Departamento de Ciências Sociais da Educação, Instituto de Educação, Universidade do Minho mjcasanova@ie.uminho.pt Cultura Sujeitos-actores produto de produções anteriores e responsáveis por novas produções (estrutura e agência) “A cultura como prática social” (Paul Willis, 1991), in Aprendendo a ser trabalhador, Porto Alegre: Artes Médicas) Representação da cultura como um iceberg: o que é visível (a ponta do iceberg) são as características de superfície da cultura; o que está submerso, invisível, é constituído pelo conjunto de características culturais que suportam/estruturam o grupo a que se pertence e que são consideradas a cultura profunda, (Immanuel Wallerstein, 1988, in Culture as the Ideological Battleground of the Modern World-System, London: Sage Publications. Tradução nossa). O que permanece e define o grupo enquanto unidade cultural e que é menos permeável à mudança e/ou reconfigurações é a cultura nas suas características de profundidade (Casa-Nova, 2009, in Etnografia e produção de conhecimento). NOTA: não interagimos com culturas no abstracto mas com pessoas portadoras de cultura (Casa-Nova) “(…) todas as pessoas partilham algumas características com todas as outras; todas as pessoas também partilham outras características apenas com algumas pessoas e todas as pessoas possuem outras características que não partilham com mais ninguém. Ou seja, cada pessoa pode ser descrita de três maneiras: as características universais da espécie, o conjunto de características que define essa pessoa como membro de um conjunto de grupos e as características idiossincráticas, que tornam essa pessoa singular. Quando falamos de características que não são nem universais nem idiossincráticas, nós normalmente usamos o termo ‘cultura’.” (Immanuel Wallerstein, 1988, in Culture as the Ideological Battleground of the Modern World-System, London: Sage Publications. Tradução minha). Aculturação: contacto entre duas culturas, do qual resulta um processo de assimilação ou de integração Assimilação (Casa-Nova, 2013, “Os ciganos é que não querem integrar-se?”, in José Soeiro et al, (orgs.) Não acredite em tudo o que pensa. Lisboa: Ed. Tinta da China) Assimilação vem “assemelhar”, de se tornar semelhante ao “outro”. A assimilação pode ocorrer: 1. por vontade própria – a)por um processo de deslumbramento acerca de outra cultura, considerada melhor do que a sua; b) por razões estratégicas – aumentar as oportunidades na vida na sociedade dita de “acolhimento”. 2. Por imposição – a) subtil (por exemplo, através da transmissão de uma cultura escolar homogénea) ou b) coerciva (assimilação pela força). Integração (Casa-Nova, 2013, “Os ciganos é que não querem integrar-se?”, in José Soeiro et al, (orgs.) Não acredite em tudo o que pensa. Lisboa: Ed. Tinta da China)
Durkheim e a função uniformizadora da educação (moral) escolar
Interiorização normativa e previsibilidade comportamental (Integração para a subordinação e não integração para a emancipação social) Durkheim: defesa de uma integração normativa e impositiva (subtil) Casa-Nova: defesa de uma integração crítica e emancipatória (sociologia crítica) Processo através do qual os sujeitos-actores ou um dado grupo socio-cultural passam a partilhar dos espaços de sociabilidade, dos espaços culturais e das redes de trabalho da sociedade dita de acolhimento, sem perda das características fundamentais da cultura de pertença, considerando simultaneamente importante fazer parte da cultura da sociedade maioritária e conservar a cultura de origem (Casa-Nova, 2013). Integração (continuação)
“(…) integração não é sinónimo de subordinação a um grupo social e
cultura maioritário (…) mas o resultado de um processo horizontal de influências recíprocas entre todos os grupos sociais.” (Casa-Nova, 1999, in Etnicidade, Género e Escolaridade. Dissertação de mestrado. Porto: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação). Processo esse que deverá ser pensado conjuntamente, incluindo as perspectivas e posições dos grupos interessados acerca da integração. Integração (continuação) “Defino o conceito de integração como a participação efectiva de todos e de todas nas mais diversas instituições da sociedade (dimensão macro) e nas relações do quotidiano (dimensão micro), numa perspectiva de reciprocidade e horizontalidade dos processos e não numa perspectiva unilateral e subordinada, onde aquele que é classificado como diferente é posteriormente objecto de uma hierarquização social que o coloca numa posição de subordinação estrutural. Integração significa, pois, um processo recíproco e horizontal, construído por todos os grupos socio- culturais, processo esse que é gradativo, complexo e multidimensional e não construído de uma vez por todas dada a relatividade e mutabilidade dos sistemas sociais e culturais; significa a manutenção da diferença nas dimensões culturais e sociais consideradas importantes para cada indivíduo pertencente a um determinado universo cultural e social, em simultâneo com a sua participação na sociedade alargada (…)”, tendo em atenção que “outros” engloba a totalidade de sujeitos-actores, dado que os “outros” não existem sem o “nós” e vice-versa” (Casa-Nova, 2013, p.217-218). Identidade Identidade: o que nos define enquanto indivíduo, simultaneamente membro de um dado grupo socio-cultural e de uma dada sociedade.
“Raça” e Racismo “Raça” é um conceito cientificamente inútil e sociologicamente relevante (Robert Garvia) Racismo (WIEVIORKA, Michel (2002) O racismo. Lisboa: Fenda Edições). “(…) o racismo consiste em caracterizar um conjunto humano por atributos naturais, associados por seu turno a características intelectuais e morais que valem para cada indivíduo que releva desse conjunto e, a partir daí, em instaurar eventualmente práticas de inferiorização e de exclusão” (pág.11) ou de extermínio.
Todo o racismo é discriminação, mas nem toda a discriminação é
racismo (Casa-Nova). Neo-racismo (Barker, Martin, 1981, The new-racism. London: Junction books) Passagem da inferioridade biológica à diferença cultural na legitimação do discurso racista. A argumentação racista passa a assentar, não na hierarquia biológica, mas na diferença cultural. Racismo (WIEVIORKA, Michel, 2002, O racismo. Lisboa: Fenda Edições). Existência não de dois racismos, mas de duas lógicas internas ao racismo. Lógica desigualitária e lógica diferencialista do racismo Lógica desigualitária: relativa às características fenotípicas, tende a discriminar, convivendo com o “outro”; Lógica diferencialista: relativa às características culturais, tende a segregar dos espaços de sociabilidade, de trabalho, etc. O racismo institucional (Stokley Carmichael & Charles Hamilton, 1967, Black power: the politics of liberation in America. New York: Vintage Books)
Nos USA, o racismo institucional é descrito como mantendo as
pessoas de pele escura numa situação de inferioridade graças a mecanismos socialmente não percebidos. Encontra-se no próprio funcionamento da sociedade, constituindo uma propriedade estrutural da mesma, estando inscrita em mecanismos rotineiros que garantem a dominação e a inferiorização das pessoas de fenótipo escuro. Sugere que o racismo pode funcionar sem que estejam em causa preconceitos ou opiniões racistas. Exemplo: quando as pessoas de pele branca recusam a mistura racial nas escolas, fazem-no sob o pretexto de os seus filhos não passarem demasiadas horas em transportes (Wieviorka, 2002). Racismo no quotidiano (ESSED, Philomena, 1991, Understanding Everyday racism. London: Sage) O racismo é um problema do quotidiano. É transmitido em práticas rotineiras que parecem “normais”, pelo menos para o grupo dominante. “Culturalização do racismo” (a inferioridade biológica atribuida à população negra é reformulada como deficiência cultural, inadequação social e subdesenvolvimento tecnológico).
Grupos humanos permanentemente em posição de subalternidade
estrutural Subordinação estrutural
Subordinação secular, naturalizada, incrustada nas sociedades.
Ocupação de posições subalternas em várias esferas da sociedade:
trabalhos piores remunerados; vivência nos chamados bairros de habitação social; vivência nos chamados “bairros étnicos”, vivência nas margens da sociedade, mas dentro da mesma: vivência nas “borderlines” ou numa posição de integração social subordinada. Etnia (Breton, s/d; Casa-Nova, 2002) “Etnia define-se como um grupo de indivíduos ligados por um complexo de caracteres comuns – antropológicos, linguísticos, político-históricos, etc. – cuja associação constitui um sistema próprio, uma estrutura essencialmente cultural: uma cultura. A etnia é então (…) a comunidade rodeada por uma cultura específica” (Breton, s/d:11-21). “Neste sentido, quando falamos de etnia, estamos a falar de um colectivo que partilha, para além de eventuais características biológicas (que derivam de uniões endogâmicas), uma organização social e política, uma língua, uma consciência étnica, uma economia, uma cultura” (Casa-Nova, 2002:54) Etnicidade (Casa-Nova, 2002; Machado, 2002) É a etnia em acção; são formas de expressar a etnia (Casa-Nova, 2002) (…) pode então definir-se a etnicidade como a relevância que, em certas condições, assume, nos planos social, cultural e político, a pertença a populações étnica ou racialmente diferenciadas. Essa pertença traduz- se e é veiculada por traços como língua, religião, origem nacional, composição social, padrões de sociabilidade, especificidades económicas e outros, traços que se sobrepõem, em maior ou menor número, na distintividade de cada grupo particular. Com efeito, na grande maioria das sociedades, a distintividade étnica e racial de determinadas populações vai a par com o seu estatuto minoritário e subordinado. No entanto, tomar a etnicidade como sinónimo de minoria coloca, pelo menos, um problema: o da chamada “etnicidade menos um” (minus one ethnicity) (Banton, 1988), que significa que a população maioritária não se classifica a si própria em termos étnicos ou raciais. Não se percepciona como uma maioria étnica (Machado, 2002). Sociologicamente, “minoria” não se define pelo seu número. Etnicidade forte e etnicidade fraca: contrastes e continuidades culturais e sociais (Machado, 2002)
Dimensões sociais (composição de classe, localização residencial,
estrutura etária e sexual).
Dimensões culturais (sociabilidade e padrões matrimoniais, língua,
religião). MULTICULTURALISMO (de raiz anglófona) O prefixo “multi” remete para a permanência num mesmo espaço geográfico sem interacções significativas
INTERMULTICULTURALISMO (de raiz francófona)
O prefixo “inter” remete para a permanência com interacção entre culturas
INTER/MULTICULTURALISMO (articula as duas dimensões)
(Casa-Nova, 2002)
Sociedades “mosaico” ou sociedades inter/multiculturais
Bibliografia citada BARKER, Martin (1981) The new-racism. London: Junction books) CASA-NOVA, Maria José (2002) Etnicidade, género e escolaridade. Lisboa: IIE; CASA-NOVA, (2009) Etnografia e produção de conhecimento. Lisboa: ACIDI CASA-NOVA, (2013) “Os ciganos é que não querem integrar-se?”, in José Soeiro et al, (orgs.) Não acredite em tudo o que pensa. Lisboa: Ed. Tinta da China) ESSED, Philomena (1991) Understanding Everyday racism. London: Sage MACHADO, Fernando Luís (2002) Contrastes e continuidades. Oeiras. Ed. Celta ROWLAND, Robert (1987) Antropologia, História e Diferença. Porto: Edições Afrontamento; STOKLEY Carmichael & CHARLES Hamilton, 1967, Black power: the politics of liberation in America. New York: Vintage Books WALLERSTEIN, Immanuel (1988, in Culture as the Ideological Battleground of the Modern World-System, London: Sage Publications. Willis, Paul (1991), Aprendendo a ser trabalhador, Porto Alegre: Artes Médicas) WIEVIORKA, Michel (1995) Racismo e Modernidade. Venda Nova: Bertrand Editora. WIEVIORKA, Michel (2002) O racismo. Lisboa: Fenda Edições.