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PROGRESSÃO LINEAR:

UMA BREVE
INTRODUÇÃO
À TEORIA DE
SCHENKER

Orlando Fraga

DeArtes | UFPR
Curitiba | 2009
ABREVIAÇÕES viii 5.5 Registro obrigatório 39
5.6 Transferência de registro 40
INTRODUÇÃO ix 5.7 Acoplamento 42
5.8 Superposição 42
1. CONTRAPONTO POR ESPÉCIE 1 5.9 Aproximação superior 45
5.10 Nota de cobertura 46
1.1 Fundamentos Pedagógicos do Contraponto – 5.11 Substituição 46
As Espécies 1 5.12 Interrupção 49
1.2 Sumário das Espécies 1 5.13 Ligação 52
1.3 Regras Gerais para o Cantus Firmus 2 5.14 Paralelismo 52
1.4 Primeira Espécie 2
1.5 Segunda Espécie 6 6. MODELOS DE ANÁLISE 57
1.6 Terceira Espécie 11
1.7 Quarta Espécie 13 6.1 Caso 1 – Primeiro Movimento da
1.8 Quinta Espécie 16 Sinfonia 6, de Beethoven (Desenvolvimento) 60
6.2 Caso 2 – Estudo para violão Op. 35,
2. PROLONGAMENTO MELÓDICO 20 n. 17, de Fernando Sor 63
6.3 Caso 3 – Prelúdio em Dó Menor do
2.1 Progressão Melódica 20 Cravo bem temperado, vol. 1, de Bach 66
2.2 Melodia Polifônica 21 6.4 Caso 4 - Variações sobre a Arietta "Lison
dormait" de N. Dezède, K. 264 (315d),
3. PROLONGAMENTO DE FUNÇÃO 25 de Mozart 70

3.1 Tipos de Continuidade Harmônica 25 SÍMBOLOS 75


DEFINIÇÕES 76
4. COMBINAÇÃO DE HARMONIA E CONTRAPONTO –
PROGRESSÃO LINEAR 28 GLOSSÁRIO 81
SUPLEMENTO DE EXERCÍCIOS 84
4.1 Baixo Fundamental 28
4.2 Linha Fundamental 29 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 91
4.3 Estrutura Fundamental 29
4.4 Harmonizando a Dissonância 30
4.5 Representação Gráfica da Estrutura
Fundamental 31
4.6 Modelos de Estruturas Fundamentais 32

5. TÉCNICAS DE PROGRESSÃO LINEAR 34

5.1 Ascensão Inicial 34


5.2 Desdobramento 35
5.3 Movimento de/para uma Voz Interna 36
5.4 Permuta 38

vii
ABREVIAÇÕES

An Antecipação
Ap Apojatura
CaF Cadência Frígia
CAI Cadência Autêntica Imperfeita
CAP Cadência Autêntica Perfeita
CE Cadência de Engano
CF Cantus Firmus
CPl Cadência Plagal
CP Contraponto
LF Linha Fundamental
MC Mais Cadência
p Nota de Passagem
r Retardo
RF Registro Fundamental
s Suspensão
sc Salto Consonante
TR Transferência de Registro
Vz Tom Vizinho
Vzi Tom Vizinho Incompleto

viii
INTRODUÇÃO materializadas em uma análise podem ganhar um novo status.
Ao teórico é dado o direito à especulação filosófica, tanto quanto
é dado ao compositor o direito à liberdade de expressão
artística.
A análise schenkeriana, como toda análise, tenta
demonstrar relações entre as diversas estruturas de uma obra Na outra ponta estão os intérpretes. Muitos deles tendem a
musical que não são prontamente aparentes. Caso os considerar que a simples análise os exime de se aprofundar nos
componentes constituintes de uma composição fossem demais aspectos que compõem o estudo de uma obra – história,
apreendidos em uma simples audição, a análise seria estilo, idiossincrasia de autor em particular, considerações de
redundante e até mesmo indesejada. Por este ponto de vista, é fraseio, articulação e dinâmica, além de outros. No entanto,
possível afirmar que um indivíduo que tem absoluta consciência todos estes elementos devem compor um conjunto de ações,
do que está ouvindo não tem a estrita necessidade de formalizar que podem resultar em um melhor entendimento da obra.
qualquer tipo de análise. A necessidade criada pela falta de
familiaridade com uma determinada linguagem é subordinada a Não sem razão, muitas análises são criticadas por sua
questões de tempo e espaço; isso significa dizer que para se aridez e formalismo exacerbado cuja principal preocupação é a
entender em toda sua plenitude uma obra de Corelli, por mera classificação, com pouca aplicação artística. Fica, assim,
exemplo, que pertence à Europa [espaço] do século XVIII evidente que a análise depende muito da habilidade do analista.
[tempo], é necessário agregar todo e qualquer tipo de Isto é uma desvantagem, pois aqueles menos treinados farão
informação que possa substanciar a sua interpretação. O pouco mais que afirmar o óbvio de uma maneira complexa e
mesmo não ocorre com uma obra do folclore brasileiro, onde a muitas vezes pretensiosa. A tática mais comum é o uso de um
intimidade com a linguagem dispensa procedimentos analíticos tipo de jargão que exclui aqueles não iniciados. Esta é uma
mais sofisticados, pelo menos para os ouvintes locais. situação muito comum nos livros didáticos. Poucos autores
tornam suas estratégias de análise explícitas o suficiente para
Aprender um novo estilo musical é como aprender um permitir que o estudante possa estendê-las ao restante do
idioma estrangeiro. O processo geralmente envolve o domínio repertório. Outros analistas, em particular aqueles da linha
da dicção, da gramática e da sintaxe. Quanto mais perfeito se estruturalista, formulam suas observações de modo a não
pretende o domínio desta nova língua, mais trabalho é permitirem leituras alternativas, assumindo que suas
necessário. Algo semelhante ocorre com o intérprete de música interpretações refletem o consenso geral e suas idéias não
quando trabalha um repertório que não lhe é nato. precisam ser corroboradas.

A análise como disciplina A tarefa não é simples. É verdade que uma abordagem
estruturalista explica “como” a música funciona, mas
O raciocínio analítico diverge do raciocínio dirigido à dificilmente “por que”. É como se tomássemos os fenômenos
composição. O este constrói; aquele “des-constrói”. O fato do musicais congelados, paralisados em um dado momento no
compositor não considerar conscientemente certas relações tempo e desconsiderássemos a natureza orgânica da
estruturais, não significa que as mesmas não estejam lá e que interpretação musical, além da relação dinâmica que existe
não possam ser observadas pelo analista. Idéias assim entre o intérprete e o seu ouvinte. Explicar a relação entre a
Introdução

estrutura e o seu significado é ainda o maior desafio da análise de abusos e torna-se irreconhecível nas mãos de intérpretes mal
e não pode ser arbitrariamente subjugado. preparados.

Não obstante a influência que possa ter, a análise O que contém o livro
schenkeriana é apenas uma entre as diversas ferramentas
existentes para explicar como a música funciona. Cada estilo ou Harmonia e forma são duas ferramentas fundamentais
gênero musical exige uma abordagem diferente e para a análise, mas por razões práticas foram omitidas neste
conseqüentemente, o emprego da técnica analítica livro. Ambas poderão ser supridas pela ampla literatura em
correspondente. Seja como for, os aspectos didáticos da teoria português já existente. Menos correntes são as definições de
de Schenker continuam a ser expandidos e desenvolvidos, posto expansão melódica e harmônica e a elas é dedicado um capítulo
que o próprio Schenker não produziu nenhum texto didático. introdutório. Contraponto por espécie é disciplina regular nas
graduações; mesmo assim, um capítulo inteiro é dedicado ao
Para quem é este livro assunto, porém de tal forma a dirigi-lo ao pensamento
schenkeriano.
Embora o título especifique que se trata de uma
introdução, pode-se dizer que este livro é uma absoluta À medida que os gráficos avançam, os textos explicativos
introdução. Explico melhor: todos os textos que estampam diminuem, em conformidade com a idéia de Schenker de que os
como título “Introdução à Teoria de Shenker” são, na verdade, gráficos devem ser auto-explicativos. Assim, é importante para
textos dirigidos a um público avançado. Ao contrário, este o estudante conviver com eles por algum tempo, reproduzir as
trabalho tem a pretensão de se dirigir àqueles que não apenas experiências aqui desenvolvidas e, se possível, sugerir outras
são novos no pensamento schenkeriano, mas também possuem leituras.
pouco treinamento prévio em análise de qualquer espécie,
sejam eles instrumentistas, compositores, professores ou Também por questões práticas, não é possível em um livro
teóricos, estudantes ou profissionais. Não obstante, um cert6 deste porte apresentar análises de obras de maior porte. As
domínio de harmonia, contraponto e forma ajudarão o quatro análises integrais apresentadas aqui obedecem a um
estudante a tirar proveito mais rápido deste livro. critério de progressividade cujos modelos analíticos poderão ser
estendidos à maior parte do repertório de música tonal.
Uma das maiores causas de insucesso na análise
schenkeriana é o total, ou quase total, desconhecimento das Longe de ser completo, este livro busca apenas dotar o
regras que permeiam o tonalismo. Em outras palavras, falha-se estudante de condições mínimas para decifrar um gráfico já
por não se saber “como” e “por que” a tonalidade funciona. Um existente ou substanciar a criação de seu próprio, sugerindo
estilo ou gênero musical está subordinado a uma sintaxe que para tal, estratégias simples de abordagem. Para aqueles que
lhe é peculiar e lhe dá identidade. Consideremos, como desejarem se aprofundar no assunto, sugerimos na referência
exemplo, a música do período Clássico. Por causa de sua bibliográfica uma pequena lista de obras que consideramos
construção formal regular, de sua quadratura de frase, de seu chaves para a continuidade dos estudos.
vocabulário harmônico convencional, sua textura homofônica,
seu ritmo muitas vezes uniforme, esta música é alvo constante

x
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker

Quem foi Schenker vários campos de estudo e vem aumentando desde sua morte.
Seu pioneirismo com relação a uma prática editorial rigorosa,
Heinrich Schenker nasceu na Galícia (hoje parte da fez com que grandes nomes da música, como Fürtwangler e
Polônia) em 1868 e morreu em Viena em 1935. Foi durante o Hindemith, viessem a prestar mais atenção às suas formulações
seu curso de Direito em Viena que decide se dedicar em tempo teóricas. Com a tradução para língua inglesa dos seus trabalhos
integral à música, transferindo-se para o Conservatório de Viena nas décadas de 1960 e 1970, o rigor analítico de Schenker
onde estudou composição com Anton Bruckner. Logo se tornou passou também a atrair teóricos importantes como Allen Forte,
um competente músico de câmara, crítico, editor e professor. Adele Katz e Felix Salzer.
Suas composições receberam a atenção de Brahms e Bussoni e
seus ensaios sobre crítica musical foram publicados em diversos Por um lado, a teoria de Schenker está intrinsecamente
periódicos. O crescente interesse de Schenker pelo processo ligada aos desenvolvimentos da lingüística (os estruturalistas,
criativo dos grandes mestres motivou seu trabalho editorial. em particular) empreendidos na Europa durante as últimas
Entre os mais importantes estão as revisões das cinco últimas décadas do século XIX. Por outro, estão as teorias da Gestalt,
sonatas para piano de Beethoven, publicadas entre 1913 e que tiveram grande influência no pensamento contemporâneo.
1921. Porém, foi a sua crescente insatisfação com as teorias As tentativas de Schenker de demonstrar como as partes
musicais de seu tempo que o levou a escrever o que viria a ser funcionam em relação ao todo podem ser entendidas em termos
sua obra mais influente, a trilogia Neue musikalishe Theorien destes conceitos.
und Phantasien (Nova Teoria Musical e Fantasias). A primeira
publicação foi Harmonielehre (Harmonia), de 1906. Depois foi
Kontrapunkt (Contraponto, em dois volumes publicados
respectivamente em 1910 e 1922), culminando com Der freie
Satz (Composição Livre, 1935).

A teoria tonal de Schenker pode ser resumida em termos


de camadas estruturais (Schichten)1 que permeiam toda obra
tonal. O conceito de planos baseia-se no fato de que os
componentes constituintes de uma música podem ser
hierarquizados estabelecendo uma outra base para a descrição e
interpretação das relações entre os componentes de qualquer
obra musical. Suas teorias tiveram grande influência no
pensamento analítico contemporâneo, principalmente nos
Estados Unidos. Mais recentemente, com a expansão da
semiótica, as teorias de Schenker vêm ganhando mais adeptos
por todo o mundo. Sua influência tem sido significante em

1
Plano Frontal, Plano Médio e Plano de Fundo.

xi

1. CONTRAPONTO POR ESPÉCIES 1.2 Sumário das Espécies

Fux fundamentou seus princípios pedagógicos do ensino do


contraponto nos autores do passado, principalmente Palestrina.
A teoria de Schenker procura explicar a música tonal como Mas diferentemente deste, e por razões puramente didáticas, o
unidades harmônicas que, por sua vez, são ornamentadas e contraponto por espécie desenvolvido por Fux assume um
expandidas no tempo, segundo os princípios do contraponto por caráter demasiadamente estrito, cuja finalidade é construir um
espécies. Na base desta idéia está o preceito de que o ambiente absolutamente controlado que poderia eventual-
contraponto por espécies é uma ferramenta didática e não uma mente, resultar em um completo domínio da técnica. Com isto,
teoria composicional. Por se tratar de um instrumento didático, Fux observou que a evolução de seus alunos era mais rápida
o ensino do contraponto por espécies segue regras muito que a média.
estritas, cuja finalidade é adquirir pleno controle da textura
polifônica. Dentre estas regras, uma das mais importantes é No contraponto estrito, os intervalos harmônicos são
aquela que governa a dissonância. Em outras palavras, deve-se classificados segundo a tabela abaixo:
observar o grau de dependência que a dissonância possui e a
exigência de uma consonância de referência como ponto de Consonantes perfeitos Uníssono
partida ou de chegada. Daí a idéia de dissonância não só como 5a
decoração, mas também como motor da progressão tonal. 8a

1.1 Fundamentos Pedagógicos do Contraponto — As Consonantes imperfeitos 3a


Espécies 6a

Os princípios do contraponto por espécie foram formulados Dissonantes 2a


por Johann Joseph Fux (1660-1741) no seu livro Gradus ad 4a
Parnassum (1725). Em 1910 e 1922, respectivamente, 7a
Schenker publicou seus estudos sobre contraponto. Neles está
embutido o conceito de que uma melodia é moldada sobre um
princípio simples como aquele estabelecido pelo contraponto Quatro tipos de movimentos são possíveis:
estrito das espécies. Isto significa dizer que, a partir de um
contraponto de notas longas (1a espécie), estas podem ser a) Paralelo: mesma direção, mesmo intervalo;
subdivididas em duas (2a e 4a espécie), em quatro (3a espécie), b) Similar: mesma direção, diferente intervalo;
até gerar uma linha complexa com relações quase livres (5a
espécie). c) Oblíquo: uma voz se move sobre outra estática;
d) Contrário: direções opostas.
2 Contraponto por espécies

1.4 Primeira Espécie


1. Uma nota contra outra do Cantus Firmus (CF);
2. As dissonâncias são proibidas;
3. 5as e 8as paralelas são proibidas;
4. O intervalo do penúltimo compasso deve ser uma 3a ou
6a em relação do CF;
Ex. 1.1 Tipos de movimento das vozes 5. O intervalo do último compasso deve ser uníssono ou 8a;
6. Evitar uníssonos no corpo do exercício;
1.3 Regras Gerais para o Cantus Firmus (CF) 7. Evitar movimento direto entre duas consonâncias;
1. A tessitura não deve ultrapassar uma 10 ; a
8. Dar preferência ao movimento contrário;
2. Delinear a linha melódica com um único clímax; 9. Saltos em uma voz podem ser contrabalançados pela
outra voz estática;
3. Os intervalos melódicos mais aceitos são: 2a, 3a, 4aj, 5aj,
6a, 8a; 10. Evitar cruzamento de vozes.
4. Não realizar mais de dois saltos consecutivos;
Abaixo, no exemplo 1.2, temos um típico contraponto a
5. Evitar saltos consecutivos de 3a; duas vozes extraído do Gradus ad Parnassum de Fux.
6. Criar uma variedade de movimentos: o movimento
diatônico contínuo ascendente ou descendente deve se
limitar a cinco notas;

7. Dar preferência ao movimento por grau conjunto; não


obstante, alguns saltos são recomendados para fins de
variedade;
Ex. 1.2 Contraponto da 1ª espécie
8. Compensar os saltos com um movimento diatônico em
direção contrária; O exemplo 1.3 abaixo demonstra como podemos
9. Limitar o aparecimento de uma mesma nota ao mínimo abstrair o contraponto de uma obra, aplicando já os princípios
possível; reducionistas de Schenker:

