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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO


INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

Luís César Castrillon Mendes

Publicar ou Arquivar? A Revista do IHGB e a escrita da


História Geral do Brasil (1839-1889)

Cuiabá - MT
Dezembro/2011

1
Luís César Castrillon Mendes

Publicar ou Arquivar? A Revista do IHGB e a escrita da


História Geral do Brasil (1839-1889)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós


Graduação em História do Instituto de Ciências
Humanas e Sociais da Universidade Federal de
Mato Grosso, como requisito para obtenção do
título de Mestre em História.

Orientadora: Profa. Dra. Maria de Fátima Costa

Cuiabá - MT
Dezembro/2011

2
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte

M538p Mendes, Luís César Castrillon


Publicar ou arquivar? A Revista do IHGB e a escrita da História Geral do
Brasil (1839-1889) / Luís César Castrillon Mendes, 2011.
122 f. ; 30 cm (inclui tabelas)

Bibliografia: fs.118-122

Orientadora: Maria de Fátima Costa


Dissertação (mestrado). Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de
Ciências Humanas e Sociais, Programa de Pós-Graduação em História, Cuiabá,
2011.

1. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro - periódicos. 2. Escrita da


História. 3. Segundo reinado - Brasil. I.Título.

CDU 930.2(81) “1839/1889”

Catalogação na fonte: Maurício S.de Oliveira CRB/1-1860.


CDU 930.2(81) “1839/1889”

3
Luís César Castrillon Mendes

Publicar ou Arquivar? A Revista do IHGB e a escrita da História Geral


do Brasil (1839-1889)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós


Graduação em História do Instituto de Ciências
Humanas e Sociais da Universidade Federal de
Mato Grosso, como requisito para obtenção do
título de Mestre em História. Aprovação em
09/12/2011.

Profª. Drª. Maria de Fátima Costa (UFMT) –


Presidente

Prof. Dr. Antonio Herculano Lopes (FCRB) –


Examinador Externo

Prof. Dr. Pablo Diener (UFMT) – Examinador


Interno

Prof. Dr. Oswaldo Machado Filho (UFMT) –


Suplente

3
Art. 1o - O Instituto Historico e Geographico Brazileiro tem por
fim colligir, methodisar, publicar ou archivar os documentos
necessarios para a historia e geographia do Imperio do Brazil; e
assim tambem promover os conhecimentos destes dous ramos
philologicos por meio do ensino publico, logo que o seu cofre
proporcione esta despeza.
Extracto dos Estatutos. RIHGB, Tomo I, 1839, p. 18.

Para se obter, de um conjunto heterogêneo, uma unidade, nada


mais adequado do que a narrativa.
Valdei Lopes de Araújo. A experiência do tempo, p. 125.

4
Dedicatória

À Telma Jakeline, minha cúmplice de todos os momentos e aos queridos


Felipe e Amanda, minhas maiores alegrias.

5
Agradecimentos
Primeiramente ao criador do universo, que fez com que este sonho se
realizasse, dando-me força, saúde e discernimento para superar os momentos difíceis
desta jornada.
À Profª. Maria de Fátima Costa, com quem tive o privilégio de um
aprendizado ímpar: como aluno, no Estágio Docência e como orientando; aliás, uma
irretocável orientação capaz de transformar um turbilhão de ideias, autores e
questionamentos neste trabalho do qual muito me orgulha. Sou grato igualmente ao
Prof. Pablo Diener pelas densas contribuições durante esses dois anos de convivência e
por prontamente ter aceitado o convite para as bancas de qualificação e de defesa desta
dissertação. Da mesma forma ao Prof. Oswaldo Machado Filho pelas importantes
considerações ao texto de qualificação.
Ao Prof. Antonio Herculano Lopes, pelo manifesto interesse em participar da
banca de defesa.
Aos professores do Programa de Pós Graduação da UFMT, principalmente aos
que tive oportunidade de cursar suas disciplinas, e aos professores da UNISINOS,
principalmente, Eliane Cristina Deckmann Fleck, que muito contribuiu no projeto, além
de disponibilizar alguns textos que foram determinantes no desenvolvimento desta
pesquisa.
Ao Professor Renilson Rosa Ribeiro pelo incentivo e sugestões, desde a
concepção do projeto de mestrado, e pela generosidade em me ceder a sua coleção da
Revista do IHGB, além de sempre compartilhar ideias e as mais recentes publicações
acerca do Instituto. À Nathália Amedi, sempre disposta a uma boa prosa sobre projetos
de vida e acadêmicos pelos botequins cuiabanos.
À turma de mestrado 2010, uma galera “nota 10”, aos alunos do Segundo Ano
de História, pela receptividade ao longo do exercício do Estágio-docência na disciplina
História da América I e aos companheiros do grupo de pesquisa História, Arte, Ciência
e Poder, coordenado pelos professores Pablo Diener e Maria de Fátima Costa, palco de
constantes reflexões e aprendizados, envolvendo diversas áreas do conhecimento.
Agradeço especialmente à Val, da secretaria do PPGHIS, sempre disposta a
resolver nossos problemas com inteligência e simpatia.
Aos professores da UNEMAT, responsáveis pelo meu primeiro encontro com
a História. Sou grato às contribuições dos colegas do grupo de pesquisa Fronteira Oeste,

6
coordenado pelo prof. Domingos Sávio da Cunha Garcia. Às professoras Marli
Auxiliadora de Almeida pelo incentivo e considerações feitas ao projeto de pesquisa e
Maria do Socorro de Souza Araújo, que me “socorreu” palmilhando as ruas cariocas
atrás de alguns livros que solicitei de última hora. Lembro-me sempre com carinho dos
nossos “estudos históricos no Caramujo”. Aos meus colegas “parentes” e “pés fofos” da
graduação na UNEMAT e aos alunos do curso de História com os quais tive a satisfação
de trabalhar, sem dúvida uma grande experiência sócio-intelectual. Para esse desafio
contei com o apoio do professor Osvaldo Mariotto Cerezer.
Não poderia deixar de registrar meu sentimento de reverência ao saudoso
historiador Manoel Salgado Guimarães, precursor nas pesquisas sobre o IHGB, falecido
prematuramente neste ano. Suas reflexões muito me auxiliaram no desenvolvimento
desta dissertação.
Sou grato ao suporte familiar “cacerense” intensificado no decorrer destes dois
anos. Aos meus pais, Natalino e Olga, pelo constante incentivo e apoio incondicional.
As animadas conversas na hora do “café” recarregavam minhas baterias. Minhas irmãs
Olga Maria, assídua interlocutora histórico-literária, pelas incontáveis sugestões para a
melhoria deste texto e à Marilda, pelo carinho e apoio com que “administrou” as
crianças durante minhas ausências. À Vanilda, um exemplo de vida a ser seguido, à
Marilce, minha guia espiritual e ao meu irmão Márcio por “assumir o posto”. Aos
consócios do “senadinho”, Sandoval, Luiz Emídio, Celso, Rodrigo e Jones.
Em Cuiabá, Nimia, minha eterna cunhada e colega de ofício. Por falar em
cunhada, agradeço também a Tânia Regina por me ceder o espaço de seu escritório no
qual pude desenvolver alguns artigos e à dona Alice, pelo apoio “logístico” e pelo
convívio na “casa da sogra”.
Em Aquidauana, à minha grande amiga “Dedé” e sua família. Saudades de
todos vocês.
À minha Telma, sinônimo de amor, estímulo e paciência, pelo constante
incentivo e inestimável ajuda nas formatações dos textos e tabelas. Por ter embarcado
nesta viagem comigo e porque há muito caminhamos juntos. Aos meus filhos pelo amor
e alegria, eles representam a renovação da arte de viver.
Por fim, agradeço à CAPES por proporcionar a tranquilidade de uma pesquisa
subsidiada e à Universidade pública por fornecer apoio financeiro para freqüentar
eventos pelo Brasil nos quais pude compartilhar os resultados parciais deste trabalho.

7
Resumo
Durante o período regencial, em 1838, nascia o Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (IHGB), uma agremiação que priorizava, dentre outras atribuições, a
construção de uma escrita histórica para a jovem nação brasileira. Logo em seguida,
como uma das formas de cumprir estes propósitos cria a sua Revista Trimestral
(RIHGB). Nesta pesquisa se discute a operação historiográfica empreendida pelo IHGB,
a partir da análise dos conteúdos veiculados nas páginas do periódico desta Instituição.
Elegeu-se, para tanto, as RIHGB que circularam entre 1839 e 1889, vale dizer do início
de sua circulação até o final da Monarquia constitucional brasileira.

Palavras-chave: IHGB – Periódico – Escrita da História – Segundo Reinado.

Abstract
During the Regency period in 1838, was born the Brazilian Historical and Geographical
Institute (IHGB), an association which emphasized, among other things, the
construction of a historical writing for the young Brazilian nation. Soon after, as a way
to fulfill these purposes creates its Quarterly Magazine (RIHGB). This research
discusses the historiographical operation undertaken by IHGB, from the analysis of the
content carried in the pages of the journal of this institution. Was elected to both the
RIHGB that circulated between 1839 and 1889, that is the beginning of their movement
by the end of the Brazilian constitutional monarchy.

Keywords: IHGB - Journal - Writing of History - Second Reign.

8
SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS 10

INTRODUÇÃO 11

CAPÍTULO I – ANTECEDENTES, TRAMAS POLÍTICAS E CONTEXTO


DE FUNDAÇÃO 18
Movimentos Acadêmicos Setecentistas 19
O Período Regencial: uma “experiência quase republicana” e o Regresso
Conservador 29
O Instituto Histórico: lugar político-social estratégico para se legitimar
um projeto de nação 37

CAPÍTULO II – PUBLICAR OU ARQUIVAR? UM PERIÓDICO A


SERVIÇO DO IMPÉRIO 47
A revista do IHB enquanto fonte e/ou objeto para pesquisa 48
O Tribunal da Posteridade: a História deve ser imparcial e isenta das
paixões do tempo presente 56
A Revista – lócus da memória: temáticas “sugeridas” para a escrita
histórica da nação 62

CAPÍTULO III – A REVISTA DO IHGB: INTRUMENTO PARA FORJAR


A NAÇÃO 75
Embates em torno da escrita da História Geral do Brasil: o Cônego e o
marechal 76
Outros embates: o cônego e o general de Bolívar 83
O “escolhido”: Martius e a escrita da História do Brasil 91
A História Geral do Brasil e o patriotismo caboclo 97

PUBLICAR OU ARQUIVAS? ÚLTIMAS CONSIDERAÇÕES 109

FONTES 113
Manuscritas 114
Impressas 114
Periódicos 116

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 117

9
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 : Lista de sócios fundadores presentes na sessão inaugural 40


Tabela 2 : Presidentes 56
Tabela 3 : Primeiros Secretários 57
Tabela 4 : Ocorrência das províncias na RIHBG (1839-1889) 58
Tabela 5 : Biografias dos brasileiros distintos por letras, armas, virtudes, etc. 64
Tabela 6 : Oradores 66
Tabela 7 : Temas para a História do Brasil na RIHGB 67
Tabela 8 : Pareceres das obras e Programas Históricos publicados 68

10
Introdução

11
“E guiado pelo amor da patria, juntar comnosco os materiaes para
que um dia possa a posteridade levantar um soberbo monumento que
então a imparcialidade chamará a Historia do Brasil”. (itálico no
original) 1.

Esta pesquisa traz como objeto e também como principal fonte de estudos um
periódico cuja circulação teve início no ano de 1839, a Revista Trimestral do Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (RIHGB), fundado no ano anterior, na cidade do Rio
de Janeiro. A Revista constitui-se em um dos periódicos que mais desfrutaram de
longevidade, já que persiste até os dias atuais, com séries ininterruptas, estando hoje
disponível para o público interessado, inclusive, em versão digital.
Tendo sido criado num dos momentos particularmente conturbados da história
do Brasil, desempenhou importante papel no processo de consolidação do Estado
imperial, ao lado de outras instituições tais como a Academia Imperial de Belas Artes
(1826), o Colégio Imperial Pedro II (1837) e o Arquivo Público do Império (1838). Nas
suas páginas foram publicados os materiais selecionados para a constituição de uma
memória oficial da nação, que por sua vez, serviu de subsídios para a escrita da história.
Entretanto ao se dar início a pesquisa para a dissertação que ora se introduz, o
interesse estava voltado para a investigação das construções discursivas, (ou
Representações, nos termos de Chartier), sobre Mato Grosso, no período antecedente da
guerra da Tríplice Aliança com o Paraguai, veiculadas nas páginas da RIHGB. Mas, à
medida que os exemplares da Revista iam sendo manuseados, alguns outros temas

1
César Augusto Marques e L. Francisco da Veiga. Parecer sobre a Historia da Província do Espírito
Santo. Ata da sessão de 16/07/1880. RIHGB, Tomo 43 (2), 1880, p. 424.

12
foram expondo-se, como por exemplo, os fatos relativos ao contexto sócio-político de
fundação do Instituto, as ligações dos sócios com agremiações literárias antecedentes e,
sobretudo, os objetivos que a agremiação se propunha realizar nos primeiros anos de
existência. Dentre estes, um projeto grandioso para a jovem Monarquia, a escrita da
história nacional, cujos propósitos poderiam servir de amálgama para a manutenção da
unidade do território e propiciar uma integração entre as suas províncias. Este aspecto
referente à determinada escrita histórica foi se transformando, gradativamente, no objeto
de investigação.
Desta forma, o exercício da pesquisa foi delineando o objeto da observação,
que se solidificou a partir da eleição dos procedimentos metodológicos adotados, e estes
conformaram a compreensão da construção dessa história e das personagens nela
envolvidas. Assim, neste estudo, objetiva-se analisar a operação historiográfica
empreendida pelo Instituto, tendo por principal fonte o seu periódico. Ao conceber a
história como uma “operação”, o historiador francês Michel de Certeau, observa que a
produção de um texto de história deve ser entendido como uma relação entre o lugar
social e as suas práticas “científicas”. A escrita se constrói em função de uma
instituição, e é em função deste “lugar” que se instauram os métodos, que se delineia
uma topografia de interesses, que os documentos e as questões que lhes serão propostas,
se organizam2.
Tendo como norte essas reflexões, foi possível perceber, por exemplo, que nas
páginas da RIHGB havia seleção de assuntos e em determinados períodos
privilegiavam-se dados sobre algumas províncias em detrimento de outras. Assim,
enquanto Mato Grosso dos tempos coloniais era tema de muitas memórias, lugares
como Pernambuco e Rio Grande de São Pedro do Sul quase não figuravam nas páginas
do periódico nos primeiros momentos de circulação. Observou-se ainda que a ênfase
recaía sobre uma determinada temporalidade, sobre o “passado remoto”, vale dizer, o
período colonial.
Porém, o periódico não publicaria somente as memórias garimpadas junto ao
passado colonial; juízos e pareceres de obras, deliberações e determinações das diversas
comissões de trabalhos, relatórios e discursos, transcritos nas Atas das Sessões
Ordinárias e Sessões Aniversárias, também eram veiculados em suas páginas, dando a
perceber o complexo trabalho realizado pela instituição.

2
Michel de Certeau. A operação historiográfica. In: A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2002, p. 66-67.

13
Então, o Instituto que mais tarde seria conhecido como a Casa da Memória
Nacional3, trazia como principal objetivo a construção de uma História Geral do Brasil,
para tanto, selecionava temas e temporalidades. Mas não apenas isto, ainda determinava
que essa história devia ser escrita preferencialmente por um brasileiro de nascimento, a
partir dos conteúdos cuidadosamente selecionados para figurar nas páginas da Revista.
Visando compreender a estruturação da Revista do IHGB e o papel que
desempenhou na construção da história nacional brasileira, a investigação teve como
marco temporal o período compreendido entre os anos de 1839 e 1889, o que equivale
dizer, do início da circulação da Revista (1839) ao final do Segundo Reinado (1889).
Estas balizas cronológicas justificam-se por coincidir com o período em que a
agremiação recebeu o mecenato de D. Pedro II, pois nos primeiros meses de 1839, em
pleno período regencial, o Instituto convidou o jovem imperador para ser seu protetor,
fato que se configura como uma interessante estratégia por parte do grupo que o
idealizou, para a agremiação ganhar visibilidade política. Já o ano de 1889, marca não
só o fim do mecenato imperial, mas, e principalmente, o início de um período político e
financeira e ideologicamente bastante delicado para o IHGB, com a proclamação da
República.
Fundamentado no interstício temporal desta pesquisa, destacam-se dois
momentos para o Instituto: um inicial, no qual estava sujeito aos interesses do grupo
político que o criou, enquanto uma via de acesso ao Paço Imperial; representado por
figuras como, por exemplo, Januário da Cunha Barbosa, Visconde de São Leopoldo,
Aureliano de Sousa e Oliveira Coutinho e Raimundo da Cunha Matos. O outro
momento, a partir do final da década de 1840, no qual o movimento Praieiro em
Pernambuco foi sufocado e que marcou também a ascensão do gabinete conservador;
este buscava conciliar e consolidar o Estado através da participação efetiva do monarca,
agora com 23 anos, na política do seu próprio governo. A partir de dezembro de 1849,
Pedro II começaria a frequentar as sessões do Instituto e a acompanhar de perto os
trabalhos daqueles que se encarregariam em escrever a história de seu reinado.
Vale ressaltar que a aparente tranquilidade expressa pela continuidade do
projeto de publicação da RIHGB não reflete o turbulento contexto político do período
regencial e logo em seguida do processo de consolidação do Estado imperial. Muito

3
A partir de 1992, o Instituto passa a ser referenciado nos Estatutos como a Casa da Memória Nacional.
Arno Wehling. De formigas, aranhas e abelhas: reflexões sobre o IHGB. Rio de Janeiro: Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro, 2010, p. 132.

14
menos deixa transparecer as tensões entre os seus sócios. Estas tensões, somente podem
ser observadas quando se atenta para as Atas das reuniões quinzenais, que se constituem
partes do periódico e que mereceram especial atenção nesta pesquisa.
Desta forma fez-se a opção por abordar o Instituto como um lugar social e
político de produção discursiva, sujeito a conflitos entre os seus membros, pois em
diferentes momentos, distintas personagens assumiram a direção dos trabalhos, sejam
eles presidentes, secretários, oradores, ou membros das diversas comissões. Coube a
estas pessoas, sobretudo aos primeiros secretários, fazer cumprir a ordem do discurso
para que viessem à luz apenas os assuntos mais convenientes ao grupo gestor da
Revista. Pois, conforme preceitua o artigo primeiro do seu Estatuto, o IHGB tinha por
objetivo Colligir, methodizar, publicar ou archivar os documentos necessarios para a
historia e geografia do Imperio do Brazil4. Porém, nem todos os documentos que
chegaram aos seus arquivos foram destinados à publicação; saíram à luz pública apenas
aqueles que atenderam aos interesses das comissões de História, Geografia, Etnografia,
ou, em última instância, da Redação da Revista que, por sua vez, refletia os desejos do
Estado.
Quanto à apresentação, esta dissertação está dividida em três capítulos. No
primeiro Antecedentes, tramas políticas e contexto de fundação, privilegiam-se
instituições anteriores à fundação do grêmio no Rio de Janeiro, ou seja, algumas
Academias literárias das quais os sócios do Instituto se achavam herdeiros, além de
outras Associações, com finalidades predominantemente políticas. Procurou-se neste
aspecto adentrar, de forma sucinta, no complexo contexto político do Império brasileiro.
Para isso foram destacados os acontecimentos como a Emancipação Política, a
Abdicação de Pedro I e a Maioridade de Pedro II, considerados temas delicados, de um
passado recente que trazia os seus protagonistas, ainda vivos, muitos deles participando
do quadro social do Instituto Histórico. Por último, são apresentados alguns aspectos
relacionados à fundação propriamente dita do IHGB, e como este foi utilizado por
políticos para conquistar espaços perdidos e ter visibilidade na Corte.
Já o segundo capítulo Publicar ou Arquivar? Um periódico a serviço do
Império, mostra a Revista através de uma análise de seu conteúdo, desde os aspectos
metodológicos no trato de periódicos à observação das temáticas sugeridas para a forja
de uma narrativa nacional. Para tanto, foram analisados alguns artigos selecionados e

4
Extrato dos Estatutos do Instituto Historico e Geographico Brazileiro. RIHGB, 1839, Tomo I, p. 22.

15
rejeitados para publicação de forma a evidenciar as referências básicas que pudessem
elucidar a escrita de uma história pátria, vale dizer o objetivo maior do grêmio,
conforme expresso nos Estatutos. Analisam-se ainda outros tipos de textos publicados
nas páginas da Revista, que também podem conduzir (ou induzir) ao tipo de história a
ser escrita, tais como Biografias, Relatórios dos secretários, Discursos dos presidentes,
Necrológios elaborados pelos oradores e Juízos e Pareceres de obras.
Por sua vez o terceiro e último capítulo A Revista do IHGB: instrumento
para forjar a nação, trata das tensões entre os consócios, acerca da escrita da história.
Nele são analisadas as personagens, lugares sociais e concepções históricas
diferenciadas que marcaram as divergências políticas anteriores à fundação e as
atuações das diversas mesas administrativas sobre algumas dessas escritas históricas.
Nesse aspecto, percebeu-se que dentro do IHGB dificilmente poderia haver um
pensamento homogêneo. Por meio da análise das Atas das Sessões Ordinárias e
Aniversárias, foram detectadas divergências e tensões. Para a construção deste capítulo
foi analisada também a correspondência ativa de Francisco Adolfo de Varnhagen,
coligida e organizada por Clado Ribeiro de Lessa, um dos seus mais conhecidos
biógrafos.
Quanto à forma, esclarece-se aqui que nas citações utilizadas no conjunto do
texto, foram mantidas a ortografia conforme consta nas fontes pesquisadas. Assim
conservaram-se as diferenciadas formas usadas para uma mesma palavra, como por
exemplo, Brasil e Brazil, ou descrição e descripção.
Por último, cabe explicitar que além do levantamento das Atas das sessões e
dos temas surgidos nas páginas da Revista, durante o desenvolvimento da pesquisa,
alguns textos que evidenciaram as tensões acerca da escrita da história do Brasil,
receberam especial atenção. Textos considerados de fundação, nos termos do
historiador Manoel Salgado Guimarães, quais sejam: o Discurso inaugural do cônego
Januário da Cunha Barbosa, a Dissertação do marechal Raimundo José da Cunha Matos
e o Texto do diplomata Rodrigo de Sousa da Silva Pontes. Além destes, foram incluídos
também os textos e contextos em que foram publicados a Dissertação de Karl F. Ph.
von Martius, o Compêndio do general José Inácio de Abreu e Lima e a História Geral
de Francisco Adolfo de Varnhagen5.

5
Manoel Salgado Guimarães reuniu esses textos de fundação na obra Livro de fontes de historiografia
brasileira. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.

16
Com as análises efetuadas se pôde perceber que apesar dos esforços e das
tentativas em se forjar a história da nação, o Instituto não entrou em consenso para
acolher essas iniciativas, como os casos das obras de Abreu e Lima e Varnhagen, devido
às divergências políticas e de ordem teórico-metodológicas acerca dos fatos,
personagens e lugares sociais de onde se produziram esses discursos. Tampouco seguiu
as prescrições do naturalista von Martius acerca da melhor maneira de se escrever a
história.
Por fim, se pôde aferir também que no período estudado o IHGB tinha como
prioridade se constituir uma memória oficial para o Brasil, publicando na Revista, em
sua maioria, fatos do período colonial. Os registros da contemporaneidade eram vistos
com desconfiança pelas comissões, pois podiam ser perigosos para a “objetividade” e
“imparcialidade” do historiador. Porém isto não quer dizer que eles não fossem bem
vindos, principalmente nas discussões observadas nas Atas das Reuniões Ordinárias,
como também, e principalmente, nas Sessões Magnas de aniversário, nas quais os
presidentes pronunciavam seus discursos, os primeiros secretários exibiam seus
relatórios dos trabalhos realizados no ano corrente e os oradores oficiais elaboravam
comoventes elogios históricos aos sócios falecidos.

17
Capítulo I
Antecedentes, tramas políticas e contexto de fundação

18
Movimentos Acadêmicos Setecentistas

“O Instituto Historico e Geographico Brazileiro é o representante das


idéas da illustração, que em differentes épocas se manifestaram em o
nosso continente”6.

De acordo com José Honório Rodrigues, a pesquisa histórica no Brasil nasceu


com a fundação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Para este autor, antes
existia apenas a pesquisa individual, o trabalho de um ou outro estudioso, que tentava
encontrar, em arquivos nacionais ou estrangeiros, novas peças que fundamentassem os
temas a serem desenvolvidos7.
Em períodos anteriores ao ano de 1838, ano da fundação do Instituto
Histórico, podem ser observados alguns estudos corporativos no sentido de uma busca
em se coletar, sistematizar e arquivar materiais úteis à Memória, a fim de fundamentar a
produção de uma Literatura específica. As atividades no interior das Academias
Literárias, que no caso da América portuguesa, se manifestaram a partir do Setecentos,
podem ser uma interessante via para se analisar as práticas, objetivos, relações sociais e
personagens envolvidas com determinados interesses comuns.
Assim, neste capítulo, a criação do Instituto em 1838, dentre outras
instituições, será abordada como o indicativo do contexto em que se buscava forjar um
6
José Feliciano Fernandes Pinheiro. O Instituto Histórico Brasileiro é o representante das idéias da
Ilustração, que em diferentes épocas se manifestaram neste continente. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 77.
7
José Honório Rodrigues. A pesquisa histórica no Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional,
1978, p. 37.

19
projeto de Nação para o Estado brasileiro. A criação do IHGB pode ser pensada
enquanto uma estratégia de um determinado grupo que, deixando de lado algumas
diferenças partidárias em detrimento de um interesse político comum, pudesse retornar
ao poder, utilizando-se do caminho das letras, talvez o único acesso disponível naquele
momento.
A fundação da nação estaria atrelada, por meios institucionais, à criação de
uma literatura nacional que singularizasse o Brasil perante seus vizinhos republicanos e
o aproximasse das demais nações europeias ditas “civilizadas”.
O projeto do Instituto, expresso pelos seus Estatutos, chama atenção pela
ousadia e a clareza de seus propósitos. Adotou-se como estratégia analítica, o
estabelecimento de possíveis relações com algumas instituições com objetivos
similares, anteriormente instaladas, seja na metrópole lusitana ou na sua colônia
americana. Isto permitiu a ligação com os movimentos academicistas do século XVIII.
Dessa maneira o plano do IHGB é analisado enquanto um desdobramento dessas
corporações científico-literárias que objetivaram pesquisas coletivas. A partir de um
breve contexto histórico, foram selecionadas algumas dessas agremiações, porém, sem
antes observar que o ato de se “escolher” determinado assunto implica em silenciar,
esquecer ou mesmo de ignorar muitos outros. Aceitando os riscos de tal procedimento,
foram priorizadas algumas corporações cujas relevâncias serão essenciais para auxiliar
nas análises dos próximos capítulos deste trabalho.
Um primeiro estudo sistemático, nos moldes do Instituto Histórico pode ser
vislumbrado na Academia Real de História Portuguesa, fundada na cidade de Lisboa
em 1720. No entender da historiadora Iris Kantor, esta agremiação assumiu uma feição
geopolítica, na qual Portugal estaria concretizando uma política de procurar municiar-se
de documentação comprobatória através de um projeto oficial de construção da
memória histórica dos seus domínios ultramarinos. Isto seria realizado por meio de
coleta de documentação e a constituição de uma ampla rede de contatos
interinstitucionais, como os cartórios das ordens militares, as provedorias das comarcas,
os senados das câmaras, os colégios de Coimbra e as ordens religiosas. Esse
procedimento permitiria a escrita da História Ultramarina, Eclesiástica e Secular do
Império Lusitano. Esta poderia ser uma forma de Portugal legitimar-se diante da
concorrência por territórios com as outras potências europeias. Por intermédio dos
debates travados no interior da Academia Real, a autora identifica a gênese de uma

20
visão secularizante da experiência ultramarina, configurando-se, então, um novo
discurso de justificação do Império8.
Esta iniciativa metropolitana, encerrada em 1776, refletiu-se na colônia, onde
a partir de 07 de março de 1724, na cidade de São Salvador, então sede do governo
lusitano na América, foi fundada a Academia Brazilica dos Esquecidos, cujas reuniões
quinzenais aconteciam no palácio do vice-rei D. Vasco Fernandes César de Menezes
(1673 - 1741). A autodenominação de “Esquecidos” provavelmente é derivada do fato
de que nenhum letrado colonial inicialmente havia sido chamado para compor os
quadros da Academia Portuguesa9.
Dessa instituição, cujo objetivo principal era gerar condições para o estudo e a
escrita da história da Nova Lusitânia, fez parte o historiador, advogado e poeta
Sebastião da Rocha Pita (1660-1738) e o padre Gonçalo Soares Franca (1632-?), os dois
únicos dentre os sete sócios fundadores que depois fizeram parte do seleto grupo de
membros da Academia Real de História Portuguesa10. Os Esquecidos tiveram breve
existência, já que as suas portas cerraram-se quase um ano depois, em 04 de fevereiro
de 1725. Nas palavras do padre-mestre Raphael Machado, reitor do Colégio dos Jesuítas
da Bahia, os Esquecidos devem ser lembrados como os iniciadores da primeira
associação litteraria instituída no Brazil11.
Outra agremiação de notório interesse foi a Academia dos Felizes, fundada em
06 de maio de 1736, pelo militar Gomes Freire de Andrade (1685-1763), governador do
Rio de Janeiro. Segundo Manuel Duarte Moreira de Azevedo, secretário do IHGB entre
1882 e 1886, esta foi a segunda no gênero estabelecida no Brasil. O mesmo Freire de
Andrade, que iria ser nomeado comissário das demarcações dos limites entre as Coroas
portuguesa e espanhola, criou no Rio de Janeiro em 30/01/1752, a Academia dos
Selectos. À esta sociedade deve-se a implantação da primeira tipografia em solo
lusoamericano, embora tenha funcionado por um curto período, já que a metrópole não
permitia o surgimento e circulação de ideias, principalmente se fossem contrárias ao
pacto colonial.

8
Iris kantor. Esquecidos e Renascidos: historiografia acadêmica luso-americana, 1724-1759. São Paulo:
Hucitec, Salvador: Centro de Estudos Baianos/UFBA, 2004, p. 20 e p. 64.
9
Fábio Mendonça Pedrosa. A Academia Brasílica dos Acadêmicos Esquecidos e a História Natural da
Nova Lusitânia. Revista da SBHC, nº1, p. 21-28, 2003 (citação, p. 21).
10
Rocha Pita desde o início da década de 1720 já vinha trabalhando na sua História da América
Portuguesa, publicada em 1730, sob os auspícios da Academia Real de História Portuguesa. Conferir: Iris
Kantor, op. Cit., p. 96.
11
Citado por: Manuel Duarte Moreira de Azevedo. Sociedades fundadas no Brazil desde os tempos
coloniaes até o começo do actual reinado. RIHGB, 1885, Tomo 48, p. 265-327. (citação, p. 268).

