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Ensino de Línguas Estrangeiras:

Valores, Atitudes e Aspectos Sociais


Professora Ms. Débora Izé Balsemão Oss (org.) [1];
Professores[2] Alexandre Ferronato, Aline Stapassoli Gomes,
Ana Paula Chies, Cristina Maria Pescador, Margarete Furlan, Renata Valiatti

Resumo—O ensino de línguas estrangeiras na rede de ensino passa por um momento de reavaliações no
que se refere às questões legais mas, especialmente, no que diz respeito a uma revisão das necessidades
dos adolescentes, aprendizes envolvidos nesse processo. Devido a essas adequações, professores de
línguas estrangeiras precisam rever aspectos relativos à sua prática, revisando abordagens e métodos
envolvidos no processo da aprendizagem de línguas. Além disso, há também a necessidade de buscar-se
um espaço que foi restringido por mais de meio século, através da atualização pedagógica, participação
em eventos e cursos de aperfeiçoamento, entre outras alternativas formativas. Este trabalho foi elaborado
com vistas ao compartilhamento de alguns aspectos teóricos e práticos que possam servir aos professores
atuantes nas redes pública e privada de ensino a conhecerem um pouco melhor a clientela de ensino
médio. Primeiramente, apresentamos uma visão geral das questões relacionadas aos aspectos legais do
ensino e formativos do adolescente, ampliando com uma breve visão histórica do ensino de línguas no
contexto educacional. Ao abordarmos os aspectos formativos, referimos aos valores agregados à
aprendizagem de línguas estrangeiras e como as atitudes dos adolescentes com relação à língua-alvo
podem influenciar a sua interação social. Na seqüência, vinculamos os aspectos teóricos desenvolvidos
anteriormente a atividades que proporcionam interações significativas dos aprendizes com o objeto de
estudo (língua inglesa ou espanhola) através da utilização de letras de música, de tarefas desenvolvidas
em ambiente virtual de aprendizagem e, finalmente, de uma releitura da linguagem corporal com vistas à
interpretação de algumas “pistas físicas” características dos jovens.

Palavras-chave: línguas estrangeiras, aprendizagem, atitudes, valores, interações significativas.

1. Introdução

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases do Ensino (Lei No. 9.394/96) e com base no documento
destinado especificamente ao ensino de línguas estrangeiras modernas (Parâmetros Curriculares
Nacionais Ensino Médio, Parte II - Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, 1998:24), “as línguas
estrangeiras modernas recuperam, de alguma forma, a importância que durante muito tempo lhes foi
negada”. Essa importância ‘negada’ deve-se ao fato de que, antes da reformulação da Lei, as línguas
estrangeiras modernas eram incorporadas ao currículo básico de ensino como atividades extras. Essa
condição levou, ao longo dos anos, a uma crescente desatenção/descaso por parte da escola e dos alunos
às tarefas relacionadas à disciplina de língua estrangeira moderna (LEM). Neste contexto, a necessidade
de inserção no mundo do trabalho serviu de gatilho para que o investimento na aprendizagem de línguas
estrangeiras (LE) fosse deslocado para cursos particulares e institutos de idiomas. Essas instituições, ao
detectarem no público adolescente um filão mercadológico, começaram a investir nesta faixa etária,
preenchendo, assim, uma carência da própria Escola.

Além dos aspectos mencionados acima, o ensino da LEM também foi prejudicado por um número
reduzido de horas destinadas à disciplina de LEM, pela carência de docentes adequadamente preparados
e pela inviabilidade na aquisição de material didático apropriado. Somou-se a isso, finalmente, a pouca
identificação do aluno de ensino médio com a aprendizagem de LEM na escola. A Lei de Diretrizes e
Bases do ensino (LDB) veio para, na medida do possível, reverter essa situação. Aos professores de LEM
cabe, então, a tarefa de investigar/avaliar a sua própria condição na docência: “quem é o meu aluno?”,
“qual a importância da LE para o futuro profissional destes jovens?” e, principalmente, “qual o papel do
ensino de LE na escola da era tecnológica?” Neste sentido, a escola precisa retomar o seu papel na
formação integral do jovem, inclusive no que diz respeito ao ensino de LEM, em um contexto que
permita ao aprendiz “o acesso a informações de vários tipos, ao mesmo tempo em que contribua para a
sua formação geral enquanto cidadão” (PCNs: 26).
2. O Adolescente, o Professor de LE e a Escola

