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FISCALIZAÇÃO DE PROJETOS

E OBRAS DE ENGENHARIA

ESAF
Escola de Administração Fazendária
Ficha técnica

Coordenador Técnico e Conteudista - Secretaria da Receita Federal do Brasil


Athos André do Amaral Rocha

Coordenação de Produção
Equipe de produção DIEAD/ESAF
Sumário

Projeto de edificações – Módulo 2............................................................................ 4

2.1 O que é o projeto de edificações e como contratá-lo?............................................. 4

2.1.1 A importância de um bom projeto para a futura atividade de manutenção


predial da edificação..............................................................................................4

2.1.2 Como um bom projeto determina o custo de uma obra ao longo de toda a
sua vida útil?...........................................................................................................7

2.1.3 O projeto começa pela contratante. Quais objetivos desejo alcançar?


Como deverá ser o edifício que pretendo construir? Quais preceitos deve
atender? Premissas de projeto............................................................................13

2.1.4 Familiarizando-se com a terminologia aplicada ao projeto. Quais as


diferenças entre Memorial Descritivo, (Caderno de) Especificações
Técnicas e Caderno de Encargos?.......................................................................19

2.1.5 A contratação do projeto: qual é a modalidade de licitação mais


indicada?...............................................................................................................22

2.1.6 A diferença entre direito autoral e direito patrimonial: autores


e coautores...........................................................................................................34

2.2 Como receber um projeto de edificações?.............................................................. 42

2.2.1 O recebimento do projeto: o que deve ser observado?.................................42

2.2.2 A responsabilidade do gestor de contrato.....................................................44

2.2.3 A importância da observação da representação gráfica na


apresentação de projetos....................................................................................48

2.3 Coordenando um projeto de edificações................................................................. 54

2.3.1 A coordenação do projeto de edificações......................................................54

2.3.2 A compatibilização dos projetos....................................................................57

2.3.3 O “projeto-mãe” em projetos de edificações.................................................60

2.3.4 A plataforma BIM e o seu papel na coordenação e na


compatibilização dos projetos............................................................................64

Encerramento......................................................................................................... 70
PROJETO DE EDIFICAÇÕES
MÓDULO 2

2.1 O que é o projeto de edificações e como contratá-lo?

2.1.1 A importância de um bom projeto para a futura atividade de manutenção


predial da edificação

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Identificar os principais conceitos para o desenvolvimento de um projeto


eficiente.
Os projetos da construção civil, nesses incluídos
os projetos de edificações, além de serem, por sua
natureza, roteiros para as atividades que concorrerão
para a execução do objeto, são igualmente ferramentas
de análise para as possíveis soluções técnicas a serem Projeto de
construção
aplicadas no processo construtivo.

A palavra projeto significa, genericamente, intento,


desígnio, empreendimento e, também, um conjunto de
ações, caracterizadas e quantificadas, necessárias à
concretização de um objetivo. Embora este sentido aplique-se a diversos campos de
atividades, em cada um deles o projeto materializa-se de forma específica.

Tome Nota
O objetivo principal de um projeto é a execução da obra idealizada
pelo arquiteto ou engenheiro. Essa obra deve adequar-se aos con-
textos naturais e culturais em que se insere e responde às necessi-
dades do cliente e dos futuros usuários do objeto construído. As
exigências do cliente e dos usuários exprimem-se por meio do pro-
grama de necessidades que define metodologicamente o produto
final.

4
Diante disso, as soluções técnicas que deverão ser empregadas para a consecução
da obra devem atender aos princípios da racionalidade, da economicidade, da
funcionalidade e do desempenho.

Considerando os conceitos de Vitrúvio (2007, p. 82),1 os projetos de arquitetura de-


vem atender cumulativamente aos princípios básicos “utilitas” (utilidade, uso, funcio-
nalidade, proveito, vantagem), “firmitas” (solidez, firmeza, consistência, robustez) e
“venustas” (beleza, elegância, estética). Tais conceitos resumem as qualidades que
se pretende para o projeto arquitetônico, demonstrando que o objeto construído deve
conciliar desempenho, economia e estética. Pode-se, assim, concluir que o edifício
ou a obra deve ter características que atendam à sua durabilidade e conservação.

Com esse objetivo, o projeto deverá também


servir à correta escolha de soluções que de-
terminem o melhor funcionamento do objeto
construído, muito além da sua concepção ou
construção. No projeto é que são definidos os
conceitos e as técnicas que garantirão a per-
manência da construção, principalmente no
quesito manutenção.

Recentemente, a ABNT editou um conjunto de normas aplicado ao desempenho das


edificações. Muito embora tal norma traga na sua origem a destinação às edificações
habitacionais, pode-se tomá-la como referência para qualquer tipo de edifício em
que se pretenda condições de bom desempenho. Uma das premissas básicas
dessa normativa é a durabilidade dos elementos da construção, denotando grande
preocupação com a manutenção do edifício.

A Administração Pública, por suas características (necessidade de racionalização


dos custos, orçamentos limitados e inconstantes, falta de equipes permanentes para
conservação), tem como um dos grandes desafios a manutenção do seu patrimônio
construído.

1
VITRÚVIO, P. Tratado de arquitetura/Vitrúvio. Tradução, introdução e notas de M. Justino Maciel. São Paulo: Martins
Fontes, 2007.

5
Importante
Por essa razão, boas escolhas na fase de projeto definirão o
custo para a Administração na conservação e na manutenção
das suas construções por longo período.

Percebe-se, dessa condição, que o projeto,


muito além de ser um roteiro para a constru-
ção do objeto, é, antes de tudo, uma ferramen-
ta para experimentação das soluções para o
bom desempenho da obra ou do edifício, pos-
sibilitando a escolha das melhores soluções
técnicas, aquelas que trarão o equilíbrio entre
custo de construção, custo de manutenção e
funcionalidade, aí considerados a eficiência e o conforto.

Você, como gestor do contrato de projeto, ao elaborar o seu Termo de Referência


ou Projeto Básico, deve observar com cautela tais premissas, de forma a conduzir a
sua elaboração pelo caminho da racionalidade, da economia e do desempenho. As
definições e as exigências dadas no Termo de Referência ou Projeto Básico devem
ser tais que condicionem a elaboração do projeto, para que esse atenda aos objetivos
aqui já mencionados.

Essas escolhas recairão sobre os tipos de materiais, a forma de ordenação dos espa-
ços, a morfologia dos elementos etc. Assim, é importante que se observe a vantagem
que se terá sobre a escolha de um material em detrimento de outro, do tamanho da
edificação frente às necessidades do órgão, ou até mesmo da observância ao índice
de compacidade2 ou da forma do edifício.

2
Índice de compacidade – É a relação percentual existente entre o perímetro de um círculo de igual área do projeto e o pe-
rímetro das paredes exteriores do projeto, conforme a definição de Mascaró. (Mascaró, Juan Luís – O custo das decisões
arquitetônicas – 5. ed. Porto Alegre: Masquatro Editora, 2010)

6
Por Exemplo
Como exemplo, citamos a escolha de esquadrias de ferro para a vedação
das fachadas externas de um edifício em zona litorânea. Certamente
toma-se aqui a condição extrema e até mesmo inadmissível, visto que,
nas condições atmosféricas daqueles ambientes, jamais se optaria pela
escolha de elementos ferrosos para tal uso. A escolha correta nesse
caso seria, por exemplo, esquadrias de alumínio, com pintura por anodi-
zação ou eletrostática, com durabilidade adequada àquelas condições
ambientais. Muito embora seja senso comum no meio da arquitetura e
da engenharia, a obviedade por tal escolha (esquadrias de alumínio para
a vedação de fachadas em edificações de ambientes litorâneos), ainda
assim é possível encontrar projetos (mal) especificados trazendo aquela
condição (especificação de esquadrias de ferro naqueles ambientes).

Nos órgãos públicos, os setores que são responsáveis pelos projetos normalmente
são diversos daqueles responsáveis pela manutenção das edificações (ou outras
obras da construção civil ou de infraestrutura viária). A boa especificação, quando da
elaboração desses projetos, poderá contribuir para a desoneração do trabalho e do
custo despendidos futuramente pelos seus setores de manutenção.

2.1.2 Como um bom projeto determina o custo de uma obra ao longo de toda a sua
vida útil?

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Reconhecer a importância do projeto no ciclo de vida de uma edificação.


No tópico anterior, foram apresentadas as relações existentes entre a boa especifica-
ção de um projeto e o custo de manutenção do objeto construído. Veja que as esco-
lhas corretas no momento das especificações têm, entre outros quesitos, a função de
desonerar o custo de manutenção futura das edificações ou outras obras.

7
O custo de um projeto é sensivelmente me-
nor do que os custos envolvidos na execução
da obra. Por essa razão, perceba que é mais
lógico e sensato concentrar esforços nes-
sa importante etapa, evitando, por exemplo,
economias irresponsáveis e permitindo que
nessa ocasião possam ser avaliadas todas
as possibilidades técnicas para a consecu-
ção do objeto pretendido. Afinal, é infinitamente mais fácil alterar um desenho, ou
até mesmo descartar-se um conjunto de elementos impressos, do que demolir uma
estrutura de concreto. O projeto, portanto, é o momento para a experimentação e o
teste de possibilidades.

Para ilustrar a importância que tem um projeto na construção civil, veja a imagem a
seguir.

Como vai querer


seu projeto?
Mal
RÁPIDO feito BARATO

Utopia
Lixo Bem Não pode
Não
pago ser feito
existe
GRÁTIS Faça
você
QUALIDADE

8
Perceba, portanto, algumas verdades sobre o projeto:

01
Esqueça projetos rápidos, sem custos e ainda assim
com qualidade. Eles não existem, muito embora essa
(projetos não remunerados) não seja uma realidade
possível na Administração Pública;

01
Esqueça projetos rápidos, sem custos e ainda assim
com qualidade. Eles não existem, muito embora essa
(projetos não remunerados) não seja uma realidade
possível na Administração Pública;

02 Projetos com prazos curtos de elaboração e com


custo baixo geralmente são mal feitos;

02 Projetos com prazos curtos de elaboração e com


custo baixo geralmente são mal feitos;

03 Projetos com prazo de elaboração exíguo e com boa


qualidade têm alto custo.

03 Projetos com prazo de elaboração exíguo e com boa


qualidade têm alto custo.

Diante disso, você, na condição de gestor público, deve observar criteriosamente


alguns aspectos na sua contratação:

01
Escolha a forma de licitação mais adequada ao objeto a
contratar;

01
Escolha a forma de licitação mais adequada ao objeto a
contratar;

02 Estabeleça corretamente o cronograma para a elaboração


de projetos;

02 Estabeleça corretamente o cronograma para a elaboração


de projetos;

03
Por meio de pesquisa de preços, estabeleça a justa
remuneração devida ao serviço de projeto e que servirá
de referência à licitação.

03
Por meio de pesquisa de preços, estabeleça a justa
remuneração devida ao serviço de projeto e que servirá
de referência à licitação.

9
Em relação à manutenção do futuro objeto construído, a questão ganha ainda mais
importância. De acordo com a Lei de Sitter,3 ou “Lei dos 5”, tomando-se novamente
como exemplo uma estrutura de concreto, o custo para uma intervenção de correção,
desde o projeto até a manutenção corretiva, aumenta em progressão geométrica, de
razão 5 (SITTER, 1984 apud HELENE, 1992)4. Assim, pode-se dizer que, arbitrando
que o custo para uma eventual correção de erro no objeto seja 1, durante a fase de
elaboração do projeto, a mesma correção na fase de execução da obra terá custo 5,
na fase de manutenção preventiva terá custo 25 e, finalmente, na fase de manutenção
corretiva alcançará o custo de 125.

Lei de Sitter

125 Custo unitário arbitrado


125

Durante a Manutenção Corretiva


Durante a Manutenção

100
Custo da Intervenção

Preventiva
Durante a Execução

75
Durante o Projeto

50

25 25
1 5
0
1 2 3 4 Tempo decorrido

Esse mesmo princípio pode ser aplicado, por extensão, às outras disciplinas (instala-
ções) das obras ou edificações.

Neste tópico, identificaremos quais são as principais escolhas que podem concorrer
para a racionalização do ambiente construído ao longo da sua vida útil, em conso-
nância com as boas práticas construtivas, à normativa técnica ou legislação vigente.

