Você está na página 1de 32

Fausto – Por este Rio Acima (1982)

CD 01

01 – É O MAR QUE NOS CHAMA (2:46)


[Instrumental]

02 – O BARCO VAI DE SAÍDA (3:46)


O barco vai de saída
Adeus ó cais de Alfama
Se agora vou de partida
Levo-te comigo ó cana verde
Lembra-te de mim ó meu amor
Lembra-te de mim nesta aventura
P’ra lá da loucura
P’ra lá do Equador

Ah! mas que ingrata ventura


Bem me posso queixar
Da pátria a pouca fartura
Cheia de mágoas ai quebra mar
Com tantos perigos ai minha vida
Com tantos medos e sobressaltos
Que eu já vou aos saltos
Que eu vou de fugida

Sem contar essa história escondida


Por servir de criado a essa senhora
Serviu-se ela também tão sedutora
Foi pecado
Foi pecado
E foi pecado sim senhor
Que vida boa era a de Lisboa

[Solo]

Gingão de roda batida


Corsário sem cruzado
Ao som do baile mandado
Em terras de pimenta e maravilha
Com sonhos de prata e fantasia
Com sonhos da cor do arco-íris
Desvairas se os vires
Desvairas magia

Já tenho a vela enfunada


Marrano sem vergonha
Judeu sem coisa sem fronha
Vou de viagem ai que largada
Só vejo cores ai que alegria
Só vejo piratas e tesouros
São pratas são ouros
São noites são dias
Vou no espantoso trono das águas
Vou no tremendo assopro dos ventos
Vou por cima dos meus pensamentos
Arrepia
Arrepia
E arrepia sim senhor
Que vida boa era a de Lisboa

O mar das águas ardendo


O delírio dos céus
A fúria do barlavento
Arreia a vela e vai marujo ao leme
Vira o barco e cai marujo ao mar
Vira o barco na curva da morte
Olha a minha sorte
Olha o meu azar

E depois do barco virado


Grandes urros e gritos
Na salvação dos aflitos
Esfola, mata, agarra, ai quem me ajuda
Reza, implora, escapa, ai que pagode
Reza tremem heróis e eunucos
São mouros são turcos
São mouros acode

Aquilo é uma tempestade medonha


Aquilo vai p’ra lá do que é eterno
Aquilo era o retrato do inferno
Vai ao fundo
Vou ao fundo
E vai ao fundo sim senhor
Que vida boa era a de Lisboa

Que vida boa era a de Lisboa

03 – PORQUE NÃO ME VÊS (5:13)


Meu amor adeus
Tem cuidado
Se a dor é um espinho
Que espeta sozinho
Do outro lado
Meu bem desvairado
Tão aflito
Se a dor é um dó
Que desfaz o nó
E desata um grito
Um mau olhado
Um mal pecado
E a saudade é uma espera
É uma aflição
Se é Primavera
É um fim de Outono
Um tempo morno
É quase Verão
Em pleno Inverno
É um abandono

Porque não me vês


Maresia
Se a dor é um ciúme
Que espalha um perfume
Que me agonia
Vem me ver amor
De mansinho
Se a dor é um mar
Louco a transbordar
Noutro caminho
Quase a espraiar
Quase a afundar
E a saudade é uma espera
É uma aflição
Se é Primavera
É um fim de Outono
Um tempo morno
É quase Verão
Em pleno Inverno
É um abandono

[Solo]

04 – A GUERRA É A GUERRA (4:27)


Salto no escuro
Entre dentes trago a faca
E nos meus olhos coloridos
Juro
Vem ver o fogo no mar
Os peixes a arder

Ó Ana vem ver


Ó Ana vem ver
Ó Ana vem ver

Voando em arco
Esgueiro o corpo num balanço
Como um piloto do inferno
Assalto
Nas asas guerreiras de um anjo
Seja louvado

Atacamos mui baralhados


Como um bando
Endiabrado
Por Jesus na sua cruz
Chora por mim ó minha infanta
Escorre sangue o céu e a terra
Ah pois por mais que seja santa
A guerra é a guerra

Malaca, Malaca
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Nos dentes a faca

Avanço e avanço
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Balanço, balanço

Cruzado cruzado
A guerra é a guerra
No céu e na terra
O mais enfeitado
Largar largar
O fogo no mar

