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Experimentos Clássicos em Análise do Comportamento

Book · December 2016

CITATION READS

1 16,214

3 authors:

Paulo Guerra Soares João Henrique de Almeida


University of Northern Parana Universidade Estadual de Londrina
18 PUBLICATIONS   59 CITATIONS    45 PUBLICATIONS   131 CITATIONS   

SEE PROFILE SEE PROFILE

Carlos Cançado
Florida Institute of Technology
39 PUBLICATIONS   266 CITATIONS   

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Efeito de história pré-experimental e de variáveis atuais sobre o responder relacional: estudos analítico-comportamentais sobre comportamentos implícitos e
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EXPERIMENTOS CLÁSSICOS
EM ANÁLISE DO COMPORTAMENTO

ORGANIZADORES

Paulo Guerra Soares


João Henrique de Almeida
Carlos Renato Xavier Cançado

www.walden4.com.br

2016
Instituto Walden4
E71
Experimentos clássicos em análise do comportamento [recurso eletrônico]
/ organizado por Paulo Guerra Soares, João Henrique de Almeida, Carlos
Renato Xavier Cançado. - Brasília : Instituto Walden4, 2016.
333 p.
ISBN: 978-85-65721-10-3

1. Psicologia experimental. 2. Análise do comportamento. I. Soares, Paulo


Guerra, org. II. de Almeida, João Henrique, org. III. Cançado, Carlos Renato
Xavier, org. IV. Título.

CDD 150.724

Coordenadora: Seila Cibele Sitta Preto


Projeto Gráfico: Leandro Brasil Melo
Diagramação: Lorena Shimizu
Capa: Lorena Shimizu
DEDICATÓRIA

Dedicamos esse livro à Profa. Sônia dos Santos Castanheira,


ao Prof. Roosevelt Riston Starling, e ao Prof. Ernani Henrique Fazzi,
responsáveis por nosso primeiro contato com a Análise Experimental
do Comportamento.

iii
AUTORES E AUTORAS

Alina Barboza Cabral Bianco Carlos Eduardo Costa


Estudante de Graduação Doutor em Psicologia
(Psicologia) – Universidade de Experimental – Universidade de
Rio Verde. São Paulo.

André Augusto Borges Varella Carlos Renato Xavier Cançado


Doutor em Psicologia – Doutor em Psicologia/Análise
Universidade Federal de São do Comportamento – West
Carlos. Virginia University, Estados
Unidos.
Andréia Schmidt
Doutora em Psicologia Carolina Coury Silveira
Experimental – Universidade de Mestre em Psicologia –
São Paulo. Universidade Federal de São
Carlos.
Armando Domingos Batista
Machado Cristiano Coelho
Doutor em Psicologia – Duke Doutor em Psicologia –
University, Estados Unidos. Universidade de Brasília.

Candido Vinícius Bocaiuva Cristiano Valério dos Santos


Barnsley Pessôa Doutor em Psicologia
Doutor em Psicologia Experimental – Universidade de
Experimental – Universidade de São Paulo.
São Paulo.
Edson Massayuki Huziwara
Carlos Augusto de Medeiros Doutor em Psicologia
Doutor em Psicologia – Experimental – Universidade de
Universidade de Brasília. São Paulo.

iv
Elenice Seixas Hanna Ítalo Siqueira de Castro
Doutora em Psicologia – Teixeira
University of Wales, Reino Graduação em Psicologia –
Unido. Universidade de Fortaleza.

Fábio Henrique Baia João Claudio Todorov


Doutor em Ciências do Doutor em Psicologia – Arizona
Comportamento –Universidade State University, Estados
de Brasília. Unidos.

Flávia Hauck João Henrique de Almeida


Mestre em Ciências do Doutor em Psicologia –
Comportamento –Universidade Universidade Federal de São
de Brasília. Carlos.

Hernando Borges Neves Filho Kennon A. Lattal


Doutor em Psicologia Doutor em Psicologia
Experimental – Universidade de Experimental e Clínica –
São Paulo. University of Alabama, Estados
Unidos.
Hiroto Okouchi
Doutor em Ciências do Lucas Ferraz Córdova
Comportamento – Hiroshima Doutor em Ciências do
University, Japão. Comportamento –Universidade
de Brasília.
Isabella Guimarães Lemes
Estudante de Graduação Marcelo Borges Henriques
(Psicologia) – Universidade de Mestre em Psicologia –
Rio Verde. Pontifícia Universidade Católica
de Goiás.

v
Márcio Borges Moreira Poliana Ferreira da Silva
Doutor em Ciências do Estudante de Graduação
Comportamento –Universidade (Psicologia) – Universidade de
de Brasília. Rio Verde.

Marco Vasconcellos Rafaela Meireles Fontes


Doutor em Psicologia – Purdue Azevedo
University , Estados Unidos. Mestre em Ciências do
Comportamento – Universidade
Maria Carolina Correa de Brasília.
Martone
Mestre em Psicologia William Ferreira Perez
Experimental – Pontifícia Doutor em Psicologia
Universidade Católica de São Experimental – Universidade de
Paulo São Paulo.

Marília Pinheiro de Carvalho


Doutora em Psicologia Básica
– Universidade do Minho,
Portugal.

Paulo Guerra Soares


Mestre em Análise do
Comportamento – Universidade
Estadual de Londrina.

Peter Endemann
Doutor em Psicologia
Experimental – Universidade de
São Paulo.

vi
AGRADECIMENTOS

“É preciso de uma aldeia inteira para criar uma criança”1. É ver-


dade: muito trabalho, de muitas pessoas. Em relação à escrita de um ar-
tigo científico, Killeen e Pellón (2013) indicaram que também “É preciso
de uma aldeia inteira para criar um artigo”2 (p.19): muito trabalho, cer-
tamente de muitas pessoas. O mesmo pode ser dito sobre a organização
de um livro. Gostaríamos de agradecer a todas e a todos dessa “aldeia”,
cujo trabalho permitiu que esse livro fosse criado.

Agradecemos à cada autora e a cada autor dos capítulos que


compõem esse livro. Vocês abraçaram o projeto e contribuíram de uma
forma que o nosso breve agradecimento não consegue descrever e nun-
ca será suficiente. Para vocês, especialmente, o nosso “Muito obrigado”.

Agradecemos ao Prof. Alexandre Dittrich pela escolha da capa


desse livro e pela escrita do texto que a acompanha. Cientistas são “ar-
tistas do mundo natural” e a experimentação é um caminho central
de sua atividade. Agradecemos à Profa. Deisy das Graças de Souza por
escrever o prefácio e apresentar o livro de forma tão clara à audiência
para qual foi escrito. O conselho que ela dá para futuras e futuros ana-
listas do comportamento é válido para todas e todos interessados no
estudo científico do comportamento, mesmo para quem tem familiari-
dade e trabalha há anos com a experimentação.

Agradecemos à equipe do Projeto de extensão UneDesign - In-


tegração Universidade-Empresa do curso de Desenho Industrial com
habilitação em Programação Visual, da Universidade do Norte do Para-
ná, coordenada pela Profa. Seila Cibele Sitta Preto, pelo trabalho cuida-

1
It takes a village to raise a child.
2
“It takes a village to raise a paper”. Killeen, P. R., & Pellón, R. (2013). Adjuntive behaviors are operants. Learning &
Behavior, 41, 1-24.

vii
doso em cada etapa da preparação desse livro. Aos discentes Leandro
Brasil Melo pelo desenvolvimento do projeto gráfico, e Lorena Shimizu
pela diagramação e desenvolvimento projetual de capa. O trabalho foi
feito como parte de um projeto de extensão, e retrata a importância da
integração das atividades de ensino e pesquisa na relação entre a uni-
versidade e as comunidades nas quais está inserida.

Por fim, agradecemos ao Prof. Márcio Borges Moreira, que acre-


ditou no projeto e aceitou a tarefa de publicação de um livro gratuito e
em formato eletrônico pela Editora do Instituto Walden4.

É verdade: é preciso de uma aldeia para criar um livro!

Paulo Guerra Soares


João Henrique de Almeida3
Carlos Renato Xavier Cançado4

3
Apoio da FAPESP (Processo no: 2014/01874-7).
4
Apoio CAPES (PNPD).

viii
PREFÁCIO

... even though laboratory methods are often devised not for practical
teaching but for the study of fundamental behavioral processes, the
techniques are then available for application outside the laboratory.

Murray Sidman, 1994, P.534

Tomar conhecimento da edição deste livro me deixou particular-


mente entusiasmada. É sempre bom contar com material de qualidade
como suporte para o ensino e, neste caso, vislumbrei a possibilidade de
ter em mãos um material muito compatível com a maneira como gosto
de trabalhar nas disciplinas que ministro para o curso de graduação em
Psicologia.

Segundo me relataram os organizadores, sua proposta era trazer


ao leitor experimentos clássicos em análise do comportamento, rela-
tados e interpretados por pesquisadores da área, com ênfase em suas
contribuições para novas linhas de pesquisa. Gostei imediatamente da
proposta e me lembrei de outras ocasiões em que tive oportunidade
de explorar artigos de pesquisa como fontes para atividades de ensi-
no, buscando propiciar ao aluno condições para o desenvolvimento de
uma ampla gama de habilidades, incluindo a busca pelas origens de
ideias, conceitos, procedimentos. No período em que estive na UnB,
no início da década de 90, tive oportunidade de trabalhar com meu
colega Jorge Mendes de Oliveira Castro, na disciplina Psicologia Geral
e Experimental (PGE I), para alunos do primeiro semestre do curso de
graduação em Psicologia. Discutimos muito as condições de entrada
dos alunos no curso, incluindo as possíveis ideias preconcebidas sobre
nossa disciplina, e a necessidade de colocá-los logo em contato com o
que se estuda em Psicologia e, ao mesmo tempo, mantê-los motivados
para ler e estudar o assunto. Concordamos muito rapidamente que, em

ix
vez de ler livros texto, os alunos poderiam aprender muito lendo arti-
gos científicos, mais precisamente, relatos de pesquisa experimental,
o que lhes permitiria ter contato com autores importantes da área e
conhecer um pouco do desenvolvimento de nossa ciência. Tenho as
melhores lembranças das horas e horas que passamos escolhendo os
textos (claro que fizemos um levantamento 10 vezes maior do que seria
possível abordar em uma disciplina de um semestre) e do entusiasmo
com que trabalhamos naquela disciplina, em grande parte motivado
pelos progressos dos alunos, evidenciados nas discussões em sala, em
suas habilidades de ler e pensar, de utilizar o raciocínio científico, e de
se dar conta de que cada experimento pode trazer uma nova contri-
buição, mas também pode ter limitações, e que identificar os limites é
um caminho para novas ideias e novas possibilidades de investigação.
Sentíamos que estávamos criando boas condições para o desenvolvi-
mento de pelo menos alguns dos requisitos importantes no repertório
de futuros psicólogos e, talvez, pesquisadores em psicologia.

Retornando à UFSCar, tive oportunidade de fazer parte da equi-


pe que planejou o curso de graduação em Psicologia, implantado em
1994. Novamente me coube uma disciplina introdutória e quando co-
mentei sobre a experiência na disciplina da UNB, meu colega Júlio de
Rose me apresentou o livro de Roger Hock: “Quarenta estudos que
transformaram a Psicologia”. O livro organizava o material em 10 ca-
pítulos, cada capítulo apresentando quatro estudos clássicos. A organi-
zação apresenta uma característica que resolvia muitos dos problemas
que eu encontrara antes, ao exigir de alunos de primeiro semestre a
leitura de um estudo experimental em toda a complexidade de seu re-
lato original: neste livro, cada estudo é apresentado de maneira resu-
mida – isto é, retira detalhes e complexidade do texto, sem deixar de
apresentar ao leitor as informações essenciais para a compreensão do

x
que foi feito e da justificativa para fazê-lo; além disso, o autor do livro
apresenta o contexto em que cada investigação foi concebida e con-
duzida; e ao final do texto, apresenta, também, de maneira resumida,
mas suficientemente informativa, as linhas de pesquisa e os desenvol-
vimentos subsequentes que derivaram daquele estudo seminal (isto é,
oferece uma perspectiva histórica do desenvolvimento da psicologia,
por meio do trabalho concreto de pesquisadores relevantes). Usei o
livro por vários anos, enquanto ministrei a disciplina (fui depois subs-
tituída pelo Júlio, que continuou usando o “Hock”) e estou certa que
o uso desse material, em suas sucessivas reedições, tem contribuído
muito positivamente para iniciar o desenvolvimento das concepções
do aluno sobre o que estuda a Psicologia – e sobre como essa ciência
vem sendo, e poderá continuar sendo, construída.

Experiência similar teve ocasião quando Edson Huziwara, fa-


zendo pós-doutorado na UFSCar, se dispôs a oferecer uma turma da
disciplina optativa do curso, denominada Fenômenos e Processos Psi-
cológicos; fui formalmente responsável pela disciplina e estive presen-
te em todas as aulas, mas todo o trabalho foi planejado e conduzido
pelo Edson e pelo João Henrique de Almeida, um dos organizadores
deste livro. Aquela disciplina do curso de Psicologia da UFSCar per-
mite, a cada oferta, a especificação dos tópicos abordados e Edson e
João propuseram que naquele semestre a disciplina tivesse por obje-
tivo apresentar, de forma sucinta, a produção empírica (experimentos
clássicos) sobre diversos processos comportamentais investigados pela
análise experimental do comportamento e ensinar as habilidades ne-
cessárias para uma leitura competente de textos científicos. Os alunos
eram de uma turma avançada e liam os artigos no original, os professo-
res realizaram um excelente trabalho de preparar cuidadosamente cada
estudo para apresentar em sala, destacando seus aspectos fundamen-

xi
tais e apresentando pistas para que os alunos discutissem qualidades
e limites da pesquisa em foco. Sou testemunha de que esta atividade
funcionou como reforçador poderoso para a leitura prévia dos alunos,
e, ao mesmo tempo, como modelo de leitura cuidadosa e crítica.

Reconheço que ao relatar essas experiências estou falando de


meu trabalho, em vez de falar sobre o livro que apresento aos leitores.
Mas espero ter fornecido evidências do quanto aprecio o que encontrei
nele:

- O conteúdo é específico de análise do comportamento: trata-


-se, assim, de uma fonte organizada de informações que podem ser
usadas no ensino de disciplinas da área.

- A seleção de artigos relevantes, que deram origem a importan-


tes desenvolvimentos na área, pode contribuir decisivamente para que
o leitor compreenda a relevância da memória da investigação científi-
ca, a importância de se conhecer os clássicos e de se estabelecer rela-
ções entre o experimento original e a linha ou linhas de pesquisa gera-
das por ele e sua importância para o conhecimento atual em análise do
comportamento.

- A ênfase em estudos experimentais permite destacar aspectos


metodológicos, as possibilidades e a importância de investigação rigo-
rosa, os necessários limites (seja do ponto de vista do controle, seja do
ponto de vista da validade interna e externa), as contribuições poten-
ciais para a compreensão de processos comportamentais, as pergun-
tas que deixaram de ser respondidas, ou que foram suscitadas pelos
dados. Esse conjunto de aspectos representa uma rica oportunidade
para subsidiar a avaliação crítica da pesquisa científica em análise do

xii
comportamento, e, o que é de extrema relevância para a sobrevivên-
cia das práticas científicas (investigação e intervenção) em análise do
comportamento, despertar talentos e vocações para dar continuidade
ao desenvolvimento da área.

Por todos esses aspectos, avalio que este volume pode ser uma
fonte inestimável para formação ou o aprimoramento de analistas do
comportamento.

Há algum tempo, em uma entrevista para a Associação Brasileira


de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC), a entrevistadora
me perguntou que conselhos eu daria para a nova geração de analistas
do comportamento. Embora desacredite no potencial de “conselhos”
(sem outras condições críticas) para gerar ou manter comportamentos,
arrisquei alguns palpites que talvez respondessem ao interesse de al-
guém. Penso que os palpites valem também para jovens analistas que
busquem aprender com este livro, por isso tomo a liberdade de trans-
crever alguns pontos daquela fala:

Não existe nada que você possa fazer bem feito, que não exija esfor-
ço, comprometimento, dedicação e um trabalho sistemático. Em nossa
área, seja no estudo, na investigação, ou nas aplicações a problemas
humanos, não dá para fazer um trabalho de qualquer jeito, não se
pode fazê-lo rapidamente, nem superficialmente. Por isso, para quem
quer se tornar um analista do comportamento competente, seja no
desenvolvimento científico da área, seja no desenvolvimento profis-
sional, o primeiro passo é dedicação. É preciso ler (ou melhor, estudar)
relatos originais de pesquisa; é preciso ler muito, voltar às origens, ler
os clássicos e, claro, ler bibliografia atualizada. Muitas vezes presencio
meus alunos lendo – ou escrevendo sobre o que leram, e eles tendem a

xiii
assumir que o autor que estão lendo no momento foi o primeiro a falar
daquele assunto, ou o que teve a ideia original de que trata a pesqui-
sa. Muitas vezes, trata-se de conceitos elaborados há muito tempo,
que são encontrados em Skinner (1931, 1938, 1953), Keller e Schoenfeld
(1950), Ferster e Skinner (1957), Millenson (1967), Sidman (1960), mas
eles citam o artigo mais recente que leram, como se fosse a fonte ori-
ginal. É preciso estar atualizado, acompanhar o desenvolvimento da
área e para isto é preciso recorrer à literatura recente, mas também
é preciso manter o registro, a memória ou a história dos conceitos e
descobertas. Apesar de todas as exigências de referência de citação
científica, muitas vezes vemos uma deturpação em relação às origens.
Não é incomum encontrarmos, em 2016, um artigo citando um au-
tor que publicou em 2015, como se este fosse a referência original de
um determinado assunto. É muito importante estudar os trabalhos
dos pioneiros (e se interessar por quem foram eles, sob que condições
trabalharam, onde e quando viveram), ler e conhecer o que a área já
produziu, ao mesmo tempo em se lê referências atualizadas. É preciso
tentar dominar o conhecimento produzido na área, que não é pouco;
quanto mais se conhece – os conteúdos e os caminhos que levaram
a eles, mais o analista do comportamento disporá de instrumental
teórico, conceitual e de procedimentos, para analisar e interpretar
situações novas e para pensar, gerar novos estudos, ou planejar in-
tervenções com embasamento cientifico. As facilidades de acesso são
cada vez maiores, mas não podemos nos iludir com essa facilidade.
É muito fácil acessar dezenas de artigos pela internet e poder abrir
cada um deles com um simples toque. Mas não basta: faltam os passos
seguintes: como é que se lê essa quantidade de material, de maneira
funcional? Será preciso trabalhar muito, de forma disciplinada. Para
quem quiser ter uma boa formação como analista do comportamento,
existe muito conhecimento sedimentado para se aprender a trabalhar

xiv
e existem boas oportunidades de novos desenvolvimentos, mas para
isso é preciso estudar, se dedicar, se comprometer.

Este livro pode ser um bom começo. Neste primeiro volume da


série foram selecionados estudos experimentais sobre condicionamen-
to respondente; sobre o papel das consequências e parâmetros de re-
forço (atraso do reforço; contraste comportamental; comportamento de
escolha, história comportamental, ressurgência); sobre controle de es-
tímulos (processos atencionais, respostas de observação, responder por
exclusão, eventos privados, resolução de problemas, Teoria das Mol-
duras Relacionais); sobre comportamento social (cooperação, cultura) e
comportamento verbal (correspondência verbal e não verbal; compor-
tamento governado por regras); e sobre análise funcional. Todos eles
deram origem a linhas de pesquisa produtivas, responsáveis por gran-
de parte do estado atual da pesquisa em análise do comportamento.
Os autores dos capítulos são investigadores nacionais e internacionais,
que conhecem profundamente os estudos e seus autores e estão com-
prometidos com a difusão e o ensino de análise do comportamento.

Por todos esses aspectos, estou certa de que o livro atende a uma
necessidade importante em nossa área, e que se tornará um oportuno
ponto de partida para iniciantes e uma excelente ocasião para revisão e
atualização para os iniciados em análise do comportamento.

Deisy G. de Souza
Universidade Federal de São Carlos

xv
SOBRE A CAPA

A ciência e a arte são as mais belas criações do comportamento


humano. Elas demonstram, cada uma à sua maneira, nossa fascinante
capacidade de transformar o mundo e de nos transformarmos ao fazê-
lo.

O gentil convite feito por Carlos, João e Paulo para que eu esco-
lhesse a imagem da capa do livro que você agora lê me confrontou com
um desafio singular: ilustrar, com o auxílio da arte, o conteúdo de um
livro científico.

Minha tarefa certamente foi facilitada pelo fato de que a arte não
nos compromete com interpretações “certas”. A arte é o campo da su-
gestão, da metáfora, do símbolo. Assim, me lancei à tarefa sob um vago
controle temático, mas também me deixando levar pela beleza e pelo
poder evocativo das imagens.

A Osteographia, publicada pelo anatomista inglês William Che-


selden em 1733, é uma das obras mais importantes da história da ilus-
tração anatômica. Ela impressiona não apenas pela precisão, mas pela
elegância. As criaturas humanas e não-humanas que ali aparecem não
são meros auxílios da ciência, passivamente à disposição dos estudio-
sos: em tudo o que importa, elas parecem vivas, ativas, interagindo
com seu entorno.

O fato de serem apenas esqueletos dá às imagens seu impacto.


Seres vivos reduzidos à sua dura estrutura têm fascinado a humanida-
de ao longo dos séculos. Caveiras e esqueletos nos lembram de nosso
destino comum. A representação da morte como um esqueleto vivo é
comum a várias culturas.

xvi
O que nos mostra que estão mortos é o fato de serem apenas
esqueletos. O que nos mostra que estão vivos é o fato de interagirem
com o mundo. Os esqueletos que nos assombram e nos encantam na
tradição são a encarnação desencarnada da contradição: são mortos
que vivem. Se neles pouco resta do que esperaríamos encontrar em
um corpo vivo, o comportamento é seu único sinal de vida - e, como
lembrava Skinner, a história do comportamento e a história da vida
começam juntas.

O esqueleto que está na capa deste livro nos lembra ainda que
a vida é evolução - e que nós, seres vivos, estamos todos ligados por
laços de parentesco. Trata-se de uma figura simiesca, que não obstante
adota uma postura aparentemente “intencional” e verbal, tipicamente
humana. É como se interagisse com outros de sua espécie, cuja pre-
sença a imagem permite apenas subentender. Filogênese, ontogênese e
cultura estão todas na imagem - desde que nossa história nos permita
encontrá-las.

Assim como a Osteographia de Cheselden, que utilizou magis-


tralmente a arte para fazer ciência, espero que também este livro pos-
sa mostrar, da capa à última página, quão fascinante é a jornada de
conhecimento e autoconhecimento proporcionada pela investigação
científica.

Alexandre Dittrich
Universidade Federal do Paraná

xvii
APRESENTAÇÃO

Este livro foi idealizado a partir de uma paixão comum dos três
organizadores: a Análise Experimental do Comportamento. A ideia ge-
ral consiste em apresentar, a estudantes de graduação, diversos temas
de pesquisa em Análise do Comportamento por meio de experimentos
clássicos. A análise experimental geralmente é considerada um terreno
árido, com descrições metodológicas difíceis e um certo “desprendi-
mento” das questões do dia a dia. Estes fatores, em nossa opinião, difi-
cultam o contato e até mesmo o interesse de estudantes iniciantes pelo
laboratório e pela pesquisa experimental sobre o comportamento.

Buscando inspiração em livros de divulgação científica, como


“Forty studies that changed Psychology” de Roger Hock, formatamos a
ideia inicial do livro. Estas ideias nos levaram a uma série de convites
a pesquisadores e pesquisadoras de diversas instituições brasileiras e
internacionais para contribuírem com a obra. Convites aceitos, o livro
começou a ganhar forma. Mais ideias foram surgindo, e foram tantos
os temas escolhidos que acabamos tendo que dividir a obra em dois
volumes. Depois de incontáveis reuniões que aproximaram Londrina,
São Carlos e Brasília, conseguimos concretizar nosso objetivo.

Em cada capítulo, autores e autoras discutem temas relevantes


na Análise do Comportamento a partir da descrição de um experimento
“clássico”. Clássico, aqui, não significa necessariamente o estudo mais
antigo, mas aquele que é reconhecidamente uma influência importante
naquela área de pesquisa, ou seja, que tenha servido de contexto para
a produção de mais conhecimento científico. Assim, em cada capítulo,
o experimento clássico serve como um pano de fundo para a apresen-
tação do tema, e os textos foram escritos com uma linguagem leve e
acessível, buscando, sempre que possível, uma ponte entre os procedi-
mentos metodológicos e o contexto aplicado.

xviii
Esperamos que esta obra inspire estudantes (e futuros pesquisa-
dores e pesquisadoras!) a se enveredarem pelos caminhos fascinantes
da pesquisa experimental sobre o comportamento dos organismos. E
que essa jornada seja para estes estudantes um pouco do que foi (e con-
tinua sendo) para nós: um caminho de muito trabalho e de muitos erros
e acertos, mas, acima de tudo, um caminho muito gratificante e enri-
quecedor. Esperamos, também, que este material sirva como um apoio
aos professores e professoras das disciplinas de Análise Experimental
do Comportamento, como contexto para discussões sobre os temas de
pesquisa que compõe os currículos destas disciplinas.

Boa leitura!

Paulo Guerra Soares


João Henrique de Almeida
Carlos Renato Xavier Cançado

xix
SUMÁRIO

Capítulo I.............................................................................................24
Somos todos produtos da nossa história comportamental
Paulo Guerra Soares, Carlos Eduardo Costa

Capítulo II...........................................................................................36
O cheque está no correio: investigando como o reforço atrasado afeta
o desempenho
Kennon A. Lattal

Capítulo III.........................................................................................49
Quando o passado retorna: ressurgência comportamental
Carlos Renato Xavier Cançado, Flávia Hauck, Ítalo S. C. Teixeira

Capítulo IV..........................................................................................64
Clarice Lispector, tempo e consequências: considerações sobre con-
traste comportamental
João Cláudio Todorov, Rafaela M. Fontes Azevedo

Capítulo V...........................................................................................78
Da frequência absoluta à frequência relativa como unidade de análise
do comportamento
Cristiano Coelho

Capítulo VI.........................................................................................95
Prestaram atenção em tudo?
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

xx
Capítulo VII.....................................................................................109
A resposta de observação: o papel das respostas sensoriais para o es-
tabelecimento da discriminação
Peter Endemann, Candido V. B. B. Pessôa

Capítulo VIII.....................................................................................123
Controle dos processos atencionais
Edson Massayuki Huziwara, Candido V. B. B. Pessôa

Capítulo IX.......................................................................................139
O responder controlado temporalmente: desdobramentos da pesquisa
com a tarefa de bissecção
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

Capítulo X.........................................................................................158
Como você se sente?
Hiroto Okouchi

Capítulo XI........................................................................................171
“Esse não é um pitilics, então só pode ser aquele”: o responder por
exclusão e a aprendizagem de repertórios verbais
Adreia Schimidt

Capítulo XII......................................................................................186
Paus e pedras podem machucar, mas palavras... também! - Teoria das
molduras relacionais
João Henrique de Almeida e William Ferreira Perez

xxi
Capítulo XIII....................................................................................205
Quando o mundo interage com o que é dito sobre o mundo: o compor-
tamento governado por regras
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

Capítulo XIV.....................................................................................222
A função do mentir em crianças: o controle operante na correspon-
dência verbal
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

Capítulo XV......................................................................................239
Do indivíduo ao grupo: simulações experimentais de relações sociais
com animais não-humanos
Marcelo Borges Henriques

Capítulo XVI..................................................................................254
Metacontingências: investigação experimental da seleção cultural
Fábio Henrique Baia, Alina Barboza Cabral Bianco, Isabella Guimarães
Lemes, Poliana Ferreira da Silva

Capítulo XVII..................................................................................272
“Para com isso menino!”: análise funcional em problemas de compor-
tamento
André A. B. Varella, Maria Carolina Correa Martone, Carolina Coury
Silveira

Capítulo XVII..................................................................................284
Recombinação de repertórios: criatividade e a integração de aprendi-
zagens isoladas
Hernando Borges Neves Filho

xxii
Capítulo XIX....................................................................................297
Controlar para conhecer
Cristiano Valério dos Santos

Capítulo XX......................................................................................310
The check is in the mail: examining how delayed reinforcement af-
fects performance
Kennon A. Lattal

Capítulo XXI....................................................................................322
How do you feel?
Hiroto Okouchi

xxiii
Paulo Guerra Soares, Carlos Eduardo Costa

Somos todos produtos


da nossa história
comportamental

Paulo Guerra Soares


Universidade Norte do Paraná; Núcleo Evoluir

Carlos Eduardo Costa


Universidade Estadual de Londrina

Weiner, H. (1964). Conditioning history and human fixed-interval performance. Journal of the
Experimental Analysis of Behavior, 7(5), 383-385.

“O hoje é apenas um furo no futuro, por onde o passado começa a jorrar”


Raul Seixas e Marcelo Nova

24
Capítulo I | História Comportamental

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- ner, o Behaviorismo Radical enfatiza o es-


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO tudo do comportamento de cada indivíduo
DO EXPERIMENTO (e não apenas os padrões típicos de cada
espécie). Assim, fazendo jus à analogia com
Uma das principais afirmações da te- a teoria da evolução de Darwin, o compor-
oria da evolução por seleção natural é que tamento atual dos indivíduos é produto de
as gerações atuais de indivíduos de uma um conjunto de relações entre o compor-
determinada espécie são produto de um tamento do indivíduo (selecionado na his-
constante processo de variação e seleção. tória individual) e o ambiente atual. Nesse
Assim, ao longo da história de evolução sentido, Skinner afirma que “Coube a Da-
de uma espécie, indivíduos com caracte- rwin descobrir a ação seletiva do ambien-
rísticas menos adaptativas morreram, en- te, assim como cabe a nós [behavioristas]
quanto aqueles mais bem adaptados sobre- completar o desenvolvimento da ciência do
viveram, passando seus genes às próximas comportamento com uma análise da ação
gerações. É importante lembrar que mais ou seletiva do meio”. (Skinner, 1974, p.60-61).
menos adaptativa significa que, sob certos
aspectos do ambiente, certas características Como funciona essa relação entre a
favorecem mais certos indivíduos de uma ação do indivíduo e as variáveis ambien-
espécie do que outras. Não há característi- tais? Skinner propõe que em determinadas
cas intrinsecamente melhores do que ou- circunstâncias, nos comportamos no mun-
tras. Aquelas cuja consequência seja maior do de diversas maneiras (variação) e uma
chance de sobrevivência e procriação irão ou algumas dessas maneiras de nos com-
aumentar de frequência na espécie. Portan- portar produzem alterações no ambiente.
to, para explicar por que os indivíduos de Estas alterações podem produzir mudanças
uma espécie exibem alguma forma de com- na probabilidade futura do comportamento
portamento típico (como espirros, bocejos, (seleção). Se as consequências do compor-
náuseas ou salivação, no caso do ser huma- tamento forem reforçadoras, produzirão
no), é imprescindível uma análise da histó- um aumento na probabilidade desse com-
ria de seleção dessa espécie. portamento ocorrer sob circunstâncias se-
melhantes no futuro. Se as consequências
Este modelo de variação e seleção forem punidoras, produzirão uma diminui-
dos aspectos biológicos, proposto por Char- ção na probabilidade da ocorrência do com-
les Darwin no seu livro Origem das Espécies portamento. Neste último caso, o indivíduo
(1859), é reconhecidamente uma das inspi- pode se comportar em função da situação
rações de B. F. Skinner na formulação do que indica que uma consequência nociva é
Behaviorismo Radical (Baum, 2006; Lau- provável e, assim, aprende também a evitar
renti, 2009; Skinner, 1974; 1981). Para Skin- estas situações. Assim, cada indivíduo, ao

25
Paulo Guerra Soares, Carlos Eduardo Costa

entrar em contato com experiências únicas a história comportamental de crianças ten-


ao longo da vida, vai aprendendo determi- diam a explicar seu comportamento atual
nadas maneiras de agir a partir das conse- a partir de um viés mentalista. Por outro
quências que esse comportamento produz. lado, quando os observadores conheciam
a história comportamental das crianças,
A noção de seleção do comporta- tenderam a leva-la em consideração na ex-
mento por consequências sugere que, para plicação do comportamento atual em detri-
que possamos explicar os comportamentos mento das causas mentais. Assim, Skinner
dos indivíduos, é imprescindível uma aná- (1953/2003) afirmou que o “hábito de bus-
lise da história comportamental de cada car dentro do organismo uma explicação
um (Aló, 2005; Chiesa, 1994; Costa, Cirino, do comportamento tende a obscurecer as
Cançado & Soares, 2009; Freeman & Lattal, variáveis que estão ao alcance de uma aná-
1992; Skinner, 1974; Soares, Costa, Cança- lise científica. Estas variáveis estão fora do
do & Cirino, 2013). Skinner já apontava que organismo, em seu ambiente imediato e em
“uma análise do comportamento é (...) ne- sua história ambiental” (p. 33).
cessariamente ‘histórica’” (1974, p. 236), pois
os comportamentos atuais são produto de A afirmação de Skinner (1953/2003)
uma história de seleção que ocorre ao longo levanta a seguinte questão: Como podemos
da vida de cada indivíduo. analisar cientificamente os efeitos da histó-
ria ambiental sobre o comportamento atu-
Neste sentido, é relativamente se- al? Sidman (1960) afirmou que, em um con-
guro afirmar que pessoas que passaram texto experimental, a “melhor maneira de
por experiências diferentes ao longo da um experimentador especificar a história
vida, quando expostas a situações pareci- comportamental de um organismo, na me-
das no presente, se comportam de manei- dida em que é importante para um deter-
ras distintas. Contudo, o que se observa é minado problema, é construir deliberada-
que a grande maioria das explicações do mente essa história no organismo” (p. 290,
senso comum negligencia a história com- itálico adicionado). Ou seja, o experimenta-
portamental na determinação do compor- dor interessado no estudo da história com-
tamento atual (Aló, 2005; Chiesa, 1994). portamental deveria ser capaz de construir
Valendo-se de uma terminologia dualista/ diferentes histórias para seus participantes
mentalista, o senso comum explica o com- no laboratório (Wanchisen, 1990).
portamento dos indivíduos recorrendo a
conceitos como “personalidade” ou “cará- Porém, até meados da década de
ter”. A pesquisa de Simonassi, Pires, Ber- 1960 não havia, na literatura analítico-com-
gholz e Santos (1984), por exemplo, identi- portamental, um conjunto de dados siste-
ficou que observadores que desconheciam máticos que permitisse a análise do efeito

26
Capítulo I | História Comportamental

de diferentes contingências passadas sobre trução da história), os participantes do Gru-


o comportamento atual. Nesse contexto, po 1 (n=3) foram expostos a um esquema de
mais precisamente em 1964, foi publicado razão fixa (FR) 40 e os do Grupo 2 (n=3) a
um dos primeiros estudos cujo objetivo era um esquema de reforçamento diferencial
a análise do efeito de diferentes histórias de baixas taxas (DRL) 20 segundos, por 10
comportamentais (construídas no laborató- sessões de 60 min. Para os participantes
rio, como sugerido por Sidman, 1960) sobre expostos ao FR, 100 pontos eram credita-
o comportamento atual. dos no contador a cada 40 pressões ao bo-
tão. Para os participantes expostos ao DRL,
cada resposta emitida após a passagem de
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO 20 segundos da última resposta produzia
100 pontos no contador. Respostas emiti-
Objetivo e Método das antes do fim do intervalo reiniciavam o
A pesquisa de Weiner (1964) era sim- intervalo do DRL.
ples, porém engenhosa. O objetivo do estudo
foi avaliar o efeito da exposição a diferentes Esquemas de FR, em geral, selecio-
contingências históricas sobre o compor- nam altas taxas de respostas, pois há uma
tamento atual. Como estratégia metodoló- relação direta entre taxa de respostas e taxa
gica, foram arranjados esquemas de refor- de reforços sob esse esquema. Por outro
ço, programações de contingência muito lado, o esquema DRL geralmente selecio-
utilizadas em pesquisas experimentais em na baixas taxas de respostas, pois respos-
Análise do Comportamento, que permitem tas emitidas antes de terminado o intervalo
a seleção de padrões estáveis de comporta- programado produzem o reinício do inter-
mento (Ferster & Skinner, 1957; Lattal, 1991; valo. E este era exatamente o objetivo de
Souza Júnior & Cirino, 2004). Os participan- Weiner nesta primeira fase do experimen-
tes da pesquisa foram seis enfermeiros de to: estabelecer duas linhas de base - ou duas
um hospital psiquiátrico. Eles se sentavam histórias comportamentais diferentes - nas
em frente a um monitor e a tarefa experi- quais padrões de comportamento distintos
mental consistia em pressionar um botão. (altas e baixas taxas de respostas) fossem
As consequências para esse comporta- selecionados.
mento eram pontos que apareciam em um
contador de pontos no monitor. Em cada Após construir histórias compor-
sessão, os participantes também recebiam tamentais diferentes para cada grupo, era
uma quantia fixa de dinheiro, que não era hora de testar o efeito da exposição a estas
contingente ao seu desempenho. Os parti- diferentes contingências sobre o comporta-
cipantes foram distribuídos em dois grupos: mento atual, quando as contingências mu-
durante a primeira fase da pesquisa (cons- dassem. Na segunda fase do experimento

27
Paulo Guerra Soares, Carlos Eduardo Costa

(teste), os participantes de ambos os grupos valo do FI. Portanto, expor os participantes


foram expostos à um mesmo esquema de a este esquema de reforço na fase de teste
reforçamento de intervalo fixo (FI) 10 se- permitiu observar se a exposição prévia ao
gundos por 10 sessões de 60 min e, depois, FR ou ao DRL teria alguma influência no
10 sessões de 30 min. Sob o esquema de FI modo como eles se comportariam quando
10 s, a primeira resposta que ocorresse após as contingências mudassem (ou seja, quan-
o intervalo de 10 segundos produzia 100 do o FI estivesse em vigor).
pontos no contador. Respostas que ocorres-
sem ao longo desse intervalo não tinham
consequências programadas (diferente do Resultados e discussão
que ocorria na fase anterior sob o esquema E foi exatamente o que aconteceu! A
de DRL). Assim, no esquema de FI, não im- Figura 1 exibe os registros cumulativos dos
porta se o indivíduo responde em altas ou participantes do Grupo 1 (S1, S2 e S3) e do
baixas taxas, pois ambos os padrões con- Grupo 2 (S4, S5 e S6), durante os 15 últimos
tinuam a produzir pontos, desde que uma minutos da fase de teste (FI). A análise da
resposta ocorra após transcorrido o inter- Figura 1 permite constatar que, mesmo após

Figura 1. Registros cumulativos dos 15 últimos minutos da fase de teste (após 15 horas de exposição ao FI) dos participantes da pesquisa de Weiner
(1964). O painel superior exibe os registros dos participantes do Grupo 1 (história de FR) e o painel inferior exibe os registros dos participantes do Grupo
2 (história de DRL) (reproduzido com a permissão de John Wiley and Sons).

28
Capítulo I | História Comportamental

15 horas de exposição ao FI, os participan- tória (FR para S1, S2 e S3; DRL para S4, S5 e
tes que tinham sido expostos ao FR emi- S6) e a taxa de respostas nas cinco últimas
tiam taxas de respostas mais altas quando sessões do experimento.
comparadas às taxas de respostas dos parti-
cipantes que tinham sido expostos ao DRL. Observa-se na Figura 2 que a taxa de
respostas nas cinco últimas sessões de FI
A pesquisa de Weiner (1964) é inte- dos participantes com história de FR foram
ressante por demonstrar que, mesmo em sempre superiores às taxas de respostas dos
um delineamento simples, no qual a res- participantes com história de DRL. Todavia,
posta selecionada era pressionar um botão, há que se considerar que houve diminuição
o comportamento dos participantes no es- na taxa de respostas dos participantes ex-
quema de FI sofreu influências da histó- postos a história de FR e aumento na taxa
ria comportamental que foi construída no de respostas dos participantes com história
laboratório. Sobre estes resultados, Weiner de DRL, quando expostos ao FI.
afirmou que o “ponto importante é que a
história de condicionamento deve ser con- Durante as três últimas sessões de
siderada como um possível determinante
do responder de humanos em FI” (p. 385).

Mas é possível ir mais além, e supor


que a história comportamental não seja ape-
nas determinante do responder em FI, mas
de qualquer comportamento, dentro e fora
do laboratório. Se este for o caso, os resulta-
dos da pesquisa de Weiner (1964) permitem
Figura 2. Taxa de respostas (R/min) em escala logarítmica na fase de
inferir (baseado em dados empíricos) que as construção da história experimental (Hist - FR para S1, S2 e S3; DRL
experiências vivenciadas pelas pessoas ao para S4, S5 e S6) e nas cinco últimas sessões do experimento. Ver mais
detalhes no texto. (Figura construída especialmente para este capítulo
longo de sua vida podem, sim, influenciar o com dados apresentados em Weiner, 1964, p. 384, Tabela 1).

comportamento presente.
exposição ao FR, os participantes S1 e S3
Os resultados apresentados por Wei- emitiram, em média, 412 e 240 respostas
ner (1964) nos permitem ainda outras con- por minuto. Na última sessão de FI, eles
siderações. A Figura 2 abaixo foi construída emitiam 64 e 55 respostas por minuto, res-
a partir da Tabela 1 do artigo. O eixo y apre- pectivamente. Ou seja, depois de 15 horas
senta a taxa de respostas (R/min) em escala de exposição ao FI, houve uma redução na
logarítmica e o eixo x exibe a média da taxa taxa de respostas de aproximadamente 85%
de respostas das três últimas sessões de his- para S1 e de 77% para S2, em relação à li-

29
Paulo Guerra Soares, Carlos Eduardo Costa

nha de base. Uma análise parecida também tamental dos indivíduos, explicaria o de-
pode ser realizada para os participantes S5 sempenho dos participantes da pesquisa de
e S6, que foram expostos à história de DRL. Weiner (1964) durante a fase de teste? Assim
Durante as três últimas sessões do DRL, S5 como no estudo de Simonassi et al. (1984),
e S6 emitiam, em média, três respostas por provavelmente o leigo utilizaria conceitos
minuto. A taxa de respostas na última ses- mentalistas, como “ansiosas”, “hiperativas”
são do FI foi de seis e nove respostas por (para os participantes com história de expo-
minuto, respectivamente. Pode parecer sição ao FR) ou “preguiçosas”, “depressivas”
pouca coisa, mas trata-se de um aumen- (para aqueles com história de exposição ao
to na taxa de respostas de 100% para S5 e DRL), ignorando completamente a história
200% para S6! comportamental dos participantes!

A partir da pesquisa de Weiner (1964),


DESDOBRAMENTOS diversos estudos foram conduzidos para
analisar os efeitos da história de exposição a
Os resultados da pesquisa de Weiner diferentes contingências históricas sobre o
(1964) sugerem evidências de que: (a) é es- comportamento atual, manipulando variá-
sencial a análise da história de exposição a veis como controle de estímulos, reforçador
contingências passadas para a compreen- empregado e custo da resposta, utilizando
são do comportamento atual, assim como não-humanos (e.g. Cole, 2001; Doughty, Ci-
proposto por Skinner (1981), em analogia à rino, Mayfield, da Silva, Okouchi, & Lattal,
seleção natural; (b) que os efeitos da história 2005; Freeman & Lattal, 1992; LeFrancois &
comportamental podem ser estudados em Metzger, 1993) e humanos (e.g. Costa, Ba-
laboratório, desde que haja controle sobre naco, Longarezi, Martins, Maciel, & Sudo,
a construção da história comportamental 2008; Costa, Soares & Ramos, 2012; Okou-
dos indivíduos (Sidman, 1960; Wanchisen, chi, 2003a; 2003b; Soares, Costa, Cançado
1990). & Cirino, 2013).

Especular sobre as influências da As pesquisas em laboratório sobre


história de vida sobre o comportamento história comportamental tiveram desdo-
presente pode parecer óbvio. Todavia, como bramentos interessantes, também, para a
apontado anteriormente, o senso comum aplicação da Análise do Comportamento
frequentemente negligencia a história com- (como na clínica comportamental). Neste
portamental quando se propõe a explicar o contexto, Marçal (2013) ressalta que
porquê as pessoas se comportam da manei-
ra como o fazem. Por exemplo, como um
leigo, que não conhece a história compor-

30
Capítulo I | História Comportamental

“Por mais que um padrão compor- ses e especular com base em dados empí-
tamental esteja trazendo problemas ricos é mais do que muitas abordagens em
a alguém, por mais que este alguém Psicologia têm oferecido.
esteja insatisfeito com sua forma de
agir, tal comportamento foi reforçado
no passado em um ou mais contextos” CONSIDERAÇÕES FINAIS
(p. 41).
A pesquisa de Weiner (1964) foi uma
Conhecer a história é conhecer o das primeiras tentativas de análise sistemá-
comportamento. Para que se possa compre- tica do efeito de histórias comportamentais
ender o comportamento atual do paciente, é no laboratório. Seus resultados ressaltam a
imprescindível que se conheçam elementos importância do papel da história comporta-
de sua história de vida, e que estes elemen- mental na determinação do comportamen-
tos possam ser relacionados às contingên- to atual. Ao constatar este fato, o analista do
cias atuais. Portanto, para a condução de comportamento deve tomar cuidado com
uma análise funcional do comportamento dois pontos. Primeiramente, a história com-
adequada, é necessária a análise sistemáti- portamental – especialmente quando ela
ca da história do paciente. não é conhecida – não deve ser transforma-
da em uma explicação genérica do compor-
Todavia, é importante esclarecer tamento ou, como ressalta Cirino (2001), em
alguns pontos. Em primeiro lugar, quan- uma “lata de lixo” da Análise do Comporta-
do conversamos com um cliente não te- mento. Todo comportamento é explicado a
mos acesso a sua história. Temos acesso ao partir das contingências às quais o indiví-
comportamento verbal que pode estar sob o duo foi exposto, mas para lançar mão desta
controle da história, pode estar sob o con- explicação histórica o analista do compor-
trole da audiência (o terapeuta) ou ambos. tamento deve conhecer a história e quais
Os estudos sobre história comportamental elementos desta história possuem relação
não nos dão uma ferramenta para a atuação com seu comportamento atual.
aplicada da Análise do Comportamento. As
pesquisas empíricas sobre história compor- Em segundo lugar, é importante não
tamental nos permitem fazer especulações atribuir à história comportamental um efei-
mais bem fundamentadas (i.e., baseadas em to definitivo e imutável sobre o compor-
dados empíricos), mas que não passam de tamento atual (cf. Costa, Cirino, Cançado
especulações, até que a intervenção seja & Soares, 2009). Ainda que a explicação
feita e, eventualmente, o comportamento Behaviorista Radical seja essencialmente
mude na direção “esperada” (pelas especu- histórica, não podemos negligenciar o papel
lações). Isso não é pouco! Levantar hipóte- das contingências presentes. Uma análise

31
Paulo Guerra Soares, Carlos Eduardo Costa

cautelosa dos resultados de Weiner (1964) gências presentes.


ajuda a sustentar esta conclusão. Dois dos
três participantes expostos à história de FR Espera-se que o leitor possa ter com-
emitiram, na última sessão de FI, uma taxa preendido a importância da consideração
de respostas mais baixa em relação à linha dos eventos históricos sobre o comporta-
de base (Ver Figura 2, neste capítulo). Por mento atual e como o fenômeno pode ser
isso, procuramos sempre lembrar: somos estudado em laboratório. Dessa forma, des-
produtos da nossa história, mas não escra- taca-se um modelo causal (Skinner, 1981)
vos dela! que é uma alternativa a qualquer tipo de
explicação mentalista/dualista. Quando
Essas análises demonstram que, de- queremos entender – e modificar – o com-
finitivamente, não se pode negligenciar a portamento de um indivíduo, o primeiro
contingência presente. A contingência de passo, sem dúvida, é conhecer a sua histó-
FI 10 s, programada por Weiner (1964) du- ria comportamental!
rante a fase teste, estabelece um desem-
penho “ideal” de seis respostas por minuto
(pois uma resposta a cada 10 segundos pro- PARA SABER MAIS
duz reforço). Uma taxa média de respostas
como as de S1 e S2 garantiam que muitos Weiner (1969). Conjunto de cinco experi-
pontos fossem produzidos durante o FR, mentos com humanos nos quais Weiner
mas a grande maioria dessas respostas não explora diferentes estratégias na constru-
produzia consequências programadas du- ção da história comportamental. Os deli-
rante o FI, o que estabelece uma diminui- neamentos apresentados são em grupos ou
ção na taxa de respostas como algo desejá- com a exposição do mesmo participante a
vel. Durante o DRL, uma taxa média de três diferentes esquemas de reforço em fases
respostas por minuto (S4 e S5) garantia que sucessivas. Em linhas gerais, o artigo inves-
os reforços continuassem a ser produzidos tiga os determinantes do comportamento
e que poucas perdas ocorressem. Contu- humano em um esquema de FI. O desem-
do, respostas emitidas durante o intervalo penho de humanos neste esquema de re-
do FI não reiniciavam o intervalo como no forço foi a base de muita controvérsia sobre
DRL, o que estabelece um aumento na taxa a diferença de humanos e não humanos se
de respostas como algo desejável. Os resul- comportamento em esquemas de reforço. A
tados de pesquisas posteriores sobre histó- ênfase de Weiner, é claro, é na importância
ria comportamental (e.g., Freeman & Lattal, da história comportamental.
1992; Soares et al., 2013) indicaram que o
comportamento é produto da história, mas, Freeman & Lattal (1992). Avaliação dos
gradualmente, fica sob controle das contin- efeitos da história sobre o comportamento

32
Capítulo I | História Comportamental

atual de pombos usando um delineamento REFERÊNCIAS


no qual o sujeito é seu próprio controle (co-
nhecido como Delineamento Experimental Aló, R. M. (2005). História de reforçamento.
de Caso Único ou delineamento intrasujei- In J. Abreu-Rodrigues & M. R. Ribeiro (Eds.).
to). Nessa pesquisa, o mesmo organismo foi Análise do comportamento: Pesquisa, teo-
exposto a duas histórias comportamentais ria e aplicação (pp. 45-62). Porto Alegre:
de maneira relativamente simultânea, sob Artmed.
diferentes controles de estímulo. O resulta-
do geral, apontou que a história exerce efei- Baum, W. M. (2006). Compreender o Beha-
to sobre o comportamento atual, mas que viorismo: comportamento, cultura e evolu-
esse efeito é transitório. ção. Porto Alegre: ArtMed.

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delineamento intrassujeito (esquemas de philosophy and the Science. Boston: Autors
reforçamento múltiplo), com humanos, a Cooperative.
pesquisa de Okouchi apontou que os efeitos
da história ficam sob o controle de estímu- Cirino, S. D. (2001). Detecção da história de
los e que esses efeitos podem se generalizar reforçamento: Problemas metodológicos
para outras situações semelhantes no pre- para lidar com a história passada. In H. J.
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eman e Lattal (1992) com humanos. Os re-
sultados corroboram o de outras pesquisas Cole, M. R. (2001). The long term effect of
sugerindo que os efeitos da história ficam high and low rate responding histories on
sob o controle de estímulos; são transitórios fixed-interval responding in rats. Journal of
(embora possam ser de longa duração) e que the Experimental Analysis of Behavior, 75,
a regularidade nos resultados de pesquisas 43-54.
com humanos em esquemas de reforça-
mento depende do controle experimental, Costa, C. E., Banaco, R. A., Longarezi, D. M.,
não requerendo, portanto, mudanças no Martins, E. V., Maciel, E. M., & Sudo, C. H.
modelo de causalidade quando falamos do (2008). Tipo de reforçador como uma vari-
comportamento humano e não humano. ável moduladora dos efeitos de história em
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35
Kennon A. Lattal

O cheque está no correio1, 2:


investigando como o reforço
atrasado afeta o desempenho

Kennon A. Lattal
West Virginia University

Azzi, R., Fix, D. S. R., Keller, F. S., & Rocha e Silva, M. I. (1964). Exteroceptive control of response
under delayed reinforcement. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 7, 159-162.

“… um atraso do reforço não é um parâmetro estático no efeito de um reforço sobre


o comportamento”
(C. B. Ferster, 1953)

36
Capítulo II | Atraso do Reforço

INTRODUÇÃO A ÁREA DE PES- livro de Skinner (1938) O Comportamento


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO dos Organismos. Diferentemente da tenta-
DO EXPERIMENTO tiva de Hull de inferir mecanismos teóricos
subjacentes ao gradiente de atrasos do re-
Atraso do reforço, mesmo em 1964, forço, a análise de Skinner foi, previsivel-
era uma questão de interesse de longa data mente, mais empírica.
na Psicologia da Aprendizagem (e.g., Kim-
ble, 1961; Renner, 1964). Thorndike (1911) Os experimentos em que foram im-
preparou o palco para investigações futu- postos um atraso temporal entre a resposta
ras, quando afirmou que “as respostas que que produz o reforço e a entrega desse re-
eram acompanhadas ou seguidas de perto forço são descritos em dois momentos em
pela satisfação do animal” (p. 244) seriam O Coportamento dos Organismos. Os atra-
fortalecidas. Foi deixado para outros explo- sos investigados por Skinner (1938) foram
rarem os limites e as implicações da “pro- não-sinalizados, isto é, não houve mudança
ximidade” temporal para a relação respos- de estímulo que acompanhasse o intervalo
ta-reforço. O tema geral foi explorado por do atraso. No primeiro experimento (des-
todos os principais teóricos da aprendiza- crito nas pp. 73-74), uma resposta liberava
gem que sucederam Thorndike. Guthrie “um pêndulo que acionava o comedouro no
(1935) enfatizou a importância fundamen- final do intervalo desejado”. Skinner (Figu-
tal da contiguidade temporal entre eventos ra 6, p. 73) mostrou os dados de aquisição
para a aprendizagem, mas ele nem era um de oito ratos usando atrasos de 1-4 s com
teórico do reforçamento! Hull (1943) discu- diferentes pares de ratos, e, com uma exce-
tiu extensamente o problema do atraso do ção, notou que foram comparáveis aos de
reforço em seu livro Princípios do Compor- aquisição com reforço imediato. Não está
tamento (Principles of Behavior), com ên- claro se estes atrasos eram reiniciados se
fase especial nos mecanismos responsáveis as respostas subsequentes ocorressem du-
pela manutenção do comportamento sob rante o intervalo do atraso, mas parece que
condições de atraso do reforço (ver também eles não foram, isto é, os atrasos foram não
Spence, 1947). O atraso do reforço também resetáveis3 (cf. Lattal & Gleeson, 1990). Ele
aparece como um problema de pesquisa no afirmou que “[um] novo intervalo deve ser
iniciado [quando ocorre uma segunda res-
1
Tradução realizada por João Henrique de Almeida, Paulo Guerra Soa- posta] ou a segunda resposta será reforçada
res e Carlos Renato Xavier Cançado. O primeiro tradutor é bolsista de
pós-doutorado FAPESP processo número 2014/01874-7.
rápido demais, mas isto significa que a pri-
2
Nota de tradução: “The check is in the mail” é uma expressão utilizada
para indicar a um credor que um pagamento (ainda não realizado) será
feito em breve. É uma situação em que o atraso de um reforço é, neces- 3
Nota de tradução: os termos “signaled”, “unsignaled”, “resetting” e
sariamente, sinalizado (i.e., o pagamento ainda não foi recebido e seu “nonresetting” que qualificam atrasos do reforço foram traduzidos, res-
recebimento é sinalizado pela expressão “o cheque está no correio”). pectivamente, como “sinalizados”, “não sinalizados”, “resetáveis” e “não
resetáveis”.

37
Kennon A. Lattal

meira resposta não seria reforçada” (p. 73). procedimento, os ratos foram condiciona-
Seus comentários subsequentes sugeriram dos “da maneira usual” (p 140; presumivel-
que ele não resolveu este problema neste mente Skinner queria dizer com reforço
primeiro experimento. imediato) para responder, por fim, em um
esquema intervalo fixo (FI) 5 min. Após este
Um pouco mais tarde no livro ele treino, atrasos de 2, 4, 6 ou 8 s estavam em
descreveu outros dois experimentos en- vigor com diferentes ratos por três sessões.
volvendo atraso do reforço. Ele começou As taxas de resposta foram reduzidas quan-
repetindo o problema do procedimento já do os atrasos estavam em vigor, sendo que
mencionado anteriormente: “Nenhum pla- com os dois atrasos mais curtos o respon-
nejamento foi feito para evitar a possivel der foi menos reduzido em comparação aos
coincidência de uma segunda resposta com dois mais longos. Em um experimento final
um reforço atrasado” (Skinner, 1938, p. 138), sobre atraso do reforço, Skinner analisou os
tornando assim mais provável que o atraso efeitos de várias mudanças no treino e na
obtido seria menor do que o atraso progra- implementação dos atrasos.
mado. Ele também observou uma segunda
dificuldade, relacionada com os ratos que O principal desenvolvimento suse-
mantinham a barra pressionada. O atraso quente na análise experimental do atraso
começou com uma pressão a barra, mas às do reforço foi a pesquisa de Ferster (1953).
vezes a barra continuava a ser pressiona- A maioria dos teóricos de aprendizagem,
da durante o atraso e era liberada no final incluindo Skinner, focaram os efeitos pre-
do intervalo, levando Skinner a questionar judiciais do atraso do reforço sobre a apren-
se isso resultaria em reforço imediato ou dizagem e o desempenho. Ferster inverteu a
atrasado. O equipamento utilizado neste questão e perguntou se seria possível man-
experimento foi o mesmo utilizado no ex- ter o comportamento apesar da presença de
perimento descrito acima mas, no entanto, um atraso entre o reforço e a resposta que o
ele apontou uma mudança: “o equipamen- produziu. Ele conduziu uma série de expe-
to tem esta propriedade importante: se uma rimentos com pombos em que ele primei-
segunda resposta é feita durante o intervalo ro mantinha a resposta de bicar (bicar um
do atraso, a contagem do tempo recomeça, pequeno disco de plástico) com esquemas
de modo que um intervalo completo deve de reforço intervalo variável (VI). Com essa
decorrer novamente antes que o reforço linha de base, em seu primeiro e segundo
ocorra” (p 139. ). Assim, em vez de um atraso experimentos, atrasos sinalizados por bla-
não resetável, neste experimento os atrasos ckouts4 da câmara experimental ocorreram
eram resetáveis, isto é , o intervalo do atra- 4
Nota de tradução: Termo mantido como no original. O termo é utiliza-
so era reiniciado para cada resposta após do para descrever situações em que as luzes da câmara experimental, e
até mesmo aquelas que iluminam os discos de resposta, são apagadas.
aquela que iniciou o atraso. Utilizando este

38
Capítulo II | Atraso do Reforço

entre o reforço e a resposta que o produziu. apresentou dados quantitativos na descri-


Os blackouts foram utilizados “para evitar S ção de seus experimentos, baseando-se, ao
de respondesse” (p. 219), aproveitando-se do invés disso, em descrições verbais do que
fato de que pombos normalmente não bi- aconteceu, apoiadas apenas por alguns re-
cam os discos de resposta quando a caixa e gistros cumulativos dos desempenhos dos
o disco estão apagados. Claro, apagar as lu- pombos.
zes da caixa era uma consequência imedia-
ta da resposta, fazendo com que o blackout Estas duas linhas de pesquisa (Skin-
funcionasse como um estímulo, em última ner, 1938; e Ferster, 1953) fornecem o con-
análise correlacionado com a liberação do texto para o tema deste capítulo: o experi-
reforço. Como resultado, o atraso do reforço mento de Azzi, Fix, Rocha e Silva e Keller
covariou com a potencial função reforçado- (1964). Uma parte importante da história
ra condicionada do blackout. Esta covaria- por trás do experimento de Azzi et al. é caso
ção permite questionar esse experimento, e de amor de Fred Keller com o Brasil, que co-
todos os experimentos envolvendo atrasos meçou com a sua chegada como Fulbright
sinalizados do reforço, como um teste dos Teaching Fellow na Universidade de São
efeitos de um atraso do reforço”puro” sobre Paulo no início de 1961. Foi nomeado como
o responder. Em seu primeiro experimento, seu assistente de pesquisa Rodolpho Azzi,
Ferster observou que atrasos de 60 s cau- que aparece com Keller e outros pesquisa-
saram uma “pequena queda” na taxas de dores e pesquisadoras do Brasil na Figura 1.
respostas, mas sob atrasos de 120 s, a taxa Sobre Azzi, Keller (2008) afirmou:
de respostas caiu para cerca da metade de
seu valor quando o reforços imediatos eram “Ele rapidamente se tornou meu con-
utilizados. Em seu segundo experimento, selheiro e guia, ele meatualizava com
Ferster tentou manter altas taxas de res- tudo o que eu deveria saber sobre os
posta introduzindo os atrasos gradualmen- meus alunos, membros do corpo do-
te, aumentando a sua duração de 1 a 60 s ao cente e funcionários da administra-
longo de um período de treino de 90 hr. Ele ção. Ele me ajudou a responder a per-
relatou que “os três Ss que mantiveram as guntas, escrever relatórios, e avaliar
taxas normais de resposta sob 60 s de atra- o progresso dos meus alunos. Ele me
so foram mantidos no mesmo procedimen- preparou para reuniões importantes,
to por várias centenas de horas cada. Eles me informava sobre novos desenvolvi-
não exibiram nenhuma tendência de desa- mentos, e me protegeu de incômodos
celeração” (p. 222). O responder do quar- de qualquer tipo.” (p. 248)
to pombo não foi mantido, de acordo com
Ferster, porque os atrasos “foram aumen-
tados muito rapidamente.” (p. 222). Ele não

39
Kennon A. Lattal

Experimental Analysis of Behavior”


(Keller, 2008, p. 250).

