários outros parâmetros, da
velocidade dos elétrons e do raio de curvatura da trajetória. A Figura 16 mostra esquematicamente
a emissão de radiação por elétrons numa trajetória curvilínea.
Trajetória circular
Radiação
\
24 EdUFSCar -Apontamentos
Tabela 4 Principais parâmetros do anel de armazenamento de elétrons da fonte de luz síncrotron do LNLS, em Cam-
pinas (SP).
Átomos
do material
Figura 17 Ilustração de como um conjunto de átomos absorve e retransmite, esfericamente, ondas de uma frente
plana. raios paralelos, que incidem sobre esse conjunto.
º"'
~.e,<J-"' i-. ·oº/.
• • • • • • • • "'~ /
' ~'I>'·o"'~<;''/
: : : : : : : : : ~'ô'/
.......... /~
... . .... . 28 " /
•
. . . . . ...
• • • • • •,,A
/.
••
· '..(: : : : : • -....__-.:-Fe-:ix_e_d_e-~
raios X
difratado
Material cristalino
(átomos distribuídos
periodicamente)
Figura 18 Arranjo de átomos, absorvedores e retransmissores de raios X, periódicos (cristal), provocando a difração
de um feixe incidente, espalhado com o ângulo 28.
Po11anto, a Figura 18 nos mostra que, do feixe incidente, numa dada direção em relaça -
a9 pedaço de cristal, raios X de mesmo comprimento de onda incidente sairão do cristal, sem:
que uma parte será transmitida na mesma direção e outra parte será difratada, fazendo um ângi.;...
28 com o feixe transmitido. O feixe difratado também pode ser chamado de feixe espalhadc. _
ângulo e é chamado ângulo de Bragg, sobre o qual conheceremos logo adiante. O ângu!Ü : .: =
conhecido como ângulo de espalhamento ou ângulo de difração.
Veremos, em seções posteriores, que o conhecimento do ângulo de Bragg nos traz info
ções sobre o arranjo dos átomos de um cristal.
26 EdUFSCar -Apontamentos
(hkl)
1 d,.
(a)
a
Fonte
À
~ Detector
(hkl)
(b)
Figura 19 Vista lateral de um conjunto de planos paralelos, (hkl), com a distância interplanar d11 k1• (a) Destaque a um
raio incidente; (b) geometria para compreender a interferência construtiva.
Para deduzirmos a difração com mais facilidade, vamos aceitar a afirmação de que um plano
contendo átomos periodicamente distribuídos desvia um feixe de raios X semelhantemente a um
espelho, ou seja, se o feixe incidente faz ângulo 8 com esse plano, o feixe desviado também o faz.
Em outras palavras, o feixe incidente e o feixe desviado têm uma relação especular entre si. Se
Raios X: difração e espectroscopia ~ .,
estivéssemos tratando somente com um único plano atômico, ele funcionaria como um espelho.
refletindo o feixe incidente em qualquer ângulo de incidência (Figura 19a).
No entanto, um cristal apresenta um número enorme de planos paralelos para qualquer con-
junto (hkl) imaginado. Vamos imaginar um plano qualquer (hkl), como o conjunto da Figura 19b.
Um feixe de raios X, todos paralelos, de comprimento de onda À, incidindo com ângulo 8 em
relação ao plano, lança sobre cada plano paralelo do conjunto um raio, que será "refletido" especu-
larmente por cada plano do conjunto. Tornemos como referência a linha reta OPQR, perpendicular
·l
aos planos do conjunto (hkl).
f Os pontos O, P, Q e R são aqueles nos quais os quatro raios incidentes são "refletidos" pelos
planos (hkl). Se imaginarmos um detector de raios X, fora do cristal, pronto para registrar apre-
sença de radiação emergente do cristal, a matemática da interferência entre ondas nos ensina que
somente quando uma relação geométrica específica é obedecida é que o detector conseguirá regis-
trar um feixe de raios X difratado pelo cristal. Essa relação geométrica específica chama-se Lei de
Bragg, e vamos mostrá-la agora.
A Lei de Bragg estabelece que a condição necessária, porém não suficiente, para que um
feixe de raios X, com comprimento de onda À, incidindo sobre um conjunto de planos (hkl), cuja
distância interplanar é dbkt' fazendo ângulo 8 em relação a esse plano, seja difratado, fazendo o
mesmo ângulo 8, é que a seguinte equação seja obedecida:
P para ser refletido, o terceiro raio, até o ponto Q e, finalmente, o quarto raio, até o ponto R. Isto
segue até o último raio do feixe.
A Figura l 9b mostra claramente que os raios viajam cada vez mais ao longo de uma maior
distância até o ponto de reflexão sobre a linha vertical OR. Os raios também viajam ao longo de
distâncias diferentes, desde os seus pontos de reflexão até atingirem a linha reta OF. A partir da
linha OF, todos os quatro raios viajarão a mesma distância até o detector de raios X. Desse modo,
se os quatro raios em discussão e todos os outros do feixe chegarem em fase no detector, este re-
gistrará uma certa intensidade de raios X. Para isso, então, é necessário que a diferença de caminho
percorrido por cada raio seja um múltiplo inteiro de comprimentos de onda À, pois, desse modo, a
interferência será construtiva no detector. Do contrário, a interferência será totalmente destrutiva,
e o detector registrará zero de intensidade de raios X.
