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CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC

Marcos Jacob Costa Cohen

A Globalização e a (Des)Construção da Identidade Indígena

São Paulo
2015
SUMÁRIO

A GLOBALIZAÇÃO E A (DES)CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE INDÍGENA ..................... 3

REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 6
A GLOBALIZAÇÃO E A (DES)CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE INDÍGENA

A multíplice diversidade da pós-modernidade e os movimentos de


globalização têm afetado a construção e o próprio conceito de identidade. A
dinâmica conceitual da identidade sugere que, de acordo com Renato Ortiz, mais
que uma essência, ela se configure como “construção num processo histórico1”.
Neste sentido e a partir das ideias de Néstor Canclini2 e Stuart Hall3, a globalização
aparece tanto como elemento diferenciador das individualidades, como
fragmentador delas. Na mesma direção, Anthony Giddens esmiúça o conceito ao
considera-lo reflexivo da própria existência, “onde as práticas sociais são
constantemente examinadas e reformadas à luz das informações recebidas sobre
aquelas próprias práticas, alterando, assim, seu caráter [primário]4”. A partir dessa
perspectiva, este texto discutirá de que modo a globalização tem afetado a
construção da identidade indígena em duas situações recorrentes na história
brasileira: as missões religiosas e a migração das comunidades tradicionais para os
centros urbanos.
Apesar de não ter havido uma extinção das características e traços indígenas
essenciais no decorrer da história do contato com o homem branco, é inegável a
transformação identitária sofrida pelos índios do Brasil a partir do estabelecimento
de missões religiosas que buscavam (e ainda buscam) homogeneizar e “civilizar”
essas comunidades. De acordo com Márcio Braga, “a catequização foi [e é] um
elemento de profunda importância na desconstrução da identidade indígena, pois,
no Brasil [...], cristianizar, catequizar e civilizar [são] parte de um mesmo processo de
sobreposição de modelos [externos] aos modelos indígenas, sendo os três
momentos considerados não apenas sucessivos, mas praticamente sinônimos
quando aplicados à questão indígena5”. A substituição das divindades indígenas por

1. Renato Ortiz, Identidade e Globalização, em www.diariodonordeste.verdesmares.com.br, acessado


em 05/04/2015.

2. Néstor García Canclini, Consumidores e Cidadãos: Conflitos Multiculturais da Globalização, Rio de


Janeiro, 2005.

3. Stuart Hall, A Identidade Cultural na Pós-Modernidade, Rio de Janeiro, 2005.

4. Anthony Giddens, Modernidade e Identidade, Rio de Janeiro, 2002, p. 37.

5. Márcio André Braga, Identidade Étnica e os Índios do Brasil, em www.ucs.br, acessado em


05/04/2015.
ícones cristãos, bem como o batismo e a inserção de elementos estranhos à
tradição de cada etnia reforça o caráter intencional de desconstrução das
individualidades em prol do estabelecimento de um panorama hegemônico de
conduta. Para João de Oliveira, as missões conjugam aspectos assimilacionistas e
preservacionistas6, do que se infere que suas ações se configuram como facetas
utilitaristas da globalização enquanto movimentos de homogeneização das
identidades.
Outro mecanismo de fragmentação e descentralização da identidade tem sido
as migrações, especialmente as de comunidades indígenas tradicionais em direção
aos centros urbanos. Segundo Léia Andrade, “esses movimentos migratórios
acabam levando um processo de hibridação da cultura7”. Nesses centros urbanos, o
contato dos indígenas com uma cultura diversa que não lhes proporciona
oportunidades, mas demanda a padronização como ferramenta de controle social,
distorce o senso de individualismo e identidade. Nesta mesma direção, James
Clifford, ao abordar o conceito de diáspora, a considera causa de “lealdades
contraditórias”, uma vez que o indivíduo se vê preso a duas realidades, aquela de
onde se veio e aquela onde se está8. Tal vórtice de movimentação desestabiliza os
traços identitários da comunidade; para Stuart Hall “esta perda de um sentido de si
estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento ou descentração do sujeito;
esse duplo deslocamento – descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no
mundo social e cultural quanto de si mesmos – constitui uma crise de identidade
para o indivíduo9”. Como resultado, muitos indígenas renegam suas origens, não se
tornando, entretanto, “brancos”, desconstruindo não somente suas identidades, mas
a própria realidade à qual pertencem.
Algumas soluções para a crise de identidades da pós-modernidade são
apontadas por Renato Ortiz. O sociólogo coloca em cheque a “cultura de massa” ao
compreender que a democratização cultural, alardeada como pendão real, por si não
resolve as questões da atualidade, é preciso aceitar a diversidade como base de

6
João Pacheco de Oliveira, Uma Etnologia dos “índios misturados”: Situação Colonial,
Territorialização e Fluxos Culturais, em www.scielo.br, acessado em 06/04/2015.

7. Léia Andrade, Teorias da Cultura, Aula 4, pág. 3.

8. James Clifford, Travel and Translation in the Late Twentieth Century, Harvard University Press.

9. Stuart Hall, A Identidade Cultural na Pós-Modernidade, pág. 9.


uma nova perspectiva humana que reconhece a cidadania e as identidades no
contexto dos diversos elementos de mudanças no mundo10”. No caso específico dos
indígenas brasileiros, é preciso, como afirma Márcio Braga, reconhecer a
comunidade como “portadora de cultura diferenciada” e seus direitos como “grupo
etnicamente diferenciado, inserido em um contexto social pluriétnico11”.

10. Renato Ortiz, Identidade e Globalização, em www.diariodonordeste.verdesmares.com.br,


acessado em 07/04/2015.

11. Márcio André Braga, Identidade Étnica e os Índios do Brasil, em www.ucs.br, acessado em
07/04/2015.
REFERÊNCIAS

ANDRADE, Léia. Teorias da Cultura. São Paulo: Senac, 2015.

BRAGA, Márcio André. Identidade Étnica e os Índios do Brasil. Em www.ucs.br.

CANCLINI, Néstor García. Consumidores e Cidadãos: Conflitos Multiculturais da


Globalização. Rio de Janeiro: Editora da UERJ, 2005.

CLIFFORD, James. Travel and Translation in the Late Twentieth Century.


Boston: Harvard University Press, 1997.

GIDDENS, Anthony. Modernidade e Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.

HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. São Paulo, EDUSP,


2013.

OLIVEIRA, João Pacheco. Etnologia dos “índios misturados”: Situação


Colonial, Territorialização e Fluxos Culturais. Em www.scielo.br.

ORTIZ, Renato. Identidade e Globalização. Em


www.diariodonordeste.verdesmares.com.br.

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