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Resumo
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Grafite encontrado numa rua de Buenos Aires – citado por Boaventura de Sousa Santos em Pela mão de Alice,
o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez, 1995, p. 322
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O Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXII” ou Relatório
Delors, como se tornou conhecido, foi iniciado em março de 1993 e concluído em setembro de 1996. Teve a
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Os professores são co-construtores da escola. A escola não é mais nem menos do que
os seus professores conseguem fazer dela. Sendo a reflexão coletiva um exercício sistemático,
contribuição de especialistas de todo o mundo e pretende ser uma contribuição à revisão crítica da política
educacional de todos os países. No Brasil esse Relatório foi publicado numa parceria entre UNESCO, MEC e
Editora Cortez, sob o título, “Educação: um tesouro a descobrir”, em 1996, e já está em sua oitava edição.
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a escola será capaz de gerar um conhecimento consciente sobre si mesma, dos seus limites e
das suas oportunidades que alimentam novas estratégias de ação compartilhada.
A competência profissional dos educadores deve estar pautada pela capacidade de
deliberação permanente e pela possibilidade de livre argumentação. Os docentes devem ser
capazes de reconstruir os saberes pedagógicos a partir da reflexão compartilhada nos grupos
de trabalho que entrecruza de modo vivo os conhecimentos práticos e as orientações teóricas.
Carr e Kemmis (1988) lembram que o campo educacional tende a não dar importância aos
conhecimentos teóricos e à investigação sobre os problemas e riquezas de suas próprias ações
concretas.
O cotidiano pedagógico reconstitui a teoria educativa e ressignifica o seu sentido no
contexto específico da escola. É possível pensar os centros escolares como centros de
investigação da própria prática, que desenvolvem os registros sistemáticos e a documentação
das suas práticas, gerando recursos para a reflexão pedagógica, para, como dizem Carr e
Kemis (1988, p. 15) “fazer frente aos desafios que representam os estudantes alienados, a
desmoralização do professorado e os currículos prescritos e pouco motivadores”.
Os processo de gestão escolar que se movimentem nessa perspectiva precisam
considerar a premissa básica de compreender a escola como uma organização aprendente,
capaz de sistematizar saberes sobre si mesma e de alimentar o seu próprio amadurecimento
institucional.
O conceito de organização aprendente é próprio de nossos dias, em que o
conhecimento se tornou volátil e de difícil domínio exclusivo. Não é á toa que a nossa
sociedade é chamada de sociedade do conhecimento. Dada a alta perecibilidade do
conhecimento, resta investir em mecanismos de aprendizado, elemento indispensável para a
sobrevivência das organizações.
A ação em grupo favorece uma identidade comum que gera compromisso e sentido de
“corpo”, uma vez que a unidade, que nunca é sinônimo de padronização, é fundamental numa
organização dinâmica como a escola. Podemos definir um modelo de gestão como a
apresentação de forma estruturada e organizada de como ocorre a integração entre os seus
sistemas internos, formais e informais que fazem com que seja possível atender às demandas
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do projeto institucional e que seja assumido pelas pessoas dentro de uma organização formal
de poder.
O pesquisador português Licínio Lima (1999, p. 9-12) considera que existem alguns
“modelos juridicamente consagrados” de gestão no espaço escolar, sendo que cada modelo
encerra um conjunto de orientações específicas para a ação administrativa. Esses modelos
dividem-se entre modelos decretados ou de reprodução e modelos recriados ou de produção.
Os modelos decretados em geral são os modelos mais usuais nos sistemas de ensino.
Aqui a palavra “decretado” aparece em sentido amplo para representar um “conjunto de
regras formais produzidas no sentido de orientar e de regular a ação organizacional e
administrativa a nível escolar.” (LIMA, 1999, p. 10). Assim, os modelos decretados se
apresentam com uma realidade normativa que tem força legal, representando um padrão de
administração centralizada que distribui competências e estabelece regras diversas, pouco
havendo de espaço para a ação dos atores sociais locais.
Os modelos decretados aparecem de modo mais visível nos sistemas oficiais que, “do
ponto de vista jurídico-normativo, regulam a organização e o funcionamento das escolas”
(IDEM, p. 9). No caso das escolas da rede pública, em especial algumas redes estaduais e
municipais, há um conjunto de portarias, regulamentos e prescrições que definem o modelo de
gestão para todas as unidades da rede.