3
SITTER, W. R. Costs for service life optimization: the law of fives. In: CEB-RILEM. Durability of concrete structures. Procee-
dings of the International Workshop held in Copenhagen, on 18-20 May 1983. Copenhagen, 1984. (Workshop Report by
Steen Rostam).
4
HELENE, P. R. L. Manual para reparo, reforço e proteção de estruturas de concreto. 2. ed. São Paulo: Pini, 1992. 213 p.
ISBN 85-7266-010-0.

10
Conforme o art. 2º, item III, do Decreto nº 2.271, de 7 de julho de 1997 (dispõe sobre a
contratação de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e
fundacional e dá outras providências), as contratações da Administração devem
demonstrar os resultados que serão alcançados em termos de economicidade e de
melhor aproveitamento dos recursos humanos, materiais ou financeiros disponíveis.
No caso das especificações de projetos, as soluções adotadas terão íntima relação
com o comando dado nesse artigo do referido decreto.

Ainda que o conceito de um bom proje-


to seja de difícil definição, visto tratar-se
de percepção subjetiva, para a qual con-
tribuem diversas variáveis e referências,
pode-se delimitar os requisitos mínimos
que devem ser atendidos para que o re-
sultado seja adequado aos objetivos da
Administração Pública. É nesse sentido
que recentemente os Poderes Legislativo e Executivo têm editado leis e normas que
buscam o aumento da eficiência da máquina pública, refletida inclusive na constru-
ção das suas instalações.

Importante
Instruções Normativas que definem eficiência energética, otimi-
zação de recursos e critérios de sustentabilidade ambiental são
normas que atualmente devem ter observância obrigatória pela
Administração.

Dentro dessa condição, seguem algumas iniciativas específicas aplicadas à elabora-


ção de projetos da construção civil pelo poder público:

1. Escolha de materiais locais, de fácil obtenção no entorno da construção:


essa iniciativa atende aos critérios de sustentabilidade ambiental, visto que

11
possibilita menor impacto na natureza, pela diminuição das distâncias de
transporte – atividade poluidora – para os insumos da obra, com reflexo no
seu custo;

2. Escolha de materiais produzidos no país, por empresas nacionais ou naciona-


lizadas: essa iniciativa traz reflexos diretos na economia do objeto construído,
visto que diminui o custo para a sua contratação e manutenção;

3. Escolha de materiais com melhor eficiência energética, como, por exemplo,


luminárias em LED (light emitting diode – ou diodo emissor de luz), sistema de
iluminação com baixo consumo de energia e que, consequentemente, diminui
os gastos com energia elétrica ao longo da vida útil do edifício ou obra;

4. Escolha de sistemas de ar condicionado com alta eficiência energética, que, a


exemplo das instalações de iluminação em LED, proporcionam economia de
energia, e, com isso, menor gasto com energia elétrica;

5. Reúso de água, iniciativa que atende principalmente a dois requisitos básicos:


a sustentabilidade ambiental e o menor consumo de água tratada, refletindo
diretamente no custo do seu fornecimento;

6. Escolha de espécies vegetais nativas nos projetos de urbanização ou paisa-


gismo: essa iniciativa possibilita a melhor adaptação e a baixa manutenção
dos espaços ajardinados das edificações ou obras, refletindo na economia dos
recursos despendidos pela Administração Pública;

7. Escolha de materiais duráveis e com baixa manutenção quando da especifi-


cação dos projetos (exemplo: escolha de esquadrias de alumínio ou PVC para
a vedação de fachadas): essa condição evita a necessidade de retificação e
repintura dos elementos (quando especificados em madeira ou ferro), econo-
mizando recursos financeiros para os órgãos públicos.

Somam-se a essas considerações inúmeras outras possíveis e que ampliariam


bastante a lista acima. Essas escolhas e definições podem encontrar iniciativa por
ação de bons projetistas.

12
Importante
É vital, no entanto, que tais exigências emanem da contratante, a
Administração Pública, quando da elaboração dos seus editais
de contratação.

Essa é uma das razões pelas quais é importante – e recomendável – que os órgãos
públicos contem nos seus quadros com profissionais habilitados, engenheiros e
arquitetos, com qualificação permanente, para a contratação de projetos e obras da
construção civil e de infraestrutura viária, tema já abordado no Módulo 1.

2.1.3 O projeto começa pela contratante. Quais objetivos desejo alcançar? Como
deverá ser o edifício que pretendo construir? Quais preceitos deve atender?
Premissas de projeto

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Identificar os itens obrigatórios a serem observados quando da elaboração do


programa de necessidades para a contratação de um projeto de edificações.
Complementando as ideias trazidas nos
tópicos anteriores, neste tópico serão
abordadas as iniciativas por parte do
gestor do contrato quando da contrata-
ção de um projeto da construção civil.

É de grande responsabilidade a atuação do gestor, não somente por sua condição de


agente público, e que, portanto, deve obedecer às regras e condutas predeterminadas,
mas também pela condição de responsável pela contratação de objeto que terá longa
vida útil e que poderá gerar grande impacto socioambiental. Objetos da construção
civil são concebidos para durarem dezenas de anos, e, por essa razão, devem ser
muito bem pensados, antes do início da primeira escavação.

13
Note que a definição do resultado esperado é tarefa que requer complexo estudo
e envolvimento. Certamente projetistas podem dar essa resposta. A medida dessa
resposta, no entanto, está intrinsecamente condicionada às orientações e premissas
definidas pela contratante, nesse caso o poder público. Mais uma vez, a figura do
arquiteto ou engenheiro como gestor desses contratos é fundamental.

Inicialmente, pode-se dizer que as edificações ou obras contratadas pela


Administração Pública devem considerar o seu custo e o seu resultado final. Não
devem ser onerosas, dada a limitação de recursos e a responsabilidade social do
poder público, mas também não devem ter custo de construção excessivamente
baixo, que venha a onerar o custo do seu uso, conservação e manutenção, conforme
já explicitado anteriormente.

Importante
O valor de uma obra deve ser medido por todo o período da sua
vida útil, o que inclui a sua concepção, execução, usufruto e even-
tual demolição.

Conforme a ABNT NBR 15575-1:2013 – Edificações habitacionais – Desempenho


– Parte 1: Requisitos gerais, a durabilidade do edifício e de seus sistemas é um
requisito econômico do usuário, pois está diretamente associado ao custo global do
bem imóvel.5 Esse conceito, embora seja dado por norma especificamente aplicada
a edificações, e do tipo habitacional, pode, como já foi aqui ilustrado, ser aplicado a
qualquer objeto da construção civil.

5
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 15575-1:2013 – Edificações habitacionais –
Desempenho – Parte 1: Requisitos gerais. Rio de Janeiro: ABNT, 2013. p. 31.

14
Observe

Essa, infelizmente, não é a orientação obtida a partir da legislação


que rege as contratações da Administração Pública, em que comu-
mente se observa para essas apenas o critério do custo do seu pro-
jeto e construção. O gestor do contrato não deve, porém, limitar-se
a tal regra, mas buscar o equilíbrio entre o custo do projeto e da exe-
cução e o custo da sua manutenção, desembolso que será perma-
nente e que onerará os gastos da Administração Pública durante
muitos exercícios financeiros. Profissionais habilitados – arquitetos
e engenheiros – são os únicos capazes de dar tal resposta.

Devem ser considerados requisitos de desempenho e funcionalidade, que concedam


ao ambiente construído boas condições de uso e habitabilidade, proporcionando aos
seus usuários (agentes públicos e população em geral) bem-estar e conforto.

Como agente incentivador da transformação social e econômica, a Administração


tem papel na inovação tecnológica quando da elaboração dos seus projetos da
construção civil. Iniciativas que não são tomadas pelo setor privado, senão pelo lucro,
têm no setor público o seu fomento.

O poder público, como contratante de obras,


tem potencialmente grande capacidade de
transformação das nossas cidades. Veja
que, por essa razão, as obras contratadas
pela Administração devem trazer entre
as suas características a adequação ao
entorno e o baixo impacto ambiental. Os
requisitos que devem ser buscados são o
baixo consumo energético, a baixa geração
de resíduos o bom desempenho térmico e acústico e a durabilidade. Condicionando a

15
atuação da Administração Pública nas contratações de projeto, há vasta legislação.
Uma das normativas mais recentes é a Lei n° 13.647, de 9 de abril de 2018, que obriga
a instalação de equipamentos economizadores de água nos sanitários públicos de
todas as novas edificações públicas a partir da data da sua vigência.

Outro requisito igualmente importante é a preocupação com o aspecto visual da


obra, em relação à sua inserção no ambiente e ao seu impacto estético. Como agente
transformador do ambiente construído, o poder público, na condição de contratante,
deve também considerar a harmonia e a beleza das suas obras, elementos que
serão permanentes na paisagem. Devem ser evitados, por exemplo, os chamados
“projetos-monumento”, assim entendidos como aqueles que têm apelo temático ou
simbólico, cuja forma possa gerar polêmica ou dificuldade de aceitação (ver figura 3),
ou que não tenha relação com a função do objeto,6 um dos princípios norteadores da
arquitetura. Objetos de arquitetura que optem por trazer apelo simbólico podem fazê-
lo de forma sutil e indireta, remetendo à diretriz da sua concepção. Exemplos bem-
sucedidos dessas iniciativas são o edifício-sede do Banco Central do Brasil (Bacen),
em Brasília, do arquiteto Hélio Ferreira Pinto7 (ver figura 4), e a ponte da mulher (el
puente de la mujer), de autoria do arquiteto espanhol Santiago Calatrava (ver figura 5),
no bairro Puerto Madero, em Buenos Aires. O primeiro é inspirado em imagem gravada
no dobrão, moeda do período imperial, de 1725. O segundo representa um casal
dançando tango, manifestação artístico-cultural típica da Argentina, considerada
patrimônio oral e imaterial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura (Unesco).

6
“A forma segue a função” é um dos princípios da escola modernista de design Bauhaus, da década de 1910, que teve
grande influência na arquitetura desde então, ao defender a adoção de desenhos funcionais nos objetos, em oposição à
ornamentação. GROPIUS, W. The new archictecture and Bauhaus. New York: MIT Press, 1965.
7
Disponível em: <https://www.bcb. gov.br/pre/Historia/HistoriaBC/historia_BC.asp>. Acesso em: 10 abr. 2018.

16
Figura 3 - Centro de Ecologia em Kunshan – China
(http://engenhariae.com.br/curiosidades/foi-inaugurado-na-china-esse-edificio-que-mais-parece-um-
caranguejo-gigante/ último acesso em 10 de abril de 2018)

Figura 4 - https://www.bcb.gov.br/Pre/Surel/RelAdmBC/2012/orientacoes- estrategicas-do-banco-central-


do-brasil/index.html último acesso em 10 de abril de 2018

17
Figura 5 - Arquivo pessoal

Considere que as edificações e as demais obras da Administração Pública devem


ser sóbrias, para que transmitam as ideias de racionalidade e imparcialidade, ou
inovadoras, por meio do emprego de novas técnicas, conceitos ou materiais, para
que transmitam a preocupação com a evolução social ou tecnológica do homem.
Essas duas características devem estar sempre acompanhadas do princípio da
economicidade.

Assim, diante dos conceitos apresentados, pode-se resumir os objetivos e as premis-


sas para as obras contratadas pela Administração Pública e que deverão fazer parte
do programa de necessidades dos projetos:

18
Desempenho térmico e acústico,
visando à diminuição do custo do
objeto ao longo da sua vida útil;

Durabilidade e facilidade de
manutenção;

Funcionalidade, com ambientes


integrados e adaptáveis às
diversas configurações de leiaute,
de forma a diminuir o impacto
financeiro quando da
reorganização dos espaços;

Formas harmônicas e beleza;

Inserção e adaptação ao entorno,


obedecendo a critérios ambien-
tais, sociais e culturais do local;

Inovação tecnológica.

2.1.4 Familiarizando-se com a terminologia aplicada ao projeto. Quais as diferenças


entre Memorial Descritivo, (Caderno de) Especificações Técnicas e Caderno de
Encargos?

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Destacar quais documentos exigir conforme os tipos específicos de projeto;


§§ Relembrar os conceitos aplicados ao tema “projeto de edificações”.
Na contratação dos projetos da construção civil, é importante que o gestor do con-
trato tenha clareza quanto ao significado da terminologia aplicada, permitindo, assim,
que os editais tragam correta apresentação dos conceitos e das definições.

É comum entre os profissionais de engenharia e arquitetura a confusão entre os


conceitos de Memorial Descritivo, (Caderno de) Especificações Técnicas e Caderno
de Encargos, razão pela qual compete à contratante o seu esclarecimento, por meio
do documento editalício. Essa condição não somente evita a eventual impugnação do
edital como traz segurança jurídica ao órgão público.

