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“A Constituição reconhece direitos aos índios de quanto do território brasileiro?”. Essa foi
a questão que, corretamente respondida, daria à participante o prêmio de um milhão de
reais em barras de ouro. Diante da “pergunta do milhão”, a aspirante à milionária achou
por bem não responder. E o fez sabiamente – deve-se dizer –, pois, como se provou na
ação que viria a ser proposta, ao questionamento não havia alternativa correta, já que a
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Constituição não reserva percentual algum do território brasileiro à população indígena.
Abstendo-se de responder à última pergunta, a participante fez jus ao valor de R$
500.000,00 (quinhentos mil reais). À outra metade só teria direito caso indicasse a
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Teoria da responsabilidade civil pela perda da chance:
parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
opção correta, o que não se fazia possível, já que, como bem designou o Ministro relator
do Recurso Especial 788.459/BA, “a pergunta era irrespondível”.
O caso Show do Milhão abriu os debates no STJ sobre a aplicabilidade da teoria da perda
de uma chance no ordenamento jurídico brasileiro. Em sequência, outros tantos foram
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apreciados pela Corte, a suscitar importantes questões que vão desde o cálculo das
indenizações pelas oportunidades perdidas, passando pelas modalidades de aplicação da
teoria, até a própria ressarcibilidade das lesões à chance.
“se o dono do animal, ao demandar o prejuízo, incluir aí o prêmio, é certo que sua
pretensão terá que ser repelida. Tal lucro era hipotético. Mas é inegável que o animal,
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Teoria da responsabilidade civil pela perda da chance:
parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
José de Aguiar Dias, em um primeiro momento, pareceu enxergar nas chances perdidas
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hipóteses de lucros cessantes. Posteriormente, contudo, acolheu a teoria da
responsabilidade civil pela perda de uma chance. Ao analisar decisão de primeira
instância proferida em 1929 no Rio de Janeiro, novamente sobre a responsabilidade de
advogado, o jurista admitiu que a perda da chance da vítima de ter seu recurso
apreciado pela instância superior, em razão da perda do prazo para sua interposição,
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constitui perda de um direito, sendo, portanto, passível de indenização.
O segundo estudo que se dedicou exclusivamente à teoria é assinado por Sérgio Savi. A
obra buscou analisar somente as hipóteses da perda da chance de auferir um benefício.
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parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
Nesses casos, o autor afirma que a perda da chance deve ser considerada no
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ordenamento brasileiro uma subespécie de dano emergente. Para o autor, o
ordenamento jurídico brasileiro deve admitir a teoria da responsabilidade civil por perda
de uma chance, tendo como fundamento i) a cláusula geral da responsabilidade civil que
utiliza um conceito aberto de dano, ii) o princípio da reparação integral e iii) a evolução
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do sistema de responsabilidade civil.
Assim como ocorrido no Direito francês, à jurisprudência dos tribunais brasileiros coube
o concreto dimensionamento da teoria da responsabilidade civil pela perda de uma
chance. O primeiro julgado a abordar o tema data de 1990, de relatoria do então
Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul Ruy Rosado de Aguiar
Júnior, por influência de palestra proferida por François Chabas (La perte d’une chance
em droit français), em maio daquele ano, na UFRS. O caso paradigma tratou-se de ação
indenizatória de danos decorrentes de erro médico. Curiosamente, embora tenha
analisado a teoria, o Tribunal gaúcho rejeitou sua aplicação ao caso, mesmo
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reconhecendo sua pertinência no Direito brasileiro.
Desde a prolação dos primeiros acórdãos, a responsabilidade civil pela perda de uma
chance vem ganhando relevância no cenário jurídico nacional, a ponto de se dizer que o
momento atual de alguns tribunais brasileiros se caracteriza pela “ebulição da teoria da
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perda de uma chance”.