10. Evitar repetições de padrões como seqüência, motivo,


imitação, entre outras.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 3

Ex. 1.3 Narvaez: Diferencias sobre Guardamelas Vacas, para vihuela (1538)
4 Contraponto por espécies

No exemplo 1.3a temos a música propriamente dita, ou redução ao máximo possível da aplicação das regras de
seja, como ela se apresenta em sua superfície. Na primeira contraponto. No exemplo 1.4a temos a música em seu acaba-
redução (exemplo 1.3b), são eliminadas as notas repetidas e as mento final, ou seja, como ela se apresenta em sua superfície. A
notas decorativas como notas de passagem, tons vizinhos1 e partir daí, inicia-se um processo de redução eliminando-se
outras. O tipo de construção da primeira voz em arpejo ajuda primeiro as notas repetidas e depois todo tipo de decoração,
na identificação dos pontos ou notas estruturais. De um modo como tons vizinhos e notas de passagem. Este processo é reali-
geral, a primeira nota de cada compasso da melodia sustenta a zado de forma graduada através de sucessivos gráficos; desta
estrutura. O conjunto destas notas melódicas da primeira maneira pode-se chegar a conclusões mais precisas sobre as
semifrase (cc. 1-4) forma um tetracorde descendente que, decisões tomadas, além de se deixar a abordagem mais clara
quando agregado ao baixo do mesmo trecho, configura um para o leitor. No exemplo 1.4b, eliminam-se as vozes internas,
desenho melódico-harmônico que é típico do gênero Roma- cuja função é de incremento rítmico e estabelecimento de modo
nesca.2 No segundo compasso, a segunda nota ré foi escolhida (maior, menor, diminuto, aumentado). Estes elementos são
como nota estrutural, em detrimento da primeira nota si (que substituídos pelas cifras harmônicas abaixo da nota. No exemplo
poderia também ser correta) porque forma uma linha diatônica 1.4c, são eliminadas as repetições na melodia e no baixo. Em
contínua descendente, mais coerente com as regras estritas do 1.4d, são considerados os ornamentos, que neste caso foram
contraponto de 1a espécie. Uma linha melódica em grau grafados com notas pequenas a fim de diferenciá-las das notas
conjunto atenua ou compensa a instabilidade da segunda voz, mais importantes, grafadas com notas brancas. É um conceito
que se move por saltos. As ligaduras agrupam as notas importante — aquele da hierarquia estrutural, cuja organização
pertencentes ao mesmo conjunto ou universo de notas e que se visual ajuda a estabelecer o grau de importância que cada nota
relacionam internamente de alguma forma. A segunda semi- possui. Este conceito será desenvolvido mais adiante.
frase (cc.5-8) é um pouco diferente, pois acomoda a cadência;
por isso existe um incremento rítmico para mantê-la dentro dos Estamos prontos agora para explorar alguns detalhes.
quatro compassos da frase. Finalmente, no exemplo 1.3c são Vejamos o gráfico 1.4d: a primeira nota lá é anacruse de fá#,
eliminadas todas as ligaduras e notas não essenciais, restando que é a primeira nota da melodia propriamente dita – a
apenas as notas estruturais. anacruse é apenas um gesto ou impulso em direção a esta nota.
No compasso 2, as notas pretas formam o arpejo do acorde de
O exemplo seguinte mostra as várias etapas de tônica. No terceiro compasso, a nota mi, apesar de pertencer ao
depuração de outra frase musical. Na aplicação das regras acorde de dominante, tem a função de tom vizinho incompleto
estritas de contraponto no repertório clássico e romântico, da nota ré. No compasso seguinte, temos três situações: a
pode-se encontrar uma quantidade de variantes, como veremos primeira nota do compasso, ré, é apojatura do dó#; a terceira
neste exemplo extraído de um estudo de Fernando Sor (1778 - nota mi é arpejo do acorde de dominante; por fim, a última nota
1839). Em situações como esta, é importante aproximar a do compasso lá é anacruse do compasso seguinte. No compasso
7, a segunda nota si é arpejo do acorde de ii6, e a última nota
mi é arpejo do acorde de dominante. Todas as notas descritas
1
O termo corrente em português é bordadura. Não obstante, adotamos a acima são subordinadas a outras mais relevantes para a estru-
nomenclatura tom vizinho por ser esta denominação mais internacional. tura e por esta razão são menores na notação.
2
Guardame las Vacas é baseada na romanesca, um ground muito popular
no século XVI. A romanesca também é a base de Greensleeves, a
conhecida melodia inglesa.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 5

Ex. 1.4 Sor: Estudo Op. 35, No. 17


6 Contraponto por espécies

Um aspecto importante se apresenta quando temos de devem prevalecer as regras de estilo da obra analisada. Este
escolher uma entre duas notas consecutivas harmonicamente estudo de Sor é um exemplo típico do período clássico, com oito
corretas. Em situações como esta se aplica o critério do compassos divididos em duas frases, sendo a primeira
contraponto, elegendo-se a nota que melhor define a linha interrompida no compasso 4 pela semicadência. As duas frases
melódica. Como exemplo, podemos citar o segundo compasso se relacionam de forma análoga a nível local (as duas
do gráfico acima, onde temos três notas harmonicamente semifrases) e a nível global (a frase completa). Desta forma, o
possíveis. Analisemos as três no gráfico 1.4c: com a nota fá# dó# interrompido no compasso 4 será resolvido no ré do último
cria-se um movimento fá#-mi-fá# que, apesar de correto, é compasso.
redundante. A nota lá provoca um salto melódico indesejado
para o início da linha melódica. A escolha natural recai sobre a
nota ré, pois esta forma uma linha diatônica descendente que
catalisa e equilibra com perfeição o salto de 4a no baixo. Outra
situação, neste mesmo exemplo, está no compasso 3: a segun-
da nota mi e a terceira nota ré pertencem ao acorde de V7. A
escolha do ré como nota ideal baseia-se em dois critérios:
primeiro, com a nota mi, temos dois saltos consecutivos de 4a e Ex. 1.6 Organização estrutural da primeira frase do Estudo de Sor
de 3a, respectivamente; por outro lado, com a nota ré, temos
um salto ascendente compensado por um movimento cromático Apenas para reforçar o argumento, observe que os
na direção oposta, que dilui a tensão gerada pelo salto anterior. respectivos conseqüentes de cada frase são diametralmente
opostos, criando uma relação perfeita de equilíbrio, caracte-
A primeira frase é formada por quatro compassos rística fundamental do estilo clássico. Frisamos que, em redu-
organizados dois a dois, numa relação de antecedente e ções, nem sempre é possível aplicar as regras estritas do
conseqüente. O estabelecimento desta relação também justifica contraponto e cada caso deve ser julgado segundo os critérios
a escolha da nota ré como nota hierarquicamente mais de estilo do período em foco.
importante. A nota mi neste caso passa a assumir, em outro
nível estrutural, a função de apojatura.
1.5 Segunda Espécie

As regras da primeira espécie são também válidas para


a segunda, com alguns acréscimos. A principal característica
desta espécie é o incremento do movimento rítmico da melodia,
conectando as consonâncias de cada tempo forte.
1. Duas notas contra uma do CF;
Ex. 1.5 Equilíbrio estrutural no Estudo de Sor 2. O intervalo inicial deve ser o uníssono, 5a ou 8a;

Resta uma explicação sobre a quebra das regras estritas 3. A finalis deve ser uníssono ou 8a;
de contraponto no compasso 4. A resolução lógica do dó# neste
compasso deveria ser a nota ré. Porém, em casos como este,
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 7

4. A primeira nota de cada compasso deve ser consonante Os princípios do contraponto estrito podem aparecer de
com o CF; diferentes formas e em diferentes níveis estruturais de uma
música. Assim, por exemplo, um trecho na superfície baseado
5. A segunda nota de cada compasso pode ser dissonante
na 2a espécie, pode aparecer no plano de fundo na 1a espécie.
se for atingida e deixada por grau conjunto;
Os exemplos de 2ª espécie operando na superfície são inúmeros
6. Os saltos devem ser consonantes; e abrangem todos os períodos da história da música. Os chorais
de Bach costumam ser considerados como referência para o
7. O movimento contrário é preferível por dar maior estudo de notas estranhas dentro de uma harmonização.3
independência às vozes;
8. O Contraponto (CP) pode começar com uma pausa de No período barroco a idéia de um único affekt4 favorece
mínima; o aparecimento de texturas uniformes, como neste exemplo de
Henry Purcell (1659 - 1695):
9. A penúltima nota pode ser uma semibreve;
10. As notas de passagem são sempre dissonantes. A única
exceção é o movimento 6-5 ou 5-6 (consonância de
passagem);
11. Existem dois tipos básicos de dissonância: notas de
passagem e tons vizinhos;
Ex. 1.8 Purcell: Dido & Aeneas, 2º ato
12. Saltos de 8a ou maior representam uma transferência
de registro. Este moto continuo em colcheias no baixo é ornamen-
tado por notas de passagem (p) e tons vizinhos (Vz). Além de
decorar, o tom vizinho tem a função de prolongar a nota, ao
mesmo tempo em que acentua o contorno melódico da linha.
Evidentemente, isto também representa um incremento rítmico.
É interessante observar esta operação com mais detalhe. No
primeiro compasso, a nota dó# está prolongando a primeira
nota ré:
Ex. 1.7 Exemplo de contraponto da 2ª espécie

3
Notas estranhas são: notas de passagem, tons vizinhos, retardos,
apojaturas, entre outras.
4
De acordo com a Teoria dos Afetos.
8 Contraponto por espécies

Um exemplo de segunda espécie operando em um nível


estrutural mais elevado é este tema com Variações de Mozart:

Ex. 1.9

No exemplo acima, a linha pontilhada indica prolon-


gamento e as notas pequenas representam as notas não-
essenciais. Também na mesma figura, a quarta nota (mi) é uma
nota de passagem dissonante, como é o dó#; porém, sua
função é a de ligar o acorde em estado fundamental à sua
primeira inversão. Após a eliminação dos ornamentos e das
notas repetidas pode-se ver com clareza como o contraponto
está operando:

Ex. 1.11 Mozart: Variações sobre “Ah, vousdirei-je, Maman”, K. 265

Para se entender melhor o funcionamento deste tema,


precisamos é preciso examinar sua estrutura de frase e ritmo
harmônico.6 Embora esta não seja a única maneira de analisar
esta frase, pode-se notar que sua organização hipermétrica é de
2 em 2 compassos, começando pelo segundo.7 Para avançarmos
mais ainda, pode-se usar uma técnica de apoio muito
empregada pelos analistas a fim de elucidar passagens
controversas, que é a redução dos valores rítmicos. Neste caso
5
Ex. 1.10 usaremos a razão de 2 : 1.

6
Ritmo harmônico é a freqüência com que os acordes mudam.
7
Edward Cone chama isto de structural downbeat (tempo forte estrutural).
CONE, Edward. Musical Form and Musical Performance. New York : W. W.
5
O número 6 indica primeira inversão. Norton & Company, 1968, p. 24.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 9

Ex. 1.12 Mozart, K. 265 - Redução rítmica

Desta forma fica mais clara a função de anacruse do Esta terceira redução elimina as notas repetidas e ornamentais.
primeiro compasso. Anacruse é um gesto, um impulso em A ligadura pontilhada mostra qual nota está sendo prolongada.
direção à primeira nota real da melodia — neste caso a nota sol, A linha contínua embaixo da clave de fá mostra até onde I está
que recebe o firme suporte do acorde de tônica em seu estado sendo prolongado. O resultado pode ser analisado da seguinte
fundamental. O segundo acorde deste compasso é um acorde forma: primeiro temos um gesto, ou anacruse, em direção ao
vizinho (IV) cuja função é a de prolongar o acorde de tônica sol, primeira nota da melodia; a partir daí segue uma escala
que retorna logo em seguida. Podem-se observar estes detalhes descendente até o dó. Porém, antes da escala iniciar o seu
no exemplo que segue: movimento descendente, o sol é prolongado por um tom
vizinho, o lá.

Ex. 1.13 Mozart, K. 265 - Prolongamento da função tônica


Ex. 1.14 Mozart, K. 265 - Gráfico final

No exemplo acima, vemos que o baixo dó é restabelecido ao seu


lugar de direito como primeiro tempo forte estrutural.
10 Contraponto por espécies

1.6 Terceira Espécie


1. Quatro notas contra uma do CF;
2. O CP pode começar com uma pausa de semínima;
3. Intervalos possíveis para o início são: uníssono, 3a
Ex. 1.15 Contraponto da 3ª espécie
(raro), 5a, e 8a;
4. A terceira espécie inclui:
a. Notas de passagem simples ou duplas;
A terceira espécie trabalha com tons vizinhos e notas de
b. Tons vizinhos simples ou duplos; passagem. Um exemplo típico de como estas notas operam na
superfície pode ser visto em Greensleeves:9
c. Nota cambiata;8

5. A primeira nota do compasso deve ser consonante com o


CF;
6. As dissonâncias devem ser atingidas e deixadas por grau
conjunto. A exceção é a cambiata; Ex. 1.16 Anônimo século XVI: Greensleeves

7. Uníssono é permitido em qualquer tempo, porém não se


Esta frase está organizada a cada 2 compassos. Pode-se
deve usar mais de um por compasso;
observar aqui as três principais características da terceira
8. Saltos são usados mais eficazmente dentro do compasso espécie. No primeiro compasso temos uma nota de passagem
que de um compasso para o outro. ligando um intervalo de terça:

8 9
Nota cambiata (it.: nota trocada), termo introduzido no século XVII para Embora o exemplo contradiga a regra de 4 notas contra uma, sua
designar uma nota dissonante no segundo tempo fraco que é seguida por construção melódica possui todas as características desta espécie, o que,
salto de terça descendente. aliado a outras peculiaridades, justifica sua inclusão neste capítulo.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 11

eliminar as repetições e depois hierarquizar as notas,


distribuindo-as em níveis diferentes:

Ex. 1.17 Nota de passagem

No compasso 2, o tom vizinho fá prolonga a 5a do acorde


(mi):

Ex. 1.18 Tons vizinhos

No exemplo 1.18a, a ligadura pontilhada indica a nota


que está sendo prolongada; 1.18b, demonstra a hierarquia
entre as notas: a nota branca é mais importante que as pretas
sem haste. Por ser um simples ornamento, estas notas têm
significado secundário dentro da estrutura musical. A ligadura
Ex. 1.20 Gráfico de Greensleeves
agrupa as notas que pertencem à mesma coleção. Este é outro
conceito muito importante neste tipo de análise e que será
bastante explorado neste livro. No gráfico 1.20a, as primeiras três notas brancas da
melodia formam o acorde de lá menor com uma nota de
No terceiro compasso temos dois saltos consonantes
passagem entre o 3o (‡) e o 5o (‰) grau.10 Este 5o (‰) grau, que
consecutivos:
corresponde à nota mi, está sendo prolongado por um tom
vizinho, neste caso a nota fá. O segundo grupo de notas
brancas forma o acorde de sol maior. No gráfico 1.20b acima,
são retiradas as notas pretas ou notas subordinadas,
permanecendo apenas as hierarquicamente mais importantes.
Conclui-se que a passagem é um simples arpejo de dois
Ex. 1.19 Saltos consonantes (arpejo) acordes, Lá Menor e Sol Maior, respectivamente.

Como este se trata de um arpejo do acorde de sol maior,


todas as notas têm, a princípio, a mesma importância. Podemos 10
então prosseguir com a redução da passagem, começando por Na teoria schenkeriana, os graus da escala são referidos por acento
circunflexo acima do número.
12 Contraponto por espécies

1.7 Quarta Espécie

O objetivo desta espécie é o controle da suspensão.11 É


realizado em mínimas e, sempre que possível, com o segundo
tempo ligado ao primeiro tempo seguinte. Por exemplo:

Ex. 1.22 Contraponto da 4ª espécie

Quando se analisa música tonal, deve-se pesar com


Ex. 1.21 Suspensão cuidado o jogo que sempre ocorre entre harmonia, contraponto
e ritmo. Do completo entendimento destes três elementos
1. O CP sempre começa com pausa de mínima; atuando simultaneamente é que depende o sucesso da análise.
2. A segunda mínima deve ser consonante com o CF; Este conceito tem muito a ver com a 4a espécie, por conta do
deslocamento rítmico que cria a dissonância conhecida como
3. Se a nota ligada do primeiro tempo for dissonante, esta suspensão. É muito raro em composição livre encontrar trechos
deve ser resolvida um tom abaixo; musicais baseados em contraponto estrito da 4a espécie. Um
4. No penúltimo compasso, a primeira mínima deve ser estilo que se aproxima bastante disto é a cadeia de suspensões
uma 7a que resolve na segunda mínima. Esta, por sua comuns entre os compositores do barroco, em especial os
vez, deve formar um intervalo de 6a em relação ao CF; italianos:

5. É possível quebrar ocasionalmente uma sucessão de


ligaduras a fim de melhorar a condução de voz;
6. Suspensões 7-6 ou 4-3 podem ser usadas livremente. A
repetição consecutiva de uma suspensão é chamada de
“cadeia de suspensões”.