19
Esses conceitos são definidos abaixo, de acordo com o TCU:8

Descrição detalhada do objeto


projetado, na forma de texto, na É um conjunto de informações
qual
Descrição são apresentadas
detalhada do objetoas soluções complementares ao projeto,
técnicas
projetado, adotadas
na forma pelo projeto,
de texto, definindo como deve ser procedida
acompanhadas das respectivas
na qual são apresentadas as soluções Memorial Descritivo
a execução. Normalmente é
Memorial Caderno de
técnicasjustificativas,
adotadas pelo necessárias
projeto, ao pleno fornecido pelo contratante, no qual
conhecimento
acompanhadas do projeto,
das respectivas Descritivo estão consolidados as Encargos
complementando
justificativas, as informações
necessárias ao pleno especificações técnicas, o Memorial
contidas nos desenhos;
conhecimento do projeto, Descritivo e os critérios de medição
complementando as informações e pagamento de cada um dos
contidas nos desenhos; serviços previstos para a obra.

Texto no qual
Texto se fixam
no qual se fixamtodas as regras
todas as regras e
e condições
condiçõesa serem
a serem seguidas
seguidaspelo
pelo contratado para
contratado parade
a execução a execução
cada um dos de cada um da obra,
serviços
(Caderno de) dos caracterizando
serviços da obra, caracterizandoos materiais, os
individualmente
Especificações
(Caderno de) individualmente
equipamentos, os os
materiais,
elementosos componentes, os
equipamentos, os elementos
sistemas construtivos a serem aplicados e o modo
Técnicas
Especificações componentes,
como serãoos sistemas construtivos
executados cada um dos serviços,
Técnicas a serem aplicados
apontando, e o modo
também, como
as unidades de medida que
serão
embasarão os critérios paraserviços,
executados cada um dos a sua medição e
apontando, também, as unidades de
pagamento;
medida que embasarão os critérios
para a sua medição e pagamento;

Observe, portanto, dados os conceitos do TCU, que o Caderno de Encargos é a


consolidação do Memorial Descritivo e das especificações técnicas, documento
este também chamado de Caderno de Encargos e Especificações Técnicas. Esse
documento é complementar às pranchas de desenho do projeto e tem por função
a descrição completa do objeto, textualmente, e as orientações de como serão
executados os serviços. O Caderno de Encargos ainda pode apresentar outras
orientações, como a forma de medição dos serviços, a forma de descarte de resíduos,
a forma de apresentação dos documentos finais, etc.

O Caderno de Encargos, para os projetos de edificações, não é documento facultati-


vo, dele devendo fazer parte obrigatoriamente, visto ser elemento que elucida dúvidas
advindas da leitura das suas pranchas de desenho, sendo instrumento de arbitragem
nas eventuais dúvidas técnicas advindas da execução do objeto.

8
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Orientações para elaboração de planilhas orçamentárias de obras públicas. Bra-
sília: TCU, 2014.

20
Outro conceito amplamente aplicado à área e que também gera dúvidas quanto ao
seu significado é o Memorial Justificativo. Alerte-se para o fato que esse documento
é tão somente, como o próprio nome diz, um texto que justifica o projeto. Nele estará
contida a exposição das razões pelas quais foram adotadas determinadas soluções
e decisões de projeto, o porquê de se ter utilizado determinados materiais, traçados,
dimensionamentos, etc., em detrimento de outras escolhas. O Memorial Justificativo
é, portanto, a peça textual que explica o projeto.

É importante que desse documento conste com clareza a explicação para os seguin-
tes itens:

1. Localização

Descrição sucinta do entorno (quando se tratar de projeto de edificação ou intervenção


urbanística), e a forma como o objeto relaciona-se com ele, indicando as soluções
adotadas para o tratamento dos ruídos, insolação, regime de ventos, etc.;

2. Programa de necessidades

Identificação das razões que levaram o projetista a adotar determinada solução


para os elementos do objeto. Exemplo: em um projeto que contenha um auditório, a
explicação das razões pelas quais determinada forma foi adotada para tal auditório,
a configuração da plateia, etc.;

3. Planta baixa (quando se tratar de projeto de edificação ou intervenção urbanística)

Explicação para a distribuição funcional dos elementos, sua relação, ordenamento,


integração, hierarquia, etc.;

4. Volumetria

Descrição da forma como se obteve a solução plástica (quando se tratar principal-


mente de projeto de edificação), processo criativo, enfatizando procedimentos que
foram adotados, tais como subtrações, adições, composição de cheios e vazios, luz e
sombras, texturas e materiais, linhas predominantes, etc.;

21
5. Tecnologia

Apresentação da escolha construtiva e suas vantagens. Descrição do benefício


que será atingido com a opção pela forma de construção adotada, em relação à
economia, ao desempenho, à rapidez de execução, etc. Exemplo: por que foi adotada
a forma construtiva “estaiado para o projeto de um viaduto, em detrimento da forma
“simplesmente apoiado”.

Importante
O Memorial Justificativo não é item obrigatório na elaboração
dos projetos (conforme ABNT NBR 16636-2:2017 – Elaboração e
desenvolvimento de serviços técnicos especializados de projetos
arquitetônicos e urbanísticos – Parte 2: Projeto arquitetônico), e
não é comumente adotado ou exigido nas contratações da
Administração Pública. É imprescindível, no entanto, quando for
adotada a modalidade de licitação “concurso”, que será aborda-
da no próximo tópico.

2.1.5 A contratação do projeto: qual é a modalidade de licitação mais indicada?

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Avaliar qual a melhor modalidade de licitação a ser adotada nos diferentes


tipos de objeto.

22
Conforme a Lei n° 8.666/1993, há quatro As três primeiras podem ser
modalidades de licitação possíveis para a combinadas com os seguintes
contratação de um projeto na Administração tipos de licitação:
Pública:

Concorrência Menor preço

Tomada de preços Melhor Técnica

Convite Técnica e preço

Concurso

A Lei n° 10.520/2002 (institui, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e


Municípios, nos termos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de
licitação denominada pregão, para aquisição de bens e serviços comuns, e dá outras
providências) traz ainda a modalidade de pregão.

Antes de abordarmos as formas de licitação, é importante comentarmos a formação


do preço referencial no processo licitatório para a contratação de um projeto, item
que fará parte do edital.

Como já mencionado neste curso, a Administração Pública deve sempre ter o seu
preço referencial para contratações. Isso é válido para projetos, obras e também
para serviços continuados. Aplicam-se aos projetos e aos serviços continuados
as determinações constantes da IN nº 5, de 27 de junho de 2014 (dispõe sobre os
procedimentos administrativos básicos para a realização de pesquisa de preços para
a aquisição de bens e contratação de serviços em geral) da SLTI/MP.

Naquela IN está determinada a seguinte sequência, em ordem preferencial, para a


pesquisa de preços para contratação de serviços em geral:

I. Portal de Compras Governamentais;

23
II. Pesquisa publicada em mídia especializada, sítios eletrônicos especializados
ou de domínio amplo, desde que contenha a data e a hora de acesso;

III. Contratações similares de outros entes públicos, em execução ou concluídos


nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores à data da pesquisa de preços;

IV. Pesquisa com os fornecedores.

Outras formas de pesquisa também são possíveis, desde que devidamente justifica-
das pela autoridade competente, conforme disposto no parágrafo 3º do art. 2º:

“§ 3° A utilização de outro método para obtenção do resultado da pesquisa


de preços, que não o disposto no parágrafo 2°, deverá ser devidamente justi-
ficada pela autoridade competente”.9

Essa possibilidade deve-se ao fato de que, pelo serviço de projeto ter a sua mensu-
ração de forma subjetiva, por vezes é difícil encontrar referenciais criteriosos para a
formação do seu preço. Deve-se considerar que, para um mesmo objeto, pode haver
sensíveis diferenças de preços em função da escala, da área de edificação conside-
rada etc.

O item IV apontado pela IN SLTI/MP n° 5/2014 poderia, nesses casos, trazer maior
segurança na formação do preço. Sua confiabilidade seria dada pela tomada de
ao menos três orçamentos, de onde se deve tirar o preço médio. Ainda assim, nem
sempre tal expediente traz resposta indiscutível à questão. Nesses casos, pode-se
tomar como referência os preços das bases de dados dos órgãos de classe (CAU/BR,
Confea/Crea, Sindicato dos Engenheiros, Sindicato dos Arquitetos etc.).

9
BRASIL. Instrução Normativa nº 5, de 27 de junho de 2014. Dispõe sobre os procedimentos administrativos básicos para
a realização de pesquisa de preços para a aquisição de bens e contratação de serviços em geral. Brasília: SLTI/MP, 2014.

24
Atualmente, está em fase de elaboração dentro da ABNT a NBR 16633 (Elaboração de
orçamentos e formação de preços de empreendimentos de infraestrutura), dividida
em quatro partes, por meio de projeto sob o mesmo nome. Com previsão de edição
para o ano de 2018, esse conjunto de normas trará grande auxílio na análise e na
formação dos preços referenciais para os serviços de projeto.10

Analisada a questão da formação do preço referencial, é possível então avaliar as


modalidades de licitação aplicadas aos tipos de objetos, já que, normalmente, o preço
é um dos critérios para a sua escolha.

Os limites definidos na Lei nº 8.666/1993 determinam a modalidade que deve ser


adotada conforme o valor do objeto. Não se impede, no entanto, que se adote a
modalidade cujo limite do valor que a define é elevado para licitações de limite de
valor menor.11 Essa escolha, porém, deve levar em conta a racionalidade do próprio
certame e o objetivo buscado, além da supremacia do interesse público, em que se
deve considerar também o próprio custo do processo de licitação.

Como resultado dessa busca pela racionalidade e otimização dos custos, muitas
licitações para contratação de projeto vêm sendo contratadas na modalidade pregão.

Sobre tal modalidade, devemos inicialmente analisar a sua aplicação, conforme


definido na lei que a instituiu. O art. 1º da Lei nº 10.520/2002 assim determina:

10
Disponível em: <http://sinaenco.com.br/noticias/norma-sobre-formacao-de- precos-de-projetos-e-gerenciamento-
-esta-em-consulta-na-abnt/?utm_campaign =Newsletter&utm_content= Norma+sobre+forma%C3%A7%C3%A3o+
de+pre%C3 %A7os+de+projetos+e+gerenciamento+est%C3 %A1+em+consulta+na+ABNT+-+Sinaenco+%281%29&
utm_medium=email&utm _source= EmailMarketing&utm_term=newsletter +edi%C3%A7%C3%A3o+35+-+11+de+ou-
tubro>. Acesso em: 14 abr. 2018. Disponível em: <http://www.abntcatalogo.com.br/projetgrid.aspx>. Acesso em: 14 abr.
2018.
11
Brasil (1993, art. 23, § 4º).

25
Art. 1º Para aquisição de bens e serviços comuns, poderá ser adotada a
licitação na modalidade de pregão, que será regida por esta lei.

Parágrafo único. Consideram-se bens e serviços comuns, para os fins e efei-


tos deste artigo, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam
ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no
mercado (BRASIL, 2002, grifo nosso).12

12

A Advocacia-Geral da União (AGU), por meio da Orientação Normativa n° 54/2014,


pondera:

Compete ao agente ou setor técnico da Administração declarar que o objeto


licitatório é de natureza comum para efeito de utilização da modalidade
pregão e definir se o objeto corresponde a obra ou serviço de engenharia,
sendo atribuição do órgão jurídico analisar o devido enquadramento da mo-
dalidade licitatória aplicável (BRASIL, 2014).13

13

A dúvida recai sobre o fato de um projeto poder ser considerado ou não como serviço
comum de engenharia.

12
BRASIL. Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002. Institui, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos ter-
mos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de licitação denominada pregão, para aquisição de bens e
serviços comuns, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 2002.
13
BRASIL. Advocacia-Geral da União. Orientação Normativa n° 54/2014. Brasília: AGU, 2014.

26
O auditor do TCU, André Mendes (2013, p. 149-152)14, argumenta, exemplificando
a aplicação do conceito de serviços comuns de engenharia. Na opinião do autor,
considerando como orientação a Lei nº 8.666/1993, para que as contratações de
serviços de engenharia sejam exclusivamente com licitação dos tipos “melhor
técnica” ou “técnica e preço”, seria inapropriado o uso da licitação do tipo “menor
preço” para tais serviços, o que impediria também o uso da modalidade pregão, visto
essa ter como critério de julgamento exclusivamente o menor preço.