O próprio Superior Tribunal de Justiça tem sido inundado por questões atinentes à teoria
em ambas as suas modalidades: tanto na perda de chance de auferir um benefício
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quanto na de evitar um prejuízo. Tome-se como exemplo da primeira modalidade um
caso ocorrido em agosto de 2013: a mesma emissora que teve de pagar indenização a
finalista do programa “Show do Milhão” (v. introdução) foi condenada, em nova
oportunidade, a indenizar o participante de um outro jogo de perguntas e respostas
(dessa vez o programa “Vinte e um”) pela “perda da chance de passagem a etapa
seguinte”, já que a alternativa correta para responder à pergunta formulada se baseava
na parte fictícia de um livro indicado como bibliografia, que contradizia a realidade. O
STJ decidiu não manter a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, segundo a qual o
contrato
Nesse caso, mais uma vez, o STJ reconheceu a chance como interesse jurídico tutelável
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e manteve a indenização pela perda da oportunidade de auferir um benefício. Em
relação a outra modalidade da teoria, o STJ também reconhece amplamente sua
aplicabilidade. Ao julgar o REsp 1.254.141/PR, a Ministra Nancy Andrighi deixou
consignado que
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parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
“a teoria da perda de uma chance pode ser utilizada como critério para a apuração de
responsabilidade civil ocasionada por erro médico na hipótese em que o erro tenha
reduzido possibilidades concretas e reais de cura de paciente que venha a falecer em
razão da doença tratada de maneira inadequada pelo médico.”
Segundo a relatora, “a chance em si – desde que seja concreta, real, com alto grau de
probabilidade de obter um benefício ou de evitar um prejuízo – é considerada um bem
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autônomo e perfeitamente reparável”.
No entanto, fato é que o manuseio da teoria pelos tribunais ainda é muito incipiente, o
que provoca oscilações de entendimentos, principalmente no tocante aos requisitos de
aplicação da perda da chance, a natureza do dano gerado e sua quantificação. Em
verdade, a conformidade da teoria com o ordenamento jurídico brasileiro nunca foi alvo
de maiores disputas jurisprudenciais. O que se discute é a adequação da teoria aos
casos concretos – preenchimento dos requisitos de aplicação – e não sua serventia no
Direito pátrio. Assim, ultrapassada a barreira da aceitação da teoria, a chance tem
recebido tutelas das mais variadas, de modo que sua perda ora se compreende como
dano moral, ora como dano de natureza patrimonial.
em benefício ou evitado prejuízo, basta que seja suficientemente real e séria para
ganhar relevância jurídica a ponto de se tornar um interesse tutelável. A doutrina
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entende que, nesses casos, justamente por gerar uma expectativa legítima em seu
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titular, a supressão da chance será suscetível de reparação.
Sérgio Savi conclui, em sua já citada obra, que “não é, portanto, qualquer chance
perdida que pode ser levada em consideração pelo ordenamento jurídico para fins de
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indenização. Apenas naqueles casos em que a chance for considerada séria e real”. No
mesmo sentido posiciona-se a doutrina de Sergio Cavalieri Filho, para quem se faz
“preciso que se trate de uma chance séria e real, que proporcione ao lesado efetivas
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condições pessoais de concorrer à situação futura esperada”.
Em outras palavras, a chance só configura um interesse jurídico tutelável quando for real
e séria. Apesar de a expressão conter dois adjetivos, a doutrina não tem se preocupado
em distingui-los, o que permite a conclusão de que por chance real e séria se diz a
chance idônea a gerar em seu titular uma expectativa razoável de obter uma vantagem
ou de evitar um malefício. Ou seja, para que uma chance seja merecedora de tutela no
ordenamento brasileiro, impõe-se seja razoável. E somente nesses casos a lesão a tal
interesse será considerada indenizável.
“o intérprete poderá aferir em que medida a disciplina individuada para certa hipótese
fática, mesmo diante de regras aparentemente claras, se encontra consentânea com os
princípios e valores do ordenamento, tendo-se em conta as especificidades dos
interesses em questão.”