Podemos apenas especular sobre o


porquê atraso do reforço foi o tema da pri-
meira pesquisa publicada no Journal of the
Experimental Analysis of Behavior com
um primeiro autor brasileiro (Azzi). Vamos
voltar para o segundo experimento relata-
do por Skinner com atraso de reforço em
O Comportamento dos Organismos. Lem-
bre-se que ele usou um procedimento de
atraso resetável, em que cada resposta que
Figura 1. Rodolpho Azzi, Fred Keller, Maria Amélia Matos, Carolina
Martuscelli Bori, e Andrés Aguirre (da esquerda para a direita) com ocorresse após aquela que deu início ao
equipamentos, Dezembro de 1961.
atraso reiniciava o intervalo do atraso. Ele
usou um procedimento semelhante para
Logo depois que Keller começou a le- reduzir o responder em altas taxas [“nenhu-
cionar, ele recebeu uma entrega de equipa- ma resposta foi reforçada se fosse precedi-
mento de pesquisa que ele havia adquirido da, no prazo de quinze segundos, por outra
da compania Grason-Stadler em Waltham, resposta” (p. 306)], dando assim origem ao
Massachussetts. Ele se lembrou de que o esquema de reforçamento diferencial de
equipamento taxas baixas (DRL). Wilson e Keller (1953),
posteriormente, estudaram os efeitos de es-
“... não veio com as instruções, por quemas DRL sobre a pressão à barra de ra-
isso tivemos de determinar como fun- tos sob uma série de valores do “atraso” (i.e.,
cionava por tentativa e erro. Rodol- os valores do DRL). O experimento Wilson
fo [sic] [Azzi] e eu, juntamente com e Keller nasceu de uma demonstração ini-
Mario Guidi, um estudante em nosso cial do que era basicamente um esquema
curso, trabalhamos durante dias an- de reforçamento diferencial de outros com-
tes de finalmente descobrirmos como portamentos (DRO), em que o início de um
automatizar um estudo longo sobre período de SD ocorreu somente se não hou-
os efeitos de diferentes atrasos do re- vesse resposta no período S-delta imedia-
forço sobre a resposta de pressionar a tamente anterior por um período de tempo
barra de três ratos brancos (nomea- especificado (cf. Skinner, 1938, p. 161). Uma
dos de Alpha, Beta e Gamma por Ro- contingência de atraso de reforço resetável
dolfo [sic]). Os resultados foram pu- é essencialmente um esquema DRL sem
blicados mais tarde no Journal of the a resposta requerida no fim do intervalo,

40
Capítulo II | Atraso do Reforço

e um esquema DRO é essencialmente um conduzidos, respectivamente, por Skinner


procedimento de atraso resetável, mas sem (1938) e Ferster (1953).
a exigência de uma resposta para iniciar
cada intervalo do DRO (os reforços ocor- Para isso, três ratos foram incial-
rem desde que a resposta alvo não ocorra; mente treinados a pressionar uma barra em
se uma resposta alvo ocorrer, ela reinicia um esquema de razão fixa (FR) 1, em que o
o intervalo do DRO). Combine todas essas reforçado era acesso à água. Parece razoável
ideias, adicione o fato de que Ferster (um assumir que neste tempo nem pelotas de
dos alunos de doutorado de Keller em Co- comida usadas com os ratos em muitos dos
lumbia) tinha estudado previamente os experimentos de Skinner e outros, nem tão
efeitos de atrasos sinalizados do reforço e, pouco os meios para liberar essas pelotas –
voilà, os procedimentos utilizados por Azzi i.e., um comedouro – estavam disponíveis
et al. (1964) emergem. Não podemos saber no Brasil. Água era fácil de obter e Keller
com precisão como a ideia para o experi- tinha trazido consigo o que ele chamou
mento foi desenvolvida mas, certamente, e de um “Brenner dipper”5 para liberação de
sem surpresa, pode ser intimamente ligada água como reforços. Após o treino inicial,
a alguns dos trabalhos anteriores de Keller e “dentro de uma câmara com a iluminação
seus alunos na Universidade de Columbia. reduzida, cada [rato] foi exposto sucessiva-
mente a atrasos do reforço de 1; 3; 5; 7,5; 10;
15; e 20 s[egundos], nesta ordem, com um
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO total de 150 reforços em cada atraso” (Azzi
et al., 1964, p. 159). O esquema de reforço
Objetivo e Método então era, tecnicamente falando, um tan-
Azzi et al. (1964) buscaram fazer duas dem FR 1 DRO t-s, em que t correspondia a
coisas: (a) investigar o responder operante um dos valores de atraso apresentados aci-
sob condições em que o intervalo entre o ma. Um esquema tandem (a palavra latina
reforçador e a resposta que o produzia era para “um logo após o outro”) é idêntico a um
variado e (b) comparar condições em que esquema de reforço encadeado em que dois
o atraso fosse acompanhado por uma mu- ou mais componentes do esquema preci-
dança nos estímulos (um estímulo que o sam ser finalizados em uma sequência fixa
sinalizasse) ou ocorresse sem qualquer mu- para que o reforço ocorra; no entanto, em
dança durante o intervalo do atraso (não um esquema encadeado cada componen-
sinalizado). Assim, o experimento era ba- te é associado com um estímulo diferente,
sicamente uma comparação de duas con-
dições diferentes – atrasos do reforço não 5
Nota de tradução: Um dipper é uma espécie de bebedouro; o equipa-
mento geralmente consiste em uma haste com um recipiente côncavo
sinalizados e sinalizados – que tinham sido na ponta que, quando mergulhado em um líquido, retém parte do mes-
mo. O líquido então pode ser apresentado ao animal movimentando-se
observados em experimentos diferentes a haste até alguma parte da câmara experimental.

41
Kennon A. Lattal

mas no esquema tandem o estímulo as- Resultados e Discussão


sociado com cada componente é idêntico. Houve dois achados principais. O
No procedimento de Azzi et al. (1964), cada responder mantido sob um esquema tan-
atraso reiniciava se uma resposta ocorresse dem FR1 DRO ts foi uma função negativa-
durante o intervalo do atraso (um atraso re- mente desacelerada da duração do atraso.
setável), e não havia nenhuma mudança no Ou seja, a taxa de respostas caiu precipita-
estímulo durante o período de atraso. Em damente quando o atraso aumentou de 1 a
seguida, foram realizadas várias manipula- 10 s, mas atingiu a assíntota naquele ponto,
ções das durações do atraso para dos dois não caindo mais quando aos atrasos dura-
dos ratos. O terceiro rato aparentemente foi vam 15 ou 20 s. Essa relação é chamada de
exposto somente a um esquema DRL 20 s gradiente de atraso do reforço, e é caracte-
com reforços imediatos. Assim como na rística da relação entre as medidas de uma
primeira, na segunda parte do experimen- resposta e a duração do atraso em uma am-
to o esquema de reforço em vigor tecnica- pla variedade de atrasos do reforço e parâ-
mente era um tandem FR1 DRO ts, em que metros do esquema de reforço (cf. Lattal,
t era 20 por dez dias, seguido por seis dias 2010). Escurecer a câmara durante o atraso
com t=30s. Durante a metade de cada ses- “produziu um efeito considerável, regula-
são, “cada animal trabalhou em uma câma- rizando e aumentando a taxa de respostas
ra com a iluminação reduzida” (p.160). Du- [relativo aquela observada na condição de
rante a outra metade, no entanto, “ausência atraso não sinalizado] em quase todos os
de iluminação (escuridão) estava em vigor casos” (Azzi et al., 1964, p. 160).
durante cada intervalo do atraso… cada vez
que uma resposta de pressão à barra ocor- A discussão considerou o papel do
ria, a luz da caixa era desligada (p.160, itáli- comportamento mediador em manter o res-
cos originais) e não voltava a ser ligada até ponder durante o atraso, uma observação
que o reforço tivesse sido liberado. Pressões feita anteriormente por Ferster (1953). No
à barra na câmara sem iluminação aumen- que subsequentemente se tornou uma aná-
tavam o período sem iluminação até que a lise padrão, a mudança de estímulos (em
duração do atraso terminasse e o reforço atrasos sinalizados dos reforços) é entendi-
fosse liberado. Assim, na segunda parte do da como um reforçador condicionado que
experimento, foram comparados um inter- mantém as respostas que a produziram. Isto
valo do atraso correlacionado com a pre- ainda é uma interpretação comum do papel
sença e com a ausência de uma mudança do estímulo que sinaliza o atraso em pro-
nos estímulos. cedimentos de atrasos sinalizados do refor-
ço. Essa interpretação, no entanto, tem sido
questionada recentemente interpretando-
-se a mudança de estímulos como tendo

42
Capítulo II | Atraso do Reforço

função de ligação ou marcação do atraso do reforço intrassujeitos durante uma úni-


(e.g., Williams, 1991), ao invés de fortalecer ca sessão. Eles mantiveram o responder sob
o comportamento que a precede. um esquema VI e, no início de cada sessão,
programaram um atraso curto antes que
um reforço fosse disponibilizado. Cada re-
DESDOBRAMENTOS forço subsequente foi disponibilizado após
um atraso progressivamente maior.
Ambos os resultados do experimen-
to qualificam Azzi et al. (1964) como um ex- O experimento de Azzi et al. (1964)
perimento seminal no estudo do atraso do foi conduzido na tradição da Universidade
reforço. Os gradientes de atraso do reforço de Columbia de conduzir análises paramé-
apresentados por Azzi et al. (1964) tem sido tricas sistemáticas das variáveis controla-
replicados quando diferentes esquemas doras do comportamento. Nesse caso, as
de reforço têm sido usados para manter o durações do atraso foram manipuladas em
responder (Elcoro & Lattal, 2011, FI; Jarmo- condições sucessivas. Como não havia um
lowicz & Lattal, 2013, FR; Richards, 1981, retorno à linha de base entre os aumentos
DRL e VI; Sizemore & Lattal, 1978, VI) e sucessivos nos valores dos atrasos, atrasos
com uma variação mais ampla de valores subsequentes eram impostos sob taxas va-
de atraso (Pierce, Hanford, & Zimmerman, riáveis de respostas entre manipulações,
1972; Richards, 1981; Sizemore & Lattal, com efeitos desconhecidos sobre o gradien-
1978). Azzi et al. também anteciparam vá- te de atraso do reforço. Esses gradientes de
rias comparações subsequentes de atra- atraso do reforço, no entanto, são um tanto
so do reforço sinalizado e não sinalizado, similares em sua forma aqueles obtidos com
com mais ou menos os mesmos resultados: pressões à barra de ratos ou bicar de disco
atrasos sinalizados mantem um responder de pombos mantidos sob outros esquemas
mais robusto do que os não sinalizados (Ri- de reforço (Elcoro & Lattal, 2011; Pierce, et
chards, 1981). Uma característica particu- al., 1972; Richards, 1981; Sizemore & Lattal,
larmente interessante de Azzi et al. é que 1978), sugerindo que a taxa de respostas
as comparações dos atrasos do reforço si- na linha de base pode ter um papel menos
nalizados e não sinalizados foram intras- importante na forma do gradiente do que o
sujeitos. Eles são os primeiros a comparar valor do atraso em si.
simultaneamente (intrassessão) os efeitos
dos atrasos do reforço sinalizados e não si- Uma potencial variável estranha no
nalizados (cf. Lattal, 1984; Lattal & Ziegler, experimento foi a taxa de reforços. Como
1982; Richards, 1981). Muito depois de Azzi tantos outros experimentos iniciais envol-
et al., Reilly e Lattal (2004) desenvolveram vendo atrasos do reforço, a taxa de refor-
um método para obter gradientes de atraso ços sob cada valor de atraso não foi relatada

43
Kennon A. Lattal

por Azzi et al. (1964). É quase certo que as CONSIDERAÇÕES FINAIS


taxas de reforço diferiram quando os atra-
sos foram aumentados na primeira parte do O atraso do reforço é um dos princi-
experimento e na presença e na ausência pais parâmetros que afetam a eficácia dos
de um estímulo na segunda parte. Pesqui- reforços no desenvolvimento e na manu-
sas posteriores, no entanto, mostraram que tenção do comportamento (Kimble, 1961).
diferenças na taxa de reforços geralmente Por esta razão, o seu papel, tanto sozinho
não explicavam as diferenças nas taxas de como em combinação com outros parâme-
resposta observadas quando durações de tros do reforço, tal como magnitude dos re-
atraso são alteradas (Lattal, 1982; Richards, forços, foi investigado extensivamente. Um
1981; Sizemore & Lattal, 1978). dos resultados dessas análises de interações
é o desconto do atraso, em que sistematica-
Lattal e Gleeson (1990) utilizaram um mente aumentar atrasos do reforço para re-
procedimento semelhante aos de Skinner forços de maior magnitude ou probabilida-
(1938) e Azzi et al. (1964) para investigar a de enquanto o atraso para outro reforço de
aquisição de responder por ratos e pombos menor magnitude ou probabilidade é fixo
experimentalmente ingênuos sob atrasos permite determinar, entre outras coisas, o
do reforço não sinalizados e resetáveis e ponto de indiferença em que uma das duas
não resetáveis quando a resposta operan- alternativas é igualmente provável de ser
te não havia sido modelada ou treinada de escolhida (ver Green, Myerson, & Vander-
alguma forma, mas deixada para se desen- veldt de 2014, para um resumo recente des-
volver sem qualquer intervenção por parte tes resultados). Estudos sobre desconto do
dos investigadores. Responder robusto se atraso oferecem insights sobre como dife-
desenvolveu sob estas condições, atestan- rentes combinações de parâmetros de re-
do o poder de reforço atrasado no desen- forço podem ser dimensionados. Da mesma
volvimento e manutenção comportamento forma, o atraso do reforço (às vezes também
operante. Esta é outra maneira de dizer que chamado de “gratificação” em experimen-
o reforço imediato não é necessário para tos não analítico-comportamentais sobre o
que a aprendizagem ocorra. Dito isto, no fenômeno) desempenha um papel impor-
entanto, o reforço imediato resulta em um tante no desenvolvimento de estratégias de
responder muito mais robusto. É uma ques- auto-gerenciamento ou de auto-controle.
tão em aberto se a aquisição de respostas Na verdade, a base desta área de pesquisa e
é “mais rápida” com reforços imediatos vs. aplicação é a análise experimental de atraso
atrasados das respostas. do reforço.

Uma outra área em que as pesqui-


sas sobre atraso do reforço tem sido impor-

44
Capítulo II | Atraso do Reforço

tantes é o estudo do reforço condicionado. atrasos pelo comportamento verbal. Ambos


Uma teoria fundamental sobre esse tipo re- Ferster (1953) e Azzi et al. (1964) sugeriram
forço é a teoria da redução do atraso (delay que o comportamento é mantido durante os
reduction theory), que sugere que estímulos atrasos do reforço na medida em que certos
funcionam como reforçadores na medida padrões de comportamento estereotipado
em que eles indicam uma redução do tem- surjem durante o atraso, o que resultaria
po de acesso ao reforço primário (Fantino, numa cadeia de comportamento desen-
1977). volvendo de tal modo que a resposta que
inicia o atraso é seguida por algum padrão
As lições do atraso do reforço não fo- regular de comportamento (não necessá-
ram perdidas na análise do comportamento rio mas mantido por reforço acidental) que
aplicada, onde a importância da imediati- termina contiguamente com reforço. Tais
cidade do reforço seguindo o comporta- cadeias supersticiosas, assim, garantiriam
mento apropriado continua, com razão, uma “conexão” entre a resposta operante
sendo enfatizada. Embora reforço imediato inicial e o reforço no final do atraso. Tem
possa ser o ideal no tratamento e na ges- sido sugerido que o comportamento verbal
tão do comportamento humano de manei- de humanos pode também mediar os atra-
ra geral, muitos comportamentos humanos sos. Algo que uma pessoa faz agora pode
são mantidos apesar de seus reforços serem não ter um efeito em uma hora, em um
atrasados a partir das respostas que os pro- dia, ou até mais, mas os dois eventos per-
duzem. A pesquisa básica sobre atraso do manecem conectados e a pessoa continua
reforço sugere uma série de condições sob a se engajar no comportamento que tem o
as quais os atrasos reduzirão (e.g., atrasos reforço atrasado. Talvez isso esteja relacio-
mais longos ou não sinalizados) ou não (e.g., nado a coisas que ou a pessoa diz a si mes-
atrasos mais mais curtos ou sinalizados) o mo ou outras pessoas a durante o interva-
responder, mas poucas pesquisas aplicadas lo do atraso. Ou talvez não. Alguns críticos
tem sido realizadas para expandir estes re- contemporâneos de tais interpretações do
sultados e investigar como eles podem es- atraso do reforço baseadas em contiguidade
tar relacionados a programas de tratamen- têm sugerido que a proximidade temporal
to (mas cf. Stromer, McComas, & Rehfeldt, entre a resposta e reforço desempenha um
2000). papel relativamente menor na aquisição e
manutenção de responder em comparação
Uma questão particularmente impor- ao fato de que existe uma correlação geral
tante e não resolvida na análise do atraso entre a taxa de respostas e os reforços que
do reforço com humanos tanto na pesquisa resultam, imediatamente ou após atrasos
como em contextos aplicados é a questão (ver Baum, 1973). O experimento de Lattal
da mediação do comportamento durante os e Gleeson (1990) descrito acima ilustra que

45
Kennon A. Lattal

a aprendizagem pode ocorrer quando há inicial sobre atraso do reforço a partir de


apenas uma correlação entre a resposta e uma perspectiva mais ampla das teorias da
o reforço, mas não a contiguidade respos- aprendizagem sobre o tema.
ta-reforço. Este último ponto levanta uma
questão mais ampla, sem resposta ainda, Stromer, McComas, & Rehfeldt (2000).
sobre se os reforços que ocorrem após um consideraram algumas implicações aplica-
atraso são mais bem caracterizados como das de pesquisas sobre atraso do reforço.
atrasados em relação à respostas específi-
cas ou se são correlacionados com grupos Tarpy & Sawabini (1974). analisaram criti-
de respostas organizadas como taxas de camente pesquisas sobre atraso do reforço
resposta ou tempo alocado à respostas de conduzidas desde a publicação da revisão
topografias particulares. de Renner até a sua própria.

Um último ponto, mas não menos


importante, é que a partir de uma perspec- REFERÊNCIAS
tiva histórica o experimento é importante
porque é o primeiro de muitos relatos de Azzi, R., Fix, D. S. R., Keller, F. S., & Rocha
pesquisa por analistas do comportamento e Silva, M. I. (1964). Exteroceptive control
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Lattal (2010). fez uma revisão sobre a pes- value. New York: Erlbaum.
quisa básica sobre atraso do reforço condu-
zida na tradição analítico-comportamental Elcoro, M., & Lattal, K. A. (2011). Effects of
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sua revisão. xed-interval schedule performance. Beha-
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Renner (1964). é uma importante revisão

46
Capítulo II | Atraso do Reforço

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Kennon A. Lattal

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48
Carlos Renato Xavier Cançado, Flávia Hauck, Ítalo S. C. Teixeira

Quando o passado
retorna: ressurgência
comportamental

Carlos Renato Xavier Cançado


Flávia Hauck
Ítalo S. C. Teixeira
Universidade de Brasília

Epstein, R. (1983). Resurgence of previously reinforced behavior during extinction. Behaviour


Analysis Letters, 3, 391-397.

A fênix é uma ave da Arábia (...). Quando percebe que envelheceu, constrói uma
fogueira para si (...) e encarando os raios do sol nascente, acende o fogo e o nutre
batendo suas asas, e ressurge de suas próprias cinzas.
(Isidoro de Sevilha, Etymologiae, Livro 12, 7:22)

49
Capítulo III | Ressurgência Comportamental

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- Em situações nas quais comporta-


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO mentos atuais deixam de produzir conse-
DO EXPERIMENTO quências, comportamentos previamente
reforçados tendem a recorrer, um fenôme-
É bem provável que você tenha se no que analistas do comportamento de-
encontrado em uma situação em que teve nominam de ressurgência (Epstein, 1983,
que resolver um problema como, por exem- 1985). Embora a ressurgência tivesse sido
plo, responder corretamente a um exercí- descrita anteriormente na literatura cientí-
cio de cálculo, abrir uma porta emperrada, fica (e.g., Carey, 1951; Leitenberg, Rawson &
ou escrever um texto sobre um tema com Bath, 1970; Leitenberg, Rawson & Mulick,
o qual você tem pouca familiaridade. Você 1975; ver Epstein, 2015), o estudo sistemá-
“não sabe o que fazer”. Um problema pode tico desse fenômeno intensificou-se nos
ser apenas uma situação em que seu com- anos 1980, especialmente após a publicação
portamento não modifica o ambiente de do artigo de Epstein (1983), cujo experimen-
maneira eficiente, isto é, seu comporta- to é descrito nesse capítulo. Nesse artigo,
mento não produz consequências. É o que Epstein usa um termo específico para des-
os analistas do comportamento chamam de crever a recorrência de comportamentos
extinção. Além da redução na frequência previamente reforçados durante a extinção
de determinadas respostas, um outro efei- de outros comportamentos (i.e., ressurgên-
to da extinção é o aumento na variabilida- cia; ver também Epstein & Skinner, 1980),
de da topografia das respostas (Antonitis, define o fenômeno, descreve um proce-
1951). Você tenta fazer coisas diferentes, dimento para sua análise experimental, e
comportar-se de outras maneiras para ten- levanta diversas questões de pesquisa que
tar resolver o problema. Parte do que você serviram de base para a condução de expe-
faz nesse momento é, comumente, algo rimentos sobre a ressurgência desde então
bem parecido com o que você fez no passa- (ver Lattal & St Peter Pipkin, 2009; e Pontes
do (talvez mesmo em um passado remoto) e & Abreu-Rodrigues, 2015, para revisões da
que, nesse passado, “deu certo”. É parte de literatura).
sua história comportamental. É sobre essa
variação comportamental que o ambiente No início de seu artigo, Epstein (1983)
irá operar, selecionando o que é usualmen- define a ressurgência da seguinte maneira:
te descrito como a “solução do problema”, “Quando, numa dada situação, um com-
possivelmente um “comportamento novo” portamento reforçado recentemente deixa
ou “criativo” (Epstein, 1996; ver especial- de ser reforçado, comportamentos ante-
mente, Skinner, 1981, 1984). riormente reforçados em condições seme-
lhantes tendem a recorrer” (p. 391; itálicos
adicionados). Essa definição pode parecer

50
Carlos Renato Xavier Cançado, Flávia Hauck, Ítalo S. C. Teixeira

geral demais, algo que talvez pudesse ter lisar experimentalmente a ressurgência,
sido descrito por meio da observação casu- isto é, a recorrência de comportamentos
al do comportamento no cotidiano, sem re- previamente reforçados quando comporta-
correr a equipamentos especiais, sem con- mentos atuais deixavam de ser reforçados.
duzir experimentos, e sequer pensar em ir Metodologicamente, seria necessário que
ao laboratório. Por quê recorrer a uma situ- uma resposta específica (a resposta alvo)
ação simplificada no laboratório quando o fosse inicialmente reforçada. Em uma se-
fenômeno pode ser observado no compor- gunda fase, a resposta alvo deixaria de pro-
tamento de humanos e não humanos em duzir reforços e uma outra resposta (a res-
ambientes não laboratoriais? Mas é exata- posta alternativa) seria reforçada. Em uma
mente essa simplificação do laboratório em terceira fase, a resposta alvo continua a não
relação a ambientes não laboratoriais, con- produzir reforços e a ressurgência dessa
duzida por meio do controle experimental resposta poderia ser verificada quando a
de variáveis, que queremos quando nosso resposta alternativa deixasse de produzir
objetivo é descrever princípios comporta- reforços. Na literatura experimental, o pro-
mentais. A análise experimental permite cedimento para o estudo da ressurgência
uma descrição mais precisa do fenôme- é descrito comumente como um “procedi-
no investigado e dos fatores que o levam a mento de três fases” e a primeira, a segun-
ocorrer (i.e., suas variáveis de controle). Se da e a terceira fases do procedimento são
você conhece as variáveis que determinam denominadas fases de Treino, Eliminação
um fenômeno, pode prevê-lo com maior (ou Reforçamento Alternativo) e Teste, res-
precisão se você sabe que essas variáveis pectivamente. Embora Epstein não tenha
estão em vigor. Além disso, se você pode feito uso desses termos, eles serão utiliza-
manipular essas variáveis, pode fazer com dos nesse capítulo para descrever as fases
que o fenômeno ocorra ou deixe de ocor- de seu procedimento.
rer (Skinner, 2003/1953). É essa a princi-
pal função de uma análise experimental do Independente dos nomes que demos
comportamento e não seria diferente em ao procedimento e às fases experimentais,
relação ao estudo da ressurgência. Vejamos, o que deve ser destacado é que Epstein
então, como foi a análise experimental da (1983) precisou construir, em laboratório,
ressurgência conduzida por Epstein. uma história comportamental remota (i.e.,
a resposta alvo foi reforçada), uma histó-
ria comportamental recente (i.e., a respos-
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO ta alvo deixou de ser reforçada e apenas a
resposta alternativa passou a produzir re-
Objetivo e Método forços) e também modificar o ambiente de
O objetivo de Epstein (1983) era ana- seus sujeitos em um teste (i.e., a resposta

51
Capítulo III | Ressurgência Comportamental

alternativa também deixou de produzir re- usualmente são de plástico e têm 2 cm de


forços) para verificar se, e como, a ressur- diâmetro; respostas de bicar o disco fecham
gência das respostas alvo ocorreria. um circuito elétrico que permite o registro
automático das respostas). Quando acio-
O experimento foi conduzido com nado, o comedouro dava acesso a grãos por
seis pombos, experimentalmente ingênu- 3 s (i.e., reforços). Em cada fase do experi-
os, mantidos a 80% de seu peso livre por mento, descritas a seguir, as sessões expe-
meio de um regime de privação de comida. rimentais duravam 60 min e o registro das
Como os experimentos sobre ressurgência respostas foi feito por meio de um micro-
são experimentos sobre os efeitos de uma computador, de registradores cumulativos,
história remota sobre o comportamento e também de filmagens das sessões expe-
atual, o fato de os pombos terem sido ex- rimentais feitas com uma câmera de vídeo.
perimentalmente ingênuos foi um aspecto
importante de controle experimental. Os Fase de Treino: o objetivo dessa fase
resultados poderiam ser diferentes (ou mes- foi estabelecer a resposta alvo. Para três
mo de difícil interpretação) se os pombos já pombos, a resposta alvo consistiu em bicar
tivessem uma determinada história no am- o disco da direita e, para os outros três, o
biente experimental escolhido por Epstein. disco da esquerda. A resposta alvo foi man-
O procedimento de privação de comida é tida sob um esquema de reforçamento in-
uma operação estabelecedora ou motiva- tervalo variável (VI) 60 s. Sob esse esque-
dora (Miguel, 2000; ver também Laraway, ma, a primeira resposta após um intervalo
Snycerski, Michael & Poling, 2003), neces- médio de 60 s produz reforços (os intervalos
sária para estabelecer o acesso à comida no entre reforços variam e sua média é igual
ambiente experimental como consequência a 60 s; os intervalos são selecionados alea-
e permitir que determinadas respostas se- toriamente em uma sessão). Esse esquema
jam selecionadas e mantidas durante o ex- produz uma taxa de respostas moderada e
perimento. constante e, por essa razão, é muito usado
para o estabelecimento de linhas de base
O equipamento utilizado no experi- comportamentais em análise experimental
mento foi uma câmara de condicionamento do comportamento. Essa fase teve a dura-
operante para pombos (as sessões experi- ção de 15 a 49 sessões, entre pombos, e ter-
mentais eram conduzidas com cada pombo minou quando a taxa de respostas de cada
individualmente). Um dos painéis da câ- pombo fosse estável (embora Epstein, 1983,
mara continha dois discos de resposta, lo- não defina precisamente seu critério de es-
calizados à direita e à esquerda no painel e tabilidade, comumente exige-se que os su-
separados por 12 cm, e um comedouro loca- jeitos sejam expostos às condições por um
lizado entre os discos (os discos de resposta número mínimo de sessões e que não haja

52
Carlos Renato Xavier Cançado, Flávia Hauck, Ítalo S. C. Teixeira

tendências crescentes ou decrescentes na destacar que, durante essa fase, a resposta


taxa de respostas por algumas sessões con- alvo também não produzia reforços. Essa
secutivas). fase esteve em vigor até o término da sessão
de 60 min e teve a duração de aproximada-
Fase de Eliminação: o objetivo des- mente 10 min para cada pombo.
sa fase foi reduzir a frequência da respos-
ta alvo e reforçar uma resposta alternati- Ressurgência seria evidenciada caso
va. Na etapa inicial dessa fase, para cada ocorresse um aumento na frequência da
pombo, a resposta alvo deixou de produzir resposta alvo na fase de Teste em relação à
reforços (i.e., extinção estava em vigor). O frequência dessa mesma resposta na etapa
número de sessões em que a resposta alvo final da fase de Eliminação. Mas vejamos
esteve em extinção variou para cada pom- alguns aspectos do procedimento de Eps-
bo, entre uma e 12 sessões. A etapa final tein (1983) que qualificam (em seu experi-
dessa fase ocorreu em uma sessão de 60 mento, e em qualquer experimento sobre
min. Nessa sessão, o procedimento de ex- ressurgência) a descrição de um aumento
tinção da resposta alvo esteve em vigor por na frequência de respostas alvo durante a
pelo menos 30 min e até que nenhuma res- fase de Teste como ressurgência.
posta alvo ocorresse por 10 min consecuti-
vos, para cada pombo. Então, foi reforçada Aspectos do controle experimental:
uma resposta alternativa cuja topografia vale destacar alguns aspectos importan-
era incompatível com bicar o disco. A topo- tes de controle experimental adotados por
grafia da resposta alternativa variou entre Epstein (1983). Lembre-se que a câmara de
pombos: para um pombo, por exemplo, a condicionamento operante tinha dois dis-
resposta alternativa consistiu em virar para cos de resposta. Bicar um desses discos foi
a esquerda; para outro pombo, em abaixar definido como a resposta alvo. Respostas
a cabeça; para outro, em levantar a asa. A de bicar o outro disco nunca produziram
resposta alternativa foi reforçada 20 vezes reforços durante o experimento, mas foram
em um esquema de razão fixa (FR) 1. Sob registradas e serviram como respostas con-
esse esquema cada ocorrência da resposta trole. A comparação da frequência de res-
alternativa produzia o reforço. Após a pro- postas alvo e respostas controle na fase de
dução de 20 reforços pela resposta alterna- Teste permite diferenciar a ressurgência da
tiva, ainda nessa mesma sessão, teve início variabilidade no comportamento induzida
a fase de Teste. pela extinção. Sem o registro de uma res-
posta controle, um aumento na frequência
Fase de Teste: nessa fase, para cada da resposta alvo na fase de Teste, que seria
pombo, os reforços para a resposta alterna- descrita como ressurgência, poderia sim-
tiva foram descontinuados. É importante plesmente ser um exemplo de variabilida-

53
Capítulo III | Ressurgência Comportamental

de induzida pela extinção. No entanto, se o fase de Teste do fenômeno de recuperação


aumento na frequência da resposta alvo na espontânea (lembre-se que a resposta alvo
fase de Teste fosse maior do que a frequên- estava em extinção durante toda a fase de
cia da resposta controle, isso seria evidên- Eliminação, e também durante a fase de
cia de que a ressurgência é função da histó- Teste). Como a transição entre as fases de
ria de reforçamento estabelecida na fase de Eliminação e Teste no experimento de Eps-
Treino e não apenas induzida pela extinção. tein ocorreu na mesma sessão, um aumen-
Portanto, a ressurgência é definida opera- to na frequência da resposta alvo no Teste
cionalmente no experimento de Epstein seria mais precisamente descrito como res-
como um aumento na frequência da res- surgência e não como recuperação espon-
posta alvo durante a fase de Teste (i.e., em tânea.
relação à frequência dessa mesma resposta
durante a etapa final da fase de Elimina- Finalmente, vale apontar que Epstein
ção) que fosse maior do que a frequência da (1983) conduziu a extinção da resposta alvo,
resposta controle nessa mesma fase. na fase de Eliminação, antes do reforça-
mento da resposta alternativa (e.g., Bruzek,
Um outro aspecto de controle ex- Thompson & Peters, 2009; Lieving & Lattal,
perimental importante do experimento de 2003). Isso foi feito para garantir que a fre-
Epstein (1983) é o fato de a etapa final da quência da resposta alvo era baixa quando
fase de Eliminação e a fase de Teste terem as respostas alternativas fossem reforçadas.
sido conduzidas na mesma sessão. Quando No entanto, são comuns experimentos so-
uma resposta está em extinção, é comum bre ressurgência nos quais a extinção da
observarmos um fenômeno de recorrência resposta alvo e o reforçamento da resposta
chamado de recuperação espontânea (des- alternativa ocorrem simultaneamente na
crito por Pavlov, e.g., Pavlov, 1927, no estu- fase de Eliminação (e.g., Cançado & Lattal,
do da extinção respondente; o fenômeno é 2011; da Silva, Maxwell & Lattal, 2008; Po-
também observado na extinção operante). dlesnik, Gimenez-Gomez & Shahan, 2006).
A recuperação espontânea caracteriza-se
por um aumento na frequência de respostas
no início de uma sessão de extinção em re- Resultados e Discussão
lação a frequência dessas respostas no final Como apontado anteriormente, o
da sessão de extinção imediatamente ante- número de sessões na fase de Treino e na
rior. Portanto, se a transição entre a fase etapa inicial da fase de Eliminação variou
de Eliminação e a fase de Teste ocorresse entre pombos. Na fase de Treino, entre
entre sessões no experimento de Epstein, pombos, de 11 a 49 sessões foram conduzi-
não teríamos como dissociar a eventual das; na etapa inicial da fase de Eliminação,
ressurgência da resposta alvo no início da de 1 a 12 sessões foram conduzidas.

54
Carlos Renato Xavier Cançado, Flávia Hauck, Ítalo S. C. Teixeira

Infelizmente, Epstein (1983) não que o aumento na frequência de respos-


apresentou dados da fase de Treino. Como tas alvo durante a fase de Teste não foi um
essa fase foi conduzida até que a taxa de exemplo de recuperação espontânea. Além
respostas alvo de cada pombo fosse está- disso, o registro das respostas controle per-
vel, temos que assumir que foi isso o que mite afirmar que esse aumento na frequên-
aconteceu. A taxa de respostas alvo, para cia de respostas alvo durante a fase de Teste
cada pombo, estava próxima de zero quan- não pode ser descrito simplesmente como
do teve início o reforçamento das respostas variabilidade no comportamento induzida
alternativas. Assim, Epstein demonstrou pela extinção. Para cada pombo, o aumen-
que a exposição à extinção durante a etapa to na frequência da resposta alvo na fase de
inicial da fase de Eliminação reduziu consi- Teste foi maior do que a frequência de res-
deravelmente a taxa de respostas alvo antes postas controle nessa mesma fase (apenas
que as respostas alternativas começassem a um pombo emitiu uma resposta controle na
ser reforçadas. fase de Teste). Portanto, podemos afirmar
que a ressurgência é produto da história re-
Na etapa final da fase de Eliminação, mota de reforçamento estabelecida na fase
a taxa de respostas alternativas aumentou de Treino. O fato de a resposta alvo e a res-
para cada pombo e a taxa de respostas alvo posta controle terem topografias semelhan-
permaneceu próxima de zero. Finalmente, tes (ambas são respostas de bicar um disco,
quando os reforços para respostas alterna- e os discos estavam próximos um do outro
tivas foram descontinuados na fase de Tes- na câmara de condicionamento) torna esse
te, a frequência dessas respostas diminuiu aspecto do procedimento ainda mais rele-
e observou-se um aumento na ocorrência vante e ressalta a importância da história
da resposta alvo para cada pombo. Isto é, a do organismo em determinar qual compor-
ressurgência de uma resposta previamente tamento irá ocorrer (ou recorrer) quando a
reforçada ocorreu quando a resposta alter- extinção estiver em vigor.
nativa estava em extinção. A magnitude da
ressurgência (i.e., o quanto a taxa de respos- Epstein (1983) destaca, contudo, que
tas aumentou na fase de Teste em relação à a condução da etapa final da fase de Elimi-
fase de Eliminação) variou entre os pombos nação e da fase de Teste em uma mesma
e aparentemente não foi influenciada pelo sessão tem implicações para interpretarmos
número de sessões conduzidas nas fases de seus resultados. Nesse contexto, ele faz re-
Treino e Eliminação. ferência a outro fenômeno de recorrência,
o restabelecimento (Reid, 1958; Franks &
A condução da etapa final da fase de Lattal, 1976). O restabelecimento é a recor-
Eliminação e da fase de Teste em uma mes- rência de respostas previamente reforçadas
ma sessão (Epstein, 1983) permite afirmar quando, em uma fase de Teste, a resposta

55
Capítulo III | Ressurgência Comportamental

alvo está em extinção, mas os reforços são de Teste.


apresentados independentemente das res-
postas do organismo. O restabelecimento
evidencia o controle discriminativo do pró- DESDOBRAMENTOS
prio reforço como variável que influencia a
recorrência de respostas. No experimento A beleza de uma ciência experimen-
de Epstein, a etapa final da fase de Elimi- tal é que os resultados de um experimen-
nação foi conduzida por um período rela- to respondem algumas perguntas, mas le-
tivamente curto (o tempo necessário para vantam uma série de novas perguntas que
a emissão de 20 respostas alternativas), requerem estudos adicionais. Ao discutir
na mesma sessão em que, posteriormente, seus resultados, Epstein (1983) afirmou que
a fase de Teste foi conduzida. É possível, muitas variáveis poderiam influenciar a
portanto, que a ressurgência observada ressurgência como, por exemplo, os esque-
para cada pombo nesse experimento tenha mas de reforçamento que mantêm a respos-
sido parcialmente induzida pela ocorrência ta alvo e a resposta alternativa, o tipo e a
de reforços na etapa final da fase de Elimi- magnitude dos reforços que mantêm essas
nação (lembre-se que 3 s de acesso a grãos respostas, a duração das fases de Treino e
serviram como reforços para as respostas de Eliminação (i.e., o tempo em que respos-
alvo, na fase de Treino, e para as respostas tas alvo e alternativa são reforçadas) e tam-
alternativas, na fase de Eliminação). No en- bém as condições em que a resposta alvo foi
tanto, vale ressaltar que, para cada pombo, a extinta (i.e., o número de sessões) e a taxa
ressurgência foi observada no experimento de respostas alvo antes do reforçamento da
de Epstein apenas quando os reforços para resposta alternativa. Além disso, ele suge-
a resposta alternativa foram descontinua- riu que o fenômeno da ressurgência esta-
dos, e não enquanto esses reforços estavam ria possivelmente envolvido no que cha-
sendo produzidos. Além disso, experimen- mamos de criatividade e de resolução de
tos subsequentes demonstraram que a res- problemas. Com essas afirmações, Epstein
surgência ocorre mesmo quando a fase de levantou uma série de questões que pode-
Eliminação é conduzida por várias sessões riam ser experimentalmente investigadas e
de duração mais longa do que aquela pro- ressaltou a utilidade do conhecimento so-
gramada por Epstein (e.g., Lieving & Lattal, bre o fenômeno da ressurgência para a aná-
2003; Podlesnik et al., 2006; Podlesnik & lise de outros padrões comportamentais.
Shahan, 2009) e quando a transição entre
as fases de Eliminação e Teste ocorre não Os resultados de Epstein (1983) têm
na mesma sessão, mas entre sessões. Nes- sido replicados em diversos laboratórios
se último caso, não há reforços disponíveis desde então, com diferentes espécies (e.g.,
para qualquer resposta durante toda a fase ratos, Podlesnik et al., 2006; humanos, Wil-

56
Carlos Renato Xavier Cançado, Flávia Hauck, Ítalo S. C. Teixeira

son & Hayes, 1996; peixes, da Silva, Cança- gência é influenciada pela taxa de reforços
do & Lattal, 2014) e com algumas modifica- em vigor nas fases de Treino (Podlesnik &
ções do procedimento descrito pelo autor Shahan, 2009, 2010) e Eliminação (Cança-
(ver Pontes e Abreu-Rodrigues, 2015). As do, Abreu-Rodrigues & Aló, 2015; Sweeney
variáveis que possivelmente influencia- & Shahan, 2013a). Em geral, taxas altas de
riam a ressurgência, indicadas por Epstein reforços nessas duas fases produzem res-
e descritas anteriormente, vêm sendo estu- surgência de maior magnitude do que ta-
dadas sistematicamente desde então. Dife- xas baixas de reforços. Temos também
rente do que indicaram os resultados de seu evidências que unidades comportamentais
experimento (Epstein, 1983), alguns estudos mais complexas, como diferentes padrões
sugerem que o número de sessões na fase temporais de resposta (Cançado & Lattal,
de Treino pode influenciar a magnitude da 2011) e sequências espaciais de respostas
ressurgência. Ressurgência de maior mag- (Sánchez-Carrasco & Nieto, 2005; Reed
nitude tende a ocorrer quando a fase de & Morgan, 2006) ressurgem assim como
Treino é conduzida por um número maior respostas discretas como bicar um disco,
de sessões (e.g., Bruzek et al., 2009; Dou- pressionar uma barra ou um botão de res-
ghty, Cash, Finch, Holloway & Wallington, postas. Esse último achado pode ser rele-
2010). No entanto, resultados inconsisten- vante para interpretar resultados de alguns
tes entre estudos têm sido obtidos quando estudos que mostram que ressurgência de
a duração da fase de Eliminação é manipu- maior magnitude é observada quando, na
lada. Em alguns estudos, a magnitude da fase de Treino, a resposta alvo ocorre em
ressurgência foi maior quando a duração taxas altas do que quando ocorre em taxas
da fase de Eliminação foi menor (e.g., Lei- baixas (da Silva, et al., 2008; Reed & Mor-
tenberg, et al., 1975; ver também Sweeney & gan, 2007). O que esses últimos resultados
Shahan, 2013b). Em outros estudos, a dura- podem indicar é a ressurgência de padrões
ção da fase de Eliminação não influenciou diferentes de respostas (i.e., taxas altas e ta-
a magnitude da ressurgência (e.g., Lieving & xas baixas) estabelecidos na fase de Treino.
Lattal, 2003, Winterbauer, Lucke & Bouton, Por fim, vale ressaltar que a ressurgência de
2013). respostas mantidas por contingências de
reforçamento negativo (ao invés de contin-
Hoje sabemos que a ressurgência é gências de reforçamento positivo, como no
um fenômeno replicável interssujeitos e experimento de Epstein) tem sido demons-
também intrassujeitos (i.e., após a exposi- trada com humanos no laboratório (Bruzek
ção repetida dos mesmos sujeitos ao pro- et al., 2009; Alessandri, Lattal & Cançado,
cedimento de três fases; e.g., Cançado & 2015) e em ambientes não laboratoriais (e.g.,
Lattal, 2011; Lieving & Lattal, 2003). Além Volkert, Lerman, Call & Trosclair-Lasserre,
disso, sabemos que a magnitude da ressur- 2009).

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Capítulo III | Ressurgência Comportamental

Epstein (1983) destacou a relevância Recentemente, esforços de pesquisa-


do fenômeno da ressurgência para a análise dores e pesquisadoras em contextos labo-
de fenômenos como a criatividade e a re- ratoriais e não laboratoriais têm produzido
solução de problemas (ver também Epstein, achados interessantes sobre a ressurgência.
1996). Mas a ressurgência pode ser relevan- Esses achados não apenas aumentam nosso
te também para compreender outros fenô- conhecimento sobre o fenômeno, mas ser-
menos, como, por exemplo, a recaída (e.g., vem como base para lidar com o fenômeno
de comportamentos mantidos por drogas, nos mais diversos contextos. Consideran-
Podlesnik et al., 2006; ou de outros compor- do-se a data de publicação do experimen-
tamentos de relevância aplicada; Lieving, to de Epstein (1983), a área de pesquisas
Hagopian, Long & O’Connor, 2004; ver sobre ressurgência é relativamente jovem.
também, Bouton, 2011; Podlesnik & Kelley, A ressurgência é um tema desafiador – é
2015; e St Peter, 2015). Se você pensar no um fenômeno transitório (Sidman, 1960) e,
procedimento de três fases para o estudo da como qualquer fenômeno transitório, exige
ressurgência, verá que o procedimento se esforço de pesquisadores e pesquisadoras
adequa bem como um modelo experimen- na elaboração das melhores condições para
tal para o estudo da recaída. No laborató- seu estudo. Análises experimentais siste-
rio com não humanos, por exemplo, pode- máticas dos efeitos de variáveis de controle
mos reforçar as respostas alvo com drogas já conhecidas sobre a ressurgência são in-
na fase de Treino (e.g., álcool, Podlesnik et teressantes e necessárias. Ao conduzirmos
al.; ou cocaína Quick, Pyszczynski, Colston tais análises, certamente descobriremos
& Shahan, 2011) e as respostas alternativas novas variáveis de controle e relações entre
com comida, na fase de Eliminação (a fase essas variáveis na determinação da ressur-
de Teste consistiria, assim como no estu- gência.
do de Epstein, em descontinuar a comida
que mantém as respostas alternativas). Em
contextos aplicados, a resposta alvo pode CONSIDERAÇÕES FINAIS
ser um comportamento problema cuja fre-
quência temos interesse em reduzir (e.g., Por quê estudar a ressurgência, ou a
agressão, autoagressão, abuso de drogas e recorrência do comportamento de maneira
outras substâncias) e respostas alternativas geral, é interessante? Primeiramente, trata-
são comumente aquelas mais apropriadas -se de um fenômeno natural e seu estudo,
para o contexto em que vive o participante por si só, se justifica. Além disso, é útil co-
e que resultam de uma intervenção com- nhecer suas variáveis de controle para al-
portamental como reforçamento diferen- terar sua probabilidade de ocorrência onde
cial de respostas alternativas (Marsteller & quer que isso seja necessário. Há contextos
St Peter, 2014; Volkert et al., 2009). em que a recorrência de comportamentos

58
Carlos Renato Xavier Cançado, Flávia Hauck, Ítalo S. C. Teixeira

é indesejável, mas ocorrem mesmo assim e em que grau o fenômeno será observado.
(e.g., a recorrência de comportamentos-pro- Essa é uma tarefa que aguarda aqueles in-
blema e a recaída). Há outros contextos em teressados na ressurgência e na recorrência
que seria desejável e pode não ocorrer (e.g., de comportamentos em geral.
em contextos de resolução de problemas e
quando temos interesse no estabelecimento
de comportamentos novos). PARA SABER MAIS

No início de seu artigo, Epstein (1983) Lieving & Lattal (2003). Série de quatro ex-
afirma que o fato que comportamentos pre- perimentos conduzidos com pombos. Uma
viamente reforçados tendem a recorrer das primeiras análises experimentais sis-
quando comportamentos atuais deixam de temáticas sobre a ressurgência conduzida
produzir reforços (i.e., ressurgência) teria após a publicação do experimento de Eps-
“um potencial de aplicação amplo” (p. 391). tein (1983).
Talvez apenas recentemente, dado o acu-
mulo de evidências experimentais sobre o Podlesnik, Gimenez-Gomez, & Shahan
fenômeno, tenhamos passado a explorar (2006). Experimento conduzido com ratos
mais as implicações do estudo da ressur- sobre a ressurgência de comportamentos
gência para uma análise experimental do previamente mantidos por álcool. Os auto-
comportamento e para a aplicação dos prin- res apresentam nesse artigo o procedimen-
cípios comportamentais em contextos não to para o estudo da ressurgência como um
laboratoriais. Durante aproximadamente modelo experimental da recaída.
20 anos, desde a publicação do trabalho
de Epstein até a publicação de uma série Podlesnik & Shahan (2009). Nesse artigo,
de experimentos conduzidos por Lieving e os efeitos sobre a ressurgência de taxas de
Lattal (2003), estudos sobre a ressurgência reforços diferenciais na fase de Treino (as-
foram escassos e envolveram comumente sim como sobre outros fenômenos de recor-
a análise de condições em que o fenômeno rência, como o restabelecimento e a reno-
ocorre ou não (ver Pontes & Abreu-Rodri- vação) são avaliados. Os autores propõem
gues, 2015). Recentemente, contudo, aná- uma relação entre as variáveis que deter-
lises experimentais sistemáticas têm sido minam a ressurgência (e a recorrência em
direcionadas à descrição de variáveis que geral) e a resistência do comportamento à
alteram não apenas a ocorrência da ressur- mudança.
gência, mas também sua magnitude. Um
maior refinamento experimental permite Bruzek, Thompson, & Peters (2009). Em
descrever não apenas quando o fenômeno dois experimentos conduzidos com hu-
irá ocorrer, mas também especificar como manos, a ressurgência de comportamentos

59
Capítulo III | Ressurgência Comportamental

mantidos previamente por contingências Mexicana de Análisis de la Conducta, 41,


de reforçamento negativo (fuga) foi estuda- 84-115.
da.
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Capítulo III | Ressurgência Comportamental

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João Cláudio Todorov, Rafaela M. Fontes Azevedo

Clarice Lispector,
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João Cláudio Todorov


Rafaela M. Fontes Azevedo
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“Observo em mim mesma as mudanças de estação: eu claramente mudo com elas”


Clarice Lispector

64
Capítulo IV | Contraste Comportamental

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- 1953/2003).


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO
DO EXPERIMENTO Os estímulos discriminativos (SD)
podem ser qualquer variável presente no
A noção de que o comportamento é contexto atual do indivíduo. São estímulos
selecionado por suas consequências é an- que sinalizam a disponibilidade da conse-
tiga, anterior a Thorndike (e.g., 1911, 1927). quência e dão “dicas” sobre a probabilidade
Skinner (1957/1978) inicia seu livro sobre de o comportamento ser ou não reforçado
comportamento verbal com uma frase de ou punido. Quando determinadas consequ-
impacto: “Os homens agem sobre o mundo, ências estão disponíveis apenas para res-
modificam-no e, por sua vez são modifica- postas emitidas em um determinado con-
dos pelas consequências de sua ação” (p.15). texto (na presença de determinado SD) e
quando o indivíduo passa a responder ape-
Consequências parecem ser a marca nas nesse contexto, dizemos que o respon-
registrada da Análise do Comportamento, der é discriminado (Skinner, 1938). Porém,
como demonstram alguns livros recentes para sabermos se o responder é discrimi-
(Biglan, 2015; Madden, 2013; McSweeney & nado ou não é preciso que haja pelo menos
Murphy, 2014a; Schneider, 2012). Mas con- dois contextos correlacionados diferencial-
sequências não seguem comportamentos mente com a produção da consequência
no vácuo. O contexto no qual o comporta- (e.g. contextos diferentes que sinalizam a
mento ocorre também é relevante (Skinner, presença de tipos de consequências dife-
1953/2003). Skinner (1938) afirmou que, em- rentes, ou que sinalizam presença vs. au-
bora a resposta possa ocorrer em diversas si- sência de consequências, ou mesmo que si-
tuações, apenas em parte dessas situações a nalizam diferentes relações entre a emissão
sua emissão será efetiva em produzir refor- da resposta e a apresentação do reforço). Ao
ços. Assim, o contexto no qual o comporta- observarmos mudanças no comportamento
mento ocorre (i.e., eventos antecedentes ao do indivíduo em função de mudanças nos
comportamento) acaba exercendo funções estímulos antecedentes poderemos afirmar
muito importantes por sinalizar quando e que há controle discriminativo, isto é, que o
quais tipos de consequências estarão dispo- comportamento está sob o controle de estí-
níveis. Em função disso, o comportamento mulos (Catania, 1999).
operante deve ser sempre compreendido a
partir da contingência tríplice: Eventos que Controle discriminativo, portanto, se
antecedem o comportamento (estímulos refere à influência que o contexto exerce
discriminativos), o próprio comportamento, sobre o comportamento (Moreira & Medei-
e as consequências que seguem a sua emis- ros, 2007) e, para estuda-lo é preciso treinar
são (reforço ou punição; e.g., Skinner, 1938, o comportamento em contextos diferentes

65
João Cláudio Todorov, Rafaela M. Fontes Azevedo

(na presença de estímulos distintos). Isto é, mulos antecedentes é o esquema múltiplo.


é preciso expor o indivíduo a situações nas Em um esquema múltiplo, dois ou mais
quais a disponibilidade da consequência esquemas de reforçamento são correlacio-
é diferencialmente correlacionada a dife- nados a diferentes estímulos antecedentes.
rentes estímulos antecedentes. Por isso, o Cada um desses esquemas de reforçamento
esquema mais tradicionalmente utilizado correlacionados a diferentes estímulos an-
para investigar controle discriminativo tem tecedentes compõe o que se chama de com-
sido o esquema múltiplo. ponente (Ferster & Skinner, 1957). Em um
experimento de laboratório com animais
Esquemas de reforçamento ou pu- não-humanos podemos ter, por exemplo,
nição são relações condicionais entre o um esquema múltiplo com dois compo-
comportamento dos organismos e eventos nentes: em um sempre há uma luz acesa e
no ambiente e são geralmente utilizados a emissão da resposta é sempre seguida por
como variáveis independentes na Análi- comida e no outro não há luz e a resposta
se do Comportamento (Ferster & Skinner, nunca é seguida por comida. Têm-se, assim,
1957). Assim, ao estabelecer um esquema dois contextos diferentes (presença vs. au-
de reforçamento se estabelece uma rela- sência de luz) correlacionados com esque-
ção “se, então” que indicará quais as con- mas diferentes (reforço vs. extinção). Pode-
dições (e.g. número de respostas, interva- -se afirmar que o responder é discriminado,
lo de tempo necessário entre as respostas, nesse exemplo, se o organismo responde
etc.) para a apresentação da consequência. mais na presença da luz do que na sua au-
Por exemplo, em um esquema de razão fixa sência.
se estabelece um número fixo de respostas
que deve ser emitido pelo organismo para Embora no treino discriminativo
que a consequência seja apresentada. Em simples seja comum a utilização de alter-
um esquema de reforçamento, geralmente nação de estímulos antecedentes correla-
se estabelece também uma relação condi- cionados a reforço e extinção (e.g. Hanson,
cional com o estímulo antecedente. Assim, 1959; Skinner, 1938; Smith & Hoy, 1954), ge-
a relação entre a resposta e a consequência ralmente os experimentos com esquemas
depende do estímulo antecedente presente múltiplos utilizam dois ou mais componen-
no momento: se na situação A o compor- tes nos quais diferentes esquemas de refor-
tamento B ocorrer, então a consequência C çamento (e.g. razão fixa ou variável, inter-
será apresentada (Todorov, 2002, 2012). valo fixo ou variável) estão em vigor, sendo
cada um sinalizado por um estímulo an-
Como indicado anteriormente, um tecedente diferente, porém, correlaciona-
esquema comumente utilizado para de- dos a tipos semelhantes de consequências
monstrar o controle estabelecido pelos estí- (Ferster & Skinner, 1957). Por exemplo, po-

66
Capítulo IV | Contraste Comportamental

demos ter um esquema múltiplo com dois interação entre os componentes do esque-
componentes programados da seguinte ma múltiplo pode ser estudada alterando-
forma: em um componente há sempre um -se as condições em um componente en-
tom e a consequência é produzida a partir quanto as condições no outro componente
de um esquema de razão fixa (a cada X res- são mantidas constantes. Assim, o objetivo
postas, a comida é apresentada) e no outro ao se estudar a interação é observar como
componente o tom está sempre ausente e mudanças nas condições de um contexto
a consequência é produzida a partir de um afetam o comportamento em outro contex-
esquema de intervalo fixo (a comida é apre- to inalterado.
sentada para a primeira resposta emitida
após X min). Nesse caso, pode-se afirmar Diversos experimentos foram reali-
que o responder é discriminado se for ob- zados para investigar essa interação entre
servado que a taxa e o padrão de respostas componentes (e.g. Findley, 1958, Herrick,
são diferenciados entre os componentes. Myers & Korotkin, 1959, Reynolds, 1961b,
Uma das utilidades do esquema múltiplo é, 1961c) e o que se observou é que alterações
então, demonstrar como o comportamento que diminuem a taxa de respostas em um
muda em função de mudanças no contexto, componente (e.g., extinção) geralmente
dado que as mudanças no contexto sinali- produzem aumentos na taxa de respostas
zam mudanças nas contingências em vigor. no componente inalterado. Além disso, al-
terações que aumentam a taxa de respostas
Herrnstein e Brady (1958) afirmaram em um componente produzem diminuições
que o esquema múltiplo pode ser uma boa na taxa de respostas no componente inal-
ferramenta para comparações intrassujei- terado. A esse efeito de interação foi dado
tos dentro de uma mesma sessão em função o nome de contraste comportamental (con-
da independência entre o desempenho nos traste positivo, no primeiro caso, e contras-
componentes. Porém, em diversos experi- te negativo no segundo). Assim, contraste
mentos (inclusive no experimento de Herr- comportamental se refere a uma mudança
nstein & Brady) tornou-se evidente que os na taxa de respostas na presença de um
desempenhos entre os componentes podem estímulo que é oposta à mudança na taxa
não ser independentes, isto é, o que ocorre de respostas na presença de outro estímulo
em um dos componentes de um esquema (Reynolds, 1961a).
múltiplo pode influenciar o comportamen-
to que ocorre no outro componente. À mu- Embora o contraste seja um efeito
dança do comportamento em um contexto comumente observado durante a formação
(SD) em função de alterações nas condições de uma discriminação entre dois ou mais
em vigor em outro contexto (diferente SD) estímulos (e.g., quando um deles é corre-
chama-se interação (Reynolds, 1961b). Essa lacionado ao reforço e o outro a extinção),

67
João Cláudio Todorov, Rafaela M. Fontes Azevedo

o contraste ocorre também em condições ços e taxa de respostas pudessem ser expe-
em que há reforço programado na presença rimentalmente isoladas para observar como
de ambos os estímulos, porém com varia- cada variável influenciava o contraste e as-
ções na taxa de reforços entre eles. Findley sim, poder verificar se o fenômeno era fun-
(1958), por exemplo, relatou que a taxa de ção de mudanças na taxa de reforços ou na
respostas em um componente, um esquema taxa de respostas. Reynolds encontrou uma
de intervalo variável (VI) 6 min, aumentou solução relativamente simples e interes-
quando no outro componente, um VI maior sante para responder a sua pergunta: Dimi-
do que 6 min programava uma menor taxa nuir a taxa de respostas sem alterar a taxa
de reforços em relação ao VI 6 min. de reforços.