O autor continua, fazendo uma comparação entre um serviço notadamente comum


de engenharia, a impermeabilização de uma laje de uma edificação e um serviço de
projeto. Somente pelo fato de o projeto necessitar de um responsável técnico, ou seja,
configurar-se como um serviço intelectual, não poderia ser classificado como serviço
comum. Além disso, em um projeto, tomando-se como exemplo um projeto de arqui-
tetura, não é possível definir objetivamente sua forma, aparência e características
arquitetônicas finais, confirmando a impossibilidade de seu enquadramento como
serviço comum.

No entanto, conforme jurisprudência do TCU, por meio do Acórdão n° 601/2011 – TCU


– Plenário, se houver entendimento de que o objeto final de uma licitação de projeto
não terá diferença, independentemente de quem o fará, este pode ser classificado
como comum:

(...) se o projeto ou estudo a ser obtido pela realização do serviço por uma
empresa ou profissional for similar ao projeto desenvolvido por outra empre-
sa, dotada com as mesmas informações da primeira, esse objeto, no caso
“estudos e projetos”, pode ser caracterizado como “comuns”. Caso contrário,
se a similaridade dos produtos a serem entregues não puder ser assegurada,
o objeto é incomum (BRASIL, 2011).15

15

14
MENDES, André. Aspectos polêmicos de licitações e contratos de obra públicas. São Paulo: Pini, 2013.
15
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n° 601/2011 – TCU – Plenário. Brasília: TCU, 2011.

27
Perceba a controvérsia que envolve a questão e que, diante da incerteza do caminho
a seguir, muitos gestores acabam optando pela adoção dessa modalidade (pregão)
para a contratação dos serviços de projeto, quando de pequeno vulto. Opta-se, dessa
forma, pelo caminho mais seguro, se considerarmos a segurança jurídica. Perde-
se, no entanto, pela qualidade do objeto ofertado, visto que o custo e a qualidade
do projeto tendem a ser grandezas opostas, conforme demonstrado no tópico 2.1.2
deste módulo, por meio da figura 1, abaixo relembrada.

Como vai querer


seu projeto?
Mal
RÁPIDO feito BARATO

Utopia
Lixo Bem Não pode
Não
pago ser feito
existe
GRÁTIS Faça
você
QUALIDADE

É importante comentar que a modalidade “pregão” pode tornar-se antieconômica


para a Administração Pública, as chamadas licitações deficitárias, visto que há
casos em que o desconto obtido em um certame com esse tipo de modalidade –
comparando-se o preço contratado com o preço inicial dos lances (orçamento
referencial da Administração) – não alcançou o gasto despendido com o contingente
de mão de obra envolvido no seu procedimento. Estudos nesse sentido vêm sendo
feitos pela Controladoria-Geral da União (CGU), que concluiu que 85% dos órgãos da
Administração direta realizam pregões deficitários.16

16
CAMAROTTO, M. Decreto vai atualizar valores de licitação, congelados há 20 anos. Valor Econômico, Brasília, 9 abr. 2018.
Disponível em: https://www.valor.com.br/brasil/5438381/decreto-vai-atualizar-valores-de-licitacao-congelados-ha-
-20-anos. Acesso em: 10 abr. 2018.

28
Para que se jogue mais luz sobre o debate, tome-se o posicionamento do Conselho de
Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) e suas recentes ações quanto à adoção
do pregão para a contratação de projetos pela Administração Pública.

A unidade do CAU do estado do Rio Grande do Sul posicionou-se sobre o tema e tem
alcançado repetidos êxitos nas ações judiciais ou ações de impugnação impetradas
contra a modalidade pregão nesse tipo de contratação.17

Deve ser considerado que, ainda que o serviço de projeto a ser contratado seja de
pequeno vulto, o tipo de licitação a ser escolhido deve ser o de “técnica e preço” nas
modalidades “concorrência” ou “tomada de preços”, no caso da RFB, por definição da
Portaria RFB/Sucor/Copol n° 566/2011, no seu art. 11:

Art. 11. Nos procedimentos licitatórios para contratação de elaboração de


projetos, deverá ser adotada licitação do tipo técnica e preço, podendo ser
adotada licitação do tipo menor preço para as contratações com custo esti-
mado até R$ 15.000,00 (quinze mil reais), sem prejuízo da faculdade legal de
contratação direta por dispensa de licitação (BRASIL, 2011, grifo nosso).

Sabe-se que contratações de projeto têm pouca representatividade numérica no


universo de contratações da Administração Pública. Não traria ônus à supremacia
do interesse público o maior dispêndio de tempo e de recursos humanos da
Administração para essa forma de contratação (licitações nas modalidades que não
sejam o pregão), frente ao benefício que se teria com o resultado final do objeto fruto
de um bom projeto, conforme já mencionado nos tópicos 2.1.1 e 2.1.2 deste módulo.

Disponível em: <http://www.caurs.gov.br/caurs-nao-admite-pregao-na-contratacao-de-servicos-de-arquitetura-e-urba-


17

nismo/>. Acesso em: 4 abr. 2018.


Disponível em: <http://www.caurs.gov.br/caurs-tem-sucesso-em-impugnacao-de-pregao-em-campo-bom/>. Acesso
em: 4 abr. 2018.
Disponível em: <http://www.caurs.gov.br/pregao-encruzilhada/>. Acesso em: 4 abr. 2018.

29
Para projetos de maior vulto, no entanto, a modalidade ideal é o concurso. Esse é
o entendimento da academia e dos órgãos de classe da engenharia e arquitetura.
Notadamente, os grandes projetos em nível mundial, aqui definidos grandiosos pela
sua qualidade, destaque e importância, aliados à quintessência da manifestação
artística e tecnológica, foram desenvolvidos por meio de concurso.

Exemplos desses projetos são a Ópera de Sidney, Austrália (figura 6); o Plano Piloto
da cidade de Brasília, Brasil (figuras 7 e 8); o Museu Guggenheim, Bilbao/Espanha
(figura 9); o Estádio “Ninho de Pássaro”, Pequim/China (figura 10); e a remodelação
da Estação Central de Trens, Berlim/Alemanha (figura 11).

Figura 6 - https://www.archdaily.com.br/br/784303/classicos-da-arquitetura-pera-de-sydney-jorn-utzon
(último acesso em 04/04/2018)

30
Figura 7 - https://www.archdaily.com.br/br/762897/em-foco-lucio-costa/54ecb228e58ece263300000a-the-original-pilot-p
(último acesso em 04/04/2018)

Figura 8 - http://solucaoemtransporte.com.br/sites/tours/brasilia/ (último acesso em 04/04/2018)

31
Figura 9 - http://verybilbao.com/en/comercios/museo-guggenheim-bilbao/ (último acesso em 04/04/2018)

Figura 10 - http://www.psam.uk.com/beijing-to-reuse-olympic-stadia-for-2022-winter-games
(último acesso em 04/04/2018)

32
Figura 11 - http://www.tremeuropa.com.br/trens-em-berlim/ (último acesso em 04/04/2018)

André Baeta, auditor federal de Controle Externo do TCU, em artigo publicado em


novembro/2014 na revista “Infraestrutura Urbana”,18 defende a contratação de projetos
pela modalidade concurso. Segundo o auditor, há vantagens para a Administração
Pública quando desse tipo de contratação, abaixo transcritas:

Com o concurso, contrata-se o melhor projeto, e não a melhor empresa.

A Administração Pública sabe qual é o projeto que está comprando,


visto que, ao receber as propostas, a contratante avaliará desenhos
conceituais, memoriais etc., ainda em fase preliminar.

18
Disponível em: http://www.caubr.gov.br/auditor-do-tcu-defende-concurso-para-contratacao-de-projetos/. Acesso em:
4 abr. 2018.

33
O projeto é entregue no prazo, sem aditivos ou aumento de custos.

Há aumento da competitividade entre as empresas projetistas.

O melhor projeto é selecionado por especialistas da área.

Há isonomia e impessoalidade na seleção do melhor projeto.

Assim, considerando-se as questões apresentadas no debate em tor-


no do tema, é possível concluir que há grande vantagem para a Admi-
nistração Pública na escolha da modalidade concurso ou licitações do
tipo “técnica e preço” para a contratação de projetos.

2.1.6 A diferença entre direito autoral e direito patrimonial: autores e coautores

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Reconhecer a proteção dos direitos autorais e a sua aplicação no âmbito do


poder público como contratante.
Surgida na Renascença, no início do século XIV, a questão dos direitos autorais trazia
no seu conceito original a proteção aos editores, o que, na Inglaterra, foi chamado de
copyright. Essa condição, fomentada pela então recente invenção da imprensa, tinha
por objetivo garantir àqueles editores e livreiros a remuneração dos altos custos de
impressão aos quais estavam submetidos, devido ao uso de gravuras (muito comuns
nos primórdios da imprensa) ou outras informações adicionais.

34
A proteção para os direitos do autor surgiria somente mais tarde, nos ares da Revolu-
ção Francesa, em oposição à condição protetiva inglesa, o que se chamou droit d’au-
teur. Essa condição trazia outra inovação: a divisão dos direitos em direitos patrimo-
niais e direitos morais, concedendo ao autor não só a proteção sobre a sua autoria,
como também à propriedade da sua obra.19

No Brasil, a legislação sobre direitos autorais teve início ainda no período imperial, por
meio da edição de normas vinculadas à proteção de obras jurídicas, com a criação dos
primeiros cursos de direito, com alguma evolução ao longo do período republicano e
sua consolidação, por meio da Lei nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973, que reunia a
legislação sobre o tema.

Na Constituição da República de 1988 surge, pela primeira vez em um texto constitu-


cional, a proteção dos direitos de autor como uma garantia individual. Vejamos o seu
art. 5º:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviola-
bilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprieda-
de, nos termos seguintes: (...)

XXVII – aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou


reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei
fixar (BRASIL, 1988).20

20

Dez anos depois é editada a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que revoga a lei
de 1973 sobre o tema e que está em vigor atualmente, com recente alteração pela Lei
nº 12.853, de 14 de agosto de 2013, incluindo a gestão coletiva dos direitos autorais,
as duas regulamentadas pelo Decreto nº 8.469, de 22 de junho de 2015.
19
DUARTE, E. C. V. G.; PEREIRA, E. C. Direito autoral: perguntas e respostas. Curitiba: UFPR, 2009. (Série FAQS em PI, v. 1).
20
BRASIL. Constituição da República Federativa de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988

35
No âmbito da Administração Pública e sua relação com os autores, aqui enfatiza-
dos os autores de obras intelectuais de projetos, um dos temas no nosso curso, é
limitada a possibilidade de transferência daqueles direitos. Como contratante, a Ad-
ministração tem a possibilidade de transferência para si apenas da parte relativa aos
direitos patrimoniais do autor.

Para tratarmos a questão, é necessário primeiramente que entendamos a divisão dos


direitos autorais.

Conforme a Lei nº 9.610/1998, esses dividem-se em patrimoniais e morais, a exemplo


das primeiras manifestações do modelo legislativo francês sobre o tema. O seu art.
22 diz que ambos os direitos pertencem ao autor da obra intelectual.

O direito moral, inalienável e irrenunciável, por tratar-se de direito que protege a cria-
ção de espírito, não pode ser transferido, e confere, ao autor, as seguintes prerrogati-
vas, dadas no art. 24 da Lei n° 9.610/1998:

Art. 24. São direitos morais do autor:

I – o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;

II – o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anun-


ciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;

III – o de conservar a obra inédita;

IV – o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modifica-


ções ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou
atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;

V – o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;

VI – o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utili-


zação já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à
sua reputação e imagem.

VII – o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre


legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo foto-
gráfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma
que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso, 36
III – o de conservar a obra inédita;

IV – o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modifica-


ções ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou
atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;

V – o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;

VI – o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utili-


zação já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à
sua reputação e imagem.

VII – o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre


legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo foto-
gráfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma
que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso,
será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causado (BRASIL,
1988).21

21

Para os incisos V e VI, são ressalvadas as indenizações aos terceiros atingidos: “§


3º Nos casos dos incisos V e VI, ressalvam-se as prévias indenizações a terceiros,
quando couberem” (BRASIL, 1998).

O art. 26 traz importante informação:

Art. 26. O autor poderá repudiar a autoria de projeto arquitetônico alterado


sem o seu consentimento durante a execução ou após a conclusão da cons-
trução.