E alerta:
Significa dizer que, para a configuração de uma chance razoável, não basta a simples
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alusão a utopias remotas. Deve-se exigir a demonstração in concreto de que a
oportunidade perdida já representava um interesse palpável no patrimônio da vítima,
sob pena de subverter os valores ordenamento por meio de uma “ultratutela” da vítima
que não foi vítima, pois não detinha um interesse merecedor de tutela.
Nas palavras de Anderson Schreiber, para que a lesão à chance seja indenizável, é
preciso verificar se a oportunidade realmente existiria não fosse a intervenção do
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infrator. Desse modo, para se falar em perda da chance, deve-se demonstrar que “o
normal desenrolar dos fatos conduziria ao gozo da oportunidade, que não dependia de
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outras condições que não as que já estavam presentes no caso concreto”.
sopesados, como, por exemplo, a vontade do marido perdido de ter filhos ou até mesmo
sua própria sobrevivência.
Diante do exemplo narrado, percebe-se que algumas chances podem ser consideradas
razoáveis – quando do decurso natural dos fatos elas seriam aproveitadas – e outras,
contrariamente, devem ser consideradas hipotéticas e aleatórias. No primeiro caso, a
chance configura interesse tutelado pelo Direito e sua perda ensejará responsabilização;
no segundo, devem-se rejeitar as pretensões indenizatórias.
Nessas hipóteses, não se trata, a rigor, de negar existência literal da perda de uma
chance. De fato, havia a chance de a mulher ter filhos após casada e ela foi perdida por
ato imputável a terceiro. Contudo, por não configurar uma chance razoável, deve-se
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negar-lhe tutela jurídica, já que ausente o an debeatur.
Importante atentar que o parâmetro de razoabilidade ora proposto não se confunde com
análises numérico-probabilísticas. Isto é, para a configuração do an debeatur –
existência da chance como interesse tutelável – não se faz necessário que haja uma alta
probabilidade de ganho. Veja-se o multicitado caso do “Show do Milhão” (v. introdução,
supra), em que, mesmo com reduzida probabilidade de acerto (25%), foi reconhecido o
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direito à indenização. -
O estudo probabilístico entre a chance perdida e o resultado final se faz mais relevante
no momento posterior: a etapa de quantificação do dano. Vale dizer: uma vez
considerada razoável, está presente o an debeatur. Em seguida, verifica-se qual a
probabilidade de a chance ter produzido o efeito benéfico (ou evitado o malefício) diante
do curso natural dos fatos. E é dessa análise probabilística que se extrairá o quantum
debeatur.
O que não parece adequado é vincular a existência da chance como interesse tutelável a
um critério probabilístico predeterminado (seja de 50, 20 ou 10 por cento), pois a
influência dialógica que a probabilidade terá no juízo de razoabilidade deverá ser
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avaliada nas vicissitudes de cada caso concreto. Isto porque, como bem nota a
doutrina, chances de poucas probabilidades podem revelar um interesse relevante para
vítima, cuja supressão gerará um dano ressarcível. Por outro lado, há vezes em que
chances muito prováveis podem não ter valor algum. Mais valem 15% de chance de
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realizar um sonho do que 95% de conseguir algo não tão desejado. Apenas o caso
concreto poderá informar a que ponto a análise probabilística deverá influenciar no juízo
de razoabilidade.
De fato, o juízo de probabilidade, por trabalhar com a frieza dos números, carece de um
olhar mais apurado para o caso concreto. Assim, a ciência probabilística, posto que
forneça uma precisão numérica certeira, não tem aptidão para viabilizar a precisão
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Teoria da responsabilidade civil pela perda da chance:
parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
jurídica esperada à luz de cada caso concreto. Ou seja, embora possa ser reconhecida a
probabilidade de 60% de sucesso de determinada intervenção cirúrgica, não será
possível saber a chance de sucesso do tratamento realizado in concreto pelo médico “A”
no paciente “B” em uma sala do hospital “C”, naquele dia “D” e naquela hora “E”.