Porém, até a década de 1960, o que Para isso, Reynolds (1961a) utilizou
se observava nos experimentos realizados quatro pombos e uma caixa operante com
sobre contraste (e.g. Herrick, et al., 1959; um disco que poderia ser iluminado por
Reynolds, 1961b) era que a taxa de respostas quatro cores diferentes. Durante o experi-
covariava consistentemente com a taxa de mento, cada pombo era colocado na câma-
reforços (i.e., diminuições na taxa de refor- ra experimental e respostas de bicar o disco
ços eram seguidas de diminuições na taxa produziam acesso a comida. Reynolds di-
de respostas e aumentos na taxa de refor- vidiu o seu estudo em quatro procedimen-
ços eram seguidos por aumentos na taxa tos subdivididos em várias fases. Em cada
de respostas) e não se sabia dizer qual das procedimento havia um esquema múltiplo
duas variáveis era responsável pelo con- com dois componentes e, em cada compo-
traste comportamental. Permanecia então a nente, o disco era iluminado por uma cor
questão: A taxa de respostas no componen- diferente (SD). Diversos tipos de alterações
te inalterado aumenta porque a taxa de res- foram feitas em um dos componentes do
postas do segundo componente diminui ou múltiplo a fim de verificar quais variações
porque a taxa de reforços do segundo com- nesse componente levariam a mudanças
ponente diminui? Por isso, em 1961, Rey- na taxa de respostas no outro componen-
nolds resolveu conduzir um estudo para te, que permanecia inalterado ao longo das
responder a essa questão. fases.

Em todos os procedimentos, inicial-


DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO mente, um VI 3 min esteve em vigor em
cada componente do múltiplo. Isto é, em
Objetivo e Método média, a primeira resposta após 3 min pro-
A proposta de Reynolds (1961a) foi duzia o reforço. Cada componente ficava
conduzir um estudo no qual taxa de refor- em vigor por 3 min e eram apresentados de

68
Capítulo IV | Contraste Comportamental

maneira alternada. Em cada sessão, cada componente foi alterado para o DRO e só
componente era apresentado 30 vezes. Os depois para extinção e para outros pombos
procedimentos variaram em relação às al- a ordem de alteração foi inversa). O Proce-
terações realizadas em um dos componen- dimento III foi uma combinação dos dois
tes, sendo no primeiro sempre mantido um procedimentos anteriores e a manipula-
VI 3 min (de agora em diante, chamaremos ção feita no componente alterado foi uma
o componente mantido com o VI 3 min de combinação do timeout com o DRO, ou
componente constante e o componente no seja, todas as luzes da caixa experimental
qual as manipulações foram realizadas de eram apagadas e reforços eram produzidos
componente alterado). se os pombos não respondessem durante o
intervalo do DRO. Um procedimento adi-
No Procedimento I, para o compo- cional foi realizado para controlar o efeito
nente alterado foi programado um timeout do aumento na taxa de reforços sob o DRO
em umas das fases (todas as luzes da caixa e, para isso, ao final da última sessão do
operante eram apagadas e não havia apre- Procedimento III, aumentou-se o peso dos
sentação de reforço para nenhuma das res- animais (i.e., diminuiu-se a privação) e, en-
postas emitidas) e extinção em outra fase tão, no dia seguinte os animais foram nova-
(o estímulo continuava a ser apresentado, mente expostos às mesmas condições que
porém, não havia apresentação do reforço). haviam sido programadas no Procedimento
No Procedimento II, para o componente al- II, no qual para o componente alterado foi
terado, foi programado um esquema de re- programado um DRO em uma fase, e extin-
forçamento diferencial de outros compor- ção na fase seguinte.
tamentos (DRO¹) 50 ou 75 s para uma das
fases e extinção para outra. A programação As manipulações realizadas por Rey-
do DRO no Procedimento II teve como ob- nolds (1961a) possibilitaram a comparação
jetivo garantir que a taxa de respostas di- de condições nas quais a diminuição da
minuísse sem que houvesse uma redução taxa de respostas estava correlacionada à
na taxa de reforços, dado que sempre que diminuição na taxa de reforços (i.e., alteran-
os pombos não respondessem (por 50 ou 75 do o segundo componente para extinção ou
s) o reforço seria apresentado. A ordem de timeout) e condições nas quais a diminui-
mudança para DRO ou extinção, no com- ção da taxa de respostas não estava corre-
ponente alterado, foi contrabalanceada en- lacionada à diminuição na taxa de reforços
tre os pombos (i.e., para alguns pombos o (i.e., alterando o segundo componente para
um DRO). Dessa forma, foi possível iso-
lar experimentalmente os efeitos da taxa
1
Em um DRO, o reforço só é apresentado se o organismo cumprir o
intervalo estabelecido sem emitir determinada resposta. No presente de respostas e da taxa de reforços sobre o
experimento, caso o pombo passasse 50 ou 75 s sem bicar o disco a
comida era apresentada. contraste comportamental. Se o contraste

69
João Cláudio Todorov, Rafaela M. Fontes Azevedo

dependesse de variações apenas na taxa componente alterado, combinado ou não


de respostas, em todas as condições o con- com timeout, aumentos na taxa de respos-
traste deveria ocorrer, já que em todas ha- tas do componente constante (independen-
veria uma redução da taxa de resposta no te do peso corporal dos pombos) não foram
componente alterado. Porém, se é a altera- observados. De maneira geral, o contraste
ção na taxa de reforços a variável relevan- foi observado nas condições onde não ha-
te, então, o contraste só deveria ocorrer nas via reforços em um componente (timeout
condições nas quais houvesse variação da e extinção), mas não foi observado quando
taxa de reforços no componente alterado havia reforço disponível nesse componen-
(i.e., nas condições em que foram progra- te, embora a taxa de respostas durante o
mados timeout ou extinção) e não deveria componente alterado tenha diminuído em
ocorrer nas condições em que o DRO estava todas as condições.
em vigor (i.e., a taxa de reforços nessa con-
dição não era alterada). Portanto, se a taxa Reynolds (1961a) propôs duas expli-
de respostas no componente constante au- cações para a não ocorrência do contraste
mentasse quando mudanças fossem feitas nas condições em que um DRO estava em
no componente alterado em todas as con- vigor no componente alterado. Uma expli-
dições, a taxa de respostas poderia ser en- cação é que o contraste pode não ter acon-
tendida como variável mais relevante. No tecido porque, sob o DRO, pausas (i.e., não
entanto, se a taxa de respostas do compo- bicar o disco) foram reforçadas e isso pode
nente constante só variasse nas condições ter induzido a ocorrência de pausas tam-
em que houve mudanças na taxa de refor- bém no componente constante, em que o
ços no componente alterado, então a taxa VI 3 min continuava em vigor. Uma outra
de reforços seria a principal variável deter- explicação é que o contraste poderia não
minante do contraste. ter ocorrido porque a diminuição na taxa de
reforços, e não de respostas, é a condição
necessária para a ocorrência do contraste
Resultados e Discussão e, dessa forma, o DRO eliminou este efeito
Os resultados indicaram que altera- uma vez que não houve redução na taxa de
ções na taxa de reforços, e não na taxa de reforços sob esse esquema, como indicado
respostas, em um dos componentes do múl- anteriormente.
tiplo é a variável que determina o contraste
comportamental (Reynolds, 1961a). Tanto Como o aumento da taxa de respos-
timeout quanto extinção no componente tas foi imediato no componente constante
alterado produziram aumentos na taxa de (VI 3 min) quando o DRO foi suspenso no
respostas do componente constante. Po- componente alterado (i.e., quando extinção
rém, quando o DRO estava em vigor no estava em vigor nesse componente), Rey-

70
Capítulo IV | Contraste Comportamental

nolds (1961a) afirmou que a taxa de reforços naquele contexto em relação a todos os ou-
é a variável mais relevante para a ocorrên- tros.
cia do contraste. Para Reynolds, é a altera-
ção na frequência relativa de reforços (i.e., a A partir da pesquisa de Reynolds
frequência de reforços na presença de um (1961a) muitas outras investigações foram
estímulo em relação à frequência de refor- realizadas a fim de verificar o efeito da taxa
ços na presença de ambos os estímulos) que de reforços sobre a ocorrência e a magni-
causa as alterações na taxa de respostas tude do contraste, principalmente com o
que descrevemos como contraste. objetivo de responder se a taxa de refor-
ços seria a única variável responsável pela
ocorrência do contraste, se seria a variável
DESDOBRAMENTOS principal, e que outras variáveis e explica-
ções seriam possíveis.
O experimento de Reynolds (1961a)
sugere que as consequências que são pro- Experimentos manipulando diver-
gramadas em um contexto afetam não só sos tipos de esquemas em um dos com-
o que fazemos naquele contexto, mas tam- ponentes, para produzir diferentes taxas
bém o que fazemos em outros contextos. de respostas sem alterar as taxas de re-
Portanto, o que um organismo faz em uma forços entre os componentes foram reali-
situação depende não só das consequências zados, corroborando a ideia de que a taxa
disponíveis naquela situação, mas também de reforços é realmente mais relevante do
das consequências disponíveis em situa- que a taxa de respostas na determinação
ções diferentes (ver também Herrnstein, do contraste (e.g. Bloomfield, 1967; Nevin,
1961, 1970). 1968; Reynolds, 1961d; Zuriff, 1970). Dado,
então, que a taxa relativa de reforços é
Assim, para que seja possível com- uma variável relevante para a ocorrência
preender o que um indivíduo faz em um do contraste, também foram estabelecidas
determinado contexto muitas vezes será relações entre contraste e a Lei da Iguala-
preciso observar também o que ele faz em ção (e.g. McLean & White, 1983; Williams
outras situações e que tipos de consequ- & Wixted, 1986). A Lei da Igualação prediz
ências ele tem disponível de uma maneira que em situações de escolha (i.e. esquemas
geral e não apenas em uma determinada concorrentes, nos quais os dois componen-
ocasião. É preciso, então, adotar uma pers- tes são apresentados simultaneamente e
pectiva relativa e entender que a função de o organismo deve escolher responder em
um estímulo pode ser não só a de sinalizar ou outro componente) a taxa de respostas
as consequências disponíveis naquele con- se igualará à taxa de reforços disponíveis.
texto, mas as consequências disponíveis Assim, situações de escolha caracteriza-

71
João Cláudio Todorov, Rafaela M. Fontes Azevedo

riam o caso mais evidente de interação, já traste, desde então diversas investigações
que a maneira como eu me comporto em tem sido conduzidas a fim de se chegar a
relação a uma das opções necessariamente um entendimento mais claro e a uma des-
afetará o meu comportamento em relação à crição mais acurada desse fenômeno (ver
outra opção, dado que ambas as respostas Freeman, 1971; e Williams, 1983).
não podem ser emitidas ao mesmo tempo.
Assim como a distribuição de respostas em
esquemas concorrentes é função da distri- CONSIDERAÇÕES FINAIS
buição dos reforços entre os componentes,
essa interação também parece ocorrer mes- A conclusão de que é alteração da
mo quando as opções são apresentadas de taxa de reforços que produz a ocorrência do
maneira sucessiva, e não simultânea, como contraste, entretanto, deve ser considerada
é o caso dos procedimentos para o estudo com cautela. Reynolds e Limpo (1968), por
do contraste (i.e., esquemas múltiplos). Em exemplo, conduziram um experimento uti-
ambos os casos, então, temos evidencia de lizando um esquema de reforçamento dife-
como a distribuição de reforços pode afetar rencial de taxas baixas (DRL) e observaram
a distribuição das respostas. que a taxa de respostas do componente
constante aumenta, apesar da taxa relativa
Outra variável que parece afetar a de reforços diminuir em relação à linha de
ocorrência do contraste é a duração dos base.
componentes, e muitos estudos foram con-
duzidos a fim de se investigar essa relação. Embora alterações na taxa relativa de
De maneira geral, observa-se que a magni- reforços pareçam estar diretamente relacio-
tude do contraste é maior quanto menor for nadas à ocorrência do contraste, sendo re-
a duração do componente (e.g. Charman & plicada em diversos trabalhos (e.g. Catania,
Davison, 1982; Hinson, Malone, McNally & 1961; Reynolds, 1963; Wilton & Gay, 1969),
Rowe, 1978; Shimp & Wheatley, 1971; Todo- essa pode não ser a única variável de con-
rov, 1972). trole (e.g. Davison & Ferguson, 1978; Wilkie
1977; Williams, 1980). O mais importante a
O estudo de Reynolds (1961a) foi ser considerado na literatura sobre contras-
um primeiro passo para uma compreensão te e sobre o trabalho de Reynolds (1961a),
mais precisa sobre a ocorrência do con- especificamente, é o papel que outros con-
traste, pois foi o primeiro a isolar os efeitos textos (passados e futuros) exercem sobre o
de taxa de respostas e de reforços. Embo- que acontece no momento atual.
ra seus resultados tenham indicado a taxa
relativa de reforços como a principal vari- Trabalhos publicados nos anos 1960
ável responsável pela ocorrência do con- e 1970 foram decisivos para determinar o

72
Capítulo IV | Contraste Comportamental

progresso da Análise do Comportamento variáveis passadas, presentes e futuras que


nessa questão, destacando a função do con- podem atuar no controle do comportamen-
texto na determinação do comportamento to atual de um organismo.
e demonstrando que diversos aspectos do
contexto exercem controle sobre o com- Essa noção de interação entre dife-
portamento dos organismos. Esses diversos rentes contextos pode ser especialmente
aspectos devem, então, ser considerados ao relevante no contexto aplicado e principal-
se analisar o que um organismo faz agora e mente no tratamento de comportamentos
por quê faz. Para compreender o compor- problema. Gross e Drabman (1981) fizeram
tamento atual de um organismo é preciso uma revisão de estudos sobre contraste
levar em conta que seu comportamento é comportamental realizados com humanos
influenciado não só pela contingência a que demonstram a ocorrência do fenôme-
qual está exposto, mas também pelo que no. Uma das evidências que se tem é de que,
mais está acontecendo no ambiente na- embora alguns tratamentos sejam eficazes
quele momento, ou seja, todas as demais em reduzir o comportamento problema em
contingências disponíveis que concorrem determinados contextos, esse mesmo com-
simultaneamente. Assim, para entender portamento pode aumentar de frequência
o que o indivíduo faz precisamos analisar em outros contextos não correlacionados
todas as outras opções do que ele poderia ao tratamento (e.g. redução de comporta-
estar fazendo e todas as consequências pro- mentos inapropriados em casa, mas au-
gramadas para esses comportamentos con- mento desses mesmos comportamentos
correntes (Herrnstein, 1961, 1970). na escola), caracterizando assim um efeito
de contraste comportamental. Então, ao se
O comportamento atual pode ser pensar em intervenções comportamentais
influenciado ainda por sinais do que vai é preciso sempre lembrar que os contextos
acontecer no futuro muito próximo (Rey- não podem ser compreendidos de maneira
nolds, 1961a, 1961b, 1961c; Reynolds & Lim- isolada e que alterações em um contexto
po, 1968) e também do que já ocorreu no podem acarretar mudanças comportamen-
passado, e assim, a ordem de ocorrência tais em outros contextos aparentemente
dos eventos (o que o indivíduo acabou de não correlacionados.
fazer e o que ele vai fazer em seguida) pode
controlar também o seu comportamen-
to atual (e.g. Catania & Gill, 1964; Nevin & PARA SABER MAIS
Shettleworth, 1966; Terrace, 1966a). Dessa
forma, ao analisarmos o papel do contexto Terrace (1966b). Investigou se o uso de um
é preciso compreendê-lo de modo amplo e treino de discriminação mais extenso e uti-
dinâmico, tendo em vista circunstâncias e lizando um procedimento de aprendizagem

73
João Cláudio Todorov, Rafaela M. Fontes Azevedo

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Cristiano Coelho

Da frequência absoluta
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“Você não veio aqui para fazer a escolha. Você já a fez. Você está aqui para tentar
entender porque fez essa escolha”
O Oráculo (The Matrix Reloaded, Irmãos Wachowski)

78
Capítulo V | Escolha

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- cionadas às suas respectivas consequên-


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO cias. Essa formulação apresentou avanços
DO EXPERIMENTO na compreensão do controle do comporta-
mento operante, mas ainda se concentrou
Skinner (1950) deu os primeiros pas- na consequenciação direta de cada respos-
sos para uma compreensão do estudo do ta independentemente das consequências
comportamento de escolha na Análise do para respostas alternativas. No exemplo
Comportamento ao propor que responder do pombo acima, as respostas a cada disco
a um dentre dois estímulos é escolha, não eram vistas como influenciadas apenas por
o resultado desta escolha (como propõe seus próprios reforços, sem uma influência
o senso comum). Já preferência seria uma direta pelos reforços disponíveis para ou-
medida do número de respostas em uma tras alternativas. Isso teria como implicação
alternativa em relação à outra, relacionan- que, ao aumentar a frequência de reforços
do-se à alternação de respostas a cada es- em um dos discos, a taxa absoluta de res-
tímulo disponível. Dessa forma, em vez de postas a esse disco aumentaria, sem inter-
tomar a escolha como um processo inferido ferir na taxa de respostas ao outro disco.
pré-comportamental, visão característica Mesmo assim, Skinner antecipou a noção
de concepções que baseavam suas explica- de igualação ao obter uma proporcionali-
ções em processos mentais vigentes à épo- dade nas taxas absolutas de respostas entre
ca, Skinner focou na a emissão de respostas dois esquemas, conforme suas respectivas
como a escolha em si. Com isso, caracte- taxas absolutas de reforços.
rizou-a como um padrão comportamental
mais amplo, relacionado a outras variáveis Condições que envolviam essas si-
que não os supostos processos decisórios tuações foram exploradas de forma siste-
internos. mática posteriormente por Ferster e Skinner
(1957) em experimentos sobre o compor-
Podemos dizer que bicar um dentre tamento em esquemas concorrentes, nos
dois discos disponíveis, estudar em vez de quais dois (ou mais) esquemas de reforça-
ir para a festa na véspera da prova ou dizer mento permanecem em vigor simultanea-
“te amo” quando solicitado pela namorada mente para diferentes respostas incompa-
em vez de dizer que quer terminar, seriam tíveis de serem emitidas ao mesmo tempo.
as escolhas e não os produtos da escolha. Em arranjos experimentais de esquemas
Adicionalmente, bicar mais vezes um dis- concorrentes, cada esquema é vinculado a
co que outro, ir mais vezes à balada que es- diferentes operandos que diferem com re-
tudar na véspera da prova e dizer mais “te lação à posição (como dois discos ou duas
amo” ilustrariam as preferências por cada barras), cor ou outra propriedade, e permi-
uma dessas alternativas, e estariam rela- tem a mensuração das taxas e distribuições

79
Cristiano Coelho

das diferentes respostas ao longo do tempo. começou a se desenvolver com Herrnstein


Podemos ter dois discos em uma parede da (1958) ao propor que devido às respostas em
caixa experimental dispostos lado a lado, esquemas concorrentes serem incompatí-
cada um iluminado por uma cor; respos- veis, haveria “a possibilidade de estudar es-
tas a um dos discos podem ser reforçadas colha como um processo comportamental”
intermitentemente a cada 30 segundos e (p. 35). De acordo com ele, porém, o desen-
respostas ao outro disco podem ser refor- volvimento da área carecia de dados que
çadas a cada 60 segundos, por exemplo, e explicitassem como a disponibilização de
as duas respostas não podem ser emitidas consequências para respostas incompatí-
ao mesmo tempo. Esse procedimento, que veis levaria à semelhança na proporciona-
passou a ser o padrão no estudo de escolha, lidade entre os reforços obtidos e respostas
capta a noção básica de Skinner (1950). Os emitidas nas duas alternativas que os da-
estudos anteriores a Herrnstein (1961) con- dos sugeriam, isto é, como uma alternativa
centraram-se nas análises da suspensão com uma frequência de reforços duas vezes
dessas consequências sobre respostas con- maior que a outra levava a um responder
correntes e dos efeitos de consequências, duas vezes maior naquela alternativa.
que mostravam regularidades nos padrões
e distribuição de respostas: Ferster e Skin- Herrnstein (1958) obteve dados de
ner (1957) investigaram sistematicamente distribuição de respostas entre dois es-
em várias condições que as respostas em quemas concorrentes de razão fixa (FR),
esquemas concorrentes com dois operan- com três pombos. Nesse experimento, de
dos localmente separados apresentavam os um total de 40 respostas a serem emitidas
mesmos padrões obtidos em esquemas sim- para cada reforço, foi manipulado o núme-
ples; Findley (1958) estendeu esses achados ro de respostas necessárias em cada disco
para situações experimentais com os dois para a liberação do reforço em diferentes
esquemas associados ao mesmo operando, condições. A proporção de respostas nas
sinalizado por cores diferentes de acordo alternativas se aproximou das proporções
com o esquema no qual o pombo respondia, programadas pelos esquemas de razão, mas
e as cores e o respectivo esquema modifica- a proporção de reforços obtidos variou de
dos quando o pombo emitia uma resposta maneira irregular quando a obtenção do
em um disco de mudança. De acordo com reforço dependida da emissão de uma res-
Davison (2012), estes trabalhos iniciais es- posta no esquema alternativo após serem
tavam preocupados em descrever essas re- emitidas as respostas definidas no outro
gularidades em vez de se aprofundarem em esquema. Ao controlar sistematicamente a
medidas quantitativas. distribuição de reforços, Herrnstein obteve
proporções de respostas semelhantes à de
A busca por descrições quantitativas reforços obtidos. Apesar da noção de esco-

80
Capítulo V | Escolha

lha como comportamento não estar parti- calizados em uma das paredes da caixa. Os
cularmente traçada naquele trabalho, esta- discos podiam ser iluminados com as cores
va aberta a porta para o desenvolvimento vermelho (A - disco da esquerda) e branco
de um modelo quantitativo do estudo do (B - disco da direita) e ficavam a uma mes-
comportamento de escolha a partir da no- ma distância do comedouro, que ficava
ção de igualação. Um dos grandes diferen- centralizado na mesma parede dos discos.
ciais de Herrnstein (1961) foi investigar essas
relações de maneira sistemática, fornecen- O experimento iniciou-se com um
do sustentação empírica para a análise dos treino preliminar em duas sessões que ter-
efeitos da frequência relativa de reforços minavam após 60 reforços, no qual eram
sobre a distribuição de respostas. reforçadas respostas no disco diferente
daquele para o qual havia sido disponibi-
lizado o último reforço, de acordo com um
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO esquema concorrente de reforço contínuo
(CONC CRF - CRF). Este treino visou ga-
Objetivo e Método rantir uma distribuição de respostas simi-
O objetivo do trabalho de Herrns- lar e a alternância entre os dois discos, de
tein (1961) foi estudar de forma paramétrica forma a garantir um mesmo contato com as
e descrever quantitativamente o efeito da alternativas concorrentes em vigor. Poste-
frequência relativa de reforços em esque- riormente, Herrnstein (1961) programou re-
mas concorrentes sobre as taxas de respos- forços para duas respostas disponibilizados
tas em cada componente do esquema e as independentemente de acordo com esque-
taxas relativas entre os dois esquemas. Em mas de reforço de intervalo variável (CONC
um estudo paramétrico, a variável indepen- VI - VI), nos quais a liberação de reforços
dente (e.g., frequência relativa de reforços) em um esquema não interferia na liberação
é manipulada em diferentes valores permi- de reforços da outra alternativa. O uso de
tindo que sejam obtidas diversas medidas esquemas de intervalo variável, nos quais
da variável dependente (e.g., frequência re- o reforço é disponibilizado para a primeira
lativa de respostas), possibilitando o acesso resposta após a passagem de um tempo que
a uma maior amplitude da relação funcio- varia em torno de uma média, justificou-se
nal, ou seja, como a variável dependente por ser um esquema que, ao ser modifica-
se modifica com diversos valores da variá- do, leva a consistentes alterações na taxa de
vel independente. Para tanto, três pombos respostas. Os dois esquemas vigoravam ao
foram mantidos a 80% de seus pesos com mesmo tempo, sem interferência entre si,
acesso livre a alimento. O experimento foi e os intervalos programados para cada um
realizado em uma caixa de condicionamen- deles vigoravam mesmo quando o pombo
to operante com dois discos de respostas lo- respondia no outro esquema, porém um

81
Cristiano Coelho

reforço disponível em um dos esquemas condições, um procedimento que evitava


só era liberado quando o sujeito respondia que respostas de alternar entre os dois es-
nesse esquema. Assim, em um dado mo- quemas fossem reforçadas acidentalmente,
mento poderia haver reforço disponível em o atraso para respostas de mudança (chan-
ambos os esquemas, em apenas um deles geover delay, COD). Como ele funciona?
ou em nenhum dos dois. Sem o COD, quando o pombo estivesse bi-
cando em um disco e houvesse reforço dis-
Herrnstein (1961) utilizou dois pares ponível para respostas no disco alternativo,
de esquemas que em conjunto programa- a primeira resposta nesse disco alternativo
vam um reforço a cada 1,5 minutos em todas seria reforçada. Isso pode reforçar não res-
as condições. Este controle experimental postas a um disco específico, mas o padrão
foi importante para garantir que as medidas de alternação entre os discos (i.e., responder
de respostas se relacionassem às frequên- em um disco e responder no outro e, assim,
cias relativas de reforços dos dois esquemas sucessivamente) independente das modifi-
e não a possíveis diferenças nas taxas totais cações na taxa relativa de reforços. O COD
de reforços entre as condições. Em seu tra- tem como função evitar que isso aconte-
balho, os valores dos VIs foram: VI 3 min ça. Vamos supor que em um determinado
– VI 3 min; VI 2,25 min – VI 4,5 min; VI 1,8 momento houvesse reforço disponível para
min – VI 9 min; e VI 1,5 min – Extinção. respostas no disco B e o pombo estivesse
Esses pares de esquemas foram alternados respondendo no disco A. Ao alternar para
entre os dois discos (A e B), de forma que o disco B e obter o reforço disponível nes-
havia condições em que o disco A ora tinha se disco, ele precisaria permanecer respon-
VIs menores (maior frequência de reforços), dendo no disco B pelo menos pelo tempo
ora VIs maiores (menor frequência de re- definido no COD (que foi de 1,5 s. no experi-
forços) que o disco B, além da condição VI mento) para que um reforço fosse liberado.
3 min – VI 3 min, em que foi programada
uma mesma frequência de reforços para os
dois discos. Os sujeitos foram expostos a to- Resultados e discussão
das essas condições e em ordens diferentes, Herrnstein (1961) registrou o núme-
visando reduzir efeitos derivados da ordem ro de reforços obtidos e respostas emitidas
de exposição. É importante ressaltar que em cada disco, para cada condição. Esses
cada condição foi realizada por um número dados possibilitaram diversas análises so-
de sessões até que a emissão de respostas se bre os efeitos das alterações na frequência
estabilizasse ao longo de cinco sessões; só de reforços sobre a regularidade e, princi-
então uma nova condição era iniciada. palmente (no caso de Herrnstein), a aspec-
tos quantitativos do comportamento. Mais
Herrnstein (1961) usou, em algumas especificamente, se o aumento na taxa de

82
Capítulo V | Escolha

reforço de uma alternativa e a consequente As porcentagens de respostas se


redução na taxa de reforço para a outra al- aproximaram da porcentagem de reforços
ternativa levariam a aumentos (e reduções) obtidos nas respectivas condições, ou seja,
nas taxas de respostas, bem como a exten- a frequência relativa de respostas tendeu a
são dessas alterações em função dos esque- igualar a frequência relativa de reforços, nas
mas do par concorrente. Para isso, em cada condições em que se utilizou o COD (que
condição, além das frequências absolutas de reduziu a taxa de alternação e, consequen-
reforços e respostas em cada um dos discos temente, aumentou o controle pelas con-
A e B, foram calculadas a frequência relati- tingências de cada esquema) e os desvios de
va de reforços obtidos (proporcionalmente uma igualação perfeita não apresentaram
o número de reforços obtidos no disco A em tendência sistemática da previsão teórica
relação ao total de reforços obtidos nos dois de igualação. Este achado submeteu pela
discos, A e B) e a porcentagem de respostas primeira vez a teste quantitativo a noção de
emitidas (total de respostas emitidas no dis- distribuição de respostas como função da
co A dividido pelo total de respostas emiti- distribuição de reforços baseada no princí-
das nos discos A e B), considerando as cinco pio de que a alteração na frequência de re-
sessões finais, com o comportamento está- forços de uma fonte influencia as respostas
vel. Como a frequência relativa de reforços sob controle de outra fonte de reforços.
variou entre as condições, esses cálculos
possibilitaram verificar como se alteraria a Essa influência relaciona-se a outro
distribuição de respostas entre os dois dis- achado fundamental obtido por Herrnstein
cos. De maneira direta, Herrnstein investi- (1961) e que se constitui um dos pressupos-
gou se a proporção de respostas se igualaria tos para a relação de igualação: a taxa de res-
à frequência relativa de reforços, descrita postas apresentou uma relação linear (cres-
pela equação: cente e contínua) com a taxa de reforços
obtidos em cada alternativa e que as taxas
(1), de respostas nos dois discos foram seme-
lhantes na condição CONC VI 3 min - VI 3
na qual R e r são número de respostas e re- min, quando foi programada a mesma taxa
forços, respectivamente, e 1 e 2 correspon- de reforço nos dois discos. Assim, o total de
dem às alternativas. Essa equação expressa respostas nos dois discos em cada condição
que as respostas na alternativa 1 divididas ficou constante ou apresentou pequenas
pelo total de respostas nas duas alternativas variações assistemáticas. E por que essas
(1 e 2) tendem a igualar o total de reforços
obtidos na alternativa 1 divididos pelo total 1
Em seu trabalho, Herrnstein (1961) utilizou P (para bicadas - pecking)
de reforços obtidos nas duas alternativas¹. em vez de R e E (para comer – eating) em vez de r. No presente traba-
lho, a escolha de nomenclatura diferente do trabalho original deriva do
fato de ter se tornado uma das mais usadas na área.

83
Cristiano Coelho

variações são compatíveis com o princípio sem alterações sistemáticas entre diferen-
de igualação? O aumento linear nas taxas tes condições.
de respostas com o aumento da frequência
absoluta de reforços foi descrito a partir da
relação p = ke, sendo p a frequência de bi- DESDOBRAMENTOS
cadas (respostas), e a frequência de comer
(reforços) e k uma constante, compatível A importância do experimento de
com a noção de fortalecimento da respos- Herrnstein (1961) foi exatamente estabele-
ta proposta por Skinner (1938, p.130, citado cer um procedimento no qual era possível
por Herrnstein, 1961, p. 270) de que há uma se relacionar medidas quantitativas de fre-
constância entre a quantidade de reforços quências absolutas e relativas de respos-
obtidos e respostas emitidas em extinção. tas a dois discos à frequência relativa de
Apesar de Skinner posteriormente aban- reforços. A relação de igualdade entre as
donar a noção de constância entre essas frequências relativas de reforços e as fre-
medidas, a equação continuou como uma quências relativas de respostas expressa
proposta de fortalecimento de respostas na Equação 1 foi então o primeiro grande
baseada em um crescimento linear até atin- passo para a chamada “Lei da Igualação”
gir o máximo de respostas possíveis. Para (Herrnstein, 1970), que expressa, em linhas
Herrnstein (1961), essa relação seria a única gerais, que a distribuição de respostas entre
compatível com a igualação. E por que isso alternativas tende a igualar a distribuição
é tão importante para apreciarmos os resul- de reforços obtidos nas respectivas alter-
tados de Herrnstein? Porque ao ser aplicado nativas. Além disso, dela deriva a ideia de
a esquemas concorrentes, envolve um pres- que quando essa distribuição de reforços é
suposto fundamental: de que há um limite alterada em alguma direção, a distribuição
máximo de emissão de respostas e, assim, o de respostas tenderá a se alterar na mesma
aumento na taxa de uma resposta (confor- medida. Assim, se duas fontes de reforços
me o aumento na taxa de reforço) é neces- fornecem a mesma frequência de reforços,
sariamente acompanhado pela redução nas as respostas tenderão a se distribuir em tor-
demais respostas. Ao revermos a descri- no de 50% para cada alternativa; se uma
ção dos dados de taxas de respostas acima, das fontes passa a fornecer uma frequência
quando os dois esquemas eram iguais (VI quatro vezes maior que a outra, de forma
3 min – VI 3 min) as taxas de respostas se que 80% dos reforços passam a ser obtidos
assemelharam e, para cada um dos demais nessa fonte, a Lei da Igualação prevê que
esquemas com VIs diferentes, os pombos o organismo passará a emitir em torno de
responderam no VI com maior frequência quatro vezes mais respostas nessa alterna-
de reforço e a soma das respostas nos dois tiva, conforme previsto na igualação perfei-
esquemas permaneceram constantes, ou ta (ou estrita) de Herrnstein (Equação 1).

84
Capítulo V | Escolha

Os trabalhos que se iniciaram com mento linear das taxas de respostas deveria
o experimento de Herrnstein (1961) passa- ser obtido com o aumento das taxas abso-
ram a fornecer dados sistemáticos que fo- lutas de reforços também em situações que
ram gradativamente demonstrando que um investigavam respostas em esquemas sim-
comportamento é influenciado não apenas ples. Ao se deparar com dados que contra-
por suas consequências, mas também pelos riaram essa suposição (e.g. Catania & Rey-
reforços disponíveis no ambiente para res- nolds, 1968) e mostravam que o aumento da
postas alternativas e culminaram na con- taxa de respostas com o aumento da taxa
cepção de que escolha é comportamento de reforços caracterizava-se por unidades
e todo comportamento envolve escolha² cada vez menores (quanto mais reforços por
(Herrnstein, 1970). minuto eram providos, menor o aumen-
to na taxa de respostas), Herrnstein (1970)
Dois pressupostos quantitativos bá- ponderou que mesmo em um esquema sim-
sicos propostos por Herrnstein (1970), em ples outras fontes de reforço (mesmo não
decorrência dos dados que passaram a ser controladas pelo experimentador) estariam
sistematizados em Herrnstein (1961), re- em vigor, concorrendo com o esquema pro-
lacionavam as respostas e os reforços dis- gramado pelo experimentador. Em termos
poníveis para diferentes respostas em uma matemáticos, essa relação pode ser aplica-
dada situação (Baum, 2010; Davison, 2012; da a uma única resposta R1 reforçada com
De Villiers & Herrnstein, 1976). Primeira- uma frequência absoluta r1, em que devem
mente, considerando-se o conjunto de res- ser considerados os reforços para outros
postas nesta dada situação, há um máximo comportamentos incompatíveis (ro), rela-
de respostas incompatíveis possíveis de se- ção essa expressa na Equação 2, que ficou
rem emitidas (k) que se mantém constante conhecida como a hipérbole de Herrnstein,
nessa situação. O outro pressupõe que esse por dar conta dos efeitos cada vez menores
total de respostas é alocado entre diferen- do aumento da taxa absoluta de reforços
tes fontes reforçadoras conforme suas res- sobre a taxa absoluta de respostas:
pectivas proporções de reforços. Contudo,
Herrnstein (1961) considerava que o au- (2).

2
A sugestão inicial de Herrnstein levou a questionamentos acerca de
sua amplitude, por ser inicialmente entendida como relacionada a As previsões derivadas desse mode-
comportamentos operantes e respondentes e por se questionar a sua
aplicabilidade em situações nas quais a escolha é “praticamente” nula, lo são que: a taxa de R1 pode variar de zero
como, por exemplo, uma pessoa sendo ameaçada com uma arma para
abrir seu cofre. Com relação ao primeiro, os relatos encontrados res-
até se aproximar do máximo k, conforme a
tringem-se a comportamento operante. Quanto ao segundo, a situação
envolveria uma altíssima magnitude de reforço (negativo, no caso) para
relação entre seus reforços (r1) e os outros
a resposta de ceder à ameaça, em contraposição a uma ínfima mag- reforços (ro) para as respostas concorrentes;
nitude para rebater as ameaças, de forma que a resposta (muito) mais
provável estaria sob controle das magnitudes relativas de ambas as quanto maior a frequência de reforços para
respostas. Dessa forma, a menção a respostas no presente texto será
referente a operantes. R1 em relação aos reforços disponíveis para

85
Cristiano Coelho

outras respostas, maior a frequência de R1; à do-se 50, 100, 140, 170 até atingir o máximo.
medida que o ambiente passa a prover mais
reforços para outras respostas, a frequência Esse efeito das taxas de reforços so-
de R1 diminui; o aumento da frequência ab- bre a taxa de respostas, porém, não apenas
soluta de R1 é cada vez menor à medida que é totalmente compatível com a igualação,
se aumenta a frequência absoluta de refor- mas acaba sendo fundamental para que
ços. ela ocorra, pois acaba mostrando que as
alterações nas condições estão alterando a
Para exemplificar a relação acima, frequência de reforços programados pelo
vamos supor uma situação hipotética na experimentador relativamente aos outros
qual o total de reforços para outros compor- reforços providos pelo ambiente (Ro), que
tamentos é constante ao longo de diferentes permaneceram constantes ao longo das di-
condições. Em uma condição o experimen- ferentes condições no nosso exemplo. Se
tador programa um esquema que fornece hipoteticamente os outros reforços tiverem
10 reforços por hora e, hipoteticamente, o uma taxa de 10 por hora na primeira condi-
organismo emite 50 respostas por minuto. ção, igual ao programado pelo experimen-
Ao alterarmos a condição e aumentar em tador, o organismo alocará metade do tem-
10 os reforços por hora (fornecendo então po respondendo ao esquema programado e
20 reforços por hora), possivelmente as res- metade do tempo realizando as outras ati-
postas aumentarão para 100 por minuto (50 vidades.
respostas a mais). Se aumentarmos mais 10
reforços por hora em uma nova condição Vamos considerar agora duas situa-
(que passa a fornecer 30 reforços por hora), ções com esquemas concorrentes. Em uma
as respostas apresentarão um aumento temos dois esquemas de intervalo variável
menor, digamos 40 respostas por minuto de 30 segundos, e na outra, dois esquemas
a mais, e o organismo passará a emitir 140 de intervalo variável de 1 minuto, cada um
respostas por minuto. Caso uma nova con- associado a um disco de respostas. Nas duas
dição programe mais 10 reforços por hora, situações, a taxa total de reforços é diferente,
o aumento no número de respostas será considerando os dois esquemas: a primeira
de 30, por exemplo, e assim por diante, até com 120 reforços por hora e a segunda com
que atinja o máximo de respostas, e então o 60 reforços por hora. Assim, o total de res-
aumento na taxa absoluta de reforços não postas emitidas nos dois discos na primeira
produzirá aumentos nas taxas de respostas. situação seria maior que na segunda, visto
Como podemos ver, a cada condição o au- que teria uma maior taxa absoluta de refor-
mento na taxa de reforço foi constante (de ços. Porém, como em ambas as situações
10 em 10), mas o aumento na taxa de respos- os esquemas componentes dos respectivos
tas foi cada vez menor (50, 40, 30...), obten- pares concorrentes são iguais, com metade

86
Capítulo V | Escolha

dos reforços a serem obtidos em cada fon- de respostas R1 aumenta, mas a emissão de
te, a igualação prevê que o organismo dis- outras respostas alternativas diminui, de-
tribuiria igualmente suas respostas às duas vido a um máximo de respostas possíveis
fontes, pois o que importa para a igualação de serem emitidas. O artigo de Herrnstein
são os valores relativos dos reforços e não (1961) foi um marco no estudo do comporta-
os absolutos. Mas você pode perguntar: e os mento de escolha ao prover dados sistemá-
outros reforços não alterariam essa relação? ticos e quantificação de duas alternativas
Não! De acordo com a hipérbole de Herr- de respostas, realizando manipulações pa-
nstein, além dos esquemas programados ramétricas da taxa relativa de reforços em
pelo experimentador, o organismo também esquemas concorrentes de intervalo variá-
gastaria tempo emitindo respostas que são vel (CONC VI - VI) e mostrando que as alte-
controladas pelos outros reforços disponí- rações nessa taxa relativa de reforços eram
veis nessa situação. Contudo, como os ou- acompanhadas de alterações similares na
tros reforços estão constantes nessa condi- taxa relativa de resposta, desenvolvendo o
ção, eles interfeririam da mesma maneira princípio de igualação. Em termos quanti-
(ou igualmente) nas respostas aos dois es- tativos, se aplicarmos a Equação 2 a duas
quemas e, assim, seus efeitos se anulariam respostas concorrentes, R1 e R2, obtemos a
matematicamente. Equação 1³ proposta por Herrnstein (1961).

Essas previsões atualmente podem A concepção de Herrnstein (1961) foi


parecer simples, mas precisamos conside- tão importante que, após sua publicação, a
rar que àquela época o diferencial foi mos- Análise do Comportamento passou a de-
trar que a frequência de R1 não dependia senvolver diversos trabalhos quantitativos,
apenas dos reforços produzidos por ela. não apenas para o estudo de escolha, mas
Porém, isso não é tudo. Se R1 depende de na busca de relações quantitativas entre o
sua taxa de reforços e dos reforços para ou- comportamento e suas consequências, ava-
tras respostas alternativas e, consequente- liando também a asserção de Herrnstein
mente, as outras respostas são controladas (1970) de que escolha é comportamento (e
pelos seus próprios reforços e pela taxa de vice-versa). Passamos então a ter uma gama
reforços de R1, há uma interdependência de estudos que tentavam avaliar a genera-
entre a contingência em vigor para R1 e as lidade da Lei da Igualação e extensão para
contingências sob as quais estão as outras outros parâmetros do reforço, como atraso
respostas possíveis de serem emitidas na e magnitude (e.g. Rachlin & Baum, 1969;
mesma situação e incompatíveis com R1.
Dessa forma, ao se aumentar a taxa de re- 3
Há um conjunto de transformações para se chegar a essa formulação,
forços para R1 relativamente aos reforços fora do âmbito do presente trabalho. De forma resumida, tanto k quan-
to ro saem da Equação 1 porque ao interagirem da mesma forma com
de outros comportamentos, não só a taxa R1 e R2, seus efeitos são matematicamente “anulados”.

87
Cristiano Coelho

Logue, 1988; Logue & Chavarro, 1987; Todo- mos ao início deste tópico, para Herrnstein
rov, 1973), arranjos experimentais, como a (1961), a igualação implica que uma variação
função do COD e efeito da frequência abso- na frequência relativa de reforços deve ser
luta de reforços (e.g. Shull & Pliskoff, 1967; acompanhada da mesma variação na fre-
Todorov, Coelho & Beckert, 1993), efeitos da quência relativa de respostas: se em uma
história (e.g. Todorov, Oliveira-Castro, Han- fonte é obtida três vezes mais reforços que
na, Bittencourt de Sá & Barreto, 1983), ape- a alternativa, para igualar o organismo emi-
nas para mencionar alguns poucos exem- tiria três vezes mais respostas, por exemplo.
plos. Pesquisas mostraram também que a Além disso, ao se dobrar a frequência relati-
relação de igualação se aplicava para medi- va de reforços para essa mesma alternativa,
das de alocação de tempo (e.g. Baum, 1975; a frequência relativa de respostas também
Baum & Rachlin, 1969). A aplicabilidade da dobraria. Porém, Baum (1979) realizou uma
proposta de Herrnstein para o estudo e in- revisão de 23 estudos e observou dados nos
tervenção sobre o comportamento humano quais quando a distribuição de reforços era
também foi testada (e.g. Bradshaw & Szaba- alterada em uma certa medida produzia
di, 1978; Logue, 1988; Neef, Mace, Shea & variações menores e, em outras, variações
Shade, 1992; Pierce & Epling, 1983). maiores na distribuição de respostas, as
quais Baum denominou de “subigualação”
Baum (1974, 1979) observou os dados e “sobreigualação”, respectivamente.
de alguns estudos indicavam dois desvios
sistemáticos da igualação encontrados em- Diversos trabalhos (e.g. Baum, 1974,
piricamente. Um desvio foi chamado de 1979; Rachlin & Baum, 1969) estenderam a
viés, uma persistência a apresentar uma proposta de Herrnstein (1961, 1970). Ao bus-
preferência por uma alternativa derivada car sistematizar os dados sobre igualação
de aspectos não relacionados à distribui- envolvendo os diferentes parâmetros do re-
ção de reforços. Essa preferência por uma forço, Baum (1974) desenvolveu a Lei Gene-
alternativa pode ser derivada de diferenças ralizada da Igualação. Porém, derivou uma
na força necessária para acionar o lócus equação baseada na relação entre razões de
de respostas, diferenças qualitativas nas respostas (respostas emitidas em uma alter-
respostas em cada esquema (bicar x acio- nativa dividida pelas respostas emitidas na
nar um pedal), diferenças na iluminação outra alternativa) e razões de reforços (re-
dos discos, dentre outros. O outro desvio, forços obtidos em uma alternativa dividido
chamado de sensibilidade, ocorre quando pelos reforços obtidos na outra alternativa).
a distribuição de respostas não se modifi- O uso de medidas de razão descrevia me-
ca de maneira estrita conforme a alteração lhor as distribuições de reforços e respostas
nas relações entre os reforços obtidos nos por terem uma amplitude maior que pro-
esquemas concorrentes. Conforme pontua- porção ou porcentagem, que tem seu limite

88
Capítulo V | Escolha

de 0 a 1 e 0% a 100%, respectivamente. Essa A discussão levantada por Pierce e


relação é expressa na Equação 3: Epling (1983) mostra alguns dos cuidados
necessários para se falar em igualação e sua
(3), aplicabilidade ao comportamento huma-
no, em concordância com os pressupostos
sendo a e b os parâmetros obtidos empiri- desenvolvidos por Herrnstein (1961, 1964,
camente, relacionados ao viés e sensibilida- 1970) e compatível com a literatura. Dois
de. Quando se encontra uma sensibilidade exemplos da aplicabilidade da igualação
perfeita e ausência de viés, a equação de com humanos em contextos diferentes po-
Baum expressa a igualação estrita de Herr- dem contribuir para que visualizemos a ex-
nstein. A mesma relação pode ser aplicada tensão dos efeitos de Herrnstein (1961).
quando são manipuladas as magnitudes e/
ou atrasos. Quando os três parâmetros são Bradshaw e Szabadi (1976) realiza-
manipulados em um mesmo experimento, ram uma investigação, ao longo de seis me-
é possível se calcular as sensibilidades às ses, com uma pessoa diagnosticada como
variações de cada um deles. maníaca depressiva. No experimento, dife-
rentes operandos estavam associados com
Pierce e Epling (1983) avaliaram a ge- diferentes VIs, que foram utilizados para
neralidade da Lei da Igualação para a des- manipular a taxa de reforço, testando uma
crição do comportamento humano e suge- função derivada da Equação 1 acima. Essa
rem que os resultados com humanos seriam mensuração, realizada em situações com
compatíveis com a igualação. Além disso, diferenças de “humor” (normal, depressivo,
observaram que pesquisas com humanos maníaco), mostrou que a taxa de respos-
que não encontraram dados sistemáticos tas aumentava com aumentos na taxa de
compatíveis com a igualação (e.g. Oscar- reforço na forma prevista pela Equação 1,
-Berman, Heyman, Bonner & Ryder, 1980) atingindo o máximo k. Contudo, conforme
apresentavam especificidades metodoló- o “humor”, o máximo de respostas emitidas
gicas que não permitiriam uma adequada diferiu, com taxas máximas mais altas obti-
análise da igualação. Em primeiro lugar, das em quando o paciente estava maníaco,
esses experimentos com humanos geral- e as mais baixas quando estava depressivo.
mente utilizaram poucas sessões e dados
de comportamento sem o controle já esta- Neef, Mace, Shea e Shade (1992) ava-
belecido pela contingência, ou seja, dados liaram a Lei da Igualação em um contexto
de transição, ao passo que a lei se dirige a educacional com reforçadores de mesma
dados de distribuição de respostas em esta- “qualidade” e “qualidade” diferente. Três
do estável. estudantes especiais tiveram que resol-
ver problemas matemáticos apresentados

89
Cristiano Coelho

concorrentemente e com reforços de acor- Generalizada da Igualação como o nível de


do com esquemas de VI. Na condição com semelhança funcional ou de complementa-
reforços qualitativamente semelhantes, o riedade entre os reforços disponibilizados
tempo alocado a cada esquema variou con- pelas duas fontes. Em alguns casos, essa in-
forme previsto na igualação. Um dado inte- terpretação prevê que a diminuição de uma
ressante foi que os autores não obtiveram frequência de reforços levaria à diminuição
igualação com reforços qualitativamente nas duas respostas concorrentes e permite
diferentes. De fato, a proposta de igualação, descrever adequadamente as alterações na
tal como proposta por Herrnstein, se ade- distribuição de respostas. Mas essa é outra
qua a escolha com mesmos reforçadores. longa história4!

A ideia de igualação repercutiu tam-


bém no desenvolvimento dos trabalhos CONSIDERAÇÕES FINAIS
sobre escolhas entre reforçadores com di-
ferentes atrasos e magnitudes, desenvol- Sem dúvida, a contribuição mais
vidos na área de autocontrole (e.g. Mazur, clara de Herrnstein (1961) foi sua proposta
1987; Rachlin & Green, 1972). A noção bási- de estabelecer relações quantitativas pre-
ca para essa extensão foi a Lei Generalizada cisas entre comportamento e suas conse-
da Igualação, com a demonstração de que quências. Essas relações não só validam,
a distribuição de respostas é alterada con- mas principalmente, acrescentam-se aos
forme os pressupostos básicos da ideia de achados sobre a regularidade dessas re-
Herrnstein (1961) quando são manipulados lações. Ao longo de seus estudos, Herrns-
atraso e magnitude de reforço. Além disso, tein procurou aprofundar essas relações,
análises quantitativas da perda de valor re- focando nos efeitos das consequências e
forçador de consequências atrasadas mos- questionando princípios de racionalidade,
traram-se compatíveis com a equação de sistematizados em uma compilação de tex-
igualação (Ainslie & Haslam, 1992) ao serem tos finalizada após sua morte (Herrnstein,
aplicadas ao estudo do comportamento de Rachlin & Laibson, 1997). Essa compilação
não humanos (e.g. Mazur, 1995) e humanos de textos mostra como as pesquisas realiza-
(e.g. Coelho, Hanna & Todorov, 2003; Ra- das por ele iniciadas a partir de Herrnstein
chlin, Raineri & Cross, 1991). (1961) foram indicando as falhas nas previ-
sões da Psicologia e da Economia baseadas
A Lei da Igualação, tal como propos-
ta por Herrnstein (1961), se adequa a escolha 4
Algumas referências a respeito, além de Rachlin (1989): Rachlin, H.,
com mesmos reforçadores. Propostas pos- Kagel, J. H., & Battalio, R. C. (1980). Substitutability in time allocation.
Psychological Review, 87(4), 355. Rachlin, H., Green, L., Kagel, J. H., &
teriores (e.g. Rachlin, 1989) tentaram inter- Battalio, R. C. (1976). Economic demand theory and psychological stu-
dies of choice. Psychology of Learning and Motivation, 10, 129-154.
pretar o parâmetro de sensibilidade da Lei

90
Capítulo V | Escolha

no pressuposto de que as escolhas visam o mais citados no Journal of Applied Beha-


máximo de resultados. Esses dados mos- vior Analysis (JABA) entre 1983 e 2003
tram a igualação na base da dinâmica das (Elliot e cols., 2005). Ao lado do artigo se-
escolhas. E há muito mais para buscarmos minal de Michael (1982) sobre operações
e satisfazer nossa curiosidade. Os números? estabelecedoras, a Lei da Igualação perma-
Eles não são o comportamento em si, ape- neceu como um dos principais tópicos de
nas uma forma (dentre as diversas) de des- interesse na área aplicada. Conforme El-
crevê-lo e permitir-nos conhecer de uma liot e cols. (p. 560) “Claramente, igualação
maneira mais precisa as regularidades do e operações estabelecedoras são tópicos de
comportamento. contínuo interesse para analistas aplicados
do comportamento e devem ser abrangidos
Considero que para além da quanti- em programas de treinamento. Igualação e
ficação, o pressuposto de que nosso com- operações estabelecedoras tem provado ser
portamento é afetado também pelas con- úteis em conceituar e tratar uma amplitude
tingências concorrentes é uma das grandes de comportamentos-problema”.
contribuições da sistematização dessa área.
Ela permeia direta ou indiretamente inter-
venções que passaram a ser adotadas em PARA SABER MAIS
diferentes contextos, nos quais fomos dei-
xando de punir comportamentos-proble- Baum (2010). Descreve um tutorial baseado
ma e passamos a reforçar comportamentos na igualação como alocação de tempo entre
socialmente desejáveis. Diferentes formas atividades. No texto são discutidos aspec-
de intervenção baseadas em reforço dife- tos referentes à
rencial e até a noção de reforço para com-
portamentos clinicamente relevantes tipo 2 Borges, Todorov, & Simonassi (2006). Des-
(CRB2) na Psicoterapia Analítica Funcional creve experimentos com diferentes mani-
(Kohlenbergh & Tsai, 2001) tem embutidas pulações, mostrando como as condições
noções que se aproximam daquela investi- para a obtenção de igualação com humanos
gada a partir do experimento de Herrnstein dependem da programação experimental.
(1961).
Garcia-Mijares & Silva (1999). Apresenta
Podemos ilustrar sua repercussão de forma didática as noções de igualação.
pelo fato de que Herrnstein (1961), junta-
mente com outro trabalho clássico sobre Madden & Perone (1999). Avaliaram a Lei
escolha (Herrnstein, 1970) foi um dos cin- Generalizada da Igualação e, mais especi-
co trabalhos publicados no Journal of the ficamente, a sensibilidade comportamental.
Experimental Analysis of Behavior (JEAB) Os dados mostraram que a sensibilidade foi

91
Cristiano Coelho

maior quando havia uma resposta de obser- sis of Behavior, 94, 161-174.
vação.
Baum, W. M., & Rachlin, H. (1969). Choice as
Todorov, Coelho, & Beckert (1993). Reali- time allocation. Journal of the Experimental
zaram um conjunto de experimentos com Analysis of Behavior, 12, 861-874.
pombos, nos quais variaram a frequência
relativa e frequência absoluta de reforços. Borges, F. S., Todorov, J. C., & Simonassi, L.
Os dados reforçam que o pressuposto de E. (2006). Comportamento humano em es-
que a igualação depende somente da fre- quemas concorrentes: escolha como uma
quência relativa de reforços e da função do questão de procedimento. Revista Brasilei-
COD na separação das respostas aos esque- ra de Terapia Comportamental e Cogniti-
mas. va,8, 13-24.

Bradshaw, C. M., & Szabadi, E. (1978). Chan-


REFERÊNCIAS ges in operant behavior in a manic-depres-
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94
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

Prestaram atenção
em tudo?

Elenice S. Hanna
Universidade de Brasília

Márcio Borges Moreira


Centro Universitário de Brasília; Instituto Walden4

Reynolds, G. (1961). Attention in the pigeon. Journal of the Experimental Analysis


of Behavior, 4, 203-208.

“Da mesma forma que podemos atentar para um objeto sem olhar para ele, assim
também podemos olhar para um objeto sem prestar-lhe atenção”
Skinner (1953/2003, p. 138)

95
Capítulo VI | Atenção

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- quer evento físico, combinação de eventos


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO ou relação entre eventos. O vocabulário do
DO EXPERIMENTO estímulo classifica os aspectos do ambiente
…” (Catania, 1998/1999, p. 402). Quando fa-

Ao perguntar para várias pesso- lamos de uma propriedade de um estímulo,
as que foram à mesma sala de cinema no falamos de alguma qualidade mensurável
mesmo horário, o que lhes chamou mais de um estímulo, por exemplo, cor, forma,
atenção, respostas variadas apareceriam. cheiro, tamanho, textura, etc. O conceito
Alguns incluiriam no relato determinados de ambiente, por sua vez, pode ser definido
personagens, suas personalidades ou as in- como o “conjunto de circunstâncias físicas
terações entre eles. Outros falariam dos ce- no qual o organismo, ou uma parte referida
nários, cidades ou construções. Poderíamos desse organismo, existe” (Johnston & Pen-
ainda encontrar aqueles que focam seus nypacker, 2009, p. 29).
relatos nas cenas de suspense, na forma
como foram produzidas, na iluminação ou O uso do conceito de atenção em
nos aspectos negativos. Uma pessoa menos muitos casos, entretanto, pode inverter “...
atenta ao filme, como o dono do cinema, a direção da ação ao sugerir que não é o es-
poderia ainda ter se interessado pelo nú- tímulo que controla o comportamento do
mero de pessoas que havia na sala e no que observador, mas é o observador que atenta
elas estavam consumindo. para o estímulo e assim o controla” (Skin-
ner, 1953/2000, p. 135). Nessa perspectiva,
Em situações cotidianas nem sem- a “falta de atenção” não explica o contro-
pre o comportamento de uma pessoa fica, le inadequado de estímulos, é apenas uma
do ponto de vista de um observador exter- forma resumida de se referir à ausência de
no (o diretor do filme, por exemplo) ou do controle por determinados elementos ou
próprio indivíduo, sob controle dos mes- dimensões de estímulos sobre o comporta-
mos estímulos que antecedem ou que estão mento. É importante lembrar que falar de
presentes quando um determinado com- controle do comportamento é falar de vari-
portamento ocorre. Dito de outra forma, di- áveis que tornam um determinado compor-
ferentes indivíduos podem prestar atenção tamento mais ou menos provável (não sig-
a diferentes aspectos, ou diferentes estímu- nifica, necessariamente, falar de “obrigar”
los, de um mesmo ambiente. Diz-se, nessas alguém a fazer algo).
situações, que o organismo prestou ou não
atenção ao evento, que atentou ou não a Conhecer as variáveis que aumen-
uma ou mais propriedades relevantes do es- tam as chances de haver coerência entre
tímulo. É importante ressaltar que, em Aná- o que se quer ensinar dos estímulos ante-
lise do Comportamento, estímulo é “qual- cedentes e o que será aprendido é funda-

96
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

mental para o ensino de diversos processos for amarelo (S–). Responder “vermelho” faz
comportamentais complexos. A aprendiza- parte de duas contingências: uma na qual
gem de conceitos, por exemplo, é base para a resposta produz reforçamento e outra em
o desenvolvimento do pensamento e da que produz extinção, gerando a discrimi-
linguagem humana. Quando aprendemos o nação entre os objetos de cores diferentes
conceito de “vermelho” ou de um “núme- (i.e., vermelho e amarelo). Discriminar esses
ro”, interagimos com eventos que são com- objetos é responder diferencialmente na
postos por outras propriedades. Um objeto presença de cada um, isto é, dizendo “ver-
vermelho ou unitário possui forma, peso, melho” diante do S+ (objeto vermelho), mas
tamanho, apenas para citar algumas das não diante do S– (objeto amarelo).
possíveis propriedades. Mas como ocorre
o processo que permite que determinado A discriminação está presente em
comportamento fique sob controle da cor muitos exemplos do que chamamos de “co-
ou o número, por exemplo, dentre tantos nhecimento” e de “atenção”. Quando se diz
aspectos dos objetos que contêm cor e nu- que alguém reconheceu o brinquedo ver-
merosidade? Perguntando em uma lingua- melho ou prestou atenção no vestido ver-
gem mais coloquial, como prestamos aten- melho, supõe-se que ele(a) diferencie (dis-
ção apenas à cor ou ao número dos objetos? crimine) as cores. No entanto, afirmações
como essas são meras inferências (Sidman,
O experimento que é tema deste ca- 1979), como as evidências apresentadas por
pítulo foi publicado por George Reynolds Reynolds (1961) permitem discutir. Pas-
em 1961 com o título de “Atenção no pom- semos, então, para o estudo clássico que
bo” e inspirou uma série estudos relevan- apresentou estas evidências e em seguida
tes para a compreensão da atenção e do veremos como este tema tem relação com
controle do comportamento por estímu- outros assuntos interessantes.
los compostos. Em estudos sobre controle
do comportamento operante por estímu-
los antecedentes, o ensino é realizado por DESCRIÇÃO DOS EXPERIMEN-
meio de procedimentos chamados de treino TOS
discriminativo. A base de um treino discri-
minativo é o reforçamento diferencial da Os experimentos de Reynolds (1961)
resposta emitida na presença de estímulos foram inspirados, dentre outros experi-
diferentes (Dinsmoor, 1995). Na presença mentos, pela pesquisa realizada por Lashley
de um objeto vermelho (S+), a resposta de (1938), na qual respostas de ratos de saltar
dizer “vermelho” (R) é seguida por alguma em direção a um cartão contendo a figura
reação de aprovação do professor (SR+), de um triângulo f‌oram reforçadas com co-
mas não terá esta consequência se o objeto mida e as respostas de saltar em direção a

97
Capítulo VI | Atenção

um cartão contendo a figura de triângu- Experimento 1 - Objetivo e Método


lo invertido foram punidas pela queda do Com base nos resultados da pesquisa
animal em uma rede de segurança. Após de Lashley (1938), o objetivo do experimen-
realizar esse treino discriminativo, Lashley to de Reynolds (1961) foi avaliar os efeitos
realizou testes nos quais apenas metade das da variação e eliminação de características
figuras eram apresentadas aos ratos. Nes- dos estímulos sobre a aprendizagem de dis-
ses testes, não se observou consistência no criminações de estímulos – dizemos que
comportamento de saltar dos animais, isto uma discriminação de estímulos foi estabe-
é, as “partes” dos triângulos apresentadas lecida quando o indivíduo se comporta de
nos testes como estímulos antecedentes maneira diferente na presença de estímulos
exerceram controles diferentes para dife- antecedentes diferentes.
rentes animais. No entanto, estes responde-
ram de forma coerente com o treino quando No Experimento 1 (Reynolds, 1961),
apenas a metade inferior de cada figura era dois pombos foram colocados em câma-
apresentada. ras experimentais que continham discos
de resposta onde ora era apresentado um
triângulo sobre um fundo vermelho (ΔR) e
ora um círculo sobre um fundo verde (OG),

Figura 1. Diagrama do treino discriminativo e dos estímulos decompostos utilizados no teste em extinção de Reynolds (1961; painel da esquerda) e
resultados do Experimento 1 (painel da direita). O gráfico do painel da direita é uma adaptação da Figura 1 de Reynolds (p. 204).

