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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2019.0000959088

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº


2244445-27.2019.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que são agravantes ESSER
HOLDING LTDA., GENERAL EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA.,
GIONNY RONCO, ALAIN KORALL HORN e RAPHAEL KORALL HORN, são
agravados CARLOS LOBTSKY FILHO, MARIA JOSÉ RODRIGUES LOBITSKY,
MIGUEL RODRIGUES LOBITSKI e RAFAEL RODRIGUES LOBTSKY.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 5ª Câmara de Direito Privado do


Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao
recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JAMES SIANO


(Presidente sem voto), FERNANDA GOMES CAMACHO E JAIR DE SOUZA.

São Paulo, 14 de novembro de 2019.

MOREIRA VIEGAS
Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Agravo de Inst.: 2244445-27.2019.8.26.0000


Comarca: São Paulo
Agravantes: ESSER HOLDING LTDA. E OUTROS
Agravados: CARLOS LOBTSKY FILHO E OUTROS

Agravo de Instrumento desconsideração da personalidade


jurídica relação consumerista configurada aplicabilidade
da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica,
logo, a mera insolvência e a ausência de bem penhorável livre
e desimpedido de ônus, já admite a desconsideração -
Inteligência do art. 28, caput, e § 5º, do CDC ilegitimidade
dos sócios administradores não acolhida - o fato de serem
administradores ou diretores das empresas não impede a sua
inclusão no polo passivo, uma vez constada a participação no
conluio e o benefício próprio - decisão mantida Recurso não
provido.

VOTO Nº 27.411

Agravo de instrumento tirado em face de r. decisão de


fls. , que em autos de ação de rescisão de compromisso de compra e venda, ora
em fase de cumprimento de sentença, acolheu o incidente de desconsideração
de personalidade jurídica da executada Esser Tokio Empreendimentos
Imobiliários Ltda para atingir os sócios ESSER HOLDING LTDA, GENERAL
EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, ALAIN KORALL HORN, GIONNY
RONCO, RAPHAEL KORALL HORN por estarem presentes os requisitos do
artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor autorizadores da medida.

Alega o agravante, em breve síntese, que a decisão


agravada também não observou a regra do artigo 137 do Código de Processo
Civil, a qual estabelece que, se acolhido o pedido de desconsideração, esta
atingirá somente àquilo que foi alienado ou onerado sob este manto. Afirma ainda
a ilegitimidade passiva dos administradores, pessoas físicas, Srs. Alain, Raphael
e Gionny, já que não são sócios diretos da executada originária, razão pela qual
não podem ser atingidos pela desconsideração da personalidade jurídica. Alega
não haver confusão patrimonial entre a devedora originária e os agravantes e

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menos ainda óbice ao ressarcimento ao consumidor, razão pela qual não estão
previstos os requisitos do art 28 do CDC para ensejar a desconsideração da
personalidade jurídica.

Recurso processado, sem efeito suspensivo, pois em


que pesem as razões apresentadas, não vislumbro presentes os requisitos
necessários à concessão da medida liminar: relevância da fundamentação na
forma da verossimilhança do direito apregoado, e; lesão grave e de difícil
reparação (art. 1.019, I, NCPC). Recolhido o preparo.

Não houve intimação da parte contraria para


apresentar contraminuta e dispensadas as informações por tratar-se de matéria
estritamente de direito.

É o relatório.

O agravo não merece provimento.

Em que pese as alegações das agravantes sua


irresignação não merece prosperar, haja vista que restou demonstrado nos autos
que está havendo oposição de obstáculos ao ressarcimento dos prejuízos
causados aos consumidores, já que não existem saldos nas contas bancárias das
empresas e nem bens imóveis livres de constrição.

Assim, com efeito, ao caso se aplica o Código de Defesa


do Consumidor e a teoria da menor desconsideração da personalidade jurídica,
artigo 28, §5º, do CDC, segundo a qual a mera insolvência ou a existência de
obstáculos ao ressarcimento do consumidor permite a desconsideração, o que é
patente no caso.

Em outras, palavras, o presente processo, como se


disse, tem causa em relação de consumo, decorrente da prestação de serviços
decorrentes da incorporação, construção e comercialização de imóvel financiado,
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sendo certo que o art. 28 do CDC tem tratamento diferente do art. 50 do Código
Civil, dispondo aquele que: " o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da
sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso
de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato
social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado
de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má
administração ", e o seu § 5º que: " também poderá ser desconsiderada a pessoa
jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao
ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores ". Destarte, o mero estado
de insolvência e a ausência de bem penhorável da sociedade suficiente para a
garantia da execução, já admite a desconsideração.

Oportuna a transcrição jurisprudencial do STJ:

“ A teoria menor da desconsideração, acolhida em nosso


ordenamento jurídico excepcionalmente no Direito do
Consumidor e no Direito Ambiental, incide com a mera
prova de insolvência da pessoa jurídica para o
pagamento de suas obrigações, independentemente da
existência de desvio de finalidade ou de confusão
patrimonial .” (REsp 279.273/SP, Ministra Nancy
Andrighi, Terceira Turma. DJe 29-03-2004)

É possível, em linha de princípio, em se tratando de


vínculo de índole consumerista, a utilização da chamada
Teoria Menor da desconsideração da personalidade
jurídica, a qual se contenta com o estado de insolvência
do fornecedor, somado à má administração da empresa,
ou, ainda, com o fato de a personalidade jurídica
representar um 'obstáculo ao ressarcimento de prejuízos
causados aos consumidores' (art. 28 e seu § 5º, do
Código de Defesa do Consumidor) (REsp 1111153/RJ,
Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
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TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 04/02/2013)

Em outras palavras, com relação à demonstração de


fraude ou desvio patrimonial, é de se dizer que estes requisitos não são
necessários para a configuração da desconsideração quando se trata de relação de
consumo, como a dos autos.

Isto porque a relação de consumo adota a Teoria Menor


a Desconsideração da Personalidade Jurídica, bastando somente o fato de a
personalidade jurídica da empresa funcionar como obstáculo ao ressarcimento dos
prejuízos causados ao consumidor, sem ser necessária a prova da fraude ou abuso
de direito ou confusão patrimonial.

No caso, embora não se tenha notícia de inatividade ou


encerramento irregular das empresas executadas originárias, há evidente obstáculo
ao ressarcimento do prejuízo do consumidor, até porque as executadas nem sequer
indicaram a existência de bens livres e suficientes para serem penhorados, logo,
como consequência restaram configurados os requisitos autorizadores da
desconsideração da personalidade jurídica nos termos do art 28, §5º, do CDC.

Confira-se, ainda, precedentes deste E. Tribunal:

Compra e venda. Ação de indenização em fase de


cumprimento de sentença. Desconsideração da
personalidade jurídica. Relação de consumo. Aplicação
do art. 28 e do § 5º do referido artigo (Teoria Menor),
como instrumento ao ressarcimento dos danos
causados ao consumidor. Precedentes. Insolvência da
devedora caracterizada. Decisão mantida. Recurso
desprovido. O Código de Defesa do Consumidor
apresenta uma regra especial e ampliativa acerca das
hipóteses cabíveis de desconsideração, consoante
prescreve o art. 28, dentre elas a infração da lei ou a
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prática de ato ilícito, ou seja, ato que viole o dever


jurídico contratual, bem como o encerramento ou
inatividade da pessoa jurídica. E, mais específico o § 5º,
do art. 28 do CDC, que dispõe como acréscimo “também
poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre
que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo
ao ressarcimento de prejuízos causados aos
consumidores”. (AI 2010986-52.2018.8.26.0000, Rel.
Kioitsi Chicuta, j 06/03/2018)

“Cominatória c/c indenizatória de danos fundada na


compra e venda de veículo, em fase de cumprimento.
Desconsideração da pessoa jurídica. Admissibilidade a
fim de proteger o consumidor. Desconsideração
permitida com base na ampla previsão do art. 28, § 5º,
CDC, diante da relação consumerista identificada,
determinada a anterior citação dos sócios e
oportunizados contraditório e ampla defesa. Decisão
mantida. Agravo improvido” (Agravo de Instrumento nº
2238691-75.2017.8.26.0000, 34ª Câmara de Direito
Privado, Rel. Des. Soares Levada, J. 16.02.2018).