As diferenças de caminho percorrido pelos raios são os seguimentos APD, BQE, CRF, e as-
sim por diante. Fazendo-os múltiplos de À, haverá interferência construtiva. Vamos nos ater apenas
aos dois primeiros raios para escrevermos a expressão matemática que representa a frase anterior:
que é a expressão da Lei de Braggjá vista na Equação 8. Esse raciocínio é válido para qualquer par
de raios que queiramos tomar.
Vamos, agora, voltar à questão da ordem de difração. O inteiro n significa que, para um dado
conjunto de planos (hkl), existe mais de um ângulo de difração possível. Conforme n aumenta, o
ângulo de Bragg também aumenta, já que 2·dhk1 tem um valor constante para um dado cristal.
Façamos um exemplo. Se um cristal tem d 100 = 0,3 nm, e fazemos incidir sobre ele um feixe de
raios X de comprimento de onda igual a 0,154 nm (Kª do Cu), então a primeira ordem de difração,
n = 1, ocorrerá para o ângulo 8 = 14,9º; a seguda ordem, n = 2, em 8 = 30,9º; a terceira
ordem, n = 3, ocorrerá em 8 = 50,4°; e assim por diante.
O significado fisico da ordem de difração é muito importante para a compreensão plena~do
fenômeno da difração de raios X. Para compreendê-la melhor, vamos reescrever a Lei de Bragg da
seguinte maneira:
À = 2 ·( d~ki } Sen(0) (1 O)
Escrita dessa maneira, a Lei de Bragg estabelece que as ordens superiores de difração de um
plano (hkl), ou seja, n > 1, é a mesma coisa que a primeira ordem de difração de um conjunto de
Raios X: difração e espectroscopia 29
planos que tenha distância interplanar igual a d,,k/ n, o que quer dizer planos (n·h n·k n·l). Vejamos
a Tabela 5 que exemplifica esse fato.
Tabela 5 Exemplo do funcionamento da ordem de difração n, para um cristal cúbico com a= 0,300 um, recebendo a
incidência de raios X com À,= 0, 154 nm sobre diferentes planos (hkl).
Os valores possíveis de n têm um limite superior, que é determinado pela limitação da função
Sen(8) de ter seu valor máximo igual a - 1. Portanto, o máximo valor de n para um dado plano (hkl)
é determinado pela relação:
Vamos tomar como exemplo o caso do plano (100), mostrado na Tabela 5. Nesse caso, x vale
3,896 e, portanto, nmax é igual a 3.
Quando a Lei de Bragg fo i apresentada anteriormente, foi dito que era uma condição necessária
mas não suficiente para a difração de um feixe de raios X incidente sobre um certo plano (hkl). Isso
quer dizer que, mesmo satisfazendo a Lei de Bragg, um plano (hkl) pode não difratar um feixe de
raios X. Para compreender isso, vamos discuti r um pouco sobre do que depende a intensidade de
um feixe difratado. A fórmula que define a intensidade, I(hkl), de um feixe difratado por um plano
(hkl) tem sua forma mais genérica expressa por:
em que N é o número de células unitárias "iluminadas" pelo feixe incidente; p(hkl) é a chamada
multiplicidade do plano (hkl) e depende da simetria do cristal; L(8) é o fator de Lorentz, que
30 EdUFSCar -Apontamentos
Estrutura com átomos somente sobre Índices de Miller das linhas ausentes Exemplos de planos que não geram
os pontos da rede: (proibidas) difração
cúbica simples nenhuma restrição nenhuma restrição
cúbica de corpo centrado h+k+l = número ímpar (100), ( 111 ), (210), (221 ), (300), ...
cúbica de face centrada h, k e 1 misturados entre pares e (100), (110), (210), (211), (221),
ímpares (300), ...
Tomemos o diamante como um exemplo de estrutura mais complexa, que possui átomos de
carbono sobre os pontos de uma rede cúbica de face centrada, além de quatro átomos ocupando
Raios X: difração e espectrosco::: .:
l = h ·V· cp(v) (1 3
Não nos enganemos; portanto, energia dos fótons e intensidade do feixe não são a mesma
coisa. Podemos ter um fluxo,~' baixo de fótons de alta energia, de tal modo que a intensidade desse
feixe seja alta, mas também podemos ter um alto fluxo de fótons de muito baixa energia, de modo
que o feixe é de baixa intensidade.
Para o caso dos difratogramas, como já vimos, que são obtidos com feixes monocromáticos,
isto é, de urna única freqüência, as diferenças de intensidade estão relacionadas apenas às dife-
renças de fluxo de fótons de cada feixe difratado. Nos espectrograrnas, que veremos mais adiante,
precisamos tomar cuidado, pois cada linha espectral registrada tem diferentes fluxo e energia dos
fótons.
Bragg: William Lawrence Bragg, 1890-1971, nascido na Austrália, era físico e cristalógrafo. Em
1912 estabeleceu a Lei de Bragg. Juntamente com seu pai, Sir William Henry Bragg (1862-1942),
ganhou o prêmio Nobel de Física de 1915, pela determinação de várias estruturas cristalinas em-
pregando raios X (Encyclopaedia Britannica).
Lorentz: Hendrik Antoon Lorentz, 1853-1938, nascido em Arnhem, na Holanda, ganhou o prê-
mio Nobel de Física de 1902, juntamente com Pieter Zeeman, pela sua teoria da radiação eletro-
magnética. Essa teoria e sua conhecida transformação de Lorentz foram a base para o estabeleci-
mento da Teoria da Relatividade Especial por Einstein (Encyclopaedia Britannica).