21
Em junho de 1759, no conturbado contexto da expulsão dos jesuítas das
possessões portuguesas, foi inaugurada na cidade de Salvador, Bahia, a Academia
Brazilica dos Acadêmicos Renascidos, que tinha como símbolo a fênix fitando os olhos
no céu. A alegoria da fênix - ave mitológica, símbolo da alma e da imortalidade, que,
segundo a crença dos antigos, vivia muitos séculos e por fim queimava para depois
ressurgir de suas próprias cinzas - era utilizada como representação iconográfica oficial
do reinado de D. João V (1689-1750), e também era uma marca usada pela Academia
de História Portuguesa. Fundada sob o patrocínio do desembargador e conselheiro
ultramarino José Mascarenhas Pacheco Pereira de Melo, a academia era composta por
quarenta sócios numerários e por um número indeterminado de sócios supra
numerários. Possuía uma padroeira, um protetor e um mecenas: Nossa Senhora da
Conceição (padroeira de dezenas de Academias ibéricas), o rei de Portugal D. José I
(1714-1777) e o seu ministro Sebastião José de Carvalho e Mello (1699-1782), futuro
marquês de Pombal, respectivamente.
As reuniões aconteciam quinzenalmente e nos natalícios régios realizavam-se
comemorações solenes para a exaltação de seus feitos e de seus patrocinadores.
Salienta-se que o objetivo era nada menos do que escrever a História Universal,
Eclesiástica e Secular da América Portuguesa. O programa historiográfico dessa
agremiação, como demonstra Iris Kantor, consistia em uma sistemática compilação
documental para que em seguida se escrevesse a história na língua latina. Através da
subdivisão das capitanias em pequenos distritos, os acadêmicos repartiriam as tarefas
entre um ou mais sócios, de modo que pudessem averiguar localmente os pontos
duvidosos e individuar fatos. Ao historiador cabia saber todos os fatos e opiniões e
“escolher” as melhores opções. Pela acumulação progressiva das memórias e histórias
particulares das capitanias poderia se conformar uma história do continente americano
em sua totalidade12.
Para a prática de uma escrita institucionalizada da história seriam necessárias
algumas técnicas de produção de “consensos”, aspecto inclusive previsto nos estatutos
dos Renascidos. De acordo com a regra, nenhum sócio poderia emitir opinião sobre
assuntos controvertidos antes que o congresso elegesse os que dissertariam sobre essas
matérias, emitindo um parecer coletivo sobre a opção considerada mais provável. Da
mesma forma, os sócios que quisessem propor emendas ou questionar os trabalhos dos

12
Iris Kantor, op. Cit., p. 215.

22
colegas, deveriam fazê-lo por escrito, não sendo permitido divulgar em público os
“defeitos” dos consócios13. O projeto dessa escrita, bem como os estatutos publicados
na primeira sessão desta agremiação chegou ao IHGB, por meio do Visconde de São
Leopoldo, a partir de uma cópia dos originais encontrados na Biblioteca Pública do Rio
de Janeiro14.
A criação do Diretório dos Índios, em 1755, quatro anos antes da inauguração
dos Renascidos, evidenciou a diferenciação entre a abordagem do indigenismo
pombalino e o indianismo erudito15. Enquanto a Coroa, por meio do Diretório, intentava
integrar o indígena enquanto vassalos úteis para o povoamento e defesa das fronteiras,
os historiadores brasílicos enalteciam a sua própria ascendência indígena, como uma
espécie de fundador das principais linhagens da nobreza da terra. A contradição se
estabelecia no rebaixamento intelectual e moral do indígena “real” contemporâneo, e o
discurso de heroicização do ancestral indígena “ideal”. O pragmatismo que envolvia a
criação da Academia dos Renascidos consistia justamente no recrutamento de párocos
que deveriam substituir os missionários jesuítas nas vilas indígenas recém instituídas
pelo Diretório dos Índios16.
A Academia, porém, não chegou a ser institucionalizada; um mês após a sua
inauguração, o poderoso ministro de D. José decretava a prisão de seu principal
promotor, o desembargador Mascarenhas de Melo. Entretanto a historiadora Iris Kantor
confirma o funcionamento informal desta associação por cerca de um ano. Para o
conselheiro Mascarenhas de Melo, a empresa acadêmica poderia ter se tornado um
importante instrumento de ação governamental em meio ao processo de redefinição das
fronteiras territoriais, de expulsão dos jesuítas e de secularização do controle da mão de
obra indígena17.

13
Iris Kantor, op. Cit., p. 193-196.
14
José Feliciano Fernandes Pinheiro. O Instituto Histórico Brasileiro é o representante das idéias da
Ilustração, que em diferentes épocas se manifestaram neste continente. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 79.
15
O Diretório dos Índios foi uma lei editada em 1755 por D. José I, através de seu ministro, o futuro
marques de Pombal, que dispunha sobre os aldeamentos indígenas do Estado do Grão Pará e Maranhão.
Em 1758 um Alvará estendeu estas medidas para toda a América portuguesa. Este diretório extinguiu o
trabalho missionário dos religiosos nos aldeamentos, elevando estes à condição de vilas, administradas
por um diretor. Destaca-se no Diretório a intenção da Coroa de evitar a escravização dos índios, sua
segregação, seu isolamento e a repressão ao tratamento dos indígenas como pessoas de segunda categoria
entre os colonizadores e missionários brancos. O documento estabelece, entre outras medidas, a proibição
do uso do termo “negro”, o incentivo ao casamento de colonos brancos com indígenas, a substituição da
língua geral pela língua portuguesa, e punição contra discriminações. Conferir:
http://www.nacaomestica.org/diretorio_dos_indios.htm. Acesso em 20/10/2011.
16
Iris kantor. Op. Cit., p. 225.
17
Idem, p. 20.

23
Mais de uma década depois foi criada a Academia de Ciências do Rio de
Janeiro, sob os auspícios do vice-rei o marquês de Lavradio (1729-1790), em 18 de
fevereiro de 1771. Esta Academia tinha por objetivo tratar, nas suas conferências, de
temas de história natural, física, química, agricultura e medicina. Nas palavras de José
Feliciano Fernandes Pinheiro, foi a que compreendeu e exprimiu tão bem as
necessidades do Brasil18, tinha por objetivo tratar, nas suas conferências, de temas de
história natural, física, química, agricultura, e medicina. Seu presidente era o médico do
vice-rei, José Henriques Ferreira e tinha o mérito de enfatizar os assuntos científicos
durante as reuniões semanais. A Academia possuía um horto botânico e entre as suas
contribuições destacavam-se a propagação do uso do bicho da seda e o incremento da
indústria da cochonilha. Sobre esta última, Henriques Ferreira escreveu uma memória
sobre o descobrimento deste pequeno inseto, do qual se extrai um corante vermelho, que
foi publicada em 1814 no jornal político-literário O Patriota19.
Cabe observar que esse movimento de fundações de sociedades científicas
estava em voga na Europa. No início do Oitocentos intelectuais prussianos envidaram
esforços no sentido criar uma agremiação para o estudo da história nacional, a
Sociedade para o Estudo da História Alemã Antiga, fundada em 1819. Tratava-se de
um projeto de compilação de documentos guardados em arquivos de diversos países
europeus tanto para as letras quanto para a construção da nação. O resultado dessa
iniciativa materializou-se em 1826 por meio da Monumenta Germaniae Historia, uma
edição crítica dessa coleta documental. Cabe destacar que nesse período a nação alemã
ainda não se constituía enquanto um Estado unificado e essa busca de fontes acerca de
um passado grandioso justificavam as atitudes políticas do presente em prol de uma
construção nacional. Esse novo paradigma na pesquisa documental influenciou
Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878) no seu trabalho com fontes nos diversos
arquivos que visitou, já que tinha acesso à cultura alemã e era conhecedor dos métodos
utilizados na Monumenta20.
A História seria o caminho para a forja de laços identitários e essa iniciativa
disseminou-se por vários Estados europeus: a Academia de História de Madrid lançou o
Memorial Histórico Espanhol; a Sociedade de História da França editou documentos

18
José Feliciano Fernandes Pinheiro. Op. Cit., p. 82-83.
19
José Henriques Ferreira. Sumario da Historia do descobrimento da cochonilha. O Patriota, jornal
litterario, politico, mercantil, &c. Rio de Janeiro: Impressão Regia, 1814, p. 03-13. Disponível em:
http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/64, acesso em 25/08/2011.
20
Manoel Salgado Guimarães. Historiografia e nação no Brasil: 1838-1857. Rio de Janeiro: EdUERJ,
2011, p. 175-176.

24
inéditos da história da França (1835)21. Uma iniciativa inovadora acerca dos novos
procedimentos de coleta, organização, crítica e, sobretudo, publicidade para as fontes
documentais.
O pioneirismo alemão influenciaria os brasileiros por meio de historiadores
franceses como François Guizot (1787-1874), que à época de fundação da Société
ocupava o cargo de ministro da instrução pública, o diplomata Prosper de Barante
(1782-1866), o filósofo e político Victor Cousin (1792-1867) e Louis Adolphe Thiers
(1797-1877), que chegou a ser primeiro ministro e presidente da República francesa.
Pode-se perceber o vínculo dos escritores franceses com o aparelho estatal e a
configuração da história como uma arma poderosa para se legitimar e consolidar
identidades nacionais. Situação parecida com o contexto brasileiro dentro do IHGB, no
qual seus sócios, aqueles que deveriam escrever a história, pertenciam em sua maioria
aos quadros do governo.
Há também outras sociedades científico-literárias, algumas secretas como, por
exemplo, as lojas maçônicas, dentre as quais a mais atuante foi a Grande Oriente, que
contava entre os Grãos mestres com personalidades como o político José Bonifácio de
Andrada e Silva (1763-1838) e o primeiro imperador brasileiro, D. Pedro I (1798-1834).
Esta agremiação teve participação ativa no processo de independência do Brasil gerando
disputas políticas e provocando dissidências entre alguns dos seus participantes após o
Sete de Setembro.
Ainda com o propósito de localizar “heranças” academicistas do Instituto
Histórico no Dezenove, duas sociedades também merecem destaque: a Academia
Fluminense das Sciencias e Artes e a Sociedade Defensora da Liberdade e
Independência Nacional. A primeira delas, a Academia Fluminense das Sciencias e
Artes foi idealizada pelo cônego Januário da Cunha Barbosa, futuro secretário do IHGB
e Joaquim Gonçalves Ledo (1781-1847), um dos políticos atuantes no processo de
independência brasileiro. Os objetivos norteados pelos estatutos internos desta
agremiação, apresentados em 03/11/1821, previam o estudo das ciências, belas letras,
artes, história do Brasil e sua estatística. Na oportunidade contou com 25 sócios
efetivos, dentre eles José Silvestre Rebello (? -1844) e Diogo Soares de Bivar (1785-
1865), que posteriormente também fariam parte do quadro social do IHGB, e um

21
Neuma Brilhante Rodrigues. O amor da pátria, o amor das letras: as origens da nação na Revista do
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1839-1889). Dissertação de Mestrado em História. UNB,
Brasília, 2001, p. 55-56.

25
número indeterminado de sócios honorários e correspondentes, sob a proteção do
príncipe regente, Dom Pedro, futuro Pedro I. Após quatro sessões, esta associação
fechou as suas portas motivadas pelas agitações políticas em torno do processo de
Independência.
A outra entidade, a Sociedade Defensora da Liberdade e Independência
Nacional, possuía interesses predominantemente políticos, foi fundada em 10 de maio
de 1831 com a finalidade de combater os adeptos da Restauração, ou seja, os que
defendiam a volta do duque de Bragança - D. Pedro I, ao trono brasileiro, que em 7 de
abril acabara de abdicar em favor de seu filho, Pedro II. Essa associação resolveu
estrategicamente fundar novas filiais, ramificando-se pelas províncias do Império. Suas
sessões aconteciam aos domingos em uma das salas do Paço da Câmara Municipal e
teve como integrantes nomes influentes da política imperial, tais como Evaristo da
Veiga (1799-1837), primeiro secretário durante toda a existência do grêmio, Antonio
Borges da Fonseca (1808-1872), Manoel Odorico Mendes (1799-1864), Paula Souza
Melo (1799-1864), Limpo de Abreu (1798-1883), os irmãos Lima e Silva e Andradas.
A Sociedade Defensora pode ser analisada como uma tentativa organizada de
se oferecer sustentação política à Regência. Essa espécie de pacto selado entre
diferentes grupos reuniu, nesse momento delicado, representantes dos Liberais
Exaltados e Moderados. Para Lúcia Guimarães, esta entidade civil constituiu-se no
principal reduto do chamado liberalismo moderado22.
Essas associações, algumas com objetivos ilustrados, outras nem tanto,
demonstram tentativas de reunir esforços no intuito de desempenhar tarefas que
expressam objetivos comuns entre seus integrantes, ou seja, trabalhos realizados em
conjunto pelos sócios. Seja pelos aspectos relacionados a disputas políticas, manutenção
ou contestação da ordem ou pela necessidade de coleta documental para legitimação de
territórios, identidades nacionais, bem como desenvolver as Letras, as associações têm
como uma das características em comum, o fato de buscarem apoio junto a
representantes do poder central. No caso do IHGB, esta prática vai se tornar condição
fundamental para o cumprimento dos objetivos preestabelecidos e pela sua longevidade.
Resta ainda chamar atenção para a correspondência entre determinados temas
enfatizados pela Revista do IHGB com alguns dos assuntos veiculados por um dos
periódicos que circulou nos anos de 1813 e 1814 no Rio de Janeiro. Trata-se do jornal O

22
Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Debaixo da imediata proteção de Sua Majestade Imperial: o
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1889). RIHGB, Tomo 156 (388), 1995, p. 481.

26
Patriota, editado pelo militar e jornalista Manuel Ferreira de Araújo Guimarães (1777-
1838).
O historiador Manoel Salgado Guimarães detectou algumas correspondências
entre estes periódicos, observando, por exemplo, que o Patriota era impresso na capital
pela Imprensa Régia, criada em 13/05/1808 e subordinava-se à Secretaria de Negócios
Estrangeiros e da Guerra, nas mãos de Rodrigo de Souza Coutinho (1755-1812), um dos
estadistas que tinham como missão a tarefa de fundar um novo Império que teria como
sede o Rio de Janeiro e que deveria se impor às demais capitanias, tarefa essa que
contou com a colaboração dos ilustrados brasileiros23. Souza Coutinho já havia
presidido uma instituição similar em Portugal, que era encarregada de assuntos de
natureza literária: a Casa Literária do Arco do Cego, fundada em 1799 e que teve uma
breve vida funcionando até 1801. O saudoso historiador notou também que o primeiro
presidente do IHGB José Feliciano Fernandes Pinheiro, futuro visconde de São
Leopoldo, trabalhou como tradutor na tipografia dessa instituição, sendo o seu primeiro
cargo público após a conclusão de seus estudos em Coimbra24.
O jornal O Patriota constituiu-se em um periódico oficial que deu visibilidade à
Corte. Há algumas convergências entre os artigos que este periódico publicou e os que
irão aparecer na Revista do IHGB vinte e cinco anos depois, como por exemplo o artigo
Descrição geográfica da capitania de Mato Grosso, publicado no periódico do IHGB
em 1844, que já havia circulado em cinco números em seqüência d’o Patriota no ano de
1813. Outro texto emblemático é a História dos índios cavaleiros ou da nação
Guaycuru que veio a ser o primeiro tema do passado colonial veiculado pela Revista do
IHGB, em 183925.
Há também outra revista, desta feita publicada na capital francesa. A Revista
Nitheroy, cujos dois únicos volumes vieram a lume no ano de 1836, fruto da iniciativa
de brasileiros como Francisco Sales de Torres Homem (1812-1876), Manuel de Araújo
Porto Alegre (1806-1879), João Manuel Pereira da Silva (1817-1897), Candido de

23
Maria Odila Leite da Silva Dias. A interiorização da metrópole e outros estudos. São Paulo:
Alameda, 2005, p. 33.
24
Manoel Luís Salgado Guimarães. Entre as luzes e o Romantismo: as tensões sobre a escrita da história
no Brasil oitocentista. In: _____ (org) Estudos sobre a escrita da história. Rio de Janeiro: 7 Letras,
2006, p. 68-85.
25
Francisco Rodrigues do Prado. História dos índios cavaleiros ou da nação Guaykuru, escrita no Real
Presídio de Coimbra ...– ano de 1795. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 25-57. A sociedade Guaicuru estava em
evidência nas primeiras décadas do Oitocentos devido aos ataques ocorridos no Presídio de Nova
Coimbra, nos anos de 1778 e 1789. Em 1791 foi concretizado um acordo de paz entre portugueses e esse
grupo, na qual foram reconhecidos como vassalos da rainha de Portugal, D. Maria I.

27
Azeredo Coutinho (?-1878) e Domingos José Gonçalves de Magalhães (1811-1882).
Esse grupo contou com a ajuda do francês François Eugène Garay de Monglave (1796-
1873), membro fundador e secretário perpétuo do Institut Historique de Paris, criado
em 1834. Esses intelectuais priorizavam um projeto de renovação da vida intelectual
brasileira. Além da literatura se pensava em modernizar, de acordo com os padrões
parisienses, a música, as artes, a economia, a filosofia e as ciências. O lema era “tudo
pelo Brasil e para o Brasil”. No primeiro tomo, Gonçalves de Magalhães escreveu o seu
Ensaio sobre a historia da litteratura do Brasil, no segundo (e último) tomo, Pereira da
Silva apresentou o seu Estudos sobre a Litteratura26.
Neste último tomo Monglave fez a apresentação dos trabalhos escritos,
exaltando a iniciativa dos brasileiros e evidenciando o fato de os redatores participarem
também do quadro do Instituto Histórico parisiense27. Estavam, assim, lançadas as bases
para a construção da literatura nacional e estabelecida a relação do Instituto francês com
o seu congênere brasileiro, cuja inauguração se daria dois anos mais tarde.
Muitos dos futuros sócios do IHGB foram membros do Instituto Histórico
francês, o que contribuiu para um “afrancesamento” do pensamento brasileiro do século
XIX. Dentre eles, além dos integrantes da Revista Nitheroy, eram sócios o cônego
Januário da Cunha Barbosa, Raimundo da Cunha Matos (1776-1839), Francisco Freire
Alemão (1797-1874), Antonio de Meneses Vasconcellos de Drummond (1794-1874), o
visconde de São Leopoldo, Evaristo da Veiga, Pedro de Araujo Lima (1793-1870),
Limpo de Abreu e o próprio D. Pedro II (1825-1891).
Entretanto, para se entender a relação entre estas primeiras instituições e o
IHGB, é necessário se enveredar pelos meandros da política imperial. A atuação das
diferentes mesas diretoras instaladas no IHGB estará vinculada aos acontecimentos
históricos contemporâneos e a personagens que participaram das alianças e dos embates
políticos que decidiram os destinos da jovem Monarquia constitucional brasileira.

26
Conferir Nitheroy Revista Brasiliense de Sciencias, Lettras, e Artes. Tomos I e II. Paris: Dauvin et
Fontaine, Libraires, 1836. Disponível em:
http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_periodicos/per700045/nitheroy.htm
27
Sobre os brasileiros no IHP, conferir: Elaine Cristina Carraro. O Instituto Histórico de Paris e a
regeneração moral da sociedade. Dissertação de mestrado em Sociologia. UNICAMP, Campinas, 2002
e Antonio Candido. Formação da Literatura brasileira. Volume II (1836-1880). 8ª ed. Belo Horizonte-
Rio de Janeiro: Itatiaia, 1997, p. 13.

28
O contexto social e político do Brasil após a Independência, se comparado às
ex-colônias hispânicas, apresenta um quadro, cuja especificidade salta aos olhos, a
começar pela forma de governo adotada: uma Monarquia constitucional em meio as
Repúblicas americanas. Um dos fatores relacionados a este fato poderia estar localizado
no processo da transmigração da família imperial com a nobreza lusitana para o Rio de
Janeiro, em face da invasão pela França napoleônica. Esta nova configuração elevou a
colônia à categoria de Reino Unido, em 1815. Alterou-se, desta forma, o monopólio
estabelecido pelo pacto colonial, estimulando a criação de uma série de medidas e
instituições que objetivavam ajustar a colônia à função de sede do governo.

O Período Regencial: uma “experiência quase republicana” e o Regresso


Conservador

“Aos nove annos do primeiro reinado seguiram-se dez de uma


minoridade laboriosa e arriscada: em muitos pontos do imperio a
hydra da guerra civil alçou terrivelmente a cabeça, e em toda parte o
horizonte da patria obscureceu ameaçando tempestade: foi
lamentável período de convulsões politicas, e as convulsões politicas
assemelham-se à inundação e ao incendio...”28

O lugar social de produção do discurso associado ao contexto histórico torna-


se pressuposto obrigatório para se tentar decifrar o universo sócio-cultural e político
acerca das ideias e procedimentos adotados pelos muitos protagonistas envolvidos. O
IHGB pode ser pensado enquanto uma agremiação literária em uma Sociedade de Corte,
na qual, se valia de práticas fundamentadas no compadrio e nos apadrinhamentos para a
formação de seu quadro social. As primeiras medidas foram a conquista da imediata
proteção do jovem monarca e o estabelecimento de critérios como visibilidade social e
prestígio político para se ingressar na instituição. A criação de uma associação nos
moldes do Instituto Histórico na Corte será analisada enquanto uma estratégia política
de afirmação de determinados indivíduos, pois suas hierarquias internas, os critérios de
ingresso, seu quadro social, a constituição das mesas diretoras, a correspondência com
instituições congêneres, enfim, as práticas no interior deste Instituto, em diversos
momentos e por diversas personagens, evidenciam disputas e tensões sobre temas

28
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do secretario perpetuo. RIHGB, Tomo 17, 1854, p. 647.

29
delicados e convergências sobre determinados assuntos considerados de interesse
nacional.
E, uma vez que o IHGB foi concebido durante o Regresso Conservador, no
período das regências, neste estudo se considerou prudente trazer alguns aspectos
políticos dessa configuração histórica para visualização e entendimento das diversas
operações efetuadas pelos associados do Instituto, que serão os representantes do alto
escalão burocrático da Monarquia.
Para tanto, foram selecionados autores que estudaram o período, como José
Murilo de Carvalho, Ilmar Rohloff de Mattos e Emilia Viotti da Costa, entre outros,
com o objetivo de estabelecer uma ligação entre a fundação e consolidação do grêmio
na Corte e as intensas disputas políticas durante a “experiência republicana”29.
Cabe ressaltar que o período das regências esteve associado por certa tradição
historiográfica a um momento de caos político logo após a abdicação de Pedro I. Pode-
se pensar, dialogando com Istvan Jancsó, que essa temporalidade pode ser igualmente
analisada como um período em que houve um leque de possibilidades para a construção
da nação brasileira. O Segundo Reinado foi apenas um entre vários outros projetos
políticos possíveis, no qual foi considerado a opção mais adequada diante daquele
momento em que o Império poderia vir a esfacelar-se30.
Para a historiadora Emília Viotti da Costa, dentre as medidas adotadas por D.
João VI, as mais nefastas aos portugueses que ficaram na metrópole foram a extinção do
monopólio comercial e a abertura dos portos31. Estes estariam sujeitos à concorrência
inglesa, cuja revolução industrial estava em pleno vapor. A insatisfação dos
comerciantes culminou no levante da cidade do Porto, cujas exigências imediatas se
pautavam no retorno do rei e a restituição do pacto colonial, o que colocaria frente a
frente os interesses dos comerciantes lusitanos em Portugal e no Brasil. Dentre as
possibilidades estavam a de restabelecer o regime anterior à vinda da Corte para o Rio
de Janeiro, ou mesmo o estabelecimento de uma Monarquia dual com sedes simultâneas
no Brasil e Portugal. Mas, ganhou espaço a possibilidade da proclamação da
independência, procurando preservar a autonomia administrativa e comercial alcançada.
29
A expressão é de Paulo Pereira de Castro. Conferir: Política e administração de 1840-1848. In: Sérgio
Buarque de Holanda (Org.). História Geral da Civilização Brasileira – O Brasil Monárquico. Tomo 2,
vol. 2º. São Paulo: Difel, 1985, p. 19.
30
István Jancsó e João Paulo Garrido Pimenta. Peças de um mosaico: apontamentos para o estudo da
emergência da identidade nacional brasileira. In: Carlos Guilherme Mota. (Org.). Viagem Incompleta
1500-2000 - A experiência Brasileira. São Paulo: SENAC São Paulo Editora, 2000, v. 1, p. 127-175.
31
Emília Viotti da Costa. Da Monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo: Fundação
Editora UNESP, 2007, p. 28.

30
A manutenção do príncipe D. Pedro propiciou a realização de tal ato sem alteração da
ordem social. Adotar a solução monárquica de governo significaria uma “revolução” de
cima para baixo, dispensando mobilizações populares, garantindo assim a manutenção
da unidade e uma personagem simbólica que poderia ajudar a manter a ordem
monárquica.
Atuação interessante teve José Bonifácio de Andrada e Silva, assessor direto
do príncipe. Aquele que viria a ser conhecido como o “Patriarca da independência”
intentava também formar alianças com os países americanos contra possíveis políticas
ofensivas por parte da Santa Aliança, formada no Congresso de Viena (1814-1815),
lideradas pela Áustria e; além disso, por intermédio da princesa Leopoldina de
Habsburgo, filha do imperador austríaco e esposa de D. Pedro, simpática ao movimento,
se procuraria tranquilizar a Europa, a esta altura nada simpática a movimentos
revolucionários, envolvendo o futuro da Monarquia no Brasil.
Realizada a Independência, as diferenças entre grupos radicais e conservadores
tornavam-se mais evidentes. José Bonifácio no Apostolado32, sociedade fundada pelo
seu irmão, Antonio Carlos de Andrada Machado e Silva procurava, seguindo o lema
dessa sociedade, a integridade, independência e felicidade do Brasil como Império
constitucional, opondo-se tanto ao despotismo que o altera quanto à anarquia que o
dissolve33. Na loja maçônica Grande Oriente, o grupo composto por Gonçalves Ledo,
Januário da Cunha Barbosa e Manoel Alves Branco, aliados dos Andradas durante o
processo de emancipação, assumiu o controle da situação, elevando D. Pedro a Grão
Mestre.
Desta forma, o rumo da jovem nação ficou a cargo de um grupo de elite:
fazendeiros, comerciantes, pessoas que ocupavam altos cargos na administração e no
governo, muitos dos quais mais tarde foram titulados por serviços prestados por ocasião
da independência, constituindo assim uma verdadeira oligarquia integrante do Conselho
de Estado, Senado, Câmara dos deputados, exercendo funções de presidentes de
províncias e de ministros de Estado.
A concentração de poder nas mãos dessa minoria acarretou a disputa com o
imperador pelo controle da nação, levando-o, entre outras causas, à abdicação em 1831.
32
Apostolado da Nobre Ordem dos Cavaleiros de Santa Cruz, sociedade política no estilo dos clubes
secretos, porém não maçônica, ao lado da loja Grande Oriente Brasileiro, constituíram-se em espaços de
sociabilidade que disputavam a influência sobre D. Pedro I, após a emancipação política. Lúcia Bastos
Pereira das Neves In: Ronaldo Vainfas, (Org.). Dicionário do Brasil Imperial. Rio de Janeiro: Objetiva,
2008, p. 506-507.
33
Emília Viotti da Costa. Op. Cit., p. 57.

31
A ordem econômica tradicional estabelecida pela estrutura colonial de produção e
fundamentada na grande propriedade, na manipulação do poder local pelos proprietários
e na exportação de produtos tropicais, garantida pela manutenção da escravidão seria
preservada.
A Constituição de 1824 assegurava a igualdade de todos perante a lei, bem
como garantia a liberdade individual, mas a maioria da população continuava excluída.
A eleição indireta obedecia a critérios censitários. Reconhecia-se o direito da admissão
em cargos públicos, porém prevalecia a amizade e o compadrio, reflexo de um sistema
de clientela no processo de nomeações para os cargos burocráticos. Para Emília Viotti
da Costa, à elite de letrados caberia, em nome das categorias socialmente dominantes,
ser portadora de uma ideologia liberal que disfarçasse as contradições do sistema. O
Brasil independente continuaria na dependência de uma estrutura colonial de produção,
passando do domínio português para a tutela britânica34.
De qualquer forma o Estado monárquico não teria condições de se sustentar
sem a agricultura de exportação que gerava 70% das suas rendas, por meio dos impostos
de exportação e importação35. Através dessa dialética da ambigüidade, nos termos de
José Murilo de Carvalho, o Estado imperial se tornava, por sua elite, instrumento ao
mesmo tempo de manutenção e transformação das estruturas sociais36.
Durante o período inicial da Regência, esboçou-se um projeto de nação de viés
liberal democrático que não chegou a se tornar realidade. Este funcionou como resposta
dos setores liberais à política centralizadora do Primeiro Reinado (1822-1831). A
aspiração a uma maior autonomia municipal e provincial, a extinção do Poder
Moderador, do Conselho de Estado e da vitaliciedade do Senado, a discriminação das
rendas públicas nacionais e provinciais, além de se transformar os Conselhos
Provinciais em Assembléias Legislativas, não se efetivaram totalmente. Essas medidas,
embora aprovadas na Câmara dos Deputados, onde havia a maioria dos Liberais mais
exaltados, não passava pelo Senado, reduto das camadas conservadoras.
E logo após a Abdicação ocorreu a reformulação do Código de Processo
Criminal e a instituição do Ato Adicional de 1834. Buscava-se uma maior autonomia
para as províncias, mas com a permanência da ordem e da integridade nacional. O
Código, aprovado em 29 de novembro de 1832, tornava-se a personificação de um dos

34
Emília Viotti da Costa. Op. Cit., p. 61-62.
35
Idem, p. 232.
36
José Murilo de Carvalho. A Construção da Ordem: a elite política imperial. Teatro das Sombras: a
política imperial. 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006, p. 417.

32
principais instrumentos da descentralização, estabelecia que o poder judiciário fosse
independente do administrativo, e que o promotor, o juiz municipal e o juiz de órfãos,
até então nomeados pelo governo central, passassem a ser escolhidos a partir de uma
lista tríplice proposta pela Câmara Municipal.
Apesar da relativa homogeneidade de parte da elite brasileira, seria muito
complexo estabelecer um sistema nacional monárquico de dominação, ante as
divergências regionais e a enorme extensão territorial. Uma onda revolucionária seria a
característica dos primeiros anos da instituição monárquica brasileira. O melhor
indicativo desse quadro pode ser percebido nos diversos levantes, principalmente
durante o período das regências. Dois grandes grupos de revoltas podem ser observados,
de acordo com Carvalho: o primeiro, imediatamente após a Abdicação de Pedro I,
perdurou até 1835, um ano após a sua morte e promulgação do Ato Adicional; o
segundo grupo, posterior ao Ato, terminaria somente em 1848, com a Revolução
Praieira em Pernambuco37. Cabe destacar que a subida de Pedro II ao trono aos quatorze
anos não foi suficiente para estancar os conflitos de viés separatistas.
Os motivos dos levantes regenciais eram de ordem concreta e pragmática. As
elites locais protestavam contra a perda de poder e a interferência do governo central em
suas comunidades e eram contra substituições de autoridades eleitas por aquelas
indicadas pelo governo. O crescente monopólio do comércio por estrangeiros
favorecidos por tratados comerciais, o aumento dos preços dos alimentos e o
recrutamento militar forçado também não eram vistos com simpatia.
Ainda de acordo com Carvalho, não se pode falar em partidos políticos no
Brasil antes de 1837, pois as organizações políticas se davam no interior das sociedades
secretas, a maioria sob a influência maçônica. Durante a Regência formar-se-iam os
dois principais partidos que dominaram a vida política do Império até o seu final: o
partido Conservador e o partido Liberal. O primeiro surgiu de uma fusão de ex-
moderados e ex-restauradores sob a liderança de Bernardo Pereira de Vasconcelos e
propunha a reforma das leis descentralizadoras num movimento chamado pelo próprio
Vasconcelos de Regresso. Já o partido Liberal se organizou no intuito de justamente
defender essas leis38.
Ilmar Rohloff de Matos analisa a polaridade partidária entre Liberais e
Conservadores, ou nos seus termos, entre Luzias e Saquaremas, partindo não só de suas

37
José Murilo de Carvalho. Op. Cit., p. 250.
38
Idem, p. 204.

33
semelhanças e diferenças, como também por meio de hierarquizações entre eles39.
Durante esses anos de conflito por todo o país as facções liberal e conservadora
utilizaram-se de discursos diferenciados que pareciam reivindicações distintas. Os
Liberais retoricamente eram federalistas, defendiam a autonomia local, exigiam a
supressão do Poder Moderador e do Conselho de Estado e opunham-se ao Senado
vitalício e a intromissão do governo na economia. Eram favoráveis ao comércio livre, à
liberdade de expressão e de culto. Já os Conservadores, por sua vez, defendiam posições
opostas: poder central forte, Senado vitalício, Conselho de Estado e o catolicismo como
religião oficial.
Na prática, diante da incapacidade dos regentes em solucionarem a crise
político-econômica e restabelecerem a ordem conciliando ou minimizando as
divergências entre os grupos dominantes, as diferenças entre Luzias e Saquaremas se
encurtaram. O temor aos radicais fizera a aproximação dos Liberais moderados aos
Conservadores.
Conforme demonstra José Murilo de Carvalho em A construção da ordem,
indivíduos vinculados à posse da terra se distribuíam quase que igualmente entre os dois
partidos. O autor conclui que a maioria dos componentes do Partido Conservador fazia
parte de uma coalizão de burocratas e proprietários de terras, cuja produção era voltada
para exportação e de colonização mais antiga, como Pernambuco, Bahia e Rio de
Janeiro; ao passo que o Partido Liberal, era composto, em sua maioria, por profissionais
liberais e donos de terra de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, cujo interesse
voltava-se ao mercado interno40.
As eleições de 1836 marcaram a vitória dos Conservadores, originando o
começo do “Regresso”. A intenção do movimento regressista se constituiu na devolução
ao governo central dos poderes perdidos durante as reformas liberais. Assim, em 1840,
é reformulado o Ato Adicional e em 1841, o Código de Processo Criminal. Esse esforço
de se manter a ordem e a integridade territorial foi possível - por um lado - devido à
aliança do governo central com a alta magistratura e, por outro, com os grandes
comerciantes e proprietários da cafeicultura fluminense. Com o projeto da Maioridade,
em 1840, voltaram o Poder Moderador e o Conselho de Estado, extintos pelo Ato
Adicional.

