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RIO DE JANEIRO
2007
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE BIOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA
2007
ii
Banca Examinadora:
_______________________________
Prof. Dr. Marcus Vinícius Vieira
Universidade Federal do Rio de Janeiro
_______________________________
Prof. Dra. Renata Pardini
Universidade de São Paulo
_______________________________
Prof. Dr. Fernando A. S. Fernandez
Universidade Federal do Rio de Janeiro
iii
FORERO-MEDINA, GERMAN ANDRES
Capacidade perceptual de pequenos mamíferos da Mata Atlântica e
implicações para a conectividade funcional de uma paisagem fragmentada.
[Rio de Janeiro], Instituto de Biologia/UFRJ, 2007.
XIII, 108 f.: 29,7cm
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de
Pós-graduação em Ecologia.
Referências Bibliográficas: f. 83-94.
1. Capacidade Perceptual 2. Conectividade Funcional 3. Didelfídeos 4. Mata
Atlântica 5. Rio de Janeiro. I Forero-Medina, German. II. Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Biologia, Programa de Pós-Graduação
em Ecologia. III. Título.
iv
“Insularity is moreover a universal feature of
biogeography....consider for example, the insular
nature of streams, caves, gallery forest, tide pools,
taiga as it breaks up in tundra, and tundra as it
breaks up in taiga. The same principles apply, and
will apply to an accelerating extent in the future, to
formerly continuous natural habitats now being
broken up by the encroachment of civilization…”
v
“Freqüentemente se vêem zonas rurais que têm um ar
desolado: morros sem outra cobertura além do capim
queimado de sol, uma ou outra palmeira esquálida,
moitas de bambu e cupinzeiros; matas secundárias
nas quais desponta a embaúba com seus braços de
candelabro, nus e brancos, para o alto; e
insignificantes nesgas de mata novas em vales
ressecados pelos quais a poeira dos caminhos vai
serpenteando vermelha... Uma agricultura predatória
exauriu a terra. A mata virgem já deixou de existir, o
que há aqui, agora, é devastação. ”
Helmut Sick
Tukani 1957
vi
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer ao Marquinhos pela orientação durante estes dois anos, pelo apoio,
ajuda e confiança. Obrigado por ter acreditado em mim e em nosso trabalho.
À minha parceira de campo, Ana “Craudia”, pela ajuda em todas as fases do meu
mestrado, e pela amizade.
À Raquel pela valiosa ajuda com o ArcView e as imagens dos fragmentos que
foram indispensáveis para várias análises.
Ao Diogo, pela amizade, pelos conselhos e ajuda durante meu mestrado, pelas
valiosas sugestões e comentários sobre minha dissertação, e por abrir sua casa para as
festinhas do laboratório.
vii
Ao CAPES pelo suporte econômico durante o mestrado.
À família Venturotti Nunes Carneiro, pelo apoio e pelo imenso carinho que me
brindaram.
viii
ÍNDICE GERAL
ix
MATERIAL E MÉTODOS ......................................................................................................... 59
Teoria dos Grafos .................................................................................................................... 59
Análises de Conectividade Funcional....................................................................................... 60
Remoção de fragmentos de diferentes tamanhos....................................................................... 63
Possíveis efeitos das Áreas de Proteção Permanente (APP) na conectividade funcional da
paisagem. ................................................................................................................................ 63
RESULTADOS ......................................................................................................................... 64
Análise de Conectividade Funcional das espécies estudadas..................................................... 64
Limiar de conectividade funcional ........................................................................................... 67
Remoção de fragmentos de diferentes tamanhos....................................................................... 68
Possíveis efeitos das APP na conectividade funcional da paisagem .......................................... 69
DISCUSSÃO ............................................................................................................................ 73
Conectividade funcional das espécies estudadas....................................................................... 73
Efeito da perda de fragmentos de diferentes tamanhos.............................................................. 76
Efeito da criação da APP ......................................................................................................... 77
CONCLUSÕES ......................................................................................................................... 79
x
ÍNDICE DE FIGURAS
CAPÍTULO I
Figura 1.1. Área de liberação próxima ao fragmento florestal. ............................................ 10
Figura 1.2. Espécies estudadas. ............................................................................................ 14
Figura 1.3 Mecanismo de liberação dos indivíduos. ............................................................ 17
Figura 1.4 Disposição dos lugares de liberação.. ................................................................. 18
Figura 1.5. Orientações angulares dos indivíduos de P. frenatus liberados a 50m, 100m, e
200m do fragmento............................................................................................................... 25
Figura 1.6. Orientações angulares dos indivíduos de D. aurita liberados a 50m, 100m,
200m e 300m do fragmento.................................................................................................. 26
Figura 1.7. Orientações angulares dos indivíduos de M. paraguayanus liberados a 50m,
100m, e 200m do fragmento................................................................................................. 27
Figura 1.8. Orientações angulares dos indivíduos de M. incanus e M. mudicaudatus
liberados a 100m do fragmento.. .......................................................................................... 28
Figura 1.9. Orientação das espécies D. aurita, P. frenatus e M. paraguayanus com relação
ao fragmento no qual foram coletadas.................................................................................. 29
Figura 1.10. Orientação dos indivíduos de P. frenatus e M.paraguayanus com relação ao
vento na hora de liberação.. .................................................................................................. 33
Figura 1.11. Orientação dos indivíduos da espécie D. aurita com relação ao vento na hora
de liberação........................................................................................................................... 34
CAPÍTULO II
Figura 2.1. Área de estudo na bacia do Rio Macacu. ........................................................... 61
Figura 2.2. Conectividade funcional da paisagem para M. incanus. .................................... 64
Figura 2.3. Conectividade funcional da paisagem para P. frenatus e M. paraguyanus.. ..... 65
Figura 2.4. Conectividade funcional da paisagem para D. aurita.. ...................................... 66
Figura 2.5. Tendência da conectividade funcional da paisagem com o aumento da distância
de dispersão ou fluxo ecológico. .......................................................................................... 68
Figura 2.6. Tendência na conectividade funcional da paisagem para as espécies estudadas
com a perda de fragmentos de diferentes tamanhos. ............................................................ 69
Figura 2.7. Conectividade funcional da paisagem para Marmosops incanus, assumindo a
presença de uma APP de 100m em torno dos rios da região................................................ 70
Figura 2.8. Conectividade funcional da paisagem para P. franatus e M. paraguayanus,
assumindo a presença de uma APP de 100m em torno dos rios da região........................... 71
Figura 2.9. Conectividade funcional da paisagem para Didelphis aurita, assumindo a
presença de uma APP de 100m em torno dos rios da região................................................ 71
xi
ÍNDICE DE TABELAS
CAPÍTULO I
Tabela 1.1. Resumo dos modelos explicativos da orientação de Philander frenatus para o
fragmento.............................................................................................................................. 30
Tabela 1.2. Resumo dos modelos explicativos da orientação de Didelphis aurita para o
fragmento.............................................................................................................................. 31
Tabela 1.3. Resumo dos modelos explicativos da orientação de Micoureus paraguayanus
para o fragmento................................................................................................................... 32
Tabela 1.4. Peso médio dos indivíduos, inclinação e capacidades perceptuais esperadas para
P. frenatus, M. paraguayanus e D. aurita segundo as equações de Mech & Zollner (2002).
.............................................................................................................................................. 35
Tabela 1.5. Inclinação calculada usando os dados dos experimentos, capacidade perceptual
esperada calculada usando esta inclinação, e capacidade perceptual determinada usando
estatística circular. ................................................................................................................ 36
CAPÍTULO II
Tabela 2.1. Capacidade perceptual estimada para 4 espécies de marsupiais da Mata
Atlântica. .............................................................................................................................. 60
Tabela 2.2. Comparação da conectividade funcional para as diferentes espécies estudadas
usando algumas métricas dos grafos. ................................................................................... 67
Tabela 2.3. Comparação entre o número de componentes, conexões entre fragmentos, e
área do maior componente das paisagens com e sem a presença da APP............................ 72
xii
RESUMO
A capacidade perceptual, ou distância máxima na qual um organismo percebe um elemento
da paisagem, é uma característica específica determinante no sucesso de dispersão, na
conectividade funcional da paisagem, e na dinâmica das populações em ambientes
fragmentados. Em este estudo foram determinadas as capacidades perceptuais das espécies
de marsupiais mais abundantes numa paisagem fragmentada da Mata Atlântica, RJ, no
sudeste brasileiro. Para isto, foram utilizados experimentos de soltura em uma área aberta, a
diferentes distâncias de um fragmento de floresta. A orientação dos indivíduos foi
determinada usando a técnica do carretel e estatística circular. Foram também estudadas as
variáveis biológicas e ambientais que afetam a capacidade de orientação durante a procura
de habitat, utilizando seleção de modelos, a partir do critério de Akaike. Numa segunda
parte, foram usados os valores das distâncias perceptuais para modelar a conectividade
funcional da paisagem para cada espécie, e para avaliar o possível efeito da perda de habitat
na conectividade da paisagem. Também foi avaliado o efeito da implementação de Áreas de
Proteção Permanente (APP) em torno aos rios, na conectividade funcional da paisagem. As
análises de conectividade funcional foram feitas usando a teoria dos grafos. D. aurita
apresentou a maior distância perceptual (200m) seguida por M. nudicaudatus (≥100m), P.
frenatus e M. paraguayanus (100m), e por último M. incanus (<100m). Nenhuma das
espécies se orientou significativamente para o fragmento origem, e não houve diferença na
orientação entre sexos. A orientação de P. frenatus e M. paraguayanus foi influenciada
principalmente pela distância ao fragmento, sugerindo um mecanismo de orientação visual.