Parágrafo único. O proprietário da construção responde pelos danos que


causar ao autor sempre que, após o repúdio, der como sendo daquele a auto-
ria do projeto repudiado (BRASIL, 1998).

21
BRASIL. Lei n° 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá
outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 1998.

37
Importante
Esse comando limita, portanto, a discricionariedade do contra-
tante quanto à alteração da obra intelectual, e deve ser muito
bem observado pela Administração Pública, aqui enfatizados os
projetos contratados pelo poder público, sob pena de gerar ao
autor, em eventuais alterações do objeto, o direito a indeniza-
ções.

O segundo grupo de direitos do autor são os patrimoniais, relativos à propriedade da


obra. Vejamos o que diz a Lei nº 9.610/1998 quanto a essa questão:

Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra lite-
rária, artística ou científica.

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da


obra, por quaisquer modalidades, tais como: (...)

X – quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a


ser inventadas (...)

Art. 37. A aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não confere ao


adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, salvo convenção em
contrário entre as partes e os casos previstos nesta lei (BRASIL, 1998).

38
A leitura dos artigos acima indica a necessidade de transferência daqueles direitos
patrimoniais pelo autor ao adquirente, para que esse possa fazer a utilização e o
usufruto da obra.

Quanto a isso, há previsão expressa na Lei nº 9.610/1998:

Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a


terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pes-
soalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio
de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em
direito, obedecidas as seguintes limitações:

I – a transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os de


natureza moral e os expressamente excluídos por lei;

II – somente se admitirá transmissão total e definitiva dos direitos mediante


estipulação contratual escrita (BRASIL, 1998).

Assim, é necessário que a Administração Pública, como adquirente do direito


patrimonial do autor (por meio da devida remuneração pela obra adquirida), faça
constar no edital da licitação cláusula expressa, conforme demonstrado no inciso II
do art. 49 da Lei n° 9.610/1998.

39
Importante
Veja que, diante do que estabelece aquela lei, é importante
também o cuidado da Administração Pública quanto à eventual
alteração do objeto contratado. Na execução de obras, a partir da
contratação de um Projeto Básico, conforme permitido pela Lei
n° 8.666/1993, deve ser observado com elevado critério a elabo-
ração do Projeto Executivo concomitante à obra, também autori-
zado pela referida lei. O Projeto Executivo em questão – com o
significado que tem – já discutido no tópico 1.1.2, do Módulo 1
deste curso, deve configurar-se em mero detalhamento comple-
mentar, jamais podendo alterar a concepção original dada no
Projeto Básico.

Alterações naquela concepção geram a possibilidade de o autor buscar indenizações


ou mesmo reparação judicial contra a ofensa ao seu direito moral.

A coautoria, por conseguinte, é instituto que prevê a assunção da


paternidade de uma obra artística ou trabalho técnico por dois ou mais
autores. A sua manifestação é direta, por meio do acordo entre os
participantes quando da composição do objeto, em que cada um dos
autores contribui com a sua ideia na elaboração do intento, trazendo
como resultado ideia única da combinação dessas. Os coautores têm
igual peso na responsabilidade pelo objeto constituído e também iguais
direitos.

40
Essa é uma das razões pelas quais se deve tomar cuidado quando da revisão dos
projetos contratados pela Administração Pública por meio da elaboração do Projeto
Executivo concomitante à obra. Essa também é uma das razões para a contrariedade
dos conselhos de classe (CAU/BR e sistema Confea/Crea) quanto a essa prática.

Permitida pela Lei nº 8.666/1993, no seu art. 7º, essa condição prevê a possibilidade
de complementação do Projeto Básico por meio do chamado Projeto Executivo, que
pode vir a transfigurar o objeto original, o que se caracterizaria uma clara afronta ao
direito autoral.

Observe

Lembre-se de que a Lei nº 8.666/1993, conforme já exposto neste


curso, no tópico 1.1.4, traz confusão nos conceitos de Projeto
Básico e Projeto Executivo. Para que se afaste o risco de ofensa à
autoria do projeto, a ação permitida para o momento da obra, em
relação à revisão do projeto, deveria ser tão somente a de detalha-
mento complementar. Essa complementação teria apenas o caráter
de esclarecimento da ideia advinda do projeto original (o Projeto
Básico da licitação) eventualmente não detalhada, ou que possa ter
gerado dúvida quanto à sua forma de execução, preservando a
autoria do objeto, impedindo o risco de desobediência ao direito
autoral e, desta forma, dando segurança à conduta do gestor do
contrato.

41
2.2 Como receber um projeto de edificações?

2.2.1 O recebimento do projeto: o que deve ser observado?

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Indicar a necessidade de verificação das normativas técnicas e demais


normativas legais citadas no projeto, sua vigência, a data da sua edição etc.
Nos processos licitatórios, o edital de licitação e o seu Termo de Referência ou Pro-
jeto Básico são os elementos que definem os procedimentos para as contratações
da Administração Pública. Dessa forma, ao ser recebido o projeto, toma-se como
primeira ação do gestor a necessidade de análise do objeto quanto à observância das
diretrizes expostas no Termo de Referência ou Projeto Básico do edital.

Nessa ocasião, a revisão deve pautar-se na observação do atendimento ao progra-


ma de necessidades, à legislação, às diretrizes técnicas e aos objetivos expostos
naquela peça processual.

Simultaneamente a essa revisão preliminar, o gestor mergulhará na documentação


do projeto para a identificação do atendimento aos itens de entrega obrigatória para
o tipo de objeto. A relação desses itens deve sempre estar expressa no Termo de Re-
ferência ou Projeto Básico para que o gestor tenha a legitimidade na sua cobrança.
Para a sua elaboração, no momento da montagem do edital, a Administração deve
fazer constar as orientações das normas técnicas, a bibliografia sobre o assunto e as
determinações dos conselhos profissionais.

Complementarmente, e como rica fonte de consulta, pode-se observar as orientações


do TCU, por meio da Portaria da Secretaria-Geral de Controle Externo (Segecex) nº 33,
de 7 de dezembro de 2012, no seu item I.1.2.1 e no seu Anexo II.

Os elementos mínimos a serem apresentados para o projeto de uma edificação de


porte médio, conforme esse item da portaria, são:

a) Levantamento topográfico;

b) Sondagens;

42
c) Projeto arquitetônico;

d) Projeto de terraplanagem;

e) Projeto de fundações;

f) Projeto estrutural;

g) Projeto de instalações hidrossanitárias;

h) Projeto de instalações elétricas;

i) Projeto de instalações telefônicas;

j) Projeto de instalações de detecção e alarme e de combate a incêndio;

k) Projeto de instalações lógicas;

l) Projeto de instalações de climatização e ventilação mecânica;

m) Projeto de instalação de transporte vertical.

O conjunto de documentos do projeto deve contemplar as peças gráficas (pranchas


de projeto), com a indicação da sua revisão e data, o Caderno de Encargos, o crono-
grama físico-financeiro e o orçamento detalhado, com a indicação da data-base para
os preços tomados.

No Caderno de Encargos, deve estar descrita a lista das pranchas de desenho inte-
grantes do projeto, com a sua revisão e data. No
cronograma físico-financeiro e no orçamento de-
talhado deve ser mostrado o título do projeto para
a sua fácil identificação. As pranchas de desenho
devem ser apresentadas dentro das normas da
ABNT, condição que deve estar expressa no edital.
Essa condição vale também para o Caderno de En-
cargos. Esse documento, conforme o tamanho do
objeto, atinge o volume de 400 páginas ou mais,
razão pela qual deva ser apresentado com sumá-
rio. Recomenda-se que o sumário siga a mesma sequência numérica que será apre-

43
sentada na planilha orçamentária, o orçamento detalhado. Essa forma de ordenação
não somente torna mais coesa a informação apresentada pelo autor do projeto, como
possibilita a facilitação do trabalho futuro do executor da obra e, principalmente, do
seu fiscal.

Para a conferência da documentação entregue, o gestor do contrato pode valer-se


da adoção de lista de checagem, documento que poderá ser anexado ao processo.
As observações quanto ao recebimento do objeto devem ser registradas em relatório
de análise, que servirá de documento de comunicação com a licitante e também será
integrado ao processo.

Deve também ser observada pelo gestor do contrato a indicação da


data de edição das leis ou normas técnicas referenciadas pelo autor do
projeto. É comum a citação de normas técnicas sem vigência ou que
tenham sido substituídas por outras normas, mais atualizadas, bem
como a referência a leis que tenham sido revogadas. Esse é um dos
principais erros cometidos nos projetos, assunto que será retomado
em tópico deste módulo.

2.2.2 A responsabilidade do gestor de contrato

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Enfatizar a responsabilidade do gestor do contrato de elaboração do projeto


frente ao objeto entregue, em relação a soluções, quantitativos, custos etc.
Na Administração Pública, o gestor de contrato responde solidariamente pelos da-
nos causados à Fazenda Pública (arts. 25, 50 e 71 da Lei n° 8.666/1993) ou por atos
praticados no exercício das suas funções (arts. 121 e 122 da Lei nº 8.112/1990). Ve-
jamos os exemplos:

44
Art. 25. (...)

§ 2º Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se com-


provado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à
Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público
responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis (BRASIL, 1993,
art. 25, § 2º).

Art. 121. O servidor responde civil, penal e administrativamente pelo exercício


irregular de suas atribuições (BRASIL, 1990, art. 21).22

22

Perceba que as ações dos agentes públicos devem, portanto, estar sempre ampara-
das em normativas legais que as legitimem. Essa condição estende-se às ações de
contratação e recebimento de um objeto, aqui especificamente tratado o projeto. A
mesma observação aos critérios legais que deve ter o gestor de contrato quando da
elaboração dos editais de contratação deve ser aplicada quando do recebimento do
projeto e da sua consequente revisão e aceitação.

Jurisprudência recente do TCU traz o entendimento da matéria por aquela


corte. Vejamos o que dizem os acórdãos:

1. A aprovação de Projeto Básico inadequado, com grandes implicações nos


custos e prazos de execução do empreendimento, reveste-se de gravidade
suficiente para justificar a apenação pecuniária do gestor responsável e a sua
inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança
no âmbito da Administração Pública Federal (BRASIL, 2015).23
23
1. A aprovação de Projeto Básico que não atenda ao disposto no art. 6º,
22
inciso
BRASIL. LeiIX, e nodeart.
nº 8.112, 12dezembro
11 de da Lei de8.666/1993 pode
1990. Dispõe sobre ensejar
o regime a responsabilização
jurídico dos
dos servidores públicos civis da União,
das autarquias e das fundações públicas federais. Diário Oficial da União, Brasília, 1990.
23 pareceristas da área técnica que endossaram o projeto.
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 915/2015 – TCU – Plenário. Brasília: TCU, 2015.

(...) Ressaltou o relator não ser “essa a conduta que se esperava dos parece-
ristas do DEG, que poderiam ao menos ter questionado a empresa projetista
acerca dos parâmetros utilizados para elaboração do projeto, efetuando
45
1. A aprovação de Projeto Básico inadequado, com grandes implicações nos
custos e prazos de execução do empreendimento, reveste-se de gravidade
suficiente para justificar a apenação pecuniária do gestor responsável e a sua
inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança
no âmbito da Administração Pública Federal (BRASIL, 2015).23

1. A aprovação de Projeto Básico que não atenda ao disposto no art. 6º,


inciso IX, e no art. 12 da Lei 8.666/1993 pode ensejar a responsabilização dos
pareceristas da área técnica que endossaram o projeto.

(...) Ressaltou o relator não ser “essa a conduta que se esperava dos parece-
ristas do DEG, que poderiam ao menos ter questionado a empresa projetista
acerca dos parâmetros utilizados para elaboração do projeto, efetuando
estudos comparativos com outras obras semelhantes e de mesmo porte” e,
no tocante ao volume de concreto das estruturas, “a conferência da memória
de cálculo da empresa projetista ou dos levantamentos realizados pela
licitante poderia atestar com precisão a necessidade de eventuais ajustes no
projeto”, mas, ainda que formalmente avisados das supostas falhas no proje-
to, os pareceristas não tomaram as medidas adequadas para sanar as pen-
dências. Enfatizou ainda o relator que, além dos expressivos acréscimos veri-
ficados no custo da obra, “a deficiência do Projeto Básico trouxe um atraso
de quase um ano no andamento do empreendimento em vista das negocia-
ções que pautaram a celebração do primeiro termo aditivo”. Por isso, no voto
que veio a ser aprovado pelo Colegiado, propôs aplicação da multa prevista
no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992, individualmente a cada um dos pare-
ceristas, e o acolhimento das razões do diretor de engenharia, que assinara o
contrato amparado no parecer técnico (BRASIL, 2016).24

24

Analisando-se os pressupostos legais citados, percebe-se claramente a responsa-


bilidade do gestor quanto aos seus atos administrativos. Essa estende-se por con-
sequência às questões específicas da sua função e habilitação, por meio da escolha
das soluções técnicas a serem adotadas na elaboração do objeto – o projeto, por
exemplo – e a criteriosa análise daquelas soluções propostas pelos projetistas. Essa
condição está amplamente amparada no Acórdão nº 915/2015 – TCU – Plenário, acima
citado, visto que dada a discricionariedade do gestor de contrato na aprovação do
projeto, pode-se configurar a desobediência aos princípios da economicidade e da
razoabilidade.
24
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 1.067/2016 – TCU – Plenário. Brasília: TCU, 2016.

