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2019
Este trabalho que se subordina ao tema em epígrafe, é uma investigação que busca compreender
o quanto a falta de respeito pelo bem comum causa problemas e desavenças no seio da sociedade
e nos diferentes estágios da convivência humana. Procura demostrar que o respeito pela coisa
pública é o garante para a consolidação da democracia, a manutenção da Paz na nossa sociedade
e contribui para a criação de uma sociedade cada vez mais justa, pacífica e pacifista. Busca
encontrar formas para conscientizar a sociedade que os problemas que afectam o nosso País
(corrupção, as dívidas ocultas, a injustiça eleitoral, a vandalização de infra-estruturas públicas…)
têm a sua origem no desrespeito e desvalorização do bem comum. Busca soluções para pôr fim a
este flagelo que enferma a nossa sociedade. A investigação tem por objectivo perceber as
motivações por detrás dessas acções e por fim propôr possíveis soluções; tem como relevância a
necessidade de ver Moçambique cada vez mais humano, democrático, pacífico, onde a
convivência humana é cada vez mais harmoniosa, fraterna e onde o desenvolvimento económico,
social e cultural acontece de maneira equitativa com diferenças sociais menos notáveis. O estudo
será baseado na Doutrina Social da Igreja, à luz do pensamento social da Igreja. Usar-se-á uma
abordagem qualitativa para a colecta de dados; serão usadas técnicas como a entrevista,
observação e análise documental.
This article is subordinated to the theme in epigraph, is an investigation that seeks to understand
how much the lack of respect for the common good causes problems and disagreements within
society and in the different stages of human coexistence. Seeks to demonstrate that respect for
A coisa pública destina-se a todos e precisa dos cuidados, de espirito humanitário e do amor de
quem de direito para que ela possa servir a todos. Nesta perspectiva, e cientes das constantes
violações de direitos humanos e da legalidade, a usurpação do erário público pelas entidades que
tem acesso, e cientes do mal que essas acções causam na nossa sociedade, propomo-nos a fazer
este estudo procurando levantar o problema, expôr o perigo que disso resulta e por fim tentarmos
buscar possíveis soluções desta anomalia que deixa a sociedade cada vez mais pobre e faz com
que surjam muitos conflitos sociais, políticos e culturais. O ser humano é um ser social, como diz
o filosofo. Portanto, a vida na sociedade implica partilhar tudo com o próximo. Mas quando um
não quer partilhar com os demais, quando os que tem poder são egoístas faz com que os outros
se insurjam e se envolvam em conflitos na tentativa de defender o que lhe é de direito. É daí que,
sentindo-nos solidários levantamos este problema para merecer uma análise de modo a colocar
na cabeça de todos os que estão na posse e administrando algum bem comum a ideia de
conservá-lo e expô-lo para todos se for o caso.
PERGUNTA DE PARTIDA
Face aos constantes conflitos políticos, étnicos e sociais… que originam, por vezes
espancamentos, detenções, homicídios, etc, o estudo faz a seguinte pergunta de partida:
PROBLEMATIZAÇÃO
O surgimento de uma guerra civil é ocasionado por uma má administração do poder público
que cria descontentamento no seio da sociedade. O exemplo de Moçambique: quando, depois da
proclamação da independência, a partir de 1975, o governo da FRELIMO adopta um regime de
orientação comunista (o socialismo), e começa o autoritarismo do partido único, onde os direitos
fundamentais foram postos em causa. Surge como resposta a Guerra dos 16 anos, onde as Forças
militares do partido RENAMO opunham-se ao Governo no poder. Guerra que dizimou muitas
vidas humanas e levou o Pais ao fundo do abismo da pobreza. É o poder público que foi
administrado sem respeitar os direitos fundamentais, que coloca em causa a integridade da
pessoa humana.
O caso actual das dívidas ocultas, onde dirigentes mal-intencionados levaram dinheiro
estrangeiro em forma de dívida com garantias do Estado, e usaram de maneira indevida, para fins
individuais. Nota-se aqui o total desrespeito pelo bem comum no momento em que eles levam
dinheiro em nome dos Moçambicanos e não aplicam para os projectos que visam garantir o bem-
estar dos beneficiários, situação que deixa o Pais endividado com os EUA e com outras Nações
por onde passaram a cometer os mesmos ilícitos. No momento em que se faz um empréstimo em
nome de um Estado ou em nome de uma Organização, aquele empréstimo passa a pertencer a
comunidade em causa, e consequentemente, será pago pela colectividade. Quando um dirigente
ou grupo de dirigentes se beneficia desse valor sem o consentimento da colectividade
destinatária, estamos perante o desrespeito pelo bem comum. Estamos a falar do caso das
famosas dívidas de EMATUM que no princípio foram aprovadas e apelidadas de Dívidas
soberanas, que num passado muito recente a mesma Instituição que aprovou, veio anular.
A corrupção a vários níveis, um fenómeno claro que resulta do desrespeito pelo bem comum.
Este mal acontece, na maioria das vezes quando os responsáveis de alguma Instituição canalizam
algum bem a outrém, que a princípio não tinha direito, em detrimento dos legítimos
beneficiários, em virtude de terem recebido valores monetários ou favores da parte do
beneficiário. Pode ocorrer em situações em que o bem pertence ao Estado ou a um agrupamento,
onde os responsáveis pela distribuição do respectivo bem usufruem sem merecimento de o fazer,
que muitas das vezes ocasiona rebeliões e, ou desavenças entre a colectividade e os que tutelam
tais instituições. A corrupção em Moçambique teve a sua génese no tempo do partido único, na
Através das lojas do povo o estado encarrega-se de vender tudo: agulhas, botões, alfinetes,
amendoim a escudo, o petróleo a quinhenta, o lenço, a capulana, o quilo de arroz, a garrafa de
óleo, a barra de sabão, o corte de cabelo, o arranjo das unhas. É tarefa do Estado esta? A
transformação duma loja, loja privada em loja do povo, significava na altura, pôr o letreiro: Loja do
Povo. Já é loja do povo. Porque tem o letreiro, já é loja do povo. Vender a mercadoria que estava
la dentro da loja até acabar. Manter a loja, depois, sem mercadoria, fazer delas focos de
corrupção, centro de boçalismo, covil de ladrões…” Machel ( 1933-1986)
Quando os funcionário públicos descobriram que os empregados das lojas do povo tinham
ganhos a mais com as cobranças ilícitas, decidiram adoptar. Adoptando, a corrupção de alastra,
das lojas do povo as instituições do Aparelho do Estado. Isso esta claro nos descursos de Samora
Machel, que dizia:
O inimigo actua no nosso Pais. Infiltrou-se e instalou-se. Ele está em pontos estratégicos da nossa
economia: nos portos, nos transportes rodoviários, ferroviários, marítimos e aéreos; nas empresas,
nas fabricas, nos hospitais, nas lojas, nos diversos sectores da nossa economia. O inimigo instalou-
se nos sectores sensíveis do Aparelho do Estado: nos Ministérios e nos Governos Provinciais.
Porque alguns responsáveis se deixaram embalar por relatórios falsos, Relatórios triunfalistas,
Relatórios que escamodeiam a realidade. Porque alguns responsáveis são sensíveis a adulação,
gostam de ser adulados; sensíveis ao servilismo, sensíveis ao lambe botas, sensíveis ao beija-mão,
perderam a sensibilidade para os problemas do povo. Ficaram insensíveis às queixas do povo.
Comprometem-se, perdem o martelo, abandonam o leme, perdem o controlo, não dirigem…
(Machel, 1933-1986)
…nós não lutamos para libertar os ladrões. Não é verdade? Não lutamos para transformar o nosso
País em País de ladrões. Ouviram? Transformar o nosso País em País de indisciplinados. Não era
isso. País de preguiçosos. Não era isso. Desleixados, sujos. Não era isso. Era para conquistarmos a
nossa dignidade, a nossa personalidade. É ou não é? (Machel, 1933-1986)
Ensino sobre Direitos Humanos às crianças sem incluir deveres que as crianças tem para com
os pais, para com o lar onde ela vive, para com os mais velhos, para com a sociedade. Situação
que faz com a criança cresça libertina, sem respeito e malcriada.
Legalização do aborto
Na concepção da Igreja Católica, “o fecto é um cidadão” e justifica-se pelo facto de que é a partir
do fecto que se obtém um adulto. O Artigo 40, nº 1 da Constituição da República confirma dando
Direito à vida a todo o cidadão Moçambicano, nos seguintes termos: “Todo o cidadão tem direito
à vida e à integridade física e moral e não pode ser sujeito à tortura ou tratamentos cruéis ou
desumanos”. Todos adultos vieram do fecto. E se estes fossem abortados não teríamos nenhum
adulto. Os que agora são dirigentes já passaram da fase do fecto e se fossem abortados, não
teríamos dirigentes. Os legisladores já passaram da fase do fecto e se fossem abortados, não
teríamos legisladores. O Documento sinodal (2019), reafirma o empenho da Igreja em defender a
vida "desde a concepção até o seu fim"(Sínodo de Amazónia, 06-27 de Outubro de 2019).
GERAL
ESPECÍFICOS
JUSTIFICATIVA
O estudo justifica-se pela aparente diferença social que a nossa sociedade vive, pelos conflitos
político-militares, sociais, étnicos, tribais e culturais, a corrupção, as dívidas ocultas que nos
assola de tempo em tempo que são fruto egoísmo, da falta de partilha, falta de amor ao próximo e
a ausência de solidariedade e subsidiariedade. Em suma, frutos do desrespeito pelo bem comum.
DELIMITAÇÃO DA PESQUISA
No Livro I da Política, Aristóteles afirmou que o homem é político por natureza. É somente
através da participação como cidadãos da comunidade política, ou polis, prestados pelo Estado,
que os homens podem alcançar o bem comum da comunidade através do engajamento activo
com a política, seja como funcionário público, como participante na deliberação de leis e justiça,
ou como um soldado defendendo uma nação.(Ibdin)
A noção do bem comum foi novamente retomada nos séculos 16, na obra mais famosa de
Maquiavel: O Príncipe. Maquiavel sustentou que, para se garantir o bem comum, iria depender
O estudo foi feito em Moçambique, na base de consulta da bibliografia existente sobre a matéria
de respeito pelo bem comum, sobre o respeito pelo próximo e resolução de conflitos.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A sociedade forma-se por meio de relações interpessoais saudáveis, como dizia São Francisco de
Assis, cit por Larrannaga (1978, Pag. 135): “Os irmãos devem reverenciar-se e honrar-se sem
murmuração”. Para que os irmãos se reverenciem e se honrem sem murmuração é necessário que
se respeitem mutuamente. Quem respeita não opta por vias de egoísmo; quem respeita partilha;
quem respeita conta com o próximo. Larranaga diz, ainda: “O respeito é a atitude primeira e
elementar, nas relações interpessoais duma comunidade”. Segundo o autor, “a falta de respeito
chama-se, vulgarmente por murmuração e cientificamente por violência compensadora”. A
murmuração envenena rapidamente as melhores intenções de qualquer comunidade. Mas para
que não haja murmurações é necessário que as entidades responsáveis pelo património público
enveredem por práticas de inclusão.
O bem comum tem um destino e tem destinatário. Para que o uso do bem comum não crie atrito
no seio da sociedade há necessidade de distribuí-lo sem descriminação. Como se afirma na obra
da Diocese de Quelimane, intitulada: O Cristão no Mundo (1993),
…os bens da terra estão destinado para o uso de todos os homens, para que todos possam viver
dignamente, conforme as exigências próprias e da própria família. Isto significa que grandes
companhias exploradoras do território, não poderão ir contra o direito de todos possuírem e
participarem dos bens da terra. Mesmo o direito a propriedade privada, válido e necessário, deve
ter limites: deve estar submetido ao direito do uso comum, ao destino universal dos bens.
Isto se inspira na Encíclica de São João Paulo II, intitulada: Sollicitudo Rei Socialis (SRS)
É necessário recordar mais uma vez o princípio típico da Doutrina Social da Igreja: os bens deste
mundo são originariamente destinados a todos. O direito a propriedade privada é valido e
necessário, mas não anula o valor de tal princípio. Sobre a propriedade, de facto, esta subjacente
Quando as entidades responsáveis pela proteção, conservação e manutenção do bem comum não
cuidam dos bens públicos que foram confiados, limitam-se simplesmente a usa-los
indevidamente, gera conflitos e por vezes Guerras.
Aliado a isso, está a colocação contida em: “Documentos Pontifícios e Episcopais (DPE),
intitulado: A Igreja no Mundo, Doutrina Social da Igreja”, que cita o Livro do Géneses:
“Multiplicai-vos, enchei a terra e dominai-a”, (Gn 1, 28). E acrescenta:
“Logo desde a primeira página, a Bíblia ensina-nos que toda a criação é para o homem, com a
condição de ele aplicar todo o seu esforço e inteligência em valorizá-la e, pelo seu trabalho, por
assim dizer, completá-la em seu serviço. Se a terra é feita para fornecer a cada um os meios de
subsistência e os instrumentos do progresso, todo o homem tem direito, portanto, de nela encontrar
o que lhe é necessário”, (DPE, 1975, Pag. 297)
O Concílio Vaticano II, (CVII) na Constituição Apostólica, Gaudium Et Spes (GS), esclarece nos
seguintes termos: “Deus destinou a terra e tudo o que nela existe ao uso de todos os homens e de
todos os povos, de modo que os bens da criação afluam com equidade às mãos de todos, segundo
a regra da justiça, inseparável da caridade”, (GS, n. 69,§ 1.) Portanto, a finalidade primária de
todos os bens é o homem. Por isso, nenhum homem tem direito de apropriar-se de um bem, nem
criar leis que impeçam os outros a beneficiar-se dos bens estatais.
A responsabilidade de perseguir o bem comum compete, não só as pessoas consideradas
individualmente, mas também ao Estado, pois que o bem comum é a razão de ser da autoridade
politica. Na verdade, o Estado deve garantir a coesão, unidade e organização a sociedade civil da
qual é expressão, de modo que o bem comum possa ser conseguido com o contributo de todos os
cidadãos e para todos. (Sapato, Cunlela & Maria, 2014, Pag. 48).
Portanto, não há sociedade política num local onde não existe a sociedade civil, e a existência da
sociedade política é para a administração do bem comum. Ela simplesmente, administra e
canaliza à legítima beneficiaria que a sociedade civil.
Padre Arcanjo Linda Sitimela, na sua obra intitulada: Lógicas de acção e critérios teológicos da
Pastoral social na Diocese de Quelimane (1978-2008), fala-nos da relação entre a caridade e a
justiça. Com efeito, não existe justiça num mundo sem caridade, onde cada um puxa por si e
Ao lado do bem individual, existe um bem ligado à vida social das pessoas: o bem comum. É o
bem daquele «nós-todos» formado por indivíduos, famílias e grupos intermédios, que se unem em
comunidade social. Não é um bem procurado por si mesmo, mas para as pessoas que fazem parte
da comunidade social. [...] Querer o bem comum e trabalhar por ele é uma exigência de justiça e de
caridade. [...]
Todo o cristão é chamado a esta caridade, conforme a sua vocação e segundo as possibilidades que
tem de incidência na polis. Este é o caminho institucional - podemos mesmo dizer político - da
caridade, não menos qualificado e incisivo do que a caridade que vai diretamente ao encontro do
próximo, fora das mediações institucionais da polis. Quando o empenho pelo bem comum é
animado pela caridade, tem uma valência superior à do empenho simplesmente secular e político.
Aquele, como todo o empenho pela justiça, inscreve-se no testemunho da caridade divina que,
agindo no tempo, prepara o eterno.
A ação do homem sobre a Terra, quando é inspirada e sustentada pela caridade, contribui para a
edificação daquela cidade universal de Deus que é a meta para onde caminha a história da família
humana. Numa sociedade em vias de globalização, o bem comum e o empenho em seu favor não
podem deixar de assumir as dimensões da família humana inteira, ou seja, da comunidade dos
povos e das nações, para dar forma de unidade e paz à cidade do homem e torná-la em certa
medida antecipação que prefigura a cidade de Deus sem fronteiras. (Bento XVI papa de 2005 a
2013)
Perante os protestos e reivindicações que acontecem na maior parte dos Estados, Papa Francisco
dá o seguinte conselho: “As reivindicações sociais, que têm a ver com a distribuição dos
rendimentos, a inclusão social dos pobres e os direitos humanos, não podem ser sufocadas com o
pretexto de construir de escritório ou uma paz efémera para uma minoria feliz”. E conclui: “A
dignidade da pessoa humana e o bem comum estão por cima da tranquilidade de alguns que não
querem renunciar aos seus privilégios. Quando esses valores são afectados é necessária uma voz
profética”. (Ibdem).
As entidades políticas têm como função, cuidar o bem comum, para depois canalizá-lo ao
beneficiário, o povo. E não devem se apropriar dele.
Como dissemos atrás, a paz é um bem comum. Ela não pode estar somente com uma pessoa ou
com um grupo de pessoas. Mas sim, com todos. Uma sociedade dividida, onde um lado há paz,