39
Ilmar Rohloff de Matos. O tempo Saquarema. São Paulo: Hucitec, 2004, p. 144-145.
40
José Murilo de Carvalho. Op. Cit., p. 212-213.

34
Os Luzias revoltaram-se contra essas medidas centralizadoras em 1842,
porém, ao retornarem a governar em 1844, perceberam que as mesmas lhes eram úteis
no exercício do poder. O ano de 1850 seria decisivo para aprovação de leis polêmicas e
que estavam relacionadas entre si, como a abolição do tráfico e a implantação da lei de
terras, em discussão e sempre adiada desde 1843. A partir de 1852 surgiu uma política
de conciliação, na qual membros dos dois segmentos serviram juntos nos mesmos
ministérios41.
Portanto, torna-se complexo analisar a dinâmica dos dois grandes partidos
imperiais, uma vez que eram compostos por uma intrincada combinação de grupos
diversos, em termos de ocupação e de origem social e regional. O caráter ambíguo
desses partidos se evidencia ao tentar conciliar, por exemplo, idéias antagônicas tais
como centralização política e reformas sociais. Magistrados, ligados à grande
propriedade, favoreciam retoricamente a extinção da escravidão. As principais leis de
reforma social foram aprovadas por gabinetes conservadores. Os liberais propunham as
mudanças e os conservadores as efetivavam; as leis da extinção do tráfico, do ventre
livre, da abolição e a lei de terras, podem ser vistos como os melhores exemplos.
Alheio a essas disputas políticas o jovem monarca precisava ser preparado
para assumir o Brasil quando completasse dezoito anos.
Nascido em 2 de dezembro de 1825, Pedro II, apesar da aparência saudável,
não foi uma criança sadia, pois sofria de epilepsia. Segundo José Murilo de Carvalho a
palavra que melhor define sua infância é a orfandade: perdeu a mãe, D. Leopoldina de
Habsburgo, com apenas um ano. O pai, o primeiro imperador, deixou o Brasil em 1831.
Sua mãe de criação seria D. Mariana de Werna, ou Dadama, como o jovem príncipe a
chamava. Era portuguesa, viúva e muito religiosa, vindo para o Brasil em 1808 na
comitiva do príncipe regente D. João VI. Seu primeiro tutor, indicado pelo pai, foi José
Bonifácio de Andrada e Silva, mas as articulações políticas que mantinha com os
Caramurus, denominação dos partidários da restauração de Pedro I (agora o rei Pedro
IV de Portugal), fizeram com que suas relações com a Regência se tornassem
insustentáveis42. O ministro da justiça Aureliano de Sousa Coutinho (1800-1855),
liberal moderado, destituiu-o do cargo em dezembro de 1833. Com isso, Souza
Coutinho e seu grupo, conhecido por “facção áulica”, aumentaram rapidamente sua

41
Emília Viotti da Costa. Op. Cit., p. 160.
42
A origem dessa designação deriva do nome do jornal o Caramuru, fundado em 1832 no Rio de Janeiro,
porta voz dessa corrente política. Lúcia Paschoal Guimarães. In: Ronaldo Vainfas, Dicionário do Brasil
Imperial. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008, p. 118.

35
influência na Corte, principalmente através do novo tutor do imperador menino, Manuel
Inácio de Andrade Pinto Coelho (1782-1867), futuro marquês de Itanhaém, e da
indicação de seu amigo Paulo Barbosa da Silva (1774-1868) para o cargo de Mordomo
Real do Paço. Entretanto, após a queda de seu ministério, entraria em cena um
adversário seu, Bernardo Pereira de Vasconcelos, que em setembro de 1837, acumulou
em suas mãos dois ministérios. Além disso, Aureliano perdeu importantes aliados
devido à renúncia do regente Feijó e a morte prematura de Evaristo da Veiga.
Para Lilia Schwarcz, Aureliano de Souza Coutinho e Paulo Barbosa eram os
dois nomes que ditavam as regras no Paço e em tudo que dizia respeito às crianças
imperiais. Ao lado da camareira-mor, D. Mariana, que cuidava da gestão do cotidiano
do Paço, Paulo Barbosa era encarregado das finanças e dos rituais oficiais, inclusive os
envolvendo o jovem D. Pedro, e Souza Coutinho, futuro visconde de Sepetiba, era quem
exercia uma espécie de professorado político, imiscuindo-se inclusive em decisões
regenciais43.
A primeira educação de D. Pedro II esteve a cargo de nomes como o frei
Antonio de Arrábida, o pintor Simplício de Sá e o coreógrafo Luís Lacombe. Outros
mestres importantes foram: Felix Taunay, que lhe ensinava desenho, história universal,
artes, literatura antiga e grego; Araújo Viana, futuro marquês de Sapucaí, ensinava
literatura e ciências práticas, além de lhe dar conselhos políticos, ajudando-o a se
decidir, entre outros assuntos, sobre a antecipação de sua maioridade. Frei Pedro de
Santa Mariana ensinava latim, aritmética, geometria e religião; Luís Aleixo Boulanger
foi o professor de escrita, caligrafia e geografia; Lourenço Lacombe, ensinava dança;
Renato Pedro Boiret, francês e geografia; Fortunato Maziotti, música; Nathaniel Lucas,
inglês; Rochus Schüch, latim e alemão; Alexandre Antonio Vandelli, professor de
ciências naturais. O coronel Luís Alves de Lima e Silva, futuro duque de Caxias, foi seu
mestre de esgrima44.
Seguia-se um rígido regulamento previamente estabelecido pelo novo tutor,
incluindo instruções a serem observadas pelos mestres na educação literária e moral de
seu pupilo. Misturavam-se Iluminismo, Humanismo e Moralismo. Pretendia-se formar
um monarca perfeito: humano, sábio, justo, honesto, constitucional, pacifista e

43
Lilia Moritz Schwarcz. As barbas do Imperador: Dom Pedro II, um Monarca nos Trópicos. São
Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 57-58.
44
José Murilo de Carvalho. D. Pedro II. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 26-33.

36
tolerante. Um governante dedicado às suas obrigações, acima das paixões políticas e dos
interesses privados.
Seus poucos companheiros de infância foram os filhos de pessoas próximas ao
Paço, tais como Luiz Pedreira do Couto Ferraz, que depois seria presidente do IHGB,
Guilherme Schüch, tradutor da memória vencedora do concurso realizado pelo Instituto
em 1847, sobre como se deve escrever a história do Brasil, e Francisco Otaviano.
Assim, o “órfão da nação”, nos termos de José Murilo de Carvalho, com todos
os seus traumas domésticos, foi preparado para se transformar em um governante
imparcial, justo e amante das letras, portanto, o oposto do que havia sido o seu pai.

O Instituto Histórico: lugar político-social estratégico para se legitimar um projeto


de nação

“Em 1838 emfim a luta dos partidos ainda continuava renhida, o


bello céo do Brazil ainda se mostrava obumbrado por negras e
espessas nuvens; a tempestade continuava a bramir, mas o instincto
do patriotismo presentiu que breve ia chegar o prazo em que as furias
da anarchia viriam quebrar-se impotentes aos pés de um throno, cuja
base assenta no coração dos brazileiros...”45

O projeto de Nação vencedor para o Estado brasileiro, inspirado no modelo


iluminista de civilização e progresso, constituía-se na restauração do poder central,
visando consolidar a Monarquia, a manutenção da unidade territorial e a neutralização
de qualquer ameaça à grande propriedade de terra e ao sistema escravista.
Os regressistas liderados por Bernardo Pereira de Vasconcelos, congregariam
militantes do Partido Restaurador, sem causa desde 1834, ano da morte do duque de
Bragança (D. Pedro I), e remanescentes da Sociedade Defensora da Liberdade e
Independência Nacional, tais como: o marechal Torres Alvim, Francisco Viana, o
cônego Januário da Cunha Barbosa, Clemente Pereira, Fernandes Pinheiro e os
deputados Acaiaba Montezuma e Lopes Gama; todos eles estariam na lista de sócios
fundadores do IHGB. Outros fundadores ilustres, como Aureliano de Sousa e Oliveira
Coutinho, Candido José de Araújo Viana e Bento da Silva Lisboa, seriam colegas na
formação do ministério durante a gestão do Terceiro Gabinete.

45
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do primeiro secretario interino. RIHGB, Tomo 17, 1854, p.
647-8.

37
Para Lúcia Guimarães, destituídos dos postos-chave da Regência com o
avanço de Bernardo Pereira de Vasconcelos, os áulicos necessitariam:

Abrir um novo espaço na Corte. Um espaço aparentemente neutro,


que lhes permitisse transpor os jardins da Quinta, facilitando o seu
trânsito no cenário político. Neste sentido, podemos afiançar de
antemão, nada mais oportuno do que a criação da Academia. (...)
Gerada em altos conchavos, nos salões de São Cristóvão46.

No contexto de disputas pelo poder político e no anseio de aproximar o Brasil


das nações “civilizadas”, várias instituições científicas e culturais foram criadas. As
primeiras, com a chegada da família imperial, foram as faculdades de Medicina da
Bahia e do Rio de Janeiro, inauguradas já em 1808, por D. João VI. No contexto do
Primeiro Reinado (1822-1831), foram criadas a Academia Imperial de Belas Artes
(1826) e as faculdades de Direito de São Paulo e Olinda (1827), e, durante o período
regencial, o Colégio Pedro II (1837), além do IHGB e do Arquivo Público do Império,
(ambos em 1838).
O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro surgiu do interior da Sociedade
Auxiliadora da Indústria Nacional (SAIN), idealizada em 1820, mas instalada somente
em 19 de outubro de 1827, funcionando até 1904, quando foi incorporada ao Centro
Industrial de Fiação e Tecelagem do Rio de Janeiro, transformado depois em Centro
Industrial do Brasil. Entre 1833 e 1892 foi publicado o seu periódico, O auxiliador da
Indústria Nacional, cuja missão seria vulgarizar conhecimentos úteis à lavoura e às
demais atividades produtivas nacionais47.
Na sessão do dia 18/08/1838 da Sociedade Auxiliadora o cônego Januário da
Cunha Barbosa, secretário adjunto e o primeiro secretário, marechal Raimundo José da
Cunha Matos, propuseram a criação de um Instituto Histórico e Geográfico. No dia
seguinte a proposta foi aprovada por unanimidade. Em 25 de agosto o cônego propõe
que se convidassem algumas personalidades políticas para serem os sócios fundadores.
Proposta igualmente aprovada. Marcada a Assembleia Geral para 21 de outubro, às onze
horas da manhã, reunidos no salão da SAIN, sob a presidência do marechal Francisco
Cordeiro da Silva Torres Alvim, que dirigia essa instituição, foi declarado fundado o

46
Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Debaixo da imediata proteção de Sua Majestade Imperial: o
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1889). RIHGB, Tomo 156 (388), 1995, p.482.
47
Sobre a SAIN, conferir: José Luiz Werneck da Silva. A Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional,
matriz do Instituto Histórico. In: WEHLING, Arno. (Coord.). Origens do IHGB: idéias filosóficas e
sociais e estrutura de poder no Segundo Reinado. Rio de Janeiro: IHGB, 1989.

38
Instituto, contando com 27 sócios. Ato contínuo, foram escolhidos para servirem
interinamente como presidente e primeiro e segundo secretários, José Feliciano
Fernandes Pinheiro, visconde de São Leopoldo, o cônego Januário da Cunha Barbosa e
o médico Emílio Joaquim da Silva Maia, respectivamente.
Arno Wehling observa que se torna compreensível a idealização do Instituto
no interior da SAIN, cujos integrantes são vinculados à nascente cafeicultura
fluminense, dependente do trabalho escravo48. O movimento regressista seria uma
reação às medidas do regente Feijó, favorável à abolição e ao desligamento do Rio
Grande do Sul, então República de Piratini, do Estado brasileiro. A proposta de criação
do IHGB veio da aliança da elite política moderada e o grupo cafeeiro da província do
Rio de Janeiro. Conforme José Murilo de Carvalho, a sede da Corte se constituiu por
uma combinação de burocratas, formados na longa tradição absolutista portuguesa e
pelos principais teóricos e implementadores da política centralizadora; proprietários de
terras, neste caso, os preocupados com o mercado externo e os comerciantes
prejudicados pelas agitações urbanas “socialmente perigosas”49.
Porém, isto não significou que essa elite fosse monolítica, conforme já
advertira o mesmo José Murilo de Carvalho em A Construção da ordem50. Havia
divergências intra-elite. O cônego Januário, por exemplo, ao tratar da temática da
escravidão, em um programa histórico sorteado na sessão de 4 de fevereiro de 1839,
deixava bem claro o seu posicionamento:

Não sou patrono da escravidão, nem dos indios, nem dos negros; e
por isso considero a liberdade como um dos melhores instrumentos
da civilização dos povos51.

Apesar de suas palavras, o cônego concluiu o mesmo documento, dizendo que


os negros não somente embaraçam a civilização dos indios, como também retardam a
nossa propria civilização.
Arno Wehling observa que temas problemáticos como o da escravidão, mola
propulsora do Império “civilizado”, eram sempre tratados de forma “moderada”,

48
Arno Wehling. As origens do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. RIHGB, Tomo 338, 1983, p.
07-16. (citação, p. 12).
49
José Murilo de Carvalho. A Construção da Ordem: a elite política imperial. Teatro das Sombras: a
política imperial. 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006, p. 219-220.
50
Idem, p. 231.
51
Januario da Cunha Barbosa. Se a introdução dos escravos africanos no Brasil embaraça a civilização
de nossos indígenas, dispensando-se-lhes o trabalho, que todo foi confiado a escravos negros. Neste caso
qual é o prejuízo que sofre a lavoura brasileira? RIHGB, 1839, Tomo I, p. 159.

39
buscando solucioná-los a partir de critérios evolucionistas e não com o liberalismo
radical de uma ruptura52. Permaneceria a contradição, tão característica da Monarquia:
difundir a “civilização”, mas sem abrir mão da ordem pré-estabelecida. Ordem esta que
implicava na garantia da continuidade das relações entre senhores e escravos,
preservando a integridade territorial do Império e do regime monárquico constitucional.
Portanto, cabia às instituições legitimar o projeto de Nação, no qual o Instituto
Histórico seria o lócus privilegiado para se vasculhar os indícios de sua implementação,
pois representava, através de seu quadro social, uma estreita relação com a burocracia
imperial e o poder central, conforme demonstra uma análise dos 27 sócios efetivos
fundadores, mostrada na tabela a seguir:
Tabela 1: Lista dos sócios fundadores presentes na sessão inaugural
Sócios – fundadores Naturalidade Formação Função
Alexandre M. de Mariz Sarmento Portugal _______ C
Antonio Alves da Silva Pinto _______ Coimbra pl
Antonio José de Paiva G. Andrade _______ _______ C
Aureliano de Sousa O. Coutinho Brasil (RJ) Coimbra C/S/D/d
Bento da Silva Lisboa Brasil (BA) _______ C
Caetano Maria Lopes Gama Brasil (PE) Coimbra C/S
Candido José de Araújo Vianna Brasil (MG) Coimbra C/S/D/d
Conrado Jacob de Niemeyer Portugal Lisboa pl
Emílio Joaquim da Silva Maia Brasil (RJ) Paris P
Francisco Cordeiro S. Torres Alvim Portugal Lisboa C
Francisco G. Acayaba Montezuma Brasil (BA) Coimbra D
Ignácio Alves Pinto de Almeida Brasil (BA) ______ C
Januário da Cunha Barbosa Brasil (RJ) RJ D/P/
João Fernandes Tavares Brasil (RJ) Paris C
Joaquim Caetano da Silva Brasil (RS) Montpelier P
Joaquim Francisco Vianna Brasil (RJ) Coimbra C/D/
José Antonio Lisboa Brasil (RJ) Coimbra C
José Antonio da Silva Maia Portugal Coimbra C/d
José Clemente Pereira Portugal Coimbra C/D/d
José Feliciano Fernandes Pinheiro Brasil (SP) Coimbra C/S
José Lino de Moura Brasil (MG) _______ fp
José Marcellino da Rocha Cabral Portugal Coimbra pl
José Silvestre Rebello Portugal ______ cm
Pedro de Alcântara Bellegarde Brasil (RJ) RJ P
Raymundo José da Cunha Mattos Portugal Lisboa D
Rodrigo de Souza da Silva Pontes Brasil (BA) Coimbra D/d
Thomé Maria da Fonseca Silva ______ ______ fp.
Legenda: C – Conselheiro; D – Deputado; d – Desembargador; P – Professor; S – Senador; fp –
funcionário publico; pl – profissional liberal; cm – comerciante53.

52
Arno Wehling. Op. Cit., 1983, p. 16.
53
Tabela elaborada a partir da lista dos membros, publicada na RIHGB, 1839, Tomo 1, p. 156-158.
Foram consultadas também: José Vieira Fazenda. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro: subsídios

40
A intenção aqui é mostrar, através da triangulação entre os dados de
naturalidade, formação e função no aparelho estatal, o quão imbricado era a relação do
quadro social fundador com os cargos da alta burocracia imperial. Nessa exposição fica
evidente que quase a metade dos sócios fundadores foram formados na Universidade de
Coimbra. Sendo que nove escolheram a carreira jurídica. Dos 27 sócios que se reuniram
no dia 21 de outubro de 1838, pelo menos 18 ocuparam cargos políticos, à época ou
num futuro bem próximo, seja como conselheiros de Estado, senadores ou deputados.
Outro fator de destaque é que muitos desses homens de Estado eram proprietários de
terra, e consequentemente, possuidores de escravos. Há oito sócios nascidos ainda em
Portugal, fato que irá suscitar tensões quanto à nacionalidade, mesmo que o “ser
brasileiro” estava então associado não ao local do nascimento, mas ao amor à pátria e ao
amor às letras. Temos também quatro professores, um da Academia Militar e dois do
Colégio Pedro II, além do cônego Januário, professor público de Filosofia Racional.
Ao longo do ano de 1839 ingressaram mais 21 sócios efetivos e 11 honorários,
perfazendo um total de 46 membros54. A classe dos efetivos passou a contar, dentre
outros, com Euzébio de Queiroz Coutinho Matoso Câmara, que viria a ser, ministro da
justiça, senador e deputado; o conselheiro Diogo Duarte da Silva; Felix Emile Taunay,
diretor da Academia Imperial de Belas Artes e preceptor de Pedro II; o senador João
Vieira de Carvalho – conde de Lages – à época, ministro da guerra e o conselheiro
Candido Baptista de Oliveira, titular das pastas dos ministérios da Fazenda e dos
Negócios Estrangeiros.
Entre os sócios honorários, figuraram personalidades como o próprio Regente
do Império, senador Pedro de Araújo Lima; Eugene de Monglave, secretário perpétuo
do Institut Historique de Paris; o botânico Karl Phillip von Martius e os marqueses de
Maricá, Paranaguá, Baependi e São João da Palma, todos senadores do Império. Os dois
primeiros foram também conselheiros de Estado e o último, mordomo-mor da Casa
Imperial55.
Tamanha concentração de representantes do alto escalão da política, muitos
deles responsáveis pela educação do Imperador, fez com que as reuniões do Instituto

para a sua história. RIHGB, Tomo 74, 1911, p. 277-439; Olegário Herculano de Aquino e Castro. O
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro desde a sua fundação até hoje. RIHGB, Tomo 60 (2), 1897, p.
171-201 e Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Debaixo da imediata proteção de Sua Majestade Imperial: o
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1889). RIHGB, Tomo 156 (388), 1995, p. 476-478.
54
Lista dos membros do Instituto Historico e G. Brasileiro do qual é protector S. M. I. o Senhor D. Pedro
II. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 156-158.
55
Lista dos membros do Instituto, p. 157-158.

41
mais parecessem reuniões do Conselho de Ministros56. Na sessão de 19/01/1839,
Ataíde Moncorvo propôs como sócios correspondentes todos os agentes diplomáticos
brasileiros e em 04/02/1839, surgiu ainda a proposta de envio de título de membros
correspondentes a todos os presidentes das províncias, cumprindo à risca a proposta de
seus estatutos.
Assim, não é de se estranhar que em 04/05/1839, o primeiro secretário
perpétuo, propusesse que fosse solicitado ao corpo legislativo um subsídio para ajudar
nas despesas do Instituto. Sua petição foi imediatamente aprovada e remetida a uma
comissão especial, composta por Aureliano Coutinho, que iria assumir a pasta do
ministério das Relações Exteriores no ano seguinte e Araújo Viana, que então presidia
da Câmara dos deputados. Em 1839, na primeira Sessão Aniversária, o primeiro
secretário já noticiava o “bom acolhimento” da proposta por parte do governo imperial e
das Câmaras legislativas, cuja receita recebida fora suficiente para cobrir as despesas,
assim como agradecia a presença de ministros do Império e do regente Pedro de Araújo
Lima57.
Outra proposta surgiu, desta vez na Sessão Extraordinária do dia 07 de junho,
na qual José Silvestre Rebello sugeriu que se pedisse ao corpo legislativo que
autorizasse o ministro dos Negócios Estrangeiros, no caso o Conselheiro Candido
Baptista de Oliveira, a enviar um adido à Espanha e outros países a fim de copiar
manuscritos importantes relativos ao Brasil58. Aureliano Coutinho mediou o pedido de
autorização por parte do governo de Portugal para que se pudesse também copiar dos
seus arquivos os documentos interessantes à história do Brasil59. Essas propostas foram
aprovadas de imediato pelo governo e desde 1839 o Instituto manteve adidos para
percorrerem os arquivos no exterior60. Nos primeiros anos os interesses do grupo áulico
de abrir um acesso direto à Quinta da Boa Vista se materializaram, por meio da
conquista de espaço pelo caminho das letras, já que o itinerário ao Paço Imperial estava
comprometido com a presença de Vasconcellos.
No final do primeiro ano foi implementada a proposta de conferir a todos os
presidentes das associações com as quais o Instituto mantinha correspondência, o título

56
Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Op. Cit., p. 485.
57
Januario da Cunha Barbosa. Relatorio do secretario perpetuo. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 220.
58
Ata da 14ª sessão, em 07/06/1839. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 150-151.
59
Ata da 54ª sessão, em 23/12/1840. RIHGB, Tomo 2, 1841, p. 535.
60
Dentre os nomes que percorreram esses arquivos estão: José Maria do Amaral (1839-1842); Francisco
Adolfo de Varnhagen (1842-1847); Antonio Gonçalves Dias (1854-1856); João Francisco Lisboa (1856-
1863); novamente Gonçalves Dias (1864) e Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro (1852-1861).

42
de membros honorários e a seus secretários, de membros correspondentes, conforme a
deliberação estabelecida na reunião da Assembleia Geral de eleição61.
Na sessão de 21 de junho de 1841, entrou em discussão a proposta da
Comissão de Estatutos, para que se criasse uma nova classe de sócios com o título de
presidentes honorários, conferidos aos príncipes da família imperial brasileira e aos
soberanos e príncipes estrangeiros. A indicação foi aprovada de imediato e o Instituto
deliberou que o primeiro secretário levasse a decisão ao conhecimento do governo
imperial. Este aditivo aos Estatutos foi aprovado pelo Imperador, conforme se noticiou
na sessão subseqüente62.
Ao final do primeiro volume da Revista, têm-se mais uma lista dos membros
honorários e correspondentes. Dentre os honorários havia figuras como Manuel Inácio
Pinto Coelho, o marquês de Itanhaem, tutor do Imperador, o barão de Humboldt, o
visconde de Chateaubriand e o general José Inácio de Abreu e Lima, personagem que
será analisado no terceiro capítulo.
Sobre as categorias de sócios cabe um breve comentário: havia no IHGB
várias tipificações: os efetivos, que residiam na Corte, os correspondentes, que
poderiam ser brasileiros ou estrangeiros, e os honorários. Estes também poderiam ser
nacionais ou estrangeiros, porém somente conferidos a pessoas de avançada idade,
consumado saber e distinta representação, ficando dispensados dos encargos ordinários
a que estavam sujeitos os outros sócios63. No início do período republicano, no qual o
Instituto perderia seu protetor imediato, seria criada a categoria dos beneméritos;
conferidos aos sócios que para ingressar, deveriam contribuir com no mínimo dois
contos de réis, como uma ajuda financeira ao grêmio que passava por dificuldades.
Certamente o Instituto não foi bem visto pelo novo regime, principalmente
pelo vínculo histórico com a Monarquia de Pedro II, deposto em novembro de 1889.
Suspeitava-se, não sem razão, de que os principais inimigos da República faziam parte
do quadro social do IHGB. O novo regime necessitava se legitimar. Novos personagens,
novas construções identitárias, novas disputas acerca do conhecimento histórico e novos
mitos de origem precisariam ser criados.
Para Lúcia Guimarães, por muito pouco o Instituto não cerrou suas portas, no
início do período republicano, amargando por mais de uma década e meia os desfavores

61
Ata da 26ª sessão, em 10/11/1839. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 367.
62
Ata da 66ª sessão, em 01/07/1841. RIHGB, Tomo 3, 1841, p. 348.
63
Extracto dos Estatutos do Instituto Historico e Geographico Brazileiro. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 22-
23.

43
oficiais, para em seguida iniciar gradativamente a recuperação de seu prestígio64. Fato
que marcou esse divisor de águas foi a indicação e eleição para presidente da
agremiação, em 1909, de um antigo associado, José Maria da Silva Paranhos Júnior, o
barão do Rio Branco.
Mas voltando ao seu período inicial - objeto deste estudo - o Instituto admitia
seus sócios tendo como único critério a representatividade social. Dispensava-se a
apresentação de qualquer trabalho, fato que foi modificado na reforma dos Estatutos de
1850. Desde então se passou a exigir, como condição de admissão, a apresentação de
um trabalho nas áreas de História, Geografia ou Etnografia, com isso o pretendente
deveria demonstrar possuir certa suficiência literária. Isto porque, passados os anos
iniciais no qual o principal papel do IHGB foi de depositário de documentos sobre o
Brasil, seria necessário priorizar a escrita da História Geral, conforme anunciou o
cônego Januário nas primeiras reuniões.
Joaquim Manuel de Macedo, primeiro secretário de 1853 a 1856, chamou a
atenção, na Sessão Aniversária de 1853, justamente para a desproporção entre a
publicação de manuscritos antigos e a dos trabalhos dos membros do Instituto65.
Logo após a morte de Januário da Cunha Barbosa, ocorrida em 1846, a mesa
diretora pediu a Manoel Ferreira Lagos, nomeado primeiro secretário interino, que
apresentasse uma relação de todas as comissões ou sócios que estivessem com trabalhos
atrasados66. Apresentadas essas relações foram tomadas decisões a fim de resolver
definitivamente a questão67.
As mortes de Januário, seguida pela do visconde de São Leopoldo e do
príncipe D. Afonso, em 1847, parecem ter proporcionado uma profunda letargia no
IHGB. Os encontros que cada vez reunia um menor número de sócios fizeram com que,
a partir da sessão de 03/07/1847, constasse em Ata o número dos presentes e foi
aprovada uma proposta que passava as reuniões quinzenais para semanais, sempre as
quintas feiras, não sendo dia feriado. Todos esses mecanismos visavam cobrar dos
sócios um efetivo compromisso com a instituição. Por outro lado, muitos sócios
estavam com as mensalidades atrasadas.

64
Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Da escola palatina ao silogeu: Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (1889-1938). Rio de Janeiro: Museu da República, 2007, p. 19-42.
65
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do Primeiro Secretario. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 581.
66
Ata da 146ª sessão, em 18/03/1846. RIHGB, Tomo 8, 1846, p. 156.
67
Ata da 150ª sessão, em 04/06/1846. RIHGB, Tomo 8, 1846, p. 296.

44
Os anos iniciais, sob o comando do cônego, pareciam estar em largo contraste
com o marasmo dos últimos anos da década de 1840.
Essa letargia contrastou com o estado de euforia que tomou conta do Instituto
a partir de 15 de dezembro de 1849, uma data que se tornou marco do renascimento da
instituição. Trata-se da entrada repentina na sala de reuniões do jovem Imperador, então
com 24 anos. Ao que tudo indica era uma resposta a situação em que se encontrava a
agremiação: atrasos e desânimos. De imediato imprimiu-se um recado que o monarca
em pessoa transmitiu àqueles que deveriam ser os artífices da História Geral do Brasil:

Sem duvida, Srs., que a vossa publicação trimestral tem prestado


valiosos serviços, mostrando ao velho mundo o apreço que tambem
no novo merecem as applicações da intelligencia; mas para que esse
alvo se attinja perfeitamente, é de mister que não só reunais os
trabalhos das gerações passadas, ao que vos tendes dedicado quase
que unicamente, como também, pelos vossos próprios, torneis
aquela a que pertenço digna realmente dos elogios da posteridade:
não dividi pois as vossas forças, o amor da sciencia é exclusivo, e
concorrendo todos unidos para tão nobre, util, e já difficil empreza,
erijamos assim um padrão de gloria á civilisação da nossa
patria68.(grifos nossos)

D. Pedro II, após indagar sobre as finanças do Instituto, distribuiu vários


Programas Históricos para alguns sócios. Esses Programas versavam sobre temas para
serem discutidos nas sessões. Muitos deles, os mais polêmicos, não foram publicados na
Revista69. O clima de euforia do grêmio só não foi maior devido à epidemia de febre
amarela que vinha assolando a Corte desde o ano anterior.
A partir desse divisor de águas uma espécie de renascimento envolve a
instituição; as palavras pronunciadas pelo monarca serão exaustivamente repetidas,
principalmente nas Sessões Magnas Aniversárias. Isto leva a se pensar em um novo
momento para o IHGB. Momento este que pode ser extensivo também para o Império.
O ano de 1848 marcou o fim da última revolta contra o regime, a Praieira ocorrida em
Pernambuco, além dos afastamentos de Aureliano de Oliveira e Souza Coutinho e de
Paulo Barbosa da Silva das suas funções no Paço Imperial.
O imperador poderia agora, uma vez que se viu livre dessas duas personagens,
se dedicar a transformar o Segundo Reinado “digno dos elogios da posteridade”. Sua

68
Ata da 212ª sessão, em 15/12/1849. RIHGB, Tomo 12, 1849, p. 552.
69
Conferir: Fabiana Rodrigues Dias. Por entre legados e demandas: um estudo sobre os programas
históricos apresentados no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1856). Dissertação de
Mestrado em História – IFCH, UERJ, Rio de Janeiro, 2009.

45
autoconfiança pode ser evidenciada inclusive na nomeação de Pedro de Araújo Lima,
regente em 1837, agora agraciado com o título de visconde de Olinda, para um dos
ministérios. Araújo Lima, nome outrora muito representativo pelo peso político, voltava
a ingressar no complexo jogo político cujo comando figurava-se agora na pessoa do
imperador.
O processo de consolidação do Estado imperial estava completado em 1853,
ano do ministério da conciliação. O Instituto, agora sob augustos olhares, além da
imediata proteção, pode ser analisado, apesar das tensões internas, como um veículo das
ideias da Monarquia, representada pela figura do imperador. O periódico do IHGB
continuaria a ser um instrumento que ia sugerir temas, personagens e metodologias para
a escrita da tão almejada História Geral do Brasil.

46
Capítulo II

Publicar ou Arquivar? Um periódico a serviço do Império

47
A Revista do IHGB enquanto fonte e/ou objeto para pesquisa

“A collecção das nossas Revistas se tem tornado em um cofre


precioso, onde se guardam em deposito thesouros
importantíssimos; e a leitura d’ellas será muitas vezes fructuosa
para o ministro, o legislador e o diplomata, e em uma palavra
para todos aquelles que não olham com indifferença as cousas
da pátria”70.