A resposta à pergunta “quem é o meu aluno?” vem para agregar conhecimento básico ao profissional do
ensino médio. Pikunas (1979: 302) adverte que, ao estudarmos o adolescente, devemos considerar a
ambigüidade de sentimentos que o indivíduo dessa faixa etária experimenta. Nesta etapa, as necessidades
internas são freqüentes e poderosas, além de serem estimuladas pelo próprio meio social, que molda e
dirige a energia do jovem para padrões adequados ou inadequados de atividades e experiência. Os
conflitos e ambivalências em geral são fortes para a maioria dos jovens antes dos vinte anos. Pikunas
(1979:327) também observa que é difícil fazer declarações conclusivas a respeito da identidade
adolescente, que está muito envolvida com o aumento da autopercepção, que é levada à auto-avaliação
crítica e à rejeição de um comportamento dos anos recentemente passados. Os padrões de ajustamento e
a reorganização da personalidade denunciam o desenvolvimento fisiológico, sexual, emocional, social,
cognitivo e de valores do indivíduo. Em geral, o adolescente é profundamente sensibilizado para o seu
ambiente social e sua estrutura motivacional muitas vezes parece ser bastante contraditória. A alternância
entre a infantilidade (narcisista) e a juventude (altruísta), entre a hiper-atividade e o ócio, por exemplo,
podem ser comportamentos perfeitamente comuns. Há ainda, no comportamento do adolescente, a marca
entre a instabilidade e a falta de coerência. Em certos momentos, ele fica confuso no que tange aos seus
papéis, tarefas e obrigações. As surpresas agradáveis e os desapontamentos chocantes, o stress e as
alegrias seguem uma seqüência imprevisível.

Esses aspectos extralingüísticos apontados fazem parte de um conhecimento necessário ao profissional da


área que se interesse em trabalhar com o adolescente. Além desses, fatores psicolingüísticos são
apontados (Guiora et al: 1972b; Gardner: 1985; McLaughlin:1990a; Brown:1994; Dörnyei: 1994) como
responsáveis pelas atitudes e motivação para aprender uma LE. Guiora et al (1972b) propõem o conceito
de ego lingüístico para dar conta da identidade que o indivíduo desenvolve em relação à língua materna
que utiliza. Para qualquer pessoa monolíngüe, o ego lingüístico inclui a interação com a língua materna e
o desenvolvimento do ego. A sua auto-identidade é intrinsecamente ligada à sua língua e o
desenvolvimento do seu ego, pois ela está presente no processo comunicativo. Guiora et al (1972b)
sugerem que o ego lingüístico pode tornar-se defensivo e protetor devido às mudanças cognitivas, físicas
e emocionais simultâneas da puberdade, agarrando-se à segurança da língua materna.

Outro aspecto relevante a ser considerado dentre as características específicas da adolescência está a
maturação cognitiva. ‘Durante a puberdade, o adolescente atinge seu nível intelectual adulto’ (Pikunas:
1979, 292). A confiança na habilidade mental é crescente e o prazer proporcionado pelo pensar, pelo
aventar hipóteses, pelo experimentar, conduz o adolescente à aquisição de uma atitude teórica e bastante
crítica. Nesta fase, o jovem não confia mais nos julgamentos dos pais ou professores, mas prefere
formular suas próprias respostas. O concreto dá lugar à análise conceitual e, nesta fase, muitos
adolescentes já têm totalmente adquirido o pensar formal e as operações proposicionais. Isso significa
dizer que podem lidar com proposições verbais, além de combinar várias associações empíricas sobre as
quais as classes multiplicativas se baseiam em muitas maneiras possíveis. O jovem, nesta fase, trata da
maioria das operações formais, inclusive disjunção, incompatibilidade e várias formas de implicação e
exclusão; são capazes de estabelecer condições experimentais para a verificação de pressupostos simples.
As operações formais permitem ao jovem construir um grande número de possibilidades em um sistema,
inclusive proposições contrárias a um fato, e ele já raciocina objetivamente a respeito de seus
pensamentos (sobre a discussão LE e identidade, ver também Revuz, 1998).