D. aurita apresentou um comportamento de anemotaxia, sendo que sua orientação é
determinada pela direção do vento. A conectividade funcional da paisagem foi diferente
para as espécies estudas, sendo maior para D. aurita, seguida por M. paraguayanus e P.
frenatus, e M. incanus, com a menor conectividade. A baixa conectividade das três ultimas
espécies sugere que as populações estão altamente isoladas e são vulneráveis aos problemas
que afetam populações pequenas. A perda de fragmentos pequenos, entre 6 e 15 hectares,
diminui significativamente a conectividade funcional para todas as espécies. Finalmente, a
implementação das APPs em torno aos rios da região implicaria um aumento na
conectividade funcional para as espécies estudadas.
xiii
ABSTRACT
The perceptual range, or maximum distance at which an organism can detect a landscape
element, is a specific characteristic that determines dispersal success, landscape functional
connectivity, and population dynamics on fragmented environments. In this study, we
determined the perceptual range of the most abundant marsupial species on a fragmented
landscape at the Atlantic Forest, northeastern Brazil. We used release experiments on an
open area, at different distances from a forest fragment. Orientation towards the woods was
determined using the spool-and-line technique and circular statistics. We also studied the
effect of some biological and environmental variables on the orientation during habitat
search using model selection, based on the Akaike criteria. On a second part of the study,
we used values of the perceptual distances to model the landscape functional connectivity
for each species, and to determine the possible effect of habitat loss on the functional
connectivity. We also studied the effect of creating Environmental Protected Areas (APP)
along river bedsides on the landscape functional connectivity. Connectivity analyses were
based on the graph-theoretic perspective. D. aurita had the highest perceptual range
(200m), followed by M. nudicaudatus (≥100m), P. frenatus and M. paraguayanus (100m),
and finally by M. incanus (<100m). None of the species oriented significantly towards the
fragment where it was captured, and there was no difference on orientation abilities
between sexes. The orientation of P. frenatus and M. paraguayanus was mainly influenced
by distance to the woods, suggesting this species uses a visual mechanism for habitat
detection. D. aurita presented anemotaxis, its orientation was determined by the wind
direction. Landscape functional connectivity was different for most of the species studied,
with D. aurita presenting the highest functional connectivity, followed by M.
paraguayanus and P. frenatus, and M. incanus. The low landscape functional connectivity
presented by the last three species means that their populations are isolated and are
vulnerable to the negative effects of small population size. The loss of small fragments,
around 6 to 15 hectares, significantly diminishes landscape functional connectivity for all
species studied. Finally, the creation of the APPs along river bedsides on the region would
increase landscape functional connectivity for all species.
xiv
INTRODUÇÃO GERAL
A fragmentação de habitats é uma das mais citadas ameaças à extinção das espécies
e causas de perda da diversidade biológica (D´Eon et al. 2002), sendo um dos tópicos de
conservação mais estudados e discutidos nos últimos anos. Pode ser definida de forma geral
como o processo pelo qual uma área contínua de habitat é reduzida em tamanho, e dividida
em dois ou mais fragmentos separados por uma matriz de habitats diferentes do original
(Wilcove et al. 1986). Segundo esta definição, o processo de fragmentação tem quatro
Devido aos efeitos da perda de habitat original serem diferentes e independentes dos
efeitos da fragmentação per se, sugeriu-se que os dois processos fossem denominados e
perda de área (Fahrig 2003). Porém, na maioria dos estudos sobre fragmentação, não é feita
uma distinção entre os dois processos e os efeitos da perda de habitat original não são
controlados na avaliação dos efeitos da fragmentação per se. Isto dificulta determinar em
1
1972, Newmark 1987). Além disso, populações isoladas em fragmentos muito pequenos
populacional e aos efeitos dos processos estocásticos (Gilpin & Soulé 1986). A diminuição
predadores nas bordas (Chalfoun et al. 2002), maior probabilidade dos indivíduos de passar
al. 2002) podem afetar também a abundância e distribuição das populações (Hanski et
al.1996), e a variabilidade genética (Gibbs 2001). A perda de habitat pode afetar a taxa de
da cadeia trófica (Komonen et al. 2000, Dobson et al. 2006), alterar interações
interespecíficas (Taylor & Merriam 1996), afetar espécies que dependem de recursos
efêmeros (Gibbs & Stanton 2001), e diminuir o sucesso na dispersão (Bélisle et al. 2001).
espécie pode ser limitado pela criação de barreiras (Primack 1998). Esta pode ser uma
& Lima 1999b). Neste sentido, a conectividade, o inverso da fragmentação, que pode ser
2
definida como o grau no qual uma paisagem facilita ou impede o movimento entre
crítica para a sobrevivência e a dinâmica das populações (Fahrig & Paloheimo 1988)..
Zollner & Lima 1999a), e capacidade de perceber um fragmento a distância (Zollner 2000).
próprio de cada espécie. Porém, existe pouca informação sobre estas características para
(Myers et al. 2000, Mittermeier et al. 2004, Galindo-Leal & Câmara 2005). Estende-se ao
longo da costa brasileira, numa área onde residem mais de 100 milhões de pessoas, e
possui uma longa história de uso intensivo da terra com início na colonização portuguesa
que transformou completamente a paisagem original (Viana and Tabarez 1996, Galindo-
Leal & Câmara 2005). Atualmente, restam menos de 8 % da extensão original da Mata
3
extinção local de diversas espécies (Pinto & Brito 2005). Mais de 110 espécies da Mata
perigo (Galindo-Leal & Câmara 2005). Por outro lado, se considerarmos a escala nacional e
Mata Atlântica ameaçadas de extinção chega pelo menos a 510 (Tabarelli et al. 2005). As
biodiversidade é afetada, e como pode ser mantida nos fragmentos pequenos e alterados
modelo para estudar os efeitos do processo da fragmentação (Fonseca & Robinson 1990,
Lynam & Billick 1999, Pardini et al. 2005). São relativamente fáceis de estudar, e
diferencial e dispersão potencial de sementes (Vieira et al. 1997, Grelle & Garcia 1999).
com 90 espécies, das quais 43 são endêmicas (Fonseca et al. 1996). Além disso, vários
estudos mostraram que a fragmentação pode ter efeitos sobre este grupo, afetando a riqueza
ou abundância de algumas espécies (Lynam & Billick 1999, Pardini et al. 2005, Laurance
usar estas distâncias de percepção para modelar a conectividade funcional numa paisagem
fragmentada da Mata Atlântica. Por não existirem trabalhos prévios sobre a capacidade
4
eficiente para estabelecer a capacidade perceptual de cada espécie. Finalmente as distâncias
Esta abordagem pode ser útil também na escolha de áreas prioritárias para
estudo também foram usadas as distâncias de percepção para, através de simulações, avaliar
5
CAPITULO I
6
INTRODUÇÃO
fragmentos de habitat, seja porque o habitat está conectado através de estruturas como
(With & King 1999). Assim, as características de cada organismo são determinantes da
2000). Lima & Zollner (1996) definiram a capacidade perceptual (perceptual range) como
a distância máxima na qual um elemento da paisagem pode ser percebido ou detectado por
favorável (Zollner & Lima1999a). Um animal com uma baixa escala perceptual terá um
risco de mortalidade relativamente alto, pois gastará mais tempo procurando um habitat
favorável que um animal com uma alta escala perceptual (Zollner & Lima 1997). Desta
fragmentados (Zollner & Lima 1999a). Da mesma maneira, a sensibilidade de uma espécie
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Porém, existe pouca informação empírica sobre a escala perceptual de vertebrados
(Zollner & Lima 1999a). As poucas espécies estudadas incluem um réptil, a tartaruga de
água doce Trachemys scripta, cuja escala perceptual foi determinada em 300 m (Yeomans
floresta até aproximadamente 10m (Gillis & Nams 1998); Peromyscus leucopus, que possui
uma escala perceptual máxima de 90m (Zollner & Lima 1999b); Tamias striatus com
aproximadamente 120m; Sciurus carolinensis com 300m e Sciurus niger com 400m
(Zollner 2000).
perceptual limitada para o roedor Oryzomys palustris, menor que 10m. Esta espécie
contra o vento quando estão procurando um habitat, provavelmente para manter uma
trajetória retilínea (Schooley & Branch 2005). Este comportamento já tinha sido registrado
em invertebrados como o besouro Chelinidea vittiger, que possui uma forte tendência a se
mover contra o vento, provavelmente usando o olfato para orientação (Schooley & Wiens
2003). O fato de algumas espécies usarem o olfato, ou outros sentidos como a audição,
perceptual pode depender de condições ambientais (Yeomans 1995, Zollner & Lima
1999a).
ainda que a fragmentação seja comum nestas paisagens. Este estudo buscou determinar a
8
OBJETIVOS
florestais.