98
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

de forma imprevisível. Bicadas no disco concentrando no disco cujas bicadas pro-


ΔR eram seguidas por comida (reforço), duziam comida, isto é, os animais passaram
após transcorridos 3 min em média desde a a bicar nos disco quase que exclusivamente
apresentação do último reforço (i.e., um es- na presença do triângulo sobre fundo ver-
quema de reforçamento intervalo variável, melho (Figura 1). Neste caso, dizemos que
VI, 3 min). Respostas de bicar no disco OG o controle discriminativo foi estabelecido:
não eram reforçadas (extinção). Esta etapa respostas de bicar ocorriam na presença do
do procedimento consistiu de um treino triângulo sobre fundo vermelho e ocorriam
discriminativo (Figura 1). Após a etapa de com baixa frequência na presença do círcu-
treino discriminativo, iniciava-se uma se- lo sobre fundo verde.
gunda etapa do experimento, chamada de
teste em extinção. Nesta etapa Reynolds Durante o teste em extinção, na qual
(1961) programou um teste no qual os com- os componentes dos estímulos utilizados
ponentes dos estímulos utilizados durante no treino foram apresentados separada-
o treino discriminativo eram apresentados mente, Reynolds (1961) verificou que, para o
separadamente, ou seja, o disco de resposta pombo 105, a maioria das respostas de bicar
continha ora o triângulo, ora o círculo, ora ocorreu na presença do triângulo, enquan-
era iluminado por vermelho e ora por ver- to para o pombo 107 a maior parte das res-
de. O teste foi realizado em extinção, isto postas ocorreu na presença da cor vermelha
é, bicadas no disco, independentemente de (Figura 1). Mesmo tendo sido submetidos ao
qual estímulo estivesse presente no disco, treino discriminativo com os mesmos es-
não eram seguidas pela apresentação de tímulos compostos, o comportamento de
comida. O teste em extinção foi uma veri- cada um dos animais, durante o teste, foi
ficação do que os pombos haviam aprendi- controlado por uma propriedade especí-
do durante o treino discriminativo. Portan- fica diferente do estímulo (triângulo para
to, procedimentos de treino são tarefas de o pombo 105 e cor vermelha para o pom-
aprendizagem e procedimento de teste em bo 107). Reynolds argumentou apenas que
extinção são procedimentos de avaliação o responder de cada um dos pombos ficou
dessa aprendizagem. sob controle de um dos muitos aspectos de
cada estímulo, não sugerindo possíveis de-
terminantes das diferenças individuais no
Resultados e Discussão controle de estímulos observado no com-
No início do treino discriminativo, portamento dos pombos - até porque seus
ambos os pombos bicavam no disco tanto dados não permitiam explicar o controle de
na presença do ΔR quanto na presença do estímulos desenvolvido pelos animais. Os
OG. No entanto, à medida que o treino dis- analistas do comportamento acham mais
criminativo continuava, as respostas iam se produtivo ficar provisoriamente sem uma

99
Capítulo VI | Atenção

explicação do que inventar um explicação cionada no mesmo local que a amarela, se


que não seja baseada nas interações entre o acendia. Durante o treino discriminativo do
organismo e o ambiente. Por exemplo, Rey- Experimento 2, as respostas de bicar o disco
nolds poderia ter dito: “O pombo 105 bicou foram reforçadas em esquema de intervalo
mais vezes na presença do triângulo duran- fixo (FI) 3 min quando a lâmpada amarela
te os testes porque ele prestou mais aten- estava acesa e o fundo do disco era verme-
ção a este aspecto do estímulo durante o lho (independentemente se continha círcu-
treino”. No entanto, propor uma explicação lo ou triângulo) e quando a luz verde estava
como essa não explica nada, é apenas ou- acesa e o disco continha um triângulo (in-
tra forma de dizer que o pombo bicou mais dependentemente da cor do fundo do dis-
vezes na presença do triângulo. Mesmo se co). Veja que neste treino discriminativo, o
aceitássemos a explicação “bicou mais na comportamento do pombo de bicar no dis-
presença do triângulo porque prestou mais co deveria ficar sob controle de uma rela-
atenção a esse aspecto”, ainda teríamos que ção mais complexa (i.e., composta por mais
explicar por que ele prestou mais atenção a elementos) entre os estímulos presentes do
esse aspeto. Os estudos que foram desen- que aquela programada no Experimento 1:
cadeados após a publicação do artigo de cor da lâmpada lateral, cor do fundo do dis-
Reynolds (1961), entretanto, mostraram que co e forma projetada no disco.
o objetivo do estudo original foi cumprido e
inspirou muitos outros estudos que nos aju- Resultados e Discussão
dam a compreender melhor como diferen- Após cerca de 100 horas de trei-
tes controles de estímulos se estabelecem. no discriminativo, o comportamento dos
pombos ficou sob controle dos estímulos
Experimento 2 - Objetivo e Método programados, isto é, eles bicavam no dis-
Reynolds (1961) realizou um segun- co quando a luz amarela e o fundo do dis-
do experimento, com os mesmos pombos, co vermelho estavam presentes e quando
fazendo combinações de estímulos ainda luz verde e o triângulo estavam presentes;
mais complexas. No Experimento 2, havia quando a luz amarela e círculo sobre fun-
as seguintes combinações de forma e cor do azul estavam presentes, por exemplo, os
nos discos de resposta durante o treino dis- pombos praticamente não bicavam o disco
criminativo: triângulo sobre fundo verme- de resposta. Após o treino discriminativo,
lho, círculo sobre fundo vermelho, triân- Reynolds (1961) realizou vários testes em
gulo sobre fundo azul, círculo sobre fundo extinção alterando a configuração dos estí-
azul. Além disso, em alguns momentos uma mulos como, por exemplo, extinção das res-
lâmpada amarela, posicionada na lateral da postas durante as mesmas configurações de
câmara experimental, se acendia e em ou- estímulos do treino; extinção das respostas
tros momentos uma lâmpada verde, posi- com as duas lâmpadas laterais apagadas; e

100
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

extinção das respostas com as duas lâmpa- demonstraram controle discriminativo por
das laterais acesas simultaneamente. parte da configuração de estímulos e avan-
Os resultados desse segundo expe- çaram o conhecimento sobre o tema.
rimento replicaram os resultados do pri-
meiro: controle por aspectos específicos da O primeiro experimento, conduzido
configuração de estímulos. Nas palavras de por Wilkie e Masson (1976), foi uma repli-
Reynolds (1961, p. 208): cação sistemática do experimento de Rey-
nolds (1961) com controles mais refinados e
No segundo experimento, nenhum também utilizando pombos como sujeitos
dos pombos atentou para a cor da lâmpa- experimentais. A primeira parte do estudo
da lateral. O responder deles foi controlado foi idêntica ao Experimento 1 de Reynolds
apenas pela presença ou ausência da lâm- (i.e., treino com estímulos compostos e tes-
pada lateral amarela, ou, de acordo com te com os elementos dos estímulos com-
análise posterior, pela intensidade da ilu- postos). Na fase de teste, os seis pombos
minação da lâmpada lateral. responderam quase que exclusivamente
na presença da cor previamente correla-
cionada com o reforço (i.e., teriam atenta-
DESDOBRAMENTOS do para cor e não para a forma). Embora as
bicadas dos pombos de Wilkie e Masson
Centenas, talvez milhares, de pes- não tenham ficado sob controle de aspec-
quisas foram e continuam sendo realizadas tos diferentes do estímulo composto, como
com o intuito de sabermos cada vez mais no estudo de Reynolds, a evidência de con-
sobre os fatores que determinam quais os trole por apenas uma das propriedades do
aspectos do ambiente que controlarão o estímulo composto (cor) é um resultado se-
comportamento de diferentes organismos melhante ao (i.e., uma replicação do) estudo
e em quais situações (e.g., Barros, Galvão, original.
Brino, Goulart, & McIlvane, 2005; Carter &
Werner, 1978; de Rose, de Souza & Hanna, A replicação (Wilkie & Mason, 1976)
1996; Debert, Huziwara, Faggiani, de Mathis confirmou que os animais não humanos
& McIlvane, 2009; Dube & McIlvane, 1999; não atentam para todas as propriedades
Johnson & Cumming, 1968; Lovaas, Koegel de um estímulo composto, mas os autores
& Schreibman, 1979). Em outras palavras, ainda foram além para avaliar se o teste em
ainda hoje estudamos o que pode levar al- extinção era um contexto adequado para
gumas pessoas a prestarem atenção a certos identificar o controle de estímulos aprendi-
aspectos de seu ambiente e outras pessoas a do durante os treinos. Wilkie e Masson, em
prestarem atenção a outros aspectos. A se- uma segunda etapa do estudo, realizaram
guir, apresentamos dois experimentos que um novo treino discriminativo para avaliar

101
Capítulo VI | Atenção

se a situação de teste em extinção masca- Nas décadas de 1960 e 1970, muitos


rou o possível controle exercido pela outra estudos sobre controle de estímulos rea-
propriedade do estímulo (forma). Neste se- lizados em laboratório utilizaram pombos
gundo treino, bicadas no disco foram refor- como sujeitos. O sistema visual das aves,
çadas na presença das duas formas (triân- dentre outras vantagens, permite empregar
gulo e círculo), mas sem o fundo colorido diversos estímulos visuais com variação
correspondente aos estímulos compostos de cores, diferentemente dos roedores que
do primeiro treino. Se as formas não tives- são sensíveis aos raios UV e “cegos” para
sem adquirido nenhuma função comporta- grande parte das frequências que seres hu-
mental no primeiro treino, a aprendizagem manos enxergam. Nesses estudos, os estí-
na presença de cada forma deveria ser se- mulos visuais são projetados nos discos de
melhante no segundo treino. No entanto, já resposta ou em outros locais da câmara ex-
na primeira sessão de treino os pesquisa- perimental para estudo do comportamento
dores observaram que a frequência do res- operante de pombos.
ponder na presença da forma previamente
correlacionada com reforço aumentou mais Uma pergunta comumente feita
rapidamente que na presença da forma cor- quando fenômenos importantes são estu-
relacionada com extinção. Embora se pu- dados empiricamente em laboratório com
desse pensar, a partir do primeiro teste, que não humanos é sobre a sua generalida-
os pombos prestaram atenção somente à de para o comportamento humano. Nesse
cor, os resultados do segundo treino discri- sentido, Touchette (1969) realizou um treino
minativo mostraram que as formas também discriminativo com sete garotos de 12 a 17
exerceram algum controle sobre o compor- anos com atraso severo no desenvolvimen-
tamento. to, utilizando linhas com diferentes inclina-
ções (45° e 135°). O treino iniciava com o re-
Este é um dos aspectos mais interes- forçamento de respostas quando uma parte
santes da pesquisa científica e que depende pequena da linha (semelhante à um ponto)
da curiosidade de pesquisadores e pesqui- aparecia na parte debaixo (para cinco parti-
sadoras: seu caráter cumulativo. Reynolds cipantes) ou de cima (para outros dois par-
(1961) demonstrou atenção seletiva à deter- ticipantes) do painel de apresentação dos
minados aspectos dos estímulos. Wilkie e estímulos (Figura 2, Pré-treino). Em segui-
Masson (1976) confirmaram esse resultado da, os participantes aprendiam as discri-
e ainda mostraram que o contexto no qual minações com as linhas inclinadas (Figura
se avalia a atenção às diferentes proprie- 2, Treino), devendo responder na chave da
dades do estímulo pode levar a conclusões esquerda na presença de uma linha com 45°
diferentes sobre a extensão do controle de de inclinação e na chave da direita na pre-
estímulos. sença de uma linha com 135° de inclinação.

102
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

Durante o teste para avaliar o con- tória em Johnson & Cumming, 1968, e Ray,
trole de estímulos, Touchette (1969) consi- 1969). A história experimental construída
derou as linhas como estímulos compos- durante o pré-treino com estímulos em po-
tos e separou cada linha em duas partes, sições diferentes (superior ou inferior), foi
apresentando ora a parte inferior ora a uma variável importante para compreender
parte superior (Figura 2, Teste). Note que o controle de estímulos observado no teste.
esta separação não alterava a inclinação Em geral, o responder foi apropriado (i.e.,
da linha, que era a propriedade que o ex- consistente com o treino) apenas quando
perimentador esperava que controlasse o as partes das linhas apresentadas no teste
comportamento dos participantes. No en- correspondiam à posição dos estímulos do
tanto, o controle parcial foi observado mais Pré-treino. Em outras palavras, o início do
uma vez para a maioria dos participantes, treino que exigiu atenção para a (ou contro-
que responderam consistentemente apenas le pela) parte de cima ou debaixo da chave
para uma das partes (superior ou inferior) determinou para qual parte da linha incli-
da linha com a inclinação correlacionada nada o participante atentou nas etapas sub-
com reforçamento (Figura 2, painel da di- sequentes do procedimento.
reita), replicando os achados de Reynolds
(1961) e Wilkie e Masson (1976). Além de Um tema de pesquisa em Análise
mostrar a generalidade do fenômeno do do Comportamento bastante relacionado
controle parcial com humanos e para estí- com os achados de Reynolds (1961) é a su-
mulos mais simples (como linhas), Touchet- perseletividade (overselectivity). Diz-se que
te mostrou a importância de aprendizagens houve superseletividade de estímulos ou
anteriores para compreender o controle de controle de estímulos restrito quando se ob-
estímulos (veja também esse efeito de his- serva que um dado comportamento fica sob

Figura 2. Estímulos utilizados em cada etapa do estudo de Touchette (1969; painel da esquerda) e porcentagens de acertos obtidas no teste para cada
participante (painel da direita). Figura construída com base na descrição do estudo.

103
Capítulo VI | Atenção

o controle de apenas uma propriedade do gem, do comportamento social e a outras


estímulo quando deveria, do ponto de vista deficiências na aprendizagem de pessoas
do experimentador, ficar sob o controle de no espectro autista.
relações entre diferentes propriedades des-
se estímulo ou de outras propriedades. Por Os estudos de Lovaas e colaborado-
exemplo, se o pai faz a barba e o filho não res (e.g., Lovaas & Schreibman, 1971; Lovaas
o reconhece mais como sendo seu pai, di- et al., 1971; Lovaas et al., 1979) foram con-
zemos que houve superseletividade de estí- siderados bastante relevantes para a época,
mulos (estímulo barba, neste caso). quando havia escassez de conhecimento
sobre a falta de responsividade a elemen-
A superseletividade (Lovaas, Schrei- tos críticos do ambiente em indivíduos com
bman, Koegel, & Rehm, 1971) ou controle res- diagnóstico de autismo e por ter desenca-
trito de estímulos é observada em humanos deado investigações sobre as condições
com desenvolvimento típico (e.g., Verneque que reduzem a superseletividade. Lovaas e
& Hanna, 2012), mas com mais frequência Schreibman (1971), por exemplo, mostraram
em crianças com desenvolvimento atípico que ao reforçar respostas na presença dos
(e.g., Lovaas & Schreibman, 1971; Lovaas et componentes apresentados separadamen-
al., 1971; Lovaas, et al., 1979), especialmente te, crianças com diagnóstico de autismo
em indivíduos com diagnóstico de autis- passaram a responder a todos os elementos
mo. Lovaas e colaboradores (e.g., Lovaas & do estímulo composto. Outros estudos (e.g.,
Schreibman, 1971; Lovaas et al., 1971) ensi- Allen & Fuqua, 1985; Schreibman, Charlop,
naram crianças com desenvolvimento típi- & Koegel, 1982) mostraram que não é neces-
co e com diagnóstico de autismo a discrimi- sário decompor o estímulo e ensinar sepa-
nar estímulos compostos e mostraram que radamente as discriminações de cada ele-
a maioria das crianças com diagnóstico de mento para ampliar o controle de estímulos
autismo respondeu a apenas um dos com- (i.e., para reduzir a superseletividade). Estes
ponentes dos estímulos quando eles foram estudos utilizaram, durante a fase de ensi-
apresentados separadamente no teste (i.e., no, configurações de estímulos compostos
superseletividade). Uma proporção menor S+ e S- que variavam um componente do
de crianças com atraso do desenvolvimento composto por vez (diferença única) e com-
do estudo de Lovaas et al. (1971) apresentou pararam com a condição de ensino que pro-
superseletividade, enquanto as crianças grama estímulos compostos com todos os
com desenvolvimento típico responderam componentes diferentes (diferenças múlti-
a todos os componentes do estímulo com- plas). Veja na Figura 3 exemplos de estímu-
posto. Lovaas et al. (1979) discutem como los criados com diferenças múltiplas (pai-
a superseletividade pode estar relacionada nel direito) e estímulos com diferença única
com falhas no desenvolvimento da lingua- (painel esquerdo). Na configuração com di-

104
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

ferenças múltiplas, estímulos S+ e S- pos- em tarefas com alta complexidade em rela-


suem maior diferença física e o responder ção ao repertório inicial de estudantes (e.g.,
sob controle de um único componente do Anderson & Rincover, 1982). Nesses casos,
estímulo tem a mesma probabilidade de re- procedimentos especiais que combinam o
forçamento seja qual for o elemento. Nesse ensino de discriminações com os elemen-
caso, atentar para qualquer um dos elemen- tos separados e compostos com diferenças
tos do estímulo composto é suficiente para críticas e/ou a programação de aumentos
produzir 100% dos reforços. Em contraste, graduais na semelhança física entre os es-
para a configuração que possui apenas um tímulos (fading, veja o estudo de Terrace,
elemento diferente, responder sob contro- 1963) podem ser utilizados na metodologia
le dos elementos iguais tem baixa probabi- de ensino. Os estudos de Dube e McIlvane
lidade de ser seguido por reforço, uma vez (1999) e de Duarte e Baer (1997) são exem-
que ele também está presente nos estímu- plos destes procedimentos. O primeiro en-
los “incorretos”, isto é, aqueles não correla- sinou discriminações entre palavras e o se-
cionados com reforçamento. Se o elemento gundo entre faces.
diferente é variado ao longo do treino (uti-
lizando-se diferentes S- como os da Figura
3), as discriminações por mais componen- CONSIDERAÇÕES FINAIS
tes se desenvolvem.
Em muitas atividades humanas,
No entanto, configurações com dife- é necessário atentar e discriminar diver-
rença única (crítica) produzem mais erros sos eventos e ignorar outros. Reynolds
durante a etapa de ensino e seu uso pode (1961) iniciou uma série de investigações
não ser uma estratégia eficiente para indi- que mostraram que o atentar e as discri-
víduos com baixa resistência à frustração e minações que aprendemos dependem das
contingências de reforçamento às quais
somos expostos. Quando estas contingên-
cias permitem o responder sob controle de
qualquer componente ou propriedade do
evento antecedente para que o reforçamen-
to ocorra, variabilidade e controle restrito
por um dos elementos comumente resulta.
A ocorrência dessa variabilidade depende,
entretanto, de condições antecedentes his-
tóricas e presentes, além de características
do organismo. O conhecimento das variá-
Figura 3. Exemplo de configuração de estímulos S+ e S- com diferença
única e com diferenças múltiplas. veis independentes que ampliam o controle

105
Capítulo VI | Atenção

de estímulos (atenção) tem possibilitado o PARA SABER MAIS


desenvolvimento de metodologias efetivas
para modificar o padrão de controle de estí- da Hora & Benvenuti (2007). Os pesquisa-
mulo muitas vezes denominado de “patoló- dores avaliaram os efeitos de um procedi-
gico” (Sidman, 1960). mento conhecido como resposta de obser-
vação diferencial sobre o desempenho de
Pesquisas sobre controle de estímu- um menino autista em uma tarefa de mat-
los realizadas com não humanos, como as ching-to-sample (MTS) que utilizou sílabas
de Reynolds (1961), dentre muitas outras, e palavras como estímulos. A resposta de
foram e continuam sendo essenciais para observação diferencial impedia que o res-
que pesquisas sobre controle de estímulos ponder da criança aos estímulos compara-
com humanos fossem e continuem sen- ção fosse baseado em apenas uma das síla-
do realizadas – toda vez que uma criança bas da palavra apresentada como modelo.
apresenta dificuldades para aprender a ler,
por exemplo, temos ali uma possível apli- Gomes & Souza (2008). Nesta pesquisa
cação para o conhecimento sobre controle avaliou-se o desempenho de pessoas diag-
de estímulos. O conhecimento acumulado nosticadas com autismo em tarefas de em-
produzido tanto por pesquisas com não hu- parelhamento com o modelo por identida-
manos quanto por pesquisas com humanos de. Buscou-se, na pesquisa, identificar os
foi essencial para que tecnologias de ensino efeitos da organização dos estímulos sobre
eficazes fossem produzidas e aplicadas nos a aprendizagem dos participantes.
mais diversos contextos. Graças a todo esse
histórico de produção de conhecimento de Hanna, Karino, Araújo, & Souza (2010).
base empírica, analistas do comportamento Será que aprendemos a ler novas palavras
têm a possibilidade, hoje em dia, de auxiliar mais rapidamente treinando a leitura com
professores a elaborar estratégias de ensino palavras semelhantes ou diferentes? Será
que otimizam a aprendizagem de leitura e que aprendemos a ler novas palavras mais
escrita de crianças no ensino regular; que rapidamente treinando com silabas ou le-
possibilitam melhora na qualidade de vida tras? Essa pesquisa tentou responder a es-
de crianças diagnosticadas com algum tipo sas perguntas.
de atraso no desenvolvimento, incluindo
desempenhos acadêmicos; e que auxiliam Alves, de Assis, Kato, & Brino (2011). Nesta
no desenvolvimento de softwares educa- pesquisa investigou-se a aprendizagem de
cionais mais eficazes, apenas para citar al- leitura recombinativa após procedimentos
guns exemplos. de esvanecimento de sílabas das palavras
de ensino em pessoas com atraso no desen-
volvimento cognitivo.

106
Elenice S. Hanna, Márcio Borges Moreira

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107
Capítulo VI | Atenção

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108
Peter Endemann, Candido Pessôa

A resposta de observação: o
papel das respostas sensoriais
para o estabelecimento da
discriminação

Peter Endemann
Universidade de São Paulo

Candido V. B. B. Pessôa
Paradigma Centro de Ciências do Comportamento

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“A seleção natural atuou sobre o sistema sensorial por meio das consequências im-
postas aos comportamentos guiados por esse sistemas”
Nilsson (2009)

109
Capítulo VII | Resposta de Observação

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- um longo debate, conhecido como Contro-


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO vérsia Continuidade vs. não Continuidade.
DO EXPERIMENTO Foi a partir desse debate que Wyckoff (1952,
1969) elaborou seu problema de pesquisa e
A elaboração do conceito de respos- o procedimento experimental para seu es-
ta de observação se deu com o objetivo de tudo.
abordar um conjunto de práticas e pressu-
postos envolvendo a experiência senso- De um modo geral, o papel das res-
rial dos organismos a partir de uma pers- postas sensoriais foi inserido nos estudos
pectiva comportamental. De modo geral, a sobre a discriminação por Karl Lashley
experiência sensorial, compreendida pelo (1929). Essa inserção se deu partir de um
ver, ouvir, sentir cheiros ou gostos ou sen- princípio fundamental da Gestalt, a seleti-
tir a textura de um objeto pelo tato, é tra- vidade. Com base nesse princípio, os orga-
dicionalmente definida por habilidades nismos não percebem ou atentam ao am-
tais como a diferenciação e associação de biente como um todo, mas apenas a partes
objetos. De uma perpectiva comportamen- restritas desse ambiente. Segundo autores
tal, essa experiência foi definida em termos como Lashley (1929, 1938, 1942) e Kreche-
de discriminação e generalização, isto é, vsky (1932, 1937, 1938), o sujeito experi-
pelo controle diferencial de respostas por mental, ao ser exposto a um treino discri-
estímulos do ambiente. Segundo Skinner minativo, poderia atentar seletivamente a
(1938/1991), “pode-se dizer que um organis- estímulos irrelevantes1 para a discriminação
mo ‘percebe que dois estímulos são diferen- e permanecer respondendo sobre controle
tes’ se alguma diferença, qualquer que seja acidental desses estímulos. Nesses casos, o
ela, pode ser identificada no comportamen- sujeito poderia não estar aprendendo nada
to sob controle daqueles estímulos” (p. 169). sobre as contingências de discriminação
Essas respostas diferenciais são produzi- programadas. Em síntese, o sujeito poderia,
das em um treino discriminativo ou treino em função do controle seletivo de estímu-
de reforçamento diferencial. Nesse treino, los irrelevantes, permanecer em situação
respostas são reforçadas na presença de não discriminada mesmo sendo exposto e
um estímulo (S+ ou SD) e não reforçadas na produzindo os reforçadores programados a
presença de outro estímulo (S- ou S-delta). depender de sua correlação com aqueles es-

Nas décadas de 1930 e 1940, o papel 1


O controle da resposta por estímulos irrelevantes e seu efeito no esta-
das respostas sensoriais no estabelecimen- belecimento da discriminação tem sido investigado ao longo das últi-
mas décadas por diversos pesquisadores (e.g. Dinsmoor, 1985; Dopson,
to da discriminação foi empiricamente in- Esber & Pearce, 2010; Endemann, 2013; Hall, 1976; Krechevsky, 1932;
Lawrence, 1949; Mackintosh, 1965; Serna & Carlin, 2001; Spence, 1936;
vestigado. Posições opostas entre os diver- Trobalon, Miguelez, McLaren & Mackintosh, 2003; Wagner, Logan,
Haberlandt & Price, 1968; Wyckoff, 1952; Zeaman & Denegre, 1967).
sos pesquisadores da época deram origem a

110
Peter Endemann, Candido Pessôa

tímulos. Exemplos de estímulos irrelevan- dade da seletividade frente ao treino dis-


tes poderiam ser a temperatura, o tamanho criminativo e ao estabelecimento da dis-
ou a textura da caixa experimental em um criminação, os autores (e.g., Lashley, 1929,
treino discriminativo entre as cores verde e 1938) apontavam para a necessidade de se
vermelho. investigar não apenas o estabelecimento de
respostas diferenciais, mas também de res-
Respostas a estímulos irrelevantes ao postas sensoriais que tinham como função
longo do treino discriminativo foram cha- colocar o organismo em contato com os es-
madas de tentativas de solução e, segundo tímulos S+ e S-, relevantes para a diferen-
Lashley (1929, 1938, 1942), são parte de uma ciação da resposta. Não se questionava uma
gama de atividades e da história do sujeito. definição comportamental de discrimina-
Essas tentativas de solução foram analisa- ção, mas a natureza do processo pelo qual o
das por Krechevsky (1932, 1938) sob o rótulo organismo passava a responder diferencial-
de “hipóteses”. Essas respostas, registradas mente quando exposto ao treino de reforça-
sobretudo no início do treino discriminati- mento diferencial. Para os autores citados
vo, foram discutidas por Lashley e por Kre- anteriormente (e.g., Krechevsky, 1932, 1938;
chevsky com base em outro princípio da Lashley, 1938) , o estabelecimento da dis-
Gestalt, o da “organização sensorial”. criminação seria um processo de natureza
descontínua.
O estabelecimento da discriminação
envolveria, assim, uma série de controles Por outro lado, Kenneth W. Spen-
independentes em função do contato sen- ce (1936, 1940, 1945) e Skinner (1938/1991)
sorial e seletivo com os estímulos presen- assumiam a discriminação como um pro-
tes. Essa série de controles antecederiam o cesso contínuo, envolvendo o acúmulo de
contato e o controle diferencial das respos- pequenas diferenças entre as respostas na
tas pelos estímulos S+ e S-. Lashley exem- presença de S+ e S-, em função do reforça-
plifica esses controles como “respostas à mento diferencial (Skinner não participou
posição, à alternação, a dicas oriundas dos ativamente do debate, o que lhe rendeu
movimentos do pesquisador e que comu- críticas, e.g., Krechevsky, 1938). Contudo,
mente precedem as respostas aos estímulos a concepção de que a discriminação seria
correlacionados” (Lashley, 1929, p. 135). O
2
Em um treino discriminativo, a correlação dos estímulos é correta e
termo “estímulos correlacionados” utilizado comumente tratada da seguinte maneira: S+ correlacionado ao reforço
e S- correlacionado à extinção. A extinção se refere à ausência de re-
por Lashley se refere tanto a S+ como a S-, forço e, desse modo, o S- é correlacionado, negativamente, ao reforço.
pois ambos conservam correlações de +1 e Assim, em um treino discriminativo, podemos nos referir tanto ao S+
como S- como “estímulos correlacionados”. Em termos de probabilida-
-1 com o reforço, respectivamente2. de de a resposta (ou cadeia de respostas) produzir o reforço, temos pro-
babilidade de 100% e 0%, respectivamente, sob o S+ e sob o S-. Estímu-
los que, de fato, não são correlacionados com o reforço são aqueles que
mantem correlação nula (zero) e a probabilidade de a resposta produzir
Em conclusão, supondo uma priori- o reforço em sua presença é 50% (i.e., ao acaso).

111
Capítulo VII | Resposta de Observação

um processo contínuo de acúmulos de pe- e 1940 (e.g. Ehrenfreund, 1948; Krechevsky,


quenas diferenças foi defendida por Spen- 1932, 1937, 1938; Lashley, 1929, 1938, 1942;
ce). Essa concepção ficou, então, conhecida McCulloch & Pratt, 1934; Spence, 1936,
como continuísta. 1940, 1945). Nesses experimentos, a princi-
pal manipulação (variáveis independentes)
Com o objetivo de se investigar os foi o controle e variações em parâmetros
processos básicos envolvidos na discrimi- dos estímulos (e.g., quantidade e posição
nação, tornar o treino mais eficaz e evitar o dos estímulos no ambiente experimental,
controle acidental das respostas por estímu- variação em suas propriedades físicas – bri-
los irrelevantes, tanto Skinner (1938/1991) lho, frequência, textura, etc. – variação em
como Spence (1936) estabeleceram algumas sua correlação com o reforço) e o desem-
soluções procedimentais. Segundo Skinner, penho analisado (variável dependente) foi
os experimentos deveriam ser conduzidos o número de “acertos” e “erros”. O desem-
“em caixas à prova de som, escuras, com pa- penho foi registrado antes que os sujeitos
redes lisas” (p. 55). Segundo Spence (1936), atingissem o critério, ou seja, no período em
uma vez que o interesse é no processo de que os sujeitos se mantinham responden-
diferenciação das respostas aos estímulos do tanto na presença do S+ quanto na do
correlacionados com o reforço, o ambiente S-. Nesse período, as respostas não discri-
experimental bem como a resposta senso- minadas (em relação aos S+ e S-) produzem
rial aos estímulos correlacionados devem as consequências programadas ao acaso,
ser os mais simples possível. ou seja, as respostas produzem reforços em
aproximadamente 50% das vezes. Esse pe-
Segundo Spence (1936), todos es- ríodo foi chamado de período pressolução.
tímulos que incidam sobre o aparato sen-
sorial do organismo quando sua resposta é A manipulação de parâmetros dos
reforçada adquirem ou perdem tendências estímulos e a análise das respostas no pe-
excitatórias. Assim, ao longo do treino dis- ríodo pressolução foram realizadas em con-
criminativo, possíveis controles da resposta junto com uma manipulação bem engenho-
por estímulos irrelevantes vão sendo gradu- sa. Diversos pesquisadores aplicaram uma
almente eliminados e os estímulos correla- reversão na correlação dos estímulos com o
cionados com o reforço (i.e., S+ e S-) passam reforço ainda no período pressolução, isto é,
a controlar diferencialmente a resposta, em o estímulo que era S+ passava a ser S- e vi-
um processo gradual e contínuo. ce-versa. A justificativa dessas reversões no
período pressolução era que caso a discri-
As posições opostas sobre o processo minação se estabelecesse por um processo
de discriminação foram submetidas a uma contínuo, a reversão deveria afetar o núme-
série de experimentos nas décadas de 1930 ro de respostas (acertos e erros) emitidas no

112
Peter Endemann, Candido Pessôa

período pressolução, em comparação a um Apesar de o artigo de Ehrenfreud ter


grupo controle para o qual a reversão não sido publicado em 1948, o efeito da posição
era conduzida. Se a discriminação fosse um do estímulo já vinha sendo debatido desde
processo descontínuo, a reversão dos estí- a década de 1930. Ao longo do debate, Spen-
mulos no período pressolução não afetaria ce (1940, 1945), de forma bastante coerente,
necessariamente o número de respostas, analisou a situação experimental dos estu-
uma vez que essas poderiam ser emitidas dos e inseriu uma questão interessante em
sob controle de outras partes do ambien- seus argumentos. Segundo Spence, a mera
te (estímulos irrelevantes) que não aquelas presença dos estímulos na situação expe-
que foram correlacionadas ao reforço. rimental não garante que esses estímulos
incidam no aparato sensorial do sujeito. Se-
De todas as manipulações dos parâ- gundo Spence, “caso o aparato sensorial do
metros dos estímulos, a posição na qual o animal não seja forçado a receber os estí-
estímulo era apresentado em um treino de mulos correlacionados com o reforço desde
discriminação visual teve um papel pecu- o início do treino, as associações não serão
liar para o problema de pesquisa de Wycko- formadas” (Spence, 1940, p. 276). Nessas si-
ff (1969). Ehrenfreud (1948), com base nos tuações,
dados inconclusivos dos experimentos até
então realizados, decidiu expor dois grupos “o animal é requerido a aprender, em
de sujeitos ao mesmo treino discriminativo adição à resposta diferencial, uma
e reversão dos estímulos no período pres- resposta perceptual apropriada que o
solução. A única diferença entre os grupos conduza para a recepção dos estímu-
foi a posição na qual os estímulos eram los correlacionados ... o animal deve
apresentados no campo de visão dos sujei- aprender a orientar e fixar a cabeça
tos. Os resultados obtidos por Ehrenfreud e os olhos afim de receber os estímu-
refletem os resultados obtidos ao longo de los correlacionados” (Spence, 1940, p.
todo o debate: quando os estímulos eram 276).
apresentados bem a frente do sujeito, em
uma posição a partir da qual o contato era Essas respostas foram chamadas de
favorecido ao longo de todo o treino, os re- respostas de orientação dos órgãos recep-
sultados davam maior suporte àqueles que tores.
defendiam a discriminação como um pro-
cesso contínuo. Quando os estímulos eram Ao inserir a necessidade do aprendi-
apresentados em outra posição do campo zado de uma resposta de orientação dos re-
visual, os resultados davam maior supor- ceptores no debate, Spence (1940, 1945) ad-
te àqueles que defendiam discriminação mite que o animal pode estar respondendo
como um processo não contínuo. a estímulos irrelevantes e não estar apren-

113
Capítulo VII | Resposta de Observação

dendo nada sobre os estímulos correlacio- DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO


nados (i.e., S+ e S-). Mas, nesse caso, segun-
do Spence (1945), não estaria ocorrendo o Objetivo e Método
estabelecimento da discriminação sobre o O objetivo principal do experimento
qual seus interesses estavam centrados. O de Wyckoff (1969) foi analisar o papel das
autor insistiu, portanto, na simplificação do respostas de orientação dos receptores no
ambiente experimental. estabelecimento de uma discriminação. Di-
ferentemente de como essas respostas eram
Após revisar o debate, Wyckoff levan- discutidas, Wyckoff as definiu como res-
ta críticas ao modelo defendido por Spence postas que colocam o organismo em conta-
(1940, 1945). Sem necessariamente tomar to com estímulos correlacionados com o re-
um partido no debate, Wyckoff (1952) apon- forço. Para diferenciá-las das respostas que
ta que a simplificação do ambiente experi- produzem o reforço (e.g., bicar um disco em
mental, de modo a minimizar a necessidade experimentos com pombos, pressionar uma
de aprendizado de respostas de orientação barra em experimentos com ratos, chama-
dos receptores (como definidas por Spence), das de respostas efetivas), Wyckoff as no-
poderia impor limites ao valor preditivo do meou de respostas de observação (RO).
modelo continuísta e de teorias sobre o es-
tabelecimento da discriminação. Segundo Com base na função da RO (i.e., co-
Wyckoff, nem em situações cotidianas nem locar o organismo em contato com os es-
em situações controladas de laboratório tímulos correlacionados ao reforço) e nos
seria possível precisar se os animais serão princípios do condicionamento operante
expostos aos estímulos correlacionados ao descritos por Skinner (1938/1991), Wyckoff
reforço. Em sua tese de doutorado, Wycko- (1969) investigou se a produção de estímu-
ff, manipulou a necessidade de se aprender los discriminativos teria um efeito reforça-
a resposta de orientação dos receptores, dor sobre a RO em um treino discrimina-
além daquelas respostas que produzem (ou tivo. Essa investigação, segundo Wyckoff
não) o reforço, em um treino discriminativo. (1952), forneceria um tratamento comporta-
Wyckoff finalizou o doutorado em 1951, pu- mental ao que vinha sendo nomeado de ex-
blicou um artigo teórico em 1952 e, apenas periência sensorial e resposta de orientação
em 1969, um artigo que descreve seu estudo dos receptores.
experimental. Os objetivos e o método des-
se estudo serão descritos a seguir. Frente à dificuldade de se registrar a
orientação dos órgãos receptores de sujei-
tos experimentais, Wyckoff (1969) foi enge-
nhoso e coerente com a definição funcional
da RO. Em seu experimento, usou pombos

114
Peter Endemann, Candido Pessôa

como sujeitos experimentais. Na caixa ex- minar, não havia contingências para pisar
perimental, um pedal foi posto no piso e no pedal e tampouco uma correlação entre
os estímulos correlacionados com o refor- as luzes verde e vermelha e o acesso ao co-
ço (S+ ou S-) só eram apresentados caso o medouro. Os pombos do Grupo Controle
pombo o pressionasse. Assim, os pombos foram expostos a estas condições durante
só entravam em contato com os estímulos todo o experimento.
ao pressionar o pedal. Os estímulos ficavam
expostos durante todo o tempo em que o Na Fase Experimental (treino discri-
sujeito estivesse pisando o pedal, o que, por minativo), aplicadas apenas aos pombos no
sua vez, definiu a medida a ser registrada Grupo Experimental, houve cinco sessões
e analisada por Wyckoff: a duração da res- de 75 min e uma de 15 min. Durante as ses-
posta de observação. sões desta fase, respostas de bicar o disco fo-
ram mantidas sob um esquema FI 30 s. Esse
No experimento, foram utilizados 20 esquema se alternava com um esquema de
pombos mantidos sob um regime de priva- extinção a cada 30 s. Durante a extinção,
ção de comida. Os pombos foram distribuí- bicadas no disco não produziam acesso ao
dos em dois grupos, (Controle e Experimen- comedouro. Durante a fase experimental, a
tal). Além do pedal, a caixa experimental luz vermelha era correlacionada ao FI 30 s
continha um disco que podia ser iluminado (i.e., aos reforços) a luz verde era correlacio-
de branco, vermelho ou verde e um come- nada à extinção. Entretanto, as luzes ver-
douro retrátil (para apresentação de comi- de ou vermelha eram produzidas somente
da). enquanto o pombo pisasse no pedal, isto é,
quando emitisse a RO. Se o pombo emitisse
Em uma fase preliminar, que durou a RO e o esquema em vigor fosse a extin-
45 min, houve a adaptação dos pombos ção, o disco era iluminado de verde. Quan-
de ambos os grupos às condições experi- do o pombo pisasse no pedal e estivesse em
mentais. Durante os primeiros 15 min des- vigor o esquema FI 30 s, a luz vermelha se
sa fase, o disco foi iluminado de branco e acendia no disco. Caso o sujeito não emitis-
a primeira bicada no disco produzia acesso se a RO, o disco permanecia iluminado de
a um comedouro por 4 s em um esquema branco tanto quando o esquema em vigor
de intervalo fixo (FI) 30 s. Durante os 30 era o FI30 s quanto quando o esquema em
min restantes dessa fase, o disco foi ilumi- vigor era extinção e as respostas de bicar o
nado de verde ou de vermelho em períodos disco produziam o reforço a depender de
sucessivos de 30 s. As respostas de bicar o qual esquema estava em vigor. Em resumo,
disco davam acesso ao comedouro da mes- pisar o pedal, emitindo a RO, transformava
ma forma que nos primeiros 15 min dessa um esquema misto FI 30 s extinção em um
fase (i.e., sob um FI 30 s). Nesta fase preli- esquema múltiplo FI 30 s extinção3.

115
Capítulo VII | Resposta de Observação

Após as seis primeiras sessões da subgrupos. A duração da RO para o Grupo


Fase Experimental, o Grupo Experimen- Controle foi relativamente alta inicialmen-
tal foi subdividido em três subgrupos A, B te, mas rapidamente diminuiu, permane-
e C. O subgrupo A permaneceu no treino cendo baixa até o fim do experimento. Para
discriminativo (reforçamento diferencial) e, o Grupo Experimental, a duração da RO
assim, a RO continuava a produzir as luzes também começou alta para todos os pom-
verde e vermelha e essas, por sua vez, se bos e assim permaneceu para o subgrupo
mantinham relacionadas com a extinção e A, que se manteve no treino discriminativo.
reforço, respectivamente. Para o subgrupo Para o subgrupo B, a duração da RO dimi-
B, a relação dos estímulos com o reforço foi nuiu logo que a correlação dos estímulos
invertida (o estímulo relacionado ao FI 30 foi invertida, mas aumentou assim que a
s passou a ser o verde e o estímulo relacio- discriminação foi novamente estabelecida.
nado à extinção passou a ser o vermelho); e Para o subgrupo C, que retornou às condi-
o subgrupo C retornou à condições seme- ções da fase preliminar após o treino discri-
lhantes aos últimos 30 min da fase preli- minativo (as luzes verde e vermelha podiam
minar (reforçamento não-diferencial), nas ser produzidas, mas não havia correlação
quais as luzes, apesar de produzidas pela diferencial com o reforço), a duração da RO
pressão no pedal, não estavam mais corre- diminuiu em relação à fase em que havia
lacionadas ao reforço (i.e., reforço poderia correlação entre as luzes verde e vermelha
ser produzido com a mesma probabilidade e o reforço.
diante da luz verde e vermelha, se o pedal
estivesse pressionado, e branca, se o pedal Em conclusão, Wyckoff (1969) afir-
não estivesse pressionado). mou que a exposição e o contato dos sujei-
tos com os estímulos discriminativos teve
um efeito reforçador sobre a RO (i.e., pres-
Resultados e Discussão são ao pedal). Assim, Wyckoff confirmou
Como indicado anteriormente, Wy- que a produção de estímulos discriminati-
ckoff (1969) registrou o tempo em que o pe- vos para a resposta de bicar um disco esta-
dal era pressionado, isto é, a duração das beleceu e manteve a RO. Com base em seus
respostas de observação. Com isso, ele ana- resultados, Wyckoff (1952, 1969) afirmou
lisou variações na duração da RO em fun- que (1) a probabilidade da RO aumenta ou
ção da produção ou não dos estímulos cor- permanece alta sob as condições de reforço
relacionados com o reforço nos diferentes diferencial implementadas no treino discri-
minativo; (2) quando a correlação dos estí-
3
Em um esquema múltiplo, dois ou mais esquemas de reforço se alter- mulos é invertida, a probabilidade da RO
nam e cada um é apresentado conjuntamente a um estímulo diferente.
Em um esquema misto, os esquemas de reforço se alternam, mas não diminui temporariamente e depois retorna
há estímulos correlacionados diferencialmente com os esquemas em
vigor (Machado, 1982). a um valor alto; e (3) a probabilidade da RO

116
Peter Endemann, Candido Pessôa

diminui ou permanece baixa em situações sem que os pombos emitissem uma única
de reforço não-diferencial, nas quais os es- vez a RO. Esse aspecto levou a alguns des-
tímulos produzidos pela RO não são corre- dobramentos importantes na investigação
lacionados ao reforço. sobre o estabelecimento da discriminação,
sobre os efeitos comportamentais de refor-
Os resultados obtidos autorizaram ços condicionados e sobre atenção. Esses
Wyckoff (1969) a discutir o papel da RO no desdobramentos são discutidos a seguir.
estabelecimento da discriminação tendo
como base os princípios operantes descri-
tos por Skinner (1938/1991). Segundo Wy- DESDOBRAMENTOS
ckoff (1952, 1969), a RO é uma resposta ope-
rante cuja consequência é a produção dos No procedimento de Wyckoff (1969),
estímulos discriminativos. Definir a respos- chamado de delineamento (ou procedimen-
ta de observação por sua função e não por to) de resposta de observação, o fortaleci-
sua topografia permitiu a Wyckoff delinear mento da RO não ocorreu em função direta
um experimento que facilmente registrou da produção do estímulo reforçador primá-
as respostas de observação. Foi esta genia- rio (i.e., acesso a comida). Como visto, no
lidade que tornou seu estudo um clássico estudo de Wyckoff, o valor de reforçador
na Análise do Comportamento e permitiu condicionado das luzes verde e vermelha
ampliar o uso do conceito de discriminação foi adquirido em função de suas correla-
para situações em que os estímulos discri- ções com os esquemas de reforço (i.e., FI 30
minativos não estão claramente dispostos s) e extinção que, por sua vez, controlaram
sobre o aparato sensorial dos indivíduos. o aumento na duração da RO. Por meio des-
se delineamento, vários autores têm inves-
Um aspecto importante da RO vale tigado essa (correlação) e outras condições
ser ressaltado. A emissão da RO tem como (e.g. temporais) necessárias para o estabele-
única consequência a produção dos estí- cimento do valor reforçador condicionado
mulos discriminativos e, portanto, não al- de determinados estímulos.
tera a obtenção dos reforços programados
para uma determinada resposta. A obten- Como esperado, posições e hipóteses
ção dos reforços pode ocorrer sem a emis- opostas sobre o reforço condicionado foram
são da RO (i.e., na presença da luz branca). propostas. Um amplo debate se mantém até
Em uma discriminação sucessiva (i.e., em os dias atuais. As duas principais hipóteses
que os estímulos correlacionados com re- são conhecidas como a hipótese da redu-
forço e com extinção se alternam), como ção da incerteza e a hipótese da redução
delineada por Wyckoff (1969), todos os re- do atraso. Autores que propõem a hipótese
forços programados podiam ser produzidos da redução da incerteza (e.g. Berlyne, 1957)

117
Capítulo VII | Resposta de Observação

defendem que a condição necessária para o 1985; Dinsmoor, Mueller, Martin, & Bowe,
estabelecimento e controle da RO é a redu- 1982).
ção na incerteza gerada pelas respostas aos
estímulos não-correlacionados (estímulos Com o desenvolvimento de novas
irrelevantes, tais como a luz branca do es- tecnologias, especialmente a de rastrea-
quema misto no estudo de Wyckoff, 1969). mento dos movimentos oculares, o conceito
Os autores que propõem a hipótese da re- de resposta de observação tem sido subme-
dução do atraso (e.g. Fantino, 1977; Fantino tido à novos refinamentos e discussões (e.g.
& Logan, 1979), defendem que a condição Endemann, 2008, 2013; Pessôa, 2010; To-
necessária para o estabelecimento do valor manari, Balsamo, Fowler, Farren, & Dube,
reforçador condicionado de um estímulo é 2007; Tomanari & Pergher, 2003). O registro
a redução temporal relativa sinalizada pelo de parâmetros dos movimentos sacádicos4
estímulo correlacionado com o reforço pri- (pico de velocidade, amplitude, curvatura) e
mário. da fixação (frequência, duração) tem permi-
tido a análise de novas medidas da RO. De
Dinsmoor (1983) discute algumas posse dessas novas medidas, o papel da RO
questões referentes à RO e apresenta, além tem sido analisado em diferentes situações
de novas possibilidades de investigação básicas e aplicadas envolvendo discrimina-
sobre reforçamento condicionado, um refi- ções simples e condicionais, formação de
namento do estudo de Wyckoff (1969) e do classes de estímulos equivalentes (e.g. Dube
conceito de resposta de observação. Como et al., 1999; Serna & Carlin, 2001), treina-
descrito anteriormente, Wyckoff registrou mento de habilidades como leitura e reso-
e analisou a duração da RO em função da lução de problemas (e.g. Endemann, Pessôa,
correlação dos estímulos com o reforço. Perez & Tomanari, 2010).
Dinsmoor, Browne, Lawrence, e Wasser-
man (1971) registraram e analisaram sepa-
radamente a duração da RO nos diferentes CONSIDERAÇÕES FINAIS
componentes (i.e., na presença dos dife-
rentes estímulos) em um treino de reforça- Com o objetivo de trazer a discrimi-
mento diferencial. Os autores notaram que nação para o campo da análise do compor-
a duração da RO é maior na presença do S+ tamento operante, Skinner (1938/1991) de-
do que na presença do S-. Essa assimetria
na duração da RO entre S+ e S- foi definida 4
Movimentos sacádicos são os movimentos oculares rápidos, antece-
pelos autores como observação seletiva e didos e precedidos pela fixação e acomodação dos estímulos no centro
da retina (e.g. Krauzlis, 2008; Madelain, Paeye & Darcheville, 2011; Sal-
gerou novas pesquisas sobre o reforço con- thouse & Ellis, 1980). Segundo Krauzlis (2008), um aspecto importante
dos movimentos sacádicos é que “são seletivamente guiados por ob-
dicionado e sobre o papel da RO no estabe- jetos de interesse do observador, apesar do fato de haver usualmente
no ambiente vários outros objetos distratores” (Krauzlis, 2008, p. 789,
lecimento da discriminação (e.g. Dinsmoor itálico acrescentado).

118
Peter Endemann, Candido Pessôa

fendeu que a discriminação e a experiência lares). Neste estudo, apresentam-se com


sensorial a ela subjacente deveriam ser de- mais detalhes os estudos experimentais e
finidas e analisadas com base em apenas argumentos da Controvérsia continuidade
uma classe de respostas (i.e., aquela que, vs. não-continuidade.
pela produção diferencial do reforço, fica
sob controle de estímulos discriminativos). Pessôa & Sério (2006). Análise teórica so-
Wyckoff (1969) foi original em estabelecer bre as duas contingências envolvidas no
medidas interdependentes entre duas clas- estabelecimento da discriminação. Os au-
ses de resposta (i.e., a que produz direta- tores discutem as duas funções adquiridas
mente o reforço e a que produz os estímulos pelo estímulo correlacionado com o refor-
discriminativos) e em avaliar experimental- ço: Discriminativo, para a resposta efetiva,
mente a resposta de observação bem como e reforçador condicionado, para a resposta
o entrelaçamento desta com a resposta de observação.
que produz o reforço. Esse entrelaçamen-
to é mediado por um estímulo com duas Tomanari (2009). Ampla revisão dos estu-
funções: Função reforçadora condiciona- dos sobre a resposta de observação desde
da para a resposta de observação e função pesquisas precursoras com ratos expostos
discriminativa para a resposta que produz o a labirintos até investigações mais recentes
reforço (e.g., Pessôa & Sério, 2006). sobre o tema. O autor apresenta aspectos
relevantes do delineamento experimental
tais como número de operanda e as dife-
PARA SABER MAIS rentes espécies utilizadas nos estudos.

Dinsmoor (1985). Análise teórica sobre o Pessôa & Tomanari (2015). Diferenciam o
papel da resposta de observação no estabe- procedimento de resposta de observação
lecimento da discriminação, em que o autor elaborado por Wyckoff (1969) da importân-
critica as posições de Skinner e Spence. O cia da resposta de observação por ele de-
autor apresenta uma série de estudos sobre finida funcionalmente, dando destaque às
controle de estímulos, destacando o papel possibilidades de pesquisas aplicadas para
da observação seletiva (desenvolvido desde a facilitação da aquisição de respostas de
o estudo de Dinsmoor et al., 1971). observação.

Endemann (2013). Análise experimental e


teórica sobre o efeito de variações nos es- REFERÊNCIAS
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119
Capítulo VII | Resposta de Observação

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122
Edson Massayuki Huziwara, Candido V. B. B. Pessôa

Controle dos processos


atencionais

Edson Massayuki Huziwara


Universidade Federal de Minas Gerais

Candido V. B. B. Pessôa
Paradigma Centro de Ciências do Comportamento

Holland, J. G. (1958). Human vigilance. Science, 128 (3315), 61-67.

“Life is what happens to you while you’re busy making other plans”
John Lennon

123
Capítulo VIII | Atenção

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- Reinhardt & Reinhardt, 2013).


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO
DO EXPERIMENTO O interesse pelos processos atencio-
nais justifica-se não somente pelos aspec-
Notícias a respeito de pessoas diag- tos patológicos nele envolvidos, mas tam-
nosticadas com o Transtorno do Déficit de bém por sua aparente importância nas mais
Atenção e Hiperatividade (TDAH) torna- variadas situações de nossa vida cotidiana.
ram-se consideravelmente frequentes nos Por exemplo, um jogador que não se manti-
dias atuais. Segundo o Manual Diagnóstico ver atento ao jogo reduz suas possibilidades
e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM- de vitória; um aluno que não se mantiver
-IV-TR™), o TDAH apresenta como carac- atento à aula, reduz suas possibilidades de
terística principal um “padrão persistente aprender a tarefa; ou, ainda, um motoris-
de desatenção e/ou hiperatividade-impul- ta que não se mantiver atento ao trânsito,
sividade, mais frequente e grave do que aumenta suas possibilidades de causar ou
aquele tipicamente observado nos indiví- sofrer um acidente.
duos em equivalente estágio de desenvol-
vimento” (APA, 2002, p. 112). Estima-se que Estudos sobre processos atencionais
3% a 6% das crianças em idade escolar de conduzidos nas décadas de 1940 e 1950
todo o mundo tenham sido diagnosticadas utilizavam situações nas quais indivíduos
com o referido transtorno (Faraone, Serge- eram requisitados a detectar a ocorrência de
ant, Gillberg, & Biederman, 2003; Rohde, determinados eventos críticos, porém pou-
Miguel Filho, Benetti, Gallois, & Kieling, co frequentes, em tarefas longas e propo-
2004), constituindo-se assim em uma das sitalmente monótonas. Mackworth (1948),
principais causas de encaminhamento para por exemplo, realizou um experimento no
os serviços de saúde (Rohde, Barbosa, Tra- qual a tarefa dos participantes era obser-
montina, & Polanczyk, 2000; Rohde et al., var um mostrador de um relógio analógico.
2004). Em grande parte do tempo, o único pontei-
ro apresentado nesse mostrador realizava
Iniciar este capítulo apresentando movimentos em ritmo regular, movendo-se
considerações acerca do TDAH tem por ob- apenas uma vez por segundo. Os eventos
jetivo ilustrar como questões relacionadas críticos que deveriam ser detectados pelos
a processos atencionais estão em evidência participantes consistiam em movimentos
na Psicologia contemporânea. A produção duplos do ponteiro, ou seja, ocasiões em
de conhecimento sobre tais processos con- que o ritmo era alterado e o ponteiro movia-
tinua sendo fundamental para o desenvol- -se duas vezes em um único segundo. Esses
vimento de intervenções eficazes (Ketzer, eventos críticos ocorriam 24 vezes em cada
Gallois, Martinez, Rohde, & Schmitz, 2012; hora de sessão, em intervalos variáveis de

124
Edson Massayuki Huziwara, Candido V. B. B. Pessôa

tempo. O procedimento tinha como objeti- eram detectados quando 10 apresentações


vo simular situações em que, por exemplo, por hora eram realizadas; no entanto, 88%
um marinheiro observa um sonar para de- dos eventos eram detectados quando 40
tectar a presença de submarinos inimigos. apresentações por hora eram realizadas
Holland (1958) destacou a similaridade des- (Deese & Ormond, 1953). De acordo com
ta situação com a de um trabalhador em Deese e Ormond, o desempenho altamente
uma fábrica que inspeciona produtos em acurado no início da tarefa seria um refle-
uma linha de produção para detectar itens xo dos altos níveis de atenção ou vigilân-
com defeito que raramente aparecem. Nes- cia1 apresentados pelos indivíduos. Ainda
sas situações, apesar da baixa probabilida- segundo Deese e Ormond, com o passar do
de de ocorrência de um evento crítico, sua tempo e a consequente fadiga, os níveis de
detecção seria de extrema importância e, atenção ou vigilância diminuiriam e isso
portanto, marinheiros ou trabalhadores de- produziria uma queda na quantidade de de-
veriam manter-se atentos durante todo o tecções. A correlação positiva entre quanti-
tempo de execução da tarefa. dade absoluta de apresentações de eventos
críticos e porcentagem de detecções, por
Muitos estudos utilizando tarefas sua vez, era explicada fazendo referência
experimentais similares àquela propos- à diferentes níveis de expectativa. Dizia-se
ta por Mackworth (1948) foram conduzi- que quanto maior a quantidade de eventos
dos. Em geral, os resultados demonstra- críticos apresentados até um determinado
ram que a acurácia em detectar os eventos momento da sessão, maior também seria a
críticos diminuía ao longo do tempo (e. g., expectativa de que um próximo evento crí-
Adams, 1956; Bakan, 1955; Bartlett, Beinert, tico fosse apresentado dentro de um curto
& Graham, 1955; Deese & Ormond, 1953; espaço de tempo. Portanto, a alta expecta-
Fraser, 1950; Mackworth, 1948; 1950). Mais tiva da próxima apresentação de um evento
especificamente, todos ou quase todos os crítico manteria altos níveis de atenção e
eventos críticos apresentados no início da vigilância durante a tarefa, apesar da fadiga
sessão eram detectados. No entanto, princi- ocasionada pelo decorrer do tempo.
palmente depois dos 30 primeiros minutos,
apenas aproximadamente 30% dos partici- Acerca de tais explicações, baseadas
pantes continuavam a detectar na mesma em constructos teóricos como atenção, vi-
proporção os eventos que ocorriam. Outro gilância ou expectativa, Holland (1958) ar-
resultado comum nessas pesquisas era uma gumentou:
correlação positiva entre a quantidade ab-
soluta de eventos críticos apresentados e a 1
Optou-se por traduzir a palavra inglesa “vigilance” por “vigilância”.
porcentagem total de eventos detectados Outras possibilidades de tradução, talvez mais provocativas, seriam
“concentração” ou “atenção focada”, termos que aparecem como sinô-
– i.e., em média, 46% dos eventos críticos nimos de “vigilance” na edição eletrônica do Oxford Dictionary.