Seja bendito
De todos o mais enfeitado
Olha p’ra mim o mais guerreiro
Ao vivo
Olha p’ra mim o teu amado
E o céu a arder

Ó Ana vem ver


Ó Ana vem ver
Ó Ana vem ver

Barcos em chamas
Erguidas
Parecia coisa sonhada
Queimados
Os gritos horrendos da besta
Ferida

Que lá dentro ardiam homens


Encurralados
E cá fora à cutilada
Decepados
P’la calada
Pelos peitos já desfeitos

Chora por mim ó minha infanta


Escorre sangue o céu e a terra
Ah pois por mais que seja santa
A guerra é a guerra

Malaca, Malaca
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Nos dentes a faca

Avanço e avanço
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Balanço, balanço

Cruzado cruzado
A guerra é a guerra
No céu e na terra
O mais enfeitado
Largar largar
O fogo no mar

Foge saloio, eh parolo


Aguenta António de Faria
E a fidalguia
Todo o massacre e todo o desconsolo
Que já lá vem o Coja Acém
E o mar a arder

Ó Ana vem ver


Ó Ana vem ver
Ó Ana vem ver

Diz-nos adeus o pirata


O labrego
Lá de cima daquele mastro
Trocista e airoso
Mostrando o traseiro cafre
Preto escuro de um negro

Levando-nos couro e tesouro


Rindo de gozo
Perdeu-se o resto na molhada
Pelo estrondo
Na quebrada
No edema da gangrena

Chora por mim ó minha infanta


Escorre sangue o céu e a terra
Ah pois por mais que seja santa
A guerra é a guerra

Malaca, Malaca
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Nos dentes a faca

Avanço e avanço
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Balanço, balanço

Malaca, Malaca
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Nos dentes a faca

Avanço e avanço
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Balanço, balanço

Cruzado cruzado
A guerra é a guerra
No céu e na terra
O mais enfeitado

Malaca, Malaca
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Nos dentes a faca

Avanço e avanço
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Balanço, balanço

Cruzado cruzado
A guerra é a guerra
No céu e na terra
O mais enfeitado

Malaca, Malaca
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Nos dentes a faca

Avanço e avanço
A guerra é a guerra
No céu e na terra
Balanço, balanço

05 – DE UM MISERÁVEL NAUFRÁGIO QUE PASSÁMOS (3:05)


O escuro é muito grande
O tempo é muito frio
O mar é muito grosso
O vento é muito rijo
As águas são cruzadas
As vagas levantadas

Eh bruto corta-me esses mastros


Aguenta a popa e vira a proa
Ajusta-me esses calabretes
Baldeietas feitas à toa

Descarrega este convés


Saltam braços, voam pés
Um vinto pr’arranjar um estardalhaço
Os corpos atirados em pedaços
Dão à costa
Pela encosta

Chuna-nos a nossa perdição


Dei-lhe muitas bofetadas
Ainda afogo, sim senhor
Daqui vendo um charco d’água
Gritámos amarras ao Salvador

O escuro é muito grande


O tempo é muito frio
O mar é muito grosso
O vento é muito rijo
As águas são cruzadas
As vagas levantadas

Salve-se agora quem puder


Por entre feridos e aflitos
As calças banhadas em sangue
Mordem atabões e mosquitos

Gritam mudos ouvem-se curdos


Em trejeitos absurdos
Um marin negro de cabeça toda aberta
Com os miolos todos podres quase inerte
Num boeiro
Ai que cheiro

E abraçado a mim logo expirou


Cobradores aí por questão
O que muito nos consolou
Não ter que o levar às costas
Enterrado, abençoado e lá ficou

O escuro é muito grande


O tempo é muito frio
O mar é muito grosso
O vento é muito rijo
As águas são cruzadas
As vagas levantadas

Estando nós em grande perigo


Num enorme desvario
Anda a nau dos marinheiros
E a pouco mais de meio rio

Arremeteram contra eles


Dois lagartos muito grandes
Que os esfarraparam todos em bocados
Com a convista ficámos assombrados
Ai socorro
Ai que eu morro

Livra que nos fomos logo a pique


E subitamente ao fundo
Com um rinco pela mão (ooh)
Tão pasmado e caladinho
Vais lá por dentro a cantar o cantochão

06 – COMO UM SONHO ACORDADO (6:04)


Como se a Terra corresse
Inteirinha atrás de mim
O medo ronda-me os sentidos
Por abaixo da minha pele
Ao esgueirar-se viscoso
Escorre pegajoso
E sai
Pelos meus poros
Pelos meus ais

Ele penetra-me nos ossos


Ao derramar-se sedento
Nas entranhas sinuosas
Entre as vísceras mordendo
Salta e espalha-se no ar
Vai e volta
Delirante
Tão delirante
É como um sonho acordado
Esse vulto besuntado
A revolver-se no lodo
A deslizar de uma larva
Emergindo lá ao fundo
Tenho medo ó medo
Leva tudo é tudo teu
Mas deixa-me ir

Arrasta-me à côncava do fundo


Do grande lago da noite
Cruzando as grades de fogo
Entre o Céu e o Inferno
Até à boca escancarada
Esfaimada
Atrás de mim
Atrás de mim
É como um sonho acordado
Esses olhos no escuro
Das carpideiras viúvas
Pelo pai assassinado
Desventrado por seu filho
Que possuiu lascivo
A sua própria mãe
E sua amante

Meu amor quando eu morrer


Ó linda
Veste a mais garrida saia
Se eu vou morrer no mar alto
Ó linda
E eu quero ver-te na praia
Mas afasta-me essas vozes
Linda

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Arrasta-me à côncava do fundo


Do grande lago da noite
Cruzando as grades de fogo
Entre o Céu e o Inferno
Até à boca escancarada
Esfaimada
Atrás de mim
Atrás de mim
É como um sonho acordado
Esses olhos no escuro
Das carpideiras viúvas
Pelo pai assassinado
Desventrado por seu filho
Que possuiu lascivo
A sua própria mãe
E sua amante

Meu amor quando eu morrer


Ó linda
Veste a mais garrida saia
Se eu vou morrer no mar alto
Ó linda
E eu quero ver-te na praia
Mas afasta-me essas vozes
Linda

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes
Tens medo dos vivos
E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

Tens medo dos vivos


E dos mortos decepados
Pelos pés e pelas mãos
E p’lo pescoço e pelos peitos
Até ao fio do lombo
Como te tremem as carnes
Fernão Mendes

07 – A ILHA (4:42)
Olhamos tudo em silêncio na linha da praia
De olhos na noite suspensos do céu que desmaia
Ai lua nova de Outubro, trazes as chuvas e ventos
A alma a segredar, a boca a murmurar tormentos

Descem de nuvens de assombro taínhas e bagres


Se as aves embalam os peixes em certos milagres
Levita-se o corpo da alma, no choro das ladainhas
Na reza dos condenados, nas pragas dos sitiados

Na ilha dos ladrões, quem sai?


E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus

Livra-me da fome que me consome, deste frio


Livra-me do mal desse animal que é este cio
Livra-me do fado e se puderes abençoado
Leva-me a mim a voar pelo ar

Como se houvesse um encanto, uma estranha magia


O sol lentamente flutua nas margens do dia
Despe o meu corpo corsário, seca-me a veia maruja
Morde-me o peito aos ais, das brigas, dos punhais
Da ilha dos ladrões, quem sai?
E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus

Livra-me da fome que me consome, deste frio


Livra-me do mal desse animal que é este cio
Livra-me do fado e se puderes abençoado
Leva-me a mim a voar pelo ar

Andamos nus e descalços, amantes, sedentos


Se o véu da noite se deita na curva do tempo
Ai lua nova de Outubro, os medos são medos das chuvas e ventos
Da alma a segredar, da boca a murmurar

Adeus

08 – A VOAR POR CIMA DAS ÁGUAS (3:56)


Ó ai meu bem
Como baila o bailador
Ó meu amor
A caravela também
Ó bonitinha
Ai que é das penas
Que é das mágoas
Sendo nós como a sardinha
A voar por cima das águas
 
Vai de roda quem quiser
E diga o que é que tem a dizer (Certo!)
Sonhei muitos muitos anos por esta hora chegada
De Lisboa para a Índia vou agora de abalada

Mas em frente de Sesimbra


Logo um corsário francês
Nos atirou para Melides
Com o barco feito em três
E por Deus e por El-Rei
Que grande volta que eu dei
 
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo

Ó ai meu bem
Como baila o bailador
Ó meu amor
A caravela também
Ó bonitinha
Ai que é das penas
Que é das mágoas
Sendo nós como a sardinha
A voar por cima das águas
 
Ena que alegria enorme (Eh!)
Uns mais ou menos conforme (Certo!)
Mas que terras maravilha
Mais parece uma aguarela
Que eu vejo da minha barca
Branca, azul e amarela

A Lua dormia ali


E com o sol é tal namoro
Que as montanhas estavam prenhas
E pariam prata e ouro
Com Jesus no coração
Faz as contas ó Fernão!
 
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo

Ó ai meu bem
Como baila o bailador
Ó meu amor
A caravela também
Ó bonitinha
Ai que é das penas
Que é das mágoas
Sendo nós como a sardinha
A voar por cima das águas

Mais que levava não bailar (huu!)


Que andamos tão baralhados (Certo!)
Nunca vi bichos medonhos tão soltos e atrevidos
Que nos fomos logo a pique
Com o bafo dos seus grunhidos

Todo nu sobre o manedo


De mãos postas a rezar
Até me tremiam as carnes
Por os não ter no lugar
Ainda por cima a chover
Vejam lá o meu azar

Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo

Ó ai meu bem
Como baila o bailador
Ó meu amor
A caravela também
Ó bonitinha
Ai que é das penas
Que é das mágoas
Sendo nós como a sardinha
A voar por cima das águas

Eh valente rapazinho (Ahh!)


A cantar ao desafio (Certo!)
Matei mouros malabares
Quem foi à guerra fui eu
Afundei grandes armadas no cargueiro Taseu

Mas ao ver o cu do mouro


Feito ossos de candifado
Até pescanejei
De todo o tive a bordo
Siga a roda sem parar
Que a gente vai a rolar

Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo

Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo
Ó é tão lindo

09 – OLHA O FADO (3:38)


Eu cá sou dos Fonsecas
Eu cá sou dos Madureiras
De fero e puro sangue
O que me corre nas veias

Nasci da paixão temporal


Do parto dos vendavais
Cresço no fragor da luta
Numa força bruta
Para além dos mortais

Mas tenho muitas saudades


De certas penas e desejos
E aquela louca ansiedade
Como um pecado
Meu amor se te não vejo

Olha o fado

Ora é tão vingativo


Ora tão paciente
Amanhã é comedor
Hoje abstinente
Mentiroso alcoviteiro
Doce e verdadeiro
Uma vez conquistador
Outra vez vencido
Amanhã é navegante
Hoje é desvalido
Sensual aventureiro
Doido e bandoleiro

Eu cá sou dos Fonsecas


Eu cá sou dos Madureiras
De fero e puro sangue
O que me corre nas veias

Nasci da paixão temporal


Do parto dos vendavais
Cresço no fragor da luta
Numa força bruta
Para além dos mortais

Mas tenho muitas saudades


De certas penas e desejos
E aquela louca ansiedade
Como um pecado
Meu amor se te não vejo

Olha o fado

Ora é tão vingativo


Ora tão paciente
Amanhã é comedor
Hoje abstinente
Mentiroso alcoviteiro
Doce e verdadeiro

Uma vez conquistador


Outra vez vencido
Amanhã é navegante
Hoje é desvalido
Sensual aventureiro
Doido e bandoleiro

Somos capitães, somos Albuquerques


Nós somos leões, os lobos do mar
De olhos pregados nos céus
De cima dos chapitéus

Somos capitães, somos Albuquerques


Nós somos leões dos lobos dos mares
E na verdade o que nos dói
É que não queremos ser heróis

Somos capitães, somos Albuquerques


Nós somos leões, os lobos do mar
De olhos pregados nos céus
De cima dos chapitéus

Somos capitães, somos Albuquerques


Nós somos leões dos lobos dos mares
E na verdade o que nos dói
É que não queremos ser heróis

Somos capitães, somos Albuquerques


Nós somos leões, os lobos do mar
De olhos pregados nos céus
De cima dos chapitéus

Somos capitães, somos Albuquerques


Nós somos leões dos lobos dos mares
E na verdade o que nos dói
É que não queremos ser heróis

CD 02

01 – POR ESTE RIO ACIMA (4:58)


Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
Leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima

Por este rio acima


Os barcos vão pintados
De muitas pinturas
Descrevem varandas
E os cabelos de Inês
Desenham memórias
Ao longo da água
Bosques enfeitiçados
Soutos laranjeiras
Campinas de trigo
Amores repartidos
Afagam as dores
Quando são sentidos
Monstros adormecidos
Na esfera do fogo
Como nasce a paz
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
Meu bem

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
Meu bem

Por este rio acima


Isto que é de uns
Também é de outros
Não é mais nem menos
Nascidos foram todos
Do suor da fêmea
Do calor do macho
Aquilo que uns tratam
Não hão-de tratar
Outros de outra coisa
Pois o que vende o fresco
Não vende o salgado
Nem também o seco
Na terra em harmonia
Perfeita e suave
Das margens do rio
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
Meu bem

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
Meu bem

Por este rio acima


Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
Leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima

Por este rio acima

[Solo]

02 – O CORTEJO DOS PENITENTES (6:20)


No cortejo dos penitentes
Vão culpados pecadores da gula
Vão culpados da sensualidade
Castigados até à medula

Vão os tíbios e frouxos no amor


Imaculados como o Criador
Vão culpados por abstinência
Vão culpados das suas carências

No cortejo dos penitentes


Os homens cortam suas próprias carnes
São ofertas que fazem aos céus
Ao mais alto de todos os céus

No cortejo dos penitentes


Os sacerdotes da austera vida
Vão contentes e muito enfeitados
Sobre as cinzas dos sacrificados

E cantam louvores ao Deus

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto
Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

No cortejo os penitentes
Bebem tragos de bebida amarga
Da urina que depois vomitam
Pela noite mal aventurada

No cortejo os penitentes
Comem postas de sangue coalhado
Da sangria dos outros romeiros
Suavemente mutilados

E cantam louvores ao Deus

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

Abranda Senhor
A pena dos mortos
P’ra que te louvem
Com sono quieto

[Solo]

03 – O ROMANCE DE DIOGO SOARES (5:34)


Diogo Soares
O grande general
Chamado “o Galego”
O homem dos olhares fatais

Comanda sessenta mil homens


De terras estranhas
Vencedo e lutando
Por quem paga mais

Eficaz nos sermões


Insinuante pois
Ganhou a simpatia
De príncipes e samurais

Já é governador
Do reino de Pegu
Mais forte do que o rei
Mais rico por golpes mestrais

Naquela cidade
Vivia um mercador
De nome Mambogoá
De fortuna sem fim

E naquele dia
O dia das bodas
Casava uma filha
Com Manica Mandarim

Diogo Soares
Passou por ali
Ao saber da festa
Felicitou noivos e pais

E a noiva tão linda


Ofereceu-lhe um anel
Agradecendo a honra
Por gestos puros e sensuais

Então o galego
Em vez de guardar
O devido decoro
Prendeu-o e disse-lhe assim:

Ó moça formosa
És minha, só minha
A ninguém pertences
A ninguém, senão a mim

O pai Mambogoá
Ao ver pegar o bruto
Tão rijo na filha
Ouvindo este insulto de espanto

Levantou as mãos aos céus


Os joelhos em terra
No retrato da dor
Pedindo e implorando num pranto

Eu peço-te Senhor
Por reverência a Deus
Que adoras concebido
No ventre sem mancha e pecado

Não tomes minha filha


Não leves meu tesouro
Que eu morro de paixão
Que eu morro tão abandonado

Mas Diogo Soares


Mandou matar o noivo
Que chorava abraçado
À moça assustada tremendo

E a noiva estrangulou-se
Numa fita de seda
Antes que a possuísse
À força o sensual galego

A terra e os ares
Tremeram com os gritos
Do choro das mulheres
Tamanhos que metiam medo

E o pai Mambogoá
Pedindo pelas ruas
Justiça ao assassino
Acorda a cidade em sossego

Ó gentes Ó gentes
Saí como raios
Na ira das chuvas
Na ventania do açoite

E o fogo consuma
Seus últimos dias
E lhe despedace
As carnes no meio da noite

Em menos de um credo
Numa grande grita
P’lo amor dos aflitos
Juntou-se ao velho o povo inteiro

Com tamanho furor


E sede de vingança
Arrastaram-no preso
Diogo Soares ao terreiro

E o povo a clamar
Que a sua veia seja
Tão vazia de sangue
De quanto está o inferno cheio

E subiu ao cadafalso
Cada degrau beijou
Murmurando baixinho
O nome de Jesus a meio

Seu filho Baltasar Soares


Que vinha de casa
O qual vendo assim
Levar seu pai

Lançou-se aos seus pés


A chorar
E por largo tempo abraçados
No abraço dos mortais

Senhor porque vos levam


Cruéis e vingativos
Senhor porque vos batem
E porque vos matam medonhos?

Pergunta-o aos meus pecados


Que eles to dirão
Que eu vou já de maneira
Que tudo me parece um sonho

E foram tantas pedras


Sobre o padacente
Que este morreu bramindo
O rosário dos seus pecados

Ensopado na baba
Do ódio dos homens
Escuma animal
De todos os cães esfaimados

As crianças e os moços
Trouxeram seu corpo
Sem vida pelas ruas
Arrastado pela garganta
E a gente dava esmola
Oferecida aos meninos
Dava como se fosse
Uma obra muito pia e santa

Assim terminam os anais


Do grande general
Chamado o “Galego”
O homem dos olhares fatais

04 – NAVEGAR, NAVEGAR (4:98)


Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Quem conquista sempre rouba


Quem cobiça nunca dá
Quem oprime tiraniza
Naufraga mil vezes
Bonita eu sei lá

Já vou de grilhões nos pés


Já vou de algemas nas mãos
De colar no pescoço
Perdido e achado
Vendido em leilão

Eu fui a mercadoria
Lá na praça do Mocá
Quase às avé-marias
Nos abismos do mar

Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Já é tempo de partir
Adeus morenas de Goa
Já é tempo de voltar
Tenho saudades tuas
Meu amor de Lisboa

Antes que chegue a noite


Que vem do cabo do mundo
Tirar vidas à sorte
Do fraco e do forte
De cima e do fundo

Trago um jeito bailarino


Que apesar de tudo baila
No meu olhar peregrino
Nos abismos do mar

Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Navegar navegar
Mas ó minha cana verde
Mergulhar no teu corpo
Entre quatro paredes
Dar-te um beijo e ficar
Ir ao fundo e voltar
Ó minha cana verde
Navegar navegar

Ai navegar
Ó cana verde
E no teu corpo
Entre quatro paredes
Ai dar-te um beijo
E ir ao fundo
Ó cana verde
Ai navegar navegar

Ai navegar
Ó cana verde
E no teu corpo
Entre quatro paredes
Ai dar-te um beijo
E ir ao fundo
Ó cana verde
Ai navegar navegar

Ai navegar
Ó cana verde
E no teu corpo
Entre quatro paredes
Ai dar-te um beijo
E ir ao fundo
Ó cana verde
Ai navegar navegar

Ai navegar
Ó cana verde
E no teu corpo
Entre quatro paredes
Ai dar-te um beijo
E ir ao fundo
Ó cana verde
Ai navegar navegar

Ai navegar
Ó cana verde
E no teu corpo
Entre quatro paredes
Ai dar-te um beijo
E ir ao fundo
Ó cana verde
Ai navegar navegar

Ai navegar
Ó cana verde
E no teu corpo
Entre quatro paredes
Ai dar-te um beijo
E ir ao fundo
Ó cana verde
Ai navegar navegar

05 – O QUE A VIDA ME DEU (3:39)


Ó mar
Leva tudo o que a vida me deu
Tudo aquilo que o tempo esqueceu
Leva que eu vou voltar
Ó mar

Como quem vem


Regressa ao fundo
Do ventre da mãe

Tão indiferente
Consumista na força bravia
Todo o encanto das coisas que havia
E lançaste na praia ardente

Náuseas e pragas
Despojos de almas
As carnes em chagas
As mágoas

Condenaste-me à noite
De sangue e fogo
E vento e sombras
Ao teu quebranto

Mas deixa-me ao menos


O corpo despido
Em descanso

Ó mar
Lago imenso de oceanos salgados
Onde os rios também naufragados
Vão por fim descansar
Ó mar

Tecem murmúrios
Sensuais
Como os amantes
Depois
Repousam em paz

No teu ciúme
Ó sereia do braço da ira
Seduziste na tua mentira
E arrastaste contigo o mundo

Todos os sonhos
Os meus desejos
Os suaves Outonos
O Tejo

São saudades que eu tenho


Leve memória
Do que já fui
Que já não sou

Mas se tudo levaste


Leva enfim esta dor
Que ficou

Ó mar
Lago imenso de oceanos salgados
Onde os rios também naufragados
Vão por fim descansar
Ó mar

Como quem vem


Regressa ao fundo
Do ventre da mãe

06 – LEMBRA-ME UM SONHO LINDO (6:28)


Lembra-me um sonho lindo quase acabado
Lembra-me um céu aberto outro fechado
Estala-me a veia em sangue, estrangulada
Estoira no peito um grito, à desfilada

Canta rouxinol canta, não me dês penas


Cresce girassol cresce, entre açucenas
Afaga-me o corpo todo, se te pertenço
Rasga-me o ventre ardente, em fumos de incenso

Lembra-me um sonho lindo quase acabado


Lembra-me um céu aberto outro fechado
Estala-me a veia em sangue, estrangulada
Estoira no peito um grito, à desfilada

Ai como eu te quero
Ai de madrugada
Ai alma da terra
Ai linda assim deitada
Ai como eu te amo
Ai tão sossegada
Ai beijo o teu corpo
Ai seara tão desejada

[Solo]

Canta rouxinol canta, não me dês penas


Cresce girassol cresce, entre açucenas
Afaga-me o corpo todo, se te pertenço
Rasga-me o ventre ardente, em fumos de incenso

Ai como eu te quero
Ai de madrugada
Ai alma da terra
Ai assim deitada

Lembra-me um sonho lindo quase acabado


Ai como eu te amo
Lembra-me um céu aberto outro fechado
Ai tão sossegada
Estala-me a veia em sangue, estrangulada
Ai beijo o teu corpo
Estoira no peito um grito, à desfilada
Ai seara tão desejada

Canta rouxinol canta, não me dês penas


Ai como eu te quero
Cresce girassol cresce, entre açucenas
Ai de madrugada
Afaga-me o corpo todo, se te pertenço
Ai alma da terra
Rasga-me o ventre ardente, em fumos de incenso
Ai linda assim deitada

Lembra-me um sonho lindo quase acabado


Ai como eu te amo
Lembra-me um céu aberto outro fechado
Ai tão sossegada
Estala-me a veia em sangue, estrangulada
Ai beijo o teu corpo
Estoira no peito um grito, à desfilada
Ai seara tão desejada

Canta rouxinol canta, não me dês penas


Ai como eu te quero
Cresce girassol cresce, entre açucenas
Ai de madrugada
Afaga-me o corpo todo, se te pertenço
Ai alma da terra
Rasga-me o ventre ardente, em fumos de incenso
Ai linda assim deitada

[Solo]
Lembra-me um sonho lindo quase acabado
Ai como eu te amo
Lembra-me um céu aberto outro fechado
Ai tão sossegada
Estala-me a veia em sangue, estrangulada
Ai beijo o teu corpo
Estoira no peito um grito, à desfilada
Ai seara tão desejada

Canta rouxinol canta, não me dês penas


Ai como eu te quero
Cresce girassol cresce, entre açucenas
Ai de madrugada
Afaga-me o corpo todo, se te pertenço
Ai alma da terra
Rasga-me o ventre ardente, em fumos de incenso
Ai linda assim deitada

07 – QUANDO ÀS VEZES PONHO DIANTE DOS OLHOS (7:36)


Quando às vezes ponho diante dos olhos
A lusitana viagem medonha que eu dobrei
Os tormentos passados e os fados que chorei
Arde o corpo em oração entre pecado e perdão
Agonia o coração e arde o corpo

O cotovelo da Terra, a pestana do Mundo


Fui treze vezes cativo, dezassete vendido
Mataram os mares, milhares no gemido
Ai de mim, sou missionário
Foge cafre, já sou corsário
Marinheiro, voluntário, ai de mim

Quando às vezes ponho diante dos olhos


A fúria da onda tremendo, a rasgada no vento
O assombro da fronha, de um monstro que horrenda
Estampada no breu
Ai meu Deus, o aperto em que estou

(Olha pr’ó prior)


Olha o bobo que eu sou
(Que se escapa no sonho)
Que me dá a fraqueza
(Enriquece Badio)
A saudade do Tejo

(Inventai uma presa)


Meu amor dá-me um beijo
(Afasta o sentido)
E lá vou eu desvalido
Quando às vezes ponho diante dos olhos
Os trabalhos tremendos e os perigos que passei
O inferno maldito infinito que afrontei
Vem à boca uma prece, a alma inteira estremece
Arde, grita, enlouquece e vem à boca

Um amargo de morte arrefece-me o corpo


Um grande medo meu Deus que estala no peito
Só o meu coração respira a amores-perfeitos
Que eu nem conto em segredo, o que eu risquei do enredo
Num latino arremedo que eu nem conto

Quando às vezes ponho diante dos olhos


Cobras, lagartos mostrengos, horríveis sarnentos
O delírio dos rios das selvas ardentes da febre a queimar
A matar
Terra à vista atenção

(Espia pouco mercador)


Eu cá sou benfeitor
(Assalta como ladrão)
Olha o rombo na quilha
(Olha a tua quadrilha)

Quem me dera estar longe


(É de pôr-lhe ao machado)
Ser um anjo, ser monge
(Aguenta safado)
Sendo o mais enjeitado

(De Lisboa para a Índia)


(Da Tartária ao Sião)
(Da China à Etiópia)
(De Ormuz ao Japão)

(Do cabo do mundo)


(Passei por um triz)
(Da ilha maluca)
(À arábia feliz)

(São de todas as cores)


(As paixões, os ardores)
(Na voragem do cio)
O amor aplacado
Entre esteiras deitado
No porão do navio
Vai o sonho entornado

Quando às vezes ponho diante dos olhos


As guerras, assaltos e gritas, o sangue a jorrar
A lacar os turcos, Senhora bendita, lançados ao mar
A afundar
Tangendo panelas
(Para o diabo que os leve)
Infiéis tagarelas
(Filhos de Mafamé)
Ai da vossa cegueira
(Dispara os roqueiros)

No rescaldo da afronta
(Abordai, sois escravo)
Rezo pela desconta
(És cruzado, és o pago)
Dos pecados sem conta

(De Lisboa para a Índia)


(Da Tartária ao Sião)
(Da China à Etiópia)
(De Ormuz ao Japão)

(Do cabo do mundo)


(Passei por um triz)
(Da ilha maluca)
(À arábia feliz)

(São de todas as cores)


(As paixões, os ardores)
(Na voragem do cio)
(O amor aplacado)
(Entre esteiras deitado)
(No porão do navio)
(Vai o sonho entornado)
(Foi de fio a pavio)

(Para o diabo que os leve)


(Infiéis tagarelas)
(Filhos de Mafamé)
(Ai da vossa cegueira)
(Dispara os roqueiros)
(Abordai, sois escravo)
(És cruzado, és o pago)
(Espia pouco mercador)
(Assalta como ladrão)
(Olha o rombo na quilha)
(É de pôr-lhe ao machado)
(Olha a tua quadrilha)

(Aguenta safado)
(Dos pecados sem conta)
(És o mais enjeitado)
(Do aperto em que estás)
(Olha o cobre e o ouro)
(Que se escapa do sonho)
(Que te dá a fraqueza)
(Enriquece Badio)
(No rescaldo da afronta)
(Há que atacar este cabo longe)
(Sem um anjo, cem bons)
(Rezam pela desconta)
(Entre pulos e gritas)

(Tu não sabes cantar)


(Trégua bom jesuíta)
(Há Jesus que embrulhar)
(Em pouco mais que dois credos)
(Dois mil mortos no chão)
(Apedrejando um milhão)
(Que se sobraram sem sangue)

(Estavam vinte furtados)


(No caseiro do cabo)
(Sobrevoa o milhafre)
(Suas cabeças rachadas)

(Muitas feridas e chagas)


(Numa grande chacina)
(Entre insultos e pragas)
(Chovem panelas de libra)

(Vinte e três afogados)


(Trinta e quatro perdidos)
(Doze anos esmagados)
(Sem contar os aflitos)

(Pelas terras abaixo)


(Vai o pobre de mim)
(De Quilá a Samatra)
(De Malaca a Pequim)

(Fugindo a sete pés)


(Do amistoiro ao meu Tejo)
(Era-se o ouro do vento)
(A prata fina, a saúde)
(Mas memória santa me ajude)
A dar graças a Deus
Misericórdia infinita
Pois eu não me lamento
Se ao fim de tantos tormentos
Se escapei deles com vida

(Senhor seja louvado)


(Santos apostolados)
(Viva entre os mortais)
(A luz que felicitais)
(Por meus grandes pecados)

Você também pode gostar