11
Referido, também, como retardo.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 13

Adágio

Ex. 1.23 Corelli: Trio Sonata, Op. 3, No. 2 - iii


14 Contraponto por espécies

Porém, o mais comum é que apareçam cadeias de suspensões


quebradas, como é o caso deste prelúdio de Bach:

Ex. 1.24 Bach: O Cravo Bem Temperado, Livro II - Prelúdio XII


Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 15

Ao se reduzir a passagem, elimina-se a segunda voz, extra. Entre todas as espécies, esta é a que mais se aproxima
permanecendo apenas o baixo e a melodia. Por fim, reorganiza- da composição livre graças à maior variedade proporcionada
se o registro para fins de análise. Como sempre, na redução pela mistura de valores rítmicos, criando um tipo mais rico de
eliminamos as notas repetidas. No caso do baixo, a 8a significa embelezamento da linha melódica. O tipo de ornamentação que
incremento rítmico da mesma nota — portanto mantemos uma decorre da 5a espécie é tradicionalmente conhecido por
nota só nos compassos 1 e 2. No segundo compasso, o salto de “diminuição” e era assim que Schenker se referia a ela. Este é
8a do láb da primeira voz provoca o que se chama transferência um ponto importante para o entendimento da sua teoria.
de registro; neste caso, sua função é puramente dramática, pois
aumenta a tensão do discurso que é explicitamente vocal. Na
segunda redução (ex. 1.24c), este salto é readequado,
permanecendo a linha melódica no mesmo registro. Bach usa
aqui suspensões 6-5 e 7-6, menos conclusivas que o movimento
4-3, que é sempre associado à cadência.

Ex. 1.25 Exemplo de contraponto da 5ª espécie


1.8 Quinta Espécie
Embora esteja fora do limite deste livro, a diminuição
É a mais próxima da composição livre.
merece alguns esclarecimentos. O termo adotado por Schenker
1. Combina as regras das quatro primeiras espécies, com em seu livro Der freie Satz (1935) é o mesmo usado para
alguns acréscimos; descrever um tipo característico de ornamentação renascentista.
Basicamente, a diminuição consiste em dividir uma nota longa
2. Pode-se começar com pausa de mínima;
em valores menores, incluindo notas de passagem, tons
3. Podem-se usar colcheias no segundo e no quarto tempo; vizinhos, saltos consonantes e suspensão.12 Este tipo de orna-
mentação, irradiado a partir da Itália, se espalhou por quase
4. Sugere-se iniciar com valores longos e acelerar o ritmo toda a Europa do século XVI e XVII e encontrou no estilo
gradualmente; elizabethano inglês um dos seus pontos altos. Vejamos um
5. O penúltimo compasso deve conter uma suspensão exemplo:
sobre a sensível, sempre que possível;
6. Ligaduras devem ser usadas apenas a partir de uma
mínima para outra mínima ou semínima. Exemplo:

A 5a espécie combina todos os procedimentos das espécies 12


anteriores com a adição de duas colcheias como decoração O termo também é usado em fugas, quando o sujeito aparece com
valores menores.
16 Contraponto por espécies

Ex. 1.26 Dowland: The Lady Rich’s Galliard - exemplo de diminuição

Neste exemplo, a primeira frase completa está na Em polifonia do século XVI, os princípios da 5a espécie
primeira linha. Em seguida a frase é repetida, desta vez podem ser alargados através de diversos tipos de manipulações
ornamentada com diminuições, na linha inferior. Observe que as de um tema ou sujeito, seja por cânone, imitação, retrógrado,
notas originais da melodia (indicadas em círculos) são preserva- inversão, entre outros. No Ex. 1.27, um trecho de uma Missa de
das quase que inteiramente na repetição, o que constitui uma Josquin des Près (ca. 1440-1521), a forma é delimitada pela
das maiores características deste estilo. ocorrência de pontos de imitação. Cada novo tema é, em geral,
derivado do tema inicial.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 17

Ex. 1.27 Josquin: Missa Pange Língua, Agnus Dei - Duo


2. PROLONGAMENTO MELÓDICO

Uma das principais vantagens da análise schenkeriana Na passagem acima cada nota da escala ascendente
está na possibilidade de se revelar progressões simples por trás está sendo decorada por tons vizinhos que, ao mesmo tempo,
de passagens aparentemente complexas. Isto pode se dar em prolongam cada uma destas notas. Na primeira linha temos o
diferentes níveis: dentro da frase, da seção ou na obra toda. fragmento melódico como se apresenta na sua superfície. A
Vamos examinar mais de perto as duas principais dimensões da segunda linha mostra as notas principais com haste para cima.
música tonal: a melodia, neste capítulo, e a harmonia, no capí- A ligadura pontilhada indica a nota que está sendo prolongada e
tulo seguinte. as notas sem haste são aquelas usadas para o prolongamento –
neste caso, tons vizinhos. A última linha mostra a estrutura
2.1 Progressão Melódica primária do fragmento – uma escala ascendente. Vejamos mais
dois exemplos que seguem este mesmo princípio:
Quando uma nota permanece ativa dentro de certo
contexto, mesmo com a intervenção de outras, diz-se que esta
nota está sendo prolongada. A variação é uma das principais
modalidades de prolongamento. Outro tipo em especial foi
usado por Schenker para basear sua teoria: a diminuição. Como
já vimos anteriormente, diminuições são basicamente passa-
gens ornamentais constituídas com notas de passagem, tons
vizinhos, apojaturas, saltos consonantes, retardos, entre outros,
que formam uma unidade linear.

Vejamos o seguinte exemplo:

Ex. 2.2

Neste exemplo, a nota mi está sendo prolongada por


duas colcheias cuja função é de tons vizinhos. Observamos duas
ligaduras: a superior pontilhada indica até onde a nota mi está
sendo prolongada; a inferior contínua mostra, em um nível mais
baixo, o movimento linear desta nota mi, ou seja, para onde ela
está se encaminhada. Neste caso temos dois níveis estruturais
operando simultaneamente: a, referido como superfície, e b e c
sua estrutura linear.

Ex. 2.1 Prolongamento de nota


O próximo exemplo foi extraído de uma Galliard de John
Dowland (1563 - 1626), que mostra o emprego mais comum da
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 19

diminuição na Renascença. Nesta operação, a nota mais impor- No exemplo acima, a ligadura é contínua porque a nota
tante (ou nota estrutural) é mantida sempre na mesma posição prolongada não está sendo repetida como nos exemplos ante-
dentro do compasso, sendo o ornamento agregado no entorno. riores. Entretanto, é possível notar, não apenas neste, mas em
Assim, sempre temos uma referência auditiva do que está todos os exemplos até aqui apresentados, que as notas
sendo decorado. Para se chegar à estrutura linear primária intermediárias decoram as notas principais sem interferir no
realiza-se um progressivo “depilamento” das diversas camadas movimento contínuo da linha. O exemplo seguinte mostra uma
estruturais: notação gráfica um pouco mais sofisticada:

Ex. 2.3

Exemplos de prolongamento podem estar inseridos nos


mais diversos contextos. Aqui temos um exemplo dentro de um Ex. 2.5 Beethoven: Sonata para Piano, Op.2, No. 1 - i
arpejo:
As ligaduras superiores indicam o movimento linear, ou
seja, a nota lá que se dirige para a nota sol que, por sua vez, se
encaminha para a nota fá. A ligadura inferior indica o prolon-
gamento da nota sol, por intermédio do fá e do mi que, por
constituírem apenas uma ornamentação de menor valor
estrutural, estão grafados sem haste.

2.2 Melodia Polifônica

Embora a melodia polifônica não constitua necessária-


mente um prolongamento, em algumas situações ela pode con-
figurar uma extensão. Por esta razão, o assunto é abordado
neste capítulo. Melodia polifônica é um recurso muito usado por
compositores para “forjar” polifonia em instrumentos melódicos,
Ex. 2.4 Bach: Prelúdio para Órgão, BWV 547
20 Prolongamento melódico

como a flauta ou o violino, e tem sido bastante explorado por


compositores de todas as eras. Examinemos um exemplo
extraído da obra de Bach:

Ex. 2.7 Haydn: Quarteto de Cordas Op. 3, No. 3 - Minueto


Ex. 2.6 Bach: Allegro para alaúde, BWV 998

Este exemplo serve para ilustrar diferentes níveis Neste exemplo temos os quatro compassos iniciais do
estruturais. O nível mais alto é o da superfície, ou seja, a músi- primeiro violino de um quarteto de Haydn (ex. 2.7a). Aqui, o
ca como se apresenta em seu acabamento final (ex. 2.6a). À ritmo harmônico regular entre I e V pode nos ajudar a deter-
medida que se avança na análise, é possível distinguir as notas minar quais são as notas estruturalmente mais importantes. O
subsidiárias ou secundárias (notas pretas sem haste em 2.6b) segundo gráfico (ex. 2.7b) coloca estas notas em uma pers-
das outras mais importantes (notas pretas com haste). Vistos pectiva hierárquica. Em cada compasso temos duas notas de
desta forma, estes dois elementos formam planos estruturais passagem (a nota principal aparece com haste para cima ligada
diferenciados — estabelecemos um novo nível de coerência ao colchete). Temos então uma escala descendente de ré a lá.1
melódica distinto da figuração ornamental da superfície (2.6c). As notas com haste para baixo representam um nível estrutural
Outras construções melódicas podem ser mais complexas que secundário – são notas que comentam a nota principal. Por
as apresentadas acima, como nos próximos dois exemplos: estabelecer o gênero (maior ou menor) elas se colocam em um
nível intermediário. Observamos que dentro de cada compasso
existe um arpejo de terça cujas notas são grafadas com haste
cruzada por estarem dentro do mesmo contexto harmônico (ex.

1
No terceiro compasso temos duas notas possíveis como notas estruturais,
o sol e o si. Esta última foi escolhida como nota estrutural mais importante
por proporcionar uma linha mais estável em direção ao lá.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 21

2.7c). Estas são agrupadas no ex. 2.7d, onde podemos Na primeira linha do exemplo 2.8atemos a música
observar uma escala descendente em terças. As notas de passa- propriamente dita, ou seja, a sua superfície. Na segunda linha
gem pertencem a um nível estrutural subordinado, por isso são (ex. 2.8b), já estabelecemos uma hierarquia, com as notas
eliminadas.2 brancas representando as notas principais da melodia. No
primeiro compasso, a nota sib é prolongada por um tom vizinho.
O segundo exemplo é um pouco mais complexo, pois A resolução deste mesmo sib é retardada no segundo compasso
envolve a relação de três vozes dentro de uma única linha: por deslocamento métrico, criando uma suspensão no primeiro
tempo que é resolvida no segundo tempo (os compassos 3 e 4
a) são análogos aos dois anteriores – ver ex. 2.9).

Ex. 2.9 Suspensão


b)
Em ex. 2.8c, trocamos a direção das hastes para
trabalharmos as vozes internas. Observamos, então, um arpejo
embutido na melodia. A quarta e quinta notas do primeiro
compasso (ré e mib) sugerem uma movimentação harmônica.
Se ligarmos todas as notas deste registro, teremos uma voz
intermediária com caráter harmônico definido. A terceira voz, ou
c)
o baixo, na superfície aparece deslocada ritmicamente nos
compassos 1 e 3 e pode ser re-alocada posteriormente. Por fim,
reorganizamos a passagem, colocando cada voz e cada ritmo no
seu lugar implicitamente original, para percebermos uma
pequena progressão a três vozes (ex. 2.8d). Como no exemplo
anterior, uma nota lá é acrescentada entre parênteses, por ser
uma nota implícita harmonicamente. Tanto quanto no exemplo
d)
2.7, este tipo de melodia polifônica exige certa quantidade de
recriação para que possamos entender melhor seu funciona-
mento.

O próximo exemplo é um trecho extraído de uma


Ex. 2.8 Bach: Suíte 1 para Violoncello Solo, BWV 1007 - Menuet II passagem bem conhecida da Chaconne para violino solo de
Bach:

2
No último compasso, foi acrescentada a nota fá# (entre parênteses). Este
é um recurso comum em análise, pelo qual se recompõe a linha de acordo
com a lógica de seu movimento implícito.
22 Prolongamento melódico

Ex. 2.10 Bach: Partita II para Violino Solo, BWV 1004 - Chaconne

Na primeira linha (ex. 2.10a), vê-se a música na sua


superfície. Na segunda linha (ex. 2.10b), temos uma interpreta-
ção da organização implícita das vozes (a linha diagonal no
primeiro compasso indica transferência de registro da nota ré).
Por último, a terceira linha (ex. 2.10c) demonstra como a
estrutura da passagem opera (com a inclusão, entre parênteses,
de notas harmonicamente implícitas). O que chama a atenção
nesta passagem é a seqüência de dominante aplicada V-I e,
depois, o movimento cadencial mais elaborado .
3. PROLONGAMENTO DE FUNÇÃO

Posto de maneira simples, prolongamento de função é a Os parênteses no exemplo 3.1a, indicam o local que
inserção, entre dois acordes, de material que o estende de pode ser preenchido por harmonias intermediárias entre I e V.1
forma análoga ao prolongamento melódico, retardando assim, Os três exemplos seguintes, b, c, e d, mostram algumas das
sua resolução. A figura abaixo demonstra de maneira simples possibilidades, entre muitas, de acordes usados com esta
como isto ocorre: finalidade. Ainda sobre o exemplo 3.1, cabe uma explicação
quanto à notação. O traço abaixo dos parênteses indica que a
função tônica prevalece até o aparecimento da dominante. Nos
exemplos seguintes, vemos o prolongamento da função tônica
por intermédio de diferentes tipos de acordes. O emprego de
tonalidades próximas juntamente com um movimento melódico
constante reforça a continuidade da progressão harmônica. Em
outras palavras, a integração destas harmonias com a função
tônica é garantida pela proximidade harmônica e pelo movimen-
to por grau conjunto das vozes individuais.

Além de retardar a resolução da tônica, estes acordes


propiciam maior variedade harmônica, além de incrementam o
ritmo harmônico. Foi manipulando estes prolongamentos com
conseqüentes adiamentos das resoluções das tensões, que os
compositores foram alargando paulatinamente as formas
musicais até chegar ao gigantismo de Wagner, Strauss e Mah-
ler, no final do século XIX e início do século XX.

3.1 Tipos de Continuidade Harmônica

O prolongamento de função pode ocorrer das mais varia-


das formas. Vejamos alguns exemplos:

Ex. 3.1

1
As harmonias que estão mais próximas à dominante preparam a chegada
desta e, por esta razão, são conhecidas como “harmonias pré-dominan-
te”.
24 Prolongamento de função

Inversão de um acorde 3. Permuta

(Beethoven: Variações sobre “GodSavethe King”, Wo O 78)


(Schumann: Álbum da Juventude, Op. 68 - Melodia)

1. Acorde vizinho

4. Prolongamento por transformação - dominante individual

5. Elaboração entre dois acordes

2. Acordes de passagem

(Bach: Coral)
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 25

6. Omnibus2
8. Seqüência

a)

b)

(Schubert: Sonata em Lá Menor, D. 845, Op. 42 – i)

(Mozart: Sonata K. 533 – iii)

2
Palavra latina que significa “para todos”. Introduzida em música por Victor
Fell Yellin (1924), professor da New York University. Refere-se a uma
progressão cromática em movimento contrário que serve para expandir
um acorde, quase sempre com função de dominante. Este artifício foi
bastante usado pelos compositores associados ao período da prática
comum. (PISTON, Walter. Harmony, pág. 440)
4. COMBINAÇÃO DE HARMONIA E
CONTRAPONTO — PROGRESSÃO LINEAR

As duas principais dimensões da música tonal, a melodia


e a harmonia são entidades firmemente ligadas uma à outra. A
forma integrada destas dimensões chama-se Estrutura
Fundamental. Estas mesmas dimensões podem ser vistas e
Ex. 4.2 Unidades lineares ou melódicas,
analisadas conjuntamente ou de forma independente. prolongando unidades harmônicas.
Consideradas unicamente do ponto de vista horizontal, dão
origem a um parâmetro que chamamos Progressão Linear. No exemplo acima, temos a representação das duas
Progressão Linear é o desdobramento da dimensão vertical em dimensões musicais. A voz superior é referida como progressão
uma dimensão horizontal. — neste caso uma progressão de 3a (3-prg), por abranger este
intervalo. As progressões mais comuns são de 3a, 5a e 8a,
intervalos que compõem o acorde perfeito. Mais raras são as
progressões de 4a e de 6a.1

Ex. 4.1 Ex. 4.3

No Ex. 4.1a vemos um intervalo harmônico de terça Comum em todos os exemplos acima é a nota de
sendo desdobrado em um intervalo melódico. Usando a técnica passagem intermediando a distância entre as notas que com-
de diminuição apresentada no capítulo anterior, podemos põem o acorde. A diferença está apenas no número maior ou
intermediar este intervalo com uma nota de passagem, neste menor destas notas de passagem. Outro conceito importante
caso a nota ré. No Ex. 4.1b, temos a mesma situação anterior, que se observa aqui é o da dissonância usada para prolongar
porém com um acorde de três notas. Aplicando-se novamente a uma função, de acordo com os princípios do contraponto por
técnica da diminuição encontramos duas notas de passagem. espécie.
Este intervalo de 3a, intermediado por uma nota de passagem,
pode receber o suporte da segunda dimensão musical, que é a
dimensão vertical ou harmônica, como embasamento tonal.

