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COTROLE DA HIDROFILICIDADE E HIDROFOBICIDADE

EM FILMES DE POLIPROPILEO POR IRRADIAÇÃO UV


ASSISTIDA A PRESEÇA DE VAPORES REATIVOS

Pedro H. de M. Leal*, Rajajeyaganthan Ramanathan, Daniel E. Weibel

1*
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, Instituto de Química, Departamento de Físico-Química, Porto
Alegre – RS – ph_leal@hotmail.com

Superfícies de filmes finos de polipropileno (PP) foram modificadas utilizando a técnica de irradiação UV assistida na
presença de vapores reativos, conferindo-lhes características hidrofóbicas ou hidrofílicas. As irradiações UV foram
realizadas na presença de vapores de Trimetóxi-propil-silano (TMPSi) ou Ácido Acrílico (AA). Quando TMPSi foi
usado como vapor reativo, a superfície do PP passou a ser hifdrofóbica, com um ângulo de contato (WCA) de ~ 145
graus. Seguindo o caminho contrário, quando vapores de AA foram utilizados durante a irradiação, a superfície final
obtida apresentou propriedades hidrofílicas (WCA ~ 40 graus). As mudanças superficiais foram analisadas por medidas
de WCA e FTIR-ATR (UFRGS) e por análises de espectroscopia NEXAFS (Laboratório Nacional de Luz Síncontron,
LNLS, Campinas). A espectroscopia NEXAFS evidenciou a formação de novos filmes de características químicas
diferentes do PP original. Por exemplo, no caso do uso vapores de AA durante a fotólise UV, um filme de ácido
poliacrílico foi formado na superfície do PP. Análise de XPS dos filmes modificados está em desenvolvimento.

Palavras-chave: Polipropileno, hidrofobicidade, hidrofilicidade, funcionalização, UV assistido, ,EXAFS.

Hydrophilicity and hydrophobicity Control of Polypropilene films by UV-assisted irradiation in the presence of
reactive vapors

Polypropylene (PP) thin film surfaces were modified using the UV-assisted technique in the presence of reactive vapors
producing films with hydrophobic or hydrophilic properties. The irradiations were carried out in the presence of
Trimethoxypropylsilane (TMPSi) or Acrylic Acid (AA) vapors. When TMPSi was used as reactive vapor atmosphere
the final PP surface obtained was hydrophobic with a contact angle (WCA) of ~ 145 degrees. On the contrary, when
AA vapors were used during irradiation the treated surface presented hydrophilic properties (WCA ~ 40 degree). The
surface modifications were analyzed by WCA and FTIR-ATR (UFRGS) and by NEXAFS spectroscopy (Laboratório
Nacional de Luz Síncontron, LNLS, Campinas). NEXAFS spectroscopy showed evidence that new films with different
chemical properties to PP were formed. For example, when AA vapors were used during the UV photolysis, a poly-
acrylic film was formed on the PP surface. XPS analysis of the modified films is under way.

Keywords: Polypropylene, Hydrophobicity, Hydrophilicity, functionalization, UV-assisted, ,EXAFS.

Introdução
Os materiais poliméricos tornam-se cada vez mais dominantes nos mais variados segmentos
da sociedade, sendo encontrados frequentemente no cotidiano do ser humano, o que os torna
sinônimo de versatilidade. Os polímeros, quando não processados, podem não satisfazer os
requisitos técnicos e mecânicos apropriados para o uso requerido1. Uma forma de adaptá-los seria a
modificação de sua superfície, sendo esta, responsável pela interação do material com os demais
meios.
O Polipropileno (PP) é um polímero derivado do propeno (ou propileno). Segue
esquematizado abaixo, o seu monômero:
*
* n

Figura 1 – Monômero do Polipropileno

Dentre as vantagens para o uso do PP, podem ser destacadas as seguintes: o baixo custo, a
fácil moldagem, a boa estabilidade térmica e a alta resistência à fratura por flexão ou fadiga.
Consequentemente, o PP pode ser aplicado em diversas áreas, desde materiais domésticos (copos
plásticos, recipientes para alimentos e remédios, carpetes e brinquedos) a materiais hospitalares,
como por exemplo, seringas de injeção e material hospitalar esterelizável. Atualmente há uma forte
tendência à utilização do PP no interior de automóveis, o que viria a facilitar a reciclagem do
material no caso do sucateamento do veículo.
Dentre as propriedades físico-químicas do PP, podem ser destacadas: mecânicas (resistência,
abrasividade), físicas (leveza do material e a alta adaptabilidade à estruturas complexas) e químicas
(possui superfície com características hidrofóbicas2, entre outros). A molécula do polipropileno é
desprovida de grupamentos eletronegativos, resultando na ausência de polaridade, o que confere
uma característica hidrofóbica à sua superfície.
Superfícies superhidrofóbicas têm despertado muito interesse tanto na área de pesquisas das
universidades, quanto na área indústrial, devido à suas propriedades autolimpantes1. A
hidrofobicidade é relacionada ao ângulo de contato entre uma gota de água e a superfície em
questão (WCA – Water Contact Angle). Uma superfície que apresenta WCA menor que 90˚ é
denominada hidrofílica. Entre 90˚ e 150˚, a superfície possui características hidrofóbicas, e acima
de 150˚ a superfície é denominada superhidrofóbica, sendo de 180˚ o ângulo formado por uma
esfera perfeita em contato com a superfície. É de interesse então conferir a certos materiais
poliméricos propriedades hidro ou superhidrofóbicas para satisfazer uma determinada demanda ou
aplicação.
O uso de biomateriais em aplicações na medicina e áreas afins é uma esfera onde os
polímeros são utilizados, substituindo cada vez mais rapidamente outros materiais, como metais,
ligas e cerâmicos. Polímeros comummente utilizados nessa área, como poliuretano, poliestireno,
polisulfona e PP, apresentam um problema em comum: a hidrofobocidade. A superfície hidrofóbica
desses polímeros sintéticos condiciona a sua biocompatibilidade e, portanto diminui sua aplicação
potencial. Durante os últimos anos, muitos estudos foram realizados para modificar e melhorar as
propriedades físicas e químicas das superfícies poliméricas. Suas características, tais como: a
composição química, a hidrofobicidade, a condutividade e a densidade de ligação polimérica;
podem ser alteradas por uma variedade de técnicas1, como, por exemplo, corona-discharge3,

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tratamento com plasma4, polimerização por plasma5-6, enxertia por co-polimerização7 e tratamento
com ozônio e ultravioleta (UV)8.
O tratamento superficial com radiação UV na presença de gases ou vapores reativos
desenvolveu-se muito durante a última década. Diferente de outras técnicas que empregam descarga
e radiação (por exemplo, feixe de elétrons e corona discharge3), esta técnica é facilmente aplicável,
de baixo custo e não necessita de aparelhagem complexa e muito elaborada.9
Levando em consideração estudos já realizados na funcionalização da superfície de
poliuretano utilizando o tratamento com plasma de baixa pressão10-11 e a modificação da superfície
com UV assistido12, optou-se por estudar a modificação superficial do Polipropileno por radiação
UV com presença de vapores ou gases reativos, a fim de atribuir à superfície do polímero
características hidrofóbicas ou hidrofílicas que permitiriam ao PP ser utilizado em inumeras novas
aplicações.

Experimental
Preparo dos Filmes
Os filmes foram preparados pela técnica de spin-coating. Prepara-se uma solução de PP em
Xilenos a 135˚C e, ao chegar à disolução do PP, deposita-se, uma gota da solução (~0,1 ml) sobre
uma placa de aço inox de dimensões aproximadamente 1cm x 1cm que está a ~ 100˚C . Nesta
técnica, um filme fino (~ 200 nm de espessura) é formado em instantes.
Fotólise
Na funcionalização, foi utilizada uma lâmpada policromática de Hg de média pressão (250W) e
uma óptica de quartzo para a colimação da radiação. O reator foi feito de aço inoxidável, com uma
janela de quartzo. Antes de se iniciar cada funcionalização, o reator foi purgado durante
aproximadamente 15 minutos com os vapores reativos. Foram utilizados como vapores reativos, o
vapor de Ácido Acrílico (AA) (99%, Sigma-Aldrich) mantido a uma temperatura constante de
50°C, arrastado por gás N2 e o vapor de Trimetóxi-propil-silano (TMPSi) ( 97%, Aldrich) a
temperatura ambiente, também arrastado por gás N2. Em todos os casos procuraram-se manter o
fluxo constante e controlado entre 4,5 cm3/s e 5 cm3/s. O N2 foi obtido da White Martins Praxair
INC (99,99%).
Análise e Caracterização dos filmes
Várias técnicas de análise de superfícies foram empregadas, como Ângulo de Contato em
Água (WCA), tirando-se uma foto da gota de água aumentada em aproximadamente 60 vezes,
utilizando um microscópico QX5 USB com uma câmera embutida. A análise de WCA foi realizada
pelo Software Surftens 3.0.

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Espectros NEXAFS (,ear-edge X-ray absorption fine structure) foram obtidos medindo o
rendimento de elétrons total (corrente de elétrons na amostra) e simultaneamente monitorando o
fluxo de fótons incidentes numa grade de Au. Os dados finais foram normalizados por esse fluxo
para compensar flutuações na intensidade do feixe de luz. As experiências com radiação SR foram
realizadas no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), Campinas, Brasil. Como fonte de
radiação monocromática foi utilizada a linha de luz SGM (Spherical Grating Monochromator) de
espectroscopia VUV e Raios-X moles (250-1000 eV) com uma resolução (E/∆E) melhor que 2000.
As experiências foram realizadas numa câmara de ultra alto vácuo (UAV), com uma pressão base
de 10-7 Pa. Os substratos de aço inoxidável foram fixados diretamente no porta-amostra, utilizando
uma fita dupla face de condução.
As análises de Espectroscopia no Infra-Vermelho por Transformada de Fourier (FTIR)
foram obtidas com o aparelho Bruker modelo Alpha-P com resolução espectral de 4 cm-1 e módulo
de Refletância Total Atenuada (ATR).

Resultados e Discussão

Filmes sem tratamento de PP apresentaram WCA de ~ 93 graus, mostrando suas caracteristicas


químicas hidrofóbicas. Quando filmes de PP são irradiados com luz UV policromática em presença
de vapores de AA, suas propriedades químicas superficiais se modificam de tal forma que a
superfície do polímero torna-se mais hidrofílica, conforme se aumenta o tempo de fotólise. A Figura
2 mostra os resultados obtidos ao se irradiar filmes de PP na presença de vapores de AA. Duas
tendências podem ser observadas: primeiro, tem-se uma diminuição rápida do WCA até tempos
menores a ~ 60 minutos, para logo
observar-se uma aparente
estabilização do WCA a ~ 40 graus
80
a tempos maiores ou iguais a 60
minutos. Esse comportamento já foi
Angulo de contato (º)

observado anteriormente na 60

funcionalização de filmes de
poliuretano com vapores de AA e 40

foi interpretado como resultado da


formação de um filme fino de ácido
20
poliacrílico (PAA) produzido por 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130
Tempo de Fotólise (min)
reações de fotopolimerização12. O
WCA de um filme de PAA Figura 2 - Variação do ângulo de contato em filmes de PP
em função do tempo de fotólise na presença de vapores de
AA.

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preparado no laboratório12 é de ~ 43 graus muito próximo aos ~ 40 graus obtidos no presente estudo
em tempos de irradiação maiores a 60 min.
Com o objetivo de comprovar a existência de um filme de características diferentes na
superfície do PP, espectros de NEXAFS foram obidos a diferentes tempos de irradiação. Á medida
em que o tempo de fotólise aumenta, o espectro NEXAFS foi mudando sua forma até que, por
exemplo, a 120 minutos de irradiação (ver Fig. 3), em presença de vapores de AA, o espectro é
similar ao espectro NEXAFS do PAA obtido em reações de polimerização por plasma13. Os sinais
característicos correspondentes ao PP 287,2 eV e 292 eV14 sinalizados na Fig. 3 somem
completamente para dar lugar ao
sinal característico do PAA a

*
288.3 eV. Estes resultados
0,020 * C 1s σ C-C
C 1s σ C-H
confirmam a informação obtida
Intensity signal (u. a.)

PP sem tratamento
0,015
por WCA que indicavam a
presença de um filme sobre a
0,010

superfície do PP, que possuem
C 1s π ROC=O
PP com irradiacao UV características químicas diferentes
0,005
+ Vapores de AA
às do PP.
Quando filmes de PP foram
0,000
280 282 284 286 288 290 292 294 296 298 300 irradiados em presença de TMPSi,
Energia do foton (eV)
Figura 3 – Espectros NEXAFS de Carbono 1s de filmes de PP sem e observou-se um rápido aumento na
com tratamento com radiação UV na presença de vapores de AA. Tempo
hidrofobicidade do filme passando
de irraidiação: 15 min
o WCA de 93 para 145 graus em
15 minutos de irradiação (ver Fig. 4) e
tenderam a se estabilizar em um WCA de 160

aproximadamente 140 graus até 120


minutos de fotólise, que foi o maior tempo 140
Angulo de contato (º)

estudado. Espectros NEXAFS mostram


120
evidência da formação de um filme também
diferente do PP, indicando grupos
100
funcionais diferentes enxertados na
superficie do PP.
80

Estudos estão sendo desenvolvidos para


0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
obter maior informação sobre as mudanças Tempo de Fotólise (min)
químicas superficiais produzidas na
Figura 4 – Variação do ângulo de contato em filmes de PP em função do
tempo de fotólise na presença de vapores de TMPSi.

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superfície de filmes de PP por outras técnicas sensitivas à superfície como FTIR-ATR and XPS.

Conclusões
Com base nos resultados obtidos nas análises de WCA e NEXAFS pode-se concluir que o
uso da técnica de UV-assistida na presença de vapores reativos para a funcionalização da superfície
de Polipropileno é eficiente para conferir características hidrofóbicas ou hidrofílicas à superfície
deste polímero. No caso particular de utilizar vapores de AA, um filme fino de PAA foto-
polimerizou-se sobre a superfície dos filmes de PP. Quando TMPSi foi usado como vapor reativo,
um filme contendo polimerização do TMPSi foi formado conferindo características hidrofóbicas à
superfície, ao contrário do que se foi observado quando foi utilizado vapor de AA. Foi possível
mostrar que, dependendo do vapor utilizado, as condições químicas finais da superfície do PP
podem ser selecionadas. O uso de radiação UV em combinação com uma atmosfera de vapor
reativa é uma metodologia de baixo custo e simples de realizar.

Agradecimentos
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e LNLS. Os
autores gostariam também de agradecer a assistência técnica do grupo de espectroscopia VUV e
Raios-X mole do LNLS.

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