Rafael Peteffi da Silva, em perspectiva distinta, infere que a perda de uma chance real
liga-se a “algo que repousa entre uma ‘probabilidade e uma certeza’ ou a um
“alargamento do nexo de causalidade”, que poderia “significar a perda de uma chance
sendo utilizada para suavizar o ônus da prova do nexo de causalidade entre a conduta
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do réu e o dano final”.
Suponha-se que um pintor tenha submetido uma obra sua a um concurso cujo prêmio
seja de cem mil reais. Por culpa da transportadora, o quadro não chega a tempo de ser
submetido à banca avaliadora do certame, razão pela qual o pintor perde a chance de
sagrar-se vencedor. Quanto vale a perda da oportunidade a ser indenizada?
Rafael Peteffi da Silva faz referência ao que aqui se denomina teto categórico pela
expressão “regra de granito”, “inquebrável” (inafastável) pelo intérprete. Segundo o
autor, “a ‘regra de granito’ limita a quantificação das chances perdidas a um valor
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obrigatoriamente menor do que o valor da vantagem esperada pela vítima”.
Nos casos de perda da chance clássica – de auferir uma vantagem –, tem-se que o fato
de a situação ser idônea a produzir apenas provavelmente e não com certeza absoluta o
lucro influi sobre a valoração do dano, já que “a chance de lucro terá sempre um valor
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menor que a vitória futura, o que refletirá o no montante da indenização”. Portanto, no
exemplo formulado, o teto da indenização seria de cem mil reais – valor da vantagem
perdida, que, na perspectiva da lesão, denomina-se dano final. Nessa hipótese, a chance
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Teoria da responsabilidade civil pela perda da chance:
parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
de ganhar um prêmio de cem mil reais deve valer menos que cem mil reais.
A respeito dos casos de perda da chance de evitar um prejuízo, tome-se como exemplo
um médico que, por negligência, omite-se em aplicar terapia cuja probabilidade de êxito
é cientificamente comprovada. Conseguintemente, o paciente vem a óbito. Nessa
hipótese, a indenização pela perda da chance de cura terá como teto a indenização
cabível pela lesão à vida. Isto é, questiona-se: qual o valor da compensação devida à
família caso o médico houvesse, de fato, matado o paciente? Esse será o teto da
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indenização pela perda da chance.
“Não é possível a fixação da indenização pela perda de uma chance no valor integral
correspondente ao dano final experimentado pela vítima, mesmo na hipótese em que a
teoria da perda de uma chance tenha sido utilizada como critério para a apuração de
responsabilidade civil ocasionada por erro médico. Isso porque o valor da indenização
pela perda de uma chance somente poderá representar uma proporção do dano final
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experimentado pela vítima.”
Tem-se, portanto, que o teto indenizatório da perda de uma chance deve pautar-se no
limite do valor da vantagem perdida, isto é, no dano final. Trata-se de teto categórico, já
que ignorá-lo seria subverter a teoria, desconsiderando a chance como interesse
merecedor de tutela e transformando, pela via indenizatória, a oportunidade em
realidade. O que justificou o desenvolvimento da teoria, sobretudo, foi o reconhecimento
da necessidade de tutela desse interesse jurídico – a chance – cujo valor é logicamente
inferior ao da vantagem perdida. Desconsiderar o teto é, no fim das contas, rasgar a
teoria e fazer da chance perdida verdadeiros lucros cessantes, o que não se mostra
adequado no ordenamento jurídico brasileiro.
“Num primeiro momento, determina-se qual seria o ganho auferido ou a perda evitada,
se a vítima tivesse obtido o resultado aleatório esperado. Depois, esse valor será
multiplicado pela porcentagem de chances que a vítima perdeu em função do ato do réu,
e o resultado desta conta será o montante a ser indenizado a título da perda da
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oportunidade.”