46
Por todas as razões citadas, ainda que a
Administração Pública contrate o projeto
ou a obra com profissional ou empresa
qualificados e habilitados, ou que tenha
igualmente o assessoramento técnico
de empresa ou profissional habilitados
e qualificados, é também de sua respon-
sabilidade qualquer erro formal, impe-
rícia ou negligência, por meio dos seus
agentes públicos. Essa condição confirma a ideia de que é altamente recomendável
que os órgãos públicos que tenham no seu organograma setores responsáveis pela
contratação de projetos, obras ou quaisquer serviços de engenharia, contem com
profissionais legalmente habilitados e com constante processo de qualificação.

No âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRF), do MF, a Portaria RFB/


Sucor/Copol nº 566, de 30 de novembro de 2011 – dispõe sobre os procedimentos
relativos à elaboração de Projetos Básicos e Executivos, bem como à execução de
obras, serviços de engenharia, reparos e adaptações no âmbito da SRF – determina o
seguinte, no art. 3º, parágrafo 1º, do seu Anexo I:

Art. 3º Após a definição do Programa de Necessidades deverá ser elaborado


o anteprojeto. Este documento constitui a configuração inicial da solução
arquitetônica para a obra, considerando as principais exigências contidas no
Programa de Necessidades.

§ 1º O anteprojeto, sempre que possível, deverá ser elaborado por servidor


devidamente habilitado do Ministério da Fazenda, preferencialmente da
Secretaria da Receita Federal do Brasil (BRASIL, 2011).

47
2.2.3 A importância da observação da representação gráfica na apresentação de
projetos

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Identificar os erros mais comuns observados nos projetos;


§§ Reconhecer a consequência gerada pelo recebimento de um projeto com
deficiência na sua representação gráfica e os prejuízos daí advindos.

Você sabia que o desenho de projetos, que resulta na sua represen-


tação gráfica, assume notadamente dupla função?

A primeira está diretamente ligada ao processo criativo, à geração da ideia, ao


significado e ao teste das possibilidades, tema tratado dentro do campo da semiótica25
e intensamente desenvolvido por autores dedicados ao estudo do pensamento
complexo.

Nessa ação, a forma de representação certamente terá influência sobre o resultado


final, condicionando inclusive a fluidez das ideias do projetista. A escolha do
instrumento de representação gráfica condicionará a síntese do seu pensamento
criativo e o sucesso da intenção de projeto.26 Não nos deteremos nessa questão neste
curso; ela é citada apenas como referência ao potencial apresentado pelos diversos
instrumentos de representação gráfica.

25
Semiótica – É o estudo e caracterização dos signos, ou significado e significante, abrangendo linguagem verbal e não
verbal, conforme síntese das definições dadas nos estudos de Peirce, Santaella e Morin. [SANTAELLA, Lúcia. O que é
semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1983.
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Trad. Maria Gabriela de Bragança. 2. ed. Lisboa: Instituto Piaget,
1995.
PEIRCE, Charles Sanders. Textes fondamentaux de sémiotique. Paris: MéridiensKlincksieck, 1987 (tradução: B. Fouchier-
-Axelsen e C. Foz)]
26
Borges, M. M. Formas de representação de projeto. In: NAVEIRO, R. M.; OLIVEIRA, V. F. (Orgs.), O projeto de engenharia,
arquitetura e desenho industrial: conceitos, reflexões, aplicações e formação profissional. Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2001.

48
A segunda função remete à comunicação, como o próprio nome demonstra, à
correta representação da intenção do seu autor. Melhor comunicação haverá entre
o comunicante do projeto (o seu autor) e o seu leitor, quanto maior for a precisão e a
correção da representação.

Bertin (1986)27 esclarece essa condição por meio da relação da ação inventiva das
ideias, com a sua representação:

ETAPAS DA DECISÃO REPRESENTAÇÃO GRÁFICA


• Definir o problema; •  Análise matricial do problema
(definição de questões).
• Construir o quadro de dados.
• Adotar uma linguagem de tratamento; • Tratamento gráfico da informa-
ção (descobrir as respostas).
• Tratar os dados categorizando os dados
exaustivos.
• Interpretar para decidir e para comunicar • Representação gráfica de comu-
os dados simplificados. nicação (comunicar as respostas
encontradas).

Observando-se o quadro acima, percebe-se a complexidade do processo que


resulta na correta representação gráfica do objeto. Assim, o desenho final deverá
ser esclarecedor da intenção do seu autor, sob pena de falhar na comunicação do
objetivo pretendido.

Durante muito tempo a representação gráfica teve por objetivo apenas o registro dos
objetos. A partir do século XV, iniciou-se a transformação da forma comunicativa, in-
corporando ações criteriosas de análise qualitativa do objeto representado por meio
da riqueza de elementos dos instrumentos da sua representação. Essa mudança
deu-se por intermédio de Filippo Brunelleschi, arquiteto italiano da Renascença, e a
potencialidade comunicativa dos seus desenhos e esboços. Ao vencer o concurso
para o projeto da cúpula da Catedral Santa Maria Del Fiore, em Florença, Brunelleschi
utilizou instrumentos de representação gráfica que mostravam notável compreensão
do funcionamento estrutural da cúpula e a criteriosa análise do sistema construtivo,
por meio da representação figurada.28
27
BERTIN, J. A neográfica e o tratamento gráfico da informação. Tradução de Célia Maria Westphalen. Curitiba: UFPR,
1986.
28
CARVALHO JR., J. M. N. Prática de arquitetura e conhecimento técnico. 1994. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urba-
nismo) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 1994.

49
Figura 12 - http://plassen-buchverlage.e-bookshelf.de/products/reading-epub/product-id/2288474/title/
Brunelleschi%2527s%2BDome.html?autr=%22Ross+King%22 (último acesso em 12/04/2018)

Na mesma época, Leon Battista Alberti, arquiteto e pintor italiano renascentista,


complementando o trabalho iniciado por Brunelleschi, assinalou outro marco na
arquitetura e na engenharia, utilizando na representação de seus desenhos a análise
científica da perspectiva, o que consolidou a forma de apresentação de perspectivas
utilizadas atualmente, as perspectivas cônicas.

Figura 13 http://www.fupress.net/index.php/aisthesis/article/view/18238/16951 (último acesso em 12/04/2018)

50
A ABNT apresenta a NBR 6294/1994, atualmente em revisão, como normativa para a
representação gráfica em projetos de arquitetura. Muito embora específica para essa
disciplina, por analogia pode-se adotá-la como orientação para a representação grá-
fica de todas as demais disciplinas que concorrem para o projeto de uma edificação
(estrutural, elétrico, ar condicionado, hidrossanitário, etc.). Essa norma determina a
correta forma de apresentação do projeto de arquitetura, por meio da escolha das
linhas de representação, dos elementos mínimos necessários, do formato das pran-
chas de desenho, das técnicas de representação, etc.

Compete ao gestor de contrato a exigência de atendimento a tal norma quando da


contratação dos projetos da Administração Pública.

Importante
A incorreção e a imprecisão na representação gráfica dos proje-
tos contratados podem possibilitar erros de interpretação dos
desenhos por parte das licitantes, e, com isso, permitir conclu-
sões equivocadas quanto à técnica construtiva ou em relação
aos quantitativos do projeto, refletindo diretamente na formação
do preço da obra.

51
Os principais erros de representação gráfica encontrados nos projetos
são:

1. Não correspondência entre o corte do desenho e a sua marcação


em planta baixa. Essa condição pode levar à interpretação errada
do comando construtivo quando da execução da obra, onerando
o seu custo pela necessidade de correção (demolições e ajustes),
quando detectada pelo fiscal.
2. Não correspondência entre a legenda e os desenhos do projeto.
Essa situação pode causar, nos projetos de instalações, a
interpretação errada dos tipos de elementos (tubulações, fiação
etc.), ocasionando a quantificação equivocada de materiais.
3. Cotagem errada dos elementos de desenho, o que pode levar à
incorreta interpretação das medidas e à consequente execução
equivocada da obra ou quantificação de materiais.
4. Erro na representação das linhas de desenhos, especialmente
nos cortes e vistas, ocasionando a interpretação incorreta dos
elementos e levando à execução em desacordo com o projeto, o
que gera a necessidade de demolição e nova execução, onerando
o custo da obra.
5. Falta de indicação das bitolas das tubulações nas instalações
hidrossanitárias, em plantas baixas, ou sua indicação parcial. Essa
situação gera dúvidas quanto às bitolas corretas, de acordo com
o trecho e a hierarquia da rede, levando à eventual quantificação
errada das diferentes bitolas.

52
A figura demonstra a falta de informação quanto ao diâmetro da
tubulação da instalação de chuveiros automáticos para prevenção de
incêndio no seu trecho terminal, o que gera a dúvida sobre qual é o
diâmetro correto que deve ser adotado.

Perceba, portanto, caro aluno, que muito mais do que uma forma simplificada de
registro das intenções de projeto, a representação gráfica tem importante função,
por ser a ação responsável principalmente pela comunicação e pelo consequente
entendimento da ideia a ser transmitida. Projetos, muitas vezes simplificada e
depreciativamente chamados de meros “desenhos”, especialmente por leigos, são,
na verdade, complexas ações de desenvolvimento e manifestação das intenções e
ideias do seu autor, podendo condicionar o sucesso ou o fracasso do seu objeto.

53
2.3 Coordenando um projeto de edificações

2.3.1 A coordenação do projeto de edificações

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Observar a interdependência dos projetos que compõem uma edificação, a in-


terferência de um projeto em outro e as consequências das decisões isoladas.
Dentro da atividade de projeto, a coordenação assume condição de destaque, confi-
gurando-se em uma das iniciativas de maior importância a partir do seu projetista.
Nos editais da Administração Pública para a contratação desse tipo de serviço, a
coordenação de projetos deve estar listada como uma das atividades que comporão
o serviço prestado e que deve ser tratada com ênfase, dada a sua importância. A
despeito da discussão jurídica existente entre os conselhos profissionais (Sistema
Confea/Crea e CAU/BR)29 sobre a legitimidade para o desenvolvimento dessa ativi-
dade, saiba que a sua responsabilidade é exclusiva daquele profissional que concebe
o projeto. Assim, espera-se que, nos projetos desenvolvidos por engenheiros, a sua
coordenação a eles seja vinculada, e que nos projetos desenvolvidos por arquitetos
imponha-se a mesma lógica.

Naturalmente, nos projetos relacionados à infraestrutura (pontes, estradas, barra-


gens etc.), normalmente desenvolvidos por engenheiros, estes também assumirão a
figura de coordenadores.

Por outro lado, nos projetos de edificações, normalmente desenvolvidos por arquite-
tos, a responsabilidade recai sobre tais profissionais.

29
Ver Resolução Confea nº 1010/2005, Resolução CAU/BR nº 51/2013, Resolução Confea/Crea nº 1048/2013 e Notas
Explicativas sobre a Especificação e Fundamentos das Atividades Privativas de Arquitetos e Urbanistas – CAU/BR.

54
Tome Nota
Este curso não tem por objetivo acalorar a polêmica sobre as com-
petências privativas ou compartilhadas de tais profissionais, mas é
importante esclarecer a necessária atuação do responsável pelo
projeto, seja ele arquiteto, seja engenheiro, na sua coordenação.
Afinal, a coordenação do projeto garantirá a sua qualidade e somente
o seu criador, que o concebe, tem condições plenas de tomada de
decisões sobre a sua forma de elaboração. Ainda que essa atividade
possa ser desenvolvida por outro profissional, dos quadros do órgão
público, ou contratado para tal, na forma de atividade de revisão do
projeto, é incomparável o domínio do processo pelo seu projetista.