Todos esses fatores são, muitas vezes, estopins para desentendimentos e/ou discussões entre professores e
alunos, ou ainda, situações constrangedoras que muitos professores não estão preparados para enfrentar.
O comportamento adolescente, baseado na sua maturidade cognitiva, o capacita a abordar, explorar e
aprender sobre novos objetos e assuntos. Essa maturidade, entretanto, entra em choque com as
necessidades de adequação física, sexual e social, que afetam o comportamento e a personalidade do
jovem. Dentre algumas necessidades, Pikunas (1979:310) aponta a necessidade de segurança—para o
desenvolvimento da autoconfiança e do autocontrole; a necessidade de status—no que se refere à
apreciação por parte da família, amigos, escola; e a necessidade de adequação—que inclui a adequação
física e social. A adequação social é o ponto propulsor para o desenvolvimento da comunicação
interpessoal, e normalmente as atividades facilitadoras de comunicação entre os pares servem para gerar
novos interesses e atitudes, ampliar pontos de vista e aumentar o conhecimento geral.

A resposta à indagação “qual a importância da LE para o futuro profissional destes jovens?” parece ser
auto-explicativa. Como é explicitado nos PCNs, há a preocupação de adequar-se o modelo educacional a
uma realidade em que as LEM estejam inseridas na formação básica do jovem justamente “pelo seu
caráter de sistema simbólico” e, “como qualquer linguagem, elas funcionam como meios para se ter
acesso ao conhecimento e, portanto, às diferentes formas de pensar, de criar, de sentir, de agir e de
conceber a realidade, o que propicia ao indivíduo uma formação mais abrangente e, ao mesmo tempo,
mais sólida.” (PCNs: 26)

Quanto à questão “qual o papel do ensino de LE na escola da era tecnológica?” temos que ter presente
que

“o que tem ocorrido ao longo do tempo é que a responsabilidade sobre o papel formador das aulas de
língua estrangeira tem sido, tacitamente, retirado da escola regular e atribuído aos institutos
especializados no ensino de línguas. Assim, quando alguém quer ou tem necessidade, de fato, de aprender
uma língua estrangeira, inscreve-se em cursos extracurriculares, pois não se espera que a escola média
cumpra essa função. Às portas do novo milênio, não é possível continuar pensando e agindo dessa forma.
É imprescindível restituir ao Ensino Médio o seu papel de formador. Para tanto, é preciso reconsiderar, de
maneira geral, a concepção de ensino e, em particular, a concepção de ensino de Línguas Estrangeiras.”
(PCNs: 27)

Some-se aos aspectos mencionados acima o que Leffa (1999) afirma, citando Negroponte (1995), “língua
é informação e a grande mudança que está ocorrendo atualmente no mundo da informação (...) é a
substituição do átomo pelo bit.” O professor de LE, neste contexto, precisa ser um profissional tão
informado quanto engajado para que possa ter a noção crítica do seu papel na formação dos jovens. Ele
precisa aprender e desenvolver novas habilidades e novas competências para, junto com “alunos que
nasceram em uma cultura que se clica, inserir-se no universo desses alunos.” (Perrenoud, 1997: 125)

3. O que a Lei Determina – A Escola Ontem e o que Acontece Atualmente

O ensino de línguas estrangeiras no Brasil, até meados da década de 90, não objetivava, de maneira geral,
permitir acesso à informação. Ao se apropriar de uma nova língua, o aluno não se apropriava também
dos seus bens culturais. A preocupação evidente era assimilar os aspectos gramaticais necessários.