1
Estes são intervalos que compõem o acorde perfeito na sua segunda
inversão.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 27

4.1 Baixo Fundamental escala representado na LF é indicado por um acento circunflexo


acima do número que o indica.
Baixo Fundamental (BF) é a linha no registro grave que
dá suporte à melodia ou Linha Fundamental (LF). Para classifi-
cação dos acordes usam-se, por convenção, as mesmas cifras
da análise harmônica (números romanos). A base do BF é
composta pelos graus principais da escala I-V-I, e as harmonias
intermediárias que surgem no decorrer de uma música são
consideradas harmonias subsidiárias da tônica ou da dominante,
respectivamente.
Ex. 4.6

A LF é formada sempre por intervalo descendente por


grau conjunto e é referida como progressão de acordo com o
intervalo que abrange. Assim, uma progressão de terça abrange
o intervalo de terça. O fato da LF ser sempre descendente em
direção ao 1o grau da escala tem um significado filosófico.
Segundo Schenker, este 1o grau representa a “nota fundamen-
Ex. 4.4 tal” ou o “som fundamental”, aquele que origina todos os de-
mais intervalos da série harmônica.
Um conceito importante para esta teoria é o de que o
arpejo do baixo também expressa a dimensão horizontal do 4.3 Estrutura Fundamental
acorde de tônica. Mas, diferentemente da Linha Fundamental,
que é organizada por grau conjunto, o Baixo Fundamental des- Estrutura Fundamental (EF) combina a LF com o BF. É a
dobra o acorde por grau disjunto (intermediado pela 3a): representação primária de como os princípios da organização
melódica e harmônica operam por baixo da superfície de uma
música. É muito importante para esta teoria a compreensão de
que a estrutura fundamental funciona em vários níveis que se
inter-relacionam melodicamente e/ou harmonicamente. Para
entender melhor este conceito, pode-se usar a imagem de uma
estrutura dentro da outra, um universo reproduzido dentro de
Ex. 4.5 outro.

4.2 Linha Fundamental

Linha Fundamental (LF) é uma representação abstrata


da linha melódica, atingida por sucessivas depurações das
camadas ou estruturas de uma melodia, cujo componente bási-
co é constituído de repetição e ornamentação. A LF conecta as Ex. 4.7
notas estruturais de uma ou mais harmonias. Cada grau da
28 Combinação de harmonia e contraponto — Progressão Linear

4.4 Harmonizando a Dissonância No exemplo acima, a nota ré continua sendo uma nota de
passagem entre dois acordes estáveis de tônica. Não obstante,
Observe o seguinte exemplo: ela pode receber um suporte consonante sem que isto altere
seu status de nota de passagem.
Dentro de uma obra musical isto pode ocorrer em
diferentes locais e a agregação destes núcleos forma um ciclo
contínuo (uma espiral ascendente) limitado somente pela imagi-
nação do compositor. Estabelecem-se, então, vários níveis.
Estes níveis (bem como os eventos agregados a qualquer parte
da estrutura musical) podem ser harmonizados e estas harmo-
Ex. 4.8 nias, por sua vez, podem ser prolongadas em um círculo
recursivo cuja conseqüência é a criação de níveis hierárquicos
Aqui temos uma progressão de terça com suporte dentro da música.
harmônico na primeira e terceira notas. O que é significante
aqui é a dinâmica do movimento melódico que, neste caso, Vejamos mais um exemplo:
traduz-se em uma meta a ser atingida (dominante e subdomi-
nante, respectivamente). Música tonal é movimento. Está sem-
pre indo ou vindo de algum lugar. Esta dinâmica pode dar-se
em vários níveis, acontecendo localmente (entre dois acordes)
ou através de uma amplitude mais global (entre duas frases ou
seções).

Segundo as regras do contraponto, a nota consonante


pode ser prolongada por uma dissonância. Para que isto possa
ocorrer, ela precisa receber um suporte consonante no baixo. Ex. 4.10

Neste caso, apesar de receberem suporte consonante, o


2o e 4o grau da escala são ainda, na dimensão linear, dissonâ-
ncias de passagem. O suporte harmônico, no exemplo acima, só
reforça a sensação de movimento em direção à tônica.2

Ex. 4.9

2
Daí o termo “progressão harmônica”, ou em outras palavras, avanço
contínuo em direção a uma meta.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 29

4.5 Representação Gráfica da Estrutura


Fundamental

A EF é representada por gráficos, que são conseqüência


da redução gradual da música a partir da sua superfície. Grosso
modo, estes gráficos podem ser divididos em três níveis ou
planos:

a) Plano Frontal
b) Plano Médio
c) Plano de Fundo

O nível frontal é o que mais se aproxima da superfície da


música. Em relação a esta, ele simplifica algumas idéias rítmicas
e omite eventos redundantes, tais como notas repetidas e notas
dobradas. No nível médio são condensados apenas aspectos
mais gerais da harmonia e do contraponto. É neste nível que os
mais importantes eventos estruturais progressivamente apare-
cem. Pode haver neste estágio quantos gráficos forem necessá-
rios, dependendo da complexidade da obra. O último estágio, ou
plano de fundo, representa a estrutura mais elementar da obra,
ou a estrutura fundamental. Nele estão resumidos todos os
elementos melódicos e harmônicos da composição, represen-
tados pela Linha Fundamental e pelo Baixo Fundamental. É
importante sempre ter em mente que o plano de fundo é uma
abstração que não tem sentido algum sem a presença dos de-
mais gráficos. O exemplo abaixo mostra um trecho musical
seguido pelos seus três níveis de redução:

Ex. 4.11 Bach: Coral “Jesu, meine Freude” (cc. 1-2)


30 Combinação de harmonia e contraponto — Progressão Linear

4.6 Modelos de Estruturas Fundamentais

Os modelos que seguem abaixo são exemplos de algumas


estruturas fundamentais mais recorrentes no repertório dos sé-
culos XVIII e XIX. Todos são exemplos de planos de fundo (duas
linhas inclinadas acima do pentagrama indicam progressão
interrompida).

Ex. 4.12
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 31

Formas

Ex. 4.13 Forma binária

Ex. 4.15 Forma sonata

Ex. 4.14 Forma ternária


5. TÉCNICAS DE PROGRESSÃO LINEAR

5.1 ASCENSÃO INICIAL (Initial Ascent; Anstieg)

Movimento ascendente por grau conjunto ou arpejo de


tríade (ou ainda uma combinação de ambos) que parte de uma
nota da tríade de tônica em direção à primeira nota da LF (nota
inicial).1 Este movimento pode se estender por uma porção
considerável da música. A Ascensão Inicial prolonga a primeira
nota e, por conseqüência óbvia, retarda a chegada da primeira
nota da LF.2

No Ex. 5.1a temos a superfície da música, ou seja, a


obra no seu acabamento final. Em b vemos que, no primeiro
compasso, a nota mi é decorada com bordadura. A ornamen-
tação (ou diminuição) prolonga a nota até o início do segundo
compasso (ligadura pontilhada). A nota fá do terceiro compasso
também é prolongada, desta vez por uma dupla apojatura. A
primeira nota da LF é o sol do segundo compasso, atingido
através de uma nota de passagem fá. Existe um deslocamento
entre a LF e o baixo, fato que ocorre com certa freqüência
literatura musical. Observamos que o acorde de tônica está
sendo prolongado neste ponto através da sua primeira inversão,
assim, a nota sol ainda está dentro deste acorde. É interessante
observar também a seqüência de 10as — outro recurso para
prolongamento de função.

Ex. 5.1 Schumann: Álbum da Juventude, Op. 68 – Humming Song

1
Head Tone (ing.), Kopfton (alem.) - ver Glossário.
2
Em muitos casos a ascensão inicial coincide com o downbeat estrutural
(ver Glossário).
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 33

5.2 DESDOBRAMENTO (Unfolding; Ausfaltung) conecta os intervalos que estão dentro do mesmo
contexto harmônico.
Resultado do desmembramento de um intervalo harmô-
nico. É uma técnica conceitual, pois horizontaliza um intervalo c) É o plano de fundo composto por uma progressão de 5a.
que, em um plano estrutural mais fundo, é simultâneo. Ocorre
sempre em melodias polifônicas. Eis alguns exemplos de
desdobramentos:

Ex. 5.2 desmembramento

O desdobramento pode ser simples quando envolve


apenas um intervalo (gráfico Ex. 5.2a, acima); ou pode ser
duplo quando envolve mais de um intervalo (gráfico b, acima).
O Desdobramento pode ocorrer em vários níveis estruturais,
porém é realizado sempre por salto (diferentemente do movi-
mento de/para uma voz interna, que é sempre por grau
conjunto).

Vejamos como funciona a técnica de desdobramento neste


exemplo extraído de uma Sonata para piano de Mozart (Ex.
5.3):

a) É a superfície ou a música propriamente dita.

b) Plano Médio: normalmente a análise passaria antes


pelo plano frontal para depois prosseguir para o plano
médio, mas neste caso, como queremos demonstrar Ex. 5.3 Mozart: Sonata para Piano K. 545 – iii
uma operação específica, saltamos a primeira etapa e
prosseguimos direto para o plano médio. O interes-
sante nesta passagem é que há um desdobramento do
intervalo de 3a superposta. No gráfico, a haste cruzada
34 Técnicas de progressão linear

5.3 MOVIMENTO DE/PARA UMA VOZ INTERNA a tornar mais clara a estrutura, mostrada aqui em b. É
(Motion to/from na Inner Voice; Untergreifen) importante lembrar que redução textural não é a mesma coisa
que plano frontal.4 Na redução eliminamos notas repetidas,
Este é um tipo de progressão linear de alcance mais notas dobradas, ornamentação, algumas ou todas vozes inter-
local (ou seja, aparece em uma pequena área ou parte da nas e realizamos a simplificação rítmica.
música) e que conecta uma nota da LF a uma voz interna em
um nível estrutural mais profundo. Na primeira parte deste tema predomina a harmonia de
tônica. Este é um tipo muito comum de construção harmônica
em música tonal, especialmente no classicismo. A segunda
parte do tema inicia com movimento melódico ascendente de
uma voz interna para a voz externa, cobrindo a extensão de
uma 8a (sol1 – sol2). Embora exista na primeira parte, um
movimento para voz interna, este não é tão claro quanto na
segunda parte. O gráfico c mostra o plano frontal e esclarece o
que ocorre: após uma rápida ascensão inicial, chegamos à nota
sol, que tem a dupla função de primeiro tom da LF (que se
prolonga até o sol do compasso 16) e a primeira nota da
Ex. 5.4
progressão de 5a (que compõe a primeira parte da peça). Como
O movimento contrário — quer dizer, da voz interna para a o primeiro tom da LF está sendo prolongado por toda a
voz externa — assume várias configurações, entre elas a extensão da passagem, esta progressão de 5a passa a ser
ascensão inicial. considerada como um movimento para uma voz interna.

O movimento de/para uma voz interna é característico O gráfico seguinte d pertence ao plano médio. Nele
das melodias polifônicas. Nesta técnica, a conexão das vozes se vemos que a ascensão inicial de uma 8a sobre I é replicada de
dá através de uma progressão por grau conjunto, enquanto que forma distendida na segunda parte com o mesmo salto de 8a,
no desdobramento a progressão é feita por salto. Estas são agora sobre V. Na primeira parte podemos observar um
técnicas comuns para expandir a melodia com conseqüente paralelismo motívico (assinalado pelas chaves) de 10as consecu-
expansão da forma.3 tivas. Seu papel é o de retardar a chegada da próxima função.

É importante sempre ter em mente que o movimento


de/para uma voz interna é uma técnica de prolongamento (em
geral de um acorde ou função) que cria um senso de retenção
mental ou suspensão momentânea do movimento.

No Ex. 5.5 de Mozart é possível observar os dois tipos de


movimentos consecutivamente. Como se trata de um exemplo
mais complexo, uma redução da textura e do ritmo pode ajudar

3
O movimento de/para uma voz interna pode dar origem a uma seção
4
independente dentro de uma grande forma. Daí o conceito de que análise schenkeriana não é exclusivamente redução.
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 35

Ex. 5.5 Mozart: Variações sobre “Lisondormait” de N. Dezéde, K. 264


36 Técnicas de progressão linear

5.4 PERMUTA (Voice Exchange)

Permuta das vozes externas entre dois acordes (às


vezes também entre uma voz interna e uma externa, Ex. 5.6).
Sua função é de prolongamento e pode ocorrer entre acordes
adjacentes ou não. Em alguns casos mais raros, uma das notas
envolvidas na permuta pode ser alterada cromaticamente.

Ex. 5.8Brahms: Achlieber Herre Jesu Christ

Os dois exemplos acima mostram o tipo mais comum de


Ex. 5.6
permuta, aquela por inversão de um acorde.

Ex. 5.7 Bach: Herzliebster Jesu, BWV 45.3

Ex. 5.9 Beethoven: Sonata para Piano Op. 2, No. 1 - ii


Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 37

Já o Ex. 5.9 mostra diversas situações de permuta no


mesmo trecho da obra. A primeira é bem visível, mesmo abran-
gendo uma extensão maior de música: trata-se da primeira
inversão do acorde de tônica e seu posterior retorno ao estado
fundamental. É interessante notar aqui, que a redução textural
b revela outra permuta não tão aparente do acorde de domi-
nante entre os compassos 2 e 3. Observe que a nota fá, do
segundo compasso, é uma apojatura; a nota real do acorde é
mi.

5.5 REGISTRO OBRIGATÓRIO


(Obligatory Register; obligateLage)

É o registro no qual se aloja a LF e que serve de


referência quando uma voz se desloca para outro registro.
Mudanças de registro podem envolver técnicas como
transferências de registro, acoplamento, suspensão, aproxima-
ção superior, nota de cobertura e substituição. Estas técnicas
serão examinadas a seguir.

Este coral de Bach é um bom exemplo de registro obrigatório


(Ex. 5.10). Para facilitar o entendimento, realizamos uma
redução textural para duas vozes. Neste procedimento, elimina-
se todo tipo de repetição e ornamentação.5 Em b, já fica claro
que temos uma linha descendente SOL-FÁ-MI, intermediada por
um tom vizinho, a nota lá.

O gráfico c representa o plano médio desta progressão de terça


e demonstra que a nota sol está sendo prolongada através do
seu tom vizinho (a nota lá) antes de prosseguir para †. Por
abrigar todos os graus da escala dentro da mesma 8a em um Ex. 5.10 Bach: Du großerScmerzensmann, BWV 300
movimento descendente graduado e contínuo, esta progressão
passa a ser referência para qualquer mudança que implique
troca de 8a ou que extrapole o âmbito deste registro, tanto para
o grave quanto para o agudo. Apenas a título de comparação,
veja o modelo abaixo, que é baseado no anterior.

5
Notas de passagem, tons vizinhos, apojaturas, e outros.
38 Técnicas de progressão linear

5.6 TRANSFERÊNCIA DE REGISTRO


(RegisterTransfer; Hoherlegung/Tieferlegung)

Transferência direta de uma nota ou mais, do registro


agudo para o grave ou vice-versa. Em um nível estrutural mais
profundo, esta técnica significa um distanciamento do registro
obrigatório. O conceito de transferência de registro está
associado ao salto de 8a. Porém, esta não é a única relação, e
outros intervalos são possíveis. Na essência da mudança de
registro estão razões de ordem estética relacionadas ao conteú-
Ex. 5.10 cont. do dramático de uma obra. Entretanto, em alguns casos, como
a condução de uma linha de baixo, a razão pode também
envolver questões técnicas.6
Se a melodia deste coral tivesse começado uma 8a acima e
depois se transferido deste para o registro médio, isto significa- Este é um dos exemplos mais típicos de transferência de
ria um afastamento do registro obrigatório. Neste caso, o coral registro, quando um motivo ou um tema completo é repetido
começaria no registro agudo, e só depois prosseguiria para seu uma 8a abaixo ou acima (Ex. 5.11). A redução textural em b nos
registro obrigatório. mostra que um mesmo intervalo (sol-ré) é repetido 8a acima
(assinalado por chaves nos compassos 11 e 12), e depois a
escala ascendente transfere a nota ré mais uma 8a acima. O
gráfico c do plano médio mostra a passagem da nota ré por três
registros, indicados pela linha reta que liga as três notas ré.