As fontes não aparecem nos arquivos de uma forma inocente, natural. Para
Albuquerque Junior, elas são frutos de operações políticas e de sentido, produzidas no
seu tempo obedecendo a intencionalidades, ou seja, as evidências em seu próprio tempo
são fabricadas71.
Eleger periódicos como fontes e/ou objeto para a pesquisa requer alguns cuidados
metodológicos. Assim como qualquer fonte a ser trabalhada, não se pode confiar na
retórica da documentação e nem em seus discursos unificadores e homogeneizadores.
Neste sentido, Tânia Regina de Luca oferece algumas sugestões práticas no trato com
este tipo de documentação72. A primeira delas é a de se atentar para a disponibilidade
das longas séries; o que, no caso da Revista do IHGB, uma publicação ininterrupta

70
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do primeiro secretário. RIHGB, Tomo 12, p. 492.
71
Durval Muniz de Albuquerque Junior. História: a arte de inventar o passado. Ensaios de Teoria da
História. Bauru: EDUSC, 2007, p. 25.
72
Tânia Regina de Luca. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.)
Fontes históricas. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2008, p.140.

48
desde 1839 até os dias de hoje, é um dado significativo pela longevidade e pela
facilidade de acesso, já que se encontra disponível em versão digital.
Para o uso das revistas, continua a autora, é preciso observar as motivações que
levaram à decisão de dar publicidade a alguma coisa. Jean François Sirinelli observou
que uma revista é um lugar de fermentação intelectual e de relação afetiva, ao mesmo
tempo viveiro e espaço de sociabilidade. Aí reside a importância de se identificar
autores, editores, colaboradores mais assíduos e os textos selecionados para a
veiculação, assim como observar as ligações com diferentes poderes e interesses
financeiros, bem como ao público a que se destina73.
O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, por meio de sua Revista, trataria de
idealizar as diretrizes para um projeto de integração das diversas províncias à Corte, a
partir de um monopólio do saber historiográfico. Com base nas questões do tempo
presente se escolheria no passado materiais e personagens para fazerem parte dessa
história nacional.
A Revista do IHGB, inicialmente com uma tiragem de 500 exemplares,
possuía um público certo. Seus receptores imediatos seriam seus próprios sócios, que já
se aproximavam de 200, no final do primeiro ano de existência. Recebiam-nas também
as sociedades com as quais o Instituto mantinha estreita correspondência no Brasil e no
exterior, além das secretarias de governo e bibliotecas provinciais. No ano de 1889, por
exemplo, a quantidade de exemplares que circulava em instituições era de 233; 97 nas
nacionais e 136 nas estrangeiras. Nas províncias circulavam 57 exemplares, sendo que
na do Rio de Janeiro se concentrava quase a metade dos exemplares74.
A organização interna da Revista difere em sua estrutura, se comparada com a
das revistas atuais. Nos seus primeiros anos não havia uma separação dos textos por
temas ou natureza. Ela abordava, sem muita ordem, documentos históricos do passado
colonial e textos contemporâneos de autoria dos seus sócios. Espaço bem delimitado no
periódico era destinado às Atas das Sessões Ordinárias e assembleias, às biografias de
figuras consideradas como grandes personagens históricas, bem como para os
necrológios dos sócios, relatórios dos secretários e discursos dos presidentes. A Revista,

73
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René. Por uma história política. Rio de
Janeiro, Ed. da UFRJ, 1996, p. 249.
74
Conferir: Edney Christian Thomé Sanches. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro:
um periódico na cidade letrada brasileira do século XIX. Dissertação de Mestrado em Teoria e História
Literária. Campinas, UNICAMP, 2003.

49
publicada trimestralmente, trazia uma paginação continuada com o objetivo de, ao final
do ano, seus quatro números formassem um único volume.
O cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro, 16 anos à frente da primeira
secretaria (1860-1876), a partir de 1864 dividiu a Revista em duas partes, A primeira, se
destinava à publicação das memórias históricas do passado colonial e a segunda,
reservava-se espaço para as produções inéditas dos sócios, além das Atas das sessões
Ordinárias e Sessões Aniversárias. Essa divisão nem sempre era respeitada, muitas
vezes publicava-se documentos na segunda parte, o que evidencia uma das
características que marcava uma agremiação composta por um número elevado de
políticos: uma baixa produtividade intelectual.
A Revista, até pela sua longevidade, sofreu algumas mudanças na forma de
apresentar o título, as epígrafes, as vinhetas. Também sofreu alterações na sua
periodicidade, séries, numeração, circulação e tiragem. Até 1850, por exemplo, trazia no
título, uma hesitação entre Revista e Jornal, o que, para Edney Sanches, evidencia a
sutil diferenciação entre esses gêneros à época do lançamento do periódico e mesmo
depois de algum tempo de circulação75. Várias tipografias encarregaram-se de imprimir
a Revista do IHGB, durante o Segundo Reinado, como a Laemmert e Garnier, até que a
partir de 1894, ficaria a cargo da Imprensa Nacional, responsável até hoje pela sua
publicação76.
Como mostrado numa das citações que foram usadas neste trabalho, além da
preocupação com a moderna escrita da história, o IHGB tratou de vincular-se ao
imperador D. Pedro II, pedindo a sua imediata proteção. A primeira sede do IHGB,
conforme visto anteriormente, foi o prédio da Sociedade Auxiliadora da Indústria
Nacional (SAIN), uma entidade que visava o desenvolvimento da agricultura e da
indústria nacionais, cujos sócios fundaram o Instituto Histórico. Em 1839 o título da
Revista era: Revista trimestral de Historia e Geographia ou jornal do Instituto
Historico e Geographico Brasileiro, fundado no Rio de Janeiro sob os auspicios da
Sociedade Auxiliadora da Industria Nacional. No ano seguinte incorporou a frase
Debaixo da imediata proteção de S. M. I. o Senhor D. Pedro II, passando a utilizar as
instalações no Paço Imperial, e a partir de 15 de dezembro de 1849 a presença do
Imperador tornava-se constante nas reuniões.

75
Edney Christian Thomé Sanches. Op. Cit., p. 97.
76
Idem, p. 56.

50
Os encontros quinzenais do IHGB seguiam a um ritual, dividido em duas
partes. Na primeira, denominada de Expediente, se faziam as leituras de aprovação da
Ata da reunião anterior e das doações de documentos por parte dos sócios. Eram lidas
também cartas enviadas pelos sócios ou por associações congêneres. Depois, passava-se
ao segundo momento, a Ordem do Dia, na qual geralmente se lia um Programa
Histórico, previamente sorteado na urna, ou indicado pelo Imperador. Analisavam
também pareceres e juízos sobre obras diversas e se discutiam os critérios para
admissão de sócios, que sofreram algumas alterações ao longo do período monárquico.
Inicialmente bastava o convite e a aprovação da comissão de admissão. Após a reforma
dos estatutos de 1851, precisava uma demonstração de certa suficiência literária, ou
seja, apresentar um trabalho de história, geografia ou etnografia para ingressar na
instituição.
Uma rígida seleção do material era efetuada pelas diversas comissões de
trabalhos. Assuntos da história contemporânea, geralmente tinham como destino o
arquivo. Temas do passado colonial, principalmente sobre os indígenas, as viagens de
exploração ao interior e as histórias das províncias eram publicadas de imediato. Esta
seleção se estabelecia por critérios teórico-metodológicos, mas também (e
principalmente) critérios políticos.
O brasilianista Rollie E. Poppino, em 1953, observou que trabalhos sobre a
História totalizaram 45% do material publicado no primeiro século de existência da
Revista do Instituto, enquanto que trabalhos de Geografia e Geologia 18%, as
Biografias, 16% e as áreas de Antropologia e Etnologia, apenas 5%. Em seguida o autor
dividiu o conteúdo de História em cinco partes: política, social, religiosa, militar e
econômica. Dividiu também cronologicamente em quatro períodos de aproximadamente
25 anos: 1839-1864; 1865-1889; 1890-1914 e 1915-193877.
Aproveitando os dados proporcionados, quanto ao intervalo temporal entre
1839-1889, pôde-se inferir que durante esse período a circulação da Revista no Segundo
Reinado a seção de história política ocupou um total de 90% das publicações sobre essa
área do conhecimento, enquanto que a Social, 42%; a Religiosa, 38%; a Militar, 16% e
a Econômica, 14%.
Das produções de âmbito historiográfico dos associados, destacam-se os temas
do Descobrimento e da Independência. Tais escolhas estavam associadas à busca de

77
Rollie E. Poppino. Um século da revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. RIHGB, Tomo
314, 1977, p. 285-305.

51
marcos da gênese da nação. Em um passado distante temporalmente estavam os
elementos fundadores da nacionalidade, e a Independência tornava-se o marco de uma
abertura epistemológica, um evento a partir do qual todo o passado colonial podia ser
compreendido como a formação da nacionalidade78. Para Valdei Lopes Araújo, a
Independência foi definida como princípio organizador da narrativa histórica, marcado
pela continuidade da Casa de Bragança, porém sem a possibilidade de se confundirem
as duas nações, portuguesa e brasileira. Nas páginas da Revista do IHGB firmava-se a
compreensão de que os sentimentos de identidade nacional e o próprio processo de
independência política estiveram sempre presentes ao longo da história colonial79.
Ao elaborar um estudo precursor sobre o IHGB, Manoel Salgado Guimarães
analisou esta instituição articulada com a ideia de construção da nação e civilização no
Brasil Imperial. Em relação à Revista, afirmou que ela se constituía em um espaço
privilegiado para se rastrear o projeto ambicioso do Instituto Histórico, pois além de
registrar as suas atividades por meio de relatórios, divulgar cerimônias e atos
comemorativos diversos, suas páginas se abriram à publicação de fontes primárias como
forma de preservar a informação nelas contidas de artigos, biografias e resenhas de
obras80.
O mesmo autor observou também a incidência de três temas predominantes no
interior da RIHGB, a saber: 1) a questão da “problemática” indígena; 2) as viagens e
explorações ao interior do território e 3) o debate sobre a história regional. Em muitos
artigos esses temas se entrecruzavam, particularmente os dois primeiros. Essas três
temáticas, responsáveis por 73% das publicações, indicam, pois, quais assuntos estavam
em evidência à época.
Com relação aos indígenas, faltava uma definição do Instituto a esse respeito,
principalmente quanto à catequização e também sobre a melhor forma de
aproveitamento como mão de obra. Esse problema se entrelaçava com outro tema de
difícil resolução aos membros do IHGB: o negro, pois a introdução dos escravos
africanos no Brasil, nos termos do primeiro secretário perpétuo, “embaraçaria a
civilização” dessas sociedades indígenas. Como já observado, o cônego Januário
conclui que, de fato, os negros servem de embaraço à civilização dos indios; e o que

78
Valdei Lopes Araújo. Op. Cit., p. 155.
79
Idem, p. 160.
80
Manoel Luiz Salgado Guimarães. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro e o projeto de uma história nacional. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, n. 01, 1988, p. 20.

52
mais é, servem não pouco de retardar a nossa propria civilização. Para o secretário só
pela catequese, se podem desentranhar os indígenas de suas matas e trazê-los aos
primeiros caminhos da civilização81. Francisco Adolfo de Varnhagen condenava a
importação do negro pelo número expressivo de escravos que havia no Brasil, um receio
devido ao levante de escravos no Haiti, ocorrido no final do século XVIII, na qual
acarretou a emancipação política desse país. Para o diplomata, a continuar o tráfico no
Brasil, os netos dos negros serão os senhores dos netos dos brancos. Dessa forma, a
nação brasileira deveria ter os escravos deportados, os índios utilizados como mão de
obra e o Brasil necessitava passar por um processo de europeização através da vinda de
estrangeiros82.
Já no primeiro Tomo da Revista, aparece uma breve notícia sobre os “índios
cavaleiros”, os Guaikuru, com descrição de seus costumes e das hostilidades que
praticavam aos portugueses, e traz ainda informações sobre os costumes dos índios
Tupinambá no litoral83. Dessa forma, muito antes do indianismo romântico de escritores
como Gonçalves de Magalhães, Gonçalves Dias e José de Alencar, surgiu no Instituto
um “indianismo erudito”, materializado no interesse em se conhecer e quantificar essas
sociedades, numa perspectiva etnográfica ou na sua incorporação ao processo
civilizatório84.
Sobre o tema das viagens de exploração ao interior, foram publicados na Revista
muitos diários e descrições pormenorizados que tratavam de visitas a regiões
consideradas “remotas”. Estes materiais evidenciavam o propósito do IHGB em trazer
informações que ajudariam os seus leitores a conhecer os vastos territórios e suas
fronteiras. Partindo desses esquadrinhamentos efetuados durante o século XVIII,
tentava-se legitimar divergências fronteiriças e mensurar os limites da nova nação.
A ênfase na história regional – entendendo o sentido de regional como a
representação da Corte sobre as diversas províncias do Império – justifica-se pela

81
Januario da Cunha Barbosa. Se a introdução dos escravos africanos no Brasil embaraça a civilização
de nossos indígenas, dispensando-se-lhes o trabalho, que todo foi confiado a escravos negros. Neste caso
qual é o prejuízo que sofre a lavoura brasileira? RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 159-72.
82
Francisco Adolpho de Varnhagen. Memorial orgânico. Citado por: Laura Nogueira. Os índios bravos e
o Sr. Visconde: os indígenas brasileiros na obra de Francisco Adolfo de Varnhagen. Dissertação de
Mestrado em História. UFMG, Belo Horizonte, 2000, p. 93-94.
83
Francisco Rodrigues do Prado. História dos índios cavaleiros ou da nação Guaykuru, escrita no Real
Presídio de Coimbra ...– ano de 1795. RIHGB, 1839, Tomo I, p. 25-57 e Descrição geográfica da
América portuguesa... – 1587. (S/ autoria). RIHGB, 1839, Tomo 1, p. 201-28.
84
Arno Wehling. Historicismo e concepção de história nas origens do IHGB. In: ____ (Coord.). Origens
do IHGB: idéias filosóficas e sociais e estrutura de poder no Segundo Reinado. Rio de Janeiro: IHGB,
1989, p. 46.

53
necessidade de integração territorial. A história regional seria então elaborada a partir
do Rio de Janeiro, centro da Monarquia brasileira, fundamentada nas informações dos
quatro cantos do Império enviadas à Corte. O Instituto desenvolveu uma política de
coleta de documentos no interior do Brasil e também no exterior, elegendo, de imediato,
como sócios correspondentes os presidentes das províncias, assim como diplomatas
brasileiros em diversos países, além do livre acesso aos ministérios imperiais.
Lúcia Guimarães, por sua vez, abordou o conteúdo veiculado na RIHGB
segundo a divisão em documentos contemporâneos e não contemporâneos. Tendo como
objetivo avaliar a produção intelectual dos consócios do Instituto, durante o Segundo
Reinado, a autora fez uma distinção entre Memória (documentos coligidos do passado
distante) e História (produção contemporânea dos sócios). Sua conclusão foi a de que a
quantidade dos documentos não contemporâneos publicados foi maior do que o triplo
dos escritos contemporâneos, o que a levou a afirmar que os intelectuais do IHGB se
esmeraram no que diz respeito à Memória. Quanto à História, eles deixaram a desejar85.
Para essa quantificação a autora não considerou os necrológios dos sócios, que eram
redigidos pelos oradores nas Sessões Aniversárias, justificando que cabia ao próprio
associado em vida fornecer as informações que julgasse relevantes. Tampouco levou em
consideração no seu inventário os relatórios dos primeiros secretários, os discursos dos
presidentes e as biografias das “distintas personalidades”.
É bem verdade que o Instituto se dedicou a construir um banco de memórias
cuja visibilidade se deu a partir da publicação na sua Revista. Esses vestígios do
passado eram selecionados em arquivos no Brasil e no exterior e submetidos aos
métodos da crítica documental. A grande maioria desses temas contemplava o período
colonial, porém, havia espaços do periódico nos quais apareciam as manifestações
“contemporâneas” dos sócios acerca da concepção de história a ser seguida. É
justamente nas biografias, nos elogios históricos e nos discursos e relatórios que se
fixavam pressupostos metodológicos e preferências políticas. Esses procedimentos de se
privilegiar indivíduos e episódios, ou seja, escolher vultos nacionais para
protagonizarem a história pátria e formas de se produzir a escrita da história, denotam
que discursos e relatórios, bem como os elogios aos mortos manifestavam-se

85
Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Debaixo da imediata proteção de Sua Majestade Imperial: o
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1889). RIHGB. Rio de Janeiro, ano 156, n. 388, jul./set.
1995, p. 513.

54
disseminados em diferentes partes do periódico e eram submetidos às regras da
operação historiográfica.
Isto se tornará mais claro à medida que forem analisados os diversos temas
veiculados na Revista. Para tal procedimento, foram realizados detalhados fichamentos
temáticos nos quais se privilegiou categorias que sugerissem ou induzissem à
construção histórica, dentre elas foram incluídas: Biografias, Necrológios, Relatórios
dos primeiros secretários e Discursos de presidentes. Destacou-se também, no que se
refere à lógica de publicação, os trabalhos relativos às províncias - tanto os assuntos do
passado remoto, quanto os recentes - ou seja, aqueles temas que foram “absolvidos”
pelo Tribunal da Posteridade. Ao sistematizar estes dados, observou-se que houve
algumas, em verdade poucas, exceções à regra determinada pelo Instituto de não dar
visibilidade a acontecimentos contemporâneos, cujos personagens envolvidos ainda
encontravam-se vivos.
Neste contexto, os trabalhos que conseguiram espaço no periódico do Instituto
foram analisados enquanto resultados das lutas de representação, nos termos de Roger
Chartier, no interior do grêmio. Um procedimento que Michel de Certeau denominou
operação historiográfica, com seus ditos e não ditos; constituindo dessa maneira, um
lugar social de produção discursiva, qual seja, o centro do Império, uma sociedade de
Corte articulada aos propósitos do Estado monárquico referentes à construção nacional.
Tornam-se interessantes as publicações referentes às províncias durante o período
estudado pela articulação entre a data de publicação desses temas das histórias regionais
e os contextos históricos vividos pela Monarquia.
Deste modo, pode-se afirmar que predominava entre os intelectuais do IHGB,
aliado ao projeto de nação por parte da Monarquia, o desejo de se construir uma
“História”; absoluta, científica e moderna. Em si e para si; que rompesse com a
historiografia antiga e medieval e as “histórias” dos tempos anteriores, designando
assim um singular coletivo, nos termos de Reinhart Koselleck86. Dessa forma,
fundamentava-se a identidade da nação, visando, no plano interno, manter a unidade
territorial e, no externo, legitimar a condição singular de governo monárquico em meio
às Repúblicas.

86
KOSELLECK, Reinhart. História, histórias e estruturas temporais formais. In: ________. Futuro
Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC – Rio,
2006, p. 119.

55
O Tribunal da Posteridade: a História deve ser imparcial e isenta das paixões do
tempo presente

“O coração do verdadeiro patriota brazileiro aperta-se dentro no


peito quando se vê relatados desfiguradamente até mesmo os
modernos factos da nossa gloriosa independência. Ainda estão
elles ao alcance de nossas vistas, porque apenas dezeseis annos
se tem passado dessa época memoravel da nossa moderna
historia, que accrescentou no Novo Mundo um esperançoso
imperio ao catalogo das nações constituidas, e já muitos se vão
obliterando na memoria daquelles a quem mais interessam, só
porque tem sido escriptos sem a imparcialidade e necessario
criterio, que devem sempre formar o caracter de um veridico
historiador”87.

Numa pesquisa com um largo intervalo temporal torna-se interessante fornecer


alguns dados para o leitor acerca dos nomes dos sócios que ocuparam cargos e que
constantemente discursavam na casa. Vale ressaltar que os respectivos discursos
possuíam lugar garantido nas páginas do periódico.
A seguir, oferece-se uma listagem dos sócios que estiveram à frente dos trabalhos
do IHGB, durante os primeiros cinqüenta anos de existência, apenas como um recurso
para facilitar a visualização geral do quadro social e perceber alterações nas cinco
divisões, em períodos de dez anos, efetuadas para a apresentação e análise dos dados:

Tabela 2: Presidentes
Presidentes Titulação Gestão
José Feliciano Fernandes Pinheiro Visconde de São Leopoldo 1839-1847
Candido José de Araújo Vianna Marquês de Sapucaí 1847-1875
Luiz Pedreira do Couto Ferraz Visconde do Bom Retiro 1875-1886
Joaquim Norberto de Sousa e Silva 1886-1891

87
Januario da Cunha Barbosa. Discurso. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 11.

56
Tabela 3: Primeiros Secretários
Secretários Gestão
Januário da Cunha Barbosa 1839-1846
Manoel Ferreira Lagos 1846-1851
Francisco Adolfo de Varnhagen 1851
Joaquim Manoel de Macedo 1852-1856
Manoel de Araújo Porto-Alegre 1857-1859
Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro 1860-1876
José Ribeiro de Sousa Fontes 1877-1881
Manoel Duarte Moreira de Azevedo 1882-1886
João Franklin da Silveira Távora 1887-1888
Barão Homem de Mello 1889-

Os primeiros secretários perpétuos eram os responsáveis pelo andamento da


agremiação. O cônego Januário, por exemplo, foi diretor da comissão que elaborou os
primeiros estatutos, chefe da comissão de redação da Revista, da biblioteca e do arquivo.
Varnhagen, no curto período de permanência na primeira secretaria, organizou a
biblioteca e passou as Atas, que vinham após os números trimestrais, para o final do
volume. O cônego Fernandes Pinheiro, à frente da secretaria por 16 anos, como visto, a
partir de 1864 dividiu a Revista em dois volumes, publicados semestralmente. Nas
Sessões Magnas os secretários elaboravam relatórios minuciosos dos trabalhos realizados
durante o ano corrente, nos quais selecionavam nomes e feitos que mais lhes conviessem.
Os elogios de Januário e as restrições de Macedo à Varnhagen, por exemplo, (analisadas
no próximo capítulo), foram pronunciadas durante a leitura desses relatórios, assim como
concepções acerca da escrita da história, algumas delas utilizadas como epígrafes ao
longo deste trabalho.

Temas Regionais
A ocorrência de temas regionais, localizados nas províncias do Império, segue
uma lógica de se arquivar os assuntos da contemporaneidade e de se publicar documentos
sobre o passado colonial que trouxessem informações para a legitimação e consolidação
da unidade territorial brasileira, além de fatos e personagens “dignos” de lembrança e
exemplos a serem seguidos.

57
Tabela 4: Ocorrência das províncias na RIHGB (1839-1889)
Província/Período 39-49 50-59 60-69 70-79 80-89 Total Observações
Rio de Janeiro 20 15 09 11 19 74
Espírito Santo 12 02 02 02 ____ 18
São Paulo 14 04 04 07 05 34
Minas Gerais 16 02 07 03 04 32 Desmembrada de SP em 1720
Mato Grosso 19 13 25 08 02 67 Desmembrada de SP em 1748
Goiás 11 02 02 01 02 18 Desmembrada de SP em 1736
Paraná 03 02 04 ____ 03 12 Desmembrada de SP em 1853
Santa Catarina 03 ____ 01 01 05 Desmembrada do RS em 1822
Rio Grande do Sul 02 12 08 07 10 39
Amazonas 13 05 02 03 05 28 Desmembrada do PA em 1850
Pará 16 04 06 04 01 31
Maranhão 07 03 ____ 08 09 27
Piauí 01 02 ____ 03 01 07 Desmembrada do MA em 1811
Ceará ____ 01 05 04 02 12 Desmembrada de PE em 1799
Rio Gde. do Norte ____ 02 01 ____ ____ 03 Desmembrada de PE em 1817
Paraíba 03 ____ 02 06 ____ 11 Desmembrada de PE em 1799
Bahia 28 03 02 02 07 42
Sergipe ____ ____ 01 ____ ____ 01 Desmembrada da BA em 1821
Pernambuco ____ 03 16 06 09 34
Alagoas 01 04 01 ____ 03 09 Desmembrada de PE em 1817
Total 474

Numa rápida olhada a este gráfico nota-se que há uma predominante presença do
Rio de Janeiro nas páginas da Revista do IHGB, 74 menções! O que surpreende é que
no período estudado a segunda província cuja presença era constante foi Mato Grosso.
A leitura deste gráfico, entre outros pontos, evidencia a preocupação para com a história
regional. O fato de Mato Grosso aparecer tão seguidamente na Revista, assim como Rio
Grande do Sul, Pará e Amazonas, regiões de fronteira nacional, deixa em evidência a
preocupação do Estado imperial com os assuntos relacionados à delimitação das raias
fronteiriças. E isto fica mais patente quando se verifica, no caso de Mato Grosso, sua
presença nos volumes publicados no período que antecedeu a Guerra da Tríplice
Aliança com o Paraguai (1864-70)88.

88
Conferir principalmente: RIHGB, Tomo 20, 1857; RIHGB, Tomo 25, 1862, e RIHGB, Tomo 28,
1865,. Disponível em: http://www.ihgb.org.br/rihgb.php

58
Entretanto, após o término do conflito até o final do período imperial, em 1889,
Mato Grosso perde a ênfase na Revista, cedendo lugar para outras regiões como
Pernambuco e Rio Grande do Sul. Acontece que essas regiões não se fizeram tão
presentes na Revista, nos primeiros anos de sua publicação, já que àquela época eram
cenários de conflitos contra a ordem estabelecida pelo governo no Rio de Janeiro.
Pernambuco pela Revolução de 1817 e a Confederação do Equador, em 1824 e o Rio
Grande do Sul pelo Movimento Farroupilha (1835-1845). Muitos dos personagens que
participaram nestas revoltas ainda estavam vivos e alguns deles faziam parte do
Instituto, como por exemplo, o sócio fundador Raimundo José da Cunha Matos (1776-
1839). No seu elogio histórico, no primeiro volume da Revista, o orador evidenciou
justamente a participação do marechal de campo na Revolução Pernambucana, de 1817.
A história das diversas províncias foi abordada nas páginas da Revista segundo
uma perspectiva centralizadora e “regional” – a partir da Corte –, a fim de reafirmar
uma ligação orgânica entre as regiões e o centro político do Império. Segundo Manoel
Salgado Guimarães, tratava-se de selecionar nos temas da história regional elementos
que corroborassem uma perspectiva centralizante, respaldada pelo conhecimento da
História entre as diversas partes integrantes da nação89.
Nesse sentido, é interessante o parecer da Comissão de História sobre um
documento, ofertado ao Instituto pelo general José Inácio de Abreu e Lima (1796-1869),
acerca da participação do então governador de Pernambuco Caetano Pinto de Miranda
Montenegro (1748-1827) no conflito de 1817:

Conquanto um tal documento seja na verdade de muito preço,


não convém todavia publicá-lo pelo comprometimento que sua
publicação poderia levar a pessoas ainda existentes; e por isso
a Comissão é de parecer que o sobredito documento seja
guardado nos arquivos do Instituto até que todos os nomes
nesse documento mencionados tenham comparecido perante o
Tribunal da Posteridade90.

Porém, esse mesmo Tribunal não condenou um trabalho do médico e poeta


Domingos José Gonçalves de Magalhães (1811-1882) intitulado Memoria historica e
documentada da revolução da provincia do Maranhão desde 1839 até 1840, premiado

89
Manoel Salgado Guimarães. A RIHGB e os temas de sua historiografia (1839-1857) Fazendo a história
nacional. Conferência pronunciada no IHGB em 14/09/1989. In: Arno Wehling, Arno. (Coord.). Origens
do IHGB: idéias filosóficas e sociais e estrutura de poder no Segundo Reinado. Rio de Janeiro: IHGB,
1989, p. 36.
90
Ata da 29ª sessão, em 19/12/1839. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 379.

59
pelo IHGB em 1847 e publicado já em 1848. Magalhães na qualidade de secretário do
então presidente dessa província, Luís Alves de Lima e Silva (1803-1880), encarregava-
se de registrar os feitos do futuro duque de Caxias ao sufocar a Insurreição denominada
“Balaiada”, cujos chefes eram um vaqueiro cafuzo – Raimundo Gomes, um “fazedor de
balaios” e um negro – Dom Cosme. A origem social dessas personagens sugere o
motivo pelo qual esse assunto delicado passou pelas comissões do IHGB.
No entanto quando a mesma dupla Magalhães e Lima e Silva estiveram no Rio
Grande do Sul, com o intuito de sufocar o movimento farroupilha, um pela pena e outro
pela espada, o relato do futuro visconde do Araguaia não foi publicado. Segundo Lúcia
Guimarães, o conflito no sul envolvia estancieiros e charqueadores, com complicações
internacionais91. Somente a partir de 1880 a Farroupilha vai aparecer na Revista, por
iniciativa de Tristão de Alencar Araripe, fundamentado nas observações de Gonçalves
de Magalhães da década de 184092.
A Bahia, antiga sede do governo lusitano, esteve em destaque nos anos iniciais de
circulação da Revista. As temáticas versavam sobre o passado colonial: tribos
indígenas, projetos de estradas, relatórios sobre minas e principalmente informação
sobre uma “antiquíssima cidade abandonada”. Uma das primeiras fixações do Instituto
foram pesquisas no intuito de se descobrir ruínas de civilizações nos moldes das
encontradas na América espanhola, cujas notícias indicavam a existência de ruínas pré-
cabrálicas no interior da Bahia. Tal assunto foi tratado na Relação Historica de uma
occulta e grande povoação antiquissima, sem moradores, que se descobriu no anno de
1753, nos sertões do Brazil.93.

Sobre os acontecimentos contemporâneos


Uma das regras mais rígidas do Instituto, a de não dar publicidade aos
acontecimentos contemporâneos, sempre esteve ameaçada por projetos para que não se
deixasse de registrar os fatos da jovem Monarquia e inseri-los no conjunto de matérias
veiculadas na Revista.
A primeira ideia de se preservar acontecimentos recentes, valendo-se inclusive do
uso de “fontes orais fidedignas” partiu do conselheiro Euzébio de Queirós Coutinho
Mattoso Câmara, na qual se devia convidar Joaquim Gonçalves Ledo, José Clemente

91
Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Op. Cit., p. 534.
92
Tristão de Alencar Araripe. Guerra civil no Rio Grande do Sul. RIHGB Tomos 43 (1880), 45 (1882) e
47 (1884).
93
RIHGB, Tomos 1 (1839), 3 (1841), 6 (1844), 7 (1845) e 10 (1848).

60
Pereira e Januário da Cunha Barbosa a fim de coligir e escrever tudo aquilo que possa
esclarecer ao historiador sobre a gloriosa época da nossa independência94. O cônego
Januário, na sessão de 18/05/1839, propôs que se indicassem dois sócios a fim de
elaborarem uma espécie de efemérides, notando por dia os fatos de maior interesse para
a história do Brasil. Na sessão de 01/08/1840, Clemente Pereira sugeriu a criação de um
livro intitulado Crônica do Senhor Pedro II e que se nomeasse uma comissão de cinco
membros para coligir e coordenar os fatos mais notáveis ocorridos durante o ano para
serem apresentados nas sessões de aniversário. Desses projetos o único que vingou foi o
das efemérides, que passaram a ser lidas semestralmente, porém, como era de se
esperar, não foram publicadas.
Outra manifestação da história contemporânea foi a edição de um volume
suplementar da Revista, contendo composições dos sócios, dedicadas à morte prematura
do príncipe D. Affonso em 1847, herdeiro da Coroa, aos dois anos de idade. O primeiro
secretário Manoel Ferreira Lagos informou que os trabalhos seriam submetidas à
votação antes de serem impressos. Uma das produções, a do médico Bento Mure (1809-
1858), foi barrada no escrutínio secreto. A mesa diretora assim se manifestou após a
votação: o discurso do Sr. Mure, não só por conter muitas ideias extemporâneas e
ofensivas na sua parte prosaica, mas ainda por se achar já impressa a parte poética, o
que vai de encontro ao programa publicado pelo Instituto. Depois de uma “animada
discussão”, de acordo com o relator da Ata dessa sessão, vem o veredito: Que sejam
impressos todos os trabalhos lidos na assembleia de 1º de julho, menos o do Sr. Mure95.
O parecer do IHGB motivou uma intensa troca de cartas entre o médico, que
exigiu a restituição do manuscrito, e o primeiro secretário, que exigiu a devolução do
diploma de sócio. Diante do impasse, o Instituto deliberou que se devolvesse o texto,
desde que ficasse arquivada uma cópia do mesmo, porém, Bento Mure não devolveu o
diploma, justificando o respeito que consagrava a quem o enviou e assinou, assim como
ao Instituto que o teria adotado sem nenhuma solicitação de sua parte96. O médico
estava se referindo a Januário da Cunha Barbosa, secretário, falecido no ano anterior,
que antecedeu Manoel Ferreira Lagos97.