Após a publicação da LDB, o ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna passou a se
constituir um componente curricular obrigatório a partir da quinta série do Ensino Fundamental. Desta
forma, o ensino da LE deve assegurar ao aluno do Ensino Fundamental e Médio a formação necessária ao
exercício da cidadania.

Deste ponto da história da educação em diante, o sistema educacional brasileiro passa a conhecer as
orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), um documento de referência curricular para
todo país que se concretiza nas propostas educacionais dos Estados e Municípios, no projeto político-
pedagógico de cada instituição escolar e na programação das atividades de ensino e de aprendizagem na
sala de aula. Cabe, assim, a cada Estado a elaboração de um referencial curricular comum a todas as
instituições escolares, com a finalidade de valorizar os aspectos regionais e promover educação com
eqüidade e qualidade.

Neste contexto abrangente, os educadores de todo país, inclusive os que trabalham com o ensino das
LEM, são orientados a acompanhar o processo de construção do conhecimento dos seus alunos, a
promover o desenvolvimento de competências e a aprimorar habilidades, respeitando as singularidades e
os conflitos. Neste contexto, o objetivo primordial do professor de LEM deve ser o de tornar possível que
o seu aluno atribua e produza significados, meta última do ato de linguagem. (Faraco, 2002: 93)

O Padrão Referencial de Currículo (1998), documento que visa nortear o fazer pedagógico a nível
estadual e municipal em todos os campos da educação básica, apresenta a proposta do Estado, que prevê
um ensino comprometido com o indivíduo. No que diz respeito ao ensino de LE, o Documento reitera a
importância da comunicação individual e grupal, da compreensão de valores, crenças e atitudes de outras
culturas, da valorização de conceitos e dos procedimentos de sua própria sociedade.

Segundo o Padrão Referencial de Currículo, o ensino de LEM já desde o Ensino Fundamental deve seguir
a tendência interativa comunicativa, privilegiando os aspectos cognitivos da aquisição, como as trocas de
informações, as formulações de juízos, a identificação de coisas, objetos, situações, a atribuição de
significados, a expressão de sentimentos, a intencionalidade comunicativa e o conhecimento prévio.

Assim, o aumento das possibilidades de compreensão e de utilização da LE decorre do conhecimento dos


mecanismos de uso próprios da língua, aliados à ampliação do vocabulário. Isso se dá pela exposição do
aluno aos múltiplos usos lingüísticos, no âmbito normativo ou não, de modo que ele possa incorporar, por
associações de semelhança ou antagonismo, novos vocábulos e conhecimentos ao acervo pré-existente.
(Faraco, 2002: 120). Neste sentido, ao permearmos o fazer pedagógico com aspectos capazes de
promover a aproximação dos conteúdos a serem estudados com situações cotidianas reais e com a
realidade do aluno, estaremos gerando o espaço propício à aprendizagem de conceitos e procedimentos
necessários à vida em sociedade.

Promover o ensino das LEM sob este prisma faz pensar sobre dois tópicos fundamentais. Faz pensar que
a aprendizagem acontece através da prática de ações complexas, com autonomia, segurança e através da
reflexão e da compreensão das questões sociais, do pensar sobre elas, de sua análise e da proposição de
alternativas. Além disso, a LE adquire um caráter mais funcional, aprimorando o conhecimento da
gramática e do vocabulário – desenvolvendo a habilidade de expressão oral e escrita – estimulando a
capacidade de ser um bom ouvinte em LE e aperfeiçoando a produção e a compreensão de novas idéias,
inclusive através da utilização de tecnologias da informação.