6
Tal qual ocorre em algumas linhas de baixo de certas obras de autores
barrocos, como Bach, que descem até o limite do registro grave do
instrumento, saltando obrigatoriamente para assim, dar continuidade ao
movimento descendente.
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 39

Ex. 5.11 Mozart: Sonata para Piano, K.283 - i


40 Técnicas de progressão linear

5.7 ACOPLAMENTO (Coupling; Kopellung) 5.8 SUPERPOSIÇÃO (Superposition)

Esta é uma técnica de transferência de registro onde Outra técnica que usa a transferência de registro. Neste
notas estruturais ocorrem em dois registros diferentes. O caso, a superposição acontece quando uma ou mais vozes
acoplamento está geralmente associado ao intervalo de 8a e internas aparecem acima da voz principal ou registro obrigató-
sempre envolve um certo grau de elaboração entre um registro rio.
e outro.7 Pode ocorrer em vários níveis da estrutura.
No Ex. 5.13, arpejo do acorde de tônica é uma ascensão
Qualquer transferência de registro implica em inicial que retarda a chegada do primeiro tom da LF, a nota sol.
prolongamento. Esta Sonata de Beethoven é exemplar neste O movimento continua ascendendo até atingir o dó agudo por
sentido (Ex. 5.12). Na primeira linha a, todos os acordes são salto consonante. Esta transferência de registro de uma voz
analisados individualmente. Na redução de textura e de ritmo interna para além da LF chama-se superposição.
que se segue b, observamos que os compassos 3 e 4 compreen-
dem uma única função de dominante. Vemos uma seqüência de É muito comum a superposição aparecer apenas no
dominantes individuais que conduzem ao iv, no compasso 5, plano frontal ou no plano médio como no Ex. 5.14. Neste caso,
gerando grande tensão dramática. vemos na redução textural que a mão direita do piano é uma
sucessão de 6as paralelas. Para completar o movimento, e por
A técnica de acoplamento sempre deve envolver um questões de lógica, foram acrescentadas as duas últimas notas
certo grau de paralelismo motívico, além de uma certa da progressão (ré e dó). No primeiro compasso do gráfico c, a
elaboração entre os diferentes registros. A repetição do motivo voz interna do tenor, com a nota lá, indica que houve uma
inicial nos compassos 6 e 7 nos dá a primeira idéia de que transferência desta voz para o registro agudo (ver seta no
temos um acoplamento. Neste caso, o acoplamento não é de 8a, compasso 1). Também notamos que neste acorde falta uma
como normalmente ocorre, mas de 9a, pois a passagem recebe nota para completar a harmonia de 4 sons. Ao restaurarmos a
o suporte da dominante num movimento de tensão que voz mais aguda à sua posição original (ver gráfico c), temos
resolverá na tônica no compasso 9 (primeiro tempo estrutural então uma progressão de acordes a 4 vozes completa, com
deste movimento). Observamos também que os compassos 6 e movimentos melódicos muito próximos um do outro. O gráfico
7 são uma condensação do seu referencial anterior no grave. É d, então, nos mostra que a passagem é uma simples progressão
este trabalho elaborado entre os dois registros que mais descendente de terças.
caracteriza o acoplamento.

7
Composing-out, em inglês e Auskomponierung, em alemão.
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 41

Ex. 5.12 Beethoven: Sonata para Piano, Op. 10, No.2 – i


42 Técnicas de progressão linear

Ex. 5.13 Haydn: Sonata para Piano Hob. XVI/35 – i

Ex. 5.14 Mozart: Concerto para Piano, K. 488 - ii


Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 43

5.9 APROXIMAÇÃO SUPERIOR


(Reaching Over; Über-greifen)

Outra técnica que envolve transferência de registro: uma


voz interna salta uma 8a,8 cruzando, assim, a voz principal;
após o salto, resolve por grau conjunto na direção oposta. Esta
técnica é quase sempre associada à seqüência.

Ex. 5.15

O Ex. 5.16 começa dentro de seu registro obrigatório,


mas logo salta uma 8a acima, retornando paulatinamente ao seu
registro original através de uma escala diatônica descendente
(indicada acima do pentagrama no 1o e 2o compassos do gráfico
b). É interessante notar a interpolação da nota dó aguda no
compasso 2. Trata-se de uma voz interna fora de seu registro
obrigatório, e que aqui foi tratada como um salto consonante
dentro do acorde de ii6 (haste cruzada no compasso 2 do gráfico
c). Este salto caracteriza um tipo de dramatização vocal comum
nos séculos XVIII e XIX, principalmente em ópera.

Ex. 5.16 Mendelssohn: Canção sem Palavras, Op. 30, No. 3

8
Outros intervalos também são possíveis.
44 Técnicas de progressão linear

5.10 NOTA DE COBERTURA (Cover tone; Deckton) aparecer no barroco graças a um estilo praticado pelos
alaudistas, principalmente os franceses, chamado de style brisé.
Uma nota proeminente que, apesar de sua aparente Trata-se de arpejos irregulares de acordes, de caráter
independência, mantém estreita relação com vários aspectos da improvisado, que criam uma malha complexa de harmonias que
condução das vozes. Por conta disso, não deve ser confundida se sobrepõem umas às outras. Este estilo foi então adotado
com pedal, embora acumule esta função em algumas circuns- pelos compositores de teclado, particularmente Couperin, e
tâncias. A característica da nota de cobertura é a de uma voz passou a ser difundido por todo o período.
interna que transpassa a voz principal.
Em a temos a superfície musical analisada harmônica-
No Ex. 5.17, a representa a superfície musical analisada mente do ponto de vista da tonalidade inicial. Já na redução b,
harmonicamente. Já na redução textural b, percebemos que a a análise harmônica leva em consideração a área tonal local,
mão direita é constituída de duas vozes: uma formada por uma pois estamos considerando o trecho isoladamente, fora de seu
escala cromática descendente9, e outra formada por duas notas contexto harmônico global.
longas no registro agudo. Estas últimas são as notas de cober-
tura. No gráfico c do plano médio vemos que a primeira nota
da LF, a nota fá, é atingida após uma rápida ascensão inicial.
O gráfico do plano médio é apresentado em c. A haste Esta primeira nota acumula a função de primeira nota da
cruzada agrupa as notas que compõem os acordes de SIb e RÉ, progressão de 5a, que é um evento mais local. A 5-prg aparece
respectivamente. Estes são os acordes prolongados em cada aqui com notas pretas e hastes para cima. A resolução natural
uma das metades desta frase. desta progressão seria o primeiro grau da escala de Si Maior;
porém, em seu lugar na superfície, aparece a nota fá#. Para
5.11 SUBSTITUIÇÃO (Substitution) restaurar a lógica do movimento, a nota si é restituída entre
parênteses. Outra inclusão aparece na mão esquerda no
Ocorre quando o contexto melódico ou harmônico exige compasso 13: a nota de resolução do baixo não aparece, pois a
uma certa nota e esta é “substituída” por razões puramente resolução (dó#) está embutida dentro do acorde da mão direita.
composicionais. Na análise, a nota implícita pode ser agregada Para que a lógica do baixo seja mantida, esta nota foi
dentro de parênteses para destacar sua situação (Ex. 5.18). Não restaurada. O parêntese indica a nota que foi acrescentada.
se deve confundir com cadência evitada, onde isto pode
também ocorrer.

Na teoria musical alemã, o 2º grau da escala é também


chamado de “sensível descendente”.10

É muito comum as melodias barrocas possuírem uma


textura polifônica. Este Menuet de Bach (Ex. 5.19) é um ótimo
exemplo desta técnica. Melodias polifônicas começaram a

9
A escala no compasso 3 foi acomodada uma 8ª abaixo, dando assim
continuidade natural à escala.
10
Descending leading tone, em inglês.
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 45

Ex. 5.17 Brahms: Variações e Fuga sobre um Tema de Handel, Op. 24


46 Técnicas de progressão linear

Ex. 5.18 segundo grau

Ex. 5.19 Bach: Suíte Francesa 6, BWV 817 - Menuet


Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 47

5.12 INTERRUPÇÃO (Interruption; Unterbrechung)

A interrupção talvez seja uma das técnicas mais comuns


de prolongamento musical. Esta técnica está associada a
estruturas tonais binárias e pode estar contida em uma frase ou
seção. É muito comum em construções de frases que envolvem
a relação “antecedente/conseqüente”. Nestes casos, o período
conseqüente fecha o movimento descendente deixado aberto
pelo antecedente. Em outras palavras, a tensão gerada pela
primeira parte incompleta é resolvida no final da segunda parte,
formando uma frase, período ou seção inteira. A sua principal
característica é a suspensão do movimento descendente da LF
no † sobre V. A tensão gerada por esta suspensão é resolvida
com a retomada da LF no seu início, para resolver ao final em …
sobre I. Nos gráficos ao lado (Ex. 5.20), vemos dois entre os
mais comuns padrões básicos de interrupção, assinalados por
duas linhas inclinadas sobre a LF.

No Ex. 5.21a temos a superfície musical com sua


respectiva análise harmônica. Nesta fase já é possível detectar
uma linha descendente com um firme suporte harmônico para
compor a LF. Estas notas estão ligadas entre si pelo colchete
Ex. 5.20 Interrupção da Linha fundamental
superior. Em b temos o primeiro gráfico do plano frontal.
Como nosso objetivo é apenas demonstrar a interrupção, o
gráfico aparece sem os costumeiros detalhes esperados para
esta fase. O gráfico do plano de fundo c mostra com clareza a
progressão de 5a com interrupção. Os colchetes na primeira e
na segunda parte indicam paralelismo motívico, comum neste
tipo de frase. O conceito da interrupção é que a tensão gerada
por † sobre V é resolvida no final, quando … aparece sobre I.
48 Técnicas de progressão linear

Ex. 5.21 Bach: Livro de Anna Magdalena – Menuet


Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 49

Ex. 5.22 Haydn: Quarteto Op. 3, No. 3 – ii


50 Técnicas de progressão linear

O Ex. 5.22 (página anterior), extraído de um Quarteto de (Ex. 5.24). Na transição para a seção D, Haydn usa exatamente
Haydn, mostra o mesmo tipo de progressão de 5a com as mesmas notas, com ligeira diferença rítmica. Quando analisa-
interrupção. Esta é uma típica frase interrompida, com articu- mos o Rondó em um plano estrutural mais profundo, esta
lação bem clara entre as partes constituídas da frase. A linha diferença desaparece e percebemos que as duas partes são
superior a mostra a música propriamente dita com a indicação idênticas (Ex. 5.25).
de sua harmonia. Abaixo, no gráfico b, temos a sua redução
textural. É importante buscar aqui uma linha descen-dente com 5.14 PARALELISMO (Paralellism)
suporte no baixo para formar a LF. Como sugestão, pode-se
buscar esta linha examinando as notas de cada frase de trás Representação ou reprodução local (ou em área local) da
para frente. Examinemos, então, as frases separadamente. A estrutura da peça inteira. É preciso considerar a diferença entre
primeira termina no compasso 4 com a nota lá. Partindo daí, paralelismo e paralelismo motívico. O primeiro diz respeito ao
vemos que a melhor escolha recai nas notas lá – si – dó – ré plano médio e plano de fundo, enquanto que o segundo perten-
(ver gráfico c e a indicação da seta). Se aplicarmos o mesmo ce à superfície e ao plano frontal. Pode-se observar no gráfico
procedimento para a segunda frase, teremos o resultado que é abaixo a forma conceitual de como esta relação opera.
mostrado no gráfico c.
Este exemplo de um lied de Schubert (Ex. 5.26) já se
5.13 LIGAÇÃO (Linkage; Knüpftechnik) apresenta em sua forma reduzida de textura e sem a letra. O
trecho é composto de duas frases fechadas harmonicamente.
Técnica de associação motívica onde uma nova frase
repete a idéia motívica da frase anterior, tanto para dar conti- A [cc.4-11] B [cc. 12-20]
nuidade a esta como iniciar algo novo. I ________________ I, I __________________ I

O gráfico a, do exemplo seguinte, mostra a Melodia de


Schumann (Ex. 5.23). Na redução textural b já é possível Esta análise desconsidera a introdução e o sufixo
observar a relação motívica entre o final da seção A e início da apresentados pelo piano. No gráfico do plano médio b vemos
seção B (cc. 4 e 5). Pela posição que ocupa, este tipo de que ‡ é atingido pelo arpejo do acorde de tônica (fá –sib – ré
paralelismo motívico é chamado de ligação. No gráfico do plano com haste para baixo). Esta é a primeira nota da LF, mas
frontal c, porém, é possível notar que este movimento paralelo também compõe a 3-prg grafada com a haste intermediária
das vozes é um elemento dominante na obra, o que lhe acentua para cima. Os compassos 8 – 11, sendo uma repetição literal
o senso de unidade. O colchete indica os pontos onde ocorre dos quatro compassos anteriores, são omitidos no gráfico,
paralelismo motívico com intervalos de 6a e 10a. bastando apenas a referência da repetição entre chaves [8 –
11]. O ‡ é prolongado até o início da frase B (c.13), para então
O último gráfico d, que representa o plano de fundo, nos
mostra o arpejo de Dó Maior nos compassos 1 e 2 (mi – dó – sol iniciar sua descida até … no compasso 18. Porém, antes de
com haste para baixo). A transferência de registro da nota sol atingir …, notamos outra 3-prg que ocorre imediatamente antes
prolonga a função de tônica até a chegada da dominante no da cadência final. O gráfico do plano de fundo c organiza e
compasso 4. esclarece a estrutura. Podemos observar então que as duas 3-
prg (marcadas no gráfico a. e b.) refletem, em um âmbito local,
Este segundo exemplo de ligação é mais interessante a LF (marcada c.).
ainda. Trata-se do Rondó da Sonata para Piano no. 47 de Haydn
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 51

Ex. 5.23 Schumann: Álbum da Juventude, Op.68 - Melodia


52 Técnicas de progressão linear

Ex. 5.24 Haydn: Sonata para Piano, Hob. XVI, No. 47 - iii

Ex. 5.25
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 53

Ex. 5.26 Schubert: Die schöne Müllerin, Op.25 - Das Wandern


54 Técnicas de progressão linear

Ex. 5.26 cont.


6. MODELOS DE ANÁLISE

Neste capítulo vamos mostrar de forma metódica alguns - Reformulações quanto à escolha preliminar da LF são comuns.
procedimentos de análise necessários à elaboração de gráficos Os gráficos são orgânicos e estão sempre evoluindo;
de relativa complexidade. Embora o escopo deste trabalho não
permita análise de obras inteiras, os procedimentos analíticos - Tentar agregar toda e qualquer informação paralela que possa
demonstrados em pequenas passagens podem ser aplicados, apoiar as decisões: peculiaridades do período, clichês do
em sua grande maioria, em obras inteiras. estilo, idiossincrasias do autor, aspectos de instrumentação,
e outros;
Não existe uma única maneira de tratar uma análise e a
qualidade do resultado final depende da base teórica e, é claro, - Lembrar que sucesso na análise depende de experiência;
da experiência do analista. A primeira abordagem precisa ser experiência depende de persistência. Apenas com o tempo
clara e objetiva. É necessário ter metas bem estabelecidas sobre consegue-se gerar gráficos convincentes;
o que se pretende do objeto a ser analisado. Em outras pala-
vras, o tipo de abordagem tem a ver com o que se pretende - Simplificar a textura harmônica e o ritmo ajuda na compreen-
enfatizar na obra em questão. Algumas generalizações podem são geral da obra;
ser observadas:
- Tentar manter os sucessivos gráficos ou níveis estruturais
- Enumerar os compassos, identificar e classificar todas as notas alinhados, um abaixo do outro. Isto ajuda na leitura.
estranhas, como apojaturas, notas de passagem, notas
vizinhas, e outros; Já foi dito antes que um gráfico schenkeriano não é redução.
No máximo pode-se dizer que é um tipo de redução muito
- Fazer um apanhado geral da forma e da harmonia; sofisticada. Estes gráficos vão além disto. Seu objetivo principal
é o de desvendar os elementos orgânicos constituintes, esclare-
- Havendo letra, tentar entender seu significado e buscar rela- cendo a sintaxe sobre a qual a obra foi montada. Um gráfico
ções mais explícitas entre o texto e a música, tais como schenkeriano permite uma visão multidimensional da música –
imagens musicais; esquerda/direita ou superfície/fundo. Com freqüência, um
gráfico sobrepõe algumas destas dimensões simultaneamente.
- Observar se é possível estabelecer de forma genérica uma LF
cuja progressão seja de 3a ou de 5a (com ou sem interru- Não obstante, a redução propriamente dita é uma ótima
pção);1 ferramenta de apoio para a análise. Pode-se entender redução
de duas formas: primeiro, aquela em que se eliminam as notas
- Em caso de dificuldade para encontrar uma possível LF, tentar ornamentais e notas repetidas, os acordes são simplificados ou
o caminho inverso, ou seja, buscar esta linha de trás para a condução harmônica se resume a um baixo cifrado,
frente; mantendo-se apenas duas vozes (soprano e baixo); o ritmo
também pode ser simplificado. Pode-se referir a esta modali-
1 dade reducionista como “simplificação”. Outra forma de redução
Em geral, isto já pode ser observado durante as considerações
é aquela cujo o observador se distancia do objeto, da mesma
preliminares de forma.
56 Modelos de Análise

forma que uma lente zoom se distancia de uma imagem para O sucesso de um gráfico vai depender grandemente da
que se possa incluir o máximo desta imagem em um único qualidade da preparação envolvida. Uma boa preparação para a
campo de visão. Em geral, esta modalidade envolve uma realização de um gráfico pode considerar os seguintes pontos:
redução rítmica a uma razão pré-estabelecida. É uma técnica
muito útil para se entender o funcionamento de trechos longos e 1) Preparação da superfície: observação de aspectos
complexos e de textura muito densa como, por exemplo, a gerais como forma, harmonia, construção de frase,
seção de desenvolvimento de uma grande sinfonia. Um motivos, temas, e outros. Em muitos casos, uma redu-
excelente exemplo do emprego desta técnica pode ser ção ou simplificação ajuda a tornar a obra mais
observado no seguinte trecho extraído da 9a Sinfonia de manejável. Cuidados devem ser tomados ao se eliminar
Beethoven (Ex. 6.1). Primeiro, reduz-se a orquestra para duas as vozes internas quando for o caso, pois estas, às
vozes. Em seguida, o ritmo é reduzido à razão de .= . . Desta vezes, são importantes para o entendimento do todo.
forma, chegamos à conclusão que o trecho em questão é
formado por um simples cânone. 2) Nível Frontal: procurar estabelecer os principais
movimentos harmônicos, determinando as metas locais
A análise schenkeriana examina a inter-relação entre e as metas globais. Neste ponto já podemos tentar en-
melodia, contraponto e harmonia dentro de uma estrutura tonal. contrar em caráter provisório, uma linha fundamental de
Estrutura não é forma. Entende-se por estrutura a construção e 3a ou de 5a (com ou sem interrupção) que abranja a
a característica de cada um dos aspectos citados acima, obra toda.
tomados individualmente ou em conjunto. Uma estrutura pode
envolver uns poucos compassos, uma frase, uma seção ou 3) Análise das camadas - elaboração do(s) gráfico(s):
mesmo a obra toda. Forma, por outro lado, pode ser definida não existe uma regra sistemática para se iniciar a
como a articulação ou subdivisão de uma obra em seções que confecção de um gráfico. Pode-se começar pela melodia
têm entre si uma relação de repetição, contraste ou variedade. ou pelo baixo. Pode-se optar pelo estabelecimento de
Em outras palavras, forma é o design da composição.2 uma LF geral, concentrando-se depois nos detalhes. Ou,
pelo contrário, pode-se trabalhar conjuntamente os
Embora a análise schenkeriana não trate diretamente de detalhes de melodia e de baixo paulatinamente à medida
aspectos como dinâmica e ritmo, estes são elementos de apoio que o trabalho avança. Para se chegar a um resultado
preponderantes e sempre devem ser considerados no momento satisfatório nesta fase pode ser necessário vários
de uma decisão. Um aspecto importante a ser lembrado é o de gráficos. É comum a divergência entre gráficos de uma
que as técnicas de análise schenkeriana estão longe de serem mesma obra por diferentes autores, pois não é apenas o
padronizadas. Nota-se ao longo dos anos uma acentuada que se vê, mas também como se vê.
divergência principalmente entre teóricos europeus e america-
nos. Na base desta discussão está o fato de que gráfico é 4) Plano de fundo: explica o funcionamento da grande
orgânico e depende muito da percepção auditiva em relação ao estrutura quanto ao seu movimento linear. É interes-
que se pretende mostrar com a análise. sante que cada gráfico seja acompanhado de
observações que expliquem por escrito os principais
pontos da análise, embora Schenker tenha sempre
2
defendido a idéia de que um gráfico devesse ser auto-
Uma analogia simples: em arquitetura, a estrutura é composta pelos explicativo e isento de notas.
pilares da obra. Estes pilares podem dar origem a qualquer forma -
quadrangular, retangular, esférica, entre outros.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 57

Ex. 6.1 Beethoven, 9a Sinfonia, ii

3
Obs.: O número entre os pentagramas representam o hipermetro.

3
Para definição de hipermetro, ver Definições, p. 88.
58 Modelos de Análise

CASO 1 Primeiro Movimento da 6ª Sinfonia,


de Beethoven

Este primeiro exemplo demonstra como uma redução ou razão de redução aqui é de = , o que significa dizer que cada
simplificação pode ajudar a desvendar o conteúdo de uma compasso de 2/4 foi reduzido para o equivalente ao tempo de
passagem. O trecho em questão é a seção de desenvolvimento uma semicolcheia. É isto o que o gráfico no Ex. 6.3a reproduz.
do primeiro movimento da Sinfonia Pastoral de Beethoven. A Por razões de conveniência, os acordes foram simplificados e
técnica de fragmentação temática de Beethoven nos auxilia a ordenados como um coral a quatro vozes.
determinar como esta seção é articulada. Beethoven construiu
este desenvolvimento sob dois motivos extraídos do primeiro Não obstante, procurou-se manter a condução do baixo o
tema da sinfonia (Ex. 6.2): mais próximo possível do original. Estes acordes estão ligados
por colchete em grupos principalmente de 4 semicolcheias, de
acordo com a articulação original de cada 4 compassos (motivo
+ orquestração).

O segundo aspecto que o gráfico tenta representar é o


decrescendo orquestral que Beethoven cria na passagem; uma
representação visual da intenção deste trecho é demonstrada
pela rarefação das notas dentro do acorde.

Após ordenar os acordes individualmente (gráfico b) e


restabelecer a sua posição fundamental, é possível aferir ime-
diatamente um movimento linear de larga escala que envolve os
Ex. 6.2 graus IV-V-I, representados por mínimas no gráfico por
significarem um plano estrutural mais importante - os pilares da
Estes motivos são articulados a cada 4 compassos.4 Esta estrutura. Os dois acordes que antecedem o IV são acordes de
idéia é apoiada pela orquestração (revezamento de madeiras e sétima que, por sua instabilidade (um dominante do outro), têm
cordas). um caráter transitório de introdução ao desenvolvimento. A
estabilidade é atingida no primeiro acorde fundamental, neste
Um gráfico, por mais elementar que seja, deve refletir ou caso SIb. No plano hipermétrico isto se chama primeiro tempo
representar de forma simples e direta o que se pretende de- estrutural, ou seja, o primeiro tempo forte da estrutura como
monstrar no momento. Neste caso, nos concentraremos na um todo.5 A partir daí, Beethoven inicia uma expansão
estrutura harmônica. Dois aspectos sobre o gráfico da página 72 harmônica por intermédio de dominantes individuais. A primeira
precisam ser esclarecidos antes que prossigamos: o primeiro é a movimentação é em direção ao acorde de SOL (dominante da
razão da redução. É importante reduzir de tal forma que dominante – ver gráfico b) que, por sua vez, é intermediado por
possamos ver toda a passagem em um único campo visual. A sua dominante (acorde de RÉ).

4
Grupos de compassos são chamados de hiper-compasso, cuja organização
5
é análoga ao compasso. Ver Glossário.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 59

O gráfico b mostra que o acorde de SOL está sendo


prolongado ou expandido (note a ligadura pontilhada) por uma
seqüência de dominantes individuais [MI-LÁ-RÉ] até chegar
novamente ao acorde de SOL (c. 261). A relação do acorde de
SOL com a tonalidade central é de dominante da dominante.

O gráfico c hierarquiza de forma proporcional a avaliação


acima. Os acordes mais importantes são grafados com mínimas
– IV-V-I, cc. 151, 263 e 289, respectivamente. As duas
primeiras notas no gráfico (dó e fá) são hierarquicamente
menos importantes, pois representam apenas uma transição;
por isso são representadas por notas sem haste. O prolonga-
mento da dominante da dominante (SOL) é grafado com
colcheias que representam as harmonias transitórias que
apenas prolongam a passagem. A ligadura pontilhada indica o
acorde que está sendo prolongado. Os demais acordes são
subsidiários, ou seja, estão vinculados por alguma função a
outros estruturalmente mais importantes, tais como os acordes
pivôs ou dominantes individuais.

Por fim, no gráfico d é possível observar que a estrutura


harmônica da passagem é formada por uma grande seqüência
primordialmente de 5as. Outra maneira de ver a passagem seria:
G (E-A-D) G – C – F.
60 Modelos de Análise

Ex. 6.3 Beethoven: Sinfonia Pastoral, i (Desenvolvimento)


Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 61

CASO 2 – Estudo para violão Op. 35, No. 17, de


Fernando Sor

Fernando Sor (1778 - 1839) é um típico representante do Por fim, no gráficoc, procedemos a uma simplificação
período clássico. O estudo seguinte, de textura homofônica, é rítmica e harmônica. Na melodia eliminamos todas as notas
construído de acordo com o período, aproximando-se do estilo repetidas, e uma nota no baixo acompanhada da respectiva cifra
de lied de Schubert. O nosso foco de atenção é a primeira frase, harmônica é suficiente para indicar a função tonal. A esta altura,
formada por um período paralelo interrompido. Este período é já é possível deduzir uma possível LF. Observe que a frase é
dividido em duas semi-frases que têm entre si a relação de formada por um período interrompido. Assim, só temos duas
antecedente/conseqüente. O movimento harmônico da frase é opções para este tipo de movimento linear: progressão de 3a ou
tonalmente fechado, isto é, começa e termina na tônica, de 5a. Como a melodia começa com o ‡, o mais provável é que
passando pelos principais graus da escala (ver gráfico abaixo). se trate de uma progressão 3a com interrupção (ver setas acima
do pentagrama no gráfico c).

Com este levantamento preliminar, podemos prosseguir


para a confecção do gráfico do plano frontal (gráfico d), que é
aquele que mais se aproxima da superfície da música.6 Para que
se possa ter mais clareza entre os diferentes planos, este
gráfico é construído em dois pentagramas. Nesta fase, os
diferentes elementos estruturais são hierarquizados e a polifonia
da melodia é desmembrada. Duas coisas chamam a atenção à
medida que nos aproximamos das camadas mais profundas da
estrutura: a primeira é a polarização entre as vozes internas da
Ex. 6.4 Período Paralelo Interrompido frase (marcada no gráfico d como a-b e a-c). Ao isolar-se este
detalhe, percebe-se que existe aqui uma relação antecedente/
conseqüente análoga à relação da superfície. Observa-se que a
O trabalho preliminar começa com a colocação das primeira polarização (a-b) tem um caráter suspensivo e que sua
ligaduras de frase e pela análise harmônica (ver gráfico no Ex. continuação (a-c), dentro da segunda semi-frase, tem um
6.5a abaixo). A textura homofônica, neste caso, não caráter conclusivo. Este tipo de equilíbrio interno é que torna as
compromete a redução textural e rítmica (gráfico b), isto é, obras sólidas do ponto de vista estrutural e funciona mais ou
podemos eliminar a maior parte das vozes internas sem receio menos como uma marca registrada dos grandes autores do
de comprometer o julgamento final. Os acordes, que estão período clássico.
diluídos em arpejos, podem ser agrupados em notas superpôs-
tas, formando uma apresentação simples de melodia/- O segundo ponto a notar é o desdobramento melódico7que
acompanhamento. Nesta fase pode-se estabelecer o movimento a estrutura polifônica da melodia deixa transparecer (no gráfico,
harmônico geral, estabelecendo quais são as metas locais (em ligaduras para cima e para baixo). Esta relação entre as vozes
algarismos romanos pequenos) e quais são as metas globais
(em algarismos romanos maiores). 6
Alguns autores consideram superfície e plano frontal como sendo a
mesma coisa.
7
Ver Prolongamento Melódico, pág. 29.
62 Modelos de Análise

da melodia polifônica fica mais clara no gráfico do plano de


fundo (gráfico e). Pode-se notar que a primeira nota (lá), que
foi lida como uma anacruse no gráfico anterior é aqui tratada
como segunda voz (marcada com haste para baixo).

Uma outra característica das frases clássicas, e que pode


ser observada aqui, é a diferença de movimento harmônico
entre as duas semi-frases. Isto ocorre porque ambas as metas
são diferentes. Enquanto a primeira semi-frase caminha em
direção à dominante, a segunda caminha para a tônica, necessi-
tando atingir este objetivo dentro do mesmo espaço de tempo,
ou seja, quatro compassos. Como são necessários mais acordes
dentro do mesmo número de compassos, isto acarreta o que é
conhecido como movimento de precipitação à cadência. Nesta
operação, é muito freqüente o uso de um acode pivô, quase
sempre subdominante em caráter, como o acorde ii6. Por ter um
caráter subsidiário à dominante, este acorde é grafado com
colcheia, para chamar a atenção para esta função.

Uma das maiores vantagens de um gráfico schenkeriana é


a possibilidade de sobrepor mais de um plano estrutural. Em
algumas situações isto pode dificultar a legibilidade do gráfico.
No caso específico desta melodia de Sor, é preciso distinguir o
que é segunda voz na melodia polifônica do que é movimento
para uma voz interna. O primeiro é esclarecido no gráfico e. Já
o segundo merece uma explicação extra. Observe no gráfico d
as primeiras três notas (fá#-mi-ré) grafadas com haste para
baixo. Este é um típico movimento para uma voz interna. Este
tipo de movimentação não precisa necessariamente conduzir ou
ligar-se a outra voz real. Ele pode existir como uma entidade
autônoma e operar livremente em seu próprio nível. O que
chama a atenção nestas três notas é que elas replicam
localmente a LF, o que é conhecido como paralelismo (ver Para-
lelismo, seção 5.14).
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 63

Ex. 6.5 Sor: Estudo Op. 35, No. 17


64 Modelos de Análise

CASO 3 Prelúdio em Dó Menor do Cravo Bem


Temperado, vol.1, de J. S. Bach
é o inicio de uma longa escala descendente de uma 8a, movi-
mento para uma voz interna, através de uma seqüência 6-5
O fato de este prelúdio ser formado por uma seção única
(ver no gráfico o movimento de 10as paralelas, cc. 5-11) até
(sem divisões contrastantes) não significa que não haja subdi-
atingir III6.
visões internas. Como a textura, a articulação e o ritmo deste
prelúdio são uniformes, a articulação formal interna é
Note que os próximos quatro compassos (c. 11-14)
estabelecida pela progressão harmônica e condução das vozes.
refletem a cadência inicial, agora no tom da relativa, um pouco
No Ex. 6.8, gráfico a, o ritmo e os acordes foram simplificados,
revelando-nos um ritmo harmônico bem consistente. É exata- mais enfraquecia em sua ênfase pelas inversões (Eb: I6-IV´-V´-
mente esta consistência na movimentação dos acordes que vai I). A seqüência propriamente dita acaba neste ponto (c. 11). No
gerar o desenho formal interno do prelúdio. As subdivisões da entanto, a primeira voz continua sendo o modelo estabelecido
forma aparecem abaixo do pentagrama neste mesmo gráfico.8 na seqüência, mas com um novo desenho no baixo: dó-ré-mi-
mi-ré-dó. Estes compassos formam um desenho parcialmente
Devido à relativa simplicidade na textura da superfície, semelhante à seqüência anterior, porém sem as 10as paralelas.
para este prelúdio bastam dois níveis de análise: o plano médio Tecnicamente, o que acontece aqui é uma cadeia de suspensões
e o plano de fundo. No gráfico b, do plano médio, vemos que a (ver gráfico a, cc. 13-20). A escala descendente chega a seu
tonalidade é firmemente estabelecida já nos quatro primeiros destino no compasso 18. Contudo, esta não é a meta harmônica
compassos (i-iv±–viio³–i). Este é o primeiro ponto de articulação da passagem, porque I, neste local, ainda está envolvido na
cadeia de suspensões, o que o torna muito fraco para ser
da forma (chamado de cadência, no gráfico). Segue-se então,
considerado como ponto de chegada. Na verdade, o ‡ é
uma longa progressão em direção à dominante do compasso 28,
prolongado mais um pouco — até o compasso 21, na chamada
com dois estágios intermediários: III (c. 11) e V± (c. 25). Este
área do pedal (ver gráfico a). De um modo geral, esta área
movimento para a dominante é realizado por uma seqüência 6-5
promove a desaceleração do ritmo harmônico através da
cuja meta intermediária é uma rápida modulação para III, no
compasso 11. Pode-se estranhar o porquê da nota mais aguda suspensão . Bach potencializa esta sensação de duas formas:
do primeiro acorde da seqüência ter sido escolhida como início primeiro, repete o cadencial 6/4 e, segundo, modifica o desenho
da LF, pois este não é um acorde de tônica. A resposta é que I do arpejo na superfície.
está sendo prolongado pela cadência (cc. 1-4) e este mesmo
prolongamento avança um pouco mais no acorde VI6 (c. 5). O † grave do compasso 25 (gráfico b) é transferido para o
Este acorde possui duas fortes relações com a tônica: em registro agudo no compasso 28, onde o segundo cadencial 6/4 é
primeiro lugar, trata-se da anti-relativa da tônica e entre eles resolvido. Todo este trecho até o penúltimo compasso é uma
existem duas notas comuns; em segundo lugar, o acorde de VI grande elaboração da cadência, um grande V , que Bach
na sua primeira inversão tem a nota dó no baixo, o que lhe explora até as últimas conseqüências. Primeiro, temos duas
atribui uma sonoridade bastante parecida com I. O compasso 5 imitações consecutivas, sendo a primeira tratada como cânone
(Ex. 6.6):

8
Bach usou este tipo de desenho em vários de seus prelúdios, entre eles o
Prelúdio para alaúde BWV 999 e o Prelúdio em Dó Maior do CBT 1.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 65

da resolução da tônica, uma tênue referência de que o fim está


para chegar. Esta impressão é dada pela introdução do pedal de
tônica no compasso 34, que neste ponto tem a função de acorde
subsidiário ao iv (V7 - iv). A dominante sobre o pedal de tônica
conduz à última precipitação cadencial por uma seqüência de
dominantes individuais (ver flechas c. 36). Como um arremate
da forma, a cadência final é um espelho da cadência inicial.9
Ex. 6.6
O gráfico do plano de fundo (gráfico c) mostra a
A segunda é uma imitação à 8a (Ex. 6.7):
simplicidade da estrutura harmônica: c: i – III – V – I. O III
funciona como pequena área tonal contrastante. A LF também é
bastante simples, tendo como principal característica a constan-
te transferência de registro, intercaladas por movimentos
de/para uma voz interna. Schenker deixou patente em quase
todos os seus textos que as idéias representadas em um gráfico
deveriam ser auto-explicativas, sem o apoio de um texto. É
evidente que, quando nos iniciamos em análise, isto nem
sempre é possível. Mas é nossa pretensão tentar aqui estimular
esta idéia, nos aproveitando da simplicidade e da familiaridade
Ex. 6.7
de muitos com este prelúdio. Recomenda-se um exame do
Ambas aparecem com mais clareza na redução textural do gráfico com um pouco mais de detalhamento.
gráfico a, pois na superfície o arpejo tende a esconder essas
operações. A tensão nesta passagem nunca se dissipa, porque é
construída por uma seqüência de dominantes individuais (ver
flechas no gráfico a). No compasso 34, temos uma antecipação

9
O último acorde em terça de Picardia, como era comum na época.
66 Modelos de Análise

Ex. 6.8 Bach: Prelúdio 2 em Dó Menor, CBT I


Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 67

Ex. 6.8 cont.


68 Modelos de Análise

CASO 4 Variações sobre a Arietta "Lison


dormait" de N. Dezède, K. 264 (315d),
de Mozart
que formam entre elas, um paralelismo motívico (ver colchetes
Mozart faz parte daquele grupo de compositores cuja obra
nográfico d). Não obstante, é interessante observar que estas
sabemos ser perfeita, mas nem sempre sabemos por quê. Entre
duas 3-prg estão aninhadas dentro de outra progressão em um
os vários aspectos composicionais que ele dominou com maes-
plano mais baixo na estrutura, que é uma 5-prg (notas ligadas à
tria está a forma. Mozart sempre foi um compositor prolífico e
haste). O baixo, neste trecho, tem um tratamento mais simples,
que muito cedo submeteu a técnica à sua vontade.
caracterizado pela melodia polifônica dentro da progressão I-6-
ii6-V-I, bem convencional para este repertório. No gráfico c, a
Este Tema com Variações (Ex. 6.9) já foi tratado no
polifonia é demonstrada pela direção das ligaduras.
capítulo 5, quando se discutia o movimento para uma voz inter-
na. A superfície do tema aparece no gráfico a. Sua textura
A segunda parte deste Tema com Variações inicia com o
monofônica propicia uma fácil redução textural, realizada no
movimento contrário da parte anterior, neste caso, um
gráfico b. Nesta redução aproveitamos para simplificar a harmo-
movimento para uma voz externa. O trecho todo (cc. 9-15) é
nia e o ritmo. Também estão incluídas as análises da harmonia,
formado por uma escala ascendente dentro da harmonia de
frase e forma.
dominante. No compasso 15 a nota fá# é considerada um tom
vizinho de sol, pois na verdade a LF não saiu deste registro,
Algumas generalizações podem ser feitas nesta etapa:
havendo sempre uma retenção desta nota desde o início da obra
• a seção A é fechada tonalmente;
(ver setas c. 9 do gráfico d). O que ocorre aqui é uma grande
• a segunda parte inicia com uma transição de 7
retenção do ritmo harmônico, como se houvesse uma
compassos (cc. 9-15) sob a dominante;
interrupção da contagem, um parêntese.10
• a seção B também é fechada tonalmente mas,
diferentemente da seção A, possui uma interru-
A seção B começa realmente no compasso 17. Propor-
pção.
cionalmente, parte A e parte B têm o mesmo tamanho, ambas
com 16 compassos, constituindo uma relação de equilíbrio.
Com relação à harmonia, estão grafados apenas os movi-
Porém, ambas são estruturalmente muito diferentes. A primeira
mentos principais, com alguns acordes subsidiários mais
parte é fechada tonalmente e a sua direção tonal é a tônica. Já
importantes (em letras menores acima da linha). Por fim,
a segunda está dividida em duas semifrases, sendo a meta da
podemos nos antecipar e tentar delinear uma LF provisória.
primeira a dominante (cc. 17-24), caracterizando-a como
antecedente que resolve no seu conseqüente (cc. 24-32). O
Com todas estas considerações, prosseguimos para o
movimento tonal, que neste ponto é interrompido, facilita muito
primeiro gráfico do plano frontal (gráfico c). A primeira nota da
a dedução sobre a LF. A nota sol (c. 17) é considerada como
LF é atingida após uma breve ascensão inicial que combina salto
prolongamento das seções anteriores. Este, por sua vez,
com grau conjunto, delineando o acorde de tônica. Esta nota é
também é prolongado de duas maneiras: primeiro pela 8-prg,
então prolongada através de uma 3-prg em direção a uma voz
que retém a nota original por transferência implícita de registro
interna (10as paralelas). No compasso 4, inicia-se outra 3-prg,
agora com os graus ˆ e ‡ distendidos por salto consonante.
Chegamos à conclusão de que temos duas seqüências de 10as
10
Tecnicamente, o que ocorre aqui é uma suspensão da contagem do
hipermetro.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 69

(ver seta c. 22). Segue-se então, um movimento descendente


até †, quando ocorre a interrupção. Aninhada dentro da 8-prg,
observa-se outra 3-prg (cc. 17-21) e mais outra nos compassos
25-29, ambas iguais, em altura e tipo de prolongamento, às da
primeira parte (ver colchetes cc. 17-21 e cc. 25-29 respecti-
vamente). Este tipo de paralelismo, presente em ambas as
partes, é mais facilmente observável no plano frontal e atribui à
obra um incrível senso de unidade.

Após a interrupção, a LF é retomada. Existem duas dife-


renças aqui em relação à primeira frase: em primeiro lugar,
Mozart deixa a textura um pouco mais densa ao dobrar a
melodia com terças superpostas; em segundo lugar, a meta
aqui é a tônica e não a dominante, como na frase anterior.
Assim, além da aceleração rítmica na cadência11, Mozart
modifica alguns acordes, como o acorde de tônica do compasso
22, substituído pelo acorde de VI no compasso 29. A voz do
baixo aparenta a mesma simplicidade da seção A. Tanto quanto
aquela, esta também é uma melodia polifônica. É interessante
notar que no registro do tenor do segundo pentagrama (clave
de fá), a nota dó é expandida pelos seus dois tons vizinhos. Isto
não ocorre na frase seguinte porque Mozart, ao incrementar
levemente a textura, vê-se quase que obrigado a simplificar a
harmonia para não obscurecer a passagem.

A partir do momento que buscamos mais um nível na


estrutura em direção ao plano de fundo (gráfico e, exemplo
6.10 na página 74), torna-se possível abarcar toda a estrutura
em um único plano visual. A seção A é composta pelo
prolongamento de ‰, através de uma 5-prg para uma voz
interna. No compasso 9, o movimento harmônico é suspenso,
como um parêntese. Por fim, na seção B temos uma 5-prg com
interrupção.

11
Tecnicamente, precipitação à cadência.
70 Modelos de Análise

Ex. 6.9 Mozart: Variações K. 264


Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 71

Ex. 6.9 cont.


72 Modelos de Análise

Ex. 6.10 Mozart: Variações K. 264 – Plano de Fundo


SÍMBOLOS

Permuta = troca de notas nas vozes


extremas.

Nota preta sem haste = nível estrutural


secundário; nota que forma parte do contexto
musical imediato, mas não do contexto global. Ligadura contínua = movimento de
uma nota à outra; relaciona tons em
Nota preta com haste = nível mais impor- uma progressão linear; dentro de uma
tante na estrutura que a anterior; o unidade linear indica apojaturas, tons
comprimento da haste distingue vários níveis vizinhos, e outros.
estruturais.
Ligadura pontilhada = significa o
prolongamento de uma nota.
Nota branca com haste = maior nível estru-
tural.
I, V, vi Números romanos = função ou uni-
dade harmônica.
Colcheia = associada à função seguinte; em
geral, denota a subdominante na área pré-
tonal.
Números com acento circunflexo
= graus da escala.
Parênteses = indica substituição.

Colchete = paralelismo motívico.


Haste = agrupa tons relacionados entre si, em
conexões de larga escala. Cada haste indica um
nível estrutural diferente.

Haste cruzada = agrupa notas do


mesmo contexto harmônico.
Haste quebrada = conexão de larga escala.

Linha diagonal ligando duas notas =


Haste interrompida = prolongamento de uma indica a relação entre duas notas.
nota em larga escala. Esta relação por ser de duas ordens:
1) deslocamento, ou seja, quando
uma nota da melodia não está
Interrupção = movimento harmônico suspen- alinhada com baixo; 2) cruzamento de
//ou|| so em Í sobre V, retomado do início e finali- vozes ou mudança de 8ª.
zado em Ì sobre I.
74 Símbolos, definições e glossário

DEFINIÇÕES

Muitos termos usados neste livro têm sofrido, ao longo do Simples:


tempo, revisões quanto à sua nomenclatura pelas mais variadas
razões as quais não cabe aqui discutir. Os pontos mais
polêmicos se referem às definições de período/frase e notas
estranhas ao acorde. Assim sendo, é oportuno este adendo com
as principais definições adotadas aqui.

Aceleração harmônica Dupla:


Um aumento na razão de troca de acordes que, em geral,
ocorre no final da segunda frase de um período musical — ou
seja, na área pré-cadencial.

Antecipação (An)
Nota que antecipa o acorde seguinte, normalmente na
cadência. Aparece sempre em posição métrica fraca.

Área pré-cadencial
Região da estrutura tonal que prepara a chegada da
cadência e que quase sempre está associado à função de
subdominante. Em muitos casos este papel é realizado pelo
acorde de ii6 posicionado antes da dominante. Em outros,
esta área pode ser elaborada e estendida por vários
Apojatura (Ap) compassos antes de atingir a dominante.
Nota estranha ao acorde atingida por salto e deixada por
grau conjunto descendente. Acontece sempre em posição Cadência Autêntica Imperfeita (CAI)
métrica forte. Pode ser vista como uma suspensão sem prepara- O mesmo que em CAP, mas com 3º ou 5º grau da
ção. escala no soprano.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 75

Pode ter também ambos os acordes cadenciais invertidos. Cadência de Engano (CE)
Ocorre quando a dominante resolve no vi grau.

Outra situação é a substituição do V por outro acorde com


função de dominante, como viio.
Cadência Frígia (CaF)
Nome especial dado à progressão iv6-V em menor.

Cadência Autêntica Perfeita (CAP)


Progressão V-I com ambos os acordes em posição
fundamental. No acorde final de tônica, o primeiro grau da Cadência Plagal (CPl)
escala deve aparecer no soprano (… sobre I). Progressão cadencial composta de IV-I.
76 Símbolos, definições e glossário

Escapada (E) Hipermetro (ing.:Hypermeter)


Ao contrário da apojatura, a escapada é atingida por grau Organização métrica musical cuja unidade é o compasso,
conjunto e deixada por salto. visto de um plano estrutural mais alto. Um conjunto ou grupo
de hipercompassos constitui o hipermetro. A organização hiper-
métrica é hierárquica por natureza, incluindo a recorrência de
grupos de compassos de igual tamanho, além de modelos
definidos que alternam compassos fortes e compassos fracos.
Exemplo: uma fase de 8 compassos pode ser dividida em 4
hipercompassos, cada um de 2 compassos (relação de 4 X 2) ou
em um plano mais alto, 2 hipercompassos, cada qual formado
por 4 compassos (relação 2 X 4).

Forma
Estrutura, design ou princípio organizacional da música.
Diz respeito ao arranjo de elementos dentro de uma obra
musical a fim de torná-la coerente para o ouvinte. O termo
forma é intrinsecamente associado ao plano estrutural de um
movimento que, ao se constituírem em esquemas, dão origem a
diferentes formas, como a binária, ternária, sonata, rondó e te-
ma com variações. Outras podem ter estruturas mais livres Meia Cadência (MC)
como alguns prelúdios e tocatas. Quando a frase termina em V, dando assim uma sensação
de suspensão.
Fragmentação
Menor redução possível de um motivo. O fragmento não
contém necessariamente material rítmico-melódico discernível
como entidade independente.

Função Harmônica
Significado de uma harmonia dentro de uma tonalidade. 1
São três as funções básicas: tônica, sub-dominante e dominan- Motivo
te, cujo significado é, respectivamente, de repouso, afasta- Coleção de notas que constitui o menor segmento rítmico
mento e tensão. Todas as demais funções são derivadas destas. e/ou melódico com significado musical.

Hipercompasso (Hypermeasure)
Unidade métrica do hipermetro.

1
Esther Scliar usa o termo inciso. (SCLIAR, 1982, 21). Outros autores
usam o termo célula.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 77

Nota de Passagem (p)


Ligação entre duas notas do mesmo acorde ou acordes
diferentes. Pode ser ascendente ou descendente, sempre por
grau conjunto. Em geral, está em posição métrica fraca. Quando
aparece em um tempo forte é chamada de “nota de passagem
acentuada”.

Pedal
Nota que permanece constante enquanto a harmonia ao
seu redor muda.

No registro grave:
Nota de passagem acentuada:

Nota Vizinha (Vz) No registro médio:


Também conhecida por bordadura. Ocorre sempre em
posição métrica fraca. Move-se por grau conjunto ascendente ou
descendente e sempre retorna à sua nota de origem.

No registro agudo:
78 Símbolos, definições e glossário

Período Cravo Bem Temperado são dois típicos exemplos de seção


Organização musical, em geral de oito compassos, que única.
pode ser subdivida em duas frases com quatro compassos cada,
cujos limites são estabelecidos pela cadência. Na grande maioria Seqüência
das vezes, as frases que constituem o período mantêm entre si Repetição literal (ou quase) de um modelo.
uma relação de antecedente e conseqüente, de acordo com o
tipo de cadência ao final de cada frase. As frases, por sua vez, Suspensão (S)
podem ser subdivididas em motivos e incisos. Deve ser preparada e resolvida por grau conjunto
descendente. A nota que envolve a suspensão pode ser ligada
ou não. Pode aparecer em qualquer voz, como também
sucessivamente, em cadeia.

Progressão Harmônica
Uma sucessão coerente de acordes, de acordo com a Tema
sintaxe tonal. Material musical no qual uma obra é baseada parcialmente
ou totalmente. Normalmente um tema implica em uma melodia
Retardo (R) reconhecível. Um tema pode ser usado para identificar uma
Suspensão com resolução ascendente.2 obra musical tanto quanto pode servir de base para um
conjunto de variações.

Tempo Forte Estrutural (Structural Downbeat)


O mais importante ponto estrutural de chegada simultânea
de harmonia e ritmo no início de uma composição, apontando o
seu real início. O Tempo Forte Estrutural sempre opera no nível
do hipermetro.
Seção Única
Estrutura única que não apresenta divisão interna Transição
proeminente, tal como uma interrupção. Não obstante, uma Passagem harmonicamente instável que liga duas seções
obra em seção única apresenta sub-divisões internas que harmonicamente estáveis como, por exemplo, aquela que liga a
articulam seu todo. Os Prelúdios em Dó Maior e Dó Menor do primeira área tonal à segunda área tonal em uma sonata-forma.
A transição geralmente envolve modulação.

2
KOSTKA e PAYNE, pág. 182. Alguns autores, entre eles Piston e Hindemith,
consideram suspensão e retardo a mesma coisa.
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 79

GLOSSÁRIO

Acoplamento(Coupling, Kopellung). Técnica pela qual impor- Elaboração (Composing-out, Auskomponierung). Elaboração
tantes notas estruturais ocorrem em dois registros diferentes por ornamentação ou diminuição de uma nota que forma a
abrangendo uma extensão considerável da música. linha fundamental.

Aproximação Superior (Reaching Over, Uebergreifen). Quan- Estrutura Fundamental (Fundamental Structure, Ursatz). O
do uma voz interna sobe uma oitava e descende um grau. plano de fundo de uma composição tonal, que compreende a
Linha Fundamental e o Arpejo do Baixo. Dentro da teoria de
Ascensão Inicial (Initial Ascent, Anstieg).Coleção de notas do Schenker, existem três tipos de Estruturas Fundamentais
inicio da melodia que conduz via progressão linear, ao tom baseadas em uma Linha Fundamental descendente em
inicial. Sua extensão pode variar de umas poucas notas até relação à tônica: terça, quinta e oitava.
alguns compassos. Pode ser constituída por graus conjuntos,
arpejo ou uma combinação de ambos. Gráfico (Graph, Urlinie-Tafel). Descrição detalhada das dimen-
sões melódica e harmônica de uma música segundo a teoria
Baixo Fundamental (Bass Arpeggiation, Bassbrechung). Linea- de Schenker e que pode operar em três planos ou níveis:
rização da tríade do acorde fundamental no baixo através de plano frontal, plano médio e plano de fundo.
arpejo, que envolve o movimento I-V-I.
Graus da escala [no baixo] (Scale-step, Stufe). Refere-se à
Desdobramento (Unfolding, Ausfaltung). Dimensão horizontal idéia de Schenker de uma função harmônica abstrata, que
de um ou mais intervalos que, em outro plano estrutural, é pode existir em um único acorde ou compreender várias har-
conceitualmente vertical. monias. Serve como pilar harmônico de uma passagem ou de
uma composição.
Diminuição (Diminution, Diminuition). Subdivisão de uma nota
longa por outros valores menores. O termo está fortemente Interrupção (Interruption, Unterbrechung). O movimento é
associado a um tipo especifico de ornamentação no estilo interrompido quando a Linha Fundamental atinge † sobre V,
elizabethano do século XVI. Schenker também usa o termo
sendo o movimento retomado desde o início para descansar
para designar a superfície da música.
finalmente em … sobre I. Em geral a interrupção está asso-
Divisor (Divider, Teiler). Uma nota que divide um intervalo ciada à repetição motívica. Interrupção implica em uma
grande em dois intervalos mais ou menos iguais, estrutura formal binária que envolve sempre a relação
normalmente em uma progressão do baixo. A dominante, por antecedente/conseqüente.
exemplo, pode atuar como divisora entre a tônica e sua
oitava. A terça pode ser a divisora da quinta. O termo pode Ligação (Linkage, Knüpftechnik). Meio pelo qual as diferentes
ser especialmente útil para distinguir função harmônica seções de uma música são conectadas. Tipicamente, um
(Stufen) de contraponto harmônico. motivo subordinado ao final de uma seção é repetido (litera-
lmente ou não) no início da seção seguinte.
80 Símbolos, definições e glossário

Linha Fundamental (Fundamental Line, Urlinie). A linha melo- envolver graus cromáticos como também pode ocorrer entre
dica que compõe o plano de fundo, composta por graus uma voz externa e outra interna.
conjuntos descendentes abrangendo um intervalo de 3a, 5a
ou 8a. Plano Estrutural (Structurallevel, Schicht).Um dos conceitos
mais importantes de Schenker, segundo o qual os eventos de
Melodia Polifônica (Polyphonic Melody). Uma melodia que ar- uma composição tonal são ordenados de forma hierárquica.
ticula uma ou mais vozes distintas. Os eventos mais importantes ocorrem no plano de fundo, o
qual constitui a estrutura fundamental. Eventos de impor-
Movimento de/para uma voz interna (Motionfrom/to na tância mais local ocorrem em planos estruturais mais altos,
Inner Voice, Untergreifen, Untergreifzug). Peculiaridade das no plano frontal e no plano médio. Os eventos mais
melodias polifônicas onde uma segunda voz implícita dentro detalhados, como motivos e ornamentações, ocorrem na
da melodia principal se afasta desta em direção a uma voz superfície musical.
interna por progressão linear (movimento para uma voz
interna). Este movimento pode ser ao contrário, ou seja, de Plano Frontal (Foreground, Vordergrund). O plano estrutural
uma voz interna para uma externa. mais próximo da superfície, que mostra mais detalhes que o
plano médio, mas omite vários dos elementos decorativos da
Nota de Cobertura (Cover Tone, Deckton). Uma nota proe- superfície, particularmente notas repetidas e ornamentação.
minente, muitas vezes repetida, que está acima do registro
fundamental ou da progressão linear principal. Em alguns Plano Médio (Middleground, Mittlegrund). O gráfico do plano
casos pode ser confundida com o tom inicial. Em outros, médio ocupa uma posição intermediária entre os planos fron-
pode acumular a função de pedal. tal e de fundo. O número de gráficos para representar este
nível varia de acordo com a complexidade da obra.
Nota Inicial (Head Tone, Kopfton). A primeira nota estrutural a
compor a Linha Fundamental. É estabelecida perto do come- Plano de Fundo (Background, Hintergrund). O plano ou nível
ço de uma peça e em muitos casos pode ser atingida por estrutural mais baixo, mostrando a estrutura fundamental da
uma ascensão inicial. Em geral ela é referência para progres- composição. É composto apenas pela Linha Fundamental e
sões lineares subordinadas e em muitos casos seu pelo Arpejo do Baixo.
predomínio abrange uma longa extensão de música.
Progressão Seqüência de 3 a 8 notas em grau conjunto que
Paralelismo (Parallelism). Repetição de uma estrutura dentro forma um dado plano estrutural cuja abreviação é x-prg,
de outra estrutura. onde “x” corresponde ao intervalo da progressão (ex.: 3–prg
= progressão de terça). A Linha Fundamental é essencial-
Paralelismo Motívico (Motivic Parallelism). Repetição interna mente uma progressão.
de um motivo. Pode ocorrer em diversos níveis estruturais. É
assinalado um por colchete chamado colchete motívico. Progressão Linear (Linear Progression, Zug). Progressão de
graus conjuntos abrangendo uma terça ou mais e que
Permuta (Voice Exchange). Técnica de prolongamento pela conecta as notas de uma ou mais harmonias. A Linha
qual as vozes externas de dois acordes trocam de posição Fundamental é uma progressão linear no Plano de Fundo.
entre si. A permuta pode abranger dois acordes (conse-
cutivos ou não). Em algumas situações, a permuta pode
Progressão Linear: uma introdução à teoria de Schenker 81

Prolongamento [Melódico ou Harmônico] (Prolongation,


Auskomponierung). A expansão de uma nota (elaboração),
um intervalo ou uma harmonia (Stufe) pela introdução de
material adicional em um plano estrutural mais alto. As
progressões contidas no plano médio prolongam o plano de
fundo, e os detalhes do plano frontal servem para prolongar
o plano médio.

Registro Obrigatório (Obligatory Register, obligateLage). É o


registro onde se acomoda a Linha Fundamental e que serve
de referência para movimentos para outros registros.

Substituição (Substitution). Ocorre em situações onde uma


nota ausente, porém implícita pelo contexto, é substituída
por outra.

Superfície (Surface). O plano mais alto da estrutura musical.


Representa a música em seu acabamento final.

Superposição (Superposition). Quando uma ou mais notas de


uma voz interna saltam, por transferência de registro, para
uma posição acima da Linha Fundamental.

Transferência de Registro (Octave Transfer, Hoherlegung/


Tieferlegung). A mudança de uma ou mais notas de um
registro grave para o agudo ou vice-versa, normalmente por
razões artísticas ou contrapontísticas. Em um nível mais
baixo, este movimento representa um afastamento do
registro obrigatório.
SUPLEMENTO DE EXERCÍCIOS

Contraponto por Espécie

A revisão do contraponto é uma mera formalidade que Outros Cantus Firmi


pode ser suprimida por aqueles que já passaram pela disciplina.
Para os demais, a necessidade deste livro não exige a realização
do contraponto com mais de duas vozes. Sugere-se, entretanto,
que cada cantus firmus seja resolvido em todas as cinco espé-
cies e repetidos no soprano, com a devida adaptação da clave. É
prudente neste estágio, anotar o número correspondente aos
intervalos no espaço entre os pentagramas, como nos dois
exemplos abaixo.

Ex. 1: Cantus Firmus no baixo

Ex. 2: Cantus Firmus no soprano


Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 83

Notas Estranhas ao Acorde

Os corais de Bach têm sido usados com bastante sucesso


no estudo de harmonia e controle de notas dissonantes (notas
estranhas ao acorde). No exemplo abaixo, as notas estranhas
ao acorde aparecem entre parênteses, e a abreviação da sua
designação acima da mesma. Este modelo pode ser estendido a
todos os demais corais. Além disso, eles também podem ser
empregados como reforço no estudo de harmonia e cadência.

Bach: Ach Gott, erhör mein Seufzen und Wehklagen, BWV 254
84 Suplemento de exercícios

Prolongamento Melódico Exercícios:


a)
Mozart: K. 525 - ii
Nesta série de exercícios, deve-se reduzir a passagem até
atingir a sua unidade linear primária, designando que tipo de
diminuição está sendo empregada (nota repetida, nota vizinha,
apojatura, suspensão, nota de passagem, etc.). Quando uma
nota prolongada retorna a ela mesma, usa-se a ligadura
pontilhada.
b)
Mozart: K. 525 - ii
Ex.:

c)

d)

Quando não retorna, usa-se a ligadura contínua.

Ex.:
e)

f)
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 85

g) l) Bach: Suite 2 para cello – Menuett II

h)
Beethoven: Variações sobre “God save the King”
m)
Bach:Suite
Bach: Suite22para
paracello
cello––Menuett
MenuettIIII

i)
Beethoven: Variações sobre “God save the King”
n) Bach: Pequeno Prelúdio, BWV 943

j)
Beethoven: Sonata Op. 22 o) Bach: Suíte Francesa em Mí Maior - Gavotte

k)
Bach: Suite 2 para cello – Menuett I
86 Suplemento de exercícios

p) b) Bach: Suíte 2 para cello, BWV 1008 - Gigue


Bach: Livro de Anna Magdalena - Menuet

q) Schumann: Op. 24, No. 4

c) Bach: Suíte 5 para cello, BWV 1011 - Sarabande

r)
Bach: CBT II - Prelúdio

d) Handel: Sonata para flauta em Lá Menor - Adágio

e)
Chopin: Op. 67, No. 2
Melodia Polifônica

a) Bach: Suíte 1 para cello, BWV 1007 - Prelúdio

f) Bach: Invenção 2
Progressão linear: uma introdução à teoria de Schenker 87

g) Bach: Invenção 2
Na lista de exemplos que se segue, uma ou mais técnicas
podem estar envolvidas no prolongamento. Busque prolonga-
mentos locais e/ou globais baseados nas técnicas descritas no
capítulo 4.

h) a) Beethoven: Variações sobre “God Save the King”, Wo O 78


Bach: Invenção 3 (cc.1-6 e 7-17)
b) Mozart: Sonata para piano K. 333, i (cc.1-10)
c) Haydn: Sonata para piano em Ré Maior Hob. XVI/37, III
(cc. 1-8)
d) Mozart: Sonata para piano K. 545, ii (cc.1-16)
i) Bach: Invenção 4
e) Sor: Sonata Op. 15 (cc.1-16)
f) Sor: Variações sobre a Flauta Mágica (cc. 1-8)
g) Beethoven: Sonata para piano em Fá menor, Op. 2, no. 1, ii
(cc. 1-8)
h) Clementi: Sonatina Op. 36, no. 1, i (1-15)

Prolongamento de Função i) Bach: Suite 1 para violoncello solo - Gavotte II (cc.1-4)


j) Mozart: Sonata K. 331 - I (cc. 1-8)
O exemplo abaixo mostra um prolongamento da função
tônica por inversão. As funções secundárias estão grafadas com k) Bach: Coral 296 Num lob’ mein’ Seel’ denHerren
letras pequenas, enquanto que as principais aparecem com (cc. 1-8)
letras maiores. Observe o segundo acorde do primeiro compas- l) Haydn: Sonata em Dó Maior, Hob. XVI/35 - i (cc. 1-8)
so. Podemos vê-lo de duas formas: na área local, ele representa
um acorde vizinho; por outro lado, no plano global, é um dos m) Beethoven: Sinfonia no. 6 - i (cc. 1-13)
acordes subsidiários que ajudam a prolongar I. n) Mozart: Sinfonia no. 40 K. 550 - i (cc. 1-20)

Bach: coral “Wach’auf, main Herz” (cc. 1 – 4)


o) Mozart: Sonata K. 332 - i (primeira parte completa)
88 Suplemento de exercícios

Técnicas de Progressão Linear

A lista que segue é formada por obras de acesso razoavelmente


fácil para o estudante brasileiro e foi montada de forma a conter
todas as técnicas apresentadas no capítulo 5. Não existe uma
abordagem única e infalível que sirva para todos os casos. Apesar
disso, sua análise pode se basear nos modelos propostos no capítulo
6. Revise as sugestões de preparação contidas na página 63. Além
das obras aqui sugeridas, o estudante pode (e deve) analisar obras
para seu instrumento, em particular aquele repertório que estiver
estudando no momento. Da lista abaixo, todas as músicas devem ser
analisadas por completo, salvo indicação contrária.

1) Kuhlau: Sonatina para piano, Op. 55, No. 1 - i Allegro


2) Clementi: Sonatina para piano, Op. 36, No. 2 - i Allegretto
3) Haydn: Sonata em Dó Maior, Hob. XVI/35 - iii Finale
4) Mozart: Nove variações sobre um tema de Duport K. 573,
Tema
5) Mozart: Sonata K. 570 – ii Adágio
6) Beethoven: Sonata Op. 10, no. 2 - i Allegro (cc. 1-12)
7) Beethoven: Sonata Op. 14, no. 2 - i Allegro (cc. 1-8)
8) Bach: Invenção no. 1, BWV 772 (cc. 1-7)
9) Bach: Partita 1 para violino solo BWV 1002 - Sarabande
10) Brahms: Waltzes Op. 39, No. 1
89

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Schenkerian Approach. New York : Oxford University Press,
1998.

CONE, Edward T. Musical Form and Musical Performance. New


York : W. W. Norton and Company, Inc., 1968.

FORTE, A.; GILBERT, S. E. Introduction to Schenkerian Analysis.


New York : W. W. Norton and Company, Inc., 1982.

FUX, Johann Joseph. Gradus ad Parnassus – The Study of


Counterpoint (1725). Tradução para o inglês: Alfred Mann.
New York : W. W. Norton & Company, 1977.

JEPPESEN, Knud. Counterpoint: The Polyphony Vocal Style of


the Sixteenth Century. New Jersey : Prentice-Hall, Inc.,
1939.

KATZ, Adele. Challenge to Musical Tradition – A new concept of


Tonality. New York : Alfred A. Knopf, Inc., 1945.

KOSTKA, S.; PAYNE, D. Tonal Harmony. New York : McGraw-


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MORLEY, Thomas. A Plain and Easy Introduction to Practical


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ROTHSTEIN, William N. Phrase Rhythm. New York : Schirmer


Books, 1989.

SCHENKER, Heinrich. Free Composition. Tradução para o inglês:


Ernest Oster. New York : Pendragon Press, 1977.

SCLIAR, Esther. Fraseologia Musical. São Paulo : Editora


Movimento, 1982.

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