94
Ata da 10ª sessão, em 20/04/1839.
95
Ata da 171ª sessão, em 03/07/1847.
96
Ata da 173ª sessão, em 22/07/1847.
97
O texto de Bento Mure encontra-se disponível no arquivo do Instituto Histórico. Conferir: La mort de
S. A. I. Don Alphonse: ode par le docteur B. Mure. Arquivo IHGB, lata 119, pasta 07.

61
Em 1863, o sócio Felizardo Pinheiro de Campos viu a necessidade de compor uma
obra cujo titulo era: Fastos do feliz e glorioso reinado do Sr. D. Pedro II. Apesar da
indicação do próprio monarca de se escrever sobre os fatos de seu reinado e das intensas
referências, expressas nas Atas, acerca dos temas contemporâneos como as “rebeliões”
regenciais e o processo de independência, a comissão de trabalhos históricos decidiu
pelo arquivamento, achando a iniciativa desaconselhada, desnecessária e
inconveniente98.
Pinheiro de Campos na sessão de 03/07/1863 reformulou sua proposta, agora sob
o enunciado: Bosquejo do atual reinado desde a aclamação da maioridade de S. M. I.
ou apontamentos para a história do Brasil. O primeiro secretário Joaquim Fernandes
Pinheiro assim se manifestou sobre a iniciativa: razões imperiosas, que já submetti ao
vosso discernimento, impoem-me silencio a respeito d’este trabalho do nosso colega99.
Durante o conflito no Prata entre a Tríplice Aliança e o Paraguai, o Tribunal da
Posteridade esteve bem flexível às publicações de trabalhos contemporâneos, quase que
simultaneamente aos acontecimentos. Em 1869, por exemplo, o visconde de Taunay,
orador do Instituto, teve publicada a sua memória Viagem de regresso de Mato-Grosso
á côrte. No ano seguinte saiu no periódico uma memória que havia sido lida na sessão
de 03/10/1869, o combate da ilha do cabrita, do primeiro secretário Manoel Duarte
Moreira de Azevedo, uma narrativa de um episódio da guerra na qual se evidenciava a
coragem dos combatentes brasileiros, por meio de pequenas biografias100.
Apesar da não publicação da grande maioria, estes temas da história
contemporânea eram lidos e discutidos nas sessões, evidenciando as preocupações com
a história do tempo presente, as quais podem ser encontradas somente nos arquivos do
Instituto, no Rio de Janeiro.

98
Ata da sessão de 08/05/1863.
99
Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro. Relatório do 1º secretario. RIHGB, Tomo 28, 1865, p. 335.
100
Alfredo d’Escragnolle Taunay. Viagem de regresso de Mato Grosso á côrte. RIHGB, Tomo 32, 1869,
p. 5-52. Manoel Duarte Moreira de Azevedo. O combate da ilha do cabrita. RIHGB, Tomo 33, 1870, p.
5-20.

62
A Revista – lócus da memória: temáticas “sugeridas” para a escrita histórica da
nação

“Nós vamos salvar da indigna obscuridade, em que jaziam até


hoje, muitas memorias da pátria, e os seus nomes de seus
melhores filhos; nós vamos assignalar, com possivel exactidão,
o assento de suas cidades e villas mais notáveis, a corrente de
seus caudalosos rios, a área de seus campos, a direcção de suas
serras, e a capacidade de seus innumeraveis portos”101.

“Não ha mais historia contemporânea, o dia de hontem parece


ja bem longe abysmado na sombra do passado. As perspectivas
recuam quando a grandeza e a multidão dos objectos e dos
acontecimentos se interpoem entre o olhar e a memória”102.

As duas citações postas acima como epígrafe exemplificam dois distintos


momentos no discurso do IHGB; enquanto a primeira espelha a preocupação em tirar a
pátria da obscuridade, a segunda epígrafe denota uma mudança no comportamento do
Instituto na década de 1850 referente à história contemporânea. Alguns sócios sempre
buscavam abordar temas do passado recente, mas eram barrados pela comissão de
redação, principalmente quando esta esteve nas mãos do cônego Januário da Cunha
Barbosa, ou de seu sucessor, Manoel Ferreira Lagos. O próprio Imperador não via
problemas em se abordar a contemporaneidade dos fatos, afinal, desde a sua primeira
participação nas sessões, em dezembro de 1849, tratou de estimular a apresentação de
trabalhos e a elaboração de uma história de seu reinado para a posteridade, como visto
no primeiro capítulo.
Na Revista a produção intelectual dos consócios, acerca da escrita da História,
constituiu-se em uma minoria se comparada com os documentos do período colonial,
ainda mais se não forem levadas em consideração as Biografias dos brasileiros distintos
e os Elogios históricos dos sócios falecidos. Em vista destas constatações, foram
incluídas, na análise das modalidades temáticas veiculadas no periódico, essas duas
categorias de produção, já que além do número expressivo de ocorrência na Revista,
sujeitavam-se igualmente aos procedimentos da operação historiográfica.

101
Januario da Cunha Barbosa. Discurso. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 12.
102
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do 1º secretario. RIHGB, Tomo 19, 1856, p. 107.

63
Biografias dos brasileiros distintos

Tabela 5: Biografias dos brasileiros distintos por letras, armas, virtudes, etc.
Período Biografias publicadas
1839-49 72
1850-59 12
1860-69 24
1870-79 31
1880-89 30
Total: 167

Pela tabela anterior percebe-se que o IHGB priorizou a produção de biografias de


personalidades ilustres do passado a fim de servir de exemplo aos brasileiros do
presente. A elaboração das biografias permaneceu como uma prática que esteve
presente em todos os períodos. O expressivo número na primeira década de
funcionamento do Instituto sugere a incorporação da categoria biografia ao projeto de
elaboração da narrativa nacional. O mesmo frenesi em se coligir documentos da história
pátria se verificou com a seleção de personagens a serem biografados. Entre 1850 e
1859 houve uma significativa queda nessas produções. Em 1851 aparece apenas uma
biografia publicada e entre os anos de 1853 e 1858 elas praticamente desaparecem do
periódico, salvo em 1855 e 1856, nos quais saíram à luz apenas quatro biografias.
Um dos motivos pelo súbito afastamento das biografias da Revista pode ser
identificado ao verificar os temas publicados nesses anos. Houve uma ênfase em dar
visibilidade a assuntos relacionados a regiões de fronteira como Rio Grande do Sul e
Mato Grosso, que foram palcos da guerra com a República do Paraguai, bem como
começaram a sair dos arquivos as primeiras memórias sobre os conflitos regenciais em
Pernambuco e no Rio Grande do Sul.
Maria da Glória Oliveira chama atenção para alguns aspectos na análise da seção
de biografias da RIHGB: a primeira delas é o título em aberto “etc.”, ao final do longo
título, marcado por variações que, de imediato, sugerem impasses e hesitações dos seus
colaboradores, principalmente quanto à demarcação da nacionalidade dos eleitos para a
posteridade103. O título da seção, oscilando entre brasileiros ilustres e indivíduos
ilustres, permitia a inserção de biografados que não fossem brasileiros de nascimento

103
Maria da Glória Oliveira. Traçando vidas de brasileiros distintos com escrupulosa exatidão: biografia,
erudição e escrita da história na RIHGB (1839-1850). História, São Paulo, v. 26, n. 1, 2007, p. 154-178.

64
assim como legitimava biógrafos que estavam tendo sua nacionalidade questionada,
como é o caso de Francisco Adolfo de Varnhagen, o membro do IHGB que mais
produziu biografias, num total de vinte e quatro.
Na escrita biográfica de 1843 sobre José Fernandes Vieira, português de
nascimento, o futuro visconde de Porto Seguro já advertia que o Instituto deveria
publicar também biografias de varões illustres, que posto não sejam brasileiros por
nascimento, todavia o são por acções gloriosas, e por haverem passado grande parte
de sua vida n’este paiz104.
Para Lilia Schwarcz, a biografia é um gênero que constitui uma forma específica
de se fazer história, uma história pautada em nomes e personagens, e que se concentrava
na elaboração de nobiliarquias e genealogias para elites agrárias sedentas de títulos que
as aproximassem das antigas aristocracias europeias105.
Além de Varnhagen, outros sócios se destacaram na contribuição nessa parte da
Revista, são eles: os primeiros secretários Januário da Cunha Barbosa, Joaquim Caetano
Fernandes Pinheiro e Manuel Duarte Moreira de Azevedo, com 11, 9 e 8 biografias
respectivamente, além dos historiadores Joaquim Norberto de Sousa e Silva, com 7 e
João Manuel Pereira da Silva, com 5. Desse expressivo número do gênero, apenas cinco
mulheres figuraram nessa galeria, quatro trazem a autoria de Joaquim Norberto de
Sousa e Silva, futuro presidente do IHGB. A outra biografia, a da poetisa fluminense
Narciza Amália teve como autor o escritor e sócio correspondente Luiz Francisco da
Veiga. As quatro “ilustres brasileiras” biografadas por Joaquim Norberto distinguiram-
se pelas armas. Rosa Maria Siqueira e Maria Ursula de Abreu Lencastre tiveram suas
biografias publicadas em 1841. A primeira combateu corsários argelinos na costa
africana em 1713, em nome do rei de Portugal e da fé cristã, a segunda embarcou para
Lisboa em 1700 e assentou praça de soldado sob o nome de Balthazar do Couto
Cardozo. Enviada para a Índia prestou relevantes serviços bélicos à Coroa portuguesa,
distinguindo-se pela coragem. A biografia de Clara Fillipa Camarão surgiu no periódico
em 1848 e a de Damiana da Cunha, em 1861. Trata-se de duas filhas dos bosques
brasileiros, nos termos de Joaquim Norberto, Damiana era neta de um cacique Cayapó e
foi responsável pelo aldeamento de centenas de indios arrancados das brenhas, e que

104
Francisco Adolpho de Varnhagen. Biographia dos brasileiros distinctos por lettras, armas, virtudes,
etc. José Fernandes Vieira. RIHGB, Tomo 5, 1843, p. 82.
105
Lilia Moritz Schwarcz. Os Institutos Históricos e Geográficos guardiões da História oficial. In: ____ O
espetáculo das raças: Cientistas, Instituições e Questão Racial no Brasil (1870-1930). São Paulo:
Companhia das Letras, 1993, p. 109-110.

65
vinham, submissos gozar dos frutos da civilização e da paz106. Clara Fillipa lutou contra
os Holandeses em Pernambuco ao lado de seu marido Fillipe Camarão.
Algumas biografias eram extraídas de outros periódicos como O Panorama, o
Ostensor Brasileiro, Jornal do Comércio e Minerva Brasiliense, ou mesmo de obras
como a Biblioteca Lusitana do abade Diogo Barbosa Machado. Estes trabalhos estavam
sujeitos às críticas e pareceres antes de figurarem no periódico do IHGB e muitas vezes
se publicavam aditamentos para corrigir erros que porventura passassem despercebidos
na primeira publicação.
A seção destinada às biografias era vedada aos sócios, porém, isto não impediu
que alguns deles tivessem seus nomes ao lado das ilustres personalidades, como foram
os casos do visconde de São Leopoldo, do Marquês de Sapucaí (os dois primeiros
presidentes da casa), do cônsul geral da Rússia Henrique Julio de Wallestein e de nomes
como, Balthazar da Silva Lisboa, Manoel Odorico Mendes, Domingos José Gonçalves
de Magalhães, Antonio Francisco Dutra e Mello, José Eloy Pessoa e Joaquim Caetano
da Silva.
Aos sócios falecidos era reservado um outro espaço no periódico, localizado aos
finais das sessões aniversárias por meio dos discursos dos oradores oficiais do grêmio.
Cabia também aos oradores o pronunciamento de um discurso fúnebre na cerimônia de
sepultamento dos consócios. Esses rituais que se repetiam anualmente eram realizados
publicamente e ganhavam publicidade na Revista. Uma forma de promoção da
instituição e de seus artífices, o elogio dos mortos e a consagração dos vivos107.
A seguir, os oradores oficiais durante o mecenato imperial de Pedro II:

Tabela 6: Oradores
Oradores Gestão
Pedro d’Alcantara Bellegarde 1839-1840
Diogo Soares da Silva de Bivar 1841-1843
Manoel de Araújo Port-Alegre 1844-1846
Joaquim Manuel de Macedo 1857-1882
João Franklin Silveira Távora 1883-1886
Alfredo d’Escragnolle Taunay 1887-

106
Joaquim Norberto de Sousa e Silva. Biographia dos brazileiros distinctos por letras, armas, virtudes,
&c. RIHGB, Tomo , 1861, p. 530.
107
Maria da Glória Oliveira. Op. Cit., p. 162.

66
Entre as temáticas contempladas no periódico, além dos assuntos envolvendo a
história das províncias, destacam-se alguns que se tornaram presentes desde as
primeiras reuniões, mas nem todos foram a público.

Temas para a História do Brasil

Tabela 7: Temas para a História do Brasil na RIHGB


Temas / Período. 1839-49 1850-59 1860-69 1870-79 1880-89 Total
Viagens de reconhecimento 51 30 29 14 ____ 128
Indígenas 22 16 04 01 07 48
Negro / Escravidão 02 01 ____ ____ 01 04
Guerra ____ ____ 01 06 ____ 07

No primeiro meio século de publicação, houve uma nítida preferência por


evidenciar as incursões ao interior do território brasileiro. Era imprescindível o
conhecimento das províncias consideradas distantes, ainda mais se seus territórios
servissem de fronteira nacional, que mediavam a linha de limites das terras pertencentes
às ex-colônias espanholas. Essa temática de fronteira, quase sempre se entrecruzava
com outros temas abordados, mais diretamente com questões relacionadas a indígenas.
Era necessário se conhecer os usos, costumes e territórios habitados por essas
sociedades a fim de integrá-las como mão de obra, usando-se o eufemismo de “civilizá-
las”.
Essa busca pelo conhecimento do interior e pela legitimação dos territórios
conquistados à Espanha se deu de forma mais contundente nos primeiros anos, durante
a fase de afirmação da Monarquia. A partir da década de 1850, fase da consolidação do
Império, esses números foram gradativamente diminuindo.
Visivelmente um grupo não teria espaço na formação da nação, de acordo com as
publicações: o negro. Dos cinco trabalhos que figuraram no periódico, dois deles
referem-se à destruição do Quilombo dos Palmares, outros dois foram temas de
Programas Históricos desenvolvidos por Januário da Cunha Barbosa e José Silvestre
Rebello. Para o primeiro secretário, o negro estava embaraçando a civilização do

67
indígena e para Rebello, a culpa não era apenas dos semibrutos escravos, mas também,
e, principalmente á ignorancia dos feitores108.
No ano da lei Áurea e do jubileu do Instituto (1888), saiu publicada a Extincção
da escravidão no Brasil. Nesse texto – sem autoria declarada - aparece o decreto da
princesa Izabel, libertando os cativos e a transcrição dos discursos de alguns dos
membros do IHGB proferidos no Paço. Nestes, em tom de elogio à “iniciativa” da
regente e aos feitos do Conde d’Eu nos campos do Paraguai, durante a guerra, a
comitiva tratou o fato como um desdobramento das ações de políticos, sócios do
Instituto, como o visconde do Rio Branco, autor da lei de 1871 e do finado sócio
Agostinho Marques Perdigão Malheiro, que pela sua obra A escravidão no Brazil, lida
diversas vezes nas reuniões, mas não publicada, teria lançado os fundamentos da
extincção do captiveiro109.

Pareceres das obras e Programas Históricos

Tabela 8: Pareceres das obras e Programas Históricos publicados


Temáticas / Períodos 1839-49 1850-59 1860-69 1870-79 1880-89 Total
Juízos e Pareceres de obras 11 13 ____ ____ ____ 25
Programas Históricos 08 06 01 ____ ____ 15

Os Programas Históricos constituíam-se por temas históricos considerados como


“duvidosos”, que eram desenvolvidos pelos sócios nas sessões, sorteados, ou então,
indicados pelo Imperador, a partir de sua participação nas reuniões. O interessante é que
só uma pequena parcela dos assuntos discutidos foi publicada nas páginas do periódico
do IHGB. Pelas Atas, percebe-se um total de 60 Programas desenvolvidos e discutidos
nas sessões ordinárias. Desses, apenas 15 tiveram publicidade durante o Segundo
Reinado110.
Inicialmente os Programas eram sorteados e um dos sócios voluntariamente se
encarregava de desenvolvê-lo nas reuniões subsequentes. O acúmulo de temas e a
omissão dos associados fizeram com que eles passassem a ser designados pela mesa
108
Januário da Cunha Barbosa. Se a introdução dos escravos no Brazil embaraça a civilização dos
indigenas, &c. A mesma matéria foi desenvolvida pelo sócio effectivo José Silvestre Rebello. RIHGB,
Tomo 1, 1839, p. 159-172
109
S/ autoria. Extincção da escravidão no Brasil. RIHGB, Tomo 51, 1888 (1), p. xvii-xxvii.
110
Conferir: Fabiana Rodrigues Dias. Por entre legados e demandas: um estudo sobre os programas
históricos apresentados no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1856). Dissertação de
Mestrado em História. UERJ, Rio de Janeiro, 2009.

68
diretora, ou, a partir de 1849, pelo próprio Pedro II. Na sua primeira participação na
sessão ordinária, o jovem imperador já ordenou que fossem desenvolvidos os
Programas já aprovados e distribuiu mais quatro temas para os sócios desenvolverem o
mais breve possível111.
Entre os publicados, figuram temáticas como a periodização da história do Brasil,
catequização indígena, modos de obtenção de documentos nas províncias, origem da
cultura do anil, Amazonas no Brasil, animais trazidos pelos conquistadores, plantas
exóticas aclimatadas e ocorrência de terremotos no Brasil.
Porém, entre os que foram lidos nas sessões, mas não publicados, encontram-se
Programas sobre: a forma de administrar os índios pelos jesuítas; se os poetas
românticos impedem o desenvolvimento da poesia nacional; a origem da raça dos
ciganos e sobre a introdução de estrangeiros para as minas de ouro.
Há também os que foram sorteados e/ou designados, mas não chegaram a ser lidos
e muito menos publicados, entre eles temas como: história dos indígenas; vestígios de
civilização anterior a chegada dos portugueses; se os escravos são tratados com maior
ou menor cuidado do que outros países; efeitos imediatos da mudança da corte;
primeiros americanos a tentarem obter a independência; motivo do atraso da
colonização no Rio de Janeiro; inexistência de tipografias no Brasil e a suspeita do não
auxílio de Lisboa para com a guerra da Restauração de Pernambuco dos holandeses.
Os Juízos e Pareceres, uma preocupação do IHGB em avaliar a produção sobre o
Brasil, contribuíram também para apontar caminhos que levassem à construção da
narrativa histórica nacional, ainda por fazer.
Com relação aos pareceres, havia os que foram lidos e discutidos nas sessões e
vieram à público, os que foram apenas lidos mas não publicados e os que foram
ignorados, ou seja, nem lidos, muito menos saíram no periódico. Como exemplo do
primeiro caso, tem-se um parecer sobre o trabalho de José Joaquim Machado de
Oliveira (1790-1867) sobre os limites entre Brasil e Uruguai. Para o segundo caso, a
análise de Manoel Ferreira Lagos sobre a viagem do conde de Castelnau e para o último
caso, obras como Le Brésil, de Ferdinand Denis e a História Geral do Brasil, de
Varnhagen simplesmente ficaram sem manifestações por parte do Instituto.

111
Ata da 212ª sessão, em 15/12/1849.

69
A seguir serão analisados os dois primeiros casos. Quanto ao terceiro, qual seja, o
da negligência da comissão de História, se tratará principalmente da obra máxima de
Varnhagen, assunto do próximo capítulo.

Obras comentadas e publicadas


Uma grande polêmica tomou conta da sala de reuniões do IHGB em torno da
memória de Machado de Oliveira112. Fazendo uma longa digressão sobre os Tratados de
limites entre as Coroas ibéricas, e depois entre o Império brasileiro e o Uruguai, criticou
a intervenção armada na Banda Oriental e enfatizou que o Brasil foi prejudicado pela
perda de territórios devido ao estipulado no Tratado de limites de 12/10/1851.
O primeiro parecerista, o conselheiro Duarte da Ponte Ribeiro, declarou que a
memória não era condizente com a atuação do Império no Prata e recomendou ao
Instituto que não desse assentimento a essa reflexão, contrária à retidão que caracteriza
a política brasileira113. O segundo parecer, de autoria do também conselheiro Candido
Baptista de Oliveira, em defesa do autor da memória, declarou ser o trabalho digno do
apreço do Instituto e para o futuro historiador114.
Gonçalves Dias entrou no embate, analisando tanto a memória de Machado de
Oliveira como o parecer de Ponte Ribeiro, porém posicionando-se em favor da
memória: conclúo que não se affastará o Instituto de nenhum principio de rectidão e
justiça, mostrando-se indulgente para com a “memoria historica” do nosso digno
collega o Sr. Machado de Oliveira115.
A atitude do autor dos Timbiras levou Duarte da Ponte Ribeiro a apresentar uma
defesa do seu parecer, acompanhado por vários apensos que comprovavam sua
argumentação116. Pedro de Alcântara Bellegarde entrou no debate com espírito
conciliador, observando alguns pontos sobre os Tratados de limites, rogando ao Instituto
que aparte toda discussão que azede os espíritos e estabeleça desconfianças. Em
seguida, sugere que se nomeie uma comissão a fim de elaborar uma coleção de todos os

112
José Joaquim Machado de Oliveira. Memoria historica sobre a questão de limites entre o Brazil e
Montevidéo. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 393-432.
113
Duarte da Ponte Ribeiro. Parecer sobre a memória do Sr. José Joaquim Machado de Oliveira, lida na
sessão do Instituto Histórico de 17 de junho de 1853. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 435-460.
114
Candido Baptista de Oliveira. Parecer sobre a memória do Sr. José Joaquim Machado de Oliveira,
ácêrca da questão de limites entre o Brazil e Montevidéo. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 473-477.
115
Antonio Gonçalves Dias. A memoria historica do Sr. Machado de Oliveira e o parecer do Sr. Duarte
da Ponte Ribeiro. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 478-514.
116
Duarte da Ponte Ribeiro. Defeza do parecer sobre a memoria historica do Sr. Machado de Oliveira.
RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 515-554.

70
Tratados, convenções, notas, declarações ou quaisquer outros atos relativos aos
limites117.
Cerca de um mês depois da apresentação da defesa do parecer, Gonçalves Dias
apresentou uma resposta, na qual concluiu que as reflexões de Baptista de Oliveira e as
Notas de Bellegarde arrematavam em sentido quase idêntico a memória de Machado de
Oliveira e sugere ao Instituto que ache a referida memória de utilidade, ainda que
alguns fatos precisem ser retificados 118.
Diante de tantos impasses acerca dessa disputa de memória, a mesa diretora
decidiu que todos os textos fossem impressos no mesmo número da Revista, sem
interpor juízo algum sobre a matéria. Dessa forma o Instituto ratifica a sua postura
imparcial diante de assuntos polêmicos119. Na Sessão Aniversária, ao final desse ano,
Joaquim Manuel de Macedo, primeiro secretário, assim se referiu às discussões
ocasionadas pela memória de Machado de Oliveira:

As nossas sessões ordinarias foram durante todo o anno social


celebradas com perfeita regularidade, e se fizeram
recommendaveis pela apresentação e leitura de excellentes
trabalhos, e por discussões meditadas e profundas, que
lançaram grande cópia de luz sobre alguns pontos da historia
patria, e das nossas questões de limites120.

Obras discutidas e não publicadas


Outro episódio interessante ilustra o interesse exacerbado sobre um determinado
assunto somente nas reuniões ordinárias, mas sem nenhuma intenção de torná-lo
público. Trata-se do alvoroço que se formou no IHGB acerca da expedição científica
francesa, comandada por Francis Castelnau (1810-1880), pelo interior do Brasil, entre
os anos de 1843 e 1845.
O conde de Catelnau mantinha o Instituto a par de sua exploração no interior do
território brasileiro, por meio de cartas. A que chegou de Lima, escrita em 20/02/1846,
foi transcrita na ata da sessão de 09/07/1846. Na missiva, o viajante relata a travessia do
117
Pedro de Alcântara Bellegarde. Notas. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 555-557.
118
Antonio Gonçalves Dias. Resposta do Sr. A. Gonçalves Dias á Defesa do Parecer sobre a Memoria do
Sr. Machado d'Oliveira. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 558-572.
119
Para uma análise mais aprofundada dos Pareceres e Juízos, conferir: Adriano Augusto Sgrignero. Em
busca da originalidade e unidade da nação: razões e critérios para uma História Geral do Brasil
segundo os Pareceres e Juízos publicados pela RIHGB (1838-1860). Dissertação de Mestrado em
História. UNICAMP, Campinas – SP, 2010.
120
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do 1º secretario. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 580.

71
continente, descrevendo a exploração pelos rios Araguaia, Tocantins, Cuiabá, depois
pelo São Lourenço e Paraguai, no qual entre os diversos canais, ilhas e baías desse
labirinto aquático o explorador acreditou ter achado um rio ainda desconhecido dos
geógrafos, o qual o batizou com o nome de rio Pedro II, em honra ao Imperador
brasileiro121.
Em 1851 o primeiro secretário Manoel Ferreira Lagos comunicou a chegada do
primeiro volume da obra do conde de Castelnau, e já informava que, como continha
muitas inexatidões, propunha que se formasse uma comissão para examiná-la. Aprovada
a proposta, foi indicado para esse trabalho, Joaquim Manuel de Macedo122.
O próprio Macedo quando assumiu a secretaria observou em relatório apresentado
na Sessão Magna de 1853, as imprecisões do viajante francês: (...) commetendo
inexatidões históricas, e acabando finalmente por ufanar-se até de ter sido o primeiro a
navegar em rios, que desde longa data haviam sido explorados123.
Manoel Ferreira Lagos começou a ler a análise da viagem do conde francês a
partir de maio de 1855, leitura que se estendeu durante 11 sessões seguidas. Na sessão
de final de ano Macedo, assim referiu-se a Castelnau:

O Sr. Ferreira Lagos não se contentou em um simples e breve


juízo, que poderia ser laudativo ou contrario ao merito da obra
sujeita á sua fina e profunda critica; não: acompanha passo a
passo o viajante francez atravez das nossas provincias por elle
vizitadas: dá-lhe a mão sempre que o vê tropeçar, e isso
acontece muitas vezes: aponta um a um os erros numerozos que
comete, marca-lhe os fatos que inventa; prova-lhe o
conhecimento antigo, que nós temos de algumas das suas
pretendidas descobertas; vinga-nos da maledicencia, e com um
sopro vigorozo de potente lógica desfaz as creações
imaginarias, que o conde de Castelnau quer fazer correr mundo
com fóros de realidades. (...) mostra desfilando em estravagante
revista a multidão de absurdos, de incongruências e
contradições, e não poucas vezes de immerecidas injurias, com
que desfiguram e calumniam o Brazil, homens que escondem o
que vêem, que improvizam o que não existe, e que para
escrever invocam a muza da mentira124.

121
Ata da sessão de 09/07/1846. RIHGB, Tomo 8, 1846, p. 405-411.
122
Ata da 226ª sessão, em 09/05/1851. RIHGB, Tomo 14, 1851, p. 462.
123
Joaquim Manuel de Macedo. Relatório do 1º secretario. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 600.
124
Joaquim Manuel de Macedo. Relatório do 1º secretario. RIHGB, Tomo 18, 1855, p. 506-507.

72
Até o presidente do Instituto, um cargo mais figurativo, e que dificilmente emitia
críticas, não se conteve:

Em breve Srs., a Revista oferecerá á vossa estudioza


curiosidade erudita e engenhoza analize da viagem do conde de
Castelnau, d’essa viagem inçada de inexactidões, crespa de
erros e frequentemente adversária da verdade nas couzas de
nossa terra125.

No ano de 1856, Lagos continuou a analisar a obra de Castelnau e na Sessão


Magna, novamente o presidente da casa ratificou que em breve a engenhosa crítica da
viagem do conde será franqueada ao público da Revista. O secretário Macedo informou
que somente nesse ano a análise de Lagos chegou ao seu termo. O primeiro secretário
ao dar a notícia do término da leitura e análise dessa obra, repleta de imprecisões,
demonstrou, perante o Imperador, que havia chegado a hora de se planejar uma viagem
científica ao interior do país, executada por seus filhos.
Tal procedimento sugere a hipótese de que a utilização negativa da viagem do
conde francês e pelas constantes críticas, durante praticamente dois anos, foi uma forma
de se conseguir patrocínio para uma expedição nacional a fim de explorar as províncias
do norte e nordeste do país. A proposta de se criar uma comissão de brasileiros partiu do
próprio Ferreira Lagos em 1856 e em janeiro de 1859 a expedição partiu do Rio de
Janeiro em direção ao Ceará126.
Após a análise das temáticas selecionadas para compor as edições do periódico do
IHGB, pode-se inferir que apesar da ênfase na história do passado colonial e da busca
de se constituir um acervo documental – uma espécie de “Monumenta Brasílica” –, o
Instituto procurou, em seus diversos momentos, deixar claro o tipo de história que
deveria ser escrita, a partir da seleção cuidadosa dos fatos para serem lembrados e das
personagens dignas de entrar para a galeria das biografias dos brasileiros ou indivíduos
ilustres. Os pontos ainda obscuros da história eram discutidos e elucidados nas
“acaloradas” reuniões, em forma de Programas Históricos, os Elogios aos sócios
falecidos eram realizados como forma de se perpetuar a própria memória do Instituto,
através das realizações de seus componentes. Uma lógica de publicação acerca das
províncias do Império obedecia a articulação entre o conteúdo do texto selecionado e o

125
Candido José de Araújo Vianna. Discurso do prezidente. RIHGB, Tomo 18, 1855, p. 480.
126
Sobre a expedição cientifica nacional, conferir: Maria Margaret Lopes. “Mais vale um jegue me
carregue, do que um camelo que me derrube”...lá no Ceará. Manguinhos, vol. 3, 1996, p. 50-64.

73
contexto político vivido pelo Império. O passado deveria fornecer respostas para as
demandas do tempo presente.
O fato das regiões envolvidas em conflitos de contestação da ordem imperial
serem vetadas pela comissão de história ou de redação nas duas primeiras décadas do
Segundo Reinado ou serem estimuladas a publicação com certa regularidade nas duas
décadas finais, ilustra bem essa lógica: a publicação ou o arquivamento de temas
regionais, cujas províncias foram palco de movimentos separatistas, ia de encontro ao
projeto de unidade nacional que a Revista devia estimular, assim como divulgá-las num
determinado momento, após o término da guerra no Prata e à época do lançamento do
Manifesto Republicano podia servir de alerta para uma possível realidade trazida pelos
ideais republicanos, agora muito mais fortes do que no período regencial.

74
Capítulo III

A Revista do IHGB: instrumento para forjar a nação

75
Embates em torno da escrita da História Geral do Brasil: o cônego e o marechal

“O Brazil guarda nas entranhas de suas terras, e assim nos peitos de


seus filhos e sinceros amigos, thesouros preciosos, que devem ser
aproveitados por meio de constantes e honrosas fadigas. Sem
trabalho, sem persistência nas grandes emprezas, jamais se
conseguirá a gloria que abrilhanta os nomes dos bons servidores da
patria. A geographia é a luz da historia, e a historia, tirando da
obscuridade as memórias da pátria, honra por isso mesmo aos que lhe
consagram constantes desvelos. Eia, Srs., não esmoreçamos á vista
das grandes difficuldades que sahirão ao encontro de nossos
designios; fitemos os olhos no bem dos nossos patrícios, na gloria da
nossa nação, na nossa própria honra, e nós celebraremos todos os
annos o dia anniversario do Instituto Histórico e Geographico
Brazileiro, de que somos creadores, apresentando ao publico,
relatórios dignos da sua attenção pelos úteis trabalhos que
fizermos”127.