4. A Aprendizagem de LE em Ambiente Virtual

Os PCNs prevêem o impacto da informática na sociedade e no ensino da aprendizagem de LE e chamam


a atenção para o fato de que o acesso na escola a recursos típicos do mundo extraclasse (como revistas,
TV, vídeo, computador, etc.) contribui para a vinculação da sala de aula com o mundo exterior, onde o
mundo do trabalho inclui, entre suas exigências, o domínio do uso da tecnologia da informática e o
conhecimento de uma LE.

Acrescenta-se, dessa forma, mais um papel à escola: a possibilidade de o aluno desenvolver suas
habilidades utilizando a tecnologia em ambientes informatizados de aprendizagem. Esse novo papel da
escola não extingue aquele que lhe é conferido tradicionalmente: o de oportunizar um ambiente para que
o aluno possa construir seu conhecimento e desenvolver competências para se preparar para o mercado de
trabalho atual.

O trabalho desenvolvido em um ambiente virtual permite que o aluno traga sua individualidade para a
situação e manifeste-a de várias formas, através da simulação de uma situação real, seja ouvindo outros
colegas ou negociando o sentido do que está recebendo como insumo através de uma atividade
digitalizada. Essa negociação de significado e o esforço conjunto para buscar soluções representam um
momento único para que os alunos utilizem a LE em busca de compreensão de sentido e de eficiência na
sua própria capacidade de se fazer entender. E, tendo-se em mente características específicas do período
de desenvolvimento em que se encontra o aluno de Ensino Médio, o ambiente informatizado propicia
uma situação que atende a “uma das principais preocupações do professor de ensino secundário, de
manter a auto-estima dos seus alunos em alta, evitando situações de embaraço e possibilitando que
talentos e potencialidades individuais sejam valorizados, que erros sejam aceitos e que o risco à exposição
seja reduzido através do desenvolvimento de tarefas em pequenos grupos.” (Brown: 2001)

O ambiente virtual atende os cinco fatores citados por Gebhard (2000), que contribuem para transformar
“salas de aula interativas realmente interativas.” Estes fatores seriam: (i) redução da posição central (e
tradicional) do professor, (ii) valorização dos aspectos únicos de cada indivíduo; (iii) chances para os
alunos se expressarem de maneira significativa; (iv) oportunidades para os alunos negociarem significado
entre si e com o professor; e (v) oportunidade de escolha, tanto com relação ao que os alunos dizem como
à forma que o dizem.

A negociação do significado, neste contexto, somada ao esforço conjunto para buscar soluções, incentiva
professores e alunos a buscarem alternativas para a construção da competência comunicativa[3].

5. A Competência Comunicativa e os Aspectos Sócio-Culturais

“O espanhol e a cultura hispânica sempre suscitaram o interesse dos estrangeiros, porém nos últimos anos
esse interesse tem se desenvolvido de forma notável, a tal ponto que somente está superado pelo interesse
que desperta a língua inglesa. O que talvez justifique de forma mais clara tal afirmação são as atividades
em torno do ensino da língua espanhola. Estas possuem, em cada região do mundo e em cada país,
características e dimensões muito diferentes, resultando inadequada qualquer generalização. Há, no
entanto, uma nota comum em todas elas: nos últimos dez anos a demanda do ensino do espanhol se
multiplicou”. Fernandez, 1995

O estudo de uma língua estrangeira proporciona ao aluno o acesso a uma outra cultura, a uma nova
realidade social, regida por normas que provavelmente serão diferentes daquelas do grupo social que ele
faz parte. Sendo assim, aprender uma nova língua não é somente conseguir o domínio funcional de um
novo código lingüístico, mas ser capaz de interpretar e relacionar-se com uma realidade sócio-cultural
diferente. Assim, cabe salientar que ao facilitarmos a compreensão de aspectos culturais da língua alvo, o
aluno terá condições de realizar atividades que o levarão a refletir sobre as semelhanças e as diferenças da
sua realidade e a do contexto da LE.