Mas o que é a coordenação do projeto?

Para responder a essa questão, deve ser inicialmente entendido como um projeto é
concebido. Especialmente em projetos de arquitetura, a soma das variáveis envol-
vidas apresenta questões de ordem formal (formas arquitetônicas), teórica (teorias
de arquitetura), estética, análise de estruturas (sustentação do edifício, no caso de
edificações), análise de instalações (subdisciplinas como instalações elétricas, hi-
drossanitárias, de climatização e ventilação mecânica etc., no caso de edificações) e
completa normativa técnica e legal aplicada ao campo de atuação. Para consolidar
todas essas variáveis há várias formas de abordagens, o que requer a atuação do
coordenador, em um processo de grande complexidade.30 A coordenação é então o
30
DÜLGEROGLU, Y. Design methods theory and its implications for architectural studies. Design methods: theories, resear-
ch, education and practice. California, v. 33, n. 3, p. 2870-2879, 1999. JUTLA, R. An inquiry into design methods. Design
methods: theories, research, education and practice, California: Design Methods Institute, v. 30, n. 1, p. 2304-2308, 1996.

55
teste contínuo e sistemático de integração, interdependência e consolidação de in-
fluências dessas variáveis, de forma a buscar o melhor resultado possível na concep-
ção final do objeto.

Dada a ideia acima, conclui-se que o profissional legítimo para a ação de coorde-
nação do projeto deve efetivamente ser o seu criador. Comumente confundida com
gerenciamento de projetos, a coordenação representa atividade inerente ao processo
criativo e não pode ser delegada. Enquanto o gerenciamento atua no controle de pra-
zos e processos, promovendo a intermediação entre os profissionais ou as atividades
envolvidas na elaboração de um projeto, a coordenação promove a integração do
projeto, é inata do seu processo e exclusiva do seu agente.

A falta da coordenação nos projetos possibilita o surgimento de lacunas ou questões


não respondidas, que resultam na imprevisão de soluções, acarretando o incremento
dos custos da execução das obras dele advindas. Na Administração Pública, cujo
roteiro a ser seguido encontra variadas regras e procedimentos, a falta dessa iniciativa
causa prejuízos financeiros significativos. Uma boa coordenação de projetos a
partir do seu projetista minimiza a necessidade de revisão dos projetos por parte do
órgão público, economizando tempo e mão de obra. Minimiza também os erros de
orçamento, visto que a coordenação identifica incompatibilidades que possam existir
entre as diversas subdisciplinas integrantes de um projeto.

Finalmente, e não menos importante, pode-se dizer que a coordenação do projeto


atua no resultado formal e estético do objeto, ao controlar as interferências intrínse-
cas do processo projetivo, de uma disciplina em outra, cuja falta de controle poderia
condenar a beleza, a funcionalidade e o desempenho do produto final.

A atuação do projetista não se limita, então, ao domínio da sua especialidade. A


sua responsabilidade estende-se à amarração das informações que consolidem o
objetivo pretendido, representado pelo objeto de arquitetura ou engenharia, seja ele
uma edificação, seja elemento de infraestrutura urbana ou viária.

56
Ao arquiteto, desenvolvedor do projeto de arquitetura de uma
edificação, cabe a tomada de decisão, assessorado pela sua
equipe de projetistas complementares, sobre o sistema ideal
de condicionamento do ar, alimentação de água fria ou quente,
esgoto pluvial e sanitário, elementos estruturais ou qualquer outra
infraestrutura que integre o objeto.

Ao engenheiro, desenvolvedor de um projeto de infraestrutura ur-


bana ou viária, cabe a tomada de decisão, igualmente assessora-
do pela sua equipe de projetistas complementares, sobre o sis-
tema ideal a ser adotado pelas demais disciplinas que integrem
aquele projeto.

Nos dois casos, os únicos profissionais que têm plenas condições


de dar as melhores soluções globais e integradas para o produto
final são os responsáveis pela sua concepção, pois somente eles
detêm com clareza a ideia formal sobre o objeto desenvolvido.

2.3.2 A compatibilização dos projetos

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Distinguir o conceito de projeto (desenhos, orçamento e Caderno de


Especificações);
§§ Reconhecer a necessidade de uma análise completa de todos os documentos
que compõem um projeto e a sua inter-relação.

No tópico anterior, procurou-se identificar o conceito de coordenação de projetos,


examinando as ações envolvidas no processo criativo do projeto e a sua distinção do
conceito de gerenciamento de projetos, atividade que atua notadamente no controle
dos processos, prazos e intermediação dos atores envolvidos na elaboração de um
projeto. Por ser termo de amplo significado, o gerenciamento de projetos aplica-se a
várias áreas do conhecimento humano, e não somente à construção civil.

57
A compatibilização de projetos, seguindo-se tal linha de raciocínio, pode ser entendida
como um nível mais específico de atuação do projetista na elaboração do seu projeto.
Os termos “coordenação” e “compatibilização” de projetos têm conceitos similares,
muitas vezes se confundindo. O primeiro, no entanto, é mais abrangente, conforme
apresentado no tópico anterior. A compatibilização de projetos dedica-se a um nível
mais imediato da sua análise e está refletida principalmente na sua representação
gráfica e nas suas interferências.

Note-se que, na apresentação desses conceitos (coordenação, gerenciamento


e compatibilização de projetos), a figura do projetista toma grande importância. A
Administração Pública como gestora do contrato (conceito apresentado no tópico
2.2.2 deste módulo) tem a responsabilidade sobre o projeto, pelo qual responde,
subsidiariamente, a projetista, sendo inclusive passível de denúncia por órgão de
auditoria ao conselho profissional, quando da sua má atuação e quando causadora
de prejuízos à Administração.

O projeto de uma edificação (ou de elemento de infraestrutura urbana ou viária) é


composto obrigatoriamente de alguns elementos, a saber: os desenhos gráficos, o
Caderno de Encargos e a planilha orçamentária com cronograma físico-financeiro.

É recorrente o entendimento, especialmente pelos leigos, de que um projeto é re-


presentado pelo conjunto de pranchas de desenho que o representam. Muitas ve-
zes equivocadamente chamadas de “plantas”, as folhas integrantes desse conjunto
são apenas o item “desenhos gráficos” do pacote do projeto. A esse somam-se o
documento descritivo da sua materialização (Caderno de Encargos) e os documen-
tos quantificadores e formadores de preço do seu objeto (planilha orçamentária e
cronograma físico-financeiro). Cada um desses elementos deve estar perfeitamente
integrado aos demais, sendo obrigação precípua do projetista a sua coesão, coerên-
cia e consolidação. Subsidiariamente compete à Administração Pública, por meio do
gestor de contrato, a completa revisão desses elementos para a verificação da sua
integração.

A compatibilização de projetos deficiente promove a dúvida sobre a decisão a ser


tomada, na eventualidade de contradição de informações entre os documentos de
um mesmo projeto, podendo gerar prejuízos financeiros à Administração Pública. Um

58
mesmo item do projeto deve ter idêntica especificação nas pranchas de desenho, no
Caderno de Encargos e na planilha orçamentária, e essa consolidação é obrigação do
projetista, o autor e criador do projeto.

Observe

Ao gestor do contrato, arquiteto ou engenheiro, é obrigatória a revi-


são desses elementos para que se identifiquem eventuais incompa-
tibilidades de informações, tornando-se essa uma responsabilidade
solidária, em jurisprudência pacificada pelos Tribunais Superiores e
órgãos de controle, conforme já demonstrado ao longo deste curso.
Caso ocorra tal situação, deve ser gerado relatório ao projetista,
para que este promova as devidas correções e esclareça as dúvidas
e contradições.

Na hipótese de não identificação de incompatibilidades existentes nesse conjunto


de documentos no momento da contratação do projeto e após o seu aceite, caberá ao
fiscal da obra, durante a execução, a mediação da solução, buscando sempre o escla-
recimento das dúvidas junto ao projetista. Eventuais alterações em quantitativos e
valores daí advindos deverão ser realizadas.

Dentro do conjunto das pranchas de desenho, os


seus diversos elementos gráficos devem igual-
mente apresentar coerência e relação entre si. Essa
condição, tratada no tópico 2.2.3 deste módulo,
evita o surgimento de dúvidas por eventuais infor-
mações desencontradas que possam haver entre
os diversos desenhos integrantes do conjunto de
pranchas gráficas. Erros dessa ordem são muito
comuns nos projetos da construção civil, em função da falibilidade do procedimento
de composição de desenhos pelo método atualmente adotado, o uso de softwares

59
de CAD (Computer Aided Design – ou Projeto Assistido por Computador). A necessi-
dade de geração dos seus diversos elementos em momentos distintos muitas vezes
possibilita esse desencontro de informações. As novas tecnologias, especialmente o
conceito BIM, trazem alto grau de precisão na produção integrada dos diversos dese-
nhos de um projeto, assunto que será tratado no tópico 2.3.4.

Os elementos “Caderno de Encargos” e “planilha orçamentária”, tanto quanto possível,


devem ter estrutura de organização similar. Assim, a listagem dos itens da planilha
orçamentária deve buscar obedecer à distribuição dos itens trazida no sumário do
Caderno de Encargos, com numeração sequencial hierarquizada para os diversos
elementos do projeto.

2.3.3 O “projeto-mãe” em projetos de edificações

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Identificar a importância do projeto de arquitetura no projeto de edificações,


como referência para todos os demais projetos.
Como você já pôde ver em tópicos anteriores, o projeto de uma edificação envolve um
grande número de disciplinas de acordo com as instalações específicas que serão
necessárias no edifício. Como também já destacado, esses projetos devem guardar
estreita e coerente relação entre si.

Em um edifício de porte médio, convencional, com vários pavimentos, destinado a


escritórios ou instalações administrativas, no atual estágio da construção civil, serão
necessários os seguintes projetos, minimamente:
§§ Projeto de arquitetura;
§§ Projeto estrutural (concreto armado, metálico ou madeira);
§§ Projeto de instalações hidrossanitárias (água fria e/ou quente, esgoto sanitário,
esgoto pluvial, água de reúso);
§§ Projeto de instalações elétricas (tomadas, pontos de força e iluminação);
§§ Projeto de instalações de rede lógica (dados e voz);
§§ Projeto de instalações de CFTV (circuito fechado de televisão);

60
§§ Projeto de controle de acesso;
§§ Projeto de instalações de climatização e ventilação mecânica;
§§ Projeto de prevenção e proteção contra incêndios (sistemas passivos e ativos
– saídas de emergência, iluminação de emergência, hidrantes, chuveiros
automáticos etc.);
§§ Projeto de elevadores;
§§ Projeto de GMG (grupo motogerador);
§§ Projeto de urbanização e paisagismo.

E ainda, conforme o detalhamento do projeto:

§§ Projeto de esquadrias;
§§ Projeto de revestimento de fachadas;
§§ Projeto de cogeração de energia;
§§ Projeto de tratamento de efluentes.

Observe

Essas disciplinas, com seus desenhos finalizados integrando o con-


junto impresso da documentação de projeto, da forma como é prati-
cado atualmente, resultam em centenas de pranchas de desenho,
chegando facilmente a 500 pranchas, nos formatos A1 ou A0, para
edifícios de médio porte (dez pavimentos, com área construída
entre 20.000 e 30.000 m²). Esse complexo conjunto de desenhos
tem como ordenador inicial o projeto de arquitetura. Embora tal
informação possa parecer óbvia, é comum a sua incompreensão,
em que se verifica muitas vezes a adoção da premissa errada para
a elaboração de uma determinada disciplina, ao basear-se em pro-
jeto diferente do projeto de arquitetura.

61
Para que se consolide o entendimento, vejamos o que determinava a ABNT NBR
13531:1995 – Elaboração de projetos de edificações – Atividades técnicas:

Essa norma técnica foi cancelada em 2017, estando em processo de revisão, tendo
sido substituída pelo conjunto de normas ABNT NBR 16636:2017 – Elaboração e
desenvolvimento de serviços técnicos especializados de projetos arquitetônicos e
urbanísticos.31

O texto da norma em vigor traz, na sua parte introdutória, a seguinte orientação:

31
Ver informação no sítio da ABNT: <http://www.abntcatalogo.com.br/norma.aspx?ID=5011>. Acesso em: 14 abr. 2018.

62
Naturalmente, a interação dos projetos faz com que tal lógica seja contrariada em
casos específicos. Pode-se citar como exemplo a necessidade de dimensionamento,
no projeto elétrico, dos pontos de força que alimentarão as máquinas climatizadoras
ou ventiladoras, informação advinda do projeto de climatização e ventilação mecâ-
nica. Certamente, nesse caso específico, a melhor fonte de informação é realmente
aquele projeto de instalações de climatização, visto que o projeto de arquitetura não
apresenta tal informação, tampouco se propondo a apresentá-la.