Neste capítulo busca-se analisar o periódico do IHGB enquanto instrumento de


legitimação de um projeto do Estado brasileiro para forjar a nação. Essa identificação
com o Estado só se tornou plena a partir da década de 1850, com uma relativa
estabilidade política e com o começo da participação efetiva do Imperador nas questões
de Estado, conforme visto no primeiro capítulo. Cabe lembrar que ao ser criado, em
1838, o IHGB buscava coligir, metodizar, publicar ou arquivar os documentos
necessários para a história e geografia do Império do Brasil. Além disso, se propunha
manter correspondências com sociedades estrangeiras de igual natureza e se ramificar

127
Januario da Cunha Barbosa. Discurso. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 20-21.

76
pelas províncias do Império, através da criação de núcleos regionais, para mais fácil
desempenho dos fins aos quais se objetivava128.
Para que estes projetos fossem cumpridos, seus sócios, ou seja, as principais
personagens que comandavam o Instituto, como José Feliciano Fernandes Pinheiro
(1774-1847), presidente; Januário da Cunha Barbosa (1780-1846), primeiro secretário
perpétuo, e Raimundo José da Cunha Matos (1776-1839), vice-presidente,
empenhavam-se ferrenhamente na consecução dos objetivos propostos.
A principal figura responsável pelo andamento deste primeiro momento do
IHGB sem dúvida foi o cônego Cunha Barbosa. Nascido no Rio de Janeiro em 10 de
julho de 1780, este personagem concluiu em 1801 seus estudos religiosos no Seminário
Episcopal do Rio de Janeiro. Depois, esteve em Portugal durante quatro anos
aperfeiçoando seus conhecimentos, porém pode-se dizer que sua formação foi toda no
Brasil. Foi sim um representante da elite brasileira, não chegando a entrar em contato
com a administração do mundo luso brasileiro tal como seu companheiro Cunha Mattos
ou o próprio José Bonifácio. Com a chegada da Corte portuguesa ao Brasil, Cunha
Barbosa foi nomeado pregador régio da recém criada Capela Real do Rio de Janeiro.
Em 1809 chegou a Lente da Cadeira de Filosofia Racional e Moral da Corte, uma
espécie de curso preparatório para alunos interessados em ingressar na Universidade de
Coimbra.
Além de pregador e membro da loja maçônica Grande Oriente, o cônego
destacou-se na política e no jornalismo. No jornal Reverbero Constitucional
Fluminense, que criou junto com Joaquim Gonçalves Ledo, em 1821, disseminou ideias
favoráveis à independência. Acusado de traição por José Bonifácio por divergências
políticas (acusado de republicanismo), foi preso e depois exilado durante um ano,
quando esteve em Paris. Ao regressar, após a queda dos Andradas, foi eleito deputado
pelo Rio de Janeiro em 1826 e também dirigiu a Tipografia Nacional e o periódico
Diário do Governo. Aliás, sua atividade como jornalista continuou em o Mutuca
Picante, fundado em 1834 onde travou uma luta com o jornal o Sete de Abril, de
Bernardo Pereira de Vasconcellos. Durante toda a sua vida Cunha Barbosa pertenceu a
diversas instituições culturais do Brasil e do exterior e publicou várias obras. Além de
seus “tratados metodológicos” publicados nas páginas da Revista do IHGB, foi autor do
livro o Parnaso brasileiro ou Coleção das melhores poesias dos poetas do Brasil, tanto

128
Extrato dos Estatutos do Instituto Historico e Geographico Brazileiro. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 22-
23.

77
inéditas como já impressas (1829-1830), uma espécie de antologia de poetas nativos, na
qual procurava traçar um quadro da literatura nacional, produzida por brasileiros de
nascimento129. Tratava-se de um estímulo à mocidade que já começava a trilhar a
estrada das belas letras, quase abandonada nos últimos vinte anos dos acontecimentos
políticos, nas palavras do cônego130.
Nos últimos anos de vida foi diretor da Biblioteca Nacional e primeiro
secretário do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, entidade criada por ele
juntamente com o marechal Raimundo da Cunha Matos. Januário da Cunha Barbosa foi,
além de idealizador do IHGB, o grande protagonista desta agremiação nos primeiros
anos, definindo diretrizes para que os objetivos da mesma fossem contemplados.
Para Valdei Lopes de Araujo, o Parnaso Brasileiro já lança a ideia que serviu
de opção a toda uma geração, a trilha das letras como alternativa à disputa política. As
letras como sendo capazes de apaziguar ânimos e os partidos em luta. Enfim, um
antídoto contra os males causados pela disputa do poder político entre diferentes
grupos131.
Na primeira sessão do IHGB, o cônego e primeiro secretário perpétuo do
Instituto, lançou três propostas norteadora dos procedimentos políticos e metodológicos:

1) Proponho que o Instituto peça a S. M. I. que aceite o titulo de seu


protector.

2) Proponho que se organise uma instrucção sobre o modo de haver


noticias historicas e geographicas acerca do Brazil, para remeter aos
nossos correspondentes, e poder melhor delles haver os manuscriptos
e outros objectos que nos possam ser uteis.

3) Proponho que na proxima sessão entre já em discussão o ponto


seguinte: - Determinar-se as verdadeiras épocas da historia do Brazil,
e se esta se deve dividir em antiga e moderna, ou quaes devem ser
suas divisões132.

Tais propostas, aprovadas unanimemente pelos sócios presentes, são


reveladoras enquanto evidências de uma preocupação em se coletar documentos para
abastecer uma memória, uma preocupação com a periodização da história, separando o

129
Vicente Tapajós. Dicionário biobibliográfico de historiadores, geógrafos e antropólogos brasileiros;
sócios falecidos entre 1839 e 1860. Rio de Janeiro: IHGB, 1998, p. 27-28.
130
Januário da Cunha Barboza. Parnaso Brasileiro, ou Coleção das melhores poesias dos poetas do
Brasil, tanto inéditas, como já impressas. Citado por Araújo, 2008, p. 108.
131
Valdei Lopes de Araujo. A experiência do tempo: conceitos e narrativas na formação nacional
brasileira (1813-1845). São Paulo: Hucitec, 2008, p. 107-117.
132
Januario da Cunha Barbosa. Ata da 1ª sessão em 01/12/1838. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 57.

78
antigo do moderno, além de garantir acesso ao Paço Imperial, por meio da aproximação
com o jovem Pedro II.
As primeiras produções dos sócios publicadas na Revista traduziram então, os
anseios e os receios dos consócios do Instituto, no momento de sua implantação.
O texto que inaugura o primeiro volume da Revista, publicado em 1839, é de
autoria de Januário da Cunha Barbosa, que foi o responsável pela edição da Revista até
a sua morte em 1846. Nele o cônego destaca a necessidade de se salvar da indigna
obscuridade, em que jaziam até hoje, muitas memorias da patria133. Para Cunha
Barbosa, antes da escrita da história era necessário se constituir uma memória para a
nação, por meio de um minucioso inventário em arquivos estrangeiros e nas províncias.
Uma história que fosse geral e filosófica, elaborada por um historiador comprometido
com a Monarquia brasileira, capaz de apontar os erros de que estavam saturadas muitas
obras sobre o Império do Brasil.
Em resposta a esta solicitação do secretário perpétuo, durante a terceira sessão
do Instituto, em janeiro de 1839, o marechal de campo, Raimundo José da Cunha Matos
leu a sua Memória sobre as épocas da história do Brasil, abordando a maneira de
escrever a história antiga e moderna do Império do Brasil134, documento que trazia
algumas sugestões para a escrita histórica da nação. Segundo Cunha Matos, a história
do Império brasileiro deveria ser uma história geral e filosófica. A historia só pode ser
composta por filósofos, dizia ele135. E, segundo afirma, os melhores materiais para
escrevê-la seriam os monumentos: inscrições abertas em lâminas de pedra e metálicas,
cartas de sesmarias, diplomas legislativos, cartas imperiais ou régias, termos de posse
dos governadores, bispos, magistrados, oficiais municipais136. O marechal propôs
então, três divisões ou épocas para a história do Brasil: a primeira, sobre os Aborígines
ou Autóctones; a segunda sobre o Descobrimento do Brasil e a terceira época, que
versava sobre a Independência política137.
Percebe-se um forte vínculo da concepção de história em Cunha Matos com a
tradição iluminista do XVIII, porém já disputando lugar com a especialização e
profissionalização da disciplina história, própria do Oitocentos, sobretudo com os

133
Januario da Cunha Barbosa. Discurso. Revista do IHGB, Tomo 1, 1839, p. 12.
134
Raymundo José da Cunha Mattos. Dissertação acerca do sistema de escrever a história antiga e
moderna do Império do Brasil. RIHGB, Tomo 26, 1863, p. 121-43.
135
Idem, p.127.
136
Idem, p. 137-8.
137
Idem, p. 17.

79
critérios de seleção das fontes oficiais como as melhores opções para a escrita da
história. Esse é também o momento do surgimento do moderno conceito de “História”
com a inicial maiúscula, constituindo um coletivo singular e que viria, no entender do
historiador Manoel Salgado Guimarães, a se tornar a condição de possibilidade das
histórias particulares.

Nestes termos a filosofia da História, inicialmente entendida como


opondo-se à disciplina “História” concebida a partir do modelo
acadêmico da Universidade alemã de começos do século XIX,
manteria com esta formulação disciplinar um estreito contato138.

Para Salgado Guimarães, seria impossível conceber a História enquanto disciplina


sem as reflexões da Filosofia da História para a compreensão da sua moderna escrita;
porém, adverte que isso não significa uma continuidade sem quebras entre os dois
períodos. Dessa Universidade alemã surgiria nomes consagrados como Leopold von
Ranke (1795-1886), o primeiro historiador de ofício a ocupar uma cátedra em uma
Universidade, a quem coube conceber uma escrita objetiva assentada sobre um rigor
metodológico139.
Mas apesar de ter sido lida logo na terceira sessão, este trabalho de Cunha
Matos só foi publicado 25 anos depois, em 1863. Percebe-se certo “descaso” com os
escritos do marechal de campo, um dos grandes idealizadores do IHGB, ao lado do
cônego, ainda mais pelo fato de falecer poucos meses depois da fundação, lembrando-se
que os elogios aos mortos era um procedimento constante e bem demarcado nas páginas
da Revista. Talvez uma das razões desse descuido possa ter sido uma divergência com o
cônego Januário quanto ao modelo de história a ser seguido.
Ao comparar a memória do marechal com o discurso do cônego, observa-se
que não houve consenso acerca da forma e também do momento de se escrever a
história: o marechal achava que seria impossível tal escrita de imediato, visto ainda
existirem grandes lacunas nos conhecimentos históricos disponíveis, motivado, dentre
outros fatores, pelo até então desconhecimento de grande parte do território brasileiro.

138
Manoel Luiz Salgado Guimarães. Entre as luzes e o Romantismo: as tensões sobre a escrita da história
no Brasil oitocentista. In: _____ (org.) Estudos sobre a escrita da história. Rio de Janeiro: 7 Letras,
2006, p. 68-69.
139
Sobre concepções históricas e influências na escrita histórica oitocentista, conferir também: Manoel
Salgado Guimarães. A cultura histórica oitocentista: a constituição de uma memória disciplinar e
Temístocles Américo Cézar. Como deveria ser escrita a história do Brasil no século XIX, ensaio de
história intelectual. In: Sandra Jatahy Pesavento (org.). História cultural: experiências de pesquisa.
Porto Alegre: Ed. Da UFRGS, 2003; e Arno Wehling. A invenção da história: estudos sobre o
historicismo. 2ª edição Rio de Janeiro: EUGF/EUFF, 2001.

80
Para Cunha Matos, antes de uma história nacional seriam necessárias que as histórias
das províncias ou das partes do Império fossem elaboradas. Portanto, sua proposta
privilegiava um caráter mais regional, ou seja, descentralizado.
Já para o cônego Cunha Barbosa, essa tarefa seria elaborada facilmente por
uma equipe sobre a tutela do Instituto:

Esta tarefa, em nossas circunstâncias, bem superior às forças de um


só homem ainda o mais empreendedor, tornar-se-ia fácil pela
coadjuvação de muitos brasileiros esclarecidos das províncias do
Império, que atraídos ao nosso Instituto pela glória nacional, que é o
nosso timbre, trarão a depósito comum os seus trabalhos e
observações, para que sirvam de membros ao corpo de uma
História Geral e Filosófica do Brasil140. (grifos nossos).

Desta forma, a escrita histórica de âmbito geral proposta por Cunha Barbosa
trouxe uma característica marcadamente centralizadora, uma vez que devia ser
elaborada a partir da Corte. Uma escrita histórica a partir das outras províncias levaria a
certa autonomia historiográfica provincial, o que certamente o cônego não estava
disposto a permitir. O fato é que o texto do marechal de campo só apareceu na Revista
em 1863, quando a primeira secretaria era ocupada por um outro cônego: Joaquim
Caetano Fernandes Pinheiro (1825-1876), sobrinho do visconde de São Leopoldo,
primeiro presidente da instituição.
O Instituto determinava não apenas o que deveria ser enviado à Corte, mas
também a forma que se deveria proceder na coleta de documentos para compor o acervo
memorialístico da nação. Os conteúdos das Atas das sessões são bastante elucidativos a
esse respeito. O texto de Cunha Barbosa Lembrança do que devem procurar nas
províncias os sócios do IHGB, para remeterem à sociedade central do Rio de Janeiro141
e o do diplomata Rodrigo de Souza da Silva Pontes (1799-1855), Quais são os meios
que se deve lançar mão para obter o maior número possível de documentos relativos à
história e geografia do Brasil142, tornam-se emblemáticos à medida que denotam um
procedimento padrão na pesquisa documental, principalmente em relação ao que deve
ser selecionado e quais procedimentos devem ser adotados.

140
Januario da Cunha Barbosa. Discurso. Revista do IHGB, Tomo 1, 1839, p. 12.
141
Januario da Cunha Barbosa. Lembrança do que devem procurar nas províncias os sócios do Instituto
Histórico Brasileiro, para remeterem à sociedade central do Rio de Janeiro. RIHGB, Tomo 1, 1839, p.
141-3.
142
Rodrigo de Souza da Silva Pontes. Quais são os meios que se deve lançar mão para obter o maior
número possível de documentos relativos à história e geografia do Brasil. RIHGB, Tomo 3, 1841, p. 149-
57.

81
O texto de Silva Pontes, o discurso inaugural de Cunha Barbosa e a dissertação
“lida, mas não publicada” de Cunha Mattos, constituem os trabalhos que o historiador
Manoel Salgado Guimarães denominou textos de fundação:

Fundação igualmente de uma forma peculiar de escrita, do ponto de


vista nacional, e também de um personagem; o historiador, que, se
bem compartilha com diversos especialistas do código letrado
algumas características e tradições, por outro lado desenha uma nova
especialidade para as atividades das letras: escrever a história do
Brasil a partir de procedimentos adequados, capazes de assegurar a
verdade do narrado segundo os protocolos em construção e que
começam a vigir para esse tipo de escrita peculiar143.

Esse novo modelo de escrita histórica deveria ser elaborado por autores
comprometidos com a Monarquia constitucional de Pedro II. Começava, então, a surgir
um novo personagem: o historiador. Para Salgado Guimarães, este é o momento da
passagem de uma história de base filosófica e iluminista para uma história concebida
como ciência empírica dos fatos passados144.
De acordo com Arno Wehling, o que norteou a concepção histórica dos
fundadores do Instituto, mais do que o romantismo e o nacionalismo, no plano
ideológico, foi o historicismo iluminista, no plano teórico-metodológico. Uma história
tríplice: filosófica, pragmática e crítica; a crença na ideia da existência de leis naturais e
a possibilidade da previsão histórica acerca do futuro da nação145. Porém, novos
embates surgiram fundamentados em antigas querelas políticas do período regencial.

143
Manoel Luiz Salgado Guimarães. A disputa pelo passado na cultura histórica oitocentista no Brasil. In:
CARVALHO, José Murilo de. (Org.) Nação e cidadania no Império. Rio de Janeiro, Civilização
Brasileira, 2007, p. 99.
144
Manoel Luiz Salgado Guimarães. Entre as luzes e o Romantismo: as tensões sobre a escrita da história
no Brasil oitocentista. In: _____ (org.) Estudos sobre a escrita da história. Rio de Janeiro: 7 Letras,
2006, p. 72
145
WEHLING, Arno. Estado, história, memória: Varnhagen e a construção da identidade nacional, Rio
de Janeiro, Nova Fronteira, 1999, p. 43.

82
Outros embates: o cônego e o general de Bolívar

Januário da Cunha Barbosa tinha consciência dos procedimentos metodológicos


necessários e do autor capaz de elaborar uma História Geral. O protagonista desse
ousado empreendimento tinha de ser alguém que se destacasse na instituição de letrados
pela sua erudição, rigor na pesquisa documental e que dialogasse com os novos
pressupostos da disciplina histórica. Ou seja, alguém com experiência comprovada em
vasculhar infatigavelmente os arquivos, a serviço da pátria brasileira.
O exame das Atas das Sessões Ordinárias do Instituto conduz à pista de que o
candidato do cônego era Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878), que em 1840
estava retornando ao Brasil a fim de requerer o reconhecimento de sua nacionalidade
junto ao governo imperial. Cunha Barbosa vinha tecendo recorrentes elogios ao futuro
visconde de Porto Seguro referentes à sua dedicação e rigor na pesquisa documental.
Varnhagen era um dos sócios correspondentes que mais enviavam documentos para o
Instituto, sendo muitos deles classificados como preciosidades e recebidos com grande
satisfação pela mesa diretora. Tamanho era o apreço do primeiro secretário que não foi
difícil angariar a adesão de Varnhagen ao IHGB, como sócio correspondente.
Em carta ao primeiro secretário do Instituto, Varnhagen confidencia estar
selecionando alguns apontamentos encontrados na Torre do Tombo, que allumiará
talvez um episodio duvidoso, que embora de menor importância, tanta atenção merece
pela sua celebridade. Dessa forma, o trabalho de compilação documental foi
considerada importante contribuição para a organização de uma conveniente Historia
da Civilização do Brazil146.
Na segunda Sessão Aniversária do Instituto, constante do relatório anual, o
primeiro secretário Januário já destacava a perícia do jovem Varnhagen em acertar
alguns pontos de nossa história e exaltava o fato dele também ter descoberto a
sepultura do imortal Pedro Álvares Cabral. Assim, não foi difícil fazer figurar o nome
de Varnhagen como seu candidato a historiador ao lado de nomes que ia de Pero Vaz de

146
Segundo Clado Lessa, trata-se da memória intitulada o Caramuru perante a História, premiada pelo
Instituto e impressa na Revista em 1848. Conferir: Francisco Adolpho de Varnhagen: correspondência
ativa. Carta ao cônego Januário da Cunha Barbosa, 1º secretario do Instituto Historico. In: Clado Ribeiro
de Lessa. (org.). Rio de Janeiro: INL, 1961, p. 92.

83
Caminha e Pero de Magalhães Gandavo até Cerqueira Accioli e Monteiro Baena,
primeiros e últimos que têm escrito sobre as cousas do Brasil147.
Francisco Adolfo de Varnhagen era então um jovem de 23 anos. Nascido em São
João de Ipanema, interior de São Paulo, em 1816, formou-se engenheiro militar em
Portugal em 1834. Estando nas terras portuguesas passou a realizar pesquisas na Torre
do Tombo e rapidamente, se destacou ao “descobrir” documentos inéditos e a “corrigir”
as imprecisões da escrita histórica realizada pelos estrangeiros sobre o Brasil. Também
passou a percorrer arquivos, cartórios e bibliotecas na Espanha e em outras partes da
Europa e da América, a serviço do Império brasileiro na busca de documentação148.
Enquanto o cônego preparava o terreno para Varnhagen escrever sua obra
patriótica, sob os auspícios do IHGB, um outro consócio resolveu antecipar o
empreendimento. O general José Inácio de Abreu e Lima (1794-1869), que em 1839 foi
admitido como membro honorário, enviou ao Instituto, em setembro de 1843, o seu
Compendio da História do Brazil, junto com uma carta ao cônego Januário, na qual se
gabava da glória de ter dado o primeiro passo na carreira escabrosa de historiador149.
Assim, no Compêndio em dois volumes, produzido pelo general encontra-se a
seguinte dedicatória: ao muito alto, muito poderoso senhor D. Pedro II, imperador
constitucional e defensor perpetuo do Brasil, este Compendio de História patria em
signal de profundo respeito e da mais pura affeição e lealdade150. No prefácio, o autor
faz advertência aos leitores, ou seja, dirige-se à mocidade brasileira sobre os motivos
que o motivaram a escrever tal obra e os autores escolhidos para serem “compilados”.
Abreu e Lima explica que se serviu em grande parte do trabalho alheio, porque não lhe
sobrava tempo para compulsar arquivos e que sua composição pouco tinha da própria
lavra e, portanto não era inteiramente original, mas uma compilação de vários autores,
que havia julgado mais habilitados151.
Após essas considerações iniciais o general historiador elenca as obras e os
autores que lhe foram úteis. A citação é longa, porém interessante e elucidativa:

147
Januário da Cunha Barbosa. Relatório do secretario perpetuo. RIHGB, Tomo 2, 1840, p. 14.
148
Conferir: Renilson Rosa Ribeiro. Destemido bandeirante à busca da mina de ouro da verdade:
Francisco Adolfo de Varnhagen, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e a invenção da idéia de
Brasil Colônia no Brasil Império. Tese de doutorado em História Cultural. UNICAMP, Campinas, 2009.
149
José Ignácio de Abreu e Lima. Carta ao primeiro secretário. Ata da sessão de 14/09/1843. RIHGB,
Tomo 5, 1843, p. 395-397.
150
José Ignácio de Abreu e Lima. Compendio da Historia do Brasil desde a mais remota antiguidade
até os nossos dias. 2 volumes. Rio de Janeiro: Eduardo e Henrique Laemmert, 1843.
151
José Ignácio de Abreu e Lima. Op. Cit., p. viii.

84
Eis-ahi pois as obras de que me servi: a muito famigerada
Corographia Brasílica do padre Ayres de Casal; Historia do Brasil de
Roberto Southey, recopilação de Beauchamp; Resumo da Historia do
Brasil por Bellegarde, recompilação do – Brésil – por Fernando
Denis; Historia do Brasil, &c., por Armitage. (...) Do segundo
capitulo por diante, até o quinto inclusive, segui a recopilação de
Southey por Beauchamp, e a de F. Denis por Bellegarde. (...) Nos 6ºe
7º capitulos extractei em grande parte, e segui a Historia de Armitage
(...) assim mesmo tive que fazer algumas alterações essenciais por
outros escriptos, que me pareceram mais exactos (...) O 8º e ultimo
capitulo é todo de redacção propria, porque nada havia escripto d’esta
epocha. (...) querendo levar até a epocha actual, contentei-me de
assignalar os factos sem nenhuma reflexão. Muitas vezes omiti o
nome de algumas pessoas para evitar queixumes, e talvez
ressentimentos daquelles, som quem vivemos em parceria. Por este
motivo antes quiz passar por simples chronista do que por historiador
(...) é quasi impossivel a imparcialidade na historia contemporanea152.

Não se pode negar que o proposto pelo general foi cumprido ao longo dos
capítulos do Compêndio, ou seja, ele executou as “recompilações” de autores aos quais
julgou serem os mais indicados para a mocidade brasileira. Percebe-se que o ato de
compilar outros autores não era incomum, haja vista o trabalho do engenheiro Pedro de
Alcantara Bellegarde (1807-1864), que foi aceito pelo Instituto e adotado no Colégio
Pedro II, tornando-se referência. Segundo Abreu e Lima, o trabalho foi compilado do
Resumé de l’Histoire du Brésil, do bibliotecário Jean Ferdinand Denis (1798-1890),
publicado em 1825.
Desta forma encaminhados os acontecimentos internos, após a leitura da carta que
acompanhava o Compendio, enviada pelo general ao cônego Januário, foi nomeada uma
comissão especial composta por Bento da Silva Lisboa e Diogo Soares da Silva de
Bivar, para emitir o parecer sobre a referida obra153.
Pelo que as Atas das sessões indicam, o cônego ignorou ou esqueceu-se da
comissão de história e indicou o jovem Varnhagen para analisar a obra do general. O
candidato a historiador do Instituto, no seu parecer, desqualificou o gesto “ousado” do
general e teceu várias críticas a Abreu e Lima, acusando-o, por exemplo, de plagiar o
francês Alphonse Beauchamp que, por sua vez, teria plagiado o inglês Robert

152
José Ignácio de Abreu e Lima. Op. Cit., p. viii-xi.
153
Ata da 112ª sessão, em 14/09/1843, p. 395-397.

85
Southey154, este último, além de historiador, foi poeta laureado da escola romântica
inglesa.
Nesta contenda é interessante observar que no mesmo número da RIHGB no qual
se publica este parecer, veicula-se também a deliberação da comissão de redação da
Revista, assinada por Januário da Cunha Barbosa e por José de Paiva Guedes de
Andrade, integrante da mesma comissão que respaldou as opiniões de Varnhagen:

A commissão de redacção da Revista Trimestral do Instituto


Histórico e Geographico do Brasil examinou o Primeiro Juizo, que
ácerca do novo Compendio da Historia do Brasil publicou o Sr. J. I.
de Abreu e Lima; e achando cordatas as considerações feitas pelo
nosso sócio o Sr. Francisco Adolpho de Varnhagen, especialmente
contra o plagio tomado do insignificante escriptor francez
Beauchamp: é de parecer que o Instituto deve adoptar e publical-o
na Revista para que possa chegar ao conhecimento dos possuidores
do dito Compendio; visto que para a instrucção elementar é menos
recommendável que o do Sr. Bellegarde155. (grifos nossos)

Esse episódio torna-se emblemático para se perceber o poder de veto do primeiro


secretário perpétuo. O cônego Januário não somente ignorou a comissão de história
encarregada pelo Instituto, como também emitiu pessoalmente um parecer como chefe
da comissão de redação da Revista, fundamentado nas considerações do futuro visconde
de Porto Seguro.
Abreu e Lima, indignado, devolveu seu diploma de sócio honorário e publicou, na
cidade de Recife, um opúsculo em resposta ao juízo de Varnhagen156. Este documento,
por sua vez, foi mencionado perante o Instituto pelo primeiro secretário com desabono:

O Sr. Abreu e Lima, ultrapassando os limites da decencia, longe de


responder á refutação da sua obra com termos comedidos e proprios
das polemicas scientificas e litterarias, lança sobre o Instituto, e em
particular sobre os senhores 1º secretário e Varnhagen, toda a sorte de
apódos, improperios e calumnias157.

154
Francisco Adolpho de Varnhagen. Primeiro juizo submettido ao Instituto Historico e Geographico
Brasileiro pelo socio Francisco Adolpho de Varnhagen, acerca do “Compendio da Historia do Brasil”
pelo Sr. José Ignácio de Abreu e Lima. RIHGB, Tomo 6, 1844, p. 60-83.
155
Januario da Cunha Barbosa, Antonio José de Paiva Guedes de Andrade. Ata da sessão de 19 de janeiro
de 1844. RIHGB, Tomo 6, 1844, p. 124-125.
156
Esse opúsculo intitula-se: Resposta do General J. I. de Abreu e Lima ao Conego Januário da Cunha
Barbosa ou analise do primeiro juizo de Francisco Adolfo de Varnhagen acerca do Compendio da
Historia do Brasil. Pernambuco: Typographia de M. F. de Faria, 1844.
157
Ata da sessão de 07/08/1845. RIHGB, Tomo 7, 1845, p. 421.

86
Diante das palavras do general “não apropriadas para as polêmicas literárias”, o
Instituto deliberou que a decisão aprovada pelos sócios de não responder a esse escrito e
nem a outros de igual natureza fosse publicada nos principais periódicos da Corte.
De acordo com Luís Cláudio Moura, a intenção inicial de Abreu e Lima foi a de
escrever o artigo, entretanto acabou produzindo um livro, escrito em apenas quinze dias.
Nele o primeiro a ser alvejado foi o cônego Januário, que segundo o general, utilizava a
prerrogativa de secretário do Instituto em proveito próprio, trocando diplomas por
comendas e outros títulos honoríficos158. Abreu e Lima desqualificou as publicações do
cônego e reduziu o Parnaso Brasileiro a algumas poesias de péssimo gosto. Bem
irônica é a passagem sobre os ingleses que, segundo o general, se fossem mais espertos,
em lugar de fazerem a guerra contra a China pelo contrabando do ópio, poderia ter
substituído pelos Relatórios do padre Januário, pois causariam o mesmo efeito do
extrato da papoula sem a necessidade do cachimbo. Quanto a Varnhagen, Abreu e Lima
o atacou contestando a sua nacionalidade e também a sua até então incipiente produção
intelectual159.
O que chama atenção é que o general Abreu e Lima já era um autor de certo
prestígio em Pernambuco, fato que pode ser comprovado pela forma de ingresso no
IHGB: sócio honorário, ou seja, uma pessoa de avançada idade, consumado saber e
distinta representação, conforme expresso nos Estatutos.
Para compreender essa personagem, é necessário trazer à tona alguns traços de sua
vida atribulada. Filho de José Ignácio Ribeiro de Abreu e Lima, o padre Roma, assim
chamado por ter-se ordenado sacerdote naquela cidade e abandonado a batina para se
casar. Ingressou no curso de regimento de artilharia em Olinda e no ano seguinte
matriculou-se na Academia Militar do Rio de Janeiro. Concluído os estudos em 1816,
como capitão de artilharia, foi designado para servir em Angola até o final daquele ano.
Voltou para Recife em 1817. Preso por uma desavença, foi encaminhado para
Salvador, onde presenciou a execução do próprio pai, condenado pela participação na
Revolução Pernambucana. Fugiu então para os Estados Unidos, indo depois para a
Venezuela onde se alistou no exército de Simon Bolívar. Como soldado, participou das
guerras da independência da América espanhola tendo lutado na Venezuela e na
Colômbia, chegando a patente de general do exército revolucionário.

158
Luís Cláudio Rocha Henriques de Moura. Abreu e Lima: uma leitura sobre o Brasil. Dissertação de
Mestrado em História. UNB, Brasília, 2006, p. 208-211.
159
Idem, p. 216.

87
Retornou ao Brasil após a Abdicação, passando a apoiar a facção restauradora ou
Caramuru, por acreditar que o regime monárquico do Primeiro Reinado fosse o mais
indicado para assegurar a unidade do Império. Essa posição é visível no Bosquejo
histórico, político e literário do Brasil publicado em 1835160.
Desde então o general de Bolívar começou a defender concepções reformistas
referentes à qualidade de vida da população e o direito ao voto, além de questionar o
poder dos grandes proprietários. Em 1855 escreveu uma obra intitulada O Socialismo,
que lhe valeu projeção nos meios intelectuais. Apesar de não apoiar a Revolta da Praia
de 1848, foi acusado e preso em 1849, tendo sido enviado ao presídio de Fernando de
Noronha, porém um ano depois foi absolvido.
Nessa época, Varnhagen não havia ainda se afirmado como escritor; era apenas
uma promessa na qual o secretário Cunha Barbosa depositava suas fichas. Em 1840 o
jovem escritor escreveu Reflexões criticas sobre um escrito do século XVI, impresso
com o título de Notícia do Brasil e no ano seguinte, veio à luz a memória sobre a
necessidade do estudo e ensino da língua indígena no Brasil, período em que ainda
acreditava na relevância indígena para a formação da nação. Além disso, já havia escrito
cinco biografias e enviado vários documentos ao Instituto, a maioria deles, publicados
na Revista do IHGB161.
Assim posto, pode-se se dizer que o trabalho do general podia muito bem ser
aceito pelo Instituto, pois não se tratava de nada abominável. O veto da comissão de
redação foi de ordem metodológica, mas o que pesou foram, principalmente, os
aspectos políticos.
Em primeiro lugar, o cônego dificilmente endossaria uma escrita elaborada por
alguém que esteve contra o seu grupo político após a Abdicação, cujo pai havia se
envolvido na Revolução Pernambucana, uma ameaça à unidade do Império. Ainda mais
se essa escrita partisse de um lugar social fora do centro do Império, Pernambuco, uma
distante província. Depois, as ilustrações trazem personagens como Henrique Dias e
Felipe Camarão, tidos como heróis no episódio da expulsão dos holandeses. Os dois
ícones da restauração de Pernambuco figuravam ao lado de Colombo e de Cabral. Além
dessas personalidades, na vigésima página do segundo volume, aparece a imagem de

160
Conforme Magali Gouveia Engel. José Ignácio de Abreu e Lima. In: Ronaldo Vainfas (Org.).
Dicionário do Brasil Imperial. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008, p. 436.
161
Até o seu juízo sobre o Compendio de Abreu e Lima, Varnhagen já havia biografado: Pero Lopes de
Sousa, Gaspar Gonçalves de Araújo, Francisco de Mello Franco, Martim Afonso de Sousa e Salvador
Correa de Sá e Benevides.