Cada região, cada país, tem a sua própria cultura, estilo de vida, modo de pensar, sentir, acreditar, atuar
em sociedade. Sapir, Harris e Porcher (apud Santa Cecília, A.G.: 1995) resumem: “cultura é a soma total
da forma de viver e conceber a própria vida que tem um grupo social”. Riley (1996), aponta a cultura
como um saber que se desenvolve em três dimensões: saber o quê– conhecimentos políticos ou
religiosos, educação, história, geografia, etc.; saber sobre os sucessos, acontecimentos e preocupações
dessa sociedade; saber como atua essa sociedade (como chama ao telefone, como dança,..) e fala (como
agradece, cumprimenta, conta uma história, se comunica com seus superiores, ...).

Considerando esses pontos, cabe ao professor colocar o aluno diante de diferentes situações de
aprendizagem. É importante que o aluno seja informado sobre a riqueza cultural da língua e, no caso do
espanhol, sobre as diferentes nuances lingüísticas, culturais e sociais que são compartilhadas por
indivíduos pertencentes a diferentes nacionalidades e culturas. A compreensão de uma visão ampla sobre
os países hispânicos torna o conteúdo cultural um componente a mais na aprendizagem da LE como fonte
de enriquecimento educativo e pessoal.

O ensino de LE que tenha por objetivo capacitar o aluno para ser competente comunicativamente, deve
conceder um papel essencial ao componente cultural, como fator indispensável e indissociável à
aprendizagem da língua alvo. Os conteúdos sócio-culturais, quando inseridos nas propostas de
atividades, proporcionam uma aprendizagem que extrapola os aspectos lingüísticos. Quando a cultura
está presente nos textos, nas músicas, nas vinhetas ou mesmo em palavras isoladas, pode servir como um
referente sócio-cultural significativo no momento da aprendizagem da LE.
Finalmente, o objetivo do professor de LE é fazer com que seus alunos atinjam competência na
comunicação. Richard e Rogers (1986) apontam que a pessoa que adquirir conhecimento em relação à
formalidade ou informalidade da língua, adequabilidade de expressões, propriedade em relação a um
contexto e percepção sobre algo que foi dito, pode ser chamada de competente.

6. A Competência Comunicativa e a Música como Insumo de Compreensão Oral

A aprendizagem de língua que focaliza o entendimento contextual e cultural da significação dos textos
normalmente é facilitada pela exposição ao uso da língua em diferentes situações, interações, expressão
de crenças e sentimentos pessoais. Assim, a competência comunicativa complementa a competência
gramatical, ou seja, forma-se da relação entre o falante e o ouvinte, que por sua vez interpreta, expressa e
negocia significados em diferentes situações (Savignon: 1987). O professor de LEM, neste contexto, é o
facilitador do processo da compreensão oral, e deve proporcionar situações de aprendizagem que
promovam a autonomia dos alunos, através de uma abordagem dinâmica e da seleção de bons materiais.

Neste sentido, a utilização da música para o apoio ao desenvolvimento da competência comunicativa


pode ser considerada. Além de ser material autêntico, a música é um incentivador da autonomia do
aluno, que terá condições de selecionar esse tipo de insumo fora do ambiente de sala de aula,
proporcionando a si mesmo atividades de compreensão oral extensiva, ainda que inconscientemente. A
música também pode ser um excelente meio de internalizar e compreender a língua, pois o processo
mental que pertence à compreensão oral depende de atenção ativa, manipulação de contexto,
entendimento, interpretação e participação.

Considerando que professores usam a música em sala de aula de LE com uma variedade de razões,
podemos apontar as mais comuns: apresentar um tópico gramatical novo, um ponto lingüístico, praticar
vocabulário específico, encorajar os alunos à compreensão oral extensiva e intensiva, focalizar erros
específicos, estimulá-los à discussão de atitudes e sentimentos encorajando-os a usar a imaginação e
criatividade, desenvolvendo um ambiente relaxante e divertido e, portanto, motivador da aprendizagem
(Eken, 1996).