9
ÁREA DE ESTUDO
estado do Rio de Janeiro. Esta região apresenta um grande número de fragmentos florestais
bem delimitados e separados por áreas abertas com plantações, estradas primárias e
áreas mais altas dos morros, acima dos 100m da cota altimétrica, e possuem de forma geral
uma vegetação de floresta secundária de Mata Atlântica (Cabral & Fiszon 2004).Os
experimentos de soltura foram realizados em uma fazenda pecuária, com pasto cortado
uma pastagem contígua a um fragmento florestal de 61,38 ha (Figura 1). Esta área estava
em contato com o fragmento de soltura, com outras pastagens, e com uma estrada principal.
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ESPÉCIES ESTUDADAS
florestais, pertencem à ordem Didelphimorphia (Gill 1872). Todas têm hábito noturno e
ocorre no Brasil do Rio Grande do Norte até o Rio Grande do Sul (Cáceres & Monteiro
Filho 2006). É uma espécie semiterrestre (Cunha & Vieira 2002, Vieira & Monteiro Filho
2003, Grelle 2003), podendo ser capturada também nos estratos mais altos da floresta
em grandes distâncias, e ter áreas de vida de maiores que 120 hectares (Telford Jr. et al.
1979, Sunquist et al. 1987). Movimentos entre fragmentos de floresta têm sido reportados
para a espécie, assim como capturas nas áreas de vegetação aberta do entorno (Pires et al.
adaptar a paisagens fragmentadas (Fernandez & Pires 2006). O peso médio dos indivíduos
Philander frenatus (Olfers 1818) (Figura 1.2) ou “cuíca cinza de quatro olhos”, ocorre
no Brasil da Bahia até o Rio Grande do Sul (Cáceres & Monteiro Filho 2006). É
& Feer 1997, Cunha & Vieira 2002, Vieira & Monteiro Filho 2003). Movimentos entre
11
fragmentos e capturas nas áreas abertas de entorno também têm sido reportados para a
espécie (Pires et al. 2002), assim como visitas à matriz para forrageio (Lira 2005). As áreas
de vida reportadas variam entre 0,12 e 7,4 ha. (Gentile et al. 1997, Lira 2005), sendo que os
dados de áreas maiores são mais confiáveis já que foram estimados através de telemetria. É
considerada uma espécie que tolera relativamente bem ambientes fragmentados (Fernandez
& Pires 2006). O peso médio dos indivíduos usados neste estudo foi de 395g.
Brasil de Minas Gerais até o Rio Grande do Sul (Cáceres & Monteiro Filho 2006). É uma
(Emmons & Feer 1997). As áreas de vida da espécie podem variar de 0,8 a 2,45 ha. (Pires
& Fernandez 1999, Lira 2005). Em estudos realizados na Mata Atlântica têm sido
gramíneas, porém estes movimentos foram realizados unicamente por machos (Pires et al.
2002). O peso médio dos indivíduos usados neste trabalho foi 112g.
Bahia até o Paraná (Cáceres & Monteiro Filho 2006). É uma espécie arborícola, de sub-
bosque (Charles-Dominique et al. 1981, Cunha & Vieira 2002)¸ mas também é capturada
no chão (Grelle 2003). A informação sobre os movimentos desta espécie é limitada e suas
áreas de vida não são conhecidas (Cáceres & Monteiro Filho 2006). Pode utilizar certo tipo
12
separados por este tipo de vegetação (Passamani 2003). O peso médio dos indivíduos
olhos” é encontrada no Brasil do Amazonas até Santa Catarina (Cáceres & Monteiro Filho
2006). É uma espécie essencialmente terrestre (Emmons & Feer 1997, Cunha & Vieira
2002, Vieira & Monteiro-Filho 2003). Os indivíduos desta espécie podem percorrer
grandes distâncias (Gentile & Cerqueira 1995) e atravessar áreas abertas para se
movimentar entre remanescentes florestais (Pires et al. 2002), porém parecem evitar a
borda da floresta (Stevens & Husband 1998). O tamanho médio reportado para as áreas de
vida é de 0,5 a 0,74ha. (Bergallo 1994, Cáceres 2006), embora informações obtidas a partir
medidas (Loretto, D., comunicação pessoal). O peso médio dos indivíduos usados neste
13
Figura 1.2. Espécies estudadas: a) Didelphis aurita (Foto: German Forero); b) Philander
frenatus (Foto: German Forero); c) Micoureus paraguayanus (Foto: Renato Affonso); d)
Marmosops incanus (Foto: Vitor Rademaker); e) Metachirus nudicaudatus (Foto: Renato
Affonso).
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MATERIAL E MÉTODOS
cada espécie foram capturados em remanescentes florestais e levados a uma área da matriz
no entorno dos remanescentes, uma pastagem no caso. Nesta pastagem os indivíduos foram
medida para determinar sua escala perceptual. Este método tem sido usado, com algumas
insetos (Zollner & Lima 1997, 1999a, Zollner 2000, Schooley & Wiens 2003, Schooley &
Branch 2005).
em direção ao mesmo. Uma área aberta, como uma pastagem, pode representar um local
totalmente desfavorável para algumas espécies de pequenos mamíferos que são restritas ao
interior da floresta, pois não provê recursos alimentares e tem um risco de predação alto.
(Zollner & Lima 1997). Como alguns estudos mostram que muitos animais percebem o alto
risco de predação em áreas abertas (Lima & Dill 1990), é razoável assumir que quando
15
Captura, soltura e rastreamento
Bacia do Rio Macacu, RJ, nos municípios de Guapimirim e Cachoeira de Macacu, RJ.
Nestes inventários foram usadas armadilhas Sherman modelo XLK e Tomahawk modelo
201. Uma vez capturados, os animais eram colocados em gaiolas individuais, à sombra,
soltura. Posteriormente, eram transladados ao local de soltura com a gaiola coberta para
evitar que olhassem os arredores. O local de liberação era uma pastagem contígua a um
fragmento florestal diferente, que ficava a uma distância mínima de 1,2km do fragmento de
captura, para minimizar assim a chance de que os animais tivessem experiência prévia ou
conhecessem o lugar.
em uma caixa de madeira ou plástico, sustentada por uma corda que passava por duas
roldanas, o que permitia que fosse suspendida à distância (Figura 1.3). Antes da liberação, o
animal recebia um carretel de rastreamento nas costas (Cunha & Vieira 2002, Vieira &
Loretto 2004), e era colocado sob a caixa onde permanecia por alguns minutos antes da
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Figura 1.3 Mecanismo de liberação dos indivíduos.
Foram usados carretéis de linha de nylon nº. 5 ou nº. 10 (Culver Textiles Corp.,
New York), com o peso aproximado de 1,7g (175m de linha) e 4,5g (480m de linha),
enrolados em filme PVC (Boonstra & Craine 1986). Os carretéis maiores (nº. 10) foram
usados para as espécies maiores, Didelphis aurita e Philander frenatus, e os menores (nº. 5)
para as outras espécies. Para equipar cada indivíduo com o carretel, este era colado no pêlo,
entre as escápulas, utilizando cola. Estudos realizados usando este método têm mostrado
que o procedimento não tem efeitos negativos na sobrevivência dos indivíduos (Steinwald
et al. 2006).
As solturas dos indivíduos foram feitas mantendo uma distância mínima de 20m entre
indivíduos eram liberados puxando a corda do mecanismo, levantando assim a caixa para
que o animal pudesse sair. Os locais de soltura foram posicionados ao longo de linhas
paralelas à borda da floresta (uma para cada distância), e espaçados 20m entre si, para
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influências olfativas na orientação (Figura 1.4). Todas as solturas foram feitas durante o
final do dia, no crepúsculo, entre 17h30min e 19h30min. Durante cada evento de soltura
foram utilizados no máximo seis indivíduos, que eram liberados ao mesmo tempo, ou com
intervalos de máximo 10 minutos entre cada um. A distância inicial de liberação foi 50m,
Figura 1.4 Disposição dos lugares de liberação com relação ao fragmento e ao pesquisador.