Importante
Excetuando-se essas condições específicas, que deverão ser
coordenadas pelo autor do projeto, todas as disciplinas devem
remeter-se às orientações dadas no projeto de arquitetura, sob
pena de a representação gráfica da disciplina em questão não
ser clara, sendo por vezes confusa e ilegível, conforme for a base
de desenho equivocadamente escolhida para a sua elaboração.

A figura 15 mostra o resultado indesejado gerado pela escolha da base de desenho do


projeto de climatização e ventilação mecânica para a elaboração do projeto de pre-
venção de incêndio. Note-se que o desenho não está legível, causando dificuldade na
identificação dos elementos que efetivamente interessam naquele desenho, as ins-
talações de prevenção de incêndio. Dentro do retângulo vermelho é mostrada a área
que foi ampliada na figura 16, em que se pode identificar em destaque os elementos
do projeto de climatização e ventilação mecânica (tubulação de insuflamento de ar
exterior e evaporadoras), em detrimento da representação gráfica dos elementos da
instalação de prevenção de incêndio (eletrodutos, com a identificação dos circuitos, e
detectores de fumaça, apontados pelas setas de cor laranja).

63
Figura 15

Figura 16

2.3.4 A plataforma BIM e o seu papel na coordenação e na compatibilização dos


projetos

Ao final deste tópico, o aluno será capaz de:

§§ Destacar as vantagens da modelagem digital para a qualificação dos projetos


e para a diminuição dos custos;
§§ Demonstrar que a diminuição dos erros grosseiros nas obras é resultado de
uma boa compatibilização e coordenação dos projetos.

64
A partir da evolução da forma de representação gráfica iniciada no Renascimento,
com Brunelleschi e Alberti,32 intensificou-se o uso das perspectivas cônicas com-
postas de um ou dois pontos de fuga e, como você já pôde ver em tópicos anteriores,
seguiu-se a invenção do sistema de representação através de diedros33, por Gaspard
Monge.34 Naquele sistema, um dado objeto é projetado simultaneamente em dois
planos de projeção ortogonais – o diedro –, trazendo para o desenho conceitos ma-
temáticos, criando a geometria descritiva e fundando a base para o desenho técnico
moderno. Essa técnica permitiu o início da representação de um objeto tridimensio-
nal em planos bidimensionais, conforme identificado na figura abaixo:

Fonte: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAglgcAB/apostila-geometria-descritiva -
Acesso em: 16 maio 2018.

32
Filippo Brunelleschi foi um arquiteto, engenheiro e pintor italiano do período da Renascença (Florença, 1377 – Florença,
1446) que resgatou a utilização das perspectivas, muito adotada na cultura greco-romana da Antiguidade, para a repre-
sentação de desenhos na forma tridimensional. Brunelleschi é o responsável pela criação da perspectiva cônica com um
ponto de fuga, representando os desenhos em três dimensões, da forma como efetivamente as imagens são vistas pelo
olho humano. Leon Battista Alberti foi um arquiteto, pintor e escultor italiano do período da Renascença (Gênova, 1404
– Roma, 1472) que, a exemplo de Brunelleschi, utilizou o desenho em perspectiva como forma de representação gráfica.
Continuando o trabalho por ele iniciado, Alberti foi o autor da primeira análise científica da perspectiva, por meio do estu-
do das proporções do edifício e da geometrização do espaço.
33
Diedros – É a união de dois semiplanos perpendiculares entre si. Por analogia pode-se comparar o diedro como se fosse
um livro aberto, com suas páginas formando um ângulo de 90°.
34
Gaspard Monge (Beaune, 1746 – Paris, 1818) foi um matemático francês criador da geometria descritiva, a base mate-
mática do desenho técnico.

65
A técnica criada por Monge exige que se represente o objeto em vários planos bi-
dimensionais, para que sejam mostradas todas as suas faces. Assim, quanto mais
complexo for o objeto a ser representado, maior será o número de planos necessários.
Nesse método, a representação gráfica de um triedro35 exige três planos, enquanto a
representação de um octaedro36 exigirá oito. Dessa forma, quando da necessidade de
modificação do objeto tridimensional, a alteração deve considerar todos os planos de
representação, identificando quais os planos cujas modificações serão representa-
das. Essa condição traz ao desenho técnico a necessidade de extremo cuidado, para
que não sejam esquecidas as modificações do objeto em todos os planos em que
essa ocorrerá. Falhas na execução dessa técnica trazem infidelidade ao desenho, e,
na atividade de projeto, podem causar grandes prejuízos à interpretação do desenho,
distorcendo o entendimento do objeto representado.

Em um projeto de edificação, situações como essa influenciam diretamente a


quantificação das partes do objeto, com reflexos no seu custo. Os sistemas baseados
em CAD, assim como os sistemas adotados anteriormente – o desenho na prancheta
–, apresentam grande possibilidade de falhas por essa condição. Quando uma
alteração é feita em uma vista de desenho, imediata e manualmente, deve ser feita
nas demais vistas, para que a informação representada guarde coerência.

Tome Nota
Com o advento da tecnologia BIM, situações como essas desapare-
ceram. Isso porque, na estratégia da plataforma BIM, a forma de
representação do objeto não se dá em planos, e sim no espaço,
como um objeto tridimensional, por meio de um modelo digital,
representando o objeto como este ocorre na realidade. Nos softwa-
res que adotam a tecnologia BIM, qualquer vista do objeto será a
partir do modelo tridimensional, o que promove a sua interdependên-
cia com as outras vistas. Assim, ao serem feitas alterações em uma
vista extraída do modelo – um corte do modelo, por exemplo –,
35
Triedro – Elemento da geometria espacial composto de três lados, ou três planos.
36 essasda geometria
Octaedro – Elemento alterações automaticamente
espacial serão
composto de oito lados, ou refletidas
oito planos. nas demais
vistas. Para o projetista, elimina-se a preocupação com a alteração
manual das modificações sofridas pelo objeto nas tantas vistas que
o representarem. Somente por essa condição, a tecnologia BIM já
trouxe grande ganho à atividade de projeto, o que elimina a possibili- 66
Com o advento da tecnologia BIM, situações como essas desapare-
ceram. Isso porque, na estratégia da plataforma BIM, a forma de
representação do objeto não se dá em planos, e sim no espaço,
como um objeto tridimensional, por meio de um modelo digital,
representando o objeto como este ocorre na realidade. Nos softwa-
res que adotam a tecnologia BIM, qualquer vista do objeto será a
partir do modelo tridimensional, o que promove a sua interdependên-
cia com as outras vistas. Assim, ao serem feitas alterações em uma
vista extraída do modelo – um corte do modelo, por exemplo –,
essas alterações automaticamente serão refletidas nas demais
vistas. Para o projetista, elimina-se a preocupação com a alteração
manual das modificações sofridas pelo objeto nas tantas vistas que
o representarem. Somente por essa condição, a tecnologia BIM já
trouxe grande ganho à atividade de projeto, o que elimina a possibili-
dade da ocorrência dos erros descritos no tópico 2.2.3 deste módulo,
quando utilizados os sistemas CAD.

A grande vantagem dessa nova tecnologia, no entanto, está na coordenação e na


compatibilização dos projetos. Nos softwares que adotam a tecnologia BIM, as
diversas disciplinas integrantes do objeto, um projeto de uma edificação, por exemplo,
são representadas a partir do mesmo modelo digital, tridimensional. Assim, tendo-se
a representação do modelo de arquitetura do edifício, pode-se incluir espacialmente,
por meio de medidas reais, em escala, as diversas instalações aplicadas ao modelo
de arquitetura, tais como instalações elétricas, hidrossanitárias e de climatização e
ventilação mecânica, além do sistema estrutural.

As instalações representadas serão mostradas tridimensionalmente, com os tama-


nhos reais, facilitando a sua visualização e identificando o espaço por elas ocupado.
Dessa forma são facilmente identificadas as interferências de uma sobre a outra que
eventualmente possa haver, promovendo a sua coordenação.

Alguns softwares BIM trazem a possibilidade da detecção automática de conflitos,


proporcionando ao projetista a rápida visualização das eventuais interferências.
No quesito das informações do projeto, a tecnologia BIM tem como instrumento a
quantificação automática dos elementos e sistemas do objeto, o que permite gerar
relatórios de quantitativos que servirão à composição do seu orçamento e à formação
de preço, eliminando a possibilidade de erros na sua compatibilização.

67
Importante
Uma falha desse sistema, no entanto, é a impossibilidade de atu-
alização automática dos preços dos insumos ou serviços
quando da alteração do seu valor. Softwares de orçamento atual-
mente existentes possibilitam a comunicação direta com bases
de dados de preços de serviços e insumos, o que torna automáti-
ca a atualização de uma planilha orçamentária de um projeto,
facilidade não encontrada nos atuais softwares BIM.

Ainda assim, a tecnologia BIM deverá, muito em breve, ser dominante no processo
de projeto, dadas as enormes vantagens por ela oferecidas. Um projeto elaborado
dentro dessa plataforma apresenta grande fidelidade e coordenação entre os seus
elementos, o que reduz os custos finais do objeto a ser construído, em função da
previsão antecipada do seu resultado e da possibilidade de tomada de decisões,
preventivamente, na eventualidade da ocorrência de alguma incompatibilidade. Essa
condição diminui a necessidade de aditamentos ao contrato quando da execução
da obra por eventuais erros de projeto. Para a indústria da construção civil e para
a Administração Pública essa é uma grande vantagem, ao otimizar os custos de
produção e eliminar os retrabalhos na execução do objeto.

Nos últimos anos a tecnologia BIM vem se tornando obrigatória nos projetos das
edificações públicas de alguns países. Você sabia que entre esses estão França, In-
glaterra, Alemanha, Suécia, Noruega, Estados Unidos e recentemente Espanha, com
previsão até o final de 2018? Pois saiba que no Brasil essa obrigatoriedade poderá vir
a ser adotada em breve. Na edição de 5 de junho de 2017 do Diário Oficial da União, a
Presidência da República (PR) editou decreto que instituiu a criação do Comitê Estra-
tégico de Implementação do BIM.37 Nesse decreto, uma das atribuições do comitê era
37
BRASIL. Decreto de 5 de junho de 2017. Institui o Comitê Estratégico de Implementação do Building Information Mo-
delling. Diário Oficial da União, Brasília, 2017. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.
jsp?data=06/06/2017&jornal=1&pagina=19&totalArquivos=216>. Acesso em: 15 abr. 2018.

68
a de “propor, no âmbito do Governo Federal, a Estratégia Nacional de Disseminação
do BIM, as suas diretrizes e a estratégia de atuação” (BRASIL, 2017, art. 3º, item I).
Recentemente, em 17 de maio de 2018, foi editado o Decreto nº 9.377, que institui a
Estratégia Nacional de Disseminação do BIM e que revogou o decreto de 5 de junho
de 2017.

69
Encerramento
Neste Módulo 2 foi abordado o projeto de edificações com seus temas vinculados.
Ainda que muitos conceitos sejam específicos da área, nos quais engenheiros e
arquitetos têm pleno domínio, a abordagem buscou esclarecer, de forma didática
para os leigos, os conhecimentos inseridos nesses conceitos. Uma das ênfases
deste módulo foi o peso e a importância que tem um projeto bem desenvolvido para a
execução da obra, sendo diretamente responsável pela otimização do seu custo, sua
durabilidade, seu desempenho e o regime de manutenção durante a sua vida útil.

O projeto foi também apresentado como um instrumento para tomada de decisão,


atividade prévia à sua função final, que são o roteiro e as especificações técnicas de
materiais e serviços para a execução da obra. Tema importante, estudou-se também
os conceitos de direito autoral, o limite das responsabilidades do projetista e do
executante, além de um debate sobre a modalidade de licitação mais indicada para a
contratação de projetos, com o posicionamento das cortes de julgamento de contas
e dos conselhos profissionais.

Por fim, com o encerramento do módulo, foram abordados os temas de coordenação


e compatibilização de projetos, com os instrumentos disponíveis para essas ações,
e o seu recebimento. Essas duas iniciativas, igualmente importantes, quando bem
executadas, condicionam o bom andamento da obra e a redução dos riscos daí
advindos.

70

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