As atividades de compreensão oral devem ser adaptadas de maneira que desenvolvam a compreensão
comunicativa, com propósitos específicos aonde o aluno seja capaz de compreender a autenticidade dos
materiais e sua real aplicabilidade, cabendo ao professor também a tarefa de motivar os alunos.

Idealmente, as atividades devem ser apresentadas de acordo com o nível dos alunos, facilitando a
interação de todos, originando uma aprendizagem mais efetiva. Portanto, se o professor proporcionar aos
seus alunos um ambiente desafiador com atividades estimulantes, mais interessados estarão os alunos e os
resultados serão mais perceptíveis.

7. A Linguagem Corporal e os Adolescentes

A adolescência é um período de procura de identidade num espaço próprio no mundo. É um período de


crescimento psicológico, físico e afetivo. O equilíbrio psico-afetivo que tinha sido mantido até o período
de latência é transformado e entra-se num período de tumulto que se reflete na vida pessoal, na relação
consigo próprio, com o seu corpo e também na relação com os pais. Características do pensamento do
adolescente: pensamento mágico, questionamento da autoridade, criatividade, conformidade com o grupo,
insegurança e necessidade de apoio e sensibilidade à auto-estima. Isabel Lacerda

Os adolescentes pedem limites e, muitas vezes, esse pedido não é entendido. O pedido de limites ou de
ajuda que o adolescente transmite pode ser expresso através de mensagem verbal ou não-verbal. Na
mensagem verbal o adolescente fala muito, questiona, argumenta, mas nem sempre é o que está sentindo
ou acreditando. Na mensagem não-verbal, a relação com os outros sentidos é mais intensa e mais
vivencial, havendo uma dificuldade de compreensão por parte do adulto.
O profissional que trabalha com adolescentes necessita ter uma compreensão da linguagem e do ritmo do
grupo, uma vez que o adolescente também se comunica muito através de uma linguagem implícita,
própria do seu modo de ser e, por isso, nem sempre entendida. Noções de linguagem corporal são
importantes para a formação desse profissional. Ao identificarmos um gesto ou um movimento na
comunicação diária, como acenar para alguém na rua ou fazer sinal que vai telefonar mais tarde, estamos
utilizando a nossa linguagem não-verbal. Braços, mãos, pernas e expressões faciais, todos dizem algo que
não transparece na comunicação verbal. Cabe, portanto, ao educador decodificar esses sinais para
entender o adolescente e estabelecer comunicação de forma mais eficaz.

Inicialmente, é importante que tenhamos em mente que o comportamento adolescente se dá, quase
sempre, em relação direta ao comportamento do grupo. A partir daí, devemos considerar também que o
grupo tem necessidade de obter informações sobre o desempenho pessoal dos seus componentes: como é
a atmosfera do círculo de amizades, se existe confiança no líder, se existe maturidade, entre outros
aspectos.

A primeira lição da linguagem corporal ocorre nas atividades do nosso dia-a-dia, quando nos percebemos
dizendo coisas que, na verdade, não pensamos ou quando expressamos outras através do nosso corpo. Os
psicólogos explicam esses comportamentos através de uma teoria que coloca em questão o senso comum.
Este princípio, chamado dissonância cognitiva, pode ser entendido pela existência de elementos de
conhecimento que, de uma maneira ou de outra, são dissonantes e conduzem, da parte do indivíduo, a um
esforço para reduzir essa dissonância. Através desta linha de pensamento, podemos encontrar exemplos
da necessidade adolescente de sentir-se inserido, aceito e respeitado nas esferas de relacionamentos dos
adultos. Assim, para neutralizarmos a dissonância, dispomos de diversos meios: modificação do nosso
comportamento, mudança de opiniões, ou ainda, a incorporação de informações novas ao nosso estoque
de conhecimentos.