Por fim, observe-se como exemplo, nos casos de perda da chance de evitar um prejuízo,
a seguinte situação: um médico, por negligência, deixa de aplicar terapia cuja
probabilidade de êxito é, em média, de 70%, o que acaba por resultar na morte de seu
paciente. A análise probabilística indica que a compensação devida giraria em torno de
70% daquilo que seria devido pela lesão direta à vida. Contudo, resta comprovado que a
vítima, por sofrer de outra doença rara, detinha apenas 30% de chance de cura com o
tratamento. Dessa forma, o quantum reparatório deve se distanciar dos 70% sugeridos
pelo juízo probabilístico inicial e se aproximar daquele de 30%, dado pelo princípio da
razoabilidade.
Para que se possa falar em perda da chance indenizável, como visto, é preciso que a
oportunidade se revista de razoabilidade, isto é, impõe-se que a chance perdida seja o
resultado natural de um processo aleatório já em curso e não um sonho remoto da
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parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
Assim, faz-se necessário que a chance não dependa de outros fatores cuja presença não
seja verificável na análise do caso concreto. Nesse aspecto, o Superior Tribunal de
Justiça tem se mostrado bastante cauteloso, buscando avaliar minuciosamente o
requisito de razoabilidade para, não estando preenchido de acordo aos aspectos do caso
concreto, rejeitar a aplicação da teoria da perda de uma chance.
O caso tratava de uma ação ordinária por meio da qual o autor pedia indenização da
União por ter sido reprovado no exame psicotécnico inicial do concurso público para o
cargo de Policial Rodoviário Federal. Embora a injustiça de sua reprovação tenha sido
reconhecida, seu pedido de indenização com base na teoria da perda da chance foi
rejeitado, pois, ainda que aprovado na primeira fase do certame (prova de
conhecimento), “ficaram pendentes as quatro fases seguintes da primeira etapa,
compreendendo os seguintes exames: psicotécnico (considerando a inexistência de
resultado válido), médicos, capacidade física e motricidade; e, ainda, a segunda etapa,
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de caráter eliminatório – Curso de Formação”.
O entendimento foi ratificado pelo mesmo órgão no ano de 2010, no julgamento do REsp
1115687/SP, em cujo acórdão restou consignado que “Somente a perda de uma
oportunidade real, plausível e séria justifica a compensação por danos morais”. Na
hipótese, a Corte acabou por afastar a teoria da perda da chance, pois, a seu entender,
a oportunidade de evitar um malefício – purga da mora apta a evitar o leilão
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extrajudicial de imóvel de propriedade dos recorrentes – era “remota e inexpressiva”.
“a existência do dano acarretado à vítima, uma vez que esta oportunidade já estava
inserida em seu patrimônio, que a configuração deste dano fora gerado pela perda da
oportunidade, real, séria e atual na obtenção de certa vantagem, ou para evitar um
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prejuízo.”
fato, temos que não restou comprovado se haveria real possibilidade de renovação da
bolsa, caso a primeira Autora estivesse em condições físicas de efetuar o trabalho de
campo, inexistindo qualquer comprovação de que novas bolsas seriam concedidas na
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área de atuação da Demandante.”
Ocorreu que o Banco, por falha na prestação do serviço, emitiu seis títulos de igual
numeração, motivo pelo qual o autor exigiu indenização pela perda das chances de
ganhar o sorteio que a numeração sequencial correta dos documentos lhe traria. Dado o
exposto, decidiu o Tribunal que
“se deve tratar de uma chance palpável, factível. Há que se tratar não de mera
possibilidade abstrata, mas perda de uma oportunidade séria e real. Chances meramente
matemáticas, diminutas, dificilmente realizáveis, não chegam a atrair a obrigação
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reparatória, já que recaem na hipótese do mero dano hipotético.”
O caso narrado permite a observação concreta do que já foi dito: a análise probabilística
atuou dialogicamente com o princípio da razoabilidade para a determinação do an
debeatur. A equivocada numeração sequencial dos títulos não ocasionou, pela análise do
caso concreto, uma diminuição severa da probabilidade de o autor ganhar o sorteio.
Desse modo, ao critério probabilístico foi permitido influenciar a qualificação da chance
como razoável e, portanto, seu reconhecimento como interesse tutelável.
5.Síntese conclusiva
Assim, o processo de quantificação se dará por meio de uma probabilidade, que será
traduzida em uma percentagem sobre o valor da vantagem esperada ou do dano final
que o lesado teria, a depender da modalidade da perda de aplicação da teoria. Assim
como o princípio da razoabilidade sofre influências do juízo probabilístico no momento da
constatação da existência do dano, na etapa de quantificação, o critério da probabilidade
matemática será por ele permeado. Os dados estatísticos oferecerão apenas um
parâmetro ao magistrado para que ele, em análise minuciosa do caso concreto, defina o
quantum da chance perdida a ser indenizada.
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Teoria da responsabilidade civil pela perda da chance:
parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
6.Referências bibliográficas
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quantitative de la causalité d’un fait dommageable. Juris-Classeur Périodique, Paris, I, n.
2620, 1974.
BUSNELLI, Francesco Donato. Perdita di uma chance e risarcimento del danno. In: Il
Foro Italiano. Roma: Società Editrice del Foro Italiano, 1965. v. LXXXVIII.
CARNAÚBA, Daniel Amaral. A responsabilidade civil pela perda de uma chance: a técnica
na jurisprudência francesa. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 101, n. 922, p. 139-171,
ago. 2012.
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo: Atlas,
2014.
DANTAS, San Tiago. Problemas de direito positivo: estudos e pareceres. Rio de Janeiro:
Forense, 2004.
DE CUPIS, Adriano. Il danno: teoria generale dela responsabilità civile. Milano: Giuffrè,
1966. v. 2.
DIAS, Sérgio Novais. Responsabilidade civil do advogado: perda de uma chance. São
Paulo: LTr, 1999.
MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rêgo. Artigo 944 do Código Civil (LGL\2002\400): o
problema da mitigação do princípio da reparação integral. In: TEPEDINO, Gustavo;
FACHIN, Luiz Edson (Org.). O direito e o tempo: embates jurídicos e utopias
contemporâneas: estudos em homenagem ao professor Ricardo Pereira Lira. Rio de
Janeiro: Renovar, 2008.
NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 4. ed. São Paulo, Saraiva, 2013.
SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2006.
SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade civil pela perda de uma chance: uma análise
do direito comparado e brasileiro. São Paulo: Atlas, 2007.
3 Outros casos julgados pelo STJ serão analisados ao longo deste trabalho, em especial
nos itens 1.3 e 2.2.2, v. infra.
4 CARVALHO SANTOS, João Manoel de. Código Civil Brasileiro Interpretado. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 1956. v. XXI. p. 321-322.
7 O autor cita hipóteses clássicas de perda da chance em nota de rodapé referente aos
lucros cessantes: “Assim, a probabilidade de ganhar uma causa; vencer a corrida de
cavalo, vencer um concurso, ganhar na bolsa; obter o prêmio em uma exposição de
pintura, probabilidade perdida, respectivamente, em consequência de fato do advogado;
do transportador que não conduziu o animal a tempo ou do espectador que provocou o
acidente de que resultou originariamente a sua má colocação; do mandatário que não
promoveu a habilitação do candidato, a ele confiada; do banqueiro que não proporcionou
em tempo o numerário ao cliente; do indivíduo que destruiu o quadro etc.”. (AGUIAR
DIAS, José de. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012. 827).
10 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
p. 42.
11 DIAS, Sérgio Novais. Responsabilidade civil do advogado: perda de uma chance. São
Paulo: LTr, 1999.
12 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 4. ed. São Paulo, Saraiva, 2013. p.
671.
14 SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade civil pela perda de uma chance: uma
análise do direito comparado e brasileiro. São Paulo: Atlas, 2007. p. 230.
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parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
16 SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas,
2006.
17 TJRS, Ap. Civ. 598069996, rel. des. Ruy Rosado de Aguiar Júnior, j. 12.06.1990. O
acórdão está a seguir ementado: “Cirurgia seletiva para correção de miopia, resultando
névoa no olho operado e hipermetropia. Responsabilidade reconhecida, apesar de não se
tratar, no caso, de obrigação de resultado e de indenização por perda de uma chance”.
18 TJRS, Ap. Civ. 591064837, rel. des. Ruy Rosado de Aguiar Júnior, j. 29.08.1991. O
acórdão está a seguir ementado: “Responsabilidade civil. Advogado. Perda de uma
chance. Age com negligência o mandatário que sabe do extravio dos autos do processo
judicial e não comunica o fato à sua cliente nem trata de restaurá-los, devendo indenizar
à mandante pela perda da chance”.
24 Como bem nota CARNAÚBA, Daniel Amaral. A responsabilidade civil pela perda de
uma chance: a técnica na jurisprudência francesa. Revista dos Tribunais, São Paulo, v.
101, n. 922, ago. 2012. p. 163.
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27 SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas,
2006. p. 60.
28 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo:
Atlas, 2014. p. 98.
30 “Se a teoria [da perda de uma chance] tem aplicação quando não é possível provar
cabalmente o nexo causal entre a ação ou omissão e o resultado danoso e, além disso,
se a sua fundamentação teórica relaciona-se com uma apreciação em abstrato, baseada
na probabilidade, é necessário, para se assegurar um patamar mínimo e inafastável de
segurança jurídica, que tal probabilidade seja real, ou seja, que se possa verificar que a
chance perdida tenha representatividade” (KONDER, Carlos Nelson; DALSENTER,
Thamis. Questões atuais da responsabilidade civil médica e hospitalar. In: TEIXEIRA,
Ana Carolina Brochado; DADALTO, Luciana. Dos hospitais aos tribunais. Belo Horizonte:
Del Rey, 2013. p. 488).
33 Fala-se em chance pois nada garante que o noivo, no dia da cerimônia, diria sim.
35 “Em primeiro lugar importa averiguar se a chance perdida era real e séria: se for,
haverá obrigação de indenizar; se ela tiver caráter meramente hipotético, não. E para
saber se a oportunidade perdida era real e séria, haverá que recorrer às regras de
experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece”
(NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 674)
(grifos do original).
36 No mesmo sentido, v. Anderson Schreiber: “Vale dizer: para que tenha aplicação a
teoria da perda da chance, não é necessário que haja uma alta probabilidade de ganho,
superior a 50% ou a qualquer outro patamar. Mesmo chances reduzidas de sucesso
(25%, por exemplo) podem dar ensejo à indenização” (SCHREIBER, Anderson. A perda
da chance na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. In: SCHREIBER, Anderson.
Direito civil e Constituição. São Paulo: Atlas, 2013. p. 197).
37 Em sentido contrário, Sérgio Savi afirma que somente nos casos “em que for possível
fazer prova de uma probabilidade de no mínimo 50% (cinquenta por cento) de obtenção
do resultado esperado (o êxito no recurso, por exemplo), é que se poderá falar em
reparação da perda da chance como dano material emergente”. (SAVI, Sérgio.
Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2006. p. 61).
Contudo, ao analisar o acórdão proferido pelo STJ no caso do “Show do Milhão”, o autor
afirma que a decisão é “quase impecável” e merecedora de aplausos. Mesmo tendo a
Corte concedido indenização a uma chance de 25%, o civilista declara que “não há como
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parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
afirmar que o acórdão está equivocado. A diferença entre o entendimento esposado pelo
STJ neste acórdão e aquele por nós defendido neste livro é, tão somente, em relação ao
critério a ser adotado” (SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance.
São Paulo: Atlas, 2006. p. 80).
42 SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade civil pela perda de uma chance: uma
análise do direito comparado e brasileiro. São Paulo: Atlas, 2007. p. 204.
44 SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas,
2006. p. 63 (grifos do original).
46 SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade civil pela perda de uma chance: uma
análise do direito comparado e brasileiro. São Paulo: Atlas, 2007. p. 205.
47 SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas,
2006. p. 63 (grifos do original).
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parâmetros de aplicação à luz do Direito Civil brasileiro
49 STJ, REsp 1.2541.141/PR, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2012. O acórdão
está a seguir ementado: “Direito civil. Responsabilidade civil. Fixação do valor da
indenização pela perda de uma chance. Não é possível a fixação da indenização
pela perda de uma chance no valor integral correspondente ao dano final experimentado
pela vítima, mesmo na hipótese em que a teoria da perda de uma chance tenha sido
utilizada como critério para a apuração de responsabilidade civil ocasionada por erro
médico. Isso porque o valor da indenização pela perda de uma chance somente poderá
representar uma proporção do dano final experimentado pela vítima”.
50 “Uma alta probabilidade de sucesso conduz a uma indenização por perda da chance
que será próxima ao valor do resultado final. Uma possibilidade reduzida de acerto
conduzirá a uma indenização diminuta e uma chance ínfima que pode mesmo deixar de
ser indenizada, em atenção à ausência de relevância jurídica da perda, conforme já
destacado” (SCHREIBER, Anderson. A perda da chance na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça. In: SCHREIBER, Anderson. Direito civil e Constituição. São Paulo:
Atlas, 2013. p. 201).
53 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 4. ed. São Paulo, Saraiva, 2013. p. 675
(grifos do original).
56 Sobre o princípio da reparação integral dos danos, v., por todos, MONTEIRO FILHO,
Carlos Edison do Rêgo. O princípio da reparação integral e sua exceção no Direito
Brasileiro. In: Rumos contemporâneos do direito civil: estudos em perspectiva
civil-constitucional. Belo Horizonte: Fórum, 2017.
58 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10. ed. Trad. Maria Celeste
Cordeiro Leite dos Santos. Rev. técnica Claudio De Cicco. Apres. Tércio Sampaio Ferraz
Júnior. Brasília: Universidade de Brasília, 1999, p. 34. Sobre o papel criativo do
magistrado, atente-se, contudo, para a lição de Gustavo Tepedino: “O reconhecimento
do papel criativo dos magistrados [...] não importa em decisionismo, ou voluntarismo
judiciário. A própria noção de segurança jurídica há de ser reconstruída a partir do
compromisso axiológico estabelecido pela Constituição da República, com a elaboração
de dogmática sólida, capaz de enfrentar a complexidade dos novos fenômenos sociais e
de suas mudanças. Nessa esteira, torna-se imperioso fortalecer e difundir a teoria da
argumentação, associada à interpretação unitária do ordenamento, não já à valoração
individual de cada juiz, a fim de legitimar o discurso jurídico e a decisão judicial”
(TEPEDINO, Gustavo. Itinerário para um imprescindível debate metodológico. Revista
Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro, v. 35, 2008. p. iv).
59 STJ, AgRg no REsp 1.220.911/RS, 2ª T., Rel. Min. Castro Almeida, j. 17.03.2011.
64 TJRJ, Ap. Civ. 0209293-51.2013.8.19.0001, 19ª Câmara Cível, Rel. Des. Lúcio
Durante, j. 16.02.2017.
65 TJRJ, Ap. Civ. 002517-90.2009.8.19.0054, 23ª Câmara Cível, des. Rel. Maria da
Gloria Oliveira Bandeira de Mello, j. 15.03.2017.
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