Você está na página 1de 2

Então. Senta que lá vem história, rs.

Pra falar de racismo, primeiro é importante


definir o que é raça. De maneira muito resumida, raça foi originalmente uma definição
da biologia pra classificar e diferenciar plantas e animais da mesma espécie. A partir de
um determinado momento, passaram a querer usar esse tipo de classificação pros seres
humanos. Ela pode ser entendida 1) biologicamente, a partir de um aspecto físico (como
a cor da pele ou o tamanho do nariz e dos lábios, etc) ou 2) culturalmente, a partir de
coisas relacionadas ao modo de viver (qual é a origem da pessoa, a religião que ela
prega, a língua que ela fala, os costumes que ela tem).
Ao longo do século XX, a Biologia e a Antropologia já provaram
cientificamente que não existe nenhuma diferença, cultural ou biológica, que justifique
a hierarquização entre pessoas. Mas essas diferenças, definidas por essa ideia de raça,
foram usadas como forma de justificar a desigualdade e a discriminação de grupos
minoritários — socialmente falando, aqueles que não têm poder político (pode ser por
desigualdade social, econômica e/ou por não se adequar ao padrão).
A definição de racismo é estrutural: uma parte fundamental da organização
econômica e política da sociedade, pra definir e separar indivíduos por conta do grupo
étnico-racial ao qual elas pertencem e, a partir dessa definição de raça, gerar
desigualdade.
Embora esteja tudo conectado, tem uma diferença considerável, dentro da noção
desse racismo, entre preconceito e discriminação. Preconceito é quando você pensa que
algum grupo racial ou étnico tem características essenciais (“negro é bandido”, “árabe é
terrorista”, “judeu é pão-duro”, “português é burro”, etc.). É essa coisa do estereótipo.
Discriminação é quando a concepção se transforma em ação e alguém, direta ou
indiretamente, age pra favorecer ou prejudicar uma pessoa por conta da condição racial
dela — como quando alguém nega uma vaga de emprego, duvida da inteligência ou da
capacidade profissional de um negro, por exemplo. Ou quando um policial identifica um
“suspeito”. Por isso não faz sentido essa ideia de “racismo reverso”. Não existe racismo
contra branco. É claro que um membro de um grupo minoritário pode ser
preconceituoso ou discriminar, mas não tem poder político pra transformar a estrutura.
Não é a mesma coisa, entende?
Em relação ao Holocausto, eu vejo essa reportagem que você citou como
completamente equivocada. Não tem nada de original nas ideias da Alemanha nazista, é
uma combinação de características muito fortes do século XIX, essa definição biológica
de raça e o ultranacionalismo. É o tipo de combinação que já era usada para perseguir as
populações nativas nos Estados Unidos e na África. E é o grande exemplo pra provar
que essa definição de raça é uma escolha política e não teve nada de “natural”. A “raça
pura” dos arianos foi uma justificativa dos nazistas na Alemanha pra oprimir não só a
população de origem judia, mas também os negros, os homossexuais, os comunistas, os
deficientes, os romani (que a gente define popularmente como “cigano”). A grande
diferença foi a alta tecnologia de guerra e o desespero de uma sociedade em crise.
Infelizmente esse projeto chegou ao poder em um momento onde uma parte muito
significativa da população europeia era de judeus. E eles, assim como os eslavos (por
mais europeus que sejam), nunca foram entendidos como “raça superior”, muito pelo
contrário. Existiam diversas características, tanto biológicas quanto culturais, que
criavam essa separação. Tanto que esses também são povos historicamente perseguidos
— e que sim, sofreram com o problema do racismo. E não tem nada de reverso nisso.
Ser “branco” não diz respeito somente à cor da pele, mas também a uma posição
social de privilégio, que depende do contexto. No Brasil, por conta da composição
social que é tão complexa, existe essa grande dificuldade de definir quem é o que. Mas
vê o caso dos Estados Unidos, por exemplo, onde a separação racial sempre foi algo
obrigatório. Conseguem dizer no instante que te vêem qual é a sua ascendência. E isso,
infelizmente, é fundamental pra definir a qual grupo você pertence e, principalmente, se
você é um alvo ou não. Logo, é natural que tenha existido um estranhamento e que isso
tenha gerado discriminação ao Eminem quando ele quis fazer rap, uma expressão
artística sempre ligada à população negra e pobre. E a carreira dele é prova do quanto a
cor dele não criou nenhuma barreira em relação ao sucesso. Eu diria inclusive que
tornou o rap mais digerível pra muito adolescente branco classe média na época, até
porque eu conheço um monte desses, rs.
Enfim. É uma discussão bem complicada e extensa, teria muito mais coisa pra
falar mas eu tentei ser o mais simples e direto possível. Eu espero que ajude na
discussão e se você quiser saber mais eu tô super disposto a conversar mais e
recomendar leituras.

Você também pode gostar