88
José Bonifácio, o algoz do cônego Januário, após o sete de setembro. Por fim, o general
ao abordar fatos recentes do período regencial, chegando até 1841, teria infringido uma
das principais regras do IHGB: o cuidado de não se publicar acontecimentos
contemporâneos. Em vista disto, é fácil perceber que o Tribunal da Posteridade jamais
deixaria de condená-lo.
Compilação ou plágio, o fato é que Varnhagen enviou de Sevilha uma carta ao
cônego Januário, datada de 01/04/1846, ainda sobre o Compendio; um aditamento ao
seu juízo de 1843. O cônego não chegou a ler, pois havia falecido dois meses antes.
Nela o futuro visconde de Porto Seguro exaltava suas descobertas históricas nos
arquivos e suas retificações historiográficas fundamentadas por “sólidas” pesquisas. Ao
concluir, Varnhagen reforça as suas convicções: Para ser compilador, e ainda melhor
plagiário, basta ter ido á escola e saber copiar traslados, e ter muito atrevimento, -
como têm sempre os mais ignorantes162.
Pelo procedimento do Instituto referente aos pareceres das obras elaborados pelas
comissões, o que se levava em consideração não era “se foi” compilado, mas,
principalmente, “de quem foi”. Para se “compilar” algum autor era necessário pelo
menos que o mesmo tivesse credibilidade junto ao grêmio, como por exemplo,
Ferdinand Denis ou Robert Southey, que apesar de serem estrangeiros, tiveram
pareceres favoráveis. Isto certamente não foi o caso do autor francês, nas palavras de
Cunha Barbosa, um insignificante escritor como Beauchamp163.
Quanto ao sorocabano Varnhagen, que primava pela pesquisa documental, jamais
apoiaria uma versão que tratasse positivamente os indígenas brasileiros, que para ele
não passavam de vindiços alienigenas164 e muito menos que abordasse de forma
negativa os bandeirantes paulistas. O lugar social da produção discursiva estava, dessa
forma, interferindo nas versões, nos interesses e nas intenções para a fabricação da
narrativa histórica.
Até na sua morte, ocorrida em 1869, o general permaneceria envolvido em
polêmicas. Desta vez, com o bispo de Pernambuco Cardoso Aires, que negou-lhe

162
Francisco Adolpho de Varnhagen. Carta ao secretario do Instituto em 1846 em additamento ao Juizo,
sobre o Compendio da Historia do Brasil, publicado no n. 21 da Revista. RIHGB, Tomo 13, 1850, p.
396-401.
163
Januario da Cunha Barbosa, Antonio José de Paiva Guedes de Andrade. Ata da sessão de 19 de janeiro
de 1844. RIHGB, Tomo 6, 1844, p.125.
164
Francisco Adolfo de Varnhagen. Historia Geral do Brazil, Madri, Imprensa da V. de Dominguez, 1ª
ed., 1854, Tomo I, 1857, Tomo II, p. 51-52.

89
sepultura, sob o pretexto de que o morto não seria católico165. O escritor Silvio Meira,
admitido no IHGB em 1981, escreveu sobre o episódio. Para este autor, o bispo foi
injusto para com um dos generais de Bolívar e membro honorário do Instituto, ainda
mais que teve o pai Vilmente fuzilado na presença do filho na Bahia, em 1817166. Ao
lembrar-se da polêmica extremada do general com Varnhagen, Silvio Meira afirmou
que o visconde de Porto Seguro não tinha razão.
Para desapontamento do autor de Historia Geral do Brazil, o general iria
gradativamente recuperar o seu prestígio perante a agremiação, o que não aconteceu
com a sua obra publicada em 1854, conforme se verá adiante. Entre 1850 e 1862,
apenas sete anos após o parecer negativo do cônego Cunha Barbosa, o Compendio do
general foi adotado no Colégio Pedro II. Além de se tornar obra oficial de um dos mais
conceituados colégios do Império, os consócios aos poucos foram obrigados a
reconhecer os méritos da obra.
A censura imposta ao general por Cunha Barbosa e Varnhagen, em 1843, foi
violada pelo poeta Antonio Gonçalves Dias (1824-1864), ao fazer a leitura do parecer
sobre o Resumo da Historia do Brasil, para uso na instrução primária, do professor e
sócio do Instituto, Salvador Henrique de Albuquerque. O relator da Ata dessa reunião
informou que o mesmo parecer ficou sobre a mesa para ser discutido em tempo
opportuno167. Na reunião de 27/09/1849 o parecer de Gonçalves Dias chegou a entrar
em discussão, porém, a sessão foi adiada novamente e “esquecida” nas reuniões
subsequentes. Somente na Sessão Aniversária de 1852 pôde-se saber parte do teor do
parecer de Gonçalves Dias, por meio da fala do então primeiro secretário Joaquim
Manuel de Macedo:

O Sr. Antonio Gonçalves Dias apresentou o seu parecer sobre o


Compendio de Historia do Brazil escripto pelo Sr. Salvador Henrique
de Albuquerque: a confrontação estabelecida entre esta obra e a outra
sobre o mesmo assunpto, do Sr. General Abreu e Lima, não pôde ser
favorável á primeira168.

165
Silvio Augusto de Bastos Meira. O julgamento da História: o bispo Cardoso Aires e o general Abreu e
Lima. RIHGB, Tomo 151 (367), 1990, p. 147-159.
166
Silvio Augusto de Bastos Meira. Op. Cit., p. 150.
167
Ata da sessão de 26/04/1849. RIHGB, Tomo 12, 1849, p. 282.
168
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do Primeiro Secretario. RIHGB, 1849, Tomo 12, p. 510.

90
Infelizmente a avaliação de Gonçalves Dias não foi publicada, mas deixa evidente
que o veto do trabalho do general manteve-se somente enquanto o cônego Cunha
Barbosa esteve na primeira secretaria do grêmio.
No entanto, em 1858 a obra de Abreu e Lima foi redimida através das palavras do
então primeiro secretário Manuel de Araújo Porto-Alegre:

O Sr. General Abreu e Lima no seu indice chronologico fez a


enumeração dos factos, e na sua historia geral seguiu algumas vezes
Beauchamp; porém honra lhe seja feita na parte moderna, e em que
foi espectador, porque ahi abdicou muitas vezes seus principios e
vistas politicas para fazer justiça a seus contrarios169.

O general de Bolívar, apesar de ter seguido Beauchamp, adquiriu o status de


historiador ao presenciar os fatos e conseguir narrá-los de forma “imparcial”. O IHGB a
partir da década de 1850 passou a ser mais tolerante com os acontecimentos da história
contemporânea, conforme analisado no segundo capítulo.

O “escolhido”: Martius e a escrita da História do Brasil

Em 1840, entre os debates acerca da maneira de se escrever a história pátria, o


IHGB lançou o concurso que escolheria o melhor plano para a escrita histórica da nação
e/ou a delimitação das fronteiras entre as histórias antiga e moderna do Brasil. Nesse
contexto é que o naturalista Karl Friedrich Phillip von Martius (1794-1868) apresentou
a dissertação Como se deve escrever a Historia do Brasil.
Martius chegou ao Rio de Janeiro em julho de 1817, acompanhado pelo zoólogo
Johann Baptiste von Spix (1781-1826), por ordem do rei Maximiliano José I. Ambos
faziam parte da expedição austro-bávara, que veio ao Brasil pelo ensejo do casamento
da princesa Leopoldina de Habsburgo com Pedro I. Durante três anos seguidos Spix e
Martius percorreram o interior, perfazendo quase dez mil quilômetros pelos territórios
da ainda América portuguesa. O resultado da peregrinação foi publicado em três
volumes entre 1823 e 1831, intitulado Reise in Brasilien. Sua tradução ao português

169
Manuel de Araújo Porto-Alegre. Relatorio do Primeiro Secretario. RIHGB, Tomo 21, 1858, p. 464.
Lúcia Guimarães (1995: 572) equivocadamente atribui essas palavras ao presidente do Instituto Candido
José de Araujo Vianna, à época visconde de Sapucaí.

91
como Viagem pelo Brasil, entretanto só viria a acontecer no ano de 1938, nas
comemorações do centenário de fundação do IHGB170.
Martius era um dos sócios correspondentes do Instituto, portanto acompanhava as
publicações da Revista e estava a par das discussões em torno do projeto de uma escrita
da história. Nessa condição ele escreveu o texto Bermerkungen über die verfassung
einer geschichte brasiliens, que pode ser traduzido como: “Observações para a
formulação de uma história do Brasil”171. Este texto, ao ser vertido para o português em
1843, por Guilherme Schüch (1824-1908)172, recebeu como título: “Como se deve
escrever a história do Brasil” e, assim nomeado, circulou no sexto volume da RIHGB,
impressa em janeiro de 1845, sendo o vencedor do concurso premiado pelo Instituto, em
1847.
Têm-se, dessa forma, o texto de um viajante naturalista estrangeiro que se tornou
referência para a escrita de uma história nacional. No entanto trazia um título, cuja
tradução divergia da proposta do concurso e dos títulos dos textos de seus
contemporâneos.
Há que se observar que o texto de Raimundo da Cunha Matos, lido na sessão do
dia 19 de janeiro de 1839 possuía o seguinte título: Dissertação acerca do sistema de
escrever a história antiga e moderna do Império do Brasil173 e que a proposta de
Januário da Cunha Barbosa, na primeira sessão, também insistia nesse ponto:
Determinar-se as verdadeiras épocas da história do Brasil, e se esta se deve dividir em
antiga e moderna, ou quais devem ser suas divisões174. A sugestão de um prêmio
durante a segunda Sessão Aniversária do IHGB determinava: Uma medalha de ouro, no

170
C. F. Ph. von Martius & J. B. von Spix. Viagem pelo Brasil. São Paulo: Itatiaia/Edusp, 1981.
171
Karl Friedrich Phillip von Martius. Bermerkungen über die verfassung einer geschichte brasiliens.
Arquivo IHGB, Lata 969, pasta 29.
172
Guilherme Schüch de Capanema durante sua estada acadêmica no Imperial Instituto Politécnico de
Viena, entre 1842-46, como bolsista do Imperador Pedro II, esteve em contato permanente com Martius,
sendo um dos colaboradores da Flora Brasiliensis. Seu pai, Rochus Schüch, bibliotecário e conservador
do gabinete de história natural da princesa Leopoldina, veio para o Brasil na comitiva de 1817 com os
dois referidos viajantes bávaros. Conferir: FIGUEIRÔA, Sílvia F. de Mendonça. Ciência e tecnologia no
Brasil Imperial: Guilherme Schüch, Barão de Capanema (1824-1908). Revista Varia Historia, Belo
Horizonte, vol. 21, nº 34: p. 437-55, Julho de 2005. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_pdf&pid=S010487752005000200010&lng=en&nrm=i&tlng=
pt . Acesso em 24/09/2010.
173
Raymundo José da Cunha Mattos. Dissertação ácerca do systema de escrever a historia antiga e
moderna do Imperio do Brasil. RIHGB, Tomo 26, 1863, p. 121.
174
Januario da Cunha Barbosa. Ata da 1ª sessão, em 01/12/1838. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 57.

92
valor de 200$000 réis a quem apresentar o mais acertado Plano de se escrever a
história antiga e moderna do Brasil175.
O outro trabalho que concorreu com o de Martius, foi o do cônsul geral da Rússia
e também sócio, Henrique Julio de Wallestein (1790-1843), escrito em 1843, com título
semelhante: Sobre o melhor plano de se escrever a historia antiga e moderna do Brasil,
que foi publicado na Revista somente em 1882. Segundo este autor: o plano mais
acertado de se escrever a história do Brasil seria pelo sistema de décadas, narrando-se
os fatos dentro de períodos certos176. Para o cônsul, a História do Brasil teve início com
o descobrimento, em 1500, indo até 1510, data do naufrágio de Diogo Álvares Correa, o
Caramuru, constituindo-se a primeira década e assim, sucessivamente, até a
Independência. O cônsul decidiu parar o sistema de décadas na coroação de Pedro I por
achar que nenhum historiador nacional tinha condições de abordar a história
contemporânea para não se expor em juízos temerários e outros inconvenientes. E
concluiu: Arquivem-se os documentos e o tempo virá177.
A comissão encarregada de julgar o melhor trabalho entre o de Martius e o de
Wallestein, foi composta pelo médico-botânico Francisco Freire Alemão (1797-1874),
pelo político Thomaz Gomes dos Santos (1803-1874) e pelo cônego Manuel Joaquim da
Silveira (1807-1875), que ao concluir os trabalhos, na sessão do dia 10 de junho de
1847, assim se pronunciou acerca da proposta de Julio de Wallestein:

Parece à comissão que o autor desta memória não compreendeu bem


o pensamento de nosso programa, porquanto as vistas deste Instituto
não se podiam contentar com as simples distribuições das matérias, e
isto por um método puramente fictício ou artificial, que poderá ser
cômodo para o historiador, mas de modo algum apto a produzir uma
historia no gênero filosófico, como se deve exigir atualmente178.

Já sobre a monografia de Martius, a mesma comissão julgadora não poupou


elogios nas oito páginas do parecer. Além disso, alertava que esse texto já se achava
publicado há muito tempo na Revista e com o nome declarado do autor, justificando
como um “descuido” da redação. De acordo com os pareceristas: o que todavia lhe
devemos relevar e talvez mesmo agradecer visto ser o assunto da memória tão

175
Suplemento ao segundo Tomo. RIHGB, Tomo 2, 1840, p. 72.
176
Henrique Julio de Wallestein. Memória sobre o melhor plano de se escrever a história antiga e
moderna do Brasil. RIHGB, Tomo 45, 1882, p.159-160.
177
Idem, p. 160.
178
Thomaz Gomes dos Santos; Francisco Freire Allemão e Joaquim da Silveira. Ata da 163ª sessão em
10/07/1847. RIHGB, Tomo 9, 1847, p. 279.

93
transcendente para o Brasil e tão sabiamente explanado179. Após um resumo, exaltando
vários pontos do texto do naturalista bávaro, a comissão concluiu:

Eis aqui senhores um pálido reflexo desse importante trabalho, onde


todas as exigências da história se acham satisfeitas (...) conclui
portanto a comissao que a memória do Sr. Dr. Carlos Frederico Ph.
de Martius sobre o como se deve escrever a historia do Brasil satisfaz
exuberantemente ao programa do Instituto, e deve ser premiada180.

A dissertação de Martius de fato é bem mais pormenorizada do que a do seu


concorrente, que de forma sintética escreveu apenas duas laudas.
Martius organizou seu texto em quatro partes: 1) idéias gerais sobre a Historia do
Brasil; 2) Os índios (a raça cor de cobre) e sua historia como parte da Historia do
Brasil; 3) Os portugueses e sua parte na Historia do Brasil e 4) A raça africana em
suas relações para com a Historia do Brasil.
Essa disposição chama a atenção pela ordem de exposição: os indígenas aparecem
antes dos portugueses; coisa que foge à regra se comparados a outras obras anteriores ou
posteriores181. O escritor aborda uma teoria para combinar as três raças, segundo a
metáfora do rio: o sangue português em um poderoso rio que absorveu os pequenos
confluentes das raças índia e etiópica. Dessa fusão se formaria a população
brasileira182.
No texto de Martius predomina a visão de que o historiador deve viajar. Somente
desta maneira o pesquisador poderia observar com seus próprios olhos as
particularidades do país e da sua população. Deve também abordar a história das
províncias agrupando-as de acordo com analogias da sua natureza física. Assim, por
exemplo, são convergentes a história das províncias de São Paulo, Goiás, Minas e Mato
Grosso. A do Maranhão se liga à do Pará e assim por diante.
Encontra-se também considerado que somente pela manutenção da Monarquia é
que se pode estabelecer uma sábia organização entre todas as províncias e fazer com
que a série de histórias provinciais componha a História do Brasil. Para Martius, o

179
Thomaz Gomes dos Santos; Francisco Freire Allemão e Joaquim da Silveira. Op. Cit., p. 279-80.
180
Idem, p. 287.
181
Dentre elas podemos destacar Pero de Magalhães Gândavo. A primeira história do Brasil, de 1576, na
qual os índios aparecem somente no décimo capítulo; Frei Vicente do Salvador. História do Brasil, de
1627 e publicada somente em 1889, aqui os indígenas estão no capítulo 12; e sobretudo, Francisco Adolfo
de Varnhagen. Historia Geral do Brazil, publicada em 1854, uma obra posterior à de Martius, em que os
gentios emergem somente no décimo capítulo.
182
Karl Friedrich Phillip von Martius. Dissertação: Como se deve escrever a história do Brasil. RIHGB,
Tomo 6, 1844, p. 381-403.

94
historiador filosófico deve posicionar-se enquanto um autor monárquico constitucional
e escrever em um estilo popular, porém nobre, e não em uma linguagem empolada e
nem carregada de erudição ou de uma multidão de citações estéreis183.
Estava assim, idealizada uma forma possível e desejada para se escrever a História
da pátria brasileira; ofício que caberia a um brasileiro, já que o próprio Martius
dispensou-se da incumbência por achar que não deveria ser tarefa de um estrangeiro.
Von Martius enviou ao Instituto, em anexo ao seu trabalho, uma seleção de importantes
obras acerca do Brasil, o que segundo ele, deveriam constituir o acervo básico de uma
assim chamada Biblioteca Brasiliana184. À época, “biblioteca” não significava um
espaço arquitetônico para a organização e consulta de livros, como nos dias atuais, mas
um catálogo sobre outras obras. Na publicação da Dissertação, em 1845, não apareceu
essa listagem de obras selecionadas pelo naturalista germânico.
A Dissertação de Martius, escrita em Munique em 10 de janeiro de 1843, refletiu
algumas das inquietações do Estado brasileiro, através do IHGB, de meados do século
XIX. Para Temístocles Cezar, o prêmio concedido a Martius legitima o projeto de
escrita da História apto a criar simbolicamente a nação brasileira185. O naturalista
bávaro deixou diretrizes detalhadas para a confecção de uma história que amalgamasse
todo o território nacional. Ou seja, a História enquanto mestra da vida e como meio
indispensável para se forjar a nacionalidade.
O texto, premiado pelo IHGB em 1847, como visto, já havia sido publicado na
RIHGB, por um deslize por parte da redação. Mas esse mesmo deslize não ocorreu com
o trabalho de Wallestein, cujo texto só foi publicado em 1882. Portanto, Martius era sim
um estrangeiro, tal como seu concorrente, mas não era um desconhecido; além disso,
personificava o protótipo do viajante, que palmilhou uma importante área do território
brasileiro, pois já havia percorrido o interior das possessões lusitanas entre os anos de
1817-20.
O título de seu trabalho, bem emblemático por sinal, pode ser pensado como uma
“adaptação” na tradução por parte do Instituto. O título original, vale lembrar, era
Observações para a formulação de uma história do Brasil, mas ao que parece o
Instituto preferiu um tom bem mais imperativo, ao denominá-lo de Como se deve

183
Karl Friedrich Phillip von Martius. Op. Cit., p. 402.
184
A primeira página da Dissertação trazia a seguinte inscrição: Acompanhada de uma Bibliotheca
Brasileira, ou lista das obras pertencentes á Historia do Brasil.
185
Temístocles Américo Cézar. Como deveria ser escrita a história do Brasil no século XIX, ensaio de
história intelectual. In: PESAVENTO, Sandra Jatahy (org) História cultural: experiências de pesquisa.
Porto Alegre: Ed. Da UFRGS, 2003, p. 207.

95
escrever a história do Brasil. Assim, já no título indicava ser uma espécie de “manual”
a ser seguido. O texto trazia algumas “prescrições” para o historiador que se aventurasse
a uma empresa de tal envergadura. Martius deixa bem claro o papel desse historiador
brasileiro na Monarquia constitucional e a maneira de como este deveria escrever a
História.
Um dos pontos, como se viu, era a necessidade de um historiador filósofo-
viajante: a viagem como condição necessária para fundamentar a sua escrita. Parece-me
indispensável que o historiador tivesse visto esses paises, que tivesse penetrado com os
seus próprios olhos nas particularidades da sua natureza e população186. Além de
filósofo era preciso ser pragmático, a fim de inspirar soluções para os problemas do
tempo presente à luz da História; e também crítico, para que se restabelecesse a verdade
objetiva da História através de métodos confiáveis de análise documental.
Assim condensados, os parâmetros estavam traçados, mas isso não significou que
eles fossem seguidos; faltava o indivíduo capaz de tal façanha – o historiador habilitado
a efetivar o projeto historiográfico proposto por Martius e pelo IHGB, na figura do
primeiro secretário. Um pesquisador que possuísse anos de experiência em coleta e
sistematização documental em arquivos nacionais e no estrangeiro; que contemplasse a
necessidade de se escrever uma história filosófica, aliada ao rigor metodológico da
Escola Metódica alemã; um historiador monárquico constitucional. Enfim, alguém que
fosse capaz de efetuar esta tarefa. Dez anos depois, isto foi realizado por um outro
germânico, “nascido” na América: Francisco Adolfo de Varnhagen, que em 1854 trouxe
a público o primeiro volume da Historia Geral do Brazil187. Porém, tal façanha não foi
recebida pelo IHGB como o autor esperava.
O curioso é que as várias publicações do naturalista, como a Flora Brasiliensis e
outros trabalhos sobre a língua e a etnografia indígenas, foram ignoradas pelo IHGB.
Com respeito a estas últimas, o descaso do Instituto talvez possa ser interpretado como
um indício do tipo de tratamento e concepção do indígena, que o IHGB estava
abraçando, ou seja, o índio “romantizado”, idealizado, o passado glorioso, a ênfase na
ancestralidade, conforme o tratamento da Academia dos Renascidos, fundada em 1759.
O índio real, de “carne e osso” o que deveria fazer parte da nação simplesmente foi
marginalizado. Assim, é sintomático que a partir da década de 1850, os pressupostos de

186
Karl Friedrich Phillip von Martius, Op. cit., p. 400.
187
Francisco Adolpho de Varnhagen. História Geral do Brasil. Madri, Imprensa da V. de Dominguez,
1ª ed., 1854, Tomo I, 1857, Tomo II.

96
Martius não fossem mais mencionados nas reuniões. E somente voltariam à ordem do
dia por meio das duras críticas estabelecidas por Silvio Romero:

Desgraçada coisa seria a mentalidade da nação brazileira, se tivesse


precisado que Martius lhe viesse ensinar duas coisas trivialissimas,
que a tanto se reduzem as mais encomiadas idéas do tão afamado
sábio: - a divisão do país por zonas, a necessidade de considerar as
tres raças que constituiram o povo!...188.

O polêmico crítico literário afirmou que a única empresa notável do naturalista era
a Flora Brasiliensis, e justifica o emprego do termo “empresa” e não “obra”, pois: o que
ali ha só em pequena parte lhe pertence189. Francisco Iglesias explica que o texto de
Romero é passível de muito reparo, como quase tudo que produziu e que os dois pontos
abordados poderiam ser trivialidades no começo do século XX, mas seguramente não
eram em 1843, quando a ideia foi lançada ou em 1847 quando de sua publicação190.
Essa discussão proposta por Martius serviu de fundamento para a construção do
mito da democracia racial, que foi desenvolvida por alguns intelectuais da década de
1930, sobretudo Gilberto Freyre, configurando-lhe o papel de identidade nacional.

A História Geral do Brasil e o patriotismo caboclo

“A Historia Geral do Brasil fica concluída. Junto inclúo a dedicatória


que penso publicar se V. M. não mandar o contrario. (...) desejava
chegar com a redacção ao anno de 1825 e comprehender a
Constituição, e reconhecimento da Mãe Pátria e o nascimento de V.
M. I., mas não me foi possível. Tão espinhosa é por enquanto a tarefa
da imparcial narração desse período, sobretudo para um nacional.
Daqui a poucos annos não o será”191.

O Romantismo brasileiro pode ser visto, grosso modo, como um movimento,


responsável pela fundação de uma literatura de âmbito nacional e que teve por
elementos principais a ênfase no passado pré-colonial, na natureza e no indianismo. Os

188
Sylvio Romero. Carlos Frederico F. de Martius e suas idéas acerca da Historia do Brazil. Revista da
Academia Brazileira de Letras, ano III, nº 8, abril-junho de 1912, p. 231-272. Citação, p. 232.
189
Idem, p. 232.
190
Francisco Iglesias. Historiadores do Brasil: capítulos de historiografia brasileira. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira; Belo Horizonte: Ed. da UFMG, IPEA, 2000, p. 71-72.
191
Francisco Adolpho de Varnhagen. Correspondência ativa. Carta ao imperador D. Pedro II, de
06/05/1853. In: Clado Ribeiro de Lessa (org.). Rio de Janeiro: INL, 1961, p. 201.

97
escritos literários românticos surgiram como textos complementares aos estudos
históricos e ambos se fundamentavam em crônicas do período colonial e em relatos de
viagens do XVIII.
Conforme demonstra Flora Süssekind, a fundação de uma historiografia literária
nacional no início do século XIX surgiu da construção do narrador de ficção tendo por
fundamentação o relato de viagem. O texto de ficção teria como base fatos, extraídos
das crônicas dos tempos coloniais ou dos diários dos viajantes ilustrados do Setecentos.
Cabia aos historiadores levantar o passado autêntico, e aos escritores, popularizá-lo,
inclusive preenchendo as lacunas com a “imaginação literária”, se preciso fosse. Essa
popularização se deu por meio das publicações nos variados periódicos que circulavam
nas primeiras décadas do Oitocentos, principalmente na Corte do Rio de Janeiro192.
Dessa forma encontravam-se ainda bastante imbricados os campos da história e da
literatura. Em uma sociedade literária como o IHGB a história somente começaria a
desvencilhar-se da “imaginação literária” através da coleta e crítica documental tendo
por objetivo uma escrita “verdadeira” que legitimasse a nação. E um dos nomes que
estava em destaque era Francisco Adolfo de Varnhagen, que já havia produzido em
1840 a Crônica do descobrimento do Brasil – uma obra ficcional baseada na Carta de
Pero Vaz de Caminha - e o Florilégio da poesia brasileira, de 1850 – uma reunião das
composições mais notáveis dos poetas falecidos, precedido por um ensaio histórico das
letras no Brasil.
Varnhagen na sua História Geral não corroborou com as orientações de Martius,
em relação à ideia de um Império “mestiço”. Isto certamente não seria compactuado
pelo historiador do cônego Januário pelas suas concepções acerca dos indígenas. Dentre
as diretrizes apontadas pelo naturalista bávaro pode-se dizer que o futuro visconde de
Porto Seguro se limitou a dar ênfase no elemento português, ignorando os demais193.
Varnhagen manteve também o compromisso do historiador com a Monarquia
constitucional, agora consolidada, fato que representava condição fundamental para a
escrita da História.
Inicialmente o futuro visconde se mostrou muito interessado nos primeiros
habitantes do Brasil, até realizar uma viagem ao interior de São Paulo, em 1841, na qual

192
Flora Süssekind. O Brasil não é longe daqui: o narrador, a viagem. São Paulo: Companhia das Letras,
1990.
193
Conferir: Renilson Rosa Ribeiro. “Destemido bandeirante à busca da mina de ouro da verdade”:
Francisco Adolfo de Varnhagen, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e a invenção da idéia de
Brasil Colônia no Brasil Império. Tese de doutorado em História Cultural. UNICAMP, Campinas, 2009,
p. 257.

98
ficou impressionado pela ameaça de ataques indígenas. De acordo com Pedro Puntoni,
esse episódio modificou a sua visão. Varnhagen, teria então perdido, em sua palavras,
repentinamente todas as ilusões poéticas em que a respeito dos mesmos índios estava, e
comecei a meditar e a pensar muito mais seria e positivamente acerca deles194. Agora,
os indígenas brasileiros, pela sua “incivilidade”, não poderiam fazer parte da nação.
Com a morte do cônego Cunha Barbosa em 1846, a primeira secretaria do
Instituto passou as mãos de Manoel Ferreira Lagos (1816-1871), permanecendo nela até
maio de 1851, quando Varnhagen foi eleito para o cargo. Nos seis meses que esteve à
frente da secretaria começou a preparar o terreno para a acolhida de sua Historia Geral,
passando a ler alguns trechos nas reuniões195; ao tempo em que organizava o arquivo e a
biblioteca do Instituto.

A década de 1850 foi um marco para o renascimento do IHGB, pela presença


imperial nas reuniões, agora com lista dos sócios presentes, constando em Ata. E é
também o tempo em que se reformam os seus estatutos, passando o Instituto a contar
com uma seção de Arqueologia e Etnografia indígena, reflexo do crescente interesse
indianista promovido pelos escritores românticos que também faziam parte da
agremiação. Novos critérios para a admissão de sócios foram aprovados, passando-se a
exigir a elaboração de um trabalho de História, Geografia ou Etnografia, que seria
analisado pelas respectivas comissões. Com isto também se extinguia a perpetuidade
dos cargos de presidente e das duas secretarias, sendo que as Sessões Magnas passaram
a ser celebradas em 15 de dezembro, em homenagem à primeira sessão assistida pelo
imperador196.

Desta forma apertava-se o cerco aos membros que não produziam e aos
inadimplentes. Nenhum sócio podia passar mais de dois anos sem apresentar trabalho e
quem não estivesse quite com o tesoureiro não teria direito à publicação na Revista,
caso fosse aprovado pelas comissões.

Em 15 de dezembro de 1851 Varnhagen deixou a secretaria do IHGB para assumir


o posto diplomático em Madri. Na capital espanhola poderia se dedicar ao
empreendimento pátrio, mantendo D. Pedro II informado dos progressos de sua obra

194
Citado por Pedro Puntoni, em: O Sr. Varnhagen e o patriotismo caboclo: o indígena e o indianismo
perante a historiografia brasileira. In: István Jancsó (org.). Brasil: formação do Estado e da Nação. São
Paulo: Hucitec, 2003, p. 633-675.
195
Ata da 228ª sessão em 06/06/1851. RIHGB, Tomo 14, 1851, p. 469.
196
Ata da Assembléia Geral de 22/11/1850. RIHGB, Tomo 13, 1850, p. 523-525.

99
por meio de diversas cartas, nas quais situava o monarca na temporalidade em que
estava escrevendo: a Historia do Brasil está já em 1654197. Exaltava também as
personagens nos períodos trabalhados, como por exemplo: já estou no período de 1715
a 1750, período cuja gloria pertence aos paulistas, e os assuntos importantes às
províncias de Minas, Goyaz, e Matto Grosso198.

Ao terminar sua obra, Varnhagen contava com a chancela do IHGB e, se preciso


fosse, estaria disposto a omitir seu nome para que o trabalho figurasse apenas como de
um brasileiro ou do Instituto Histórico do Brazil; e, por conseguinte, de todo o
Brazil199.

Em sete de dezembro de 1855 chegou ao Instituto o primeiro volume da sua


Historia Geral do Brazil, acompanhada de uma carta do autor ao primeiro secretário
Joaquim Manoel de Macedo. A obra de imediato foi enviada à comissão de história para
interpor o seu parecer200. Passados quatro meses, um novo exemplar chega ao IHGB
como consta no Oficio dos Srs. E. e H. Laemmert, enviando, por ordem do Sr. F. A. de
Varnhagen, um exemplar da sua Historia Geral do Brazil, publicado na sessão de
18/04/1856.

Nas Atas constam, pois, de dois envios da obra; a primeira em dezembro de 1855
e a outra em abril de 1856. Apesar disto, nenhum parecer foi apresentado. Para
desapontamento do futuro visconde de Porto Seguro, o Instituto não faria as honras
esperadas à sua obra, o que motivou várias missivas ao imperador, reclamando,
amargurado até pelos desfavores do próprio Instituto ... do Instituto!...201. A instituição
que lhe criara tantas expectativas, sequer acusou o recebimento do ofício acerca do
primeiro volume, nem da oferta do exemplar. Talvez só porque, nas suas palavras, não
adulo servilmente, como outros, certo perigoso brasileirismo caboclo202.

Essa fria recepção da Historia Geral do Brazil por parte do IHGB deve-se em
grande parte às disputas internas entre dois grupos, acerca das matrizes formadoras da

197
Francisco Adolpho de Varnhagen. Correspondência ativa. Carta ao imperador D. Pedro II, em
02/12/1852, p. 193.
198
Francisco Adolpho de Varnhagen. Correspondência ativa. Carta ao imperador D. Pedro II, em
07/02/1853, p. 195.
199
Francisco Adolpho de Varnhagen. Correspondência ativa. Carta ao imperador D. Pedro II, em
05/02/1854, p. 213.
200
Ata da sessão de 07/12/1855. RIHGB, Tomo 18, 1855, p. 467.
201
Francisco Adolpho de Varnhagen. Correspondência ativa. Carta ao imperador D. Pedro II, em
14/07/1857, p. 247.
202
Francisco Adolpho de Varnhagen. Correspondência ativa. Carta ao imperador D. Pedro II, em
24/09/1856, p. 235.