Os modelos recriados ou de produção começam a surgir a partir do momento em que
as regras formais dos modelos decretados passam a enfrentar o cotidiano prático nas escolas.
A partir do momento em que as regras formais são publicadas, elas imediatamente escapam
aos limites da sua concepção, tornando-se, inevitavelmente, objeto de interpretação. Assim,
toda prescrição normativa passa a ter um modo de ser compreendida conforme o horizonte de
possibilidades do contexto em que é recebida, o que denuncia a fragilidade das esperanças de
unidade pretendidas com a padronização dos modelos decretados.
Desta forma os modelos recriados estão estreitamente vinculados aos modelos
decretados e acontecem quando não ocorre uma mera reprodução das regras formais
estabelecidas, mas vão mais longe, a ponto de se produzirem novas regras.
Muitas dessas “novas regras” jamais ganham força legal embora venham a ser
usualmente praticadas. Mesmo que pudessem vir a ser consideradas “ilegais” na maioria das
vezes acabam incorporadas no senso comum da instituição.
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Essas novas regras podem coexistir com as prescrições legais sem que o modelo
decretado seja afastado. Um exemplo clássico são os “ajustes internos “ que muitas escolas
fazem para escapar às prescrições do sistema que confrontam-se com as necessidades práticas
das pessoas.
O modelo praticado corre ao lado do modelo decretado. As soluções criadas nas
escolas para “contornar sem sair da legalidade” normas externas para gestão dos horários
dos professores, para o controle financeiro, para a elaboração de boletins informativos, etc,
ilustram bem a recriação institucional dos modelos decretados que de uma forma ou outra
ocorrem em todas as escolas.
O pesquisador Licinio Lima conclui com propriedade que “a produção de uma regra,
qualquer que seja o seu estatuto e a instância que a produziu, não arrasta obrigatoriamente e
automaticamente o seu cumprimento por parte de quem age e toma decisões em um contexto
escolar.” (LIMA, 1999, p. 12)
Existe um processo que é próprio das escolas que é o processo de recontextualização.
Isso representa o exercício que as equipes escolares inevitavelmente fazem de atribuir um
sentido pedagógico próprio às propostas, discursos e teorias que adentram o espaço escolar.
Digo que esse processo é inevitável, pois a recontextualização é um processo próprio dos
humanos na busca de atribuir sentido à vida e às suas conformações. Não haveria de ser
diferente e nem menos produtivo no processo das organizações escolares.
em seu projeto educativo. Uma escola reflexiva é uma organização aprendente que qualifica
não somente os que nela estudam, mas os que nela ensinam ou apóiam estes e aqueles, diz
Alarcão (2001, p. 15).
Organização Aprendente ou Learning Organization são, portanto, organizações
capazes de renovar e inovar continuamente. Vasconcelos (2004) afirma que o conceito de
organização aprendente é próprio de nossos dias, em que o conhecimento se tornou volátil e
de difícil domínio exclusivo. Dada a alta perecibilidade do conhecimento, resta investir em
mecanismos de aprendizado, elemento indispensável para a sobrevivência das organizações.
Essa temática será retomada no próximo capítulo, quando trataremos das perspectivas para
gestão numa escola reflexiva.
Brzezinsk (2001) parte da visão de Alarcão, de que a escola deve ser necessariamente
reflexiva e qualificante e amplia essa ideia, tomando a escola como necessariamente reflexiva
e emancipatória, por entender que a formação coletiva, “que é reflexiva e qualificante” como
afirma Alarcão, possibilita aos participantes, por meio de atividades de formação integradas,
uma ampliação e democratização de saberes e liberta-os de compreender o mundo somente na
perspectiva das suas próprias disciplinas.
Na escola reflexiva as pessoas são o sentido da existência da instituição. O espaço é
criado e recriado pelo convívio. Através da palavra, as pessoas se exprimem, confrontam as
suas ideias, desejos e expectativas, assumem responsabilidades e organizam-se. Uma marca
das escolas inovadoras é contar com a existência de líderes em todos os níveis hierárquicos. A
abertura às ideias do outro aparece como enriquecimento do processo de compreensão da
escola. A descentralização do poder estimula o envolvimento de todos e a atitude cooperativa.
O pensamento sistêmico aparece como importante capacidade a ser desenvolvida, uma vez
que representa o sujeito capaz de ver simultaneamente em várias direções sem perder o foco,
capaz de organização, conceitualização e de ação.
Um projeto pedagógico próprio pode ser o elemento viabilizador da construção da
escola reflexiva e emancipadora. Pressupõe a criação de uma comunidade educacional
enraizada no chão da escola e que traduza a visão que a escola tem de si mesma e o que
pretende. A qualidade social do ensino deve ser o compromisso primeiro do projeto
pedagógico institucional. Desdobramento do compromisso da escola com a qualidade social
do ensino, a formação continuada do professor que se realiza no locus de trabalho, de forma
regular e sistemática, planejada e inserida no Projeto Geral da Escola. Se os alunos passam
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pela escola, os professores ficam e acompanham o seu desenvolvimento, por isso a questão da
formação continuada é fundamental. Não podem ser demitidos de suas responsabilidades para
com a escola e com a sociedade. Devem tomar consciência da sua própria profissionalidade e
tomar isso como uma responsabilidade pessoal e coletiva.
Considerações finais: desafios para pensar a gestão do pedagógico na escola vista como
organização que aprende
(2003, p. 44), o gestor educacional deve ser “um animador da inteligência coletiva” da sua
comunidade escolar, orientando os percursos individuais e comunitários de seus
colaboradores no compromisso de gerir eticamente a escola. Mais importante do que cada
pessoa na escola sabe é o que cada pessoa na escola efetivamente é como ser humano.
A direção escolar não pode se concentrar apenas na função pedagógica. Também não
pode concentrar-se apenas nas funções de relacionamento com as famílias ou nos processos
administrativos. Na verdade o diretor coordena todos esses processos e para isso constitui
equipes multifuncionais. Aliás, esse é um elemento central para pensar a composição das
equipes no processo de gestão. Não pode haver gap em termos do conhecimento pedagógico.
Todos da equipe pedagógica precisam estar em dia com esse quesito. Vale o mesmo para o
conhecimento técnico das equipes de contabilidade e finanças. E ao diretor geral compete ao
menos o domínio amplo de todos esses quesitos do processo de gestão.
O diretor da escola é referencial para todos na escola. É importante que seja uma
pessoa acessível e visível, presente na escola. Segundo enfatiza Borges (2004, p. 23), é
preciso que o diretor tenha gosto pelo relacionamento com as pessoas, que não evite os atritos
e nem tema os conflitos. O autor insiste na habilidade do relacionamento humano como um
trunfo no êxito da atuação como diretor. Alguém que saiba escutar e que não tenha
compromisso demasiado com a necessidade de sempre estar com a razão.
Da forma como o diretor atua e se relaciona com as pessoas deriva a confiança e a
legitimidade junto aos grupos de trabalho, junto aos alunos e junto aos pais. O conhecimento
técnico-pedagógico é indispensável, mas não suficiente, da mesma forma que não basta ser
um bom animador de relações sem ter reconhecida competência de gerenciamento da escola
nas questões de ordem administrativa e pedagógica.
Borges propõe que o diretor deve desempenhar de forma articulada os seus três papéis
básicos:
a) Papel de projetista: exercido a partir da capacidade de criar realidades que
materializam os anseios das equipes e os seus próprios. “O líder tem a obrigação
de introduzir mudanças que melhorem a qualidade de vida do grupo; precisa ter
visão, inspirar o grupo”, conclui Borges (2004, p. 24);
b) Papel de professor: exercido pelo compromisso em assegurar a formação efetiva
de seus alunos e de seus professores e funcionários. O compromisso com a
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REFERÊNCIAS
ALARCÃO, Isabel. A Escola Reflexiva. In: ALARCÃO, Isabel (org.) Escola reflexiva e
nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001, pp. 15-30.
BORGES, Pedro Faria. Gestão Escolar: Guia do Diretor em Dez Lições. In: ACÚRCIO,
Marina e ANDRADE, Rosamaria. A Gestão da escola. Porto Alegre/Belo Horizonte:
Artmed/Rede Pitágoras, 2004, pp. 17-70.
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(Org.) Gestão Educacional: uma nova visão. Porto Alegre: Artmed, 2004, pp. 238-248.
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Paulo: Cortez, 2003, 408p.