Tem-se, desse modo, que reconhecer que todo profissional que trabalhe diretamente com pessoas, é
responsável por muito mais do que transmitir e receber sinais pré-concebidos, esperados e fechados, na
medida em que o próprio educador é passível de coerências e incoerências nas suas interações. Ao
transmitir e receber mensagens precisa-se ter em mente a necessidade de se reconhecer que a linguagem
transmitida pelo corpo se sobressai sobre outras formas de comunicação, com grande vantagem. No
ensino de LEM, tanto o aluno quanto o professor estão expostos a uma aquisição de conhecimento que
ultrapassa a barreira lingüística. Pode-se fazer muita coisa com o conhecimento gramatical, estrutural,
fonético, mas a comunicação mais completa ocorre fora da sala de aula quando o aluno enfrenta um
ambiente real. Os diferentes contextos interacionais podem ser mais receptivos ou mais hostis,
dependendo das variantes culturais, sociais, históricas, econômicas, políticas, ou outras. Nestes casos
ocorrem trocas de sinais e de símbolos e o aluno passa a interagir com esse universo da maneira que ele
se apresenta.

Em uma micro-escala, podemos exemplificar o relacionamento que se dá no ambiente escolar. Apesar de


compartilhar a mesma língua para interagir, professores e alunos adolescentes parecem falar idiomas
diferentes, fazendo com que os resultados nem sempre venham ao encontro das expectativas das partes
envolvidas.

Finalmente, os educadores precisam compreender que cada ser é único e traz consigo bagagens da sua
vivência. Respeitando-se os limites e aceitando-se as diferenças de cada indivíduo toda tentativa de
ensino-aprendizagem já terá garantido seu êxito.

8. Conclusão

É essencial, pois, entender-se a presença das LEM inseridas em uma área, e não mais como uma
disciplina isolada no currículo. As relações que se estabelecem entre as diversas formas de expressão e de
acesso ao conhecimento justificam essa junção. Não nos comunicamos apenas pelas palavras; os gestos
dizem muito sobre a forma de pensar e as atitudes das pessoas, assim como as tradições e a cultura de um
povo esclarecem muitos aspectos da sua forma de ver o mundo e de aproximar-se dele. Assim, as
similitudes e diferenças entre as várias culturas, a constatação de que os fatos sempre ocorrem dentro de
um contexto determinado, a aproximação das situações de aprendizagem à realidade pessoal e cotidiana
dos estudantes, entre outros fatores, permitem estabelecer, de maneira clara, vários tipos de relações entre
as LE e as demais disciplinas que integram a área.

Tudo isto se dá através da operacionalização de uma educação desadequadora. Aquela que é


evidentemente criadora, que transforma, que trabalha sobre a pergunta/dúvida, que flui. Essa educação é
que vai inserir o aluno no mundo da transversalidade. É através dela que o aluno irá interagir com a sua
bagagem informacional, porque cada indivíduo é um... “um mundo humano” diferente que capta as coisas
de maneiras diferentes. Além disso, o universo humano é sempre carregado de sentido e é nessa
dialogicidade que se permite construir simplesmente porque as diferenças são respeitadas.

Do encontro das diferenças surgem os problemas que vão convocar as habilidades e inteligências dos
alunos e dos professores. E o ciclo reinicia a fim de que possamos vislumbrar as nossas atitudes, os
nossos valores e os aspectos sociais do contexto em que estamos inseridos, todos nós, aprendizes e
educadores.

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[1] Coordenadora da Disciplina de Línguas Estrangeiras Modernas CETEC/UCS

[2] Professores de Línguas Estrangeiras Modernas do CETEC/UCS

[3] Competência comunicativa é entendida aqui como a capacidade de o indivíduo comunicar-se


funcional e interativamente, produzindo e interpretando mensagens e negociando significados. O ensino
de LE na escola, portanto, deve prever insumo que proporcione a condição de o aluno identificar
situações para que a sua competência comunicativa seja desenvolvida/aperfeiçoada.

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