Vamos nos concentrar novamente na Lei de Bragg, Equação 8. Para simplificarmos nossa
discussão, consideremos n = 1.
Podemos trabalhar com a Lei de Bragg de duas maneiras:
1) Numa primeira situação, conhecemos o comprimento de onda do feixe incidente e, por
meio de um instrumento apropriado, chamado goniômetro, medimos o ângulo de Bragg, de modo .
que possamos deduzir a distância interplanar. O equipamento que reúne todos os acessórios ne-
cessários para isso chama-se difratômetro, do qual obteremos como informação primária um di-
fratograma. Desse modo, estaremos obtendo informações estruturais (distâncias interplanares) da
amostra. Com elas, poderemos, por exemplo, inferir sobre o parâmetro de rede do cristal ou iden-
tificar as fases presentes na amostra.
2) Numa segunda situação, conhecemos a distância interplanar de um conjunto de planos
(hkl) de um determinado cristal, que, no momento, está servindo como cristal analisador. Com um
goniômetro, podemos medir o ângulo de Bragg de um feixe de raios X difratado por aquele plano
(hkl), que, por sua vez, permitirá-nos inferir sobre o comprimento de onda desses raios X inciden-
tes sobre o cristal analisador, ou seja, estaremos determinando comprimentos de onda de raios X
emitidos por uma amostra e, p011anto, fazendo espectroscopia de raios X. Isso permite identificar
os elementos químicos presentes numa amostra. O equipamento completo para isso chama-se es-
pectrômetro de raios X, e a informação primária obtida é um espectro de raios X.
A Figura 20 mostra esse esquema para a compreensão das duas técnicas básicas que utili-
zam os raios X para caracterizar materiais: a difratometria (Figura 20a) e a espectroscopia (Figura
20b).
(Conhecido) (Desconhecido)
À À
8 8 Medido
(a) (b)
Difratometria Espectroscopia
A partir dessas duas idéias básicas, fisicos, químicos e engenheiros derivaram inúmeros ins-
trumentos de análise dos mais diversos aspectos da matéria e, em particular, dos materiais de en-
genharia.
5 DIFRATÔMETRO DE RAIOS X
A Figura 21 mostra, esquematicamente, um difratômetro de raios X. São quatro as suas prin-
cipais paites:
1. A fonte de raios X, F: pode ser um tubo de raios X convencional, o qual é alimentado por
uma fonte de potência adequada. Fazem parte da fonte de raios X alguns pequenos acessórios
para dirigir o feixe na direção da amostra a ser analisada.
2. O detector de raios X, D: um dispositivo eletrônico que converte a ionização de um gás
apropriado em pulsos elétricos. A ionização do gás ocorre toda vez que um fóton de raio X
penetra no recipiente com o gás. Amplificadores condicionam adequadamente esses pulsos
para serem registrados num computador, que, por sua vez, montará o difratograma.
3. Goniômetro: é simplesmente um círculo, sobre o qual estão a fonte de raios X e o detec-
tor. Esse círculo, denominado círculo goniométrico, também contém urna escala de graus,
cuja origem dos ângulos está na direção do feixe transmitido. O ângulo de difração (ou de
espalhamento), 28, é medido sobre o goniômetro entre a origem e a posição instantânea do
detector. Uma configuração possível é aquela em que a fonte de raios X é fixa e o detector
gira sobre o círculo goniométrico.
4. Mesa do porta-amostra: é um dispositivo sobre o qual o porta-amostra é preso. Essa mesa
gira com a metade da velocidade angular do detector, de modo que, em qualquer instante, o
arranjo esteja obedecendo à geometria da Lei de Bragg. Isto quer dizer que as linhas FO e
OD têm uma relação especular com a face do porta-amostra. A face do po1ta-amostra fica,
ve1ticalmente, sobre o centro do círculo do goniômetro e é posicionada perpendicularmente
à mesa.
34 EdUFSCar -Apontamentos
Círculo do
goniômetro
· --------- - -
o
Direção de
referência
(feixe incidente)
- D
2co
e várias outras partículas nas quais os planos (h 1k 1l) não estão paralelos à face do porta-amostra. O
mesmo vale para o subconjunto de partículas 2.
Corte na metade da
altura do porta-amostra
Face do
porta-amostra
centro do
Face círculo
do porta-amostra goniométrico
Porta-amostra
(a) (b)
(e)
Figura 22 (a) Típico porta-amostra na forma de paralelepípedo com um rebaixo para a colocação da amostra em pó;
(b) corte na metade da altura do porta-amostra, destacando as partículas do pó; (e) o ângulo de Bragg 8 está satisfa-
zendo a Lei de Bragg para os planos (h 1k 1! 1) paralelos à face do porta-amostra.
1600
1400
~ 1200
rn
e..
.s. 1000
(a)
Q)
"'C
CI)
800
"'C
"üi 600
e
Q)
-e 400
200
o
-200 100 120 140
20 40 60 80
29 (graus)
2500
2000
(j)
e..
.s.
Q) 1500 (b)
"'C
CI)
"'C
"üi 1000
e
2e
500
o
o 10 20 30 40 50 60 70 80
29 (graus)
211
220
(e) (d)
300
12 15 20 25 30 12 15 20 25 30
29 (grau)~ 29 (grau)
Figura 23 Diversos difratogramas: (a) Mo, (b) SrTiO_, (e) poliestireno isotáctico parcialmente cristalizado e (d) Ó
J
Como já ficou claro, cada fase cristalina possui um difratograma associado a ela, como se fos-
se a sua "impressão digital". Mesmo que duas fases distintas tenham a mesma estrutura cristalina,
as linhas de difração aparecem em posições 28 diferentes, porque cada fase terá seus parâmetros de
rede específicos. Além disso, as intensidades das linhas de difração também serão diferentes entre
os dois difratogramas, principalmente se elas forem formadas por elementos químicos diferentes.