125
Capítulo VIII | Atenção

Esses conceitos dão a aparência de ex- observação como aquelas que produzem
plicar os dados em virtude da sintaxe os estímulos discriminativos para outras
das frases. Diz-se que o participante respostas. Manter-se observando o visor
faz uma detecção porque ele está, na- por longos períodos de tempo ou identifi-
quele momento, vigilante e atento ou car prontamente quais os vários estímu-
esperando um sinal. Mas, os conceitos los presentes durante a execução da tarefa
não são menos misteriosos do que os são exemplos de respostas de observação,
fenômenos que se propõem a explicar. uma vez que um evento detectado seria o
Resta a tarefa de descobrir os eventos estímulo discriminativo para relatar esse
que influenciam a vigilância, a aten- evento e as respostas de observação seriam
ção ou a expectativa. (p. 62). mantidas pela produção destes estímulos
discriminativos. Holland foi a primeira pes-
Ainda de acordo com Holland (1958), soa a manipular experimentalmente a fre-
as diferenças nas quantidades de detecções quência e a distribuição temporal das res-
realizadas no início ou final da sessão, assim postas de observação. O seu experimento,
como a correlação positiva entre quantida- adiante relatado, tornou-se assim um dos
de absoluta e percentual de eventos críticos mais clássicos sobre processos atencionais
detectados, como ocorrido, por exemplo, realizado sob a orientação teórica da Análi-
em Deese e Ormond (1953), são formas de se do Comportamento.
descrever padrões comportamentais dos
participantes e, como tal, não necessita-
riam de constructos mentais como atenção, DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO
vigilância ou expectativa para serem expli-
cados. Objetivo e Método
Holland (1958) teve dois objetivos. O
Diante desse contexto, o desafio es- primeiro foi verificar se a detecção de sinais
tava assim posto: Como estudar o fenôme- seria um reforçador para respostas de ob-
no da detecção de eventos críticos e expli- servação. O segundo foi medir as respostas
car resultados muito regulares sem recorrer de observação em situações similares às
a constructos mentais (e.g., expectativa)? usadas por Mackworth (1948), para pos-
Holland (1958) acreditava que a precisão sibilitar uma reinterpretação dos eventos
em detectar eventos críticos poderia estar ocorridos na situação analisada em termos
relacionada à emissão de um conjunto de comportamentais, sem o uso de construc-
respostas que aumentaria a possibilidade tos como expectativa ou atenção.
de sucesso em tal tarefa, sendo estas de-
nominadas de respostas de observação. No experimento de Holland (1958),
Wyckoff (1952; 1969) definiu respostas de a tarefa experimental consistia em par-

126
Edson Massayuki Huziwara, Candido V. B. B. Pessôa

ticipantes – jovens alistados na marinha


americana – observarem um mostrador
retangular com um ponteiro inicialmente
posicionado na extremidade esquerda. No
início da sessão, o participante era instru-
ído a detectar e relatar o máximo de oca-
Figura 1. Representação do mostrador apresentado aos participantes
siões nas quais o ponteiro se movesse da no experimento de Holland (1958). A parte esquerda da figura mostra
a posição inicial do ponteiro, antes da ocorrência do evento crítico. A
extremidade esquerda para a extremidade parte direita mostra a posição do ponteiro depois de ocorrido o evento
crítico. A seta cinza representa o sentido do movimento executado pelo
direita do mostrador (ver Figura 1). O relato ponteiro.
de movimentos do ponteiro era feito pelo
participante ao apertar um botão de relato, com precisão a ocorrência das respostas de
que também recolocava o ponteiro no lu- observação – i.e., pressões no botão que ilu-
gar original. No fim da sessão era informa- minava o mostrador – ao longo do experi-
do ao participante quantos sinais ele havia mento.
detectado e o tempo médio de detecção. A
novidade no procedimento proposto por A questão acerca dos efeitos refor-
Holland consistiu em inserir um botão que, çadores da detecção de eventos críticos
quando pressionado, acendia uma lâmpada foi solucionada utilizando conhecimen-
localizada atrás do mostrador, iluminando- tos provenientes de uma das áreas mais
-o por 0,07s (resposta de observação). Após exaustivamente estudadas em Análise do
esse curto período, a lâmpada era apaga- Comportamento, a saber, os esquemas de
da e a única forma de iluminar o mostra- reforço. Esquemas são regras que especi-
dor e poder observar o ponteiro novamente ficam sob quais condições determinadas
era uma nova pressão ao botão. As sessões respostas produzem consequências. De
ocorriam em uma sala escura, de maneira crucial importância para o presente con-
que a única forma de detectar as mudanças texto foram experimentos que demons-
no ponteiro era emitir a resposta de pressio- traram que a taxa de respostas e o padrão
nar a lâmpada. Quando um movimento do temporal de respostas é determinado por
ponteiro era detectado, o participante de- esquemas (Catania, 1999; Ferster & Skin-
veria apertar outro botão para informar que ner, 1957). Mais precisamente, os estudos
havia detectado um movimento do pontei- encontraram essa modulação de maneira
ro. Este segundo botão tinha duas consequ- tão regular, independente do organismo ou
ências: (1) acionava um contador de eventos da resposta sob análise, que se torna possí-
e (2) recolocava o ponteiro no lugar original, vel prever o padrão comportamental diante
à esquerda do mostrador, o que possibili- de cada diferente esquema de reforço uti-
tava que um novo movimento do ponteiro lizado (Machado, 1982; Skinner, 1956). Se,
ocorresse. O procedimento permitiu medir sob um determinado esquema de reforço,

127
Capítulo VIII | Atenção

a resposta assume um padrão de emissão FI, o padrão de respostas é caracterizado


típico do esquema, pode-se concluir que a por baixas taxas no início do intervalo e
contingência de reforço pela qual o reforço um aumento na taxa de respostas à medida
é produzido no esquema está controlando que se aproxima o seu final (para uma dis-
aquela resposta. cussão das exceções a este padrão veja, por
exemplo, Okouchi, 2002). No experimento
Com base nesse conhecimento, para de Holland, cinco participantes foram pri-
fazer com que a oportunidade de realizar meiramente expostos a um FI 30s por oito
uma detecção (i.e., pressionar o botão que sessões de 40 min. Ou seja, a primeira res-
relatava um movimento do ponteiro) se tor- posta de observação (i.e., pressionar o botão
nasse contingente à emissão de um deter- para o acendimento da luz) emitida após 30
minado padrão de respostas de observação s produzia não somente o acendimento da
(i.e., pressionar o botão para o acendimen- lâmpada por 0,07s, mas também o movi-
to da lâmpada), Holland (1958) utilizou di- mento do ponteiro no mostrador e a conse-
ferentes esquemas de reforço para a pro- quente oportunidade de detecção do even-
dução de movimentos dos ponteiros pela to crítico. Em seguida, o valor do intervalo
emissão de respostas de observação. Caso foi aumentado para 1, 2, 3, e, finalmente, 4
os padrões de respostas emitidos pelos par- min, com oito sessões sucessivas sob cada
ticipantes no botão que acendia a lâmpada valor do FI.
fossem similares àqueles usualmente des-
critos quando utilizados os diferentes es- Sob o FR, a produção do reforço de-
quemas de reforço, a hipótese das funções pende apenas da emissão de um número
reforçadoras da detecção de eventos críti- fixo de respostas, que é contado a partir de
cos estaria comprovada. um evento ambiental relevante, como a ob-
tenção do reforço ou o início da sessão. As-
Holland (1958) utilizou três diferentes sim sendo, nesse esquema, a obtenção do
esquemas de reforço para avaliar o padrão reforçador não está vinculado à passagem
de emissão das respostas de observação: um do tempo, existe uma relação direta entre
esquema de intervalo fixo (FI), um esquema a taxa de respostas emitida e a taxa de re-
de razão fixa (FR) e um esquema de reforço forços obtida. Talvez por este motivo, o pa-
diferencial de taxas baixas (DRL). Sob o FI, drão de respostas em FR seja caracterizado
uma resposta é reforçada após transcorrido por taxas altas e constantes durante toda a
um período fixo de tempo, contado a partir sessão, sendo muitas vezes possível visua-
de um evento ambiental relevante como a lizar pausas no responder que ocorrem tipi-
obtenção do reforço ou o início da sessão; camente após cada reforço (diferentes das
as respostas que ocorrem antes do final do pausas após o reforço em um FI, a taxa de
período não são reforçadas. Em esquemas respostas na retomada de um FR inicia-se

128
Edson Massayuki Huziwara, Candido V. B. B. Pessôa

já constante, enquanto em FI ela tende a ser rificar como seriam as respostas de obser-
positivamente acelerada). Holland (1958) vação em uma situação similar à usada por
primeiramente expos, por seis sessões de Mackworth (1948), Holland (1958) usou es-
40 min, sete participantes a um FR 36, ou quemas de reforço baseando-se nas apre-
seja, a oportunidade de detecção ocorreu sentações de eventos críticos usados por
somente após a emissão da 36ª respos- Mackworth. Nas situações testadas por
ta de observação. Então, o valor do FR foi Mackworth, os intervalos entre os eventos
aumentado, também em blocos de seis ses- críticos (duplos movimentos no ponteiro do
sões, para 60, 84, 108, 150 e, finalmente, 200 relógio) eram ¾, ¾, 1½, 2, 2, 1, 5, 1, 2, 2, 3 e
respostas por detecção. 10 min em ciclos que ocorriam a cada meia
hora. Na análise do comportamento, um es-
Por fim, sob o DRL, uma resposta é quema de reforço que ocorre em intervalos
reforçada somente quando emitida após variáveis é denominado esquema de inter-
um intervalo de tempo especificado sem ela valo variável (VI). Sob esse esquema uma
ocorrer. Ao considerar que o esquema refor- resposta é reforçada quando emitida após
ça diferencialmente o espaçamento tempo- intervalos que variam ao redor de uma mé-
ral entre as respostas, o padrão de respostas dia de tempo estabelecido. O VI produz ti-
emitidas pelos participantes irá se adequar picamente uma taxa moderada e constante
ao valor temporal estipulado, mais precisa- de respostas nos intervalos entre reforços.
mente, quanto maior for o tempo exigido No caso dos intervalos usados por Ma-
para a não ocorrência de respostas, me- ckworth, em média, a cada 1 minuto haveria
nor será a taxa de respostas. Dessa forma, um evento crítico para ser detectado. Ou-
o padrão tipicamente obtido sob o DRL é o tro aspecto do procedimento do estudo de
de baixas taxas de respostas, com espaça- Mackworth era a de que o evento crítico fi-
mento temporal entre elas e com ocasionais cava disponível para ser detectado por ape-
emissões de “jorros” de várias respostas nas um breve período de tempo. Em análise
com baixíssimo intervalo. Dois participan- do comportamento, quando o reforço está
tes foram expostos a um DRL 30 s, ou seja, disponível para ser consumido por apenas
uma resposta de observação iria provocar um determinado período de tempo, cha-
o movimento do ponteiro e a consequente ma-se esse período de contenção limitada
oportunidade de detecção se, e somente se, (limited hold). Quando se usa a contenção
fosse precedida por um período mínimo de limitada comumente observa-se o aumen-
30s sem que essa mesma resposta de ob- to da taxa de respostas em relação à uma
servação tivesse sido emitida. As sessões condição sem contenção limitada. Holland
tinham duração de 4h. usou uma contenção limitada de 1¼ s. Isto
é, neste caso em que foi usada a contenção
Para atingir o segundo objetivo, ve- limitada após o movimento do ponteiro, se

129
Capítulo VIII | Atenção

o participante não detectasse o movimen- mentais complexos, podem ser explicados


to nesse intervalo de tempo, o ponteiro re- a partir de conceitos propostos pelo condi-
tornaria automaticamente para a direita e cionamento operante, fazendo-se referên-
o participante perderia a oportunidade de cia aos esquemas de reforço que mantêm
relatar o evento. essas respostas. De acordo com o autor, não
haveria a necessidade de recorrer a níveis
mentais de explicação, a constructos teóri-
Resultados e Discussão cos como atenção, vigilância ou expectati-
Os padrões de respostas de observa- va, uma vez que o controle exercido pelos
ção descritos para os participantes em cada diferentes esquemas de reforço pôde ser di-
um dos esquemas de reforço utilizados por retamente demonstrado no nível compor-
Holland (1958) – FI, FR, DRL – foram ex- tamental.
tremamente similares àqueles usualmente
encontrados em experimentos anteriores O segundo objetivo proposto por
em outros tipos de respostas que também Holland (1958), verificar como seriam as
usaram esquemas de reforço (e.g., Ferster respostas de observação em uma situação
& Skinner, 1957). Apenas para ilustrar os similar à usada por Mackworth (1948), tam-
efeitos dos diferentes esquemas de reforço bém trouxe um resultado importante. Assim
sobre a emissão das respostas de observa- como no experimento de Mackwhoth, dois
ção, ao comparar os padrões de respostas tipos diferentes de desempenho foram ob-
de observação nos diferentes esquemas de servados entre os participantes de Holland
reforço, foi possível verificar que, enquanto que foram expostos ao VI com contenção
o participante sob FR, independentemente limitada. Na mesma proporção dos parti-
do valor do esquema, emite 600 respostas cipantes de Mackworth, aproximadamente
em menos de cinco minutos de sessão, o 30% dos participantes de Holland detecta-
participante sob DRL emite aproximada- ram todos os movimentos do ponteiro que
mente 290 respostas em 50 minutos de ses- eram programados durante o experimento.
são. Tais resultados demonstraram que a Para os outros 70%, a quantidade de even-
detecção de eventos críticos, de fato, exerce tos detectados teve um declínio acentuado
um papel reforçador para a emissão das res- ao longo da sessão. O que Holland pôde
postas de observação, como previa o autor. demonstrar com seu experimento é que
esse declínio foi causado pela diminuição
Dessa forma, os resultados obtidos da emissão de respostas de observação.
por Holland (1958) demonstraram que os Essas respostas de observação, como visto
padrões de ocorrências das respostas de na parte anterior do experimento, são con-
observação, consideradas em muitos con- troladas pelo esquema de reforço em vigor.
textos como sendo o reflexo de processos Holland demonstrou que os participantes

130
Edson Massayuki Huziwara, Candido V. B. B. Pessôa

que detectaram todos os reforços ao longo Fraser, 1950; Mackworth, 1948, 1950). Ao
da sessão partiram de uma taxa inicial de analisar o conjunto dos resultados obtidos
emissão das respostas de observação mais por Holland, foi possível comprovar a hi-
alta do que os participantes que diminuí- pótese do autor de que é possível explicar
ram as detecções ao longo da sessão Pro- os padrões de ocorrência de tais respostas
vavelmente, esse “ponto de partida” com a partir dos princípios do condicionamento
que cada participante iniciou a emissão de operante, especialmente do esquema de re-
respostas (alta ou baixa taxa de respostas) forço em vigor.
seja devido à história pregressa de reforço
de respostas de observação de cada um. Os mesmos princípios sobre o condi-
Os participantes que partiram de uma taxa cionamento operante foram utilizados por
mais baixa de emissão de respostas de ob- Holland (1958) para reinterpretar alguns dos
servação detectaram menos movimentos achados mais recorrentemente descritos
no ponteiro. Essa menor detecção é, em em experimentos sobre atenção e vigilân-
outras palavras, uma menor taxa de refor- cia até a data de publicação de seu artigo.
ços. Uma menor taxa de reforços gera uma O primeiro desses achados refere-se à di-
menor taxa de respostas (Ferster & Skinner, minuição na quantidade de detecções fei-
1957). Assim, os participantes que já inicia- tas pelos participantes ao longo da sessão,
ram o experimento com uma baixa taxa que seria explicado pelo declínio dos níveis
inicial de emissão de respostas de observa- de atenção em função da fadiga (Deese &
ção entraram num círculo vicioso de menor Ormond, 1953; Mackworth, 1948, 1950). De
emissão de respostas gerando menor taxa acordo com Holland, a explicação para tal
de reforço e menor taxa de reforço gerando fato estaria relacionada à taxa de reforço.
menor emissão de respostas. Ao longo da sessão, a taxa de emissão de
respostas de observação se adéqua à quan-
Holland (1958), portanto, demons- tidade de reforços apresentados. Assim, se
trou que a detecção de um evento crítico a quantidade de apresentações do estímu-
(i.e., o movimento do ponteiro) pode con- lo reforçador for baixa ou o intervalo entre
trolar a frequência de emissão das respos- reforços for demasiado longo, haverá um
tas de observação (i.e., pressionar o botão declínio na taxa de respostas de observação
para o acendimento da lâmpada). Vale res- (e.g., Kelleher, Riddle, & Cook, 1962). Em
saltar que estudos anteriores explicavam a decorrência da menor taxa de respostas de
ocorrência de tais respostas de observação observação, menor também será a quanti-
como sendo o reflexo de estados mentais dade de eventos críticos detectados.
complexos como atenção, vigilância ou ex-
pectativa (e.g., Adams, 1956; Bakan, 1955;
Bartlett et al., 1955; Deese & Ormond, 1953;

131
Capítulo VIII | Atenção

DESDOBRAMENTOS longos períodos de tempo, respostas nor-


malmente relacionada à vigilância. No en-
Um aspecto a ser destacado acer- tanto, de acordo com Holland (1958), uma
ca do procedimento utilizado por Holland vez demonstrada a função reforçadora da
(1958) refere-se à considerável diferença detecção de eventos críticos, elas poderiam
entre as respostas que normalmente são aumentar a probabilidade de ocorrência de
identificadas como respostas de observação toda e qualquer resposta de observação, in-
e a resposta instrumental utilizada no refe- dependente de qual topografia fosse reque-
rido experimento. Em uma análise extre- rida.
mamente crítica, poder-se-ia argumentar
que o fenômeno comportamental observa- Talvez até de modo contraditório à
do por Holland seria de natureza diferente afirmação sobre as topografias de respos-
daquela observada em experimentos sobre tas, trabalhos posteriores ao de Holland
atenção e vigilância, restabelecendo o papel (1958) estiveram relacionados a criar formas
dos constructos mentais na explicação do de registrar e medir o comportamento de
comportamento. Sobre essa questão, o au- olhar enquanto uma resposta de observa-
tor afirma: ção. Em 1968, juntamente com Stephen R.
Schroeder, Holland publicou um artigo no
Em outros estudos sobre vigilância, qual os autores utilizaram um equipamento
o comportamento de observação foi que permitiu registrar a frequência e a du-
provavelmente a fixação do olhar ou ração dos movimentos dos olhos dos par-
os movimentos com a cabeça, bem ticipantes quando estes observavam partes
como respostas talvez ainda mais su- específicas em uma tela contendo quatro
tis. Seria interessante estender a téc- mostradores, todos idênticos ao utilizado
nica apresentada aqui para algumas no experimento de Holland descrito nesse
destas respostas, mesmo consideran- capítulo. Neste novo experimento, os parti-
do que, para muitas questões, a topo- cipantes também foram instruídos a detec-
grafia da resposta pode não ser tão tar movimentos de ponteiros em qualquer
importante e os métodos ora utiliza- um dos quatro mostradores e a manipula-
dos sejam perfeitamente suficientes. ção experimental feita também utilizou di-
(p. 62). ferentes esquemas de reforço. Por exemplo,
ao utilizar um FR, um movimento de pon-
Portanto, o autor parece concordar teiro ocorria somente após a 36ª ocasião na
que a resposta de pressionar um botão para qual o participante tivesse olhado para um
acender uma lâmpada é consideravelmente dos mostradores, isto é, emitido a respos-
diferente de mover o rosto em direção a um ta de observação. Os resultados obtidos por
mostrador e permanecer observando-o por Schroeder e Holland demonstraram que os

132
Edson Massayuki Huziwara, Candido V. B. B. Pessôa

padrões de movimento dos olhos em dire- pectos da segurança no trabalho (e.g., Aber-
ção aos mostradores foram sensíveis aos nathy & Lattal, 2014; Howell, Johnston, &
diferentes esquemas de reforço utilizados Goldstein, 1966).
(i.e., FR, FI e DRL).

A similaridade dos resultados obtidos CONSIDERAÇÕES FINAIS


por Schroeder e Holland (1968), utilizando o
registro movimentos dos olhos, com aque- Como mencionado no início deste ca-
les descritos em Holland (1958), utilizando o pítulo, o TDAH atualmente se constitui em
registro de pressões a um botão, pareceu in- um sério problema a ser solucionado. Sag-
dicar que a função reforçadora da detecção volden, Aase, Johansen e Russell (2005), por
de eventos críticos realmente independe exemplo, apontavam a escassez de dados
da topografia das respostas e, talvez ainda sobre tratamentos médicos eficazes para
mais importante, que a resposta instrumen- o subtipo déficit de atenção do TDAH. No
tal utilizada em 1958 era, de fato, compa- que concerne às contribuições da Análise
rável com as respostas tipicamente iden- do Comportamento, os padrões comporta-
tificadas com a atenção (i.e., olhar). Desde mentais usualmente característicos de pes-
então, uma vasta quantidade publicações soas com diagnóstico de déficit de atenção
acerca das relações entre as respostas de são, ao menos em parte, explicados a partir
observação e o comportamento de olhar dos gradientes de atraso de reforço (Cata-
tem sido produzida (e.g., Doran & Holland, nia, 2005). Baseado em extensa literatura,
1971; Dube, Balsamo et al., 2006; Dube, Di- Catania explica que uma das causas do que
ckson et al., 2010; Huziwara, de Souza, & chamamos déficit de atenção pode estar re-
Tomanari, 2016; Huziwara, Silva, Perez, & lacionada à dificuldade de controle por re-
Tomanari, 2015; Perez, Endemann, Pessôa, forços condicionados. Nos termos do expe-
& Tomanari, 2014; Pessoa, Huziwara, Perez, rimento de Holland (1958), caso a distância
Endemann, & Tomanari, 2009; Schroeder, temporal entre a identificação de um even-
1969a, 1969b, 1970, 1997; Serna & Carlin, to crítico e o reforço obtido por essa identi-
2001). ficação for demasiado longa, o movimento
do ponteiro pode não adquirir uma função
Em relação à importância do estudo reforçadora para manter a resposta de pres-
de Holland (1958) para a manutenção da tar atenção ao (iluminar o) mostrador. Um
atenção em tarefas de vigilância, Holland valor da distância temporal eficiente varia
(1958) é citado em diversos experimentos da entre indivíduos e, assim, no caso do expe-
área, como na manutenção da atenção du- rimento de Holland, pessoas que necessi-
rante a navegação de barcos (Thomas, 1980) tassem intervalos temporais muito peque-
e aviões (Lewis, 1973) e, em geral, para as- nos entre os reforços poderiam deixar de

133
Capítulo VIII | Atenção

emitir as respostas de observação ao longo ples. Os principais resultados referem-se a


do experimento. Nos limites da revisão de uma aparente diminuição no tempo empre-
literatura realizada para o presente capítu- gado para observar os estímulos ao longo
lo, não encontramos estudos que se apoiem das sucessivas tentativas de treino.
diretamente no achado de Holland de que
esquemas de reforços influenciariam dire- Dube, Balsamo, Fowler, Dickson, Lom-
tamente a quantidade de atenção em uma bard, & Tomanari (2006). Avaliação do
tarefa (para exceção, veja Goldberg & Kons- comportamento de olhar em tarefas de
tantareas, 1979). Assim, parece permanecer discriminação condicional utilizando pro-
essa lacuna a ser perseguida sobre a relação cedimento de emparelhamento de acordo
entre os padrões comportamentais gerados com o modelo. Resultados sugerem que os
e mantidos por diferentes esquemas de re- participantes com maiores porcentagens de
forço e os padrões comportamentais carac- acertos em tarefas que envolvem o aprendi-
terísticos do déficit de atenção. zado de discriminações condicionais tam-
bém apresentam maior quantidade de tem-
Ao considerar todos os aspectos pre- po empregado na observação dos estímulos
sentes no experimento de Holland (1958), apresentados.
torna-se possível verificar que a engenho-
sidade do autor, ao propor uma nova forma Artigos de Revisão. Para uma revisão sobre
de análise, permitiu a formulação de expli- o controle operante dos movimentos dos
cações mais parcimoniosas sobre proces- olhos veja Pessôa (2010). Para uma revisão
sos comportamentais. Essa busca por ex- sobre o papel das respostas de observa-
plicações parcimoniosas, como alternativa ção como fenômenos atencionais consulte
para explicações por vezes tão misteriosas Rico, Goulart, Hamasaki e Tomanari (2012)
quanto o próprio fenômeno a ser explicado, ou Benvenuti, Barros e Tomanari (2014).
é marca dos trabalhos desenvolvidos pelo
autor e, certamente, um exemplo a ser se-
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138
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

O responder controlado
temporalmente:
desdobramentos da pesquisa
com a tarefa de bissecção

Marilia Pinheiro de Carvalho


Marco Vasconcelos
Armando Machado
Universidade do Minho, Portugal

Church, R. M., & Deluty, M. (1977). Bisection of temporal intervals. Journal of Experimental Psy-
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“O que é, pois, o tempo? Se ninguém mo pergunta, sei o que é; mas se quero explicá-
-lo a quem mo pergunta, não sei.”
(Santo Agostinho, Confissões)

139
Capítulo IX | Bissecção Temporal

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- 2 s a 20 s2. A tarefa consistia em uma dis-


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO criminação condicional na qual o estímulo
DO EXPERIMENTO modelo era uma luz que ficava acesa duran-
te um intervalo de tempo variável, e os es-
Em fins da década de 1970, já era sa- tímulos comparação eram um disco verde
bido que as respostas de animais não-hu- e um disco vermelho apresentados simul-
manos podem ser controladas por inter- taneamente após o estímulo modelo. Para
valos de tempo. Por exemplo, as pesquisas receber comida, os pombos deviam bicar o
seminais de Pavlov (1927) sobre condicio- disco verde se o modelo durasse de 2 a 10 s,
namento respondente demonstraram que, e o disco vermelho se o modelo durasse de
quando comida era entregue sucessiva- 12 a 20 s. Como os estímulos de 2 a 10 s são
mente em intervalos fixos de tempo, a sali- os mais curtos das durações treinadas, e os
vação de cães sistematicamente antecipava estímulos de 12 a 20 s são os mais longos,
os momentos de entrega. Dá-se a esse efeito podemos dizer que respostas no disco verde
o nome de condicionamento temporal (Ca- são respostas ‘curto’ e que respostas no dis-
tania, 1999). A Figura 1 abaixo ilustra um co vermelho são respostas ‘longo’.
procedimento de condicionamento tempo-
ral e resultados hipóteticos. Stubbs (1968) mediu a proporção
de vezes em que os sujeitos responderam
‘longo’ (i.e., bicaram o disco vermelho) em
função de cada uma durações apresenta-
das. Dá-se o nome de função psicométrica
Figura 1. Diagrama hipotético de um procedimento de condicionamen-
to respondente temporal. Comida (*) é apresentada sucessivamente em à função que relaciona a proporção de uma
intervalos fixos de tempo (T). Tipicamente, salivação condicionada
ocorre instantes antes de a comida ser apresentada.
das respostas (e.g., “longo”) à duração dos
estímulos (Church, 2002; Richelle & Lejeu-
Em um outro estudo clássico, desta ne, 1980). Se a discriminação fosse perfei-
vez com um procedimento de condiciona- ta, a função psicométrica deveria assumir
mento operante, Stubbs (1968, Experimen- a forma de um degrau (ver painel de cima
to 2) demonstrou que pombos eram capazes da Figura 2): Nenhuma resposta ‘longo’ se-
de discriminar estímulos com duração de ria emitida após os estímulos de 2 a 10 s
[P(‘longo’) = 0], e apenas respostas ‘longo’
1
MPC e MV contaram com a bolsa de investigação UMINHO/ seriam emitidas após os estímulos de 12 a
BI/249/2015 e com a bolsa de investigador IF/01624/2013, respectiva-
mente, ambas da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), Portugal.
20 s [P(‘longo’) = 1].
AM beneficiou da bolsa de licença sabática SFRH/BSAB/113653/2015
da FCT e de uma bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Esta-
do de São Paulo (FAPESP: 2015/06491-1) para Professor Convidado na
Universidade Federal de São Carlos, Brasil. Este capítulo foi parcial-
mente financiado pela FCT e pelo Ministério da Educação e Ciência 2
Stubbs (1968) conduziu três experimentos com intervalos temporais
através de fundos nacionais, e cofinanciado pelo FEDER sob o acordo variando entre 1 e 40 s. Para fins didáticos, ilustramos apenas o caso do
de parceria PT2020 (UID/PSI/01662/2013). Experimento 2, com intervalos entre 2 e 20 s.

140
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

A Figura 2 abaixo (painel de baixo) Curiosamente, a proporção de res-


esquematiza a tendência geral dos dados postas ‘longo’ para as durações de 10 e 12 s
individuais obtidos por Stubbs (1968). A esteve próxima de 0.5, ou seja, em cerca de
proporção de respostas ‘longo’ aumentou de metade das vezes os sujeitos respondiam
2 a 20 s, confirmando que os pombos eram ‘curto’ e na outra metade das vezes respon-
capazes de discriminar os estímulos mais diam ‘longo’ para cada uma destas dura-
curtos dos estímulos mais longos. Contudo, ções – a despeito de terem sido treinados
o aumento na proporção de respostas foi a responder ‘curto’ para 10 s e ‘longo’ para
gradual, ao invés de ser abrupto e em for- 12 s. Com base nestes resultados, Stubbs
ma de degrau: A função psicométrica tinha (1968) sugeriu que os sujeitos estabelece-
uma forma ogival, com mínimo e máximo ram um critério de decisão para responder:
nas durações extremas de 2 e 20 s, respec- Respondiam ‘curto’ para durações menores
tivamente. do que o critério e respondiam ‘longo’ para
durações maiores do que o critério. Ainda
de acordo com o autor, o critério estaria
ente 10 e 12 s e quanto mais próxima uma
duração estivesse dele, maior a incerteza
em classificá-la como ‘curta’ ou ‘longa’ – a
incerteza traduz-se em proporções de res-
postas ‘longo’ próximas de 0.5, como Stubbs
observou nos pombos.

O critério que divide as durações


mais curtas das mais longas também pode
ser tomado como a duração que, do ponto
de vista do sujeito, está equidistante das
durações treinadas. A esta duração, perce-
bida como “o meio do caminho”, por assim
dizer, dá-se o nome de ponto de igualdade
subjetiva (PIS). A pergunta que naturalmen-
te se coloca é qual duração corresponde ao
PIS. A pergunta é relevante porque o valor
do PIS dá pistas sobre a métrica usada pelos
animais para “medir” as durações dos estí-
mulos. Falar da métrica é falar da relação
Figura 2. Painel de cima: Função psicométrica hipotética em forma de
degrau. Painel de baixo: Esquematização do padrão geral das funções entre o tempo objetivo (medido pelo reló-
psicométricas obtidas em uma discriminação entre 2 e 20 s por Stubbs
(1968, Experimento 2). gio) e o tempo subjetivo (inferido a partir do

141
Capítulo IX | Bissecção Temporal

comportamento). Será a métrica do tempo Em uma transformação logarítmica,


subjetivo linear, logarítmica, recíproca, ou y = ln(x) (painel central na Figura 3; logarít-
de outro tipo? A Figura 3 abaixo ilustra as mo na base e), 1 s (x1) é representado como
três primeiras métricas. zero (y1) e 4 s (x2) como 1.39 (y2). A deriva-
ção (painel central) mostra que se o sujeito
Tome o caso de uma discriminação usa uma métrica logarítmica, o PIS é a mé-
entre 1 s e 4 s. Em uma transformação line- dia geométrica (MG) de 1 e 4 s.
ar, y = ax + b (painel da esquerda na Figura
3; no nosso exemplo, assumimos que a = 1 e Por fim, em uma transformação recí-
b = 1), 1 s (x1) é representado subjetivamente proca, y = 1/x (painel da direita na Figura 3),
como 2 (y1) e 4 s (x2) é representado como 1 s (x1) é representado como 1 (y1) e 4 s (x2)
5 (y2). O PIS é a duração x equivalente ao é representado como 0.25 (y2). A derivação
valor médio de 2 e 5 da representação sub- (painel da direita) mostra que, se o sujeito
jetiva (ver a seta que projeta no eixo do x o usa uma métrica recíproca, o PIS é a média
valor médio da representação subjetiva). A harmônica (MH) de 1 e 4 s.
derivação na Figura 3 (painel da esquerda)
mostra que, se o sujeito usa uma métrica li- Generalizando, se ao estimar a du-
near, o PIS é a média aritmética (MA) de 1 ração de n estímulos, t1, t2, ..., tn, os su-
e 4 s. jeitos usam uma métrica linear, o PIS é

Figura 3. Painel da esquerda: Transformação linear da duração x. Painel central: Transformação logarítmica da duração x. Painel da direita: Transfor-
mação recíproca da duração x.

142
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

igual à média aritmética dos estímulos DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO


 t1 + t2 +  + tn 
 MA =  ; se usam uma métrica Objetivo e método
 n 
A tarefa de bissecção temporal é uma
logarítmica, o PIS é igual à média geomé- tarefa de discriminação condicional. Para
trica dos estímulos ( MG
= n t1 × t2 ×× tn ) ; ilustrar, considere uma tentativa de treino
e se usam uma métrica recíproca, o PIS é típica no estudo de Church e Deluty (1977)
igual à média harmônica dos estímulos com ratos. Durante o intervalo entre tenta-
  tivas (ITI, do inglês inter-trial interval), uma
n
 MH = 1 1  luz de iluminação geral ficava acesa por 30
 t1 + t2 +  + tn
1 
 
segundos. Terminado o ITI, a luz geral apa-
Church e Deluty (1977) determina- gava-se por 2 ou 8 s – o período na escuri-
ram empiricamente o PIS em um dos es- dão sinalizava o intervalo de tempo a esti-
tudos mais influentes na área do controle mar e era o estímulo modelo da tentativa.
temporal do responder (timing). Eles usa- Ao fim do intervalo, duas barras de resposta
ram uma tarefa psicofísica clássica, a tare- eram introduzidas na caixa, uma na esquer-
fa de bissecção, para medir o valor do PIS da e outra na direita do painel de respostas.
em diversas discriminações temporais. Os Os ratos deviam pressionar uma das duas
resultados revelaram algumas das proprie- barras condicionalmente à duração do in-
dades centrais do responder controlado tervalo. Respostas corretas (e.g., pressionar
temporalmente em animais não-humanos a barra da esquerda após 2 s e a barra da di-
e essas propriedades definiram aquilo que reita após 8 s) eram reforçadas com acesso
qualquer modelo teórico de timing deve ex- a comida e respostas incorretas não produ-
plicar. Para além disso, o estudo de Chur- ziam consequências (extinção). Para facili-
ch e Deluty identificou pela primeira vez tar a descrição, a partir de agora vamos sim-
questões importantes sobre a natureza do plesmente dizer que os ratos aprenderam a
controle por estímulos temporais e sobre responder ‘curto’ após a duração mais curta,
a natureza do que é aprendido em tarefas e ‘longo’ após a duração mais longa – inde-
temporais, sugeriu procedimentos para pendentemente de formalmente as respos-
analisá-las empiricamente, e avançou com tas serem pressionar a barra da esquerda ou
respostas provisórias a essas questões. To- da direita.
das elas permanecem em aberto.
Quatro grupos de ratos (N = 8) foram
treinados em diversas discriminações ao
longo de seis fases experimentais. Para os
nossos propósitos, é suficiente considerar
apenas as quatro primeiras fases. Na Fase

143
Capítulo IX | Bissecção Temporal

I, todos os grupos aprenderam a discrimi- rações de treino (e.g., no caso da discrimi-


nação entre 2 e 8 s. Na Fase II, os grupos A nação entre 2 e 8 s, MH = 3.2 s, MG = 4 s e
e B aprenderam a discriminação entre 1 e 4 MA= 5 s). Também nas tentativas de teste,
s, e os grupos C e D a discriminação entre 4 os sujeitos deviam responder ‘curto’ ou ‘lon-
e 16 segundos. Na Fase III, os grupos A e B go’ condicionalmente à duração apresenta-
aprenderam a discriminação entre 4 e 16 s, da na tentativa, mas nenhuma resposta era
e os grupos C e D a discriminação entre 1 e reforçada. Concluído o treino discriminati-
4 s. Na Fase IV, todos grupos aprenderam a vo e o teste de generalização de uma fase
discriminação entre 3 e 12 s. A Tabela 1 resu- experimental, iniciava-se a fase seguinte.
me as discriminações aprendidas por cada

Tabela 1. Discriminações temporais aprendidas por cada grupo de ratos nas quatro primeiras fases do estudo de Church e Deluty (1977). Em cada célula,
a posição da duração de treino representa a resposta correta. Por exemplo, ‘1 s – 4 s’ significa que, para receber comida, os sujeitos deviam responder
‘esquerda’ após 1 s, e ‘direita’ após 4 s. Adaptado de Church e Deluty (1977).

grupo em cada fase. Doravante, chamare-


mos as durações treinadas em cada discri- Com os dados do teste de generali-
minação de ‘durações de treino’. zação, Church e Deluty (1977) obtiveram a
função psicométrica e o PIS de cada discri-
Cada fase começava com o treino minação treinada. Como o PIS é a duração
discriminativo e terminava com um teste que separa os modelos ‘curtos’ dos modelos
de generalização. O treino discriminativo ‘longos’, ele também pode ser visto como a
incluía apenas tentativas com as durações duração em que o sujeito divide ao meio,
de treino, como as descritas acima. O tes- ou bissecta, o intervalo ente as durações de
te de generalização incluía, para além das treino (e.g., o intervalo entre 2 e 8 s). Daí o
tentativas de treino, tentativas de teste em nome do procedimento, bissecção tempo-
que eram apresentadas cinco durações in- ral.
termediárias3 às durações de treino – três
destas durações correspondiam às médias
harmônica, geométrica e aritmética das du- Resultados e discussão
A Figura 4 (painel da esquerda) apre-
3
As durações de teste estavam aproximadamente em progressão geo- senta as funções psicométricas médias
métrica, ou seja, cada duração depois da primeira era obtida multipli-
cando a anterior por uma constante. (n=8) obtidas por Church e Deluty (1977) em

144
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

cada uma das quatro discriminações. Todas os parâmetros da reta (inclinação e interse-
as funções psicométricas tinham valores ção-y), calculou-se o PIS. O painel central
mínimo e máximo próximos das duraçõs na Figura 4 apresenta os PISs obtidos em
de treino de cada discriminação e formato função da média geométrica das durações
ogival, evidenciando que os pombos eram treinadas em cada discriminação – para a
capazes de discriminar as diferentes dura- discriminação entre 1 e 4 s, MG = 2 s; para 2
ções. e 8 s, MG = 4 s; para 3 e 12 s, MG = 6 s; para
4 e 16 s, MG = 8 s. A figura também mostra
O painel central da Figura 4 apresen- quais seriam os PISs esperados no caso de
ta as mesmas funções psicométricas, mas, eles estarem nas médias4 harmônica e arit-
agora, o eixo do x está com as durações mética das durações de treino (ver as linhas
em unidades logarítmicas. No eixo do x, os tracejadas na figura). Os resultados mos-
valores 1 e 7 correspondem às durações de traram que os PISs praticamente se sobre-
treino curta e longa, respectivamente. Os puseram às médias geométricas, revelando
valores 3, 4 e 5 correspondem às médias que, do ponto de vista dos ratos, a duração
harmônica, geométrica e aritmética das du- que bissecta o intervalo entre as durações
rações de treino de cada discriminação, res- de treino é a média geométrica das mesmas.
pectivamente.
Também à partir das retas ajustadas
A partir das funções psicométricas, às funções psicométricas, os autores calcu-
os autores calcularam o PIS de cada dis- laram o limiar diferencial de cada discrimi-
criminação ajustando uma reta aos pontos nação. O limiar diferencial, também deno-
correspondentes às três durações centrais minado de diferença mínima perceptível
[pontos com coordenadas (3, y), (4, y) e (5, (just noticeable difference ou JND), indica
y)]. Eles escolheram estes pontos porque quanto um estímulo de comparação deve
se concentravam próximos ao ponto com diferir de um estímulo padrão em uma dada
coordenadas (x, 0.50), o PIS. Conhecidos dimensão física para ser percebido como

Figura 4. Painel da esquerda: Funções psicométricas médias obtidas por Church e Deluty (1977). Painel central: Funções psicométricas obtidas por
Church e Deluty (1977) graficadas em uma escala comum em unidades logarítmicas. Painel da direita: PISs médios em função da média geométrica das
durações treinadas em cada discriminação. A linha contínua (MG) indica a média geométrica das durações treinadas. As linhas tracejadas (MH e MA)
indicam as médias harmônica e aritmética, respectivamente.

145
Capítulo IX | Bissecção Temporal

diferente. Se o JND é pequeno, uma peque- o PIS estava muito próximo da média geo-
na diferença entre os estímulos é suficiente métrica das durações de treino, os autores
para discriminá-los, se é grande, os estímu- assumiram que t = MG em cada discrimi-
los devem diferir bastante para serem dis- nação.
criminados. Para obter o JND de cada rato,
os autores identificaram em cada reta as As Frações de Weber obtidas eram
durações correspondentes aos pontos com relativamente constantes (M = 0.23) e não
coordenadas (x1, 0.75) e (x2, 0.25) e depois diferiram estaticamente entre si. Estes re-
calcularam JND = (x1-x2)/2. sultados revelaram que, para qualquer or-
dem de grandeza dos estímulos temporais,
Esperamos naturalmente que o JND um estímulo deve diferir em cerca de 23%5
seja maior nas discriminações com as du- do estímulo padrão para ser discriminável.
rações mais longas. Por exemplo, esperarí- Em outras palavras, a discriminabilidade
amos que ele fosse maior na discriminação entre duas durações depende de sua dife-
entre 4 e 16 s do que na discriminação entre rença relativa e não da sua diferença ab-
1 e 4 s. É fácil percebermos que, por ser uma soluta. Church e Deluty (1977) verificaram
medida absoluta da discriminabilidade dos que, à semelhança de muitas outras dimen-
estímulos, o JND é afetado pela ordem de sões do estímulo, a discriminação da dura-
grandeza dos estímulos em questão. Con- ção também segue a Lei de Weber.
clusões gerais sobre a discriminabilidade
dos estímulos, portanto, deveriam basear- Se a Fração de Weber é constante, é
-se em uma medida relativa. de se esperar que os sujeitos respondam de
maneira semelhante para durações distin-
A Fração de Weber, obtida dividin- tas que representem a mesma proporção
do o JND pelo valor do estímulo padrão, t de tempo transcorrido (ou que estejam na
(FW=JND/t), é frequentemente usada como mesma razão). Para ilustrar, voltemos ao
um índice relativo da discriminabilidade. caso das discriminações 1 s vs. 4 s e 4 s vs.
Para calcular a Fração de Weber em cada 16 s. Na primeira, os sujeitos aprenderam a
discriminação, Church e Deluty (1977) assu- responder ‘longo’ após 4 s e a MG = 2 s. Na
miram que o PIS era o estímulo padrão, ou segunda, aprenderam a responder ‘longo’
seja, o critério em relação ao qual os sujeitos após 16 s e a MG = 8 s. Em ambos os casos,
categorizavam as durações como curtas ou a proporção entre a duração de treino mais
longas. Como em todas as discriminações longa (4 ou 16 s) e a correspondente média

4
A média harmômica é sempre inferior ou igual à média geométrica 5
Na literatura em tarefas temporais com animais não-humanos, há
que, por sua vez, é sempre inferior ou igual à média aritmética, ou seja, evidencia da Fração de Weber variando entre 0.20 e 0.30 (Richelle &
MH ≤ MG ≤ MA. A igualdade ocorre quando os números são todos Lejeune, 1980).
iguais.

146
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

geométrica é de 2. Assim, como a Fração de Para facilitar a descrição, dissemos até aqui
Weber é constante, a proporção de respostas que os sujeitos aprendem a responder ‘cur-
‘longo’ emitidas para cada uma dessas duas to’ para 1 segundo e ‘longo’ para 4 s, quando,
durações longas deveria ser igual: P(‘longo’) em verdade, eles aprendem, por exemplo, a
aos 4 s na discriminação 1 s vs. 4 s deveria pressionar a barra da esquerda após 1 s e a
ser igual a P(‘longo’) aos 16 s na discrimina- barra da direita após 4 s. Existe uma dife-
ção 4 s vs. 16 s. O mesmo aconteceria para rença fundamental entre afirmar que os su-
as outras durações usadas nos testes. jeitos respondem que uma duração é curta
e a outra é longa, e afirmar que respondem
Church e Deluty (1977) confimaram ‘esquerda’ e ‘direita’ em função das dura-
este resultado: As proporções de respostas ções. A primeira afirmação implica que os
‘longo’ eram iguais para durações que repre- sujeitos respondem com base no valor rela-
sentavam a mesma proporção em relação à tivo das durações – isto é, aprendem que 1 s
média geométrica e, portanto, as funções é curto relativamente a 4 s, que 4 s é longo
psicométricas das quatro discriminações relativamente a 1 s e, adicionalmente, quais
sobrepuseram-se (conferir o painel central respostas emitir para os estímulos curto e
na Figura 4). longo; a segunda afirmação implica que
os sujeitos respondem com base no valor
A sobreposição das funções psico- absoluto das durações – isto é, aprendem
métricas ilustra uma das propriedades mais quais respostas emitir após 1 e 4 s.
robustas da discriminação temporal em
animais, a propriedade escalar: Tarefas de O responder com base no valor rela-
bissecção com durações de treino na mes- tivo dos estímulos, ou o responder relacio-
ma proporção (1:4 em todas as tarefas em nal, influenciou fortemente o programa de
análise no estudo) induzem funções psi- trabalhos da escola da Gestalt em princípios
cométricas que se sobrepõem quando gra- do século XX e é um dos tópicos de pesqui-
ficadas na mesma escala. Church e Deluty sa mais antigos da psicologia experimen-
(1977) verificaram que a discriminação tem- tal. Há evidência de responder relacional
poral dos estímulos obedece à propriedade controlado pelo brilho (Kohler, 1918/1938),
escalar. pelo tamanho (Gulliksen, 1932) e pela forma
(Saldanha & Bitterman, 1951) dos estímulos,
embora interpretações alternativas sejam
DESDOBRAMENTOS possíveis (e.g., Spence, 1936, 1937). Mas será
que animais não-humanos respondem rela-
Responder relacional vs. respon- cionalmente em discriminações temporais?
der absoluto. Retomemos o nosso exemplo
com o treino discriminativo entre 1 e 4 s. O estudo de Church e Deluty (1977)

147
Capítulo IX | Bissecção Temporal

iniciou a linha de pesquisa neste tópico e, aprenderam a discriminação entre 4 e 16 s,


assim, levantou outra questão fundamen- mas o mapeamento entre a resposta correta
tal no estudo do timing, designadamente, e a duração do estímulo diferiu entre gru-
o quê um animal aprende na tarefa de bis- pos. Um grupo aprendeu a responder ‘es-
secção. Vejamos como os autores atacaram querda’ após 4 s e ‘direita’ após 16 s. Obser-
o problema. Volte à Tabela 1 e considere as ve que se manteve o mapeamento relativo
tarefas realizadas pelos grupos A e B nas ‘curto→esquerda, longo→direita’ para este
Fases II e III. Na Fase II, ambos os grupos grupo e, por isso, vamos chamá-lo de grupo
aprenderam a responder ‘esquerda’ após Relativo. O outro grupo, em contrapartida,
1 s e ‘direita’ após 4 s. Se, por um lado, os aprendeu a responder ‘direita’ após 4 s e ‘es-
sujeitos aprenderam a responder ao valor querda’ após 16 s. Neste caso, manteve-se
relativo das durações, a contingência pode o mapeamento absoluto ‘4s→direita’ e, por
ser resumida com o esquema ‘curto→es- isso, chamamo-lo de grupo Absoluto.
querda, longo→direita’. Se, por outro lado,
aprenderam a responder ao valor absoluto Church e Deluty (1977) raciocinaram
das durações, a contingência pode ser resu- que, se o responder na discriminação tem-
mida como ‘1s→esquerda, 4s→direita’. poral é baseado no valor relativo das dura-
ções, o grupo Relativo deveria aprender a
A Fase III foi planejada para testar Fase III mais rapidamente do que o grupo
as duas possibilidades. Ambos os grupos Absoluto. Se, pelo contrário, o responder é

Figura 5. Painel da esquerda. Proporção de acertos para a duração de 4 s obtida nos grupos Relativo e Absoluto por Church e Deluty (1977). Painel
central. Porcentagem de acertos de um sujeito do grupo Relativo para as durações de 6 e 18 s na fase B do experimento de Carvalho et al. (2016). Painel
da direita. Porcentagem de acerto de um sujeito do grupo Absoluto para as durações de 6 e 18 s na fase B do experimento de Carvalho et al. (2016).

148
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

baseado no valor absoluto, o grupo Absoluto e Deluty) e (b) ambos os grupos tinham um
deveria aprender mais rapidamente do que desempenho similar e elevado no final do
o grupo Relativo. Os autores compararam a treino.
porcentagem de respostas corretas dos gru-
pos ao longo das sessões de treino da Fase Para melhor fundamentar a compa-
III, mas analisaram apenas o desempenho ração dos grupos, nós simulamos o desem-
para a duração de 4 s. Os resultados na Fi- penho na tarefa com o modelo Learning to
gura 5 (painel a) revelaram que o grupo Re- Time (LeT; Machado, 1997; Machado, Ma-
lativo respondia corretamente em mais de lheiro, & Erlhagen, 2009) e, posteriormente,
90% das tentativas ao fim de quinze sessões constratamos as simulações com os dados
de treino, mas o grupo Absoluto respondia empíricos. O LeT é um modelo comporta-
corretamente em menos de 70% das tenta- mental que descreve a aquisição e o estado
tivas. Além disso, já na primeira sessão de estável de respostas controladas temporal-
treino, o desempenho do grupo Relativo era mente com base em processos de reforça-
mais alto do que o do grupo Absoluto. Com mento, extinção e generalização.
base nestes resultados, os autores concluí-
ram que os sujeitos aprendem a responder De acordo com o LeT, o início do
ao valor relativo das durações em tarefas de estímulo modelo ativa uma série de esta-
discriminação temporal. dos comportamentais que estão ligados às
duas respostas operantes. A velocidade de
Em nosso laboratório, replicamos ativação dos estados (λ) varia de tentativa
com pombos o experimento de Church e para tentativa e provem de uma distribui-
Deluty (1977). Ensinamos aos animais as ção normal, λ ~ N (média = μ, desvio pa-
discriminações entre 2 s vs. 6 s e 6 s. vs. 18 drão =σ). Quando o sujeito emite uma res-
segundos e usamos um disco verde e outro posta ao fim do estímulo modelo, a força
vermelho como estímulos de comparação. do elo associativo entre a resposta emitida
Nossos resultados (painéis b e c na Figura e o estado ativo no momento da resposta é
5; Carvalho & Machado, 2012; Carvalho, alterada dependendo da consequência da
Machado, & Tonneau, 2016), contudo, não resposta: Se foi reforçada, a força aumenta;
corroboraram aqueles obtidos por Church e se foi extinta, a força diminui. A Figura 6
Deluty com ratos. Ao invés, eles mostraram esquematiza o modelo.
que (a) na primeira sessão de treino, o de-
sempenho do grupo Absoluto era mais alto Vejamos o caso da discriminação
do que o do grupo Relativo na duração de ‘2s→verde, 8s→vermelho’. Em uma ten-
6 s (a duração comum ao treino das duas tativa com um estímulo modelo de 2 s e λ
fases e que em nosso procedimento equi- = 1, o estado n = 2 está ativo no momento
valia à duração de 4 s no estudo de Church em que o sujeito emite uma resposta, ‘ver-

149
Capítulo IX | Bissecção Temporal

estados correlaciona-se com a passagem


do tempo e, assim, estados iniciais (e.g., n
= 1, 2, 3) estarão mais provavelmente ativos
durante as respostas ao estímulo de 2 s, e
estados subsequentes (e.g., n = 6, 7, 8) esta-
rão mais provavelmente ativos durante as
Figura 6. Diagrama dos componentes do modelo Learning to Time
(LeT) – estados comportamentais, elos associativos e respostas operan- respostas ao estímulo de 8 s. Com o treino,
tes – aplicado à uma tarefa de bissecção temporal. A cor e o tracejado
dos elos indicam a força de ligação entre os estados e as respostas: Li- as forças de ligação de todos os estados ati-
nhas pretas contínuas indicam força “elevada”, linhas pretas traceja-
das indicam força “intermediária” e linhas cinzas pontilhadas indicam vos durante as respostas são alteradas, de
força “baixa”. Portanto, o estado n = 2 está fortemente ligado a ‘verde’ e
fracamente ligado a ‘vermelho’, e o estado n = 8 está fracamente ligado modo que os estados iniciais estarão mais
a ‘verde’ e fortemente ligado a ‘vermelho’, por exemplo.
fortemente ligados a ‘verde’ e os estados
de’ por exemplo. A resposta é reforçada e, posteriores estarão mais fortemente ligados
portanto, a força do elo entre o estado n=2 e a ‘vermelho’. O resultado são dois gradien-
‘verde’ aumenta e a força do elo entre o es- tes de forças de ligação, um para a resposta
tado n=2 e ‘vermelho’ diminui . Se o sujeito ‘verde’ e outro para a resposta ‘vermelho’
responder ‘vermelho’, a resposta é extinta, (observe a gradação da espessura dos elos
o elo de n=2 e ‘vermelho’ diminui e o elo de associativos na Figura 6). Em cada tentati-
n=2 e ‘verde’ aumenta. Veja na Figura 6 o va, o sujeito emitirá a resposta que tiver o
elo “forte” (linha preta) de n=2 com ‘verde’ e elo mais forte com o estado ativo ao fim do
o elo “fraco” (linha cinza pontilhada) de n=2 estímulo modelo.
com ‘vermelho’.
Como você deve ter observado, o
Em uma tentativa com um estímulo LeT assume que as respostas do sujeito são
modelo de 8 s e λ = 1, o estado n = 8 está controladas pela duração absoluta do es-
ativo no momento em que o sujeito emite tímulo modelo (i.e., 2 s ou 8 s) e não pela
a resposta ‘vermelho’. A resposta é refor- sua duração relativa (i.e., ‘curto’ ou ‘longo’).
çada, a força do elo entre o estado n = 8 e Ao comparar as simulações do LeT com o
‘vermelho’ aumenta e a força do elo entre desempenho dos pombos, pudemos ava-
o estado n = 8 e ‘verde’ diminui. Raciocínio liar qual é a forma de controle de estímulos
semelhante ao já descrito acima aplica-se predominante na tarefa de bissecção tem-
ao efeito da extinção da resposta ‘verde’ poral. As simulações foram genericamente
emitida após 8 s. semelhantes ao desempenho dos pombos
tanto qualitativa, quanto quantitativamen-
O parâmetro λ é uma variável alea- te (compare os painéis d e e com os painéis
tória, e, portanto, o estado ativo ao fim de b e c, respectivamente, na Figura 5). Os re-
um dado estímulo modelo varia de tentati- sultados dos estudos conduzidos por Car-
va para tentativa. Contudo, a ativação dos valho e colaboradores (2012, 2016), portanto,

150
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

sugerem de maneira bastante robusta que o ram a tarefa de dupla bissecção temporal.
responder na tarefa de bissecção temporal Como o nome da tarefa sugere, os sujeitos
é baseado no valor absoluto das durações. são treinados em duas bissecções temporais.
Permanece por identificar sob quais condi- A primeira é semelhante à que acabamos de
ções os animais aprendem a responder com descrever entre 1 e 4 s. Na segunda, apren-
base na duração relativa dos estímulos tem- dem a responder ‘azul’ após 4 s e ‘amarelo’
porais. após 16 s. Para o SET, os sujeitos aprendem
‘4s→escolher azul’ e ‘16s→escolher ama-
relo’. Para o LeT, eles aprendem ‘4s→esco-
Efeitos contextuais na tarefa de bis- lher azul e evitar amarelo’ e ‘16s→escolher
secção. amarelo e evitar azul’. Aprendidas as duas
Para além dos estudos empíricos, discriminações, é conduzido um teste com
os pesquisadores do timing também têm durações que variam entre 1 e 16 s e no qual
conduzido pesquisas teóricas. Em particu- as opções de reposta são ‘verde’ e ‘azul’.
lar, eles têm proposto vários modelos ma-
temáticos para explicar o desempenho em Os modelos diferem nas previsões
tarefas temporais. Dois dos modelos mais que fazem do desempenho no teste. De
influentes são o LeT, já apresentado, e o acordo com o SET, os sujeitos deveriam
Scalar Expectancy Theory (SET; Gibbon, distribuir aleatoriamente suas respostas
1977, 1991; Gibbon & Church, 1984; Gibbon, entre ‘verde’ e ‘azul’ durante o teste, porque
Church, & Meck, 1984). no treino prévio eles apenas aprenderam
‘1s→escolher vermelho, 4s→escolher ver-
Os dois modelos diferem nos seus de, 4s→escolher azul, 16s→escolher ama-
pressupostos sobre o que é aprendido na relo’ e, portanto, não deveriam apresentar
tarefa de bissecção temporal. Para compre- vieses em favor de uma ou outra resposta
endermos estas diferenças, tomemos uma em função das diferentes durações. Como
tarefa em que os sujeitos devem responder consequência, a proporção de respostas
‘vermelho’ após 1 s e ‘verde’ após 4 s. De ‘verde’ não deveria variar com as durações
acordo com o SET, os sujeitos aprendem de teste.
apenas as contingências ‘1s→escolher ver-
melho’ e ‘4s→escolher verde’. O LeT, pelo De acordo com o LeT, os sujeitos
contrário, assume que os sujeitos apren- deveriam preferir ‘verde’ conforme as du-
dem ‘1s→escolher vermelho e evitar verde’ rações de teste aumentassem porque no
e ‘4s→escolher verde e evitar vermelho’. treino prévio os sujeitos aprenderam (a)
a evitar ‘azul após as durações mais lon-
Para testar os pressupostos dos mo- gas (próximas de 16 s) e (b) a evitar ‘verde’
delos, Machado e Keen (1999) desenvolve- após as durações mais curtas (próximas de

151
Capítulo IX | Bissecção Temporal

1 s). No teste, dada a escolha entre ‘verde’ e consideramos um treino discriminativo em


‘azul’, a proporção de respostas ‘verde’ de- que as probabilidades de reforço das res-
veria aumentar com o aumento na duração postas corretas para cada duração de treino
dos estímulos. eram iguais. Church e Deluty (1977) usaram
um esquema de Razão Fixa (FR) 1 para as
Diversos estudos usaram a tarefa de respostas ‘curto’ e ‘longo’. Sob este esquema,
dupla bissecção temporal (Arantes & Ma- verificamos que o PIS está usualmente na
chado, 2008; Machado & Arantes, 2006; média geométrica das durações de treino. A
Machado & Keen, 1999; Machado & Olivei- linha contínua na Figura 8 ilustra uma fun-
ra, 2009; Machado & Pata, 2005; Oliveira & ção psicométrica hipotética para um treino
Machado, 2008, 2009; Vieira de Castro & discriminativo entre 1 e 4 s no qual as res-
Machado, 2012; Vieira de Castro, Machado, postas ‘curto’ e ‘longo’ tinham igual proba-
& Tomanari, 2013) e sistematicamente con- bilidade de reforço. Observe que o PIS da
firmaram as previsões do LeT. A Figura 7 função é igual a 2 s.
apresenta os resultados obtidos por Macha-
do e Pata (2005) com pombos. Dá-se o nome Agora, o que aconteceria com o PIS,
de efeito de contexto a este padrão de resul- em particular, e com a função psicométrica,
tados, porque as respostas no teste são de- de um modo geral, se conduzíssemos um
terminadas pelo contexto original em que treino discriminativo em que uma resposta
os sujeitos aprenderam a escolher ou evitar tem maior probabilidade de reforço do que
a outra? Por exemplo, o que aconteceria se a
probabilidade de reforço da resposta ‘longo’
fosse de 1.0 e a probabilidade de reforço da
resposta ‘curto’ fosse de 0.2? De maneira se-
melhante, o que aconteceria se a magnitude
do reforço fosse maior para a resposta ‘lon-
go’ do que para a resposta ‘curto’? Em am-
bos os casos, esperaríamos que a proporção
de respostas ‘longo’ aumentasse, resultando
em uma função psicométrica que está des-
Figura 7. Efeito de contexto obtido por Machado e Pata (2005) com
locada para a esquerda da função que con-
pombos em uma tarefa de dupla bissecção temporal. sideramos anteriormente, e cujo PIS está
abaixo de 2 s. A linha pontilhada na Figura
uma resposta em função das durações. 8 ilustra o efeito.

Efeitos da probabilidade do reforço De maneira similar, quando a proba-


na função psicométrica. Até agora, apenas bilidade de reforço da resposta ‘longo’ fosse

152
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

discrepâncias nas probabilidades e nas mag-


nitudes de reforço. Tais resultados seriam
consistentes com a Lei da Igualação (Herr-
nstein, 1970) e aproximariam o responder
em discriminações temporais do responder
observado em outros procedimentos que
envolvem escolha. Mais pesquisa sobre o
tópico é claramente necessária.