“Agravo de instrumento. Ação de rescisão contratual c/c


pedidos de devolução de valores e de indenização.
Decisão que, em cumprimento de sentença, deferiu a
desconsideração da personalidade jurídica da empresa
ré, ora executada. Insurgência. Possibilidade de
desconsideração da personalidade jurídica da
executada com fundamento no art. 28, 'caput' e § 5º, do
Código de Proteção ao Consumidor. Agravo não
provido” (Agravo de Instrumento nº
2247302-17.2017.8.26.0000, 35ª Câmara de Direito
Privado, Rel. Des. Morais Pucci, J. 23.01.2018)
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Diante de tais considerações, a r. decisão recorrida deve


ser mantida, pois em se tratando de relação de consumo, mostra-se cabível a
adoção da medida excepcional para decretar a desconsideração da personalidade
jurídica da executada originária, a fim de coibir sua conduta abusiva, fundada nos
obstáculos criados para inviabilizar a satisfação do consumidor.

Por fim, o fato de os co-agravantes ALAIN KORALL


HORN, GIONNY RONCO, RAPHAEL KORALL HORN serem administradores ou
diretores das empresas não impede a sua inclusão no polo passivo da execução,
em conjunto com ESSER HOLDING LTDA, GENERAL EMPREENDIMENTOS
IMOBILIÁRIOS LTDA. Ora, justamente em razão do cargo diretivo que ocupam nas
sociedades, somado aos elementos probatórios constantes dos autos, é que se
pode inferir serem partícipes direta no conluio fraudulento existente entre elas, bem
como o seu benefício próprio e pessoal.

Isto porque, todas as empresas, sócios e


administradores estão sediados no mesmo endereço, qual seja: RUA HADDOCK
LOBO, 1307, 14.ºANDAR, CERQUEIRA CESAR, SÃO PAULO/SP, como também
que todos os sócios pessoas físicas, figuram em todas as empresas do
conglomerado empresarial, o que demonstra, claramente, a formação de grupo
econômico.

Em suma, justifica-se a inserção das pessoas físicas no


polo passivo da presente demanda para responder pelo crédito do consumidor ora
agravado, nos termos do art 28, §5º, do CDC, já que, como bem salientou o MM
Juiz a quo , configurou-se a formação de grupo econômico fraudulento entre as
empresas envolvidas, nas quais detém participação societária e/ou cargos diretivos
de máxima relevância, tais como diretores e administradores.

Desse modo, pela análise dos elementos constantes


dos autos, além de haver uma evidente utilização da personalidade jurídica da ré
como um obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados aos
exequentes/consumidores, comprova-se a formação de grupo econômico entre a
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empresa originária e as suas sócias, pelo que se impõe a aplicação da regra do art.
28, §5º, do CDC.

Neste mesmo sentido já se posicionou este E. Tribunal


sobre caso idêntico:

“CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. RESCISÃO DE


CONTRATO DE COMPRA E VENDA.
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE
JURÍDICA. Decisão que desconsiderou a personalidade
jurídica da executada para incluir no polo passivo
empresas do mesmo grupo econômico. Insurgência das
empresas incluídas no polo passivo. Decisão mantida.
Efetivo exercício do contraditório na hipótese (art. 135 do
CPC). Desnecessidade de verificar abuso de direito ou
confusão patrimonial. Possibilidade de desconsideração
ante o mero estado de insolvência da empresa devedora
na hipótese de relação de consumo (art. 28 do CDC).
Provas e documentos dos autos sugerem que a
executada não possui bens para solver o débito.
Alegação de insolvência sequer controvertida, bem
como não indicados quaisquer bens a penhorar.
Empresas incluídas no polo passivo que integram o
mesmo grupo societário (art. 28, §2º, CDC). Mantida,
nesse cenário, a desconsideração da personalidade
jurídica. Recurso desprovido.” (TJSP; Agravo de
Instrumento 2222571-20.2018.8.26.0000; Relator (a):
Carlos Alberto de Salles; Órgão Julgador: 3ª Câmara de
Direito Privado; Foro de Jacareí - 1ª. Vara Cível; Data do
Julgamento: 11/12/2018; Data de Registro: 11/12/2018).

E mais: o instituto da responsabilidade limitada, prevista


no art. 1.052, CC, não prevalece ante o deferimento do pedido de desconsideração
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da personalidade jurídica.

Neste diapasão conclui-se que a r. decisão recorrida


está correta e deve ser integralmente mantida.

Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.

JOÃO FRANCISCO MOREIRA VIEGAS


Relator

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