(d: distância de liberação).
vento foi considerada a direção de origem do vento, isto é, o azimute do vento. A altura do
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O carretel de rastreamento deixa um caminho que permite conhecer os movimentos
do animal após este sair do mecanismo. O caminho de cada animal foi mapeado no dia
seguinte com o auxílio de uma bússola e trena, obtendo então o azimute e a distância
percorrida entre pontos em que houve uma clara mudança na direção (aprox. ±10º). Cada
caminho foi seguido até terminar o carretel ou até chegar ao fragmento florestal.
e ângulos de orientação, foi necessário o uso de estatística circular nas análises. Esta é um
tipo particular de estatística que está no meio da análise de dados lineares e a análise de
dados esféricos (Fisher 1993). É particular devido principalmente ao caráter finito e circular
da escala dos dados. Não existe um zero verdadeiro, nem ordenação, a designação de um
valor maior ou menor é arbitrária. Assim, numa escala circular que corresponde a ângulos,
o círculo está dividido em 360 intervalos iguais, e o ponto zero é arbitrário. Da mesma
forma não há razão para dizer que 90 graus é uma direção maior que 60 graus (Zar 1984).
No presente estudo foi usada estatística circular para calcular ângulos médios, testar
liberação calculando o vetor médio dos primeiros 20m percorridos. Este novo método é
uma modificação de outros métodos que utilizam o ponto final do caminho ou o a direção
do primeiro metro percorrido para determinar a orientação dos indivíduos. O uso desta
distância mínima (20m, no caso) para medir a orientação, e não todo o caminho percorrido
19
do animal, assegura que este não tenha chegado à floresta só por movimentos aleatórios
(Goodwin et al. 1999), e resume a informação dos primeiros movimentos do animal. Para
passos de 50cm, para dar assim o mesmo peso a cada azimute. O ângulo médio foi
indivíduos liberados em uma mesma distância usando estatística circular (teste V) (Zar
1984, Fisher 1993). O teste V é uma variação do teste Rayleigh, que permite testar a
hipótese nula de que a distribuição dos ângulos é uniforme, só que o teste V é mais
fragmento. Isto permitiu determinar, para cada distância de soltura, se as orientações dos
animas eram não aleatórias e se estavam agrupadas na direção do fragmento, o que seria
esperado se estes fossem capazes de perceber o habitat de floresta. Também foram usados
Para determinar se existiam diferenças na orientação entre machos e fêmeas foi usado
o teste Mardia-Watson Wheeler, que compara duas distribuições circulares (Fisher 1993).
combinados os dados das distâncias nas quais houve uma orientação significativa para
20
múltipla), utilizando a distribuição de probabilidade normal e funções identidade. Baseados
nos resultados dos testes-V, a distância de liberação foi incluída como uma variável
fragmento e a orientação média de cada indivíduo. Este valor, conhecido como a distância
ou divergência angular, é uma variável linear e não circular (Schooley & Wiens 2003), que
varia entre 0 e180, portanto, foi possível usar métodos lineares e não circulares.
Anderson et al. (2000). O uso deste critério de seleção permite trabalhar com múltiplas
hipóteses, em lugar de uma única hipótese nula vs. uma hipótese alternativa. Este tipo de
escolha do melhor modelo, que perca o mínimo de informação com relação à realidade. A
escolha é feita usando o critério AIC, cujo objetivo básico é achar um compromisso entre o
(Mac Nally 2000). O modelo com o menor valor de AIC é considerado o melhor modelo
(Anderson et al. 2000). Para comparar os modelos, estes foram escalados calculando os
valores Δ i para cada um, onde Δ i = AIC i – mínimo AIC. Desta forma, o modelo com o
menor AIC tem um valor Δ i = 0. Modelos com Δ i ≤ 2 devem ser considerados ao fazer
inferências (Burham & Anderson 2002). Estes valores são fáceis de interpretar e permitem
21
O efeito do vento foi avaliado de duas formas: 1) sendo incluído como uma das
opostos aos valores dos movimentos a favor. Isto poderia ocultar o efeito do vento no
primeiro tipo de análise. Para determinar se existia uma orientação a favor ou contra o
vento usando estatística circular, foi verificado se a orientação dos indivíduos apresentava
favor e contra. A distribuição bimodal foi testada utilizando o método de duplicação dos
Mech & Zollner (2002) encontraram uma correlação positiva e significativa entre o
tamanho corporal (peso) e a capacidade perceptual para roedores que têm entre 15 e 800gr.
uma nova regressão) entre a inclinação e o peso médio de cada espécie. Encontraram desta
partir desta relação propuseram a seguinte equação (1) para estimar a inclinação (da relação
22
Onde S é a inclinação predita (º/m) e M é a massa da espécie em gramas.
Onde ADcrit é um valor de divergência angular encontrado por eles (63º a 69º) para o
qual a orientação se torna significativa; 15,5 representa o valor da altura da floresta usada
nos experimentos dos roedores; e H é a altura da floresta para a qual se quer predizer a
determinada H.
os dados das espécies P. frenatus e M. paraguayanus, para as quais a distância foi uma
propostas para roedores eram aplicáveis a marsupiais neotropicais, foi utilizada a equação
de Mech & Zollner (2002) para estimar a inclinação esperada da relação distância-
nossos dados.
23
RESULTADOS
paraguayanus. As outras duas espécies somente foram liberadas a uma distância de 100m
do fragmento devido ao baixo número de indivíduos capturados, e portanto não foi possível
Philander frenatus
distâncias de 50m (u=2,76; p<0,001; n=16) e 100m (u=3,02; p<0,001; n=19)(Figura 1.5).
Porém, não houve uma orientação significativa para o fragmento na distância de 200m (u=-
24
Figura 1.5. Orientações angulares dos indivíduos de Philader frenatus liberados a 50m,
100m, e 200m do fragmento. O centro do círculo indica o lugar onde os indivíduos foram
liberados e as árvores indicam a direção do fragmento. Cada triângulo representa a
orientação angular de um indivíduo. Os vetores indicam o ângulo médio e a concentração
do grupo de indivíduos e são apresentados somente quando houve uma orientação
significativa para o fragmento.
Didelphis aurita
de 50m (v=1,62; p=0,05; n=10), 100m (v=1,84; p<0,05; n=5), e 200m (v=2,17; p<0,05;
n=15) (Figura 1.6). A uma distância de 300m do fragmento não houve uma orientação
25
Figura 1.6. Orientações angulares dos indivíduos de Didelphis aurita liberados a 50m,
100m, 200m e 300m do fragmento. Todos os símbolos iguais a Figura 1.5.
Micoureus paraguayanus
50m (u=3,34; p<0,0001; n=6) e 100m (v=2,15; p<0,05; n=9)(Figura 1.7), mas não houve
26
Figura 1.7. Orientações angulares dos indivíduos de Micoureus paraguayanus soltos a
50m, 100m, e 200m do fragmento. Todos os símbolos iguais a Figura 1.6.
caso de M. incanus, não houve orientação significativa para o fragmento (v=-0,43; p=0,66;
n=5) no caso de M. nudicaudatus parece existir uma orientação para o fragmento ainda que
27
Figura 1.8. Orientações angulares dos indivíduos de Marmosops incanus (esquerda) e
Metachirus mudicaudatus (direita) soltos a 100m do fragmento. Todos os símbolos iguais a
Figura 1.7.
Nenhuma das três espécies cuja capacidade perceptual foi determinada apresentou
uma orientação significativa para o fragmento em que foram capturados. P. frenatus (u=-
n=4)(Figura 1.9).
diferentes para P. frenatus (W=0,42; p=0,81; fêmeas n=15 machos n=20) nem para D.
aurita (W=1,56; p=0,46; fêmeas n=16 machos n=14). Devido ao baixo número de
indivíduos liberados não foi possível comparar os sexos nas espécies M. paraguayanus, M.
nudicaudatus, e M.inacanus.
28
0 0
270 90 270 90
0
180 180
270 90
180
Philander frenatus
modelo incluiu estas duas variáveis (Δ i = 0; wi = 0,42; K = 4). Já o segundo melhor modelo,
que inclui o peso, possui um Δ i > 2. A distância ao fragmento e a altura do pasto também
foram as únicas variáveis que apareceram de maneira consistente nos primeiros modelos.
29
Estas variáveis estão relacionadas negativamente com a capacidade de orientação, sendo
que quanto maior a distância de liberação e a altura do pasto, maior a divergência angular
(coeficientes de regressão: dist. =0,55; alt.do pasto =3,30), e portanto menor a orientação
para o fragmento. A Tabela 1.1 mostra os primeiros seis modelos, que representam 85% de
Log- AICc
Modelo K
likelihood Δi wi
Distância, Pasto 4 -192,32 0,00 0,42
Distância, Peso, Pasto 5 -192,30 2,68 0,11
Distância, Velocidade do vento, Pasto 5 -192,31 2,68 0,11
Distância, Pasto, Orientação do vento 5 -192,32 2,70 0,11
Distância 3 -195,26 3,34 0,08
Distância, Peso, Velocidade do vento,
6 -192,29 5,54 0,03
Pasto
Didelphis aurita
de D. aurita para o fragmento de floresta (Tabela 1.2). Esta variável foi a única no melhor
modelos. Porém, os primeiros quatro modelos apresentaram Δ i < 2, portanto o peso, que
apareceu no segundo modelo com Δ i baixo, é uma variável que também pode ter
30
capacidade de orientação, sendo que quanto maior esta diferença, maior a divergência
A Tabela 1.2 mostra os primeiros seis modelos, que representam 69% de confiança no
melhor modelo.
Log- AICc
Modelo K
likelihood Δi wi
Orientação do vento 3 -176,75 0,00 0,22
Peso, Orientação do vento 4 -175,78 0,64 0,16
Distância, Orientação do vento 4 -176,34 1,77 0,09
Pasto, Orientação do vento 4 -176,42 1,93 0,08
Velocidade do vento, Orientação do vento 4 -176,52 2,12 0,08
Peso, Pasto, Orientação do vento 5 -175,40 2,64 0,06
Micoureus paraguayanus
peso, e altura do pasto devem também ser consideradas. Destas últimas, a direção do vento
apareceu como a mais importante já que foi incluída no melhor modelo além de também
capacidade de orientação, sendo que quanto maior a distância, maior a divergência angular
31
1.3 mostra os primeiros seis modelos, que representam 79% de confiança no melhor
modelo.
log- AICc
Modelo K
likelihood Δi wi
Distância, Orientação do vento 4 -95,62 0,00 0,23
Distância, Peso 4 -96,09 0,94 0,15
Distância 3 -97,86 1,22 0,13
Distância, Pasto 4 -96,37 1,50 0,11
Distância, Peso, Orientação do vento 5 -94,64 1,80 0,09
Distância, Pasto, Orientação do vento 5 -94,79 2,11 0,08
médias na direção a favor e contra o vento (teste-V com duplicação dos ângulos: P.
32
0 0
270 90 270 90
180 180
orientação significativa para a direção do vento (u=1,57; p=0,06; n=35). Porém, o resultado
é marginal e observando a figura com atenção, parece existir um agrupamento dos ângulos
ao redor de 0 e 180° (Figura 1.11). Quando os indivíduos liberados a 50m e 100m são
removidos desta análise, aparece claramente uma distribuição bimodal, com as modas perto
de 0 e 180°, o que corresponde às direções a favor e contra o vento (Figura 1.11). O método
de duplicação dos ângulos acoplado a um test-V permitiu comprovar que existe uma
distribuição bimodal para os indivíduos liberados a 200 e 300m (u=2,27; p<0,05; n=22).
33
Figura 1.11. Orientação dos indivíduos de Didelphis aurita com relação ao vento na hora
de soltura. Esquerda: todos os indivíduos, direita: indivíduos soltos a 200m e 300m. As
setas indicam a direção do vento.
orientação (divergência angular) somente para estas duas espécies. Posteriormente, foram
Utilizando a equação proposta para roedores (Mech & Zollner 2002), e uma altura de
34
Tabela 1.4. Peso médio dos indivíduos, inclinação e capacidades perceptuais esperadas
para P. frenatus, M. paraguayanus e D. aurita segundo as equações de Mech & Zollner
(2002).
Capacidade
Peso
Espécie Inclinação esperada perceptual esperada
médio (g)
(m)
Didelphis aurita 849,97 0,10 1307 – 1431
Philander frenatus 394,58 0,33 378 – 414
Micoureus 112,11 0,48 262 – 287
paraguayanus
as esperadas segundo a equação de Mech & Zollner (Tabela 1.4 e 1.5). Isto quer dizer que a
equação proposta para calcular a inclinação subestimou o valor real da inclinação para estas
duas espécies. Isto é, nos marsupiais estudados a orientação varia (diminui) mais com a
Seria possível pensar que devido ao fato de que o valor da inclinação está no
obtida com nossos dados, o valor ainda é maior do que a capacidade perceptual encontrada
utilizando estatística circular (Tabela 1.5). Quer dizer que a segunda equação também
35
Tabela 1.5. Inclinação calculada usando os dados dos experimentos, capacidade perceptual
esperada calculada usando esta inclinação, e capacidade perceptual determinada usando
estatística circular.
Capacidade Capacidade
Inclinação
Espécie perceptual perceptual
calculada
esperada (m) estimada (m)
Philander frenatus 0,53 237,33 - 259,94 100
Micoureus 0,73 173,12 - 189,61 100
paraguayanus
36
DISCUSSÃO
têm focado principalmente em movimentos dentro dos habitats das espécies, como floresta
Atlântica ou restinga (Gentile & Cerqueira 1995, Gentile et al. 1997, Cunha & Vieira 2002,
Cáceres 2003, Loretto & Vieira 2005). Porém, poucos trabalhos têm estudado os
movimentos nas áreas de matriz, com influência antrópica, que estão ao redor das áreas de
Estes estudos mostraram que várias espécies de marsupiais são capturadas na matriz,
e que os indivíduos podem se deslocar de um fragmento para outro. Não obstante, pouco é
capacidade perceptual menor do que 100m, sendo a menor encontrada nas espécies
37
estudadas, enquanto que M. nudicaudatus teria uma capacidade superior ou igual a 100m.
movimentos entre fragmentos encontrada por Pires et al. (2002) na Reserva de Poço da
Antas, RJ, na Mata Atlântica brasileira. Eles encontraram para os marsupiais, que a espécie
com a maior taxa de movimento entre fragmentos foi D. aurita, seguida por M.
paisagem. Resultados similares foram obtidos por Zollner (2000), que encontrou que a
espécies.
movimentos dentro de habitats. As espécies do gênero Didelphis têm áreas de vida grandes
e alta movimentação (Telford Jr. et al. 1979, Sunquist et al. 1987), da mesma forma que M
nudicaudatus (Gentile & Cerqueira 1995). Estas duas espécies se movimentam mais entre
mostrado que espécies generalistas são melhores atravessando e utilizando habitat de matriz
(Laurance 1990). Estas duas espécies seriam então aquelas menos sensíveis à fragmentação
38
Philander frenatus e M. paraguayanus, apresentaram a mesma capacidade perceptual,
menor que a de D. aurita. Porém, é possível que devido aos hábitos mais arborícolas, M.
frenatus utiliza a matriz com maior freqüência que M. paraguayanus (Pires et al. 2002).
Marmosops incanus, que apresentou a menor capacidade perceptual, seria a espécie mais
uma paisagem fragmentada da Mata Atlântica no nordeste brasileiro. Talvez devido a sua
fragmento a outro.
atravessando a matriz maiores que 1000m para D. aurita, de 800m para M. paraguayanus,
deslocamentos maiores que 300m podem ter sido feitos em vários passos, atravessando de
reportada no estudo de Pires et al. (2002) foi 300m para indivíduos de D. aurita, P.
freqüência dos movimentos concorda com a diferença nas capacidades perceptuais. Assim
maiores que sua capacidade perceptual, mais o fazem com menos freqüência já que correm
39
Por outro lado, o tipo de matriz na área em que estes movimentos entre fragmentos
foram estudados por Pires et al. (2002) não era uma pastagem baixa. Ainda que seja uma
área aberta dominada por gramíneas, apresenta outras espécies como samambaias, arbustos,
e outras espécies arbóreas pioneiras (Lira 2005). Isto proporciona maior proteção contra
predação, o que pode permitir que os indivíduos usem a matriz, e assim se movimentem
a conectividade funcional de uma determinada paisagem será distinta para cada espécie.
Para as espécies com maior capacidade perceptual, como D. aurita, a paisagem terá
geralmente uma conectividade funcional maior, já que elas conseguem atravessar distâncias
As diferenças nas capacidades perceptuais podem ser devidas a diferentes fatores. Foi
sugerido que para animais que utilizam a visão como mecanismo principal para detectar
habitat à distância, a capacidade perceptual deveria estar relacionada com a altura do olho
desde o chão, e com o tamanho do olho (Mech & Zollner 2002). Como estas duas variáveis,
(Kiltie 2000, Mech & Zollner 2002), a capacidade perceptual deveria também ser
Neste estudo, ainda que a maior espécie (D. aurita) teve a maior capacidade
40
tamanho do corpo pode influenciar a capacidade perceptual quando se comparam tamanhos
relativamente diferentes, como D. aurita (peso médio dos indivíduos estudados: 849,97g) e
M. incanus (peso médio dos indivíduos estudados: 58,75g). Porém, quando comparadas
espécies com uma diferença menor de tamanho, como P. frenatus (peso médio dos
Por outro lado, o peso apareceu como uma variável secundariamente importante na
orientação de D. aurita e M. paraguayanus nos modelos. Isto implica que para indivíduos
de uma mesma espécie, o tamanho do corpo pode realmente ter algum efeito na capacidade
de orientação. Não obstante, outras variáveis são mais importantes na hora de enfrentar a
M. paraguayanus.
tem sido estudado durante anos em mamíferos, mas os mecanismos exatos do processo não
são bem conhecidos. Não se sabe com exatidão se os animais que regressam a “casa” o
fazem por movimentos aleatórios, por familiaridade com grandes áreas ou através de
Ainda que este comportamento tenha sido registrado para muitas espécies de
pequenos mamíferos (Bovet 1990, revisão em Roges 1988), a maioria dos estudos têm
41
utilizado captura-recaptura, o que dificulta o entendimento dos mecanismos de orientação e
retorno ao fragmento origem para nenhuma das espécies estudadas. Os indivíduos soltos a
distâncias maiores que sua capacidade perceptual, isto é, que não se orientaram para o
onde haviam sido capturados. Isto sugere que não existe um mecanismo, pelo menos a
curto prazo, de identificar o lugar de origem, quando o animal se encontra em uma área
liberação similares feitos com roedores, onde também não foi encontrado este tipo de
fêmeas indica que os dois sexos têm capacidades de orientação similares. Se isto fosse
alguns roedores e nos marsupiais estudados, indicaria que a capacidade perceptual não é um
42
mecanismos de orientação na procura de habitat têm um componente visual importante.
Uma pastagem sem corte, com mais de 20cm de altura representa uma barreira para a
percepção de habitat a distância da espécie. Sem incluir as dificuldades que representa para
se movimentar. Este fato mostra que o uso da terra para pastagem na matriz representa um
entrar em uma área aberta e exposta, também terão uma capacidade de orientação
diminuída. O vento parece não ser uma variável importante na orientação de P. frenatus
também ter um efeito, ainda que pequeno, na orientação dos indivíduos dessa espécie.
Mesmo que não tenha sido observada uma orientação a favor do vento, o fato do vento
apresentar uma influência leve sugere que de certa maneira quando a incidência do vento
Para D. aurita, ao contrário das outras duas espécies, a distância não foi a variável
mais importante na orientação para o fragmento. Ainda que a estatística circular possibilite
de habitat parece ser diferente para esta espécie. A direção do vento foi a principal variável
todos os indivíduos juntos, não é evidente que existe uma orientação baseada no vento, não
43
obstante quando são retirados os indivíduos de distâncias menores (50 e 100m), o padrão é
vento. Isto sugere que D. aurita utiliza em distâncias curtas um mecanismo de orientação
mais visual, já que percebe com facilidade o fragmento. Porém, em distâncias maiores,
quando a percepção do fragmento parece mais difícil, como evidenciado pela alta dispersão
dos pontos na Figura 1.6, utiliza outro mecanismo eficiente para a orientação, a
anemotaxia.
químicos olfativos para localizar a fonte de ferohormônios (Balkovsky & Shraiman 2002).
Recentemente foi sugerido que a anemotaxia pode ocorrer também como uma estratégia
para manter uma direção reta durante a procura de habitat (Schooley & Wiens 2003,
Schooley & Branch 2005). Dado que um movimento quase reto é uma estratégia efetiva na
dispersão em paisagens fragmentadas (Zollner & Lima 1999), o uso do vento permitiria
manter este tipo de movimento com mais facilidade. De fato, este fenômeno foi reportado
para o roedor Oryzomys palustris durante movimentos entre áreas alagadas (Schooley &
Branch 2005).
mecanismos de procura que compensem a limitação na escala perceptual (Zollner & Lima
1999). Didelphis aurita é uma espécie que tem conseguido se adaptar bem a ambientes
anemotaxia tem contribuído para melhorar sua estratégia de procura de habitat, permitindo-
44
lhe usar a melhor estratégia em paisagens fragmentadas, seguir um caminho quase reto
experimentos de soltura permite detectar que são menos tortuosos que os das demais
espécies estudadas. Esta menor tortuosidade poderia estar influenciada também pelo fato de
ser a espécie de maior tamanho corporal e encontrar menos obstáculos para seu
sugere que esta espécie desenvolveu ou aproveitou um sistema de procura mais eficiente
que aquele das outras espécies, o que lhe permite adaptar-se melhor a ambientes
fragmentados.
As equações propostas por Mech & Zollner (2002) para estimar a capacidade
medida da orientação. O significado biológico da diferença nesta inclinação seria que nos
marsupiais, a orientação diminui mais rápido com o aumento da distância do que nos
roedores. Isto implicaria que se compararmos uma espécie de roedor com um marsupial de
Porém, esta equação implica que a distância é a única e mais importante variável
que determina a orientação. Mas os resultados mostraram que isto não é sempre o caso, e
45
outras variáveis podem ser mais importantes, o que limita o uso destas equações nas
comparações.
marsupiais tropicais, não é possível fazer comparação entre marsupiais e roedores já que as
que depois de certa altura o aumento da floresta não implica num aumento na capacidade
perceptual, por isso a equação superestima o valor real da capacidade perceptual. Desta
forma, nenhuma das equações permite uma estimativa exata da inclinação ou da capacidade
diferente tamanho permitiria, porém, estabelecer uma relação própria entre peso e
46
CONCLUSÕES
taxas de movimento dentro do habitat, sendo que as espécies com maiores áreas de
escala de tamanhos das espécies estudadas. Entre espécies com diferenças menores
Para indivíduos da mesma espécie, o tamanho do corpo apresenta uma leve relação
dependendo da espécie.
47
Os resultados do presente estudo não mostram evidência de comportamento de
estudadas.
variável que deve ser examinada em futuros estudos sobre orientação desta espécie.
indicam que a espécie pode usar esta estratégia de procura quando o fragmento está
A equação proposta por Mech & Zollner (2002) para estimar a capacidade
perceptual de roedores superestima o valor real para marsupiais. Isto é devido a dois
48
fatores, primeiro a relação entre orientação e distância é mais inclinada em
espécies.
49
CAPÍTULO II
50
INTRODUÇÃO
heterogêneas, e como estes são afetados por mudanças de origem antrópica. A Ecologia da
heterogeneidade espacial (Barret & Peles 1999). Uma das prioridades da Ecologia da
(Wu & Hobbs 2002, Rutledge 2003), o que permite entender melhor o efeito das alterações
antrópicas na paisagem.
biológicos (Taylor et al. 1993). Esta variável é medida usando um conjunto de índices
ecológicos, foram desenvolvidos nos últimos anos muitos índices para medir a estrutura da
proporção da área ocupada por elas, os segundos descrevem os atributos das manchas e
51
Porém, o uso de índices da paisagem tem sido reavaliado, pois segundo alguns
autores, em geral os índices não servem como indicadores dos efeitos da fragmentação e
Rutledge 2003, Taylor et al. no prelo). Diversos índices estão correlacionados entre si,
alguns outros são sensíveis à escala em que são medidos (Tischendorf 2001, Rutledge
2003). Os índices são uma ferramenta importante e útil para descrever e comparar padrões
espaciais (Rutledge 2003), e alguns índices estão correlacionados com processos ecológicos
como dispersão, mas apenas em algumas situações (Tischendorf 2001). Assim, estas
principalmente a área dos fragmentos e as distâncias entre eles (Taylor et al. no prelo).
Porém, a conectividade não pode ser definida baseando-se simplesmente nas distâncias
conectividade da paisagem (D´Eon et al. 2002), e esta última tem que ser considerada na
52
formas (Johnson et al. 1992), uma paisagem não é inerentemente fragmentada ou
Desta forma, existe uma diferença entre a conectividade estrutural, que é baseada
espacial (Tischendorf & Fahrig 2000). A conectividade pode ser vista então como uma
Lima & Zollner (1996) têm chamado a atenção sobre a necessidade de estabelecer
pouco conhecidos. Estes fenômenos incluem movimentos e seleção de habitat, áreas nas
diferentes. Estes autores propõem que uma maior ligação entre estas duas áreas possa
enquanto este se desloca em seu ambiente, e como esta informação é usada na seleção de
53
definida como a distância máxima na qual um organismo pode perceber um elemento da
paisagem (Lima & Zollner 1996). A capacidade perceptual de um animal influencia sua
mancha com sucesso (Zollner & Lima 1999). Portanto, esta variável pode ser utilizada
como uma medida das capacidades de dispersão das diferentes espécies em análises de
grafos aplicada à ecologia (Urban and Keitt 2001). A teoria dos grafos é conhecida e
(Bunn et al. 2000). Suas aplicações nestas áreas estão relacionadas com a otimização do
fluxo em redes ou circuitos, mas ela representa uma ferramenta importante nas análises de
conectividade da paisagem (Urban & Keitt 2001). A teoria dos grafos trabalha com um tipo
conectados entre si, representado geralmente como um diagrama (Urban & Keitt 2001). Um
grafo apresenta então uma paisagem como um conjunto de nodos conectados de alguma
forma. Uma conexão entre dois nodos implica que existe algum tipo de fluxo ecológico
entre eles, como dispersão de propágulos ou fluxo de material (Urban & Keitt 2001).Esta
abordagem é simples, e pode servir como um guia importante nas decisões sobre a
54
conectividade funcional para as diferentes espécies, dadas as características particulares da
paisagem estudada. Também foram realizadas algumas análises baseadas na teoria dos
circundando os rios da região. O Código Florestal (Lei no 4.771, de 15/09/65) define como
Áreas de Proteção Permanente locais onde devem ser mantidas todas as florestas e demais
formas de vegetação natural. Estes locais representam áreas frágeis ou estratégicas para a
e à proteção da fauna e flora local (EMBRAPA 2006). Por isto não devem ser modificados
encontram-se as áreas ao longo dos rios ou de qualquer curso de água. A largura mínima
destas deve ser de trinta metros para os cursos de água de menos de 10 metros de largura, e
dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989) (Índice Fundamental do Direito 2006). Através de
uma modelagem, foi avaliado o possível efeito das APPs que deveriam estar presentes na
55
OBJETIVOS
perceptual.
estudada.
funcional da paisagem.
5. Avaliar o possível efeito das Áreas de Proteção Permanente (APPs) em torno aos rios, na
56
ÁREA DE ESTUDO
no Rio Macacu (Amador 1997). A Bacia do Guapiaçu está localizada na vertente atlântica
como Serra dos Órgãos, até desaguar na Baía de Guanabara (Freitas 2004). A vegetação
99,94 % da sua área coberta pelo Domínio Mata Atlântica (REDE DE ONGS DA MATA
mais elevadas do terreno, nos topos dos morros, geralmente acima da cota altimétrica dos
100m (Cabral & Fiszon 2004). Estes remanescentes florestais se encontram dentro de
terra no primeiro caso, ou por habitações, pequenas hortas e jardins no segundo (Cabral e
Fiszon 2004).
57
(BRASIL, 2000), os remanescentes florestais da Bacia do Rio Guapiaçú são de grande
importância para a conservação deste bioma. Devem ser prioritários para a realização de
Uma área dentro da Bacia do Rio Guapiaçu foi delimitada para o estudo da
conectividade funcional das diferentes espécies e para a realização das análises espaciais de
conectividade. A área escolhida foi uma área de aproximadamente 16000 hectares, que
e uma pequena parte da Serra dos Órgãos, isto com o objetivo de estudar a conectividade
58
MATERIAL E MÉTODOS
As análises espaciais foram realizadas baseando-se na teoria dos grafos, que como foi
mencionado antes, trabalha com dados espaciais que consistem em conjuntos de nodos, e
são conhecidos como grafos. Um grafo está conectado se existe um caminho entre cada par
de nodos, isto é se todo nodo é atingível desde qualquer outro nodo. Um grafo não
diferentes práticas ou variáveis através de operações com os grafos. Existem dois tipos de
operações com grafos, as relacionadas com a conexão entre nodos e as relacionadas com os
nodos (Urban & Keitt 2001). Nas aplicações à Ecologia da Paisagem, as primeiras
permitem avaliar o efeito de modificações nas conexões funcionais entre fragmentos, por
espécie em uma paisagem determinada. Por outro lado, o segundo tipo de operações,
59
Análises de Conectividade Funcional
fragmentos florestais da área escolhida a partir de uma imagem de satélite (Agosto de 2005)
utilizando o programa ArcMap. Este mapa foi construído para fragmentos maiores que 1
ha., e foi utilizado como base para as análises espaciais (Figura 2.1).
fluxo os valores de capacidade perceptual obtidos no primeiro capítulo (Tabela 2.1). Foi
utilizado o modelo baseado somente na distância, sem incluir a influência do tamanho dos
considerados conectados quando separados por uma distância igual ou menor ao valor da
Além de gerar o gráfico com os grafos resultantes para cada espécie, foram
e a área do componente com o maior número de nodos. Estas métricas servem para
comparar a conectividade funcional resultante para cada espécie. Foi determinado também
60
Figura 2.1. Área de estudo na bacia do Rio Guapiaçu.
61
Ao aumentar a distância dos fluxos ecológicos, isto é, a capacidade de um organismo
paisagem. Assim, existe uma distância limiar a partir da qual a paisagem deixa de ser um
grupo de fragmentos e se transforma em uma área continua. Isto pode acontecer de forma
questão.
conectividade foi modelada para distâncias de dispersão começando de zero, caso no qual a
paisagem consiste só dos fragmentos isolados, até a distância em que a paisagem foi
constituída somente de uma única área contínua, com todos os fragmentos conectados. Para
Estas são métricas usadas na teoria dos grafos aplicada à conectividade da paisagem
(Urban & Keitt 2001). O número de componentes diminui à medida que a conectividade da
paisagem aumenta e cada vez mais fragmentos fazem parte de um mesmo componente. O
número de nodos e a área do componente com o maior número de nodos, pelo contrário,
aumentam à medida que a conectividade da paisagem aumenta. Com estes valores foram
paisagem.
62
Remoção de fragmentos de diferentes tamanhos
área do mesmo nas análises anteriores, foi utilizado o número de nodos como medida da
conectividade da paisagem para avaliar o efeito da remoção dos fragmentos. Estas análises
foram realizadas para as espécies estudadas, utilizando como medida da distância de fluxos
os valores de capacidade perceptual. Neste caso, para cada espécie, a distância de conexão
da paisagem.
caso, a área corresponde às Áreas de Proteção Permanentes que devem estar presentes na
região.
Para modelar os efeitos da presença das APP na área, foi criada no mapa dos
fragmentos uma faixa de vegetação de 100m de largura sobre todos os rios, que
ausência das APPs, através da figura dos grafos e das métricas de conectividade funcional.
63
RESULTADOS
baixa, e a paisagem aparece como uma área totalmente fragmentada (Figura 2.2). Isto
implica que na paisagem existem poucos fragmentos separados por uma distância curta o
funcional seja maior que para M. incanus, a paisagem ainda aparece altamente fragmentada
(Figura 2.3).
64
Figura 2.3. Conectividade funcional da paisagem para P. frenatus e M. paraguayanus. As
linhas representam conexões entre fragmentos.
Para a maior das espécies estudadas, Didelphis aurita, a paisagem se encontra menos
fragmentada (Figura 2.4), apresentando alguns grafos maiores que representam conjuntos
de fragmentos conectados, isto é, áreas que aparecem contínuas para a espécie devido a sua
alta capacidade perceptual. Existem, porém, algumas áreas que carecem de vegetação, que
plantações, localizadas no meio da paisagem, e às área que circundam os rios, ao longo dos
65
Figura 2.4. Conectividade funcional da paisagem para D. aurita. As linhas representam
conexões entre fragmentos.
D. aurita, que apresenta a maior conectividade funcional. É possível observar que o número
das outras espécies. Isto é, para D. aurita os 160 fragmentos presentes na área estão
divididos em somente 52 componentes ou áreas conectadas. Por outro lado, a área do maior
componente para D. aurita é de mais de 1600 ha., mais de quatro vezes a área do maior
qual a mata contínua, a Serra dos Órgãos, está conectada com alguns poucos fragmentos.
66
Para as outras espécies não existe uma conexão funcional entre a mata contínua e os
fragmentos.
fragmentos mais distantes são atingidos. Esta curva mostra três regiões diferenciadas que
das espécies com valores de dispersão entre 40 e 180m aproximadamente, que teriam uma
conectados, e uma área menor do que 200 ha. Um segundo grupo seria o das espécies com
valores de dispersão entre 200 e 380m aproximadamente. Estas espécies teriam uma
fragmentos conectados, e uma área de 2000 ha. a 4000 ha. As espécies com uma
capacidade de dispersão superior aos 400m formariam o terceiro grupo, com uma alta
uma área de 8000 ha. Já as espécies com uma capacidade de mais de 650m enxergam a
67
Desta forma, a paisagem apresenta pelos menos três limiares de conectividade, um ao
redor de 180 metros, outro ao redor de 400 metros e um último aos 650 metros. Se
180 140
# de componentes
160
# de nodos 120
# de Componentes ou nodos
100 80
80 60
60
40
40
20
20
0 0
0 40 80 0 0 0 0 80 0 0 0 0 0 20 0 0 0
12 16 20 24 2 32 36 40 44 48 5 56 60 64
Distância (m)
aparentemente não são afetadas pela perda de fragmentos menores do que sete hectares.
Ainda com a perda destes fragmentos estas espécies mantêm 86% e 78% da conectividade
68
menores, e o desaparecimento de fragmentos de seis hectares causa uma diminuição de
44% na conectividade funcional (Figura 2.6). Apesar destas pequenas diferenças, em geral
35
30
# de nodos no maior
25
componente
Marmosops
20 Philander
15 Didelphis
10
5
0
0 10 20 30 40 50 60 70
que o Rio Iconha nasce na Serra dos Órgãos, e se conecta com o Guapiaçu, a faixa de
vegetação das APPs ficaria conectada com a mata contínua. Portanto, a Serra e as APPs
constituiriam uma área de habitat contínuo, que se estenderia ao longo da paisagem. Isto
faria com que apareçessem novas conexões entre fragmentos para todas as espécies,
aumentando a conectividade funcional (Figuras 2.7, 2.8 e 2.9). Este fato implicaria que para
69
todas as espécies existiriam fragmentos da baixada conectados com a serra, o que sem a
A presença das APPs permitiria para D. aurita que os fragmentos que estão separados
pelo Rio Guapiaçu, que atravessa a paisagem, estivessem agora conectados em um mesmo
componente (Figura 2.9). Para as outras espécies, porém, esta área continuaria sendo uma
70
Figura 2.8. Conectividade funcional da paisagem para Philander frenatus, assumindo a
presença de uma APP contínua de 100m na paisagem.
71
O possível efeito das APPs na paisagem é mais claro ao comparar as áreas potenciais
de uso das espécies, áreas com fragmentos conectados, que seriam utilizadas de forma
conexões entre fragmentos, e o aumento na área do maior componente que seriam causados
conexões não são muito grandes, mas o aumento na área do maior componente permite
em quase cinco vezes, e para D. aurita em pouco mais de duas vezes (Tabela 2.3).
72
DISCUSSÃO
envolvidos nos processos de dispersão entre manchas de habitat e uso da matriz. Porém, é
indivíduos durante a procura de habitat (Lima & Zollner 1996). Porém, é importante
terão uma alta chance de ser atingidos durante um movimento de dispersão. Fragmentos
que estão separados por uma distância maior terão uma chance menor de serem atingidos,
fragmentos estão conectados significa dizer que os indivíduos de determinada espécie têm
uma maior chance de atravessar a matriz entre eles do que fragmentos separados por
73
dispersão destes últimos (Bödin et al. 2006), e para estabelecer áreas potenciais de uso de
paisagem, principalmente na área que a espécie pode usar de forma contínua. Enquanto M.
incanus enxerga a paisagem como uma área totalmente fragmentada, D. aurita possui áreas
nesta paisagem, pois teria maior dificuldade para se deslocar entre os fragmentos estudados.
funcional das duas espécies é similar, provavelmente existem diferenças na forma em que
elas usam a paisagem. Os dados da literatura mostram que P. frenatus utiliza mais
tamanhos populacionais baixos. Além disso, não existe uma conexão funcional entre a mata
contínua e os fragmentos, sugerindo a impossibilidade desta atuar como uma fonte para
74
A área sem vegetação que separa grupos de fragmentos, e corresponde ao leito do Rio
Guapiaçu, que atravessa a paisagem, mostra como o uso das áreas em torno do rio afetou a
conectividade da paisagem. Estas áreas são usadas para plantio devido à presença do rio, o
que facilita a irrigação, e para extração de areia, gerando assim uma descontinuidade na
vegetação.
espécies, exceto D. aurita, estão abaixo do primeiro limiar, o que corresponde a uma baixa
conectividade funcional. Somente D. aurita está acima do primeiro limiar, numa área de
conectividade média. Isto implica que apesar de D. aurita apresentar uma conectividade
maior que as outras espécies, isto não representa uma conectividade funcional alta.
Somente espécies com capacidades de dispersão na matriz superiores aos 400 m têm uma
partir da capacidade perceptual, e considerando que existe uma relação entre esta e o
tamanho do corpo, todas as espécies de pequenos mamíferos que não utilizam a matriz e
nas regiões onde existe maior necessidade. Dentre estas regiões encontram-se a área em
torno ao rio Guapiaçu, que é uma extensa área sem vegetação. Nas figuras 2.3, 2.4 e 2.5
podem ser identificadas outras áreas onde a criação de fragmentos de vegetação contribuiria
paisagem. Por exemplo, uma área de importância na conectividade funcional seria a que
75
separa a Serra dos Órgãos dos fragmentos da baixada, porém tais práticas dependem da
funcional apresentados são específicos para a paisagem estudada, e não podem ser
fragmentos de até sete hectares não gera uma diminuição considerável na conectividade
funcional. Isto acontece devido à baixa conectividade para estas espécies, com um baixo
número de grafos, portanto a perda de fragmentos pequenos não causa a divisão de grafos
maiores que seis hectares causa uma redução de 44% da conectividade. Isto mostra que,
conectividade funcional de todas as espécies cai com a perda de fragmentos maiores que 15
comunidades, onde é procurado preservar áreas com alta diversidade ou com espécies raras.
76
A importância dos fragmentos pequenos tem sido demonstrada em outros trabalhos (Bödin
et al. 2006), e destaca a necessidade de preservar estas áreas também, e não só concentrar
esforços em áreas maiores que podem estar isoladas ainda que sejam grandes.
conexão da Serra com uma faixa de vegetação que percorre a paisagem. É importante
considerar alguns pontos antes de pensar nos possíveis efeitos sobre a conectividade
uma faixa de vegetação estreita em torno ao rio. A função desta faixa seria a de um
corredor biológico, mas não temos certeza de que as espécies usariam esta área para
deslocar-se na paisagem.
É possível que indivíduos em dispersão usem esta área, pois representa um lugar mais
seguro frente à predação que uma área aberta, e possui um recurso importante, a água. Para
estudos têm demonstrado que faixas estreitas de vegetação são usadas por pequenos
florestais e para o fluxo genético entre populações (Bennett 1990, Laurance & Laurance
1999, Mech & Hallet 2001). Alguns mamíferos arborícolas podem utilizar faixas de
vegetação de até 30 e 40m como habitat e como corredores de dispersão, sendo que os
corredores com maior diversidade são preferidos (Laurance & Laurance 1999). Porém, a
resposta aos corredores pode variar entre espécies, razão pela qual a efetividade do corredor
77
Assumindo que as espécies poderiam usar a faixa de vegetação das APPs como
barreira, as APPs proporcionariam uma área que percorre a paisagem desde a mata
mostraram que estas áreas melhoram a conectividade funcional da paisagem para todas as
forma, a criação e manutenção das APPs em torno dos rios seria uma iniciativa interessante
A iniciativa é prática já que as APPs são áreas já estabelecidas pela Lei, que deveriam
ser preservadas. Porém, na região de estudo ao longo dos rios existem lugares sem
nenhuma cobertura de vegetação, ou em que esta não chega nem aos 10 metros de largura.
A simples aplicação de uma norma ambiental existente poderia melhorar a área disponível
78
CONCLUSÕES
A conectividade funcional da paisagem estudada foi diferente para cada uma das
menos fragmentada, com algumas áreas que têm fragmentos conectados. Esta
movimentação.
Para a paisagem estudada, todas as espécies, exceto D. aurita, estão abaixo dos três
aurita está acima do primeiro limiar, mas abaixo do segundo, numa região de
como áreas que permitem a passagem dos indivíduos para outras áreas maiores.
79
A criação de Áreas de Proteção Permanentes circundando os rios da região estudada
80
CONSIDERAÇÕES FINAIS
distâncias diferentes quando se encontram em uma matriz de pasto. Além disso, existem
da fragmentação nos pequenos mamíferos tropicais. Informações deste tipo são ainda
estudada a partir das capacidades de percepção de cada espécie, é bastante baixa em geral e
difere entre espécies. A maioria das espécies se encontra abaixo dos limiares de
conectividade funcional.
funcional.
81
Os resultados mostraram também que é possível avaliar o efeito de algumas práticas
de conservação usando o conhecimento sobre as características das espécies. Neste caso, foi
comprovado que a criação das Áreas de Proteção Permanente contíguas aos rios da região
modelo, ainda que simples e com algumas premissas, e complementado com a informação
pode ser melhorado com informações sobre o uso de diferentes tipos de matriz por parte
remanescentes florestais.
de matriz, como plantações. Também seria importante estudar o uso de faixas estreitas de
vegetação em torno dos rios, como as possíveis APPs, para determinar se esta seria uma
proposta viável para melhorar a conectividade funcional. Estes estudos, alguns já iniciados,
82
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