Figura 8. Funções psicométricas hipotéticas para diferentes probabi-


lidades de reforço na discriminação entre 1 e 4 s. Em cada linha da CONSIDERAÇÕES FINAIS
legenda, o valor à esquerda representa a probabilidade de reforço da
resposta ‘curto’ e o valor à direita representa a probabilidade de reforço
da resposta ‘longo’.
O estudo de Church e Deluty (1977)
menor do que a probabilidade de reforço da é hoje considerado um clássico da pesqui-
resposta ‘curto’, a proporção de respostas sa em timing. Por um lado, foi pioneiro na
‘longo’ diminuiria, a função psicométrica implementação de uma tarefa de bissecção
deslocar-se-ia para a direita e o PIS seria temporal recorrendo a um procedimento
superior a 2 s. A linha tracejada na Figura 8 psicofísico clássico (i.e., o método de estí-
ilustra o efeito. mulos constantes). Anteriormente, Stubbs
(1968, 1976) tinha utilizado um procedimen-
Até o momento, contudo, os resulta- to similar, mas, ao invés de reforçar apenas
dos experimentais são escassos e inconsis- as repostas para as durações mais curta e
tentes. Stubbs (1976), por exemplo, reportou mais longa, reforçava também as respostas
deslocamentos consistentes com as previ- para as durações intermediárias. Church e
sões em uma tarefa em que a probabilidade Deluty, por sua vez, foram os primeiros a
relativa de reforço diferia entre as respostas reportar funções psicométricas e PISs ob-
‘curto’ e ‘longo’ (ver também Raslear, 1985). tidos em testes de generalização e sem re-
Outros estudos que manipularam a mag- forçamento das respostas para as durações
nitude do reforço, no entanto, revelaram intermediárias. Por outro lado, e porventu-
tanto resultados consistentes quanto resul- ra mais importante, o estudo de Church e
tados inconsistentes com as previsões (e.g., Deluty deu lugar a uma série de questões
Galtress & Kirkpatrick, 2010). consideradas ainda hoje centrais para a
nossa compreensão da percepção temporal
Caso ocorram de fato, os desloca- tanto em humanos como em animais não
mentos da função psicométrica indicariam humanos.
que a distribuição das respostas entre as
duas opções (‘curto’ e ‘longo’) é sensível às Como discutido anteriormente, o PIS

153
Capítulo IX | Bissecção Temporal

na média geométrica sugere uma escala tância do trabalho de Church e Deluty (1977)
logarítmica para o tempo subjetivo, com- são as linhas de pesquisa que abriu. Trinta
binada com uma regra de decisão baseada e nove anos após a sua publicação, as su-
na diferença entre tempos subjetivos. Con- gestões nele contidas permanecem atuais e
tudo, logo após o estudo de Church e Delu- alvo de forte disputa e investigação.
ty (1977), outros autores mostraram como o
PIS na média geométrica pode ser obtido a
partir de uma escala linear e de uma regra PARA SABER MAIS
de decisão baseada na razão entre os tem-
pos subjetivos (ver Gibbon, 1991). As ques- Carvalho & Machado (2012); Carvalho,
tões sobre a métrica da escala subjetiva do Machado, & Tonneau (2016). Em ambos
tempo – logarítmica versus linear – e sobre os artigos, os autores reproduziram o estu-
a regra de decisão permanecem em aber- do original de Church e Deluty (1977) com
to (e.g., Jozefowiez, Machado, & Staddon, procedimentos que melhoraram o desenho
2013). Da mesma forma, há evidência de res- experimental e a análise de dados para es-
ponder relacional em algumas circunstân- tudar a questão do responder relacional vs.
cias (e.g., Zentall, Weaver, & Clement, 2004), responder absoluto. Nos artigos, os autores
muito embora nosso laboratório tenha en- também apresentam uma revisão detalha-
contrado evidências sólidas de responder da do trabalho de Church e Deluty (1977).
absoluto, pelo menos em pombos. Ainda, a
tarefa de bissecção abriu a porta para pro- Carvalho, Machado, & Vasconcelos (2016).
cedimentos mais complexos como a dupla Os autores revisam as principais tarefas ex-
bissecção. Esta última tem sido usada para perimentais usadas na pesquisa em timing
estudar efeitos de contexto na percepção e os principais resultados obtidos até hoje.
temporal, testando previsões contrastantes Propõem uma abordagem integrativa dos
de dois modelos proeminentes da área, o resultados que se baseia na interação de
SET e o LeT. Por fim, ainda não são claros gradientes de generalização temporal.
os efeitos da manipulação da probabilidade
e da magnitude do reforço na função psi- Richelle & Lejeune (1980). Livro de referên-
cométrica. Os resultados obtidos por alguns cia na área do timing, escrito por dois dos
autores apontam para deslocamentos da principais pesquisadores da área. Resume
função induzidos por estas manipulações os principais procedimentos, resultados e
(Galtress & Kirkpatrick, 2010; Raslear, 1985; propriedades do responder controlado por
Stubbs, 1976), mas o assunto permanece por intervalos de tempo.
esclarecer cabalmente.

A melhor prova do sucesso e impor-

154
Marilia Pinheiro de Carvalho, Marco Vasconcelos, Armando Machado

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Hiroto Okouchi

Como você se sente? 1, 2

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“Nós não precisamos supor que eventos que ocorrem dentro da pele de um organis-
mo tem propriedades especiais por essa razão”
(Skinner, 1953, p.257).

158
Capítulo X | Eventos Privados

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- Em oposição aos eventos privados,


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO eventos que ocorrem fora da pele de uma
DO EXPERIMENTO pessoa e/ou eventos que são diretamen-
te acessíveis a mais do que um indivíduo
Muitas pessoas, não somente os psi- podem ser chamados de eventos públicos.
cólogos mas também os não especialistas O pressionar de uma barra por um rato e a
em Psicologia, estão interessados em com- entrega de uma pelota de comida, durante
preender a “mente”. Analistas do comporta- um experimento de condicionamento ope-
mento têm uma perspectiva única sobre ela, rante, são exemplos típicos de eventos pú-
baseada no Behaviorismo Radical (Skinner, blicos. A análise experimental do compor-
1945). tamento tem acumulado um extenso corpo
de conhecimento sobre as relações sistemá-
A entidade hipotética que geral- ticas entre tais eventos públicos (Ferster &
mente tem sido chamada de “mente” está Skinner, 1957, Honig, 1966; Honig & Stad-
relacionada com um dos conceitos analíti- don, 1977; Iversen & Lattal, 1991; Madden,
co-comportamentais, os eventos privados. 2013).
Eventos privados têm sido geralmente de-
finidos estruturalmente como eventos que Analistas do comportamento presu-
ocorrem dentro da pele de uma pessoa (Ca- mem que eventos privados obedecem os
tania, 1992, p.388) e, funcionalmente, como mesmos princípios comportamentais reve-
eventos que são diretamente acessíveis a lados pela análise experimental de even-
apenas uma pessoa (Skinner, 1953, p.257). tos públicos. De acordo com este ponto de
Sentimentos, como “depressão” e “entu- vista, por exemplo, até mesmo descrever
siasmo”, são eventos privados não só estru- nossos próprios sentimentos é um resul-
turalmente, mas também funcionalmente, tado de contingências de reforçamento.
porque ocorrem dentro da pele de uma pes- Skinner (1945) argumentou que as respos-
soa e estão diretamente acessíveis apenas tas verbais sob controle de estímulos pri-
para ele ou ela. Tais sentimentos, em ge- vados são estabelecidas e mantidas prin-
ral, são considerados como “elementos da cipalmente pelas contingências de reforço
mente” (Dicionário de Inglês Oxford, 2004, “arranjadas” por outras pessoas. Suponha
pp.1047-1048). que uma pessoa “deprimida” (um falante),
diga: “Estou deprimido.” Se alguém (um ou-
Tradução realizada por João Henrique de Almeida, Carlos Renato Xa- vinte) ouviu e entendeu a reclamação (isto
1

vier Cançado e Paulo Guerra Soares. O primeiro tradutor é bolsista de


pós-doutorado FAPESP processo número 2014/01874-7. é, se o ouvinte pertencesse a uma mesma
2
O artigo descrito nesse texto foi traduzido para a língua portuguesa comunidade verbal que o falante e pudesse
por Júlio de Rose e está publicado: Lubinski,D. & Thompson, T. (2010)
Um modelo animal de comunicação interpessoal de estados interocep- reagir de forma adequada ao que o falan-
tivos (privados). Revista Brasileira de Análise do Comportamento, 6,
229-252. te disse), e se o ouvinte soubesse que o fa-

159
Hiroto Okouchi

lante tinha experimentado um evento que análises conceituais (e.g., Leigland, 2014;
normalmente provoca sentimentos de de- Schlinger, 2011; Tourinho, 2006), análises
pressão (por exemplo, a perda de um ente experimentais de eventos privados têm
querido), o ouvinte poderia dizer: “Eu sei recebido relativamente pouca atenção. O
exatamente como você se sente.” Compor- experimento conduzido por Lubinski e
tamentalmente, o sentimento de depressão, Thompson (1987) é um dos raros casos em
a queixa “estou deprimido”, e as palavras de que foi praticada uma análise experimental
conforto “Eu sei exatamente como você se de eventos privados.
sente”, respectivamente, são um estímulo
discriminativo, uma resposta e um refor-
çador do comportamento verbal do falante. DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO
Uma resposta verbal (e.g., “vermelho”) a um
estímulo público (e.g., um cartão vermelho) Objetivos e Método
pode ser estabelecida pelo reforço dado por O objetivo do experimento de Lu-
outros (e.g., “Correto, esta é a cor do car- binski e Thompson (1987) foi avaliar se ani-
tão.”). Os analistas do comportamento su- mais não-humanos poderiam aprender a
põe que descrever os próprios sentimentos interagir comunicativamente, com base em
(e.g., estar deprimido), também é aprendido eventos em seu ambiente interno.
(e.g., Skinner, 1953, pp.257-282).

Skinner (1945) também demonstrou


que o relato de uma pessoa sobre um estí-
mulo privado não ocorre por reforço direto,
mas por meio de generalização. Uma pessoa
pode descrever seu sentimento novo como
“deprimido(a)” se ele ou ela aprendeu que a
palavra “deprimido(a)” é usada quando algo
(e.g. uma barra) foi empurrado para baixo
(generalização de eventos públicos para os
privados, Skinner, 1957, pp.132-133) ou a
palavra é usada quando ele ou ela experi-
menta um sentimento semelhante ao sen-
timento novo (i.e. generalização de eventos
privados conhecidos para aqueles desco-
nhecidos). Figura 1. Painéis adjacentes de trabalho das caixass para os dois grupos
de pombos. Os painéis de trabalho foram separados por uma divisória
de acrílico Os mandadores foram treinados na caixa esquerda; os tate-
adores foram treinados na caixa direita (figura reproduzida da tradução
Apesar da grande quantidade de de Lubinski & Thompson, com permissão da ReBAC e JEAB).

160
Capítulo X | Eventos Privados

Figura 2. Uma comunicação entre dois pombos com base na ingestão de drogas (estado interno) de um dos pombos. Da esquerda para a direita, os cinco
quadros (A-E) mostram os componentes sucessivos do procedimento. Os pombos à esquerda e à direita em cada quadro eram o mandador e o tateador,
respectivamente (reproduzida da tradução de Lubinski & Thompson, 1987, com permissão da ReBAC e JEAB).

Os sujeitos foram cinco pombos de água e comida durante o experimento,


White Carneau fêmeas, experimentalmen- foram treinados em uma cadeia comporta-
te ingênuas, distribuídos em dois grupos, mental com dois componentes, em que o
denominados “mandadores” (dois pombos) primeiro componente compreendia uma ta-
e “tateadores” (três pombos). refa pareamento ao modelo arbitrária (arbi-
trary matching-to-sample )(o procedimen-
Duas caixas experimentais contí- to deste treino será resumido em seguida).
guas, separadas por uma divisória de acríli- Após o treino, a cadeia comportamental es-
co transparente, que permitiu que os pom- tabelecida era a seguinte: (a) O tateador era
bos vissem um ao outro, foram usadas (ver injetado com um depressor (pentobarbital),
Figuras 1 e 2). Os mandadores foram trei- um estimulante (cocaína) ou uma solução
nados na caixa esquerda, os tateadores na salina isotônica; (b) três discos de resposta,
direita. Antes de serem colocados em suas cada um marcado com a letra “D”, “N”, ou
caixas simultaneamente, cada pombo foi “Σ” foram iluminados (Figura 1); (c) bicadas
treinado individualmente. correspondentes à substância injetada (o
disco “D” para o pentobarbital, o disco “Σ”
Os tateadores, que estavam privados para a cocaína, e o disco “N” para a solução

161
Hiroto Okouchi

salina) foram seguidas pela apresentação de como um tato, o que foi estudado na parte
uma luz azul piscando acima dos discos de final do experimento (descrito em seguida).
resposta; (d) as respostas em um disco aci- Um tato, uma unidade do comportamento
ma de um comedouro (disco da comida) e verbal, é “um operante verbal em que uma
em um disco acima de um bebedouro (dis- resposta de determinada forma é evocada
co da água) foram reforçadas com comida e (ou pelo menos fortalecida) por um deter-
água, respectivamente. minado objeto ou evento ou propriedade
de um objeto ou evento” (Skinner, 1957,
A tarefa de pareamento ao modelo pp. 81-82). Citando vários outros autores
que os tateadores experimentaram é co- (e.g., MacCorquodale, 1969; Skinner, 1957,
nhecida como um procedimento de discri- pp.81-82), Lubinski e Thompson afirmam
minação de drogas (drug discrimination): que tatos não são mantidos por reforços
reforçar um tipo de comportamento após a específicos, nem mudam com o estado de
administração de uma droga e reforçar ou- privação ou de estimulação aversiva do in-
tro comportamento após a administração divíduo, mas são mantidos por reforçadores
de nenhuma droga ou alguma outra dro- condicionados generalizados (e.g., dizendo
ga (Branch, 1991). Na ausência de qualquer “Correto” quando alguém nomeia com pre-
estímulo diferencial exteroceptivo corre- cisão a cor de um cartão vermelho dizendo
lacionado com qualquer comportamento, “Vermelho”). A fim de alcançar este segun-
escolhas produziam reforçadores mais fre- do objetivo, Lubinski e Thompson tentaram
quentemente do que ao acaso e poderiam estabelecer a luz azul intermitente como
ser atribuídas a estímulos interoceptivos um reforçador condicionado generalizado
decorrentes da substância administrada que pudesse manter o comportamento dos
(e.g., a droga ou a solução salina). Assim, tateadores. Os tateadores foram privados
os tateadores no experimento de Lubinski de comida de forma mais rigorosa do que
e Thompson (1987) foram treinados para eles foram privados de água em um dia (i.e.,
“relatar seus sentimentos” pela tarefa de privação de comida por 28 hr e privação de
pareamento ao modelo. Foram necessários água por 4hr), e eles foram privados de água
aproximadamente sete meses para os tate- de forma mais rigorosa do que eles foram
adores responderem de forma consistente privados de comida em outro dia (i.e., priva-
(i.e., pelo menos 80% de respostas corretas) ção de água por 28 hr e privação de comida
nesta tarefa. por 4hr). Alternando essas duas condições
de uma forma A-B-A-B, os tateadores esco-
Um segundo objetivo do experimen- lhiam comida e água indiferenciadamente
to Lubinski e Thompson (1987) foi avaliar quando a luz azul estava piscando.
se as respostas dos pombos aos seus even-
tos internos (privados) poderiam funcionar Um mando, uma unidade mais pri-

162
Capítulo X | Eventos Privados

mitiva do comportamento verbal, é “um ram colocados nas suas caixas simultane-
operante verbal em que a resposta é reforça- amente. Como a Figura 2 ilustra, a intera-
da por uma consequência particular, e está, ção comportamental necessária de cada par
portanto, sob controle funcional das condi- mandador-tateador foi: (a) foi iluminado o
ções relevantes de privação ou de estimu- disco do mandador “Como você se sente?” e
lação aversiva” (Skinner, 1957, pp.35 -36). o mandador bicava esse disco; (b) foram ilu-
Dizer a palavra “Doce” é um exemplo de um minados todos os discos de comparação do
mando quando reforçado pelo acesso a do- tateador (i.e., os discos “D”, “N”, e “Σ”) e o ta-
ces, e a resposta “Doce” será mais provável teador bicava o disco de comparação corre-
de ocorrer após um período de privação de lacionado com a substância injetada (ou os
doces ou comida (Skinner, 1957, p.35). Os próprios “sentimentos” do tateador); (c) foi
mandadores, que foram mantidos sob pri- iluminado o disco “Obrigado” na caixa do
vação de comida a 85% de seu peso com mandador e o mandador bicava esse disco;
livre acesso a comida, foram treinados em (d) a letra (“D”, “N”, ou “Σ”, i.e., o “nome” da
uma cadeia comportamental com três com- droga ou o relato do tateador de seus “senti-
ponentes, em que o terceiro componente mentos”) previamente bicada pelo tateador
envolvia uma tarefa de pareamento ao mo- aparecia no disco modelo do mandador e a
delo arbitrário. A cadeia estabelecida para luz azul começava a piscar a caixa do tate-
o mandador era a seguinte: (a) foi ilumina- ador; o mandador bicava o disco modelo e,
do um disco com letras em Inglês dispostas em seguida, bicava do disco de comparação
para formar as palavras (Figura 1); “Como correto; o tateador bicava o disco da comida
você se sente?”; (b) as bicadas do mandador ou da água, produzindo comida ou água; (e)
ao disco “Como você se sente” foram segui- o mandador recebeu comida. Se o tateador
das pela iluminação de um outro disco ro- bicasse o disco de comparação não corre-
tulado “Obrigado”; (c) quando o mandador lacionado com a substância injectada (uma
bicava o disco “Obrigado”, a letra “D”, “N”, resposta incorreta), as luzes da caixa eram
ou “Σ” era projetada em um disco modelo; escurecidas por 4 s e o elo inicial da cadeia
(d) bicar o disco modelo e, em seguida, bicar (a) era reiniciado. Assim, o estímulo modelo
o disco de comparação contendo a respos- apresentado ao mandador sempre foi corre-
ta com a correspondência correta (o disco to. Ambos os mandadors trabalharam com
“P” para a letra “D”, o disco “C” para a letra cada um dos tateadores. Os pombos foram
“Σ”, e o disco “S”para a letra”N”) produziam testados nessa interação por 40 sessões ex-
comida. Depois de ambos os mandadors e perimentais.
tateadores adquirirem independentemente
a precisão necessária (i.e., pelo menos 80% Deve-se notar que o experimento
de respostas corretas) no encadeamento, de Lubinski e Thompson (1987) apresenta-
tateadores e mandadors individuais fo- va duas fases adicionais (Fases 2 e 3). Na

163
Hiroto Okouchi

Fase 2, os tateadores foram injetados com era de aproximadamente 11% (i.e., o produto
novas drogas, clordiazepóxido e d-anfeta- dos dois desempenhos individuais acon-
mina, que possuem propriedades farma- tecendo por acaso, i.e., 0,33 x 0,33). Estes
cológicas em comum com o pentobarbital resultados sugerem que os pombos apren-
e cocaína, respectivamente, como um tes- deram a interagir comunicativamente com
te de generalização. Na Fase 3, os autores base em eventos do seu ambiente interno.
examinaram se as respostas dos tateadores
aos seus eventos privados funcionavam
realmente como tatos. Foram testados os Resultados das Fases 2 e 3.
desempenhos dos tateadores quando foram Os desempenhos observados na
colocados em suas caixas experimentais Fase 1 persistiram na Fase 2, sugerindo que
depois de receberem 24 horas de acesso li- as respostas dos tateadores aos seus even-
vre a alimento e água (os tateadores foram tos privados decorrentes do treino com as
saciados com alimento e água), e quando drogas (pentobarbital e cocaína) generali-
suas respostas corretas produziam apenas a zaram para os eventos privados semelhan-
luz azul piscando, mas que não produziam tes decorrentes de drogas não utilizadas no
água ou comida (as respostas corretas dos treino (clordiazepóxido e d-anfetamina).
tateadores produziam apenas reforçadores Os desempenhos observados nas Fases 1 e
condicionados). 2 persistiram na Fase 3, sugerindo que as
respostas precisas dos tateadores aos seus
eventos privados não foram mantidas pelos
Resultados e Discussão reforçadores específicos (comida ou água), e
Resultados da Fase 1. não covariaram com os estados de privação
Como apenas uma única substância dos tateadores, mas foram mantidas por um
(pentobarbital, cocaína, ou salina) foi inje- reforço condicionado generalizado (a luz
tada antes de cada sessão, a escolha corre- azul piscando).
ta para o tateador foi a mesma em todas as
tentativas em uma sessão. Assim, o desem- A discussão do artigo de Lubinski
penho dos tateadores na primeira tentativa e Thompson (1987) pode ser resumida da
de uma sessão foi importante neste experi- seguinte forma: (a) o comportamento dos
mento. Tanto o mandador quanto o tatea- tateadores envolveu tatear os eventos pri-
dor responderam corretamente (e.g., o tate- vados; (b) os tateadores aprenderam a ta-
ador que recebeu o pentobarbital e bicou o tear eventos privados sob um esquema de
disco “D”, e o mandador bicou o disco “P”) reforçamento contínuo com 100% de preci-
na primeira tentativa em 70-100% das ses- são, isto é, por meio de uma contingência
sões, enquanto que a porcentagem de uma em que cada resposta correta produzia um
discriminação correta acontecer por acaso reforçador e qualquer resposta incorreta

164
Capítulo X | Eventos Privados

não produzia reforçadores; por outro lado, DESDOBRAMENTOS


considera-se que humanos aprendem a ta-
tear eventos privados sob um esquema de O experimento de Lubinski e Thomp-
reforçamento intermitente com baixa pre- son (1987) recebeu grande atenção (e.g., Ca-
cisão (Skinner, 1945); (c) a generalização ob- tania, 1992, pp.219-220). Em 1993, a revista
tida na Fase 2 configura-se como um exem- Behavioral and Brain Sciences dedicou um
plo de tatos extendidos e exemplifica com número para um debate sobre o mesmo,
não-humanos a descrição de Skinner de com comentários de 27 estudiosos da aná-
como humanos aprendem a relatar novos lise do comportamento e de outras aborda-
sentimentos; (d) os resultados de Thomp- gens (ver Lubinski & Thompson, 1993).
son e Lubunski demonstram que o com-
portamento encoberto (e.g., pensamentos, O experimento de Lubinski e Thomp-
sentimentos e imaginação), que tem sido son (1987), no entanto, não foi replicado
um dos candidatos para análise por meio diretamente ou sistematicamente. Prova-
de modelos experimentais com não-hu- velmente, isto pode ser devido a razões de
manos (Epstein, 1984), mas tem resistido à ordem prática. O equipamento utilizado
análise empírica, é passível de uma análise por Lubinski e Thompson era muito dife-
objetiva; (e) os desempenhos estudados por rente de caixas operantes padrão. As dro-
Lubinski e Thompson podem não consistir gas psicoativas não são acessíveis a todos
em um exemplo de “atividade lingüística”, os pesquisadores. Além disso, este tipo de
como o termo é geralmente entendido, mas experimento demora muito tempo. Confor-
compartilham características com aqueles me descrito na parte de Objetivos e Método
comportamentos observados em crianças deste capítulo, de fato, Lubinski e Thomp-
muito novas ou indivíduos com diagnós- son passaram sete meses para ensinar os
tico de deficiências de desenvolvimento; tateadores a discriminação entre as drogas.
(f) Savage-Rumbaugh (1984) afirmou que o
comportamento controlado por contingên- Dois estudos podem ser considera-
cias impostas por circuitos eletrônicos ao dos como sucessores Lubinski e Thompson
invés de por um outro indivíduo não pode- (1987). Um foi realizado por DeGrandpre,
ria ser caracterizado como “comunicação”. Bickel, e Higgins (1992). Eles também usa-
No entanto, as trocas diádicas humanas de ram o procedimento de discriminação de
respostas muitas vezes são mediadas por drogas como Lubinski e Thompson fizeram,
eventos externos, tais como ligações telefô- e examinaram se relações de equivalência
nicas e quadros de avisos no computador, e podem surgir entre os estímulos interocep-
nós estamos satisfeitos em nos referirmos a tivos (ativados por drogas) e os estímulos
essas trocas como “verbais”. exteroceptivos. Humanos adultos foram
treinados em discriminações de drogas com

165
Hiroto Okouchi

triazolam (reduzindo auto-relatos de ansie- estímulos visuais que apenas um indivíduo


dade) e placebo (cápsulas cheias de lactose) de um par de estudantes de graduação po-
como estímulos modelo, e estímulos visuais dia ver. De acordo com a definição funcio-
como estímulos de comparação. Quando o nal de eventos privados como eventos que
triazolam (A1) foi apresentado, a escolha são diretamente acessíveis a uma só pessoa
de um estímulo visual B1 era a correta, en- (Skinner, 1953, p.257), eventos que ocorrem
quanto a escolha dos estímulos visuais B2 e fora da pele de uma pessoa podem ser pri-
A0 eram incorretas; ou quando escolher um vados (Rachlin, 2003, chamou esse tipo de
estímulo visual C1 era a escolha correta e a evento privado de Privacidade B e o distin-
escolha dos estímulos visuais C2 e C0 in- guiu da Privacidade A, que são eventos que
corretas. Da mesma forma, quando o place- ocorrem sob a pele de uma pessoa).
bo (A2) era o modelo, as comparações cor-
retas eram B2 e C2. Após o estabelecimento Empregando a definição funcional
das relações condicionais A1B1, A1C1, A2B2, de eventos privados, Okouchi (2006) exa-
A2C2 por meio desse treino de discrimi- minou uma das interpretações de Skinner
nação de drogas, as relações não treinadas (1945) de como respostas verbais sob con-
B1C1 e B2C2 emergiam. Estes resultados trole de um estímulo privado são estabe-
demonstram que eventos privados podem lecidas: o relato de um estímulo privado
emergir como membros de uma classe equi- (e.g., dor) pode ser aprendido por meio de
valente, da mesma forma que ocorre com os reforços providos por outras pessoas que
estímulos públicos (Sidman & Tailby, 1982) inferem o estímulo privado das respostas
e, como Lubinski e Thompson mostraram, públicas colaterais (e.g., a mão no queixo,
fornecem evidências de que os princípios expressões faciais, gemidos) ao estímulo.
comportamentais que operam em eventos Oito dos 16 participantes, descritos como
públicos funcionam também com os even- instrutores, aprendiam primeiro discrimi-
tos privados (Skinner, 1953, pp.257-258). nações condicionais BC com os estímulos
B como os modelos e os estímulos C como
Outro exemplo relevante para o tema comparações. Em seguida, outros oito par-
é um experimento realizado por Okouchi ticipantes, descritos como aprendizes, fo-
(2006). Como no experimento de Lubinski ram expostos a um procedimento de pare-
e Thompson, no experimento de Okouchi amento ao modelo modificado em que as
respostas a estímulos privados de um in- respostas dos aprendizes foram reforçadas
divíduo configuravam estímulos modelos ou punidas não pelas respostas do experi-
para outro indivíduo. Diferente do experi- mentador, mas pelas respostas dos instru-
mento de Lubinski e Thompson, no entan- tores. As discriminações condicionais AC
to, estímulos privados não eram estímulos deveriam ser estabelecidas para os aprendi-
interoceptivos mas exteroceptivos, isto é, zes, em que os estímulos modelos As foram

166
Capítulo X | Eventos Privados

apresentados simultaneamente com os es- CONSIDERAÇÕES FINAIS


tímulos B para que os instrutores pudessem
ver os Bs, mas não os As. De acordo com a Talvez, simular o comportamento de
definição funcional de eventos privados, os relatar eventos privados por animais não-
estímulos A eram privados para os instru- -humanos tenha sido uma das realizações
tores. Assim, os estímulos modelo As e os mais significativas de Lubinski e Thomp-
estímulos modelo correlacionados Bs cor- son (1987). Epstein (1981, 1984) insistiu que
respondiam, respectivamente, a estímulos as simulações animais, ou modelos experi-
privados e suas respostas públicas colate- mentais, sintetizando o chamado compor-
rais na interpretação de Skinner. Okouchi tamento humano “complexo” em animais,
examinou se os relatos dos aprendizes (Cs) poderiam dar insights sobre que tipos de
de seus próprios estímulos (As) seriam es- variáveis constituem alguns desses com-
tabelecidos pelo reforço diferencial provido portamentos “complexos” em seres huma-
por outras pessoas (os instrutores) que po- nos. Epstein (1984) listou quatro classes
deriam ter acesso apenas aos estímulos co- de comportamentos que tinham resistido
laterais (BS) e aos relatos (CS). a essas análises e, portanto, tinham sido
considerados como “complexos”: (a) com-
No experimento de Okouchi (2006), portamentos encobertos (“pensamentos”,
dois de oito pares de participantes apre- “sentimentos” e “imaginações”); (b) com-
sentaram o desempenho previsto, no qual portamentos tipicamente humanos (lingua-
aprenderam as discriminações condicio- gem, comportamentos que são descritos
nais AC dos instrutores que não tinham sob a rubrica do “self”, e o comportamento
acesso aos estímulos A. Posteriormente, de resolução de problemas); (c) os compor-
Sonoda e Okouchi (2012) replicaram os re- tamentos controlados por estímulos tempo-
sultados de Okouchi utilizando um proce- ralmente remotos (“memória”); e (d) novos
dimento modificado. Eles utilizaram es- comportamentos (“criatividade” e “pensa-
tímulos abstratos e um computador, por mento produtivo”). Exceto pela classe de
exemplo, enquanto Okouchi havia usado comportamentos encobertos, alguns com-
estímulos geométricos, sílabas sem sentido, portamentos de cada uma dessas classes
e estímulos coloridos e havia controlado a foram simulados e estudados experimen-
apresentação no experimento manualmen- talmente (e.g., Epstein, 1981; Epstein, Lanza,
te. Sonoda e Okouchi obtiveram os desem- & Skinner, 1980; Epstein & Skinner, 1981). O
penhos esperados de todos os 26 pares de trabalho de Lubinski e Thompson pode ser
alunos de graduação. considerado um sucesso de uma simulação
animal de comportamentos encobertos ou
eventos privados ( “sentimentos”).

167
Hiroto Okouchi

Como o título do artigo de Lubinski por meio de drogas psicoativas.


e Thompson (1987) sugere, duas práticas
que ilustram um modelo de como exami- Kohlenberg, & Tsai (1991). Este livro des-
nar eventos privados também podem ser creve como eventos privados, como emo-
realizações significativas deste trabalho. ções, memória, cognições e crenças são
Em primeiro lugar, eles mostraram que os conceituados e manejados em uma psicote-
processos de discriminação de drogas po- rapia analítico comportamental.
dem ser utilizados em experimentos sobre
eventos privados. Uma das dificuldades na Okouchi (2006). Este artigo mostra como
experimentação sobre eventos privados é eventos fora da pele do participante e não
a manipulação dos mesmos. Apresenta- acessíveis a outros participantes, mas a um
ção e não apresentação de um “sentimen- experimentador podem contribuir para a
to”, por exemplo, não é fácil, ao passo que análise experimental dos eventos privados,
apresentações de uma luz colorida têm e relata um experimento que investigou
sido comumente implementadas em expe- uma das interpretações de Skinner (1945)
rimentos comportamentais. O uso de dro- da maneira em que os humanos aprendem
gas psicoativas seria um dos poucos méto- a relatar eventos privados.
dos para manipular sentimentos de forma
relativamente confiável (mas ver Branch, Rachlin (2003). Esse capítulo de livro des-
1991, para uma discussão sobre as dificul- creve como o behaviorismo teleológico
dades em usar drogas como estímulos dis- compreende os eventos privados. O beha-
criminativos). Em segundo lugar, Lubinski viorismo teleológico exclui eventos inter-
e Thompson conduziram um experimen- nos (eventos sob a pele do organismo) de
to sobre eventos privados no contexto das uma análise do comportamento e busca por
interações entre indivíduos. Esta prática é variáveis controladoras do comportamento
útil porque, de acordo com a definição fun- de forma ampla no ambiente temporalmen-
cional de eventos privados (Skinner, 1953, te estendido do organismo.
p.257), se um evento é privado ou não, de-
pende se ele é acessível a outras pessoas ou Skinner (1945). Esse é um clássico sobre
não. eventos privados. Você PRECISA ler se
você estuda eventos privados a partir de
uma perspectiva comportamental.
PARA SABER MAIS
Sonoda, & Okouchi (2012). Esse artigo rela-
DeGrandpre, Bickel, & Higgins (1992). Esse ta experimentos que replicam os resultados
artigo relata um experimento em que even- de Okouchi (2006), utilizando um procedi-
tos privados humanos foram manipulados mento modificado. No Experimento 2, os

168
Capítulo X | Eventos Privados

aprendizes aprenderam a tatear “eventos ence, 207, 543-545.


privados” por reforçamento não com 100%
mas com 83,3% de precisão, ilustrando um Epstein, R., & Skinner, B. F. (1981). The
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170
Andréia Schmidt

“Esse não é um pitilics,


então só pode ser aquele”: o
responder por exclusão e a
aprendizagem de repertórios
verbais

Andréia Schmidt
Universidade de São Paulo

Dixon, L. S. (1977). The nature of control by spoken words over visual stimulus selection. Journal
of the Experimental Analysis of Behavior, 27, 433-442.

“- Mamãe, por que é que eu me chamo Marcelo?


(...) Por que é que não escolheram marmelo?
- Porque marmelo é nome de fruta, menino!
- E a fruta não podia chamar Marcelo, e eu chamar marmelo?”
(Ruth Rocha – Marcelo, Martelo, Marmelo)

171
Capítulo XI | Responder por Exclusão

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- aprendizagem de vocabulário, além do seu


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO valor em si, é importante para o desenvol-
DO EXPERIMENTO vimento de intervenções comportamentais
para pessoas com dificuldades na aprendi-
Um dos fenômenos mais interes- zagem de repertórios verbais, como aquelas
santes que ocorre no desenvolvimento hu- com diagnóstico de autismo, de deficiência
mano é, sem dúvida, a aprendizagem da intelectual ou de atrasos de linguagem.
linguagem. Apesar de bebês entenderem al-
gumas palavras ditas por adultos já aos sete De acordo com Baer, Wolf e Risley
ou oito meses de idade, e até mesmo execu- (1968), o desenvolvimento de intervenções
tarem algumas ordens simples nessa idade baseadas nos princípios da Análise Experi-
(e.g., “dar tchau”), as primeiras palavras só mental do Comportamento era o foco das
serão faladas aproximadamente ao final do primeiras pesquisas de Análise Aplicada
primeiro ano de vida. Ao longo do segundo do Comportamento. Muitas estavam foca-
ano ocorre um aumento lento do vocabu- das no ensino de diversos repertórios com-
lário, mas o ritmo de aprendizagem de no- portamentais a indivíduos com deficiência
vas palavras parece ocorrer cada vez mais intelectual, inclusive repertórios verbais.
rápido e, aproximadamente aos três anos, a Várias pesquisas sobre intervenções para
maioria das crianças com desenvolvimento indivíduos com desenvolvimento atípico
típico já serão capazes de falar frases com- foram publicadas na década de 1970 e uma
pletas, e em geral de acordo com as normas delas, em especial, chamou a atenção por
da língua falada por sua comunidade verbal demonstrar um processo de aprendizagem
(Nelson, 2007). que ocorria a partir de um procedimento
de ensino de discriminações condicionais.
O que sempre intrigou pesquisadores A pesquisa de Dixon (1977) demonstrou a
e pesquisadoras é como as crianças podem ocorrência do responder por exclusão, um
aprender tanto em tão pouco tempo, ape- fenômeno comportamental que, mais tarde,
nas pela exposição à sua comunidade e sem foi relacionado por pesquisadores e pesqui-
o ensino formal das inúmeras unidades sadoras da Psicolinguística à aprendizagem
verbais (e.g., palavras ou frases) que com- rápida de vocabulário observada em crian-
põem as práticas verbais dessa comunida- ças antes dos três anos.
de. Diversos pesquisadores da Psicolinguís-
tica e da Psicologia do Desenvolvimento se
dedicaram ao estudo desse tema, sobretu- DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO
do a partir das décadas de 1960 e 1970 (e.g.,
Bloom, 1970; Brown, 1973; Menyuk, 1969). A Objetivo e Método
compreensão dos processos envolvidos na Dixon (1977) investigou o proces-

172
Andréia Schmidt

so envolvido na aprendizagem de relações Participaram do estudo oito jovens


entre palavras ditadas e figuras em tarefas com deficiência intelectual. A tarefa dos
de emparelhamento ao modelo (ou parea- jovens era selecionar uma figura (dentre
mento de acordo com o modelo – em inglês duas disponíveis) de acordo com a palavra
matching to sample), por jovens com diag- ditada pela pesquisadora. Foram utilizados
nóstico de deficiência intelectual. Nesse três conjuntos de estímulos, cada conjunto
tipo de tarefa, um estímulo modelo é apre- composto por três figuras e seus respectivos
sentado ao participante (e.g., uma palavra é nomes ditados. Os conjuntos eram com-
ditada: “Bola”) e ele deve selecionar, dentre postos por letras gregas (Conjuntos 1 e 3) ou
alguns estímulos disponíveis (e.g., figuras por símbolos japoneses (Conjunto 2). Cada
ou objetos tridimensionais: um carrinho, participante foi exposto aos três conjuntos,
um peão e uma bola) aquele que corres- um de cada vez. Antes de iniciar o proce-
ponde ao modelo. Essa tarefa envolve uma dimento com cada conjunto de estímulos,
discriminação condicional: o objeto “corre- foi conduzido um pré-teste para avaliar se
to” dependerá da palavra que foi ditada, ou os participantes eram capazes de aprender
seja, a bola será o S+ (objeto correto) apenas rapidamente as relações nome-figura com
quando a palavra ditada for “bola” (estímulo os estímulos do conjunto. Se eles aprendes-
condicional), mas não (S-) quando a palavra sem muito rapidamente essas relações, isto
ditada for “Carrinho”, por exemplo. A autora é, a partir de um número pequeno de expo-
partiu de dados da literatura da época que sições, o efeito do procedimento testado em
mostravam que (a) pessoas com deficiência fases subsequentes do estudo poderia ser
intelectual apresentavam dificuldades em obscurecido, uma vez que esses participan-
aprender vocabulário; e (b) procedimentos tes poderiam ter desenvolvido na sua histó-
de ensino por emparelhamento ao modelo ria estratégias específicas de aprendizagem
poderiam ser mais eficientes quando uma que não a de exclusão, objeto de estudo da
das alternativas de escolha já era conhecida pesquisa. No pré-teste foram conduzidos
do participante e servia de contraste para no mínimo dois blocos de 12 tentativas em
a nova aprendizagem (Vincent-Smith, Bri- que o nome de cada estímulo era ditado por
cker, & Bricker, 1974). O objetivo do estudo quatro vezes não consecutivas (a ordem dos
de Dixon era testar um procedimento de estímulos ditados ao longo das tentativas
ensino de relações palavra-figura para pes- era aleatória), e duas figuras eram coloca-
soas com deficiência intelectual, baseado das em frente ao participante para que ele
no princípio de que, a partir do ensino de apontasse aquela que correspondia à pa-
uma relação, outras poderiam ser aprendi- lavra ditada. Desempenhos corretos pro-
das mais facilmente em função do controle duziam elogios e fichas que poderiam ser
por exclusão exercido pela relação previa- trocadas por outros reforçadores no final
mente treinada. da sessão. Caso o participante apresentas-

173
Capítulo XI | Responder por Exclusão

se mais que 75% de acertos em pelo menos tativas, eram apresentadas as chamadas
dois de três blocos de tentativas, seria ex- sondas de exclusão (exclusion probes). Em
cluído do estudo, o que aconteceu com qua- um bloco de 18 tentativas, eram apresenta-
tro jovens (além dos oito que finalizaram o das 12 tentativas de linha de base (i.e., em
estudo). Os oito participantes que apresen- que a palavra ditada era aquela treinada
taram menos de 75% de acertos nos blocos na fase anterior) e seis tentativas de sonda.
de pré-teste com cada conjunto de figuras Nas sondas de exclusão, uma nova palavra
seguiram para a fase de treino, descrita na era ditada (e.g., “Theta” ou “Upsilon”) e os
sequência. estímulos disponíveis eram a figura relacio-
nada à palavra modelo na fase anterior (e.g.,
Na Fase de treino a pesquisadora en- a letra grega π) e o estímulo anteriormente
sinava cada participante a relacionar uma com função negativa (e.g., θ ou Y). Caso o
palavra ditada a uma figura do conjunto participante tivesse aprendido a relação “Pi”
(e.g., a palavra ditada “Pi” e a figura da letra - π, ao ouvir a palavra completamente nova
grega π). Na primeira tentativa da primeira deveria selecionar outra figura, não aquela
sessão de treino, a pesquisadora colocava anteriormente relacionada à “Pi”. Respostas
diante do participante duas figuras, uma corretas nessa fase produziam elogios e fi-
considerada correta (S+), que seria relacio- chas, tanto nas tentativas de linha de base,
nada à palavra ditada, e outra incorreta (S-), quanto nas sondas de exclusão.
que era uma das outras duas figuras do
conjunto. No exemplo da relação “Pi”- π, na Após a sessão de sondas de exclusão,
primeira tentativa a pesquisadora apontava os participantes passavam para a fase se-
para a figura π e dizia: “Este é o Pi. Apon- guinte, a de sondas de discriminação (dis-
te para o Pi”. Nas tentativas seguintes, ela crimination probes). Em cada sessão, era
apresentava as duas figuras e pedia que o apresentado um bloco de 18 tentativas, das
participante apontasse para a figura de “Pi”. quais 12 eram tentativas de linha de base e
Respostas corretas (a escolha da figura π) seis tentativas de discriminação, nas quais
eram seguidas de elogios e fichas. Os blocos o modelo era uma das palavras novas dita-
de treino dessa fase eram compostos por 18 das nas sondas de exclusão (e,g., “Theta” ou
tentativas nas quais o estímulo modelo (pa- “Upsilon” – três tentativas para cada pala-
lavra ditada) era sempre o mesmo e os es- vra), e os estímulos de comparação disponí-
tímulos de comparação eram o S+ (π) e um veis eram as duas figuras que tinham fun-
S-, que se alternava nas tentativas entre θ ção negativa na fase de treino (e.g., θ e Y).
e Y. Nessa fase, a autora tinha como objetivo ve-
rificar se, ao relacionar os estímulos auditi-
Após o participante ter apresentado vo e visual “novos” nas sondas de exclusão,
ao menos 16 respostas corretas em 18 ten- esse desempenho se manteria em uma ten-

174
Andréia Schmidt

tativa em que a palavra não treinada fosse os participantes.


ditada como modelo e em que os estímulos
disponíveis para escolha fossem apenas os
dois não diretamente treinados. A pergunta Resultados e Discussão
implícita nesses testes era: será que os par- Na Fase de treino, todos os partici-
ticipantes realmente aprenderam as rela- pantes aprenderam a primeira relação ensi-
ções “Theta”- θ e “Upsilon”- Y nas sondas nada rapidamente, na maioria dos casos em
de exclusão, ou será que eles selecionaram uma única sessão. O desempenho de maior
as figuras corretas diante dos modelos no- interesse, porém, era se os participantes
vos apenas porque haviam aprendido que responderiam ou não por exclusão na Fase
a figura π não era Theta ou Upsilon? As de sondas de exclusão, ou seja, se diante de
sessões de sondas de discriminação eram palavras nunca antes ditadas, seleciona-
apresentadas até que o participante apre- riam a figura que, nas tentativas de ensino
sentasse 100% de respostas corretas no blo- (Fase de treino), funcionavam como S-. Foi
co, até o máximo de quatro sessões. Se os exatamente isso o que ocorreu. Na sessão
participantes atingissem o critério em uma de sondas de exclusão, todos os participan-
ou duas sessões, isso indicaria que eles real- tes selecionaram a figura não treinada (e.g.,
mente haviam aprendido as novas relações θ ou Y) quando a palavra nova era ditada,
entre os estímulos não treinados nas son- e continuaram respondendo corretamen-
das de exclusão. Mas, se o critério não fosse te nas tentativas de linha de base. Esse re-
atingido nas quatro sessões possíveis, ou se sultado demonstrou que os participantes
fossem necessárias mais de duas sessões, aprenderam a relação que foi treinada ex-
seria possível deduzir que os participantes plicitamente (e.g., “Pi” e π) e que relaciona-
não aprenderam as novas relações nas son- ram a nova palavra à figura não treinada
das de exclusão, mas apenas relacionaram nas tentativas de sonda.
os modelos novos às figuras não treinadas
sob controle da alternativa incorreta (a fi- As sondas de discriminação, porém,
gura π), como se tivessem estabelecido uma indicaram que, apesar dos participantes
espécie de regra: “se a palavra ditada for ‘Pi’, terem relacionado os estímulos modelo e
a figura certa é π; se a palavra ditada não for comparação não treinados nas sondas de
‘Pi’, a figura correta é a outra”. exclusão (“Theta” e θ, e “Upsilon” e Y), es-
sas novas relações não se estabeleceram de
Todas as fases (pré-teste, fase de trei- forma tão estável quanto aquela treinada
no, fase de sondas de exclusão e fase de inicialmente. Apenas dois dos participan-
sondas de discriminação) foram realizadas tes atingiram o critério de desempenho nas
com todos os três conjuntos de estímulos. A sondas de discriminação realizadas com o
ordem dos conjuntos, porém, variou entre primeiro conjunto de estímulos: um deles

175
Capítulo XI | Responder por Exclusão

na primeira sessão de sondas de discrimi- critério de 100% de acertos nas sondas de


nação e o outro apenas na quarta sessão. discriminação, a despeito de terem relacio-
Os demais participantes não atingiram o nado corretamente as palavras novas às fi-
critério de 100% de acertos no bloco, mes- guras não treinadas em 100% das sondas de
mo após quatro sessões. No entanto, foi exclusão.
verificada melhora no desempenho dos
participantes nas sondas de discriminação É interessante notar, porém, que a
com o segundo conjunto de estímulos: seis exposição ao segundo conjunto de estí-
participantes atingiram 100% de acertos nas mulos promoveu melhora no desempenho
sondas de discriminação com, no máximo, dos participantes, uma vez que um número
quatro sessões, sendo que três desses seis maior deles atingiu o critério de desempe-
participantes atingiram esse resultado em nho estabelecido nas sondas de discrimina-
uma única sessão. Somente dois partici- ção. Esse resultado sugere que ocorreu uma
pantes foram expostos ao último conjunto espécie da “aprendizagem da tarefa” pelos
de estímulos, uma vez que os demais apre- participantes.
sentaram um alto desempenho com os es-
tímulos no pré-teste realizado. Ambos os
participantes atingiram 100% de acertos DESDOBRAMENTOS
nas sondas de discriminação já na primeira
sessão. Os resultados do estudo de Dixon
(1977) chamaram a atenção de pesquisa-
Diante desses resultados, Dixon dores interessados em desenvolver proce-
(1977) argumentou que o controle exercido dimentos de ensino automatizados para
pelas palavras novas nas sondas de exclu- indivíduos com deficiência intelectual,
são era, aparentemente, a rejeição da figura particularmente aqueles ligados ao grupo
treinada, isto é, daquela relacionada no trei- de pesquisa liderado por Larry Stoddard
no a uma outra palavra. Nesse caso, o que (Wilkinson, de Souza, & McIlvane, 2000).
estaria controlando a escolha dos partici- O desempenho por exclusão pareceu a es-
pantes nas sondas de exclusão não era uma ses pesquisadores especialmente interes-
relação entre a nova palavra e a figura não sante por se constituir em um desempenho
treinada, mas a exclusão da alternativa já emergente. Isto significa que, sem ensino
treinada diante de uma nova palavra. Essa direto, os participantes do estudo de Dixon
hipótese foi fortalecida pelos resultados nas estabeleceram duas novas relações entre
sondas de discriminação. Ao remover a al- estímulos auditivos e visuais, além daque-
ternativa treinada (a figura π) e apresentar la diretamente ensinada, o que pareceria
juntas as figuras não diretamente treinadas, um avanço em relação aos procedimentos
a maioria dos participantes não atingiu o utilizados até então. Os procedimentos de

176
Andréia Schmidt

ensino que envolviam tarefas de empare- estudos posteriores, esses resultados foram
lhamento ao modelo empregados na época replicados e ampliados, inclusive com o re-
costumavam apresentar aos participantes gistro de respostas de nomeação dos estí-
um estímulo modelo novo e dois ou mais mulos visuais por parte dos participantes,
estímulos de comparação também desco- somente a partir de tentativas de exclusão
nhecidos. O participante poderia acertar ou (e.g., McIlvane, Kledaras, Lowry, & Stod-
errar a primeira tentativa e a aprendizagem dard, 1992; McIlvane, Munson, & Stoddard,
das relações dependia da sua exposição a 1988). Estudos sobre procedimentos de en-
várias tentativas desse tipo com cada es- sino baseados em exclusão foram testados
tímulo modelo, o que se constituía em um em comparação a procedimentos de en-
procedimento longo e que expunha o parti- sino por tentativa e erro, e se mostraram
cipante a uma quantidade grande de erros. superiores a estes em relação à rapidez de
Esse tipo de procedimento é chamado de aprendizagem dos repertórios ensinados,
procedimento por tentativa e erro. O proce- com a produção de um número menor de
dimento de ensino por exclusão apresenta- erros por parte dos aprendizes (Ferrari, de
va vantagens por produzir aprendizagem de Rose, & Mcllvane, 1993, 2008).
forma mais rápida e com menor exposição
do participante a erros, cujos efeitos preju- Os bons resultados obtidos com pro-
diciais foram amplamente discutidos pela cedimentos de ensino baseados em exclu-
literatura (Terrace, 1963). Além disso, a me- são para o ensino de relações auditivo-vi-
lhora do desempenho dos participantes de suais para crianças e jovens com deficiência
Dixon (1977) nas sondas de discriminação intelectual motivaram muitos pesquisado-
ao longo do procedimento, com a exposição res a adaptá-los para o ensino dessas e de
dos jovens aos diferentes conjuntos de es- outras relações para diferentes populações:
tímulos, indicava que a exposição repetida leitura, para crianças com dificuldades nes-
do indivíduo às tentativas de exclusão po- sa área (e.g., de Souza & de Rose, 2006), re-
deria gerar aprendizagem consistente das lações entre palavras e figuras para crianças
relações entre estímulos. surdas com implante coclear (e.g., Almeida-
-Verdu, Huziwara, de Souza, de Rose, Bevi-
Procedimentos de ensino baseados lacqua, Lopes Jr et al., 2008; Battaglini, Be-
no desempenho por exclusão foram, en- vilacqua, & de Souza, 2012), relações entre
tão, desenvolvidos e extensamente testa- nomes e faces para idosos com demência
dos ao longo das décadas seguintes. McIl- (Ducatti & Schmidt, 2016) e nomeação de
vane e Stoddard (1981), por exemplo, foram estímulos para crianças com diagnóstico de
bem sucedidos em ensinar um jovem com autismo (Greer & Du, 2015).
deficiência intelectual a selecionar alguns
alimentos diante de palavras ditadas. Em Paralelamente aos resultados obtidos

177
Capítulo XI | Responder por Exclusão

nos procedimentos de ensino, questões de passaram por procedimentos que testavam


natureza básica surgiram e têm sido exten- o responder por exclusão a partir de dife-
samente investigadas. Uma delas se refere rentes metodologias. Primatas não huma-
à generalidade do fenômeno: todos os in- nos (Beran & Washburn, 2002; Campos,
divíduos apresentariam desempenho por Brino, & Galvão, 2013; Tomonaga, 1993),
exclusão? cães (Kaminski, Call, & Fischer, 2004; Zaine,
Domeniconi, & Costa, 2014), leões marinhos
Inúmeras pesquisas, realizadas nos (Kastak & Schusterman, 2002), algumas
últimos 40 anos, têm confirmado a gene- espécies de pássaros (Clement & Zentall,
ralidade do fenômeno com pessoas de di- 2003; Schloegl, Dierks, Gajdon, Huber, Ko-
ferentes idades (crianças, jovens, adultos trschal, & Bugnyar, 2009) e ratos (Souza &
e idosos) e condições de desenvolvimento Schmidt, 2014) têm demonstrado desem-
(desde indivíduos com desenvolvimento penho por exclusão em diferentes tipos de
típico, até crianças com desenvolvimento tarefa envolvendo discriminações simples
atípico e idosos com demência). A confir- e condicionais. Souza e Schmidt (2016), por
mação da generalidade desse fenômeno em exemplo, submeteram ratos Wistar a uma
indivíduos com diferentes condições de de- tarefa de discriminação simples simultâ-
senvolvimento levou alguns pesquisadores nea, na qual duas figuras geométricas (um
a questionar se o desempenho por exclusão triângulo e uma linha) eram apresentadas
seria, como afirmavam alguns autores da lado a lado em uma caixa de condiciona-
Psicolinguística (e.g., Markman & Wachtel, mento operante, mas apenas a escolha de
1988), um fenômeno diretamente relacio- uma delas era seguida pela apresentação
nado à aquisição de repertórios verbais. Os de água. Uma das figuras, portanto, tinha
dados obtidos com crianças pré-verbais e função discriminativa na tarefa (S+) e ou-
crianças que não tinham repertório verbal tra não (S-). Após os animais terem atingido
completamente desenvolvido foram as pri- o critério de 80% de respostas corretas em
meiras evidências de que a linguagem não três sessões consecutivas, foram apresenta-
parecia ser uma condição necessária para das sondas de exclusão, nas quais o S- era
ocorrência de desempenhos por exclusão. apresentado junto a uma figura geométrica
O estudo desse fenômeno com não huma- completamente nova. Cinco dos seis ratos
nos poderia resolver essa questão uma vez selecionaram consistentemente a figura
que, se não humanos demonstrassem de- nova (ao menos duas de três tentativas),
sempenho por exclusão, ficaria descartada rejeitando (excluindo) a figura treinada pre-
a hipótese da linguagem como condição viamente como S-. Para garantir que os ani-
para ocorrência do fenômeno. mais não selecionaram a figura desconheci-
da em função de uma eventual preferência
Diferentes espécies de não humanos por estímulos novos (viés de novidade, ou

178
Andréia Schmidt

neofilia), foram apresentadas tentativas em e jovens, com deficiência (Costa, McIlva-


que a figura treinada como S+ foi apresen- ne, Wilkinson, & de Souza, 2001; McIlvane
tada junto a outro estímulo completamente & Stoddard, 1981) e com desenvolvimento
novo e todos os animais selecionaram o es- típico (Domeniconi, Costa, de Souza, & de
tímulo treinado como S+. Rose, 2007; Schmidt, Franco, Lotério, & Go-
mes, 2016; Wilkinson & McIlvane, 1997). Os
O conjunto de resultados obtidos em resultados obtidos nessas pesquisas indi-
diferentes pesquisas sobre exclusão com caram claramente que apenas um número
não humanos indica que esse desempenho reduzido de indivíduos aprende e mantém
não é um fenômeno típico de humanos e, as relações estabelecidas a partir de uma ou
portanto, parece ser um processo comum de poucas tentativas de exclusão. Estudos
a diferentes espécies. Autores da Psicolin- realizados para estabelecer o número mí-
guística argumentam que os desempenhos nimo de tentativas de exclusão necessárias
demonstrados por não humanos nessas si- para a aprendizagem de relações entre es-
tuações podem ser indícios de capacidades tímulos (e.g., Costa, Grisante, Domeniconi,
cognitivas que estão presentes também em de Rose, & de Souza, 2013) também têm en-
humanos e que, coordenadas com outros contrado resultados muito variáveis, o que
processos, tornariam os humanos especial- levou pesquisadores a investigar variáveis
mente eficientes na aprendizagem da lin- que podem facilitar ou dificultar a apren-
guagem (Markman & Abelev, 2004). Essa dizagem por exclusão, ou mesmo o desem-
discussão parece longe de ser resolvida e penho inicial por exclusão (e.g., Antoniaz-
o estudo do desempenho por exclusão em zi, Domeniconi, & Schmidt, 2014; Costa, de
não humanos é ainda um campo promissor Rose, & de Souza, 2010; Wilkinson & McIl-
para o entendimento das bases evolutivas vane, 1994). Os resultados desses estudos
do processo de aprendizagem de repertó- são ainda inconclusivos, uma vez que as
rios verbais. variáveis manipuladas (e.g., conhecimento
anterior dos estímulos não treinados e tipos
Outra questão que permanece em de estímulos empregados) não produziram
aberto diz respeito à aprendizagem de rela- melhora na aprendizagem a partir de pou-
ções entre estímulos a partir do desempe- cas exposições a tentativas de exclusão. São
nho por exclusão. Apesar de todos os parti- necessárias pesquisas adicionais que pos-
cipantes de Dixon (1977) terem respondido sam indicar variáveis que possam facilitar a
por exclusão, nas sondas de discrimina- aprendizagem de relações entre estímulos a
ção apenas dois deles atingiram o critério partir de tentativas de exclusão.
estabelecido, um dos quais somente após
quatro blocos de tentativas. Esses resulta-
dos foram replicados com outras crianças

179
Capítulo XI | Responder por Exclusão

CONSIDERAÇÕES FINAIS rém, muitas questões ainda permanecem


em aberto.
Na mesma época em que Dixon
(1977) publicou sua pesquisa, pesquisadoras Pode-se destacar, por exemplo, que
ligadas à Psicolinguística publicaram um os estudos sobre como o desempenho por
estudo demonstrando o desempenho por exclusão está envolvido na aprendizagem
exclusão na aprendizagem do nome de co- de repertórios verbais têm sido feitos pre-
res com crianças com desenvolvimento tí- dominantemente a partir de relações entre
pico (Carey & Bartlett, 1978). Nesse estudo, substantivos e estímulos concretos (figuras
Carey e Bartlett nomearam o desempenho ou objetos tridimensionais). Há poucos es-
por exclusão de “mapeamento rápido” (fast tudos sobre o tema envolvendo proprieda-
mapping), um processo de reconhecimento des de estímulos (e.g., adjetivos – Malerbo
imediato e parcial do significado de novas & Schmidt, no prelo; Ribeiro, 2013) ou ações
palavras, que incluía (mas não se resumia (e.g., verbos – Costa et al., 2010; Fonseca,
ao) desempenho por exclusão. Muitos estu- 2016). Para que seja possível afirmar que o
dos têm sido realizados sob essa perspec- desempenho por exclusão é um dos prin-
tiva teórica na tentativa de compreender a cipais processos envolvidos na aprendiza-
aprendizagem de vocabulário em crianças gem rápida de vocabulário, são necessários
pequenas (e.g., Bion, Borovsky, & Fernald, estudos que ampliem os dados obtidos com
2013; Horst & Samuelson, 2008; Markman, verbos e adjetivos, e que outras categorias
1989, entre inúmeros outros). Os resultados gramaticais sejam também estudadas.
desses estudos e de outros realizados por
analistas do comportamento têm mostrado Além disso, são necessários estudos
que outras variáveis, além da presença de que procurem simular situações mais na-
um estímulo conhecido junto ao estímulo turais de interações verbais entre a criança
desconhecido em um episódio de exclu- e sua comunidade verbal para entender de
são, são fatores que auxiliam o indivíduo que maneira o desempenho por exclusão
a relacionar uma palavra desconhecida ao ocorre nessas situações. Em situações de la-
seu referente (e.g., pistas sociais, linguísti- boratório, utilizando-se palavras isoladas, o
cas ou perceptuais) e que essas diferentes desempenho por exclusão tem se mostrado
pistas têm diferentes pesos no desempenho um fenômeno robusto e que auxilia forte-
estudado, a depender da idade e da expe- mente as crianças a relacionar palavras aos
riência do indivíduo com sua comunidade seus estímulos correspondentes. Esses re-
verbal (Levine, Strother-Garcia, Golinkoff, sultados são fundamentais para se compre-
& Hirsh-Pasek, no prelo). A despeito dos ender o papel do desempenho por exclusão
resultados já encontrados por analistas do na aprendizagem de repertórios verbais,
comportamento e por psicolinguistas, po- mas é preciso ponderar que, nas interações

180
Andréia Schmidt

naturais entre adultos e crianças, dificil- so, e não uma figura estática, ainda que am-
mente a criança ouvirá palavras isoladas e bos sejam desconhecidos.
terá diante de si um único objeto ou figu-
ra desconhecidos. Nestas interações pala- Schloegl, Bugnyar, & Aust (2009). Revisão
vras desconhecidas aparecem no meio de dos estudos sobre exclusão com não huma-
frases, músicas e histórias e o desempenho nos, analisando não apenas os resultados
por exclusão é um, mas provavelmente não obtidos, mas também os métodos emprega-
o único processo envolvido. Entender se, e dos com cada espécie e qual o significado
como, o desempenho por exclusão ocorre desses resultados para a compreensão da
nas interações verbais da criança com a sua cognição animal.
comunidade é um desafio ainda longe de
ser vencido. O enfrentamento desse desafio Zaine, Domeniconi, & de Rose (2016). Estu-
certamente passa pela união de esforços de do experimental que investigou o desempe-
pesquisadores de diferentes áreas em um nho por exclusão em quatro cães em tarefas
empreendimento conjunto para compreen- de discriminação simples com estímulos
der melhor as peculiaridades da aprendiza- tridimensionais. O estudo relata que todos
gem do comportamento verbal. os cães responderam por exclusão e que
três deles também demonstraram aprendi-
zagem das novas relações após exposição a
PARA SABER MAIS sucessivas tentativas de exclusão.