100
nação brasileira. A primeira, representada por Varnhagen, via no elemento indígena a
expressão maior da barbárie e, portanto, não poderia fazer parte da história; a outra
corrente via no indígena, elementos que expressavam a singularidade do Brasil, assim
como a natureza exuberante. Representantes desta última facção faziam parte da mesa
administrativa do Instituto desde 1852. Nomes ligados ao Indianismo romântico203
estavam à frente da agremiação durante a publicação dos dois tomos da Historia Geral
do Brazil, em 1854 e 1857, respectivamente. Entre eles se destacaram o escritor e
professor Joaquim Manuel de Macedo, primeiro secretário do Instituto entre 1853-1856
e o pintor Manoel de Araújo Porto Alegre, orador entre 1844-1856, que o sucedeu,
ficando na primeira secretaria até 1859. Macedo passou então a exercer a função de
orador, permanecendo no cargo até a sua morte em 1882. A esses viriam somar nomes
como Antonio Gonçalves Dias e Domingos José Gonçalves de Magalhães, ambos
professores do colégio Pedro II.

O poeta Antonio Gonçalves Dias (1823-1864), sócio do IHGB desde 1843, era
professor de latim e história do Colégio Pedro II. Foi incumbido, em 1851, de coletar
material referente à História do Brasil no norte do país e, em 1854, foi a Portugal em
busca de documentação acerca da História pátria. Fez parte da comissão de Arqueologia
e Etnografia do Instituto, nos anos de 1854 e 1855 e foi um dos integrantes da Comissão
Exploradora Científica ao Ceará, em 1859. Gonçalves Dias era, a exemplo de
Gonçalves de Magalhães, um dos protegidos de Pedro II, fazendo com que este
exclamasse um “muito bem!” na reunião de 03/06/1853, ao final de uma dessas
explanações,204. Vale lembrar que D. Pedro era bem econômico com suas palavras e

203
Movimento, dentro da Literatura romântica, inspirado em temas da vida dos índios americanos, uma
busca ao específico brasileiro. Segundo Antonio Candido, A forma reputada mais lídima de literatura
nacional, que teve o momento áureo entre os anos de 1840 e 1860. Conferir: Antonio Candido. Formação
da Literatura brasileira. Volume II (1836-1880). Belo Horizonte-Rio de Janeiro: Itatiaia, 1997, p. 18 e
Bernardo Ricupero. O Romantismo e a idéia de Nação no Brasil (1830-1870). São Paulo: Martins
Fontes, 2004, p. 153-178.
204
D. Pedro II defendeu Gonçalves de Magalhães, quando a sua Confederação dos Tamoyos foi atacada
por José de Alencar. O imperador teria respondido, sob o pseudônimo de O amigo do poeta, no Correio
da Tarde e no Jornal do Commercio. Num dos periódicos teria dito: “O homem despeitado e sem
coragem fere o protegido, por não ousar ferir o protetor”. Conforme Lúcia Maria Paschoal Guimarães.
Domingos José Gonçalves de Magalhães. In: Ronaldo Vainfas. . (Org.). Dicionário do Brasil Imperial.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2008, p. 216-217. O Programa Histórico designado pelo imperador em 1849 era:
“Comparar o estado physico, intellectual e moral dos indígenas da quinta parte do mundo com o estado
physico, intellectual e moral dos indígenas do Brasil, considerados uns e outros na épocha da respectiva
descoberta, e deduzindo d’esta comparação quaes offereciam n’essas mesmas probabilidades á empreza
da civilisação”. A primeira parte deste trabalho foi publicado em 1867 com o título de “Brasil e Oceania”.
RIHGB, Tomo 30, 1867, p. 05-192.

101
essa foi a única vez que se pôde verificar nas Atas das reuniões um comentário do
monarca acerca das apresentações dos sócios do Instituto.

Vemos, pois, que na década de 1850, a mesa diretora do IHGB passou a contar
com uma maioria simpatizante ao indígena enquanto elemento formador da nação, junto
com a natureza exuberante, cujas singularidades distinguiriam o Brasil das demais
nações205.

Varnhagen, lamentando a indiferença do Instituto à sua obra, recebeu de D. Pedro


II um exemplar de A confederação dos Tamoyos, poema épico de Gonçalves de
Magalhães. A primeira edição, de 1856, de luxo, foi custeada pelo imperador, a quem o
livro foi dedicado. Desta vez, o futuro visconde de Porto Seguro não se conteve:

Infelizmente está o poema mui longe de poder, no mais mínimo,


aspirar às honras da epopéia nacional do século de Pedro 2º (...) nem
o assumpto da tal confederação bestial é verdadeiramente épico; (...)
nem o auctor, excepto na parte descriptiva, tem ao gênero épico
tendência, nem tem o saber, nem a robustez de princípios, nem a
generosidade e grandeza d’alma, (...)206

Esse procedimento colocou Varnhagen em intenso debate com Magalhães. Ao que


parece D. Pedro II se manteve neutro, ignorando pedidos de condecorações e titulações
de nobreza que lhe fazia Francisco Adolfo de Varnhagen e, é claro, a intermediação
para uma calorosa recepção de sua obra junto ao IHGB. Qualquer medida adotada pelo
monarca, beneficiando um dos grupos poderia deixá-lo em uma situação delicada.
Segundo Lúcia Guimarães, o próprio Pedro II foi um incentivador do debate entre os
dois grupos207.

Para Pedro Puntoni o poema épico de Magalhães realizou várias operações, dentre
elas, a organização das crônicas e das documentações coloniais segundo as regras do
método histórico, para forjar um conjunto de fatos e personagens a fim de permitir a
produção de uma narrativa literária, cujos traços de veracidade, apesar dos exageros,

205
Sobre o papel da natureza na formação nacional brasileira, conferir: Janaina Zito Losada. A paixão, a
natureza e os ritmos da história: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro no século XIX. Tese de
Doutorado em História. UFPR, Curitiba, 2007.
206
Francisco Adolpho de Varnhagen. Correspondência ativa. Carta ao imperador D. Pedro II, em
24/09/1856, p. 237.
207
Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB). In: Ronaldo
Vainfas. (Org.). Dicionário do Brasil Imperial. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008, p. 380-381.

102
garantiram o seu funcionamento enquanto mito fundador da Nação – Estado
brasileira208.

Pelas suas convicções historiográficas de exaltar o bandeirante em detrimento das


sociedades indígenas e das críticas direcionadas aos jesuítas, o autor da Historia Geral
do Brazil confrontou-se com boa parte do IHGB, principalmente os indianistas, nas suas
palavras, perigosos brasileiros caboclos.

O cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro (1826-1876), à época primeiro


secretário suplente, não deixou passar em branco os comentários de Varnhagen sobre os
demorados meios da catechese da Companhia de Jesus em civilizar os indios, e que
ainda restam tantos nos sertões, devorando-se uns aos outros, vexando o paiz e
degradando a humanidade. Por esse motivo, Fernandes Pinheiro fez uma longa
digressão sobre a importância da religião e da catequese, exaltando as realizações dos
inacianos no Brasil e no mundo e deixou o seu recado:

Em verdade sorprehende-me que uma pessoa tam illustrada como o


Sr. Varnhagen denomine de mal entendida philantropia, a sincera
defesa que faziam os primitivos jesuitas da liberdade dos indigenas, e
que prefira o emprego dos meios violentos aos da doçura e persuasão
que rejeita por serem demorados!!209. (itálico do original)

Em consequência, Gonçalves de Magalhães, a quem Varnhagen já havia criticado


em carta ao imperador, elaborou uma memória a fim de reabilitar os indígenas e, desta
forma, criticar o tratamento dispensado pelo historiador diplomata aos primeiros
habitantes do Brasil, além de, a exemplo de Abreu e Lima, questionar a sua
naturalidade, já que era filho de alemão e viveu a maior parte de sua vida fora do Brasil:

O Sr. Varnhagen, incansável pesquisador de antigos documentos, e


que quasi sempre viveo longe da pátria em serviço d’ella,
transportando-se com a imaginação aos tempos coloniaes, constituiu-
se o mais completo historiador da conquista do Brasil pelos
portuguezes, e o panegyrista da civilisação, mesmo a ferro e fogo,

208
A Confederação dos Tamoyos é um exemplo claro de subordinação do discurso histórico ao literário.
A separação entre esses gêneros ainda não estava claramente definida no Brasil. Conferir: Pedro Puntoni.
A Confederação dos Tamoyos de Gonçalves de Magalhães: poética da história e a historiografia do
Império. Novos Estudos, CEBRAP, nº 45, julho de 1996, p. 119-130.
209
Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro. Breves Reflexões sobre o systema de catechese seguido pelos
jesuitas no Brazil. RIHGB, Tomo 19, 1856, p. 379-397. Citação p. 388.

103
pelo captiveiro dos povos brasileiros, com quem não sympathisa,
talvez por não conhecel-os; e a quem ás vezes tudo nega, ate o titulo
de indigenas, chamando-lhes vindiços alienígenas como para não
dever-lhes caridade alguma 210. (itálico do original)
Observa-se, pois, que a maioria dos integrantes da mesa diretora e das comissões
de trabalhos do Instituto possuíam idéias divergentes das apresentadas por Varnhagen
na História Geral. No entanto o Instituto não se manteve em silêncio, pelo menos nas
reuniões e nas sessões aniversárias. Sua obra seria recebida como a maioria dos
trabalhos enviados ao grêmio: alguns esquecidos nos arquivos, outros parados nas
comissões. O que pode ter chateado o futuro visconde foi a não manifestação da
comissão de história encarregada de emitir o parecer.

Referências sobre a História Geral do Brasil são encontradas nas Atas das sessões,
antes da sua publicação, pelo 2º secretário, Francisco de Paula Menezes. Em 1854, ano
da publicação do primeiro tomo, foi feita a leitura do índice, fato já executado pelo
próprio autor, quando ocupava o cargo de primeiro secretário211. Na Sessão Magna, ao
final desse ano, Joaquim Manuel de Macedo, então 1º secretário, fez referência a essa
leitura e disse que tinha esperança de ser em breve consumada uma obra que fizesse
honra ao Brasil212. Porém, na Sessão Aniversária de 1856, Macedo não mencionou o
recebimento do ofício e nem da obra de Varnhagen.

Na sessão de aniversário do ano seguinte, Joaquim Manuel de Macedo falaria pela


primeira vez após um ano de indiferença. Antes, porém, ele teceu elogios ao poema
Confederação dos Tamoyos nas mais de quatro páginas de seu Relatório. À Varnhagen
destinou pouco mais de uma página:

Talvez bem poucos estivessem no caso de escrever uma boa historia


do Brazil, como o nosso consocio o Sr. Varnhagen; dispondo de
muitos recursos da intelligencia, tendo-se dado com empenho ao
estudo das cousas da patria, havendo sabido aproveitar-se das felizes
circumstancias que lhe facilitaram a entrada nos archivos de Portugal
e da Hespanha, onde se guardam documentos preciosos para a nossa
historia, o Sr. Varnhagen achava-se nas melhores condições para
prestar ao Brazil o notavel serviço que desde ja lhe agradecemos. O
nosso illustrado consocio tem apenas publicado o 1º volume da sua
obra; ainda portanto não é tempo de exhibir um juízo sobre ella; (...)
e hoje so nos assiste o agradável dever de declarar que foi com viva

210
Domingos José Gonçalves de Magalhães. Os indígenas do Brasil perante a Historia. RIHGB, Tomo
23, 1860, p. 03-66.
211
Francisco de Paula Menezes. Ata da sessão de 07/07/1854. RIHGB, Tomo 17, 1854, p. 623.
212
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do primeiro secretario. RIHGB, Tomo 17, 1854, p. 685.

104
satisfação que o instituto recebeu o 1º volume da Historia do Brazil
de nosso prestante consocio213. (itálico do original, grifos em negrito
nossos).

Joaquim Manuel de Macedo, além de demarcar o território dos escritores


românticos indianistas, exaltando seus feitos durante o ano, sugeriu que a
monumentalidade da obra de Varnhagen se deveu à sua inteligência, mas, sobretudo às
condições privilegiadas que ele dispôs para a pesquisa. Além disso, ao enfatizar a
publicação de apenas o primeiro volume da obra, apontava que estava incompleta. Ao
invés de enaltecimentos, Macedo deixou transparecer que a emissão do parecer se
condicionava à conclusão do segundo volume. Com apenas uma cajadada derrubava
dois coelhos: justificava o silêncio da comissão de história e cobrava agilidade de
Varnhagen para a conclusão de sua empreitada.

O golpe deve ter sido de difícil assimilação para o escritor da Historia Geral, que
pode ter sentido com isso o mesmo que o general Abreu e Lima quando seu Compendio
foi recusado pelo IHGB. Esse descaso contribuiu para que diminuísse drasticamente o
envio dos documentos ao Instituto. Na Sessão Aniversária de 1857, Araújo Porto
Alegre, então primeiro secretário, observou que Varnhagen estava renovando seu antigo
hábito com a remessa de dois importantes documentos. Destacou também que o escritor
acabava de dar a luz ao seu último volume da história pátria214.

Nem por isso o novo secretário deixou de exaltar os feitos de seus colegas, os
escritores românticos. Dessa vez evidenciou os trabalhos de Magalhães, novamente com
o poema sobre os Tamoyos, assim como os Timbiras de Gonçalves Dias e a Nebulosa
do ex-secretário Macedo.

Varnhagen no Discurso Preliminar - os índios perante a nacionalidade brasileira,


no segundo tomo da Historia Geral do Brazil, saída do prelo em 1857, respondeu às
críticas, ratificando as suas convicções anti-indianistas:

Os Indios não eram donos do Brazil, nem lhes é applicavel como


selvagens o nome de brazileiros: não podiam civilisar-se sem a
presença da força, da qual não se abusou tanto como se assoalha; e
finalmente de modo algum podem elles ser tomados para nossos

213
Joaquim Manuel de Macedo. Relatorio do primeiro secretario. RIHGB, Tomo 19, 1856, p. 109-110.
214
Manoel de Araújo Porto-Alegre. Relatorio do primeiro secretario. RIHGB, Tomo 20, 1857, p. 46.

105
guias no presente e no passado em sentimentos de patriotismo ou em
representação de nacionalidade215.

Na Europa, apesar dos elogios por parte de Ferdinand Denis, von Martius e
Humboldt, a obra de Varnhagen foi criticada pelo historiador francês Marie-Armand
d’Avezac-Macaya (1798-1875), assinalando que os indígenas só apareciam nos
capítulos 8, 9 e 10. Em vista de tantas críticas o escritor paulista muda, então, a
estrutura da obra. Na segunda edição, de 1877, os indígenas são deslocados para os
capítulos iniciais do seu livro.

Apesar desses fatos, finalmente o reconhecimento do Instituto chegou para o


historiador do cônego Januário. Em 1859 Varnhagen foi promovido a sócio honorário,
por uma proposta do cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro (1825-1876),
assinada por todos os sócios. Porém, na mesma sessão, o conselheiro Joaquim Maria
Nascentes de Azambuja (1812-1896) propôs que a distinção se estendesse aos sócios
Gonçalves de Magalhães e Joaquim Caetano da Silva216. Aliás, as concessões de títulos
nobiliárquicos, outro desejo de Varnhagen, também foi conseguida da mesma forma,
em conjunto com Magalhães, seu principal desafeto, e já nos últimos anos de vida. Para
Varnhagen, que defendia as origens europeias da nação brasileira, coube o título de
barão em 1872 e depois, em 1874, de visconde de Porto Seguro, marco do primeiro
ponto do litoral tocado pelos lusitanos. Da mesma forma, para Magalhães, barão e
depois visconde de Araguaia, devido ao seu indianismo exacerbado. Para Bernardo
Ricupero a obra de Varnhagen traduz no plano ideológico a atitude dos políticos
Saquaremas no campo político. Pois na obra se estabelecem os marcos da história
brasileira numa perspectiva que privilegia a ação do Estado em benefício da
manutenção da unidade, tal qual o projeto dos políticos conservadores. O Estado
consolidado foi a providência que propiciou a manutenção da unidade territorial e a
conservação da ordem estabelecida. A década de 1850, com a consolidação da
Monarquia ofereceu as condições necessárias para a elaboração de sua Historia
Geral217.

215
Discurso Preliminar: os Indios perante a nacionalidade brazileira. In: Francisco Adolfo de. História
Geral do Brazil. Madri, Imprensa da V. de Dominguez, 1ª ed., Tomo II, 1857, p. xxviii.
216
Ata da sessão de 01/07/1859. RIHGB, Tomo 22, 1859, p. 645. Na sessão de 25/05/1860, Varnhagen
envia uma carta ao Instituto agradecendo o diploma de sócio honorário. RIHGB, Tomo 23, 1860, p. 617.
217
Bernardo Ricupero. O Romantismo e a idéia de Nação no Brasil (1830-1870). São Paulo: Martins
Fontes, 2004, p.137.

106
A obra maior do visconde de Porto Seguro foi o símbolo de uma interpretação do
passado fundamentada no papel civilizador do português e na herança e continuidade do
Império lusitano. Assim, não é de se estranhar que Joaquim Manuel de Macedo tenha se
rendido a ela, ao elaborar as Lições de historia do Brasil, manual usado no Colégio
Pedro II, a partir de 1862, com base no modelo de cronologia adotado por Varnhagen e
que se constituiu, criticado ou não, numa constante presença nos livros didáticos
elaborados na segunda metade do século XIX e ao longo do século XX218.

Apesar do reconhecimento tardio, tanto o plano de von Martius como a Historia


Geral de Varnhagen foram ignorados, ou “esquecidos” pelos contemporâneos do
Instituto. Em 1863, por exemplo, manifestava-se novamente a necessidade de se
estimular um novo concurso para a escrita da história. Justificava-se para isso, o fato de
tanto a história do Brasil, e, por conseguinte a da Independência ainda estarem por se
fazer219. Na sessão de 01/06/1876, surgiu uma petição dos sócios Joaquim Antonio
Pinto Júnior e João Ribeiro de Almeida para que fosse nomeada uma comissão a fim de
idealizar:

(...) o Plano segundo o qual deve ser escripto em cada provincia do


Imperio um opusculo ácerca da geographia, ethnographia e estatistica
da respectiva provincia, devendo desses trabalhos serem
encarregados pessoas habilitadas nas diversas provincias, as quaes
não sendo socios correspondentes do Instituto, serão, pelo facto de
nomeação, considerados como taes220.

Em maio de 1877 a proposta sofreu um aditamento da comissão de trabalhos


geográficos, composta por Candido Mendes de Almeida e Guilherme Schüch de
Capanema. Esta emenda estabelecia que o Plano contemplasse também a historia
peculiar de cada provincia221.

O visconde de Porto Seguro começou a ser reabilitado pelo IHGB, após sua morte,
em 1878, e depois, pela passagem do centenário de seu nascimento, em 1916.
Curiosamente não foi pela obra monumental que produziu, mas pela descoberta dos
originais da História da Independência, publicada no contexto de comemoração do

218
Renilson Rosa Ribeiro. Op. Cit., p. 349.
219
Ata da sessão de 17/07/1863. RIHGB, Tomo 26, 1863, p. 880.
220
Ata da sessão de 01/05/1876. RIHGB, Tomo 39, 1876, p. 364-365.
221
Ata da sessão de 18/05/1877. RIHGB, Tomo 40, 1877, p. 438.

107
centenário da emancipação política brasileira. A obra apresentava depoimentos de
alguns dos fundadores do IHGB, como o cônego Januário e o visconde de São
Leopoldo, a qual conferia um grau de veracidade acima de qualquer suspeição 222. Sem
falar na absoluta absolvição pelo Tribunal da Posteridade, haja vista já ter-se passado
mais de setenta anos da morte dessas personagens.

222
Conferir: Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Da escola palatina ao silogeu: Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro (1889-1938). Rio de Janeiro: Museu da República, 2007.

108
Publicar ou arquivar? Últimas considerações

109
No periódico do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro encontra-se uma série
de pistas dos procedimentos metodológicos adotados nas tentativas de se construir uma
narrativa histórica para o Brasil. Tentativas porque a tão idealizada história geral, por
parte do cônego Januário da Cunha Barbosa, não encontrou receptividade junto ao
Instituto após a sua morte. A análise deste periódico revela a Operação Historiográfica
realizada pelo grêmio, articulado com o projeto de construção da ideia de nação e
civilização no Brasil Imperial, a partir de uma narrativa comum que amalgamasse o
território brasileiro. Cabe lembrar que a referida Operação inicia-se com o ato de
classificar o material coligido a fim de fazer parte da história223.

Dessa maneira, os membros das comissões de trabalhos, os presidentes, os


oradores e os primeiros secretários, da “Casa da memória nacional” deixavam claras
suas posições políticas, assim como também suas concepções teórico-metodológicas.
Estas não surgiam nos documentos coligidos do passado colonial, mas estavam
disseminadas nos discursos proferidos nas Sessões Aniversárias, nas acaloradas
discussões presentes nas Atas das Reuniões Ordinárias, nos Relatórios dos primeiros
secretários, nas Biografias das personalidades escolhidas e nos Elogios históricos dos
associados.

Para o historiador Temístocles Cézar, não há nenhuma dúvida que o IHGB


produziu uma memória nacional, porém esta opção não implica o “abandono” da

223
Michel de Certeau. A Operação Historiográfica. In: A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2002, p. 65-106.

110
história. Segundo este autor, fazer história quase que exclusivamente colonial, e,
inversamente, não fazer a história contemporânea é uma escolha certamente política,
mas também epistemológica. Esta opção não visava somente a proteger os políticos do
IHGB de descobertas desconfortáveis que a pesquisa do contemporâneo poderia revelar.
Ela seria a expressão teórico-metodológica, segundo a qual não é desejável se fazer a
história do imediato, pois ela é perigosa para a “objetividade” do historiador, e, logo,
para a melhor maneira de se escrever a história224.

Dessa forma, ainda compactuando com as reflexões do referido historiador, o


imenso acervo memorialístico “coligido”, “metodizado”, “publicado” ou “arquivado”
pelos consócios do IHGB ignoram o conjunto de esquecimentos, ausências e disputas
cujo resultado conferiu um sentido histórico à história brasileira.

Na Revista está visível o ambicioso projeto do IHGB, constituindo-se em um


lócus privilegiado para a pesquisa, nos termos de Manoel Salgado Guimarães, pois,
além de registrar as atividades do Instituto, por meio de seus Relatórios e das Atas das
sessões e divulgar cerimônias e atos comemorativos diversos, suas páginas se abriram à
publicação de documentos como forma de preservar a informação neles contidos. Por
meio das produções dos sócios, como as biografias, os necrológios, os pareceres de
obras ofertadas ao grêmio e nos desenvolvimentos dos programas históricos, aparecem
os indicativos de uma história para o Brasil. Um certo tipo de história, subordinada à
memória, mas ainda assim, uma história. Restringir a Revista a apenas um depositário
de memória é descartar todos os mecanismos inerentes à construção do discurso
historiográfico, como se verificou no decorrer da pesquisa.

Percebeu-se que a preocupação em se escrever a História do Brasil foi mais


intensa nos primeiros vinte anos da instituição. A partir do final da década de 1850 essa
questão vai se arrefecendo. O tratado de von Martius sobre como se deve escrever a
história não foi mais sequer mencionado. No final da década de 1870 surgiu uma
proposta de se elaborar um Plano para se escrever a história das províncias, porém não
foi levado adiante, assim como outros projetos sugeridos nas reuniões. Desta forma, o
Instituto não endossou nenhuma obra historiográfica elaborada no período estudado.

224
Conferir: Temístocles Américo Cezar. Presentismo, memória e poesia. Noções da escrita da História
no Brasil oitocentista. In: PESAVENTO, Sandra Jatahy. (org.). Escrita, linguagem, objetos: leituras de
história cultural. Bauru – SP: EDUSC, 2004, p. 55-56.

111
Torna-se compreensível o ímpeto dos anos iniciais em se escrever a história,
quando o Instituto estava sob o comando do cônego Cunha Barbosa. Justificava-se, por
exemplo, o fato de que nos primeiros anos faltava uma narrativa que legitimasse o
Estado que se encontrava em um período instável politicamente, com sérios riscos de
desintegração, a exemplo das Repúblicas hispano-americanas; nada melhor que uma
narrativa para se obter de um conjunto heterogêneo, uma unidade. Após a consolidação
do regime monárquico, a partir de 1850, uma história geral não se fazia mais prioritária,
já que a unidade territorial estava assegurada. Outra constatação refere-se à renovação
do quadro social do IHGB. Em meados da década de 1860 havia restado somente um
sócio fundador, Candido José de Araújo Vianna, o futuro marquês de Sapucaí.

Quanto ao dissenso por parte do Instituto acerca da chancela a uma escrita


histórica, mesclaram-se razões políticas e também epistemológicas. Politicamente, havia
a condição de o grêmio abrigar grupos distintos como, por exemplo, liberais moderados
e restauradores além de os acontecimentos ainda estarem recentes, cujos personagens
envolvidos eram alguns, os próprios sócios. Não podia haver consenso, por exemplo,
sobre a periodização; se a história começaria antes ou a partir da chegada dos
portugueses no Brasil, ou sobre as personagens que seriam os protagonistas da nação:
indígenas ou portugueses. Um grupo, porém, foi negligenciado: o negro e as questões
relativas à escravidão foram temas praticamente ignorados nas páginas do periódico.
Um assunto indigesto para os letrados do Império uma vez que se diziam herdeiros das
Luzes francesas e, portanto, deveriam ser contrários à escravidão. O eram
retoricamente, mas o Império, paradoxalmente necessitava da mão de obra africana para
a manutenção do regime.
Este trabalho é apenas uma das muitas possibilidades de análise sobre o
Instituto que se autodenominou “brasileiro”, e, ao concluí-lo, evidencia-se que no
periódico do IHGB podem ser encontradas uma série de pistas dos procedimentos
metodológicos e critérios sócio-políticos adotados nos bastidores da construção de uma
narrativa histórica para o Brasil. E que, apesar de não chancelar nenhuma das obras de
história produzidas no período aqui estudado, o Instituto deixou o legado de seu maior
empreendimento, qual seja, a sua Revista Trimestral, constituindo-se em uma das fontes
privilegiadas para se rastrear o ousado projeto historiográfico empreendido pelo Estado
monárquico brasileiro.

112
Fontes

113
Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (RIHGB). Tomos I, a LII (1839-
1889). Disponível em: http://www.ihgb.org.br/rihgb.php

Manuscritas
Bento Mure. (Benoît Jules) “La mort de S. A. I. Don Alphonse: ode par le docteur B.
Mure”. Arquivo IHGB, lata 119, pasta 07.

Karl Friedrich Phillip von Martius. “Bermerkungen über die verfassung einer
geschichte brasiliens”. Arquivo IHGB, lata 969, pasta 29.

Impressas
Alfredo d’Escragnolle Taunay. Viagem de regresso de Mato Grosso á côrte. RIHGB,
Tomo 32, 1869, p. 5-52.

Antonio Gonçalves Dias. A memoria historica do Sr. Machado de Oliveira e o parecer


do Sr. Duarte da Ponte Ribeiro. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 478-514.

_______ Resposta do Sr. A. Gonçalves Dias á Defesa do Parecer sobre a Memoria do


Sr. Machado d'Oliveira. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 558-572.

Candido Baptista de Oliveira. Parecer sobre a memória do Sr. José Joaquim Machado
de Oliveira, ácêrca da questão de limites entre o Brazil e Montevidéo. RIHGB, Tomo
16, 1853, p. 473-477.

Duarte da Ponte Ribeiro. Parecer sobre a memória do Sr. José Joaquim Machado de
Oliveira, lida na sessão do Instituto Histórico de 17 de junho de 1853. RIHGB, Tomo
16, 1853, p. 435-460.

114
______ Defeza do parecer sobre a memoria historica do Sr. Machado de Oliveira.
RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 515-554.

Domingos José Gonçalves de Magalhães. Os indígenas do Brasil perante a Historia.


RIHGB, Tomo 23, 1860, p. 03-66.

Francisco Adolfo de Varnhagen. Historia Geral do Brazil. Madri, Imprensa da V. de


Dominguez, 1ª ed., 1854, Tomo I, 1857, Tomo II.

_________ Primeiro juizo submettido ao Instituto Historico e Geographico Brasileiro


pelo socio Francisco Adolpho de Varnhagen, acerca do “Compendio da Historia do
Brasil” pelo Sr. José Ignácio de Abreu e Lima. RIHGB, Tomo 6, 1844, p. 60-83.

_______ Carta ao secretario do Instituto em 1846 em additamento ao Juizo, sobre o


Compendio da Historia do Brasil, publicado no n. 21 da Revista. RIHGB, Tomo 13,
1850, p. 396-401.

Francisco Rodrigues do Prado. História dos índios cavaleiros ou da nação Guaykuru,


escrita no Real Presídio de Coimbra ...– ano de 1795. RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 25-57.

Henrique Julio de Wallestein. Memória sobre o melhor plano de se escrever a história


antiga e moderna do Brasil. RIHGB, Tomo 45, 1882, p. 159-160.

Januario da Cunha Barbosa. Discurso inaugural no ato de estatuir-se o IHGB. RIHGB,


Tomo 1, 1839, p. .

_________ Lembrança do que devem procurar nas províncias os sócios do Instituto


Histórico Brasileiro, para remeterem à sociedade central do Rio de Janeiro. RIHGB,
Tomo 1, 1839, p. 141-143.

_________ Se a introdução dos escravos africanos no Brasil embaraça a civilização de


nossos indígenas, dispensando-se-lhes o trabalho, que todo foi confiado a escravos
negros. Neste caso qual é o prejuízo que sofre a lavoura brasil ? RIHGB, Tomo 1,
1839, p. 159-172.

_________ Biografia dos brasileiros distintos por armas, letras, virtudes, etc. O ilustre
conselheiro Henrique Julio de Wallestein. RIHGB, Tomo 6, 1844, p. 111-17.

José Feliciano Fernandes Pinheiro. O Instituto Histórico Brasileiro é o representante


das idéias da Ilustração, que em diferentes épocas se manifestaram neste continente.
RIHGB, Tomo 1, 1839, p. 61-76.
José Joaquim Machado de Oliveira. Memoria historica sobre a questão de limites entre
o Brazil e Montevidéo. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 393-432.
José Vieira Fazenda. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro: subsídios para a sua
história. RIHGB, Tomo 74, 1911, p. 279-441.

Karl Friedrich Phillip von Martius. Dissertação: Como se deve escrever a história do
Brasil. RIHGB, Tomo 6, 1844, p. 381-403.

115
Manuel Duarte Moreira de Azevedo. Sociedades fundadas no Brazil desde os tempos
coloniaes até o começo do actual reinado. RIHGB, Tomo 48, 1885, p. 265-327.

_______ O combate da ilha do cabrita. RIHGB, Tomo 33, 1870, p. 5-20.

Olegário Herculano d’Aquino e Castro. O Instituto Historico e Geographico Brazileiro


desde a sua fundação até hoje. RIHGB, tomo 60 (2), p. 171-201.

Pedro de Alcântara Bellegarde. Notas. RIHGB, Tomo 16, 1853, p. 555-557.

Raymundo José da Cunha Mattos. Dissertação acerca do sistema de escrever a história


antiga e moderna do Império do Brasil. RIHGB, Tomo 26, 1863, p. 121-43.

______ Épocas Brasileiras ou sumário dos acontecimentos mais notáveis do Império do


Brasil. RIHGB, Tomo 302, 1974, p. 218-351.

Rodrigo de Souza da Silva Pontes. Quais são os meios que se deve lançar mão para
obter o maior número possível de documentos relativos à história e geografia do Brasil.
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Thomaz Gomes dos Santos; Francisco Freire Allemão e Joaquim da Silveira na ata da
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Tristão de Alencar Araripe. Guerra civil no Rio Grande do Sul. RIHGB Tomos 43
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Virgilio Correa Filho. Como se fundou o Instituto Histórico. RIHGB – Separata, Tomo
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Periódicos:
O Patriota. Jornal litterario, politico, mercantil, &c. Rio de Janeiro: Impressão Regia,
1814. Disponível em: http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/64, acesso em
25/08/2011.

Nitheroy. Revista Brasiliense de Sciencias, Lettras, e Artes. Tomos I e II. Paris: Dauvin
et Fontaine, Libraires, 1836. Disponível em:
http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_periodicos/per700045/nitheroy.htm, acesso em
25/08/2011.

116
Referências Bibliográficas

117
ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. História: a arte de inventar o
passado. Ensaios de Teoria da História. Bauru: EDUSC, 2007.
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