O conjunto de linhas de difração, compreendendo as posições 28 e as intensidades relativas,
tem uma relação biunívoca com a correspondente fase. Daí, pode-se construir·um arquivo de.fichas
de dffi·ação de fases conhecidas, que, organizadas de modo apropriado, permitiria-nos identificar
as fases de um material desconhecido (para nós, mas não para o arquivo) pela simples comparação
do difratograma obtido com aqueles das fichas de difração.
Esta foi exatamente a idéia que Hanawalt teve em 1936, criando um sistema de fichas e de
busca (recuperação de informação) que permitia encontrar, rapidamente, a ficha da fase desconhe-
cida entre as milhares do arquivo.
Um comitê internacional, chamado Joint Committee for Powder Diffraction Standart
(JCPDS), coleciona difratogramas ao redor de todo o mtmdo, dentro de um critério estabelecido de
qualidade e confiabilidade. O trabalho de Hanawalt foi acolhido pela American Society for Testing
Materiais (ASTM), que publicou o primeiro arquivo em 1941 , contendo as fichas de 1.300 subs-
tâncias.
O mais importante desse arquivo e da metodologia estabelecida por Hanawalt é não ser ne-
cessário que se conheça a estrutura cristalina de uma certa fase, pois os parâmetros de busca são
apenas as distâncias interplanares e as intensidades relativas. Portanto, mesmo que não se conheça
a cristalografia de uma fase, tendo algum pesquisador, em algum laboratório, registrado um dia o
seu difratograma e o publicado em algum periódico, o JCPDS o integrará ao arquivo. Alguma outra
pessoa que medir um difratograma de algum material que contenha essa fase poderá identificá-la,
pois ele encontrará a sua ficha no arquivo do JCPDS.
Dois aspectos precisam ser melhor esclarecidos, o primeiro é que as fichas de difração con-
têm os valores das distâncias interplanares, d, dos cristais, e não as posições 28, porque as últimas
dependem do comprimento de onda utilizado no difratômetro no momento da análise. As distâncias
interplanares não dependem disso, pois são características do cristal. Por meio da Lei de Bragg,
Equação 8, podemos converter 8 em d.
O segundo aspecto refere-se às intensidades das linhas de difração. O que são características
de um cristal são as intensidades relativas das linhas, e não as intensidades absolutas. Estas últimas
dependem dos parâmetros operacionais do difratômetro no momento da análise. Por outro lado,
as intensidades relativas são determinadas pela estrutura cristalina e pelos elementos químicos
Raios X: difração e espectroscopia 39
Tabela 7 Intensidades absoluta e relati\'a das linhas do difratograma da Figura 23a, do Mo.
A Figura 24 mostra uma típica ficha de difração. Esta é a ficha do NaCl. As fichas do arquivo
do JCPDS estão divididas em vários campos. No canto esquerdo superior, aparece o número do
fixa, o qual é composto por duas partes separadas por um hífen: a primeira parte é o número da
seção e a segunda, o número da ordem que a ficha entrou na seção. Por exemplo, o NaCl tem uma
ficha com o número 5-628. Ainda acima e à esquerda, aparecem a fórmula química do cristal, seu
nome científico e, às vezes, seu nome popular.
40 EdUFSCar - Apontamentos
Na CI d(AJ I h k I
3.26000 13 1 1 1
2.82100 100 2 o o
Halite, syn / Sodium Chloride 1.99400 55 2 2 o
1.70100 2 3 1 1
1.62800 15 2 2 2
1.41000 6 4 o o
1.29400 1 3 3 1
Lattice: Face-centered cubic Mo/. weight = 58.44
1.26100 11 4 2 o
1.15150 7 4 2 2
1.08550 1 5 1 1
S.G.:Fm3m (255) Volume [CD] = 179.43 0.99690 4 4 o
2
0.95330 1 5 3 1
a= 5.64020 Dx= 2.163 0.94010 6 o o
3
0.89170 4 6 2 o
Dm = 2.168 0.86010 1 5 3 3
0.85030 3 6 2 2
0.81410 2 4 4 4
Z= 4 Vicor = 4.40
CAS: 7647-14-5
*Natl. Bur. Stand. (U .S. ), Gire. 539, vol ume O, page 41, (1953) primary
reference:
Swanson, Fuyat.
*Dana's System of Mineralogy, 7th Ed., volume O, page 4, optical data:
Vários campos à esquerda da ficha trazem informações cristalográficas sobre o cristal, quan-
do estas são conhecidas: informações sobre os parâmetros operacionais do difratômetro ou da
técnica utilizada, tal como o comprimento de onda e o filtro usados, além de referências sobre o
trabalho original, do qual as informações foram extraídas.
Do lado direito da ficha, aparece um conjunto de cinco colunas (dependendo do número de
linhas de difração da amostra, podem aparecer dois desses conjuntos de colunas), sendo elas uma
para os valores de d, outra para os valores da intensidade relativa, I/J 100 , e, ainda, outras para os
Raios X: difração e espectro ·a
valores de h, k e L São as listas de valores de d e de I/I 100 que permitirão a identificação de uma fa-e
por meio do método de Hanawalt.
Nem toda ficha traz as colunas dos valores de h, k e 1 preenchidas. Quando isso ocorre. sig-
nifica que não se conhece a cristalografia daquele cristal e, portanto, não se conhece a indexação
de seu difratograma. Mesmo assim, já vimos anteriormente que isso não impede a identificação da
fase representada pela ficha.
Por último, no canto superior direito da ficha aparece um símbolo que está associado à qua-
lidade ou confiabilidade dos dados apresentados. As mais confiáveis trazem uma estrela nessa
posição (nessa versão atual, a ficha traz uma denominação em vez de símbolos).
A partir do arquivo do JCPDS, foram sendo derivados vários manuais importantes para usuá-
rios, tal como um Engenheiro de Materiais, necessitando de informações cristalográficas sobre de-
terminada fase. Um manual importante traz uma listagem, em ordem alfabética, do nome científico
de todas as substâncias do JCPDS. Este é o Índice Alfabético. A Figura 25 mostra uma parte de uma
página típica desse Índice. Notemos as seguintes colunas: nome da substância, fórmula química,
valores de d das três principais linhas de difração e, finalmente, número da ficha no JCPDS.
Figura 25 Parte de uma página típica do Índice Alfabético de substâncias contidas no JCPDS.
Outro manual importante é aquele que traz as próprias fichas de difração, ordenadas pelo
número destas, primeiramente pelas seções, depois pela entrada na seção.
Um terceiro manual importante é o de busca, ou seja, de identificação de fases, pelo método
de Hanawalt. A Figura 26 mostra uma página típica desse manual.
42 EdUFSCar -Apontamentos
2.83, 1.986 1.4\ 1.335 2.492 2.292 2.122 1.76, Agi 22-1330
2.82, 19.88 3.247 1.694 1.632 1.41, o.oo, o.oo, AgBiS 2 21-1178
o 2.82x 1.98 0 1.617 1.246 1.395 1.055 0.934 0.883 SrRu03 28-1250
2.81, 1.980 3.24, 1.622 1.26, 1.40, 1.15, 1.69, AgosNªosCI 22-898
* 1.984 LiSr2Mo0 55 22-691
2.81x 1.625 4.593 1.402 2.392 2.292 1.262
2.81 X 1.98 X
1.629 1.826 1.404 1.253 1.063 4.582 Sr3Co2Te09 29-1461
2.81, 1.98. 1.62. 1.402 1.26, 3.97, 1.06, 0.94, (Sr(Ti05Ta 05)0 3)5C 26-1494
2.81 X
1.984 1.60, 3.973 2.873 1.763 2.742 1.262 (GdSc0 3)200 27-220
2.80, 1.98, 4.58, 1.08, 2.39, 3.96, 1.25, 1.82, Sr3Co 2l/'<JO 9 29-1462
2.80, 1.98, 3.963 1.593 1.762 3.542 2.732 2.322 (ScTb0 3)200 27-599
e 2.80, 1.98 0 3.24, 2.8\ 1.622 1.26, 1.15, 1.40, Li 0 c,Ag 0 ,. Br 26-856
2.80. 1.988 3.24 X 1.698 1.625 1.400 1.296 1.266 La 5 Mo 30 16 30-261
o 2.80 X
1.985 3.245 1.68, 1.61, 0.00, 0.00, o.oo, (Ptl 4) 23-1304
2.80 9 1.98X 2.727 2.678 2.657 3.965 3.324 3.304 (Ga 52 Mn)Q 24-437
2.80, 1.98, 1.62. 2,292 1.402 4.24, 1.25, 5.60, SryA1p 6 24-1187
* KTi0 2 F 25-688
2.80, 1.989 1.627 1.407 2.286 3.954 0.784 0.814
* (Cala)(MgTa)06 30-261
2.80x 1.98, 1.614 4.593 1.623 4.553 2.823 2.783
2.80x 1.98 0 1.600 1.405 3.544 2.844 2.764 2.19. LaRh03 10-305
*
2.79, 1.98, 3.94x 4.62_r 4.485 1.604 2.854 2.363 Na 3CrF 6 28-1075
2.79, 1.98x 3.35, 1.688 1.61 7 1.147 1.087 1.256 (AmS)F 24-1218
2.79, 1.98. 1.61 . 4.555 2.8\ 1.975 1.625 1.405 Sr2NiTe06 24-1226
2.79x 1.984 1.614 4.572 2.382 1.402 1.06, 1.25, (Eu(Mg 05W05 )0,)40F 26-1415
* 1.99, Mg 3Ca(C0 3)4 14-409
2.79, 1.97, 2.89, 1.772 1.762 2.60, 2.43,
2.80, 1.97x 3.95x 4.6\ 4.498 2.846 2.752 2.492 (NH 4)3V02F4 28-88
2.80 1.97. 3.21. 1.684 1.282 1.072 1.61, 1.39, ScOF 18-1159
* '
NaVF 3 29-1456
2.797 1.97. 3.95, 1.59,; 2.843 2.743 1.763 2.362
2.79, 1.97. 3.22, 3.454 2.214 2.134 2.094 1.864 RbV6 0 14 .4H 20 30-1099
2.79, 1.97. 1.61. 1.402 1.102 1.06, 0.88, 0.93, Sr3Fe 2Te0 9 26-982
*
Figura 26 Parte de uma página típica do manual do método de Hanawalt.