Costa, Domeniconi, & de Souza (2014). Re-


visão de um conjunto de pesquisas reali- REFERÊNCIAS
zadas com crianças sobre o responder por
exclusão, mostrando as regularidades en- Almeida-Verdu, A. C. M., Huziwara, E. M.,
contradas nos dados e discutindo os méto- de Souza, D. G., de Rose, J. C. C.,Bevilacqua,
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tarefa de exclusão, as crianças não ficam Antoniazzi, M., Domeniconi, C., & Schmidt,
apenas sob controle da novidade dos estí- A. (2014). Efeito da pré-exposição ao objeto
mulos modelo e comparação, mas também no desempenho por exclusão e na aprendi-
de outras dicas presentes no modelo, como zagem da relação nome-objeto. Acta Com-
o gerúndio, que indica que o comparação portamentalia, 22, 23-36.
correto provavelmente é uma ação em cur-

181
Capítulo XI | Responder por Exclusão

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185
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

Paus e pedras podem


machucar, mas palavras...
também! - Teoria das
molduras relacionais

João Henrique de Almeida


Universidade Federal de São Carlos

William Ferreira Perez


Paradigma Centro de Ciências do Comportamento

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“Abracadabra! ”
Palavra mágica prototípica usada por mágicos.

186
Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- che 2001; Perez, Nico, Kovac Fidalgo, & Le-
QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO onardi, 2013; Zettle, Hayes, Barnes-Holmes
DO EXPERIMENTO & Biglan, 2016). Essa perspectiva analítico-
-comportamental foi grandemente influen-
É amplamente disseminado na literatura de ciada pela explicação funcional da lingua-
fantasia medieval e em jogos que palavras, gem presente no Comportamento Verbal
frases curtas e textos faziam parte de rituais (Skinner,1957) e pelo estudo de relações
mágicos. Nesse contexto, poderosos magos derivadas entre estímulos, iniciado pelas
armazenavam seu poder por escrito em to- pesquisas sobre Equivalência de Estímulos
mos e pergaminhos. Uma vez que os sons (Sidman & Tailby, 1982; Sidman, 1994, 2000).
exatos fossem proferidos, coisas incríveis Nessa explicação da RFT, um tipo especí-
poderiam acontecer (Gygax & Arneson, fico de comportamento operante pode al-
1974). A palavra “Abracadabra” na epígrafe terar o modo como os estímulos adquirem
deste texto deriva de uma frase em Aramai- função a partir de relações arbitrárias deri-
co que significa “Eu crio quando eu falo” vadas entre estímulos. Elas são chamadas
(Lawrence, 1988). Obviamente, não iremos de arbitrárias, pois não dependem de carac-
explorar, neste capítulo, os efeitos das pa- terísticas físicas dos estímulos relacionados
lavras a partir da perspectiva da literatura (são baseadas em convenções); e são cha-
fantástica, sequer existem evidências cien- madas de derivadas pois, a partir de treinos
tíficas de que as essas podem alterar os diretos, inúmeras respostas não ensinadas
eventos do mundo físico. No entanto, par- diretamente podem ser observadas.
tindo de uma perspectiva analítico-com-
portamental, baseada em evidências em- Isso tudo é possível porque, desde mui-
píricas, falaremos do “poder” das palavras to pequenos, somos expostos a tarefas em
de funcionar como estímulos e, então, agir que relacionamos estímulos, e essas rela-
sobre as pessoas. Vamos explorar, neste ca- ções podem ser de diversos tipos, como:
pítulo, a “magia” que permite que palavras de similaridade (“esse tênis é parecido com
e frases (símbolos) afetem o comportamen- o meu”), de igualdade (“nossas camisetas
to, ou seja, afetem o que as pessoas fazem, são iguais”), de oposição (“doce é oposto a
pensam e sentem. salgado”), de comparação (“meu carrinho
é maior que o seu”), entre outras (Tornëke,
Para compreender esse efeito das palavras, 2010). Por questões práticas, vamos tomar
recorremos a uma explicação operante da o exemplo da comparação. Imagine uma
linguagem e cognição humana proposta criança aprendendo a comparar objetos.
pela Teoria das Molduras Relacionais (Re- Naturalmente, ao ser exposta às contingên-
lational Frame Theory ou RFT; de Rose & cias da comunidade verbal que modelam os
Rabelo, 2012; Hayes, Barnes-Holmes & Ro- repertórios linguísticos, a criança se depa-

187
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

ra com as palavras “maior” e “menor”. Ini- aplicadas para estabelecer relações de com-
cialmente, tais palavras são utilizadas para paração convencionadas pela comunidade
controlar respostas baseadas em proprieda- verbal. Esse tipo de aprendizagem descrita
des físicas dos estímulos. Diante de pergun- acima é uma parte do que chamamos de
tas e solicitações do tipo “Qual é o maior Treino de Múltiplos Exemplares, e aconte-
brinquedo de todos esses aqui?”, “Qual é a ce comumente de forma não planejada na
menor bola que você tem?”, “Pegue a bone- interação da criança e seus pais ou cuida-
ca menorzinha!”, “Pegue uma peça maior dores.
do quebra-cabeça”, as crianças aprendem a
comparar objetos sob controle do seu tama- Além de aprender relações especificamente
nho, volume ou peso. ensinadas, depois de inúmeras exposições,
a criança logo aprenderá a responder tam-
Uma questão curiosa, no entanto, é que as bém de acordo com novas relações que, em-
dicas contextuais “maior” e “menor” tam- bora não diretamente explicitadas, derivam
bém são frequentemente utilizadas para das inicialmente ensinadas. Tomando o
ensinar comparações que não se baseiam exemplo da comparação, ela aprenderá que
nas dimensões físicas dos estímulos, mas as respostas relacionais também são bidi-
em convenções da comunidade verbal. Por recionais, ou seja, que existe uma implica-
exemplo, quando for um pouco mais ve- ção mútua entre os estímulos relacionados:
lha, a criança aprenderá que a moeda de 50 logo, se um estímulo A é maior que B, B será
centavos tem valor maior, ainda que seja necessariamente menor que A. Ela apren-
menor do que a moeda de 25 centavos. Na derá, também, a combinar relações (impli-
escola, nas aulas de matemática, aprenderá cação combinatória) de tal modo que, após
que 0,000000001 é menor do que 1, embo- aprender que A é maior que B e B maior que
ra o primeiro número contenha muito mais C, poderá responder a novas relações, tais
algarismos. Assim, a criança aprende a res- como: A é maior que C e C é menor que A.
ponder adequadamente também a relações Por fim, aprenderá que estímulos relaciona-
arbitrárias de comparação, ou seja, rela- dos arbitrariamente podem ter suas funções
ções que não têm por base a comparação transformadas com base no tipo de relação
de dimensões físicas, mas dependem das implicada. Assim, se A é “bom”, logo B e C
contingências arranjadas para que dados podem ser ainda melhores!
eventos do mundo sejam tratados compa-
rativamente. Em contextos como esse, di- O fenômeno da Transformação de Fun-
zemos que as respostas relacionais podem ção1 pode ser definido como a propagação
ser arbitrariamente aplicadas a quaisquer de função de um estímulo para demais os
eventos do mundo. Em outras palavras, as estímulos relacionados. As funções trans-
dicas contextuais “maior” e “menor” são formadas podem ser de natureza muito

188
Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

diversa, como funções discriminativas, portamentos humanos complexos. A seguir,


reforçadoras, punitivas, eliciadoras, entre descreveremos um estudo clássico da Teo-
outras. Tal fenômeno já foi exaustivamen- ria das Molduras Relacionais, de Dougher,
te comprovado por experimentos, princi- Hamilton, Fink e Harrington (2007), publi-
palmente em relações de similaridade (e.g., cado no Journal of Experimental Analysis
Bortoloti & de Rose, 2009; de Almeida & de of Behavior. Esse estudo investigou como
Rose, 2015; Dougher, Augustson, Markham, o estabelecimento de relações arbitrárias de
Greenway & Wulfert, 1994; Ferro & Valero, comparação (e.g., A< B < C) pode modular a
2008; Perez, Fidalgo, Kovac & Nico, 2015; frequência de respostas e a magnitude dos
Vervoort, Vervliet, Benett & Baeyens, 2014). respondentes eliciados na presença de da-
O mais importante a ser destacado a res- dos estímulos.
peito desse fenômeno é seu efeito em nos-
so comportamento: nós respondemos aos
estímulos que adquiriram “indiretamente” DESCRIÇÃO DOS EXPERIMEN-
uma determinada função de maneira seme- TOS
lhante a como responderíamos ao estímulo
que “possuía aquela função” originalmente, Experimento 1- Objetivo e Método
como veremos a seguir. A pergunta que precisava de resposta era a
seguinte: respostas relacionais de compara-
Essa maneira de responder aos estímulos ção podem transformar (ampliar ou reduzir)
na ausência de um treino direto modifica as funções evocativas e eliciadoras de um
completamente o nosso modo de interagir estímulo? Por exemplo: imagine que os es-
com o mundo. Uma vez que nos tornamos tímulos A, B e C são figuras abstratas com o
verbais, o significado ou a função de todos mesmo tamanho; em termos de proprieda-
os estímulos ambientais poderá também des físicas, um estímulo não é comparati-
depender de relações arbitrárias estabele- vamente maior do que o outro. No entanto,
cidas com diversos outros estímulos, além suponha que sejam estabelecidas relações
da aprendizagem direta. Essa possibilidade arbitrárias de comparação entre eles, con-
de aprender a partir de relações arbitrárias e vencionadas pelo experimentador: A é me-
responder a relações derivadas é importan- nor que o B, e B é menor que C (A<B<C).
tíssima para a explicação de diversos com- Dito isso, se o participante for ensinado a
emitir uma frequência de respostas estável
Para a Teoria das Molduras Relacionais, a Transferência de Funções
diante de B, diante de A observaremos uma
1

é um tipo de Transformação de Função. Os dois termos são utilizados


na literatura da área: Transferência quando diz respeito à propagação
de função considerando relações derivadas de similaridade; Transfor-
frequência de respostas menor e diante de
mação quando diz respeito às demais relações, como, por exemplo, C uma frequência maior do que em B? Ou,
oposição, comparação, diferença, etc (para um aprofundamento nessa
discussão, ver Dymond & Rehfeldt, 2000) ou ao efeito mais geral de ainda, se B for pareado a um estímulo in-
responder de uma forma não treinada diretamente a estímulos rela-
cionados. condicionado aversivo (e.g., choque) e pas-

189
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

sar a eliciar uma resposta eletrodermal (ca- não deveria ser doloroso. O procedimento
racterística da reação de medo), será que A foi o seguinte: o gerador de choque possuía
irá eliciar uma resposta eletrodermal menor 10 níveis e, inicialmente, era colocado no
do que B? E, mais importante, será que C nível 7 para a administração de um choque
irá eliciar uma resposta eletrodermal ain- breve (50ms). Foi pedido aos participantes
da maior do que o estímulo pareado dire- que classificassem esse choque, dando uma
tamente com o choque (B)? O objetivo do nota de 1-10 (sendo 8 o nível desconfortá-
primeiro experimento foi responder exata- vel, mas não doloroso). Se os participantes
mente a essas questões. considerassem o choque de qualquer nível
diferente de oito, a intensidade era aumen-
Vinte um participantes universitários (12 tada ou diminuída e outro choque apre-
para o grupo experimental e 9 para o con- sentado. Quando a intensidade fosse con-
trole) foram recrutados e receberiam cré- siderada como oito, um segundo choque
ditos em disciplinas por sua cooperação. idêntico era apresentado para ver se essa
Para garantir que os participantes apresen- avaliação permaneceria estável. Quando
tariam índices eletrodermais mensuráveis o participante considerasse dois choques
pelo galvanômetro, foi realizado um teste idênticos consecutivos avaliados como oito
de “explosão do balão”.2 Considerando os 12 a ‘calibragem da intensidade’ esta etapa era
sujeitos do grupo experimental, três deles finalizada. Dos nove participantes do grupo
não obtiveram o critério exigido no teste e experimental, um deles foi eliminado, por
foram eliminados do estudo. avaliar todos os choques do gerador com
notas menores que oito. Assim, oito par-
Consequentemente, nove participantes se- ticipantes seguiram para a próxima fase.
guiram para a próxima etapa, de seleção da Sete outros participantes constituíram um
intensidade do choque. Essa tarefa serviu Grupo Controle. Esses realizaram todas as
para calibrar a intensidade individual do etapas do experimento, exceto o treino de
choque elétrico. Esse estímulo precisava ser múltiplos exemplares.
de intensidade forte e desconfortável, mas

2
O galvanômetro é um instrumento que serve para medir a diferença Treino de Múltiplos Exemplares
de potencial elétrico entre dois pontos. Não são todos os participantes
expostos à avaliação do índice eletrodermal que mostram um respon- Nesse treino, um de três estímulos sem
der suficiente para realização de experimentos. Isso se dá devido a di-
versas características individuais da pele dos participantes. Dessa for- sentido (A, B ou C) eram apresentados no
ma, é comum nesse tipo de experimento, inicialmente, expor o sujeito
a uma avaliação para certificar que será possível coletar os dados com
topo da tela juntamente de três estímulos
aquele participante. Um dos testes realizados, o de explosão do balão
(Levis & Smith,1987) é um dos mais comumente realizados, e consiste
de comparação idênticos, que só variavam
em apenas verificar o efeito no índice eletrodermal diante da explosão em seu tamanho (e.g., uma bola pequena,
de um balão, que estava sendo enchido pelo participante de olhos ven-
dados. Se a alteração possuir uma magnitude mínima, no caso do expe- uma média e uma grande), apresentados na
rimento aqui descrito de 2 micromhos, ele estaria apto a participar. Do
contrário, o participante seria descartado do experimento. parte inferior. Diante do estímulo A, a esco-

190
Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

lha correta seria o estímulo de comparação Treino e teste de transformação


de menor dimensão; diante de B, a escolha evocativa da resposta de pressão à
correta seria o estímulo de comparação com barra de espaços do computador
dimensão média; e diante de C a escolha Nesta etapa, os participantes foram instruí-
correta seria o de maior dimensão - como dos a pressionar a barra de espaço do com-
pode ser visto na Figura 1. Antes de iniciar a putador em uma frequência estável na pre-
tarefa, o participante foi informado que de- sença do estímulo B (médio). Eles também
veria selecionar um dos estímulos na parte foram informados que deveriam pressionar
inferior da tela e receberia feedback sinali- a barra de espaços durante todo o tempo
zando se sua escolha havia sido correta ou em que esse estímulo fosse apresentado na
incorreta. Durante o treino, foram usados tela do computador e que não haveria ne-
múltiplos conjuntos de estímulos de mes- nhum feedback para essa resposta. Por fim,
ma forma, porém com tamanhos relativos foram avisados que, uma vez que a frequ-
diferentes .(e.g., triangulo pequeno, médio e ência estivesse estável, outros estímulos se-
grande; quadrado pequeno, médio e grande riam apresentados na tela do computador;
etc.). Depois de aprender a responder cor- sua tarefa era pressionar a barra na frequ-
retamente para 12 conjuntos de estímulos ência que achassem apropriada para cada
distintos, três novos conjuntos foram apre- estímulo apresentado na tela. Após essas
sentados em tentativas de teste, ou seja, instruções, por modelação, o experimenta-
sem feedback para as respostas dos parti- dor pressionava a barra uma vez por segun-
cipantes. O objetivo dessa fase era verifi- do durante 30 segundos, com o estímulo B
car que os estímulos A, B e C continuariam presente na tela do computador. Seguindo
evocar respostas de escolha do comparação essa tentativa, o participante foi solicitado
menor, mediano e maior, respectivamente, responder da mesma maneira que o expe-
mesmo quando novos estímulos eram apre- rimentador. As tentativas foram repetidas
sentados e o feedback era retirado. Caso os até que o participante respondesse três ve-
participantes apresentassem uma alta por- zes seguidas mantendo uma frequência de
centagem de acertos no teste ( > 96%), pros- respostas constantes (dentro de mais ou
seguiam para outra etapa do estudo. menos 10% das respostas na tentativa ante-
rior). Mantida a estabilidade da taxa de res-
posta, os participantes foram expostos aos
testes, em que o estímulo B foi apresenta-
do quatro vezes e sucedido pelos estímulos
Figura 1. Figura baseada na Figura 1 de Dougher et. al. (2007), exempli-
A, B (novamente) e C. Essa fase tinha por
ficando um dos conjuntos de estímulos de comparação presentes no objetivo verificar se participantes modifica-
treino de múltiplos exemplares. No topo encontram-se os estímulos
A, B e C que sinalizariam a escolha dos comparações com dimensões, ram a taxa de resposta de forma consistente
menor maior e média respectivamente. As posições dos comparações
variavam a cada tentativa. com o treino relacional realizado anterior-

191
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

mente. Será que a taxa de pressão à barra estímulo B, de forma idêntica, foi apresen-
em A e em C foi, respectivamente, menor e tado no centro da tela o estímulo A; após a
maior se comparada a taxa apresentada na sua apresentação, um choque elétrico com
presença do estímulo B? Vamos descrever a metade da voltagem de B foi apresentado.
última etapa do procedimento e descobrire- Após novo intervalo de 90s, o estímulo C
mos os resultados a seguir. foi apresentado, mas sem nenhum choque.
A ordem foi sempre a mesma descrita aqui,
B por seis vezes, seguido de A, B e C. As-
Pareamento e teste transformação sim como na pressão à barra, será que os
de função eliciadora da resposta índices eletrodermais foram modulados de
galvânica da pele forma coerente com o treino relacional? Ou
Na última etapa, ocorreu o pareamento do seja, será que a ativação da condutância
choque elétrico com o estímulo B e o tes- elétrica da pele foi maior para C do que para
te de transformação de função eliciadora. B, mesmo na ausência de qualquer parea-
Nessa etapa, os participantes foram instru- mento direto de C com o choque?
ídos que estímulos seriam apresentados na
tela do computador e eles receberiam cho-
ques. Eles não precisariam fazer nada, ex- Resultados e Discussão
ceto prestar a atenção nos estímulos apre- Todos os oito participantes do grupo expe-
sentados. Após as instruções, o participante rimental aprenderam a tarefa relacional, ou
permanecia sentado por cinco minutos e seja, responderam consistentemente aos
seu índice eletrodermal era registrado por estímulos apresentados inicialmente no
esse período como linha de base. O estímu- topo da tela (A = escolha o menor; B = esco-
lo B deveria adquirir a função de um estí- lha o médio; C = escolha o maior). A primei-
mulo aversivo condicionado, graças ao seu ra medida de interesse foi a frequência de
pareamento consistente com um choque pressão à barra no teste que apresentava os
elétrico. Nesse pareamento, o estímulo B foi estímulos A, B e C. Para todos os oito par-
exibido por 30 segundos na tela do compu- ticipantes do grupo experimental, a taxa de
tador e quando removido, foi apresentado o resposta diante de A e C refletiu os efeitos
choque elétrico. Esse condicionamento foi do treino relacional, ou seja, a taxa apresen-
realizado por seis vezes. tada em A e em C foi menor e maior do que
em B. Para dois participantes, a diferença
Essas tentativas de condicionamento ti- foi pequena, mas ocorreu de forma coe-
nham intervalo entre tentativas de 90s, para rente com o treino realizado. Porém, para
que os índices de condutância da pele pu- os seis outros participantes, a diferença foi
dessem ser estabilizados. Após o intervalo bem grande, em alguns casos até dobrando
da última tentativa de condicionamento do a frequência de respostas ao se comparar A

192
Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

com B e B com C. Um resultado totalmen- choque. Apenas um participante do grupo


te diferente foi observado nos dados dos controle mostrou respostas maiores em A
sete participantes do grupo controle. Esses do que em B e para B em comparação a C.
participantes realizaram todas as etapas do
experimento, exceto o treino de múltiplos Os resultados tanto da resposta de pressão
exemplares, ou seja, não aprenderam A < B à barra como dos índices eletrodermais fo-
< C. Apenas um dos sete apresentou dados ram realmente surpreendentes nesse estu-
coerentes com o treino relacional, com uma do. Podemos destacar apenas duas limita-
diferença mínima entre o número de res- ções nesse procedimento: a quantidade de
postas emitidas. tentativas nos testes de transformação de
funções e a ordem dos testes. Apenas uma
A segunda medida de interesse foi o resul- tentativa foi realizada para cada teste e
tado dos testes de índices eletrodermais sempre na mesma ordem, tanto no teste da
diante de A e C. Os índices foram obtidos resposta de pressão à barra (após a estabili-
subtraindo o menor índice eletrodermal ob- dade, uma tentativa de teste para cada es-
servado durante os 30 segundos que pre- tímulo, A, B e C), como também na medida
cederam a apresentação do estímulo do do índice eletrodermal (primeiro, uma para
maior índice durante os 30 segundos de A e, em seguida, uma para C).
apresentação do estímulo. Não custa lem-
brar que os choques elétricos apresentados Em relação as pressões à barra, os autores
com a retirada dos estímulos B e A ocorre- mencionam que poderiam ter realizado um
ram sempre depois desta medida ser efetu- número maior de tentativas de teste, con-
ada. Os oito participantes do grupo controle tudo isso não ocorreu. Em relação ao índice
responderam de forma coerente com o trei- eletrodermal, múltiplas apresentações po-
no relacional realizado. Os autores relatam deriam interferir nos respondentes obser-
que, diante da apresentação do estímulo vados, alterando a condutância da pele dos
C, muitos deles ficavam assustados, e um participantes; portanto, os autores decidi-
deles chegou a tentar remover os eletrodos ram por uma única tentativa de teste. Em
de choque do seu braço. Além disso, vários relação à ordem dos testes, os experimenta-
participantes desse grupo relataram que dores já estavam usando o limite eticamen-
acreditavam que receberiam um choque te permitido para o choque. Não apresen-
mais forte, após a apresentação do estímulo tar o choque seguido do estímulo durante o
C. Esse tipo de resultado não foi observado teste poderia gerar um processo de extinção
para nenhum dos participantes do Grupo respondente. Como teriam que apresentar
Controle. Para cinco dos sete participantes, um choque, e não poderiam dar um choque
a resposta de maior magnitude foi diante mais forte que o que seguia B (incômodo,
do estímulo B, diretamente pareado com o mas não doloroso), as únicas opções seriam

193
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

apresentar um choque menor para A ou um arbitrárias de comparação entre círculos


choque de intensidade igual a B para C. A coloridos de mesmo tamanho. Esse treino
segunda opção poderia afetar as respostas tinha por objetivo estabelecer um “ranking
que seriam apresentadas em seguida diante de tamanho” entre quatro círculos colo-
do estímulo A. Por essa razão, C foi escolhi- ridos. Para isso, o estímulo A (menor) era
do para ser testado sempre por último. apresentado no topo da tela junto de dois
circulos apresentados na parte inferior.
Nesse primeiro experimento, os estímulos Como A representava a dica “escolha o
A, B e C exerceram o papel de dicas contex- menor”, as respostas corretas seriam as se-
tuais relacionais (nesse caso, de compara- guintes: o círculo verde seria menor que o
ção) sinalizando a seleção do estímulos de roxo, o roxo menor que o azul e o azul me-
comparação, menores, médios e maiores. nor que o vermelho (verde < roxo < azul <
Contudo, o treino relacional foi baseado vermelho). Uma representação dessas rela-
em propriedades físicas dos estímulos, já ções pode ser observada na Figura 2. Dessa
que os estímulos de comparação tinham forma, se estivessem presentes na tela ver-
dimensões diferentes. Para verificar se os de e roxo (sempre na presença do estímulo
mesmos estímulos A, B e C possibilitariam A, no topo), a escolha do círculo verde seria
o estabelecimento de relações arbitrárias seguida da apresentação da palavra “corre-
de comparação entre estímulos, o segun- to”, enquanto a escolha do roxo seguida da
do experimento foi realizado empregando palavra “incorreto”.
estímulos de comparação com dimensões
idênticas.

Experimento 2- Objetivo e Método


Treino de Múltiplos Exemplares
No Experimento 2, seis participantes uni-
versitários foram expostos a três etapas. Na
primeira delas, foi realizado um treino de
múltiplos exemplares exatamente igual ao
Figura 2. Figura baseada na Figura 4 de Dougher et al (2007), exem-
Experimento 1. plificando tentativas presentes no treino relacional do Experimento 2.
Na parte superior, tentativas de treino. Na parte inferior, tentativas de
teste.

Treino relacional com círculos colo- As tentativas foram apresentadas aleato-


ridos riamente. O treino foi realizado até que os
Nesta etapa, os estímulos A, B e C foram participantes respondessem de forma cor-
então utilizados para estabelecer relações reta a doze tentativas consecutivas. Depois

194
Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

de atingir esse critério de aprendizagem, os tiplos exemplares ensinou aos participan-


participantes foram expostos a um teste. tes as seguintes dicas: “diante de A, escolha
Durante esse teste, um dos três estímulos o menor”, “diante de B, escolha o médio”,
A, B ou C seria apresentado no topo da tela, “diante de C, escolha o maior”. A partir do
com três dos quatro círculos na parte infe- ensino dessas dicas contextuais que passa-
rior. Nenhuma consequência foi apresenta- ram a evocar respostas de comparação ba-
da nesse teste. Os participantes deveriam seadas em propriedades físicas, foi possível
responder escolhendo o círculo relativa- ensinar relações de comparação não mais
mente “maior”, “menor” ou “médio”, a partir baseadas em dimensões físicas (o tama-
do ranking ensinado no treino anterior (ver- nho dos estímulos), e sim relações em uma
de < roxo < azul < vermelho). O teste apre- convenção determinada pela programação
sentava 18 tentativas, e caso o participante do experimentador. Por isso, dizemos que
respondesse a todas corretamente, seguiria a relação entre os círculos (que tinham o
para a terceira etapa. mesmo tamanho) eram relações arbitrárias
de comparação, e que as dicas contextuais
foram arbitrariamente aplicadas à situação
Teste de transformação de função com os círculos para estabelecer o ranking
evocativa da resposta de pressão à entre eles. A pergunta, agora um pouco
barra mais complexa, envolve saber se relações
A última etapa do Experimento 2, foi prati- arbitrárias de comparação “verde < roxo <
camente igual ao treino e teste de pressão a azul < vermelho” também determinariam
barra realizado no Experimento 1, com uma diferentes taxas de pressão à barra de espa-
pequena mudança: o estímulo que foi utili- ços na presença dos círculos.
zado para o treino de pressão à barra, não
foi o B, e sim o círculo roxo. Além disso, os No teste de pressão à barra, cinco dos seis
círculos verde e azul, foram utilizados no participantes responderam de forma coe-
teste, em vez dos estímulos A e B. rente com o treino relacional arbitrário es-
tabelecido entre os círculos, ou seja, frequ-
ências menores foram observadas diante do
Resultados e Discussão verde e frequências maiores diante do azul,
Os seis participantes foram capazes de re- se comparadas à frequência observada na
alizar o treino de múltiplos exemplares e presença do estímulo roxo. Apesar dos re-
também o treino relacional com os círculos sultados consistentes, os autores afirmam
coloridos. Esse tipo de procedimento é um que existe uma chance (muito pequena) de
análogo de como aprendemos a relacionar as funções transformadas nos experimen-
eventos do ambiente de modo arbitrário, tos 1 e 2 não serem baseadas em relações
baseado em convenções. O treino de múl- derivadas entre os modelos, mas em as-

195
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

sociações com as características não arbi- Encerrada essa etapa, sem qualquer instru-
trárias dos estímulos de comparação. Para ção, novas tentativas foram adicionadas.
investigar a ocorrência dessa possibilidade, Tais tentativas já correspondiam ao teste
novos estímulos foram adicionados inves- dessa segunda fase. Essas tentativas novas,
tigando relações de comparações entre os tinham o mesmo formato da primeira fase
modelos. com os números, mas esses números foram
substituídos pelas dicas contextuais do trei-
no de múltiplos exemplares (A, B e C), o que
Experimento 3 - Objetivo e Método pode ser observado no segundo painel da
Treino de Múltiplos Exemplares Figura 4. Esse procedimento foi executado
O Experimento 3 foi conduzido com sete por 18 tentativas.
participantes e consistiu apenas de duas
fases. A fase inicial foi exatamente igual ao
treino de múltiplos exemplares dos Experi-
mentos 1 e 2. Figura 3. Figura baseada na Figura 7 de Dougher et al. (2007), exempli-
ficando as tentativas de testes do Experimento 3.

Após essas tentativas, novos estímulos


Teste arbitrário de relações de com- foram introduzidos, inicialmente como
paração comparações e, mais tarde, como mode-
Nesta etapa, os participantes foram expos- los. Nesse teste, os pesquisadores queriam
tos a tentativas que apresentavam, na parte verificar se os participantes iriam inferir
de cima da tela do computador, um núme- esse ranking de estímulos abstratos basea-
ro; na parte central um símbolo de “menor dos nas relações aprendidas anteriormen-
que”, “maior que” ou “igual”; e na parte in- te. Exemplos dessas tentativas finais estão
ferior três outros números. Uma represen- apresentados no terceiro e quarto painéis
tação dessas tentativas pode ser observada da Figura 4. As novas figuras adiciona-
no painel da esquerda da Figura 3. Os par- das iriam acrescentar novos elementos ao
ticipantes foram instruídos que deveriam ranking original, aumentando o número de
“ler” a tela, como se colocassem o núme- estímulos relacionados (A-- < A- < A < B <
ro na parte superior à esquerda do sinal e C < C+ < C++). A cada estímulo novo apre-
um dos números na parte inferior à direi- sentado nesse teste, apenas uma resposta
ta do sinal. Além disso, foram informados poderia ser considerada correta. Esse novo
que deveriam escolher o número na parte ranking foi apresentado em cinco tipos de
de baixo que tornasse essa “equação” ver- tentativas diferentes: (1) A<B<C; (2) A- < A <
dadeira. O critério de encerramento dessa B; (3) A-- < A- < A; (4) B< C <C +; (5) C< C+ <
fase foi que os participantes apresentassem C++. Cada tipo de tentativa foi apresentado
seis tentativas corretas consecutivamente. seis vezes sem nenhum feedback.

196
Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

Resultados e Discussão DESDOBRAMENTOS


Todos os sete participantes realizaram o
treino de múltiplos exemplares. Eles ne- Demonstrações robustas dos efeitos da
cessitaram do número mínimo de estímu- aprendizagem de relações arbitrárias entre
los para aprenderem a função das três di- estímulos têm proporcionado à Teoria das
cas contextuais A, B e C. Na Fase 2 desse Molduras Relacionais, uma explicação fun-
procedimento, dois dos sete participantes cional de diversos comportamentos huma-
responderam corretamente a todas as ten- nos complexos (Zettle et al, 2016; Stewart,
tativas do teste. Outros três participantes 2015; Dymond & Roche, 2013; Barnes-Hol-
responderam corretamente a todas as ten- mes, Barnes-Holmes, McHugh & Hayes,
tativas de quatro dos cinco tipos de testes e 2004). Essas explicações têm proporciona-
apresentaram índices superiores a 80% no do a inserção, o estudo e a intervenção da
restante. Apenas um participante apresen- Análise do Comportamento em diversas
tou resultados menos consistentes nesses áreas relevantes da Psicologia. Uma des-
testes, acertando em média 72% das tentati- sas áreas é a aplicação clínica. A transfor-
vas e com três dos cinco tipos de tentativas mação de funções na perspectiva da RFT
com critérios abaixo de 80%. O resultado ro- tem proporcionado avanços importantes
busto e coerente com as tentativas testadas em estudos sobre Ansiedade (Luciano et
na etapa final desse procedimento mostra al, 2013; Luciano et al 2014), Delírios Perse-
que os procedimentos de treino relacional cutórios (Stewart, Hughes & Stewart, 2017),
estabeleceram relações derivadas entre os Ideação Suicida (Hussey, Barnes-Holmes
estímulos presentes no treino. Esse resul- & Booth, 2016), Anedonia Social (Vilarda-
tado permite, segundo os autores, observar ga, Estévez, Levin & Hayes, 2012), Desam-
que, além de transformar as funções como paro Aprendido (Hooper & McHugh, 2013),
notado nos experimentos descritos ante- entre outros. Além disso, a RFT tem sido
riormente, o procedimento realizado no Ex- aplicada na explicação funcional da psi-
perimento 3 permitiu o estabelecimento de copatologia (Dymond, Roche, & Bennett,
uma rede relacional arbitrária entre novos 2013; Wilson, Hayes, & Zettle, 2001), bem
estímulos. Esses novos estímulos nunca fo- como no desenvolvimento de propostas de
ram pareados ou apresentados juntamente modelos de intervenções clínicas (Törneke,
com os estímulos que possuíam diferenças 2010; Törneke, Luciano, Barnes-Holmes, &
em sua dimensão. Todas essas relações adi- Bond, 2016; Villatte, Villatte, & Hayes, 2016).
cionais foram estabelecidas arbitrariamen- Nesse último caso, a RFT tem sido uma fer-
te. ramenta importante no entendimento dos
efeitos comportamentais de diferentes téc-
nicas utilizadas na ACT (Acceptance and
Commitment Therapy, Hayes, Strosahl,

197
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

Wilson, 1999), tanto em investigações in- donia (Villatte, Monestès, McHugh, Frei-
terpretativas (e.g., Foody, Barnes-Holmes, xa i Baqué, & Loas, 2008) e esquizofrenia
Barnes-Holmes, Törneke, Luciano, Stewart, (Villatte, Monestès, McHugh, Freixa i Ba-
& McEnteggart, 2014) quanto experimentais qué, & Loas, 2010) Diversos outros trabalhos
(e.g., Foody, Barnes-Holmes, Barnes-Hol- foram desenvolvidos para avaliar e intervir
mes, Rai, & Luciano, 2015; Foody, Barnes- na Tomada de Perspectiva sob a ótica da
-Holmes, Barnes-Holmes, & Luciano, 2013; RFT (e.g., Lovett & Rehfeldt, 2014; McHugh,
Luciano et al., 2014; Gil-Luciano, Ruiz, Val- Barnes-Holmes, & Barnes-Holmes, 2004;
divia-Salas, & Suárez-Falcón, 2016). Rehfeldt, Dillen, Ziomek, & Kowalchuck,
2007).
A RFT também tem sido utilizada para
abordar problemas relacionados ao desen- Outra área muito relevante em que o estudo
volvimento. Uma dessas temáticas é a In- desses fenômenos tem contribuído grande-
teligência, em que métodos baseados em mente é a das questões sociais, amplamente
responder relacional têm sido repetida- conhecidas por psicólogos cognitivos como
mente comprovados como efetivos para atitudes implícitas, permitindo o estudo de
melhora do desempenho em testes de QI preconceitos, estigmatização social e prefe-
(Cassidy, Roche, Colbert, Stewart & Grey, rências. A transformação de funções permi-
2016; Cassidy, Roche & Hayes, 2011; O´To- te uma explicação comportamental precisa
ole, Barnes-Holmes, Murphy, O´Connor & desses fenômenos sociais e diversos estu-
Barnes Holmes, 2009). Outro tema que, até dos permitiram a investigação e o desen-
recentemente, era investigado apenas por volvimento de instrumentos para mensu-
psicólogos cognitivos e recebeu uma inter- ração de sua força (Hughes, Barnes-Holmes
pretação comportamental via RFT, é a To- & Vahey, 2012; Barnes-Holmes, Murphy &
mada de Perspectiva. Os comportamentos Barnes-Holmes, 2010; Barnes-Holmes, Bar-
relacionados à tomada de perspectiva po- nes-Holmes, Stewart & Boles, 2010; Mizael,
dem ser entendidos resumidamente como a de Almeida, Silveira & de Rose, 2016).
capacidade de assumir a perspectiva de ou-
tro, permitindo inferir suas crenças, emo- Esses e muitos outros temas relevantes
ções e desejos (Carpendale & Lewis, 2006). têm sido investigados recentemente (e.g.
Esse repertório é de suma importância para analogias, regras e instruções, gerativida-
nossa vida social, e déficits nesses compor- de e desenvolvimento linguagem) a partir
tamentos têm sido correlacionados com da perspectiva da RFT (ver, Stewart, 2015).
problemas de relacionamento interpesso- Portanto, podemos entender que essa nova
al e até mesmo com autismo (e.g., Ranick, interpretação do comportamento verbal
Persicke, Tarbox, Kornack, 2013; Rehfeldt, tem permitido uma explicação integrada de
Dillen, Ziomek, & Kowalchuk, 2007) , ane- vários comportamentos humanos comple-

198
Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

xos, baseada na aprendizagem relacional (ainda mais) eventos com os quais nunca
derivada. Essa abordagem funcional da lin- tivemos uma experiência aversiva direta
guagem tem permitido a investigação ana- e também como eventos aversivos podem
lítico comportamental de vários temas que ser categorizados por comparação, tal como
por muito tempo foram acessíveis apenas observado nos procedimentos de exposição
aos leitores interessados em outras aborda- realizados em terapia.
gens psicológicas.
Os estudos da transformação de função
ainda não são tão numerosos, e, assim, al-
CONSIDERAÇÕES FINAIS gumas relações receberam pouca atenção
dos pesquisadores, como é o caso de rela-
O experimento de Dougher e colaboradores ções espaciais ou relações hierárquicas de-
(2007) pode ser considerado um marco im- rivadas. Novos trabalhos têm surgido com
portante para o estudo da aprendizagem re- uma velocidade muito grande, e o entendi-
lacional derivada. Esse trabalho, junto com mento da cognição humana a partir desses
inúmeros outros da mesma época (para parâmetros comportamentais tem capaci-
uma revisão, ver Dymond, May, Munnelly, tado a Análise do Comportamento com um
& Hoon, 2010), permitiu que analistas do instrumental novo e abrangente.
comportamento se aventurassem a inves-
tigar e explicar fenômenos relacionados à O avanço do estudo da aprendizagem de-
linguagem e à cognição antes circunscritos rivada, isto é, de como esse tipo de respon-
somente a outras abordagens da psicologia. der relacional derivado amplia as possibi-
Isso ocorreu, especialmente, pela compre- lidades de aprendizagem humanas, tem se
ensão dos processos comportamentais que apresentado recentemente como uma linha
permitem a aquisição indireta de funções de pesquisa muito promissora. Para alguns
de estímulo via participação em redes de pesquisadores, o desenvolvimento dessa
relações arbitrárias. Tal noção possibilitou explicação da linguagem e cognição huma-
que um olhar analítico-comportamental na pode representar uma maior integração
fosse legítimo também em situações nas das vertentes básicas e aplicadas da Análise
quais uma história de aprendizado direta, do Comportamento, como também maior
via pareamento ou contingências de refor- inserção e impacto na Psicologia em geral
ço, parecia ausente, sendo as causas atri- (Hayes & Bernes, 2004).
buídas à mecanismos mentais (cognitivos).
Uma estrapolação dos dados obtidos no es- Conhecer o “poder” que a linguagem pode
tudo de Dougher et al. (2007) permite, por exercer – ampliando enormemente nossa
exemplo, compreender como são constru- interação com o ambiente - é essencial para
ídas as fobias, como aprendemos a temer o entendimento completo das contingên-

199
João Henrique de Almeida, William Ferreira Perez

cias a que nós seres humanos somos ex- junto de cinco experimentos em que são
postos. Pode parecer “magia” algo extrema- avaliadas relações de comparação, similari-
mente não científico. Porém, a proposta da dade e oposição entre diferentes conjuntos
RFT, apesar de nova, possui evidências ro- de estímulos (pokémons, produtos fictícios
bustas e mostra como a ciência pode auxi- e prêmios potenciais) Os efeitos de trans-
liar no entendimento deste fenômeno, para formação de função foram evidentes para
alguns inacessível ou “fantástico”. Como um conjunto diferente de medidas compor-
toda perspectiva recente, sabemos que ain- tamentais, explícitas e implícitas.
da há muito a ser feito, então, mãos à obra!
Perez, Nico, Kovac, Fidalgo, & Leonardi,
(2013) e de Rose, & Rabelo (2012). Textos
PARA SABER MAIS introdutórios sobre a Teoria das Molduras
Relacionais em língua portuguesa.
Perez, de Almeida, & de Rose (2015). Nesse
estudo, os pesquisadores ensinaram redes
relacionais de similaridade e oposição e ob- REFERÊNCIAS
servaram resultados consistentes de trans-
formação de funções emocionais avaliadas Barnes-Holmes, Y., McHugh, L., & Barnes-
por instrumentos de avaliação implícita e -Holmes, D. (2004). Perspective-taking and
explícita. Theory of Mind: A relational frame accou-
nt. The Behavior Analyst Today, 5, 15–25.
Perez, Nico, Leonardi, & Kovac (2015).
Nesse estudo, os pesquisadores mostraram Barnes-Holmes, D., Barnes-Holmes, Y.,
a transferência de função de dica contex- Stewart, I. & Boles, S. (2010) A sketch of the
tual relacional em um procedimento com implicit relational assessment procedure
diversas variações, demonstrando a flexibi- (IRAP) and the elaboration and coherence
lidade do controle contextual. (REC) model. The Psychological Record, 60,
527-542
Gil, Luciano, Ruiz, & Valdivia-Salas (2012).
Esse estudo é uma das proposições iniciais Barnes-Holmes, D., Murph, A., & Barnes-
para o estabelecimento de relações hierár- -Holmes, Y. (2010) The implicit relational
quicas entre estímulos. Além disso, ele in- assessment procedure: exploring the im-
vestiga os efeitos da transformação de fun- pact of private versus public contexts and
ções em diferentes níveis hierárquicos. the response latency criterion on pro-whi-
te and anti-black stereotyping among Irish
Hughes, Barnes-Holmes, De Houwer, de individuals. The Psychological Record, 60,
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Capítulo XII | Teoria das Molduras Relacionais

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204
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

Quando o mundo interage


com o que é dito sobre o
mundo: o comportamento
governado por regras

Carlos Eduardo Costa


Universidade Estadual de Londrina

Carlos Renato Xavier Cançado


Universidade de Brasília

Galizio, M. (1979). Contingency-shaped and rule-governed behavior: Instructional control of


human loss avoidance. Journal of Experimental Analysis of Behavior, 31, 53-70.

“A coisa mais certa de todas as coisas, não vale um caminho sob o sol”
Caetano Veloso

205
Capítulo XIII | Comportamento Governado por Regras

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- sob o controle estrito de regras: O indivíduo


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO pode seguir as instruções descritas em um
DO EXPERIMENTO livro de receitas ou mesmo o que diz outro
indivíduo sobre preparar a refeição.
A evolução do comportamento ver-
bal permitiu outras formas de controle do Regras em forma de instruções, con-
comportamento de um indivíduo pelo com- selhos, recomendações, sugestões, avisos, e
portamento de outros indivíduos, sobretudo ordens, são utilizadas para ensinar e pres-
quando é impossível ou improvável o con- crever comportamentos nas mais diversas
tato físico entre eles (Skinner, 1957/1978, situações, como cozinhar, operar um equi-
1986). Grande parte do comportamento pamento eletrônico, resolver um problema
humano ocorre sob o controle de regras1, em determinada área do conhecimento,
que são descrições das contingências de re- comportar-se em determinados contextos
forçamento e punição em vigor em deter- sociais ou dirigir um veículo. Não apren-
minado ambiente (Skinner, 1969). Skinner demos a dirigir um carro simplesmente
(e.g., 1969, 1974) distinguiu o comportamen- sentando atrás do volante, ligando o carro
to modelado pelas contingências do com- e acelerando. Primeiramente, somos ins-
portamento governado por regras. O com- truídos a como proceder. Da mesma forma,
portamento modelado pelas contingências aprendemos a cozinhar ou a tocar instru-
é função das modificações que produz no mentos musicais com um forte auxílio do
ambiente, isto é, de suas consequências. O controle por regras. O controle por regras
comportamento governado por regras, no pode facilitar a seleção de novos compor-
entanto, ocorre primariamente sob o con- tamentos porque esses comportamentos
trole de antecedentes verbais, isto é, das novos podem ocorrer sem que o indivíduo
descrições das contingências de reforça- tenha que passar por uma longa história de
mento e punição em vigor, feitas pelo indi- exposição às contingências (Catania, 1999;
víduo que se comporta, ou por outro indiví- Cerutti, 1989; Matos, 2001; Skinner, 1969,
duo. Preparar uma refeição, por exemplo, 1974). Imagine o quão difícil seria (para você
pode ocorrer primariamente sob controle e para os outros!) aprender a dirigir um carro
das contingências em vigor e da consequ- sem nenhuma instrução e apenas por expo-
ência de ter o alimento pronto. No entanto, sição direta às contingências! Apesar disso,
o comportamento de indivíduos que não quando o comportamento está sob o con-
possuem uma história de aprendizagem re- trole estrito das regras, diz-se que o com-
lacionada a preparar refeições pode ocorrer portamento é “insensível” às suas consequ-
ências (cf. Madden, Chase, & Joyce, 1998).
Isto é, o comportamento pode não se alterar
1
No presente capítulo os termos “regra” e “instrução” serão utilizados
como sinônimos. quando há alterações nas contingências de

206
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

reforçamento e punição (Catania, 1999; Ga- 2009; Bentall, Lowe, & Beasty, 1985; Calixto,
lizio, 1979; Lowe, 1979). Ponce, & Costa, 2014; Catania, Matthews, &
Shimoff, 1982; Hayes, Brownstein, Haas, &
Diversos estudos experimentais so- Greenway, 1986; Lowe, Beasty, & Bentall,
bre o comportamento governado por regras 1983; Matthews, Catania, & Shimoff, 1985;
foram conduzidos após a publicação de aná- Okouchi, 1999; Rosenfarb, Newland, Bran-
lises teóricas feitas por Skinner (1957/1978) non, & Howey, 1992; Shimoff, Catania, &
no livro “O Comportamento Verbal” e pelo Matthews, 1981). Vejamos, então, como fo-
autor (1969) no capítulo “Uma análise ope- ram os experimentos conduzidos por Gali-
rante da resolução de problemas” (ver tam- zio.
bém Skinner, 1974; para revisões da litera-
tura ver Albuquerque & Paracampo, 2010;
e Teixeira Júnior, 2009). Dentre esses es- DESCRIÇÃO DOS EXPERIMEN-
tudos, destaca-se uma série de quatro ex- TOS
perimentos conduzida por Galizio (1979).
Baseado principalmente em considerações Experimento 1 - Objetivo e Método
teóricas feitas por Skinner (1974), Galizio O objetivo desse experimento foi
chegou à seguinte proposição: Se as teorias analisar o efeito de instruções acuradas
comportamentais sobre o porquê as pesso- sobre o comportamento. Instruções acu-
as seguem instruções estiverem corretas, radas descrevem adequadamente as con-
então “o seguimento de instruções deve tingências em vigor (i.e., são verdadeiras) e
ser influenciado pelo reforço [de seguir ins- segui-las garante a obtenção dos reforços
truções], ser sujeito à extinção e deve ficar programados. O experimento foi conduzi-
sob controle discriminativo” (p. 54). Se isso do com seis universitários e o equipamento
ocorresse, poderíamos dizer que seguir re- consistiu em um painel contendo uma sé-
gras é comportamento operante. rie de lâmpadas e uma alavanca (ver Baum,
2006, p. 169 para uma representação gráfica
Os resultados obtidos por Galizio do equipamento ). No início das sessões os
(1979) lançaram luz sobre algumas variáveis participantes eram instruídos que tinham
determinantes do comportamento gover- U$ 2,00 de crédito e deviam evitar a perda
nado por regras. Além disso, seu procedi- de dinheiro. A resposta sob análise era girar
mento estabeleceu as bases para análises a alavanca 45o para a direita e essa respos-
experimentais do comportamento governa- ta adiava a perda de dinheiro (i.e., U$ 0,05)
do por regras conduzidas desde então (e.g., que era sinalizada por uma luz vermelha e
Albuquerque, de Souza, Matos, & Paracam- um som. Este é um procedimento de refor-
po, 2003; Athayde Neto, Costa, & Banaco, çamento negativo descrito como “esquiva”,
2015; Baumann, Abreu-Rodrigues, & Souza, em que o comportamento adia ou evita a

207
Capítulo XIII | Comportamento Governado por Regras

apresentação de determinada consequên- ção Sem Instrução, SI). Em outra condição,


cia (e.g., perdas de pontos ou dinheiro, ad- instruções acuradas sobre as contingências
ministração de choque elétrico; Sidman, em vigor em cada componente do múltiplo
1953). foram dadas aos participantes (Condição
com Instrução, I): Rótulos que descreviam
Os participantes foram expostos a o tempo que cada resposta adiava a perda
um programa de reforço múltiplo com qua- de pontos (i.e., “10 s”, “30 s” e “60 s”; o com-
tro componentes. Cada componente era ponente sem perdas era indicado pelo rótu-
sinalizado por uma de quatro luzes de cor lo “NO LOSS”) foram adicionados acima de
âmbar e ocorria aleatoriamente uma vez cada luz âmbar no painel. Após exposição
por sessão. A duração de cada componente de cada participante às duas condições, os
era de 12,5 min.. Acima de cada luz âmbar, rótulos eram retirados e a posição das luzes
podiam ser colocados rótulos que descre- âmbar, que indicavam qual componente do
viam as contingências de esquiva em vigor múltiplo estava em vigor, eram alteradas, e
(i.e., as regras). Em um componente, per- replicações das condições SI e I foram con-
das de dinheiro não ocorriam. Nos outros duzidas. Quatro participantes iniciaram o
três componentes, as perdas de dinheiro experimento pela Condição SI (i.e., três fo-
ocorriam a cada 10 s na ausência de respos- ram expostos à sequência de condições SI-
tas. Além disso, nesses três componentes, -I-SI e outro à sequência SI-I) e dois pela
as respostas adiavam as perdas de dinhei- Condição I (i.e., um participante foi exposto
ro por 10 s, em um componente, por 30 s, à sequência de condições I-SI-I-SI e outro
em outro, e por 60 s, no outro componen- apenas à sequência I-SI).
te. No início do experimento, os partici-
pantes foram instruídos que cada vez que
a luz vermelha acendesse, cinco centavos Resultados e Discussão
seriam subtraídos dos dois dólares que eles Em procedimentos de esquiva, ob-
teriam de crédito no início da sessão. Os serva-se uma relação inversa entre a taxa
participantes foram informados que girar a de respostas e a duração do intervalo em
alavanca para a direita adiaria a apresenta- que respostas adiam a apresentação de
ção da luz vermelha e as perdas de dinheiro, consequências (Sidman, 1953). Assim,
mas não sobre o tempo que cada resposta quanto maior esse intervalo, menor a taxa
adiaria a perda de dinheiro em cada com- de respostas. Dos quatro participantes que
ponente do múltiplo. iniciaram o experimento pela Condição SI,
uma relação inversa entre a taxa de respos-
Em uma condição, os participantes tas e a duração do intervalo em cada com-
foram expostos ao programa múltiplo de ponente do múltiplo foi observada apenas
reforço na ausência de instruções (Condi- para um participante. Para os outros três

208
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

participantes, a taxa de respostas foi alta o replicação da Condição SI.


suficiente para evitar praticamente todas
as perdas de dinheiro, mas foi indiferencia-
da entre os componentes do múltiplo. Na Experimento 2 - Objetivo e Método
Condição I, independentemente de ter sido No Experimento 1 as instruções da-
a primeira ou a segunda condição a qual o das aos participantes foram sempre acura-
participante foi exposto, todos os partici- das. No Experimento 2, Galizio (1979) estu-
pantes responderam de acordo com o in- dou o efeito de instruções inacuradas sobre
tervalo descrito nos rótulos e observou-se o comportamento. Instruções incacuradas
uma relação inversa entre a taxa de respos- não descrevem adequadamente as contin-
tas e o intervalo em que respostas adiavam gências em vigor (i.e., são falsas) e segui-las
a perda de dinheiro em cada componente. não garante a obetenção dos reforços pro-
gramados. Participaram quatro estudantes
Os resutados desse experimento de- que haviam participado do Experimento
monstraram o controle exercido pelas ins- 1, e o equipamento foi o mesmo utilizado
truções sobre o comportamento humano naquele experimento. Para esses partici-
mantido sob contingências de esquiva. A pantes, o Experimento 1 terminou com a
exposição às contingências na ausência de Condição SI. Por isso, a condição inicial do
instruções acuradas gerou um responder Experimento 2 foi a Condição I (como des-
discriminado para apenas um dos partici- crita anteriormente) por duas ou três ses-
pantes. Quando a Condição SI foi replica- sões. Os participantes foram então expos-
da, três de cinco participantes responderam tos à Condição Sem Contato (SC), na qual
de acordo com os intervalos de adiamento perdas de pontos não ocorriam em nenhum
das perdas de dinheiro em vigor. Portan- componente do múltiplo mas os estímulos
to, houve um efeito da história de seguir discriminativos (luzes âmbar) e as instru-
instruções (Condição I) sobre a exposição ções (rótulos acima das luzes) foram man-
subsequente às mesmas contingências sem tidos. As instruções eram inacuradas nessa
instruções (segunda exposição à Condição condição porque não havia perda de di-
SI). Os resultados para esses três partici- nheiro em nenhum componente do múlti-
pantes sugerem que a exposição às instru- plo (i.e., as respostas não adiavam perdas de
ções facilitaram a ocorrência do comporta- dinheiro). Além disso, os participantes que
mento quando o ambiente se alterou e as seguissem essas instruções não entrariam
instruções estavam ausentes. Para dois par- em contato com essa mudança nas contin-
ticipantes, no entanto, a exposição à instru- gências pois um comportamento eficaz em
ções na Condição I não facilitou a ocorrên- um procedimento de esquiva implica que a
cia do comportamento sob o controle de consequência programada não ocorra.
cada componente do múltiplo durante a

209
Capítulo XIII | Comportamento Governado por Regras

Depois, os participantes foram ex- manutenção do comportamento entre con-


postos à Condição Contato (C). Nessa dições indica o controle por regras; a mu-
condição, as luzes e as instruções perma- dança no comportamento indica o controle
neciam inalterados em relação à condição pelas novas contingências (alternativamen-
SC, mas, em cada componente, perdas de te, pode-se manter as mesmas contingên-
pontos ocorriam a cada 10 s na ausência de cias entre condições, e alterar as instruções
respostas e as respostas adiavam a perda de em vigor em cada condição, e.g., Albuquer-
dinheiro por 10 s. Seguir as instruções, que que, dos Reis, & Paracampo, 2008).
eram também inacuradas nessa condição
(e.g., uma instrução de que respostas adia- Na Condição C, na qual respostas
vam a perda de dinheiro por 30 s enquanto, adiavam a perda de pontos por 10 s em to-
na verdade, adiavam por apenas 10 s), leva- dos os componentes do múltiplo, os parti-
ria a perdas de dinheiro, isto é, a um contato cipantes deixaram de seguir as instruções
com a discrepância entre as instruções as inacuradas. A taxa de respostas foi equi-
contingência em cada componente do múl- valente entre os componentes e próxima
tiplo. Posteriormente, a condição SC foi re- àquela do intervalo de 10 s de perda de pon-
plicada para cada participante. tos da Condição SC anterior. Portanto, o
comportamento de cada participante ficou
sob o controle das contingências em vigor
Resultados e Discussão em cada componente e não das instruções
Na Condição I, uma relação inver- inacuradas. Esses resultados demonstra-
sa entre taxa de respostas e o intervalo em ram que quando seguir uma regra produz
que respostas adiavam perdas foi observa- consequências que não condizem com a
da para cada participante, assim como no descrição presente na regra (e.g., a regra diz
Experimento 1. Na Condição SC, as taxas que respostas adiam perdas por 30 s, mas
de respostas dos quatro participantes fo- perdas ocorrem a cada 10 s) é provável que
ram idênticas às da Condição I, indicando o comportamento fique sob o controle da
que o comportamento estava sob o controle contingência em vigor e a regra seja aban-
das instruções inacuradas e não das contin- donada.
gências (lembre-se que os participantes não
precisavam responder para evitar perdas Durante a replicação da Condição
de dinheiro, que não ocorriam nessa con- SC, nenhum participante voltou a seguir
dição). Esse é um aspecto de controle im- as instruções inacuradas. Isto é, em cada
portante em qualquer análise experimental componente, as taxas de respostas de três
do comportamento governado por regras: participantes diminuíram para próximo de
entre condições, Galizio (1979) manteve zero (o esperado quando não há perdas de
as instruções e alterou as contingências; a dinheiro), enquanto as taxas de respostas

210
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

de um participante permaneceram altas O experimento foi conduzido com


e indiferenciadas entre os componentes, dois participantes, e o equipamento foi o
um desempenho semelhante ao observado mesmo dos experimentos anteriores, ex-
para esse participante na Condição C. ceto que duas luzes novas (roxa e laranja)
foram adicionadas. Na presença das luzes
Os resultados desse experimento de- laranja e roxa, respectivamente, as instru-
monstraram que não é suficiente que exista ções eram sempre acuradas e inacuradas
uma discrepância entre regras e contingên- (as luzes laranja e roxa seriam, respectiva-
cias (Condição SC) para que o controle do mente, equivalentes às pessoas A e B do
comportamento por regras seja alterado e exemplo anterior). Assim como no Experi-
o comportamento fique sob o controle das mento 2, os participantes foram expostos à
contingências em vigor. É necessário que Condição SC, à Condição C e novamente à
o comportamento entre em contato com a Condição SC, programadas como naquele
discrepância (como na Condição C) entre o experimento.
que a regra descreve e as contingências em
vigor.
Resultados e Discussão
Durante a primeira exposição à Con-
Experimento 3 - Objetivo e Método dição SC, os participantes emitiram taxas
O controle de estímulos é uma pro- de respostas correspondentes aos rótulos
priedade do comportamento operante. Isto (i.e., seguiram as instruções) tanto na pre-
é, a probabilidade de um comportamento sença dos estímulos correlacionados às
ocorrer é influenciada pela presença de de- instruções acuradas (luz laranja) quanto
terminados estímulos em função da corre- inacuradas (luz roxa). Esses resultados de-
lação desses estímulos com as consequên- monstram que, nessa condição, não houve
cias do comportamento. Imagine que você controle pelos estímulos correlacionados
receba instruções de diferentes pessoas, A às instruções acuradas e inacuradas. Na
e B. Após uma história de seguir instruções Condição C, na presença da luz laranja a
acuradas de A, e instruções inacuradas de taxa de respostas em cada componente foi
B, a probabilidade de que você siga instru- diferenciada como as instruções acuradas
ções seria determinada pela pessoa (A ou B) descreviam. Na presença da luz roxa, cor-
que dá as instruções? Isto é, a probabilidade relacionada às instruções inacuradas, as ta-
de seguir instruções seria alta na presença xas de respostas foram altas e semelhantes
de A e baixa na presença de B? No Expe- em cada componente do múltiplo. Portan-
rimento 3, o objetivo de Galizio (1979) foi to, quando a luz laranja estava em vigor, os
estudar o controle de estímulos do compor- participantes seguiram as instruções (acu-
tamento de seguir instruções. radas); quando a luz roxa estava em vigor,

211
Capítulo XIII | Comportamento Governado por Regras

os participantes não seguiram as instruções Experimento 4 - Objetivo e Método


(inacuradas) e o comportamento em cada O objetivo do Experimento 4 foi ve-
componente do múltiplo estava sob o con- rificar se estímulos correlacionados à ins-
trole das contingências. truções acuradas e inacuradas poderiam
funcionar como reforçadores condicionais
Na segunda exposição à Condição SC, para uma resposta de observação (i.e., uma
na presença da luz laranja os participantes resposta estabelecida e mantida pela pro-
responderam de acordo com as instruções. dução desses estímulos; Wyckoff Jr., 1952;
Na presença da luz roxa, no entanto, os par- 1969). O experimento foi conduzido com
ticipantes pararam de responder em cada três estudantes e o equipamento foi o mes-
componente do múltiplo, indicando um mo utilizado nos experimentos anteriores.
controle do comportamento pelas contin- Assim como nos Experimentos 1 à 3, girar
gências em vigor (i.e., não havia perdas em a alavanca 45o para a direita adiava perdas
nenhum componente do múltiplo). Portan- de dinheiro. Nesse experimento, girar a ala-
to, os participantes continuaram a seguir vanca 45o para a esquerda era a resposta de
instruções na presença do estímulo que observação.
havia sido correlacionado com instruções
acuradas mas – e esse é o ponto central – Os participantes foram expostos a
deixaram de seguir instruções na presença um programa múltiplo com quatro compo-
do estímulo que havia sido correlacionado nentes assim como no Experimento 1. No
com instruções inacuradas. Os resultados entanto, a luz âmbar correlacionada a cada
do Experimento 3 demonstraram o controle componente do múltiplo só acendia após a
de estímulos do comportamento de seguir emissão de uma resposta de observação. Na
instruções. É mais provável que você faça primeira condição, respostas de observação
o que alguém diz quando esse alguém, no acendiam as luzes âmbar por 10 , 20 , ou 30
passado, foi uma fonte de instruções acura- s. Cada uma dessas durações de apresen-
das (i.e., foi uma fonte “confiável”) e é mais tação das luzes esteve em vigor, para cada
provável que você deixe de seguir as ins- participante, até que a taxa de respostas de
truções de alguém que, no passado, foi uma observação fosse estável por duas sessões
fonte de instruções inacuradas. Seguir re- consecutivas (o esperado é que houvesse
gras é influenciado por suas consequências uma relação inversa entre a taxa de respos-
e por estímulos antecedentes na presença tas de observação e a duração de apresen-
dos quais seguir a regra produziu (ou não) as tação dos estímulos; assim taxas mais altas
consequências descritas na regra. de respostas de observação seriam espera-
das quando as luzes âmbar ficassem acesas
por 10 s do que quando ficassem acesas por
20 ou 30 s). Na segunda condição, as res-

212
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

postas de observação deixaram de acender as instruções e contingências programa-


as luzes âmbar (i.e., as respostas de obser- das (i.e., taxas de respostas de esquiva mais
vação estavam em extinção). Na primeira altas quando a resposta adiava a perda de
parte da terceira condição, as respostas de dinheiro por 10 s e relativamente mais bai-
observação voltaram a produzir as luzes xas quando adiava a perda por 30 s e 60 s,
âmbar, em cada componente, por 10 s. Na e nenhuma resposta no componente sem
segunda parte da terceira condição, perdas perdas). Na segunda condição (extinção),
de dinheiro passaram a ocorrer a cada 10 as taxas de respostas de observação dos
s na ausência de respostas de esquiva em três participantes ficaram próximas de zero
todos os componentes (portanto, as instru- e a taxa de respostas de esquiva se tornou
ções passaram a ser inacuradas e a presen- menos diferenciada entre os componentes
ça das luzes âmbar dependia da resposta de do múltiplo. Na primeira parte da terceira
observação). condição, a taxa de respostas de observa-
ção aumentou para todos os participantes e
Se os estímulos correlacionados às as taxas de respostas de esquiva voltaram a
instruções (i.e., luzes âmbar) adquirissem ser diferenciadas entre os componentes do
função de reforçadores condicionais, seria múltiplo. Na segunda parte dessa condição,
esperado que as respostas de observação as taxas de respostas de observação dos três
fossem mantidas na primeira condição e participantes foram novamente próximas
que a taxa dessas respostas diminuísse na de zero e a taxa de respostas de esquiva foi
segunda condição. Além disso, na tercei- alta e indiferenciada entre os componentes.
ra condição, seria esperado que a taxa das
respostas de observação diminuísse quan- A relação funcional entre a dura-
do essas respostas produzissem os estímu- ção da exibição das luzes âmbar e a taxa
los correlacionados à instruções inacuradas de respostas de observação, assim como a
por 10 s. extinção das respostas de observação, de-
monstrou que os estímulos correlacionados
à instruções acuradas funcionaram como
Resultados e Discussão reforçadores condicionais para as respos-
Na primeira codição, para cada par- tas de observação. Além disso, a redução
ticipante, a taxa de respostas de observação na taxa de respostas de observação quando
foi inversamente proporcional à duração de as instruções se tornaram inacuradas de-
apresentação das luzes âmbar (i.e., quanto monstrou que os estímulos correlaciona-
maior a duração de apresentação das lu- dos às instruções eram reforçadores apenas
zes, menor foram as taxas de respostas de quando as instruções eram acuradas (i.e.,
observação). Nessa condição, a taxa de res- quando seguir as instruções evitava a perda
postas de esquiva foi correspondente com de pontos). Em outras palavras, tendemos

213
Capítulo XIII | Comportamento Governado por Regras

a pedir informações quando, no passado, Os resultados do Experimento 2 de


pedi-las levou a reforçamento e tendemos Galizio (1979) indicaram que seguir regras é
a não pedi-las quando, no passado, pedir influenciado por suas consequências. Cali-
informações não produziu consequências xto et al. (2014, Experimento 2) estudaram o
diferenciais. controle do seguimento de regras por suas
consequências com contingências de re-
forçamento positivo. Participantes foram
DESDOBRAMENTOS expostos a um DRL 5 s com instrução mí-
nima (Grupo IM), acurada (Grupo IA) ou
Os resultados obtidos por Galizio inacurada (Grupo II). Em uma condição
(1979) têm sido replicados em diversos ex- subsequente, para os participantes em cada
perimentos. Os resultados do Experimento grupo, a contingência mudou de DRL para
1 sugeriram que o comportamento pode ser extinção, mas as instruções (agora inacura-
mais rapidamente estabelecido com o uso das) foram mantidas. Sob o DRL, os par-
de instruções acuradas, algo que tem sido ticipantes do Grupo IA emitiram taxas de
demonstrado também com comportamen- respostas mais baixas e obtiveram a maio-
tos instruídos mantidos por contingências ria dos reforços programados em relação
de reforçamento positivo. Por exemplo, a aos participantes dos outros grupos, cor-
diferenciação na taxa de respostas em pro- roborando os resultados do Experimento 1
gramas de reforço múltiplo razão fixa (FR) de Galizio. Quando a extinção estava em
reforçamento diferencial de baixas taxas vigor, mais participantes dos Grupos IM e
(DRL) é prontamente obtida em alguns es- II abandonaram a instrução do que os do
tudos somente quando instruções acura- Grupo IA. Assim como nos Experimentos
das sobre as contingências são fornecidas 2 e 3 de Galizio, esses resultados sugerem
aos participantes (e.g., Hayes, Brownstein, que o seguimento de regras é mais provável
Haas, et al., 1986; Hayes, Brownstein, Zettle, após uma história de exposição a instru-
Rosenfarb, & Korn, 1986, mas ver Porto, Ra- ções acuradas (Grupo IA) e menos prová-
mos, & Costa, 2011; e Soares, Costa, Cança- vel após exposição a instruções inacuradas
do & Cirino, 2013, para exceções). Os resul- (Grupo II; mas ver Albuquerque et al., 2003,
tados de Athayde Neto et al. (2015) também para resultados diferentes).
demonstraram que instruções acuradas fa-
vorecem a diferenciação das taxas de res- No estudo de Galizio (1979) vimos
postas em um múltiplo FR DRL, mas que que quando as instruções são acuradas, os
essa diferenciação pode ser obtida também indivíduos tendem a emitir o comporta-
com instruções mínimas (i.e., instruções ge- mento descrito nas instruções. O mesmo
rais sobre a topografia da resposta – “ganhe acontece quando as instruções fornecidas
pontos utilizando o mouse”). são inacuradas mas não há contato com a

214
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

discrepância entre instruções e contingên- na Fase 1, mas extinção estava em vigor em


cias. Quando há este contato com a dis- cada componente do múltiplo. Cinco dos
crepância entre instruções e contingências seis participantes mantiveram altas taxas
(e.g., ao seguir a instrução o indivíduo perde de respostas nos dois componentes em am-
dinheiro) o seguimento de instrução tende bas as fases sugerindo seguimento da regra
a ser abandonado. Além disso, Galizio su- durante todo o experimento, independente
geriu que em estudos sobre comportamento do monitoramento. O fato dos participan-
governado por regras nos quais há transição tes continuarem a responder em altas taxas
entre condições em que o comportamento é na Fase 2 corrobora a afirmação de Galizio
mantido por contingências de reforçamen- (1979) de que o comportamento pode per-
to positivo para extinção (uma situação em sistir por bastante tempo quando ocorre
que a instrução passa a ser inacurada e há mudança de contingência de reforçamento
contato com a discrepância pois os refor- positivo para extinção. Além disso, Ramos
çadores deixam de ser produzidos, como et al. sugeriram que pode ter ocorrido um
no estudo de Calixto et al., 2014, descrito efeito da história de reforço de seguir regras
anteriormente) pode ocorrer maior persis- (Fase 1) sobre o comportamento em extin-
tência do comportamento instruído porque ção (Fase 2), já que o seguimento da regra na
seriam necessárias muitas sessões para que Fase 1 garantia a obtenção dos pontos dis-
o comportamento se enfraquecesse. Isto é, poníveis (monitoramento também não teve
o contato com a discrepância por perder di- efeito no estudo de N. M. A. Albuquerque,
nheiro pode não ter o mesmo efeito que o Paracampo, & Albuquerque, 2004; mas teve
contato com a discrepância por deixar de efeito em outros estudos, e.g., Barrett, Deitz,
ganhar dinheiro. Gaydos, & Quinn, 1987; Cerutti, 1994).

Ramos, Costa, Benvenuti e Andra- Por fim, os resultados do Experimen-


de (2015) avaliaram essa questão em um to 3 de Galizio (1979) sugerem que, dada
experimento com seis estudantes que de- uma história de reforçamento diferencial,
veriam clicar com o cursor do mouse so- o seguimento de regras pode ser colocado
bre um botão em uma tela de computador sob controle de estímulos. Okouchi (1999)
para ganhar pontos. A instrução era sem- também investigou se instruções poderiam
pre “Pressione o botão rapidamente para ser consideradas estímulos discriminati-
ganhar pontos”. Na Fase 1 estava em vigor vos. Quatro universitários foram expostos
um múltiplo intervalo fixo (FI) 30 s FI 30 a um programa múltiplo FR DRL e instruí-
s e o experimentador estava presente em dos, na tela do computador, a responderem
apenas um dos componentes do múltiplo. lentamente no FR e rapidamente no DRL.
Na Fase 2, a instrução e o monitoramento Depois, foram expostos a um múltiplo FI
pelo experimentador foram mantidos como FI com as mesmas instruções. Durante o

215
Capítulo XIII | Comportamento Governado por Regras

múltiplo FI FI, para três de quatro partici- tamento operante e como a história com-
pantes, as taxas de respostas foram maiores portamental pode determinar o compor-
com a instrução para responder lentamen- tamento de seguir instruções. Além disso,
te do que com a instrução para responder os resultados de Galizio indicam que, em
rapidamente. Tal controle por instruções estudos com humanos em que o interesse
não foi observado para outros participantes é nos efeitos comportamentais das contin-
expostos apenas ao múltiplo FI FI com ou gências, atenção ao controle instrucional
sem instruções. Os resultados de Okouchi deve sempre ser um cuidado. Se instruções
demonstraram que o efeito de instruções acuradas e detalhadas forem apresentadas
pode ser alterado por contingências e su- aos participantes, o comportamento pode
gerem que as instruções podem funcionar se assemelhar àquele selecionado por suas
como estímulos discriminativos. Em outras consequências mas pode estar sob controle
palavras, a instrução “pressione lentamen- da instrução fornecida. Galizio adverte que
te”, passou a controlar altas taxas de respos- “em casos nos quais o controle de respos-
tas e a instrução “pressione rapidamente” tas simples pelo programa [de reforço] é de
passou a controlar baixas taxas de repostas interesse, instruções mínimas deveriam ser
em um múltiplo FI FI devido a história de empregadas” (p. 68).
contingências que correlacionou o “lenta-
mente” ao FR e o “rapidamente” ao DRL. O fato de que o seguimento de ins-
Os participantes expostos diretamente ao trução pode ser colocado sob o controle de
múltiplo FI FI responderam em altas taxas estímulos levanta questões interessantes
na presença de “pressione rapidamente” e para a análise de interações sociais. É mais
baixas taxas na presença de “pressione len- provável que um indivíduo siga instruções
tamente. O ponto interessante é que Okou- de fontes (pessoas, instituições) que lhe for-
chi construiu uma nova relação entre uma neceram instruções acuradas e que deixe
palavra e a história de contingência que dá de seguir instruções de fontes que lhe de-
“significado” a esta palavra e não se baseou, ram instruções inacuradas (Cerutti, 1989;
como outros estudos, em palavras cujo sig- Galizio, 1979, Experimento 3). Assim, seguir
nificado foi construído na história extra ex- regras de um professor ou de um especialis-
perimental do participante. ta em determinada área do conhecimento
pode ser mais provável do que seguir regras
fornecidas por um leigo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por fim, os resultados apresentados
Tomados em conjunto os quatro ex- por Galizio (1979) sugerem que o controle
perimentos de Galizio (1979) demonstram do comportamento humano por regras não
que o seguimento de instruções é compor- deve ser interpretado como uma limitação

216
Carlos Eduardo Costa, Carlos Renato Xavier Cançado

do controle do comportamento humano por para a descrição que os próprios participan-


contingências de reforçamento e punição, tes faziam sobre seu desempenho. Os resul-
ou mesmo como um limite ao princípio de tados sugeriram que o comportamento ver-
seleção do comportamento por suas con- bal produz efeitos sobre o comportamento
sequências (Skinner, 1981), mas como um não-verbal subsequente, principalmente
exemplo de uma determinada história de quando o comportamento verbal é mode-
reforço (por seguir regras) influenciando o lado.
efeito de determinadas contingências sobre
o comportamento. Em geral, os resultados Buskist & Miller Jr. (1986). Neste estudo, os
de Galizio e de outros experimentos sobre o autores procuraram investigar a interação
comportamento governado por regras indi- entre instrução e contingência no desen-
cam que o que é dito sobre o mundo intera- volvimento do desempenho de humanos
ge com o mundo no controle do comporta- em FI. Os resultados sugeriram que quando
mento de um indivíduo. há contato com a discrepância entre regra e
contingência é mais provável abandonar a
Portanto, comportamento governa- regra do que quando isso não ocorre.
do por regras é comportamento operante.
A tarefa para uma análise experimental é Hayes, Brownstein, Zettle, Rosenfarb, &
descrever quais variáveis influenciam o Korn, (1986). Procuraram avaliar o efeito
controle do comportamento por regras e a de instruções sobre a taxa de respostas em
interação entre o comportamento governa- um programa de reforço múltiplo FR DRL e
do por regras e o comportamento modelado sobre a sensibilidade à mudança nas con-
por contingências. tingências quando extinção passou a estar
em vigor em cada componente do múltiplo.
Os autores sugeriram que a diferenciação
PARA SABER MAIS na taxa de respostas no múltiplo FR DRL
foi obtida somente quando instruções acu-
Catania, Matthews, & Shimoff (1982). In- radas sobre as contingências foram forneci-
vestigaram as diferenças entre o compor- das aos participantes. Entretanto, a taxa de
tamento verbal modelado e o instruído. Os respostas dos participantes que receberam
participantes deveriam aprender a pressio- instruções acuradas sobre como responder
nar dois botões de acordo com diferentes foi mais resistente à extinção.
programas de reforçamento por modela-
gem ou instrução de seus comportamentos Torgrud & Holborn (1990). O objetivo foi
verbais. O interessante nesse estudo é que observar se existe diferença no seguimen-
a instrução não foi dada ao participante. to de regras quando os participantes eram
Ela foi modelada por meio de pontos dados expostos às contingências na ausência de

217
Capítulo XIII | Comportamento Governado por Regras

regras. Os resultados sugerem que quando Albuquerque, L. C., dos Reis, A. A., & Para-
os participantes passaram pela fase de ex- campo, C. C. P. (2008). Efeitos de histórias
posição direta às contingências (com ins- de reforço, curtas e prolongadas, sobre o se-
trução mínima), antes da fase em que era guimento de regras. Acta Comportamenta-
fornecida a instrução, o comportamento da lia, 16, 305-332.
maioria dos participantes mudou quando
as contingências programadas mudaram. Albuquerque, L. C., & Paracampo, C. C. P.
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Participantes em diferentes grupos foram pel de variáveis sociais e de conseqüências
expostos a diferentes programas de refor- programadas no seguimento de instruções.
çamento ou a apenas um esquema de re- Psicologia: Reflexão e Crítica, 17, 31-42.
forçamento. Alguns participantes foram
expostos a regras e outros foram instruídos Athayde Neto, C. A., Costa, C. E., & Bana-
a gerar regras sobre as contingências em co, R. A. (2015). Efeitos da história compor-
vigor; participantes em um grupo controle tamental e de instruções sobre a aquisição
não receberam ou foram instruídos a gerar e a resistência à extinção em um esquema
regras. A sensibilidade do comportamento à múltiplo fr drl. Psicologia: Teoria e Pesquisa,
mudança nas contingências foi maior para 31, 365-374.
participantes com uma história de exposi-
ção à diferentes programas de reforçamen- Barrett, D. H., Deitz, S. M., Gaydos, G. R., &
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221
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

A função do mentir em
crianças: o controle operante
na correspondência verbal

Carlos Augusto de Medeiros


Centro Universitário de Brasília

Lucas Ferraz Córdova


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“Mentiras sinceras me interessam”


Cazuza e Frejat

222
Capítulo XIV | Correspondência Verbal

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- “persuadir” ou mesmo “mentir” ou “xingar”


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO seriam comportamentos, logo, seriam fun-
DO EXPERIMENTO ção de variáveis ambientais. A existência
de tais comportamentos é dependente de
Em 1957, B. F. Skinner publicou o contingencias de reforçamento socialmen-
livro O Comportamento Verbal, no qual te estabelecidas que os tornam mais ou me-
propôs que este tipo de comportamento nos prováveis. Por exemplo, falar “cadeira”
poderia também ser explicado por meio diante do objeto cadeira, ou dizer “comi
da sua relação com variáveis ambientais. macarrão” após ter comido macarrão, são
Mais especificamente, Skinner descreveu o comportamentos que a comunidade ver-
comportamento verbal como um compor- bal coloca sob controle discriminativo das
tamento operante, isto é, comportamen- respectivas condições mencionadas via re-
to estabelecido e mantido por processo de forçamento diferencial. Ou seja, caso a res-
seleção pelas consequências. O que distin- posta “cadeira” seja emitida na presença de
guiria o comportamento verbal dos com- outros móveis, não será reforçada, enquan-
portamentos não verbais seria a forma de to que, na presença do móvel cadeira, sim.
consequenciação desses comportamentos. Após esse treino, a resposta verbal “cadeira”
No comportamento verbal, a alteração no será provável na presença de cadeiras e não
ambiente é proporcionada por um ouvin- de outros móveis.
te, enquanto que no comportamento não
verbal, a modificação no ambiente é dire- A relação de controle entre uma res-
ta. O marido pode pegar o controle remoto posta verbal ou não verbal emitida por um
da TV e trocar de canal, atuando assim, de falante e o comportamento verbal de rela-
forma direta no ambiente, por exemplo. Ele tá-la é chamada de correspondência verbal,
também pode, todavia, pedir para que a sua que também denomina um tema de pesqui-
esposa mude de canal por ele. Neste caso, sa em Análise do Comportamento (Beckert,
a mudança de canal foi proporcionada pela 2005; Lloyd, 2002; Paniagua, 1990). As vari-
sua esposa, de modo que a atuação do ma- áveis ambientais que afetam essa relação de
rido no ambiente foi indireta. controle entre o que um falante faz e o que
diz acerca do que faz são investigadas pelas
Explicar uma resposta verbal, en- pesquisas empíricas em correspondência
tão, é explicitar suas fontes de controle, é verbal. Três tipos principais de correspon-
descrever os eventos ambientais contin- dência verbal são investigados: (a) corres-
gentes a sua emissão, ou seja, identificar a pondência dizer-fazer, na qual é avaliado
sua função. Isto implica que comportamen- se o comportamento emitido (fazer) ocorreu
tos que são cotidianamente designados por conforme anunciado previamente pelo fa-
termos como “descrever”, “pedir”, “recitar”, lante (dizer); (b) correspondência fazer-di-

223
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

zer, sendo verificado se o relato está sob o prias consequências que podem ser sociais
controle discriminativo do comportamento ou não. Ainda que as consequências de um
previamente emitido; e (c) correspondência fazer específico sejam sociais, não neces-
dizer-fazer-dizer, na qual a correspondên- sariamente são as mesmas do dizer. Caso
cia é investigada em dois momentos, isto é, um adolescente diga aos pais que respeitará
se o fazer corresponde ao dizer prévio e se o seus professores, por exemplo, é provável
relato posterior corresponde ao comporta- que seus pais reforcem esse relato. Por ou-
mento previamente emitido. tro lado, um comportamento desrespeitoso
em relação aos professores pode ser refor-
LIoyd (2002) afirmou que há ocor- çado pelos risos dos colegas de classe. Am-
rência de correspondência quando o falan- bas consequências são sociais nesse caso,
te anuncia que irá fazer algo e o faz ou que entretanto, são distintas e podem resultar
não fará algo e não o faz (correspondência na ausência de correspondência dizer-fa-
dizer-fazer). Também ocorre correspondên- zer.
cia quando o falante diz que fez algo que
realmente fez ou que não fez algo que, de Ao enfatizar as relações de contin-
fato, não fez (correspondência fazer-dizer). gência para explicar a não ocorrência de
Portanto, são possíveis quatro tipos corres- correspondência, a Análise do Comporta-
pondência (dizer que fará e fazer; dizer que mento exclui as explicações mentalistas
não fará e não fazer; fazer e dizer que fez e como “má índole” ou “ausência de caráter”
não fazer e dizer que não fez) e quatro ti- (Lloyd, 2002). Além disso, ao contrário das
pos de não correspondência (dizer que fará explicações do senso comum, analistas
e não fazer; dizer que não fará e fazer; fazer do comportamento não pressupõem uma
e dizer que não fez; e não fazer e dizer que relação de controle a priori do comporta-
fez). A existência desse tema de investiga- mento verbal sobre o comportamento não
ção em Análise do Comportamento, segun- verbal. Ainda assim, o controle verbal do
do LIoyd, baseia-se no pressuposto de que comportamento possui grande relevân-
o fazer e o dizer são comportamentos dis- cia aplicada, o que justifica a investigação
tintos e que, portanto, não estão necessa- das variáveis ambientais que interferem na
riamente relacionados. Tais comportamen- correspondência e, principalmente, a ten-
tos podem ocorrer em momentos distintos tativa de criar condições que favoreçam
e sob o controle de variáveis específicas. O a correspondência entre o dizer e o fazer.
dizer é obrigatoriamente controlado por re- Em uma psicoterapia, por exemplo, é co-
forçamento social, ou seja, aquele provido mum os clientes verbalizarem irão emitir
por outra pessoa, na medida em que se tra- certos comportamentos (e.g., se matricular
ta de um comportamento verbal (Skinner, numa autoescola para motoristas habilita-
1957). Já o fazer é determinado por suas pró- dos como parte do tratamento para voltar

224
Capítulo XIV | Correspondência Verbal

a dirigir) sem que essa verbalização seja em ambos os estudos de Critchifield e Pe-
acompanhada do comportamento corres- rone, por Brino e de Rose, e Cortez e cols.,
pondente (i.e., se matricular na autoescola uma vez que as crianças participantes ti-
em si). Desse modo, é muito importante in- nham que relatar erros em tarefas diversas,
vestigar variáveis que afetam a correspon- e como erros costumam ser punidos, a pre-
dência entre dizer e o fazer de modo a au- cisão desses relatos é empobrecida frente à
mentar as chances de prever e controlar o dos relatos de acertos.
comportamento no contexto aplicado.
A outra condição experimental co-
Os procedimentos comumente uti- mumente utilizada é o reforçamento de re-
lizados em pesquisas sobre correspondên- latos (correspondentes ou não) específicos
cia verbal envolvem três tipos de condições (Paniagua & Baer, 1982; Ribeiro, 1989). Essa
experimentais (Beckert, 2005; LIyod, 2002). condição tende a reduzir a correspondência
Uma linha de base, na qual os reforçadores verbal. Esse tipo de manipulação é muito
não são contingentes a relatos ou compor- importante, uma vez que demonstra que a
tamentos relatados específicos, nem à cor- correspondência verbal é uma propriedade
respondência entre eles. As condições de do comportamento que é afetada por vari-
linha de base são delineadas para verificar áveis ambientais. Na sequência dizer-fazer,
a correspondência verbal decorrente da o reforçamento contingente a um dizer pré-
história pré-experimental dos participantes vio específico nem sempre é acompanhan-
(Ribeiro, 1989). do do fazer posterior. No estudo de Pania-
gua e Baer (1982), eram mostradas fotos de
Com exceção de alguns experimen- brinquedos que estariam disponíveis para a
tos como, por exemplo, os de Critchifield e criança brincar. Sempre que esta dizia que
Perone (1990; 1993), Brino e de Rose (2006), brincaria com um brinquedo previamen-
Cortez, de Rose e Montagnoli (2013), a gran- te preterido por ela em um pré-teste, o seu
de parte dos estudos sobre correspondência relato era reforçado. Entretanto, na situa-
reportam alto índice de correspondência ção de brincar em que todos os brinquedos
verbal nas condições de linha de base. Es- estavam disponíveis, a criança brincava
ses resultados corroboram a pressuposição com um brinquedo diferente do que havia
de Skinner (1957) acerca do extenso treino anunciado – constituindo uma situação de
da comunidade verbal em propiciar relatos ausência de correspondência dizer-fazer.
correspondentes. Entretanto, segundo Me- Na sequência fazer-dizer, são reforçadas
deiros (2013), caso o comportamento rela- topografias de relato específicas indepen-
tado tenha histórico de punição, é possível dentemente se estas correspondem ou não
que a correspondência seja enfraquecida. ao comportamento relatado. Com esse pro-
Esse foi justamente o resultado reportado cedimento, Pergher (2002), Ribeiro (1989)

225
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

e Sadi (2002) observaram um aumento na que buscava-se propiciar a correspondência


frequência de relatos não correspondentes, entre o que as pessoas diriam que fariam e o
ainda que em apenas a minoria de suas par- que realmente fariam. Em outras palavras,
ticipantes crianças. criar condições para que as pessoas passem
a fazer o que disseram que fariam.
Os treinos de correspondência são o
terceiro de tipo de condição experimental e O estudo de Ribeiro (1989), por outro
têm como objetivo estabelecer a correspon- lado, não enfatizava o fazer, e sim, o dizer
dência entre o dizer e o fazer. Também é como objeto de estudo. Nesse estudo, não
verificado se a correspondência se mantém era objetivado alterar a probabilidade de
após a retirada da condição de treino de cor- um comportamento específico a ser relata-
respondência. Os treinos de correspondên- do. Na realidade, a meta do estudo de Ribei-
cia envolvem o reforçamento diferencial no ro era investigar o que leva o falante a rela-
qual apenas o fazer correspondente ao di- tar com precisão ou de forma distorcida um
zer prévio é reforçado na correspondência fazer prévio. Em decorrência disso, Ribeiro,
dizer-fazer. Caso ocorra um fazer diferente diferentemente do que havia sido feito em
do anunciado previamente ou o fazer cor- estudos anteriores, descreveu os comporta-
respondente não seja emitido, o reforçador mentos verbais envolvidos em seu estudo
não é apresentado. Esse procedimento se utilizando as categorias funcionais propos-
demonstrou eficaz em estabelecer relatos tas por Skinner (1957), como tatos1 e man-
correspondentes na direção dizer-fazer nos dos2. Essas inovações, a engenhosidade dos
estudos de Paniagua e Baer (1982) e Risley e procedimentos e a robustez dos resultados,
Hart (1968). como será verificado a seguir, provavel-
mente fizeram com que essa pesquisa fosse
Nos treinos de correspondência fa- citada e descrita em diversos estudos em
zer-dizer, o reforçador é contingente ao di- Análise Experimental do Comportamento,
zer correspondente ao fazer prévio, e não é tendo inaugurado uma nova forma de estu-
apresentado caso o dizer não corresponda dar a correspondência verbal.
ao fazer (Brino & de Rose, 2006; Paniagua &
Baer, 1982; Ribeiro, 1989). Esse procedimen- 1
Tatos são operantes verbais cujas respostas estão sob o controle dis-
criminativo de estímulos não verbais, sendo estabelecidos e mantidos
to tem se mostrado eficaz tanto em produzir por reforçadores generalizados. Os exemplos comuns de tatos são os
relatos, as descrições e as narrativas. Se uma criança brincou com o
correspondência quanto em mantê-la após carrinho de relata que brincou com o carrinho, está emitindo um tato,
já que o seu relato está sob o controle discriminativo do comportamen-
o retorno à linha de base. to de brincar prévio, que é um estímulo não verbal.

2
Os mandos são operantes verbais cujas respostas são controladas por
Até a publicação do estudo de Ribei- reforçadores específicos. Pedidos, súplicas e ordens são exemplos de
mandos na linguagem cotidiana. Quando uma criança pede uns troca-
ro (1989), o foco das pesquisas foi sobre a dos para o pai para comprar doces na padaria, está emitindo um man-
do, uma vez que o que controla a sua resposta verbais é o dinheiro a
correspondência dizer-fazer, na medida em ser dado pelo pai.

226
Capítulo XIV | Correspondência Verbal

DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO que consistiam em um período de brincar e


um período de relato. A diferença entre as
Objetivo e Método condições foi quanto ao período de relato:
O estudo de Ribeiro (1989) teve como (a) Linha de Base (de quatro a seis sessões):
objetivo investigar os efeitos do reforça- ao fim de cada relato de brincar ou não, a
mento do conteúdo das verbalizações de criança recebia uma ficha que poderia ser
crianças sobre a acurácia do relatar. Em trocada por comestíveis; (b) Reforçamen-
outras palavras, o que seria observado se o to Individual do Relato de Brincar (seis
reforçamento de relatos específicos aconte- sessões): qualquer relato de brincar, inde-
cesse independentemente da acurácia des- pendentemente de ter realmente brinca-
se relato. Oito crianças, de ambos os sexos, do, produzia uma ficha e demonstração de
com idades entre três e cinco anos, partici- aprovação pelo experimentador. Por outro
param do experimento. lado, os relatos de que não havia brinca-
do não produzia a apresentação das fichas
Individualmente, as crianças eram nem demonstração de aprovação pelo ex-
levadas a uma “sala de brincar”, onde o ex- perimentador; (c) Reforçamento do Relato
perimentador podia observá-las por meio de Brincar em Grupo (quatro sessões): essa
de um espelho unidirecional. Nesta sala, condição era semelhante à condição (b),
a criança tinha acesso a brinquedos que porém o período de relato era conduzido
ela podia escolher para brincar. Ela pode- em grupos de quatro crianças. Assim, cada
ria brincar com apenas um brinquedo por criança tinha acesso ao relato e à forma de
vez. Após o termino do período de brincar, consequenciação dos relatos das outras;
que durava 12 minutos ou até ela ter brin- (d) Reforçamento de Correspondência em
cado com três brinquedos, a criança era Grupo (oito sessões): o reforçador foi con-
encaminhada para a “sala de relatar”. Nesta tingente ao relato correspondente ao com-
sala, um segundo experimentador, que não portamento ocorrido durante o período de
tinha acesso a quais brinquedos a criança brincar. Cada relato correspondente com o
havia brincado na “sala de brincar”, dizia brincar ou não brincar produzia aprovação
para a criança que gostaria de saber o que e uma ficha, enquanto que os relatos não
ela havia feito no período de brincar daque- correspondentes não produziam fichas nem
le dia. Ele se sentava à mesa, do lado oposto aprovação; (e) Reforçamento Não-Contin-
da criança, mostrando a foto de cada brin- gente (uma sessão): essa condição foi seme-
quedo e perguntava se ela havia brincado lhante à linha de base, com a diferença que
com aquele brinquedo. as crianças recebiam seis fichas antes do
período de relatar ao invés de apenas uma.
O experimento teve cinco condições,
todas compostas por sessões experimentais

227
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

Resultados e Discussão de Reforçamento de Correspondência em


Durante a Linha de Base, todas as Grupo, todas as crianças passaram a apre-
crianças apresentaram alto nível de corres- sentar correspondência tanto para o relato
pondência (seis das oito crianças apresenta- de brincar quanto para o de não brincar.
ram correspondência total, enquanto uma Apenas duas participantes precisaram de
delas emitiu um relato não correspondente três sessões nesta condição para que seus
de ter brincado e a outra emitiu dois relatos relatos passassem a ser consistentemen-
não correspondentes de não ter brincado). te correspondentes. Por fim, na condição
Na condição de Reforçamento Individual de Reforçamento Não-Contingente houve
do Relato de Brincar, foi observada grande 100% de correspondência entre todas as
variabilidade entre os participantes de pes- crianças.
quisa. Das oito crianças, seis apresentaram
pelo menos um relato não correspondente. Ribeiro (1989) discutiu os dados pri-
Quatro crianças não apresentaram corres- meiramente apontando alto grau de cor-
pondência apenas no início da condição, respondência dos participantes no início
e as outras duas relataram terem brincado do experimento (i.e., Linha de base), justi-
com todos os brinquedos disponíveis inde- ficada, provavelmente, por um histórico
pendentemente de terem realmente brin- pré-experimental que teria estabelecido
cado, maximizando, assim, os reforçadores. eficientemente um padrão de correspon-
As outras duas crianças não apresentaram dência. Este seria, segundo Ribeiro (1989),
nenhum relato não correspondente ao lon- também o motivo do porquê, na segunda
go de toda a segunda condição, não se ex- condição, quatro dos participantes terem
pondo assim à mudança de contingência apresentado uma baixa frequência de re-
em relação à Linha de Base. latos não correspondentes. Para o autor, é
provável que consequências “naturais ou
Na condição de Reforçamento do automáticas” do relato correspondente se
Relato de Brincar em Grupo, que tinha sobreponham as consequências arranjadas.
como objetivo permitir as crianças obser-
varem o relato e consequências dos relatos Apenas na condição Reforçamen-
das demais, houve um aumento no número to de Relato de Brincar em Grupo foi pos-
de relatos de brincar independentes da cor- sível observar um efeito do reforçamento
respondência desse relato. Cinco das oitos do relato sob o desempenho de não cor-
crianças passaram a relatar terem brincado respondência. A possibilidade de observar
com todos os brinquedos disponíveis, ma- a relação resposta-consequência em outro
ximizando os reforçadores. As demais três participante, somada à interação verbal
crianças emitiram relatos corresponden- entre as crianças (que descreveram umas
tes ao longo de todo o estudo. Na condição para as outras a contingencia vigente) foi

228
Capítulo XIV | Correspondência Verbal

fundamental para ampliar o controle do re- sob o controle das consequências para os
forçamento sobre o relato de brincar inde- relatos específicos e não sob o controle do
pendentemente da correspondência. Essas comportamento de brincar prévio da crian-
variáveis sociais teriam permitido a exposi- ça. Outro aspecto demonstrado pelo estu-
ção às contingências de reforçamento para do de Ribeiro foi o efeito do reforçamento
relatos de brincar não correspondentes, sobre as distorções de outros participantes
os quais produziam mais reforçadores que (i.e., aprendizagem por observação) e das
os relatos correspondentes nas condições instruções (i.e., regras) fornecidas pelos
de Reforçamento de Relato de Brincar em próprios participantes na Condição de Re-
Grupo. forçamento de Relato de Brincar em Grupo
sobre a diminuição na acurácia do relato.
O papel do reforçamento na manu- Esses resultados apontaram para o efeito
tenção da correspondência ou não do relato de variáveis sociais antecedentes sobre a
fica claro com o retorno, em todos os parti- correspondência verbal, além das consequ-
cipantes, ao padrão de correspondência ob- ências para os relatos correspondentes ou
servado durante a condição Linha de Base, não.
que voltou a ser observado nas condições
de Reforçamento de Correspondência e de
Reforçamento Não Contingente. Nestas DESDOBRAMENTOS
duas fases, a apresentação de reforçadores
passou a ser contingente à correspondên- O experimento de Ribeiro (1989) foi
cia e não ao mero relato de brincar. A partir replicado no Brasil em pelo menos cinco
da variação da correspondência dos relatos estudos (Dias, 2008; Ferreira, 2009; Ferrei-
de brincar de cinco de oito participantes do ra, Neves, Simonassi, Andrade & Dias, 2014;
estudo em função das condições experi- Pergher, 2002; Sadi, 2002). Sadi (2002), por
mentais às quais foram submetidos, pode- exemplo, replicou o estudo de Ribeiro com
-se concluir que a correspondência verbal alterações procedimentais mínimas, como
é uma propriedade do comportamento fun- por exemplo a adição apenas do registro
ção das contingências de reforçamento. de verbalizações espontâneas das crianças.
Já Pergher (2002), adicionou uma condição
Ribeiro (1989) discute os relatos cor- na qual a criança observava outra criança
respondentes como tatos, na medida em brincando e era solicitada a relatar o com-
que as respostas verbais estão sob o contro- portamento de brincar da colega. Ambos
le do comportamento de brincar prévio da estudos replicaram os resultados obtidos
criança (SD não verbal). Por outro lado, os por Ribeiro, não importando se o compor-
relatos não correspondentes seriam instân- tamento relatado era o próprio compor-
cias de mando, na medida em que estariam tamento ou o comportamento de outras

229
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

crianças (Pergher, 2002). Entretanto, os par- (1989), Dias (2008) e Ferreira et al. (2014) em
ticipantes, na condição de Reforçamento da que o experimentador apontava para uma
Correspondência em Grupo, levaram mais fotografia do brinquedo ou do alimento e
sessões para passar a emitir relatos corres- perguntava se a criança havia brincado/co-
pondentes que os participantes do estudo mido ou não.
de Ribeiro.
Ferreira (2009) levantou algumas hi-
Os experimentos de Dias (2008) e póteses acerca das diferenças nos resulta-
Ferreira et al. (2014), trocaram o “fazer” utili- dos de seu estudo e o de Dias (em relação
zado no experimento de Ribeiro (1989) (i.e., ao de Ribeiro (1989). Em primeiro lugar, nos
o brincar) pelo comportamento de comer. estudos de Ferreira e de Dias, o fazer da
Participaram destes dois experimentos criança deixava um registro evidente, como
crianças obesas e não obesas (Dias) e crian- os alimentos que sobraram ou as folhas de
ças e adultos também obesos e não obesos papel com as operações concluídas ou não.
(Ferreira et al.). Em ambos estudos foram O mesmo não ocorre nos estudos do relato
adicionadas fases de grupos heterogêneos de brincar, que era filmado sem o conhe-
e homogêneos em relação aos participantes cimento das crianças. Diante dos registros
acima (obesos) e abaixo (não obesos) do ín- dos comportamentos de fazer operações
dice de massa corporal (IMC). Os dois estu- matemáticas e de comer, haveria a possi-
dos não observaram a variação dos relatos bilidade de checagem a qualquer momen-
não correspondentes em função das dife- to pelos experimentadores (ainda que esta
rentes condições experimentais. Ou seja, nunca tivesse ocorrido), o que poderia ter
quando o brincar foi trocado pelo compor- diminuído a probabilidade de distorção do
tamento de comer, os resultados de Ribeiro relato.
não foram replicados, ainda que Dias tenha
observado um aumento na frequência do Ferreira (2009) também comenta que
comportamento de comer para alguns par- nenhum dos participantes de seu estudo e
ticipantes nas condições de Reforçamento do estudo de Dias (2008) emitiu relatos não
do Relato Individual e em Grupo de Comer. correspondentes de forma sistemática nas
condições de Reforçamento de Relato Indi-
Ferreira (2009) também não replicou vidual ou em Grupo. Desse modo, é impro-
os resultados obtidos por Ribeiro (1989) ao vável que as condições de Reforçamento
trocar o brincar pela tarefa de realizar ope- de Relato em Grupo tenham sido eficazes
rações matemáticas. Além disso, no estudo em propiciar mais relatos distorcidos como
de Ferreira, na etapa de relatar, perguntava- nos estudos de Ribeiro (1989), Sadi (2002) e
-se à criança quantas “continhas” ela havia Pergher (2002). Como todas as crianças nos
feito, ao contrário dos estudos de Ribeiro estudos de Ferreira e Dias apresentaram

230
Capítulo XIV | Correspondência Verbal

uma alta frequência de relatos correspon- as crianças mais novas talvez precisassem
dentes, as contingencias de reforçamentto ser instruídas ou terem acesso a modelos se
para relatos específicos correspondentes ou comportando de acordo com as contingên-
distorcidos não modelaram os relatos não cias em vigor para passarem a distorcer os
correspondentes. Desse modo, a frequência relatos nas condições de Reforçamento de
de relatos distorcidos era baixa na condição Relato em Grupo. Por outro lado, os dados
de Reforçamento de Relatos em Grupo, di- de Ferreira et al. (2014) com adultos suge-
ficultando a aprendizagem por observação rem que essa não é uma variável relevante,
de modelos. Também é improvável que as já que os relatos distorcidos de seus parti-
crianças desses estudos tenham formulado cipantes adultos replicaram os apresenta-
regras acerca da possibilidade de distorção dos pelas crianças, os quais não variaram
do relato como fizeram as crianças do estu- de acordo com as condições experimentais.
do de Ribeiro (1989). Sendo assim, os efei- Talvez as diferenças quanto ao tipo de fazer
tos de instruções e de modelos reportados dos estudos de Dias (2008), Ferreira (2009) e
nos estudos de Ribeiro (1989), Sadi (2002) e Ferreira et al. (2014) em relação aos demais
Pergher (2002) parecem não ter ocorrido em estudos, conforme discutido acima, possam
Ferreira (2009), Dias (2008) e Ferreira et al. ser relevantes para entender a baixa frequ-
(2014). ência de relatos distorcidos mesmo em par-
ticipantes adultos.
Ribeiro (1989) e Sadi (2002) sugeri-
ram que a idade dos participantes talvez te- A correspondência verbal fazer-di-
nha sido uma variável, não controlada, que zer continuou sendo investigada em di-
teve efeito na correspondência verbal dos versos outros estudos no Brasil ainda que
participantes, já que nas condições de Re- com a metodologias distintas da utilizada
forçamento de Relato Individual, apenas as por Ribeiro (1989). Entretanto, com exce-
crianças mais velhas começaram a distorcer. ção dos trabalhos de Critchfield e Perone
Os autores sugeriram que as crianças mais (1990; 1993), fora do país, a atenção se vol-
velhas, ao contrário das mais novas, prova- tou novamente para a direção dizer-fazer
velmente já passaram por contingências de (e.g. Baer & Detrich, 1990). Foi observada
reforçamento de relatos não corresponden- uma queda no interesse pelo tema durante
tes ou de punição de relatos corresponden- a década de 1990, sendo retomado nos anos
tes. Desse modo, seria mais provável que 2000 (LIoyd, 2002; López, Valverde & Lu-
as contingências de reforçamento para os ciano, 2011). Quanto aos estudos no Brasil, é
relatos de brincar na condição de Reforça- possível supor que, ainda que não se tratem
mento de Relato Individual, ainda que não de replicações, estes estudos tenham sido
correspondentes, passassem a exercer con- inspirados pelo trabalho de Ribeiro, pois o
trole sobre o seu comportamento verbal. Já estudo foi sistematicamente citado e descri-

231
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

to em praticamente todos esses trabalhos. É 2013); presença ou ausência do experimen-


possível propor três categorias para agrupar tador durante a sessão experimental (Brino
esses estudos: (a) Estudos observacionais: & de Rose, 2006); punição de relatos espe-
Um conjunto de estudos investigou a cor- cíficos em adultos (Sanabio & Abreu-Rodri-
respondência verbal sem manipular dire- gues, 2002); dificuldade da tarefa (Cortez
tamente o reforçamento de relatos especí- et al., 2013; Domeniconi, de Rose & Perez,
ficos ou de relatos correspondentes. Esses 2014); tipo de desempenho relatado (Cortez,
estudos voltaram a enfatizar o fazer, como de Rose & Miguel, 2014); e treino de corres-
os estudos anteriores ao experimento de pondência (Brino & de Rose, 2006; Cortez
Ribeiro (1989). Outra especificidade desses et al., 2013; Cortez et al., 2014; Domenico-
estudos foi a realização das pesquisas em ni et al., 2014). Dentre as variáveis listadas
ambientes mais próximos ao natural, como acima, a frequência de erros no fazer, ainda
na realização de exercícios físicos em três que não manipulada diretamente, repre-
mulheres diagnosticadas com diabetes tipo sentou a variável mais relevante na deter-
2 (Coelho, Wechsler & Amaral, 2008 – di- minação da precisão dos relatos acerca do
zer-fazer); em consultas pediátricas de día- desempenho. Os treinos de correspondên-
des mães e filhos (Wechsler & Amaral, 2010 cia se mostraram eficazes em estabelecer e
– dizer-fazer-dizer); em situações de sala manter a precisão dos relatos.
de aula de professores da rede estadual de
ensino (Leme & Pereira, 2012 – fazer-dizer- No estudo de Brino e de Rose (2006),
-fazer; Ricci & Pereira, 2006 – dizer-fazer); por exemplo, as crianças eram solicitadas
e no contexto organizacional entre gestores a ler em voz alta uma palavra que aparecia
(Ramalho & Pedroso, 2014 – fazer-dizer-fa- na tela do computador. Na tela do compu-
zer); tador, em seguida, apareciam dois quadra-
dos paralelos, um verde e um vermelho. Ao
(b) Relatos acerca do próprio desem- clicar no quadrado verde a criança relatava
penho: Critchfield e Perone (1990; 1993) re- ter acertado a leitura, no quadrado verme-
alizaram dois estudos nos quais os partici- lho que havia errado a leitura. Na linha de
pantes eram solicitados a relatar se haviam base, a criança permanecia sozinha duran-
acertado ou não cada tentativa em um pro- te a aplicação do experimento e não havia
cedimento de escolha atrasada de acordo consequências programadas para os seus
com modelo, sendo manipuladas as con- relatos de acerto e erro. Na condição de
dições de relato. Os estudos de Critchfield treino de correspondência, eram reforçados
e Perone foram extensamente replicados, os relatos correspondente de erro de leitura.
sendo avaliada a correspondência verbal Também foi realizada uma condição expe-
em função do histórico ou não de fracasso rimental na qual o experimentador perma-
escolar (Brino & de Rose, 2006; Cortez et al., necia com a criança durante a realização do

232
Capítulo XIV | Correspondência Verbal

experimento e os relatos de erros e acertos correspondente ou não o valor da carta ou


não tinham consequências programadas. da soma das cartas compradas. Quem rela-
Os autores observaram que as crianças ten- tasse o maior valor, a depender do estudo,
diam a relatar como acertos seus erros de ganhava pontos (e.g., Medeiros, F. H., 2012)
leitura na linha de base, o que não foi ob- ou descartava a carta (e.g., Medeiros et al.,
servado quando os relatos correspondentes 2013). Vencia a partida aquele que tivesse
eram reforçados ou quando o experimen- mais pontos ou menos cartas após um nú-
tador permanecia com a criança durante o mero fixo de rodadas.
experimento. Brino e de Rose concluíram,
com base nesses resultados, que o treino Após os relatos que podiam ser orais
de correspondência foi eficaz no estabele- (e.g., Medeiros et al., 2013), via seleção de
cimento da correspondência de relatos de um valor numa janela da tela do computa-
erros e que a presença de adultos pode ter dor (e.g., Medeiros, F. H., 2012) ou escritos
suprimido a emissão de comportamentos simultaneamente em um quadro branco
punidos no passado como, por exemplo, os (e.g., Antunes & Medeiros, 2016; Demoly,
relatos não correspondentes; 2016), um dado de seis faces real (e.g., Me-
deiros et al., 2013) ou virtual (e.g., Medeiros,
(c) Relato do valor das cartas em um F. H., 2012; Demoly, 2016) era lançado e, a
jogo de baralho. Diversos estudos sobre cor- depender do valor obtido, os participantes
respondência verbal foram realizados em precisariam mostrar as cartas que compra-
Brasília com um procedimento diferente ram para o oponente e para o experimen-
dos utilizados até então. Foi criado um jogo tador. Consequências eram programadas
de cartas inspirado em jogos de blefe (e.g., para relatos correspondentes ou não nos
truco ou pôquer), com o objetivo de criar diversos estudos realizados.
condições mais próximas às naturais para
favorecer a emissão de relatos distorcidos O efeito de diversas variáveis expe-
sem a necessidade de tokens e de refor- rimentais foi verificado sobre a precisão dos
çadores de retaguarda (e.g., guloseimas ou relatos dos valores das cartas, como a pro-
pequenos brinquedos), ainda que estes pu- babilidade de checagem dos relatos, ou seja,
dessem ser usados. Nesse jogo, dois parti- quantos valores do dado determinavam a
cipantes jogavam um contra o outro, sendo checagem (Medeiros et al., 2013); a magni-
as partidas divididas em rodadas. Os joga- tude das consequências punitivas para re-
dores recebiam pilhas de cartas e, a cada latos distorcidos em termos do número de
rodada, coletavam uma (e.g., Souza, Gui- cartas adicionais a serem compradas (Brito,
marães, Antunes & Medeiros, 2014) ou duas Medeiros, Medeiros, F. H., Antunes & Sou-
cartas (e.g., Medeiros, Oliveira & Silva, 2013) za, 2014); a faixa etária dos participantes
de cima de sua pilha e relatavam de forma (Souza et al., 2014); o modo como o relato

233
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

era solicitado (perguntas fechadas vs. per- CONSIDERAÇÕES FINAIS


guntas abertas; Andrade, 2011; Souza et al.,
2014; Demoly, 2016); o tipo de consequên- Dentro da área de pesquisa de cor-
cia para relatos precisos (ganho de pontos) respondência verbal, o estudo de Ribeiro
e distorcidos (perda de pontos) em situação (1989) tem importância em vários sentidos.
computadorizada (Medeiros, F. H., 2012); e Um primeiro ponto a ser destacado é sua
a probabilidade de ganho da partida com a importância metodológica, como pode ser
emissão de relatos precisos (Antunes & Me- observado nos experimentos citados aci-
deiros, 2016). ma (Dias, 2008; Ferreira 2009; Ferreira &
cols., 2014; Pergher 2002; Sadi, 2002). Mas
As variáveis manipuladas afeta- para além da mudança procedimental, ao
ram a precisão do relato do valor das car- inverter a direção da correspondência tra-
tas, demonstrando o efeito de aspectos do dicionalmente investigada naquela época
ambiente sobre o comportamento verbal, (i.e., passar a investigar a correspondência
como em Ribeiro (1989). Em resumo, foi ob- fazer-dizer ao invés da correspondência
servado que, quanto menor a frequência de dizer-fazer) Ribeiro altera também o objeto
checagem, a magnitude das consequência de estudo da área. Na direção dizer-fazer
punitivas para relatos distorcidos e a pro- investiga-se o controle verbal sobre o com-
babilidade de ganho com relatos precisos, portamento não verbal, ou seja, o foco está
maior a frequência de relatos distorcidos. sobre o fazer, onde o dizer se insere como
Ao mesmo tempo, o tipo de consequência, variável antecedente discriminativa. Com a
se punitiva para relatos distorcidos ou re- mudança de Ribeiro, a resposta verbal pas-
forçadora para relatos precisos, não parece sa a ser o foco, e agora, a estimulação discri-
ter efeitos sistemáticos sobre a correspon- minativa é identificada como sendo o fazer,
dência verbal. Também foi verificado que a um elemento da contingência controladora
solicitação do relato via perguntas fechadas do dizer. Assim, a investigação se volta para
(e.g., você ganha a rodada?), ao invés de per- as condições ambientais que determinam a
guntas abertas (e.g., qual a sua carta?), pro- emissão da resposta verbal.
duz relatos distorcidos mais frequentes. Por
fim, foi verificado que adultos distorcem Essa mudança de foco do fazer para
mais que as crianças caso não sejam forne- o dizer, inaugurou, dentro da Análise Ex-
cidas instruções acerca da possibilidade de perimental do Comportamento, a investi-
distorcer o relato. gação sistemática do que cotidianamente
é denominado mentir. Como sugere Me-
deiros (2013), em grande parte das vezes,
a única forma de acesso que temos acerca
do que uma pessoa fez ou ao ambiente que

234
Capítulo XIV | Correspondência Verbal

está exposta é o seu relato verbal. Desse O presente capítulo buscou permitir
modo, caso o relato verbal não seja confiá- ao seu leitor compreender o experimento
vel, teremos muitas dificuldades para pre- desenvolvido por Ribeiro (1989), tanto as
dizer e controlar o comportamento que não modificações metodológicas quanto con-
se tem acesso direto. A área de investiga- ceituais por ele proposta. Além disso fo-
ção da correspondência verbal na direção ram discutidos os desdobramentos possi-
fazer-dizer, inaugurada por Ribeiro (1989), bilitados pelo mesmo na produção da área
é fundamental para a atuação do psicólo- de correspondência verbal. Como foi visto,
go no contexto aplicado, o qual, diante das esse desdobramento é multifacetado, o que
condições ambientais, terá mais condições marca ainda mais a sua importância para
de avaliar um relato como fonte confiável área do comportamento verbal como um
de acesso às informações ou não. Ademais, todo.
terá condições de, ao manipular certos as-
pectos do ambiente (e.g., frequência de che-
cagem, reforçamento diferencial de relatos PARA SABER MAIS
correspondente, solicitação de relatos via
perguntas abertas), afetar a correspondên- Antunes & Medeiros (2016). Estudo que in-
cia verbal em contexto aplicado. vestiga o efeito da probabilidade de refor-
çamento para relatos precisos sobre a cor-
Extrapolando a área especifica de respondência verbal num jogo de cartas em
pesquisa da correspondência verbal, o es- crianças.
tudo de Ribeiro (1989) se soma, de forma
reconhecidamente robusta, ao banco de Beckert (2005). Uma revisão de literatura
dados que corroboram o caráter operante em correspondência verbal.
do comportamento verbal. Ao demonstrar
a sensibilidade da frequência de respostas Cortez, de Rose, & Miguel (2014). Estudo
verbais às variáveis antecedentes e conse- que investiga a correspondência do relato
quentes, Ribeiro (1989) descreve o que, na de erros, sendo manipulando o tipo de ta-
Análise do Comportamento, é denominado refa relatada
controle. Assim, Ribeiro permite sustentar
a ideia de que tanto topografia quanto fre- Critchfield & Perone (1990). Estudo no qual
quência de respostas verbais seriam esta- os participantes eram solicitados a relatar
belecidas e mantidas por sua relação com se haviam acertado ou não cada tentativa
variáveis ambientais. Em outras palavras, o em um procedimento de escolha atrasada
comportamento verbal poderia ser explica- de acordo com modelo, sendo manipuladas
do a partir da noção de operante (Skinner, as condições de relato.
1957).

235
Carlos Augusto de Medeiros, Lucas Ferraz Córdova

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Marcelo Borges Henriques

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Marcelo Borges Henriques


Universidade Federal de Goiás
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one person by another, and no one can suppress them who has any concern for hu-
man achievements”
(Skinner, 1971/1976, p.45)

239
Capítulo XV | Competição e Cooperação

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- dimento de acesso ao reforço para um in-


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO divíduo, em função do comportamento de
DO EXPERIMENTO outro indivíduo dentro do mesmo sistema.
Já na cooperação, o acesso ao reforço é mú-
O comportamento social foi tratado tuo, desde que a coordenação entre os in-
por Skinner (1953/2000) como uma forma divíduos produza o efeito especificado no
de comportamento operante, obedecendo sistema (De-Farias, 2005).
os mesmos princípios básicos derivados dos
estudos com organismos individuais em in- É provável que o estudante de Psi-
terações com um ambiente não-social. Para cologia não esteja familiarizado com as
Skinner, o adjetivo “social” destaca certos definições apresentadas acima, e que apre-
aspectos da relação condicional responsá- sente certo espanto ao saber que a Análise
vel pelo estabelecimento e manutenção do do Comportamento também trabalha com
comportamento. No comportamento social, fenômenos sociais. É comum o desconhe-
os eventos ambientais que estabelecem, cimento de que, em artigos e livros escritos
mantém e evocam o comportamento são por Skinner, o principal tema é o homem
produzidos por outro indivíduo. Entretan- em sociedade. Aproximadamente um terço
to, as consequências de um comportamen- do livro Ciência e Comportamento Humano
to social não precisam ser diretamente for- (Skinner, 1953/2000) – um dos principais li-
necidas por outro indivíduo. Há contextos vros introdutórios do Behaviorismo Radical
em que a consequência deve ser coprodu- – foi dedicado à análise do comportamento
zida, mediante a coordenação dos compor- de indivíduos em grupo (e.g., capítulos 19
tamentos de pelo menos dois indivíduos. à 29). Além disso, Skinner (1938), no início
Neste último caso, o efeito ambiental cor- de seu programa de pesquisas, deixou claro
relacionado com a produção de consequ- que “a importância de uma ciência do com-
ências não é gerado pelo comportamento portamento deriva-se, em grande parte, da
individual, mas pela coordenação dos com- possibilidade de uma eventual extensão às
portamentos de dois ou mais indivíduos questões humanas” (p. 441).
(i.e., efeito do comportamento grupal).
Talvez o espanto inicial se dê pela
A definição de comportamento so- forma típica pela qual a Análise do Com-
cial de Skinner (1953/2000) é abrangente portamento é apresentada à comunidade
e possibilita abordar diferentes tipos de fe- acadêmica: O famoso laboratório didático.
nômenos sociais, entre eles a competição Por meio de experimentos demonstrativos,
e cooperação. Uma interação social é de- virtuais ou reais, estudantes são ensinados
nominada competitiva quando o sistema a observar, descrever e controlar o com-
reforçador impõe uma limitação ou impe- portamento de organismos não-humanos

240
Marcelo Borges Henriques

individuais (tipicamente, ratos albinos). Es- diárias de vida. Portanto, por si só, no que
tudantes que tiveram seu primeiro contato diz respeito a qualquer medida de gradação
com a área por meio do laboratório didático de complexidade, a escala não dá nenhuma
devem se perguntar: “Ok, mas como pode indicação do grau de complexidade dos or-
uma teoria que só faz experimentação com ganismos listados. A escala não é em termos
animais não-humanos individuais ser uti- de complexidade, mas de tempo: o momen-
lizada para explicar relações sociais huma- to provável na história do planeta em que
nas? Como o trabalho experimental com cada espécie surgiu e que semelhanças cada
animais não-humanos pode ser estendido uma guarda com outras espécies extintas e
ao comportamento humano, incluindo as vivas (Hodos & Campbell, 1969). Portanto,
relações sociais”? O estudante que se vê o homem não é mais complexo que outros
incomodado com estas questões está ma- animais, ele é simplesmente distinto.
nifestando uma desconfiança legitima que
merece alguns esclarecimentos. A singularidade de cada espécie tam-
bém não pode ser usada como ataque con-
Há pelo menos duas possibilidades tra a extensão de princípios. Os princípios
para explicar por quê o estudante se sen- da seleção natural são aplicáveis a qual-
te incomodado com a extensão de princí- quer organismo vivo, independentemente
pios derivados de pesquisas com animais de suas especificidades. O mesmo poderia
não-humanos. Uma delas é a má compre- ser dito sobre os princípios comportamen-
ensão sobre a teoria evolutiva, que o leva tais básicos. Uma das premissas centrais na
a expressar uma concepção de que seres Análise Comportamento é a ideia de que os
humanos são animais “superiores” na esca- processos comportamentais são adaptações
la evolutiva. Se fossemos mais complexos, biológicas selecionadas. O comportamento
superiores e especiais, então seria impossí- é uma das propriedades mais importantes
vel explicar o comportamento humano por da vida dos organismos, uma vez que é um
meio de estudos com outros animais, certo? meio de ligação com o seu ambