Você está na página 1de 3

TEORIAS DA CONSTRUÇÃO DO SABER CIENTÍFICO

POSITIVISMO

O desenvolvimento da ciência e a sofisticação de seus métodos experimentais por algum tempo


trouxe a ilusão de que estariam resolvidos os problemas relativos à construção do saber científico.
Caberia ao cientista apenas a aplicação rigorosa do método, sem se preocupar com questionamentos
gerais sobre a natureza de seu trabalho, estas especulações deveriam ficar restritas à filosofia da ciência.
Esta concepção positivista, embora modificada, ainda hoje predomina no trabalho prático dos cientistas.
O positivismo (concepção filosófica criada por Comte) serviu de base para o que denominamos
ciência moderna. Considera que só é possível conhecer os fenômenos e as suas relações, não a sua
essência, as suas causas íntimas. Sob influência de um suposto progresso contínuo das ciências, o
positivismo afirma que os fatos só podem ser conhecidos pela experiência e que a única válida é a dos
sentidos (visão, olfato, tato, etc.). Não cabe a ciência buscar a inacessível determinação das causas, mas
procurar leis, isto é, as relações constantes que existem entre os fenômenos.
As leis naturais, assim descobertas, constituem a formulação geral de um fato particular,
rigorosamente observado. Cabe à ciência observar por toda parte o mecanismo do mundo, como este
funciona e não inventá-lo. Somos meros espectadores dos fenômenos exteriores, não podemos modificar
a ação destes sobre nós, senão submetendo-nos às leis que os regem. Os homens, nesta concepção, não
são capazes influenciarem os seus destinos, de se tornarem sujeitos da história.
Na visão positivista, a ciência evolui de forma linear, baseando-se em observações. Uma nova
teoria válida, constitui-se no aperfeiçoamento da anterior. Considera possível, através do rigor
metodológico, manter a objetividade (separar totalmente o objeto da influência do sujeito) e a
neutralidade (política, no sentido amplo) do conhecimento científico. Busca a verdade científica: “o
mundo é assim”.

O RACIONALISMO CRÍTICO DE POPPER

Para o filósofo da ciência Karl Popper, a caracterização de um conhecimento como científico


depende de duas condições:
 a teoria científica deve estar aberta à refutação (negação) ou falseamento
 e para estabelecer a validade de uma teoria deve-se buscar a refutação da mesma, as
confirmações não são aspectos que a caracterizam como ciência, pois sempre é possível
encontrar fatos que confirmam uma teoria.
Este enfoque questiona a validade do método positivista que exige a confirmação empírica (dada
pela experiência) dos seus enunciados universais, pois esta confirmação não serviria como critério para
estabelecer as fronteiras entre ciência e pseudociência.

Popper considera que a atividade científica é composta por dois momentos:


2

 Formulação de hipóteses: permite criatividade, ousadia.


O cientista não deve se limitar aos fatos estritamente observáveis: sem criar hipóteses ricas e
conjecturas audaciosas, nenhuma das grandes descobertas e invenções teria sido possível.
 Teste das hipóteses: deve ser rigoroso e buscar a refutação das mesmas.
As hipóteses escolhidas, portanto, devem ser passíveis de teste; pois para Popper uma das
características da pseudociência é a impossibilidade de testar suas afirmações.
O método proposto por Popper:

Fato-problema  hipótese explicativa  confrontação com fatos (teste) :


1.  caso se mostre falsa  hipótese é refutada (abandonada)
2.  caso se mostre verdadeira  hipótese é corroborada (significa apenas que até o momento
não foi negada, mas nunca se alcança a certeza de que uma hipótese é verdadeira)

Para Popper o conhecimento científico sempre conserva este caráter provisório, deve-se
continuar tentando provar que a teoria é falsa. Por maior que seja a confirmação de uma hipótese, nada
indica que no futuro ela não possa ser refutada.
Uma teoria científica é boa, quanto mais estiver aberta a fatos novos que possam tornar falsos os
princípios e os conceitos em que se baseia. E a maior contribuição que esta pode dar ao progresso do
conhecimento reside na sua capacidade de levantar problemas. Uma teoria científica importante não
apenas soluciona alguns problemas, mas faz aparecer novas questões.
A meta da ciência não deve ser a busca de fundamentos inabaláveis ou de certezas, mas a
construção de hipóteses férteis que ofereçam solução de algum problema humano.
Em relação a verdade Popper afirmaria: “Nesta situação, parece-nos mais interessante representar
o mundo desta maneira”.
Deve-se observar, no entanto, que Popper não rompe com a noção de progresso da ciência
presente no positivismo. A falseabilidade como critério de avaliação das teorias científicas mantém a
idéia de progresso científico, pois é a mesma teoria que vai sendo corrigida por fatos novos que a
falsificam.

KUHN E AS REVOLUÇÕES CIENTÍFICAS

Kuhn considera que tanto o positivismo, como a visão de Popper não oferecem uma visão
adequada da ciência. A ciência por ser um fenômeno histórico, só pode ser apreendida por uma teoria que
leve em conta sua dimensão histórica.
Para Kuhn a “ciência normal” não está, em geral, orientada para a descoberta do novo, mas para
submeter a natureza a esquemas conceituais fornecidos pela educação profissional. Mas o que Kuhn
define como ciência normal? É aquela que a maioria dos cientistas se ocupa durante toda sua vida
profissional. Através da instrução e treinamento recebidos, o cientista desenvolve um determinado modo
de enxergar a realidade e o objeto de investigação de sua área. Tal visão está impregnada também de
preconceitos que moldam-lhe a compreensão da realidade.
3

Além de absorver uma concepção teórica e de aprender técnicas, o cientista adquire certos
hábitos que envolvem formas sociais de comportamento, postura mental e tomada de consciência sobre
quais temas devem ter abordagem privilegiada, e quais outros devem ser ignorados.
A aceitação de uma construção teórica pela maioria dos cientistas costuma por fim a
controvérsias e polêmicas acerca dos alicerces de um determinado ramo da ciência, isto é, de uma
disciplina. Esta construção passa a oferecer a base teórica e metodológica para o trabalho subseqüente na
disciplina em questão, constituindo-se em um paradigma. O paradigma engloba o conjunto de tudo
aquilo que une os membros de uma comunidade científica, portanto possui uma dimensão social e não
pode ser substituído pelo conceito de teoria.
“É pelo paradigma que uma determinada região da realidade é recortada, delimitada e
transformada em objeto de pesquisa científica. O que transcende os limites dessa região não interessa
normalmente ao cientista ou não precisa interessá-lo. Com isso, o espaço em que se desenvolvem os
problemas se restringe ao âmbito daquilo que é coberto pelo paradigma. Aí estão os problemas
considerados legítimos; o que ultrapassa essas fronteiras é desqualificado como não-científico”
(Carvalho, 1989, p.84).
Esta é fase paradigmática da ciência ou de “ciência normal”. A ciência normal possui, portanto,
um caráter conservador.
Ao mesmo tempo, Kuhn acredita que o rompimento com um paradigma só pode ocorrer através
daqueles pesquisadores fortemente enraizados na tradição científica dominante. O trabalho minucioso,
dirigido ao pormenor, é que propicia a identificação de anomalias (fenômenos desafiantes, proibidos
pelo paradigma) que sinalizam ao cientista que é chegada a hora de buscar um novo paradigma.
Se a discrepância entre paradigma e realidade pode ser vista como um simples quebra-cabeça
(passível de ser resolvido) ou anomalia (não é resolvida com o instrumental disponível), vai depender da
percepção da própria comunidade científica, pois o paradigma não é propriedade individual de um
cientista, mas propriedade coletiva desta mesma comunidade.
Quando considerada uma anomalia, esta conclusão conduz a elaboração de novas teorias
desvinculadas do paradigma.. A nova concepção que vai surgindo, pode incorporar nela os
conhecimentos anteriores (reelaborando-os) ou afastá-los inteiramente. Kuhn denomina revolução
científica estes momentos de ruptura com antigo paradigma e de criação de novas teorias.
Para Kuhn a ciência não caminha numa via linear contínua e progressiva, mas por saltos e
revoluções. Não se trata do aperfeiçoamento da mesma teoria, mas do rompimento com seus
pressupostos, métodos e técnicas e a criação de uma nova teoria qualitativamente diferente da anterior.
Ex.: a idéia de vírus na biologia; enzima na química; fotossíntese na fisiologia vegetal; etc.

ciência normal  crise paradigmática  ciência normal cede ao caos  surge a


pesquisa extraordinária, desligada do paradigma  organiza-se as bases de um novo paradigma
(novas teorias, métodos, etc.)

Você também pode gostar