Inicialmente, Hanawalt ordenou as fichas pelos valores de d da linha principal de modo de-
crescente. Porém, com um grande número de fichas, notou-se que mais de uma substância podia
ter os valores de d da linha mais intensa e, às vezes, da segunda mais intensa, iguais ou muito
próximos. Considerando os erros experimentais na determinação dos valores de d, muitas vezes
não se podia distinguir claramente qual ficha pertencia à fase desconhecida, apenas pela linha mais
intensa. Por isso, Hanawalt estabeleceu a identificação de uma fase a partir dos valores de d das três
linhas principais de seu difratograma.
Ra ios X: difração e espectroscopia 43
Temos, então, plenas condições de sermos apresentados ao método de Hanawalt para análise
qualitativa de fases. Primeiramente, vamos conhecer cada informação contida nas páginas de seu
manual e, em seguida, veremos o procedimento da análise.
Vamos denominar dl' d2 e d3 os valores das distâncias interplanares das três linhas mais
intensas de um difratograma, sendo d 1 a 1ª linha mais intensa, d2 a 2ª mais intensa e d3 a 3ª
mais intensa. Cada ficha de difração entra 3 vezes na listagem, de modo que as três linhas mais
intensas aparecem sucessivamente na primeira coluna da listagem. Em cada vez, a ficha aparecerá
com os valores de dl' d2 e d3 com a seguinte disposição: d 1d2d3 ; d2d1d3 ; e d3d 1d2• Is~o faz com que,
mesmo com erros na determinação das intensidades relativas, a ficha correta ainda possa ser en-
contrada. O manual de Hanawalt (que é um Índice Numérico) está organizado da seguinte maneira.
Observemos novamente a página exemplo da Figura 26.
No alto da página, aparece uma faixa de números que estão associados à d1 e determinam o
grupo a que a ficha pertence. Na página, propriamente dita, vemos 11 colunas. A primeira coluna à
esquerda traz símbolos sobre a qualidade e corrfiabilidade das informações. As 8 colunas seguintes
trazem valores de distâncias interplanares. Notemos que, dessas, as 3 primeiras estão em negrito,
para lembrar que contêm dl' d2 e d3 • As outras 5 colunas trazem valores de d de outras 5 linhas de
difração com intensidades mais baixas do que d3 , sem qualquer ordem em especial.
A décima coluna traz a fórmula química da substância. Esta informação é extremamente
importante para o fechamento da análise, pois qualquer indicação prévia sobre quais elementos
químicos fazem parte da fase pode ser verificada nessa coluna.
Finalmente, na décima primeira coluna, última do lado direito da página, aparece o número
da ficha no JCPDS, que pode ser buscada no arquivo de fichas para uma verificação mais completa
do difratograma de interesse.
Uma determinada faixa de valores de dl' no alto de cada página, torna diversas páginas do
manual. Porém, ao longo do manual, ela vai diminuindo de valor.
A segunda coluna da esquerda contém os valores de d da linha mais intensa do difratogra-
ma, d 1 , portanto, do grupo. Não há ordenamento específico para essa coluna. A terceira coluna da
esquerda traz os valores de d2 ordenados decrescentemente de cima para baixo. Esta é a coluna do
subgrupo. A quarta coluna da esquerda traz d3 , também sem ordenamento específico; porém quan-
do nas colunas do grupo e do subgrupo aparecem sucessivamente vários valores iguais de d1 e d2 ,
respectivamente, então, na coluna 4, d3 aparece decrescentemente ordenado de cima para baixo. As
outras 5 colunas de valores de d não apresentam ordenamento específico.
Podemos notar também, na Figura 26, que existem pequenos algarismos colocados como
subíndices dos valores de d, que representam a intensidade relativa da linha, I/1 100 • Notemos que
aparecem os valores de l a 9 e "x". A letra "x" representa 100%, e os algarismos de 1 a 9, os valores
de 10% a 90%, de década em década. Isso mostra que, no método de Hanawalt, a intensidade rela-
44 EdUFSCar-Apontamentos
tiva não é muito decisiva na identificação de uma fase e que o erro experimental na determinação
da intensidade é relativamente grande. Daí a intensidade aparecer expressa apenas por 10%, 20%,
30%, ... , 90%, 100%.
O procedimento para a identificação de um difratograma desconhecido de um material mo-
nofásico segue os seguintes passos:
c) Se não existe sugestão prévia sobre composição química e existem duas ou mais fichas
candidatas, então a comparação do difratograma completo (as outras linhas além das 8 prin-
cipais) com as fichas do JCPDS é uma atitude importante para o fechamento da análise.
Um comentário final sobre esse procedimento de análise qualitativa por difração de raios X
é que a aplicação do método de Hanawalt é muito rápida, a partir do momento em que se tenha a
listagem de valores de d e I/1 100 • Se não houver nenhum fator complicador, é para se encontrar a
ficha correta em menos do que 1O minutos. Isso é fantástico porque o arquivo atual possui mais de
200.000 fichas. Porém, isso só é possível no caso de materiais monofásicos, pois materiais bifási-
cos exigem um pouco mais de trabalho, por causa da superposição de dois difratogramas, um para
cada fase presente. Neste caso, é necessário, primeiramente, identificarmos uma fase e, com os
picos que sobrarem, identificarmos a outra fase. A identificação de três ou mais fases torna-se muito
trabalhosa, se não impossível. Nesse caso, os procedimentos automáticos, por meio de programas
computacionais, facilitam a análise. Porém, é bom lembrarmos que isso não dispensa a supervisão
e a experiência de bons operadores. Mesmo os programas mais modernos não conseguem fechar as
análises mais complexas e, até mesmo em casos simples, podem gerar absurdos corno resposta.
Alguns fatores complicadores que podem dificultar a análise qualitativa são: a) textura na
amostra ou textura na colocação da amostra no porta-amostra, que pode causar grandes erros nas
intensidades relativas das linhas; b) superposição de linhas de difração de fases diferentes, prin-
cipalmente se envolver as linhas principais das fases; e c) erros grosseiros na determinação dos
valores de d.
Para a nossa prática, vamos fazer uma pequena aplicação do método de Hanawalt para iden-
tificar o difratograrna da Figura 23b. Daquele difratograrna, extraímos a listagem de valores mos-
trada na Tabela 8, que geraram a listagem de d e de intensidades relativas apresentada na Tabela 9,
pronta para o método de Hanawalt.
Tabela 9 Valores ordenados de d e I/I 100 , do difratograma da Figura 23b, prontos para o método de Hanawalt.
d. 1
Valores de d.1 1/1100
(Á) (%)
d, 2,75 100
d7 1,94 48,1
d_ 1,59 34,6
d A 2,25 22,2
d, 1,38 19,8
dh 3,90 3,7
d7 1,75 1,9
A Figura 27 mostra uma parte da página 663 do manual de Hanawalt, na qual é encontrada
a ficha da única fase contida no material em análise. Notemos, por meio das marcas feitas ao lado
dos valores de d, a evolução do "afunilamento" da seleção da ficha correta.
2.80, 1.95,. 3.71, 1.623 1.593 2.703 2 .063 2.033 PbSbO,Gi 17 - 469
* 2.78 X 1.959. 3.719 2.036 1.606 1.613 1.393 1.383 CuEu 20 4 22 - 234
o 2.78, 1.95x • 3.438 1.988 1.828 1.265 1.61 4 1.524 YC03F 25 -1009
2.77, 1.95•• 3.51 , 1.607 1.394 1 603 1.243 1.233 Ce Fe0 3 22 - 166
* 2.77, 1.957. 1.60. 1.58, 1.387 2 .73, 1.963 1.763 CdSn0 3 13 - 360
2.77 1.95,. 1.59, 1.398 1.24e 1.053 0.928 0.88. Sr2 NiMo0 6 15 - 601
' LaTi 30 49 20 - 557
2.77 X 1.957. 1.597 1.38,, 1.234 1.043 2.273 3.982
2.76 X • 1.957. 3.909 1.59_1 1.754 1.383 1.242 1.042 NaNb03 19 -1221
*e 2.76 X • 1.95,. 3.89, 1.59, 1.766 1.740 1.59., 1.38, NaNb02F 18 -1228
2.76,. 1.957• 3.189 1.66,, 1.23, 1.592 1. 132 0.922 (TbS)8F 18 -1336
-
2.76,. 1.95,. 3.16 X 1.93, 1.668 2.22, 1.635 1.565 Er40 3 F6 24 405
- =
2.75,. 1.95,. 3.20, 1.663 1.593 1.233 1.272 1. 132 (Ba0)8F 1 - 746 -
2.75 X • 1.95,. 2.87, 1.48, 4.608 2 .508 2.388 1.838 LiCaN 18 - 724 -
2.75,. 1.95,. 1.594. 1.372• 1.232. 1.04,. 2.61, 2 .24, • SrFe 20 4 1 -1027 -
e 2.75,.
2.75 X •
1.95,.
1.954.
1.59, .
1.58,.
1.23 .•
3.893
1.04,
2 .793
1.38,.
2.73,
3.89, •
1.602
0.92,
2.23,
(CeT1)2c
FeNd0 3
26
25
- 445
- 1149 3.20
1
-
* 1.94,. 2.72, 2.642 1.722 1.452 Ca 2 (P04).xH,O 18 - 303
=
2.80, 3.446 1.844 -
2.80, 1.94,. 3.16, 2.91 7 2.736 2.676 2 .524 2 .104 Rb 2SbBr5 11 - 668
Ca 7(P0 4 ) 2 (Si0 4)2 5 - 646
-
2.so. 1.94,. 2.66, 3.806 3.426 2.206 1.346 1.544
-
2.76 X • 1.94,. 3.87, 2 .1\ 2.236 2.74, 3.922 2.452 (GaPt,)240 23 - 993
-
2.75, • 1.944. 5.70, 1.65, 1.58, 1.23, 1.37, 1.26, Na 4Fe(CN) 6 1 - 1026 -
2.75 X • 1.94,. 3.899 1.598 1.747 7.815 3.48 2.253 Th(Ta0,) 4 16 - 672 -
--
-
Figura 27 Uma parte da página 663 do manual de Hanawalt, na qual é encontrada a ficha da fase correspondente ao -
difratograma da Figura 23b. =
-
-
-
-
Raios X: difração e espectroscopia 47
Hanawalt: J. Donald Hanawalt, 1903- 1987, pioneiro nos anos 30 do século XX no desenvolvi-
mento da estrutura de um banco de dados de difração de raios X de pó (Powder Diffraction File
- PDF), criou, em 1936, uma metodologia para a busca de difratogramas em banco de dados
composto por fichas de difração de fases previamente caracterizadas. O mineral, cuja fórmula
empírica é Hg6 HgCl 1,5 (0H) 0 ,5 0 3 , recebeu o nome de Hanawaltita (Hanawaltite), em homenagem
ao pesquisador. (International Centre for Diffraction Data - ICDD. Disponível em: http://www.
icdd.com/resources/awards/hanawalt.htm e também: http://webmineral.com/data/Hanawaltite.
6 ESPECTRÔMETRO DE RAIOS X
Círculo
goniométrico
Radiação
branca
Tubo de
raios X
Amostra
Caixa de
proteção
48 EdUFSCar -Apontamentos
amostra é uma fonte de raios X. Esse feixe é policromático, composto de diversos compri-
mentos de onda resultantes das emissões de cada elemento químico presente na amostra.
2) No centro do goniômetro de um espectrômetro, existe um cristal analisador, na forma de
uma fina placa retangular, cortado de modo especial, tendo um plano cristalográfico conhe-
cido como face de maior área, a qual fica verticalmente colocada sobre o centro do círculo
goniométrico. Sobre essa face incide o feixe de raios X fluorescentes gerado pela amostra,
o qual será separado angulannente no espaço em função dos comprimentos de onda nele
existentes.
Cabem aqui algumas palavras sobre o termo "raios X fluorescentes" usado nos parágrafos
anteriores. Nós vimos nas secções 2.4 e 2.6 os conceitos sobre o espectro característico dos alvos
dos tubos de raios X. Lá, o feixe emitido pelo alvo é excitado por um feixe de elétrons que incide
sobre o alvo. Os raios X fluorescentes são gerados de modo similar, porém a excitação é feita por
meio de raios X, ou seja, um tubo lança raios X primários sobre a amostra. Esse feixe primário tem
fótons com energia suficiente para arrancar elétrons das camadas K ou L dos átomos da amostra.
Conseqüentemente, o decaimento dos elétrons desses átomos para as vagas deixadas nas camadas
mais internas provocará a emissão de raios X secundários ou fluorescentes. Esses raios X são ca-
racterísticos dos elementos químicos que compõem a amostra.
A Figura 29 mostra, esquematicamente, o princípio da fluorescência de raios X. Notemos
que é uma pequena variação da Figura 5, em relação a qual mudou-se apenas o agente excitador
da emissão. Agora, os raios X primários são os excitadores dos raios X emitidos, isto é, fluores-
centes.
Feixe de raios X
fluorescente
Feixe de raios X N
primário
Os comprimentos de onda emitidos pela amostra são analisados pelo cristal no centro do
goniômetro. Conforme o cristal vai girando, sincronizadamente com o detector (dobro da veloci-
dade angular do cristal analisador), a Lei de Bragg vai sendo satisfeita, sucessivamente, para cada
\
Raios X: difração e espectroscopia 49
10000
<:l
:>:'.
"'
LL
=
:>:'.
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LL
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z <:l-
1000
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<:l- :>:'. o
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= .,;:
N
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~u
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- ~
- i ~ l .}
1 ~,..- -
V~ ~) ~ ""' - - o
20 30 40 50 60 70 80 90 100
28 (graus)
Figura 30 Espectro de emissão de raios X fluorescentes de um aço inoxidável anali sado por um cristal de mica.
Alguns cristais analisadores típicos usados na espectroscopia de raios X são: mica, plano
(33l), d 331 = 0,15 nm; LiF, plano (200), d200 = 0,201 nm; NaCl, plano (200), d200 = 0,282 nm. Pela
Lei de Bragg, quanto maior a distância interplanar associada à face do cristal analisador, menor o
ângulo de Bragg para um dado comprimento de onda emitido pela amostra.
Chamaremos de análise química elementar de um material aquela com que apenas identifi-
camos os elementos químicos presentes no material. Com essa análise, não é .possível saber qual
é o estado químico de um átomo específico, ou seja, como ele está ligado com seus vizinhos. Por
exemplo, podemos chegar à conclusão de que um dado material é formado por Ni, Al e O. No
entanto, não poderemos saber se esses três elementos químicos estão combinados formando, por
exemplo, uma liga metálica de Ni e AI, com O dissolvido intersticialmente, ou se é a mistura dos
dois óxidos Niü e Al 2 0 3 • O adjetivo "qualitativa" quer dizer que é feita apenas a identificação dos
elementos químicos, sem sua quantificação. No caso de também se determinarem as quantidades
relativas de cada elemento químico de um material, dizemos que a análise é quantitativa.
A Tabela 10 mostra o comprimento de onda das linhas de raios X mais intensas emitidas por
alguns elementos químicos. Notemos que cada elemento químico emite mais de uma linha, ou seja,
cada elemento químico emite um espectro de raios X. Isso significa que um espectrograma de raios
X de um dado material, composto por mais de um elemento químico, será formado pela superposi-
ção de tantos espectros de emissão quanto o número de elementos químicos que o constitui.
Tabela 10 Comprimento de onda (em angstron) das linhas mais intensas emitidas por alguns elementos químicos.
A princípio, uma análise química elementar qualitativa é simples de ser feita; porém, quando
muitos elementos químicos estão presentes num material, a análise pode se tomar complexa se
(
Raios X: difração e espectroscopia 51
ocorrer a superposição de linhas espectrais, ou seja, uma linha do espectro que pe11ence a mais de
um elemento químico. Pela Tabela 1O, podemos ver que é até muito fácil ocorrer a superposição de
linhas por causa da grande quantidade delas emitida por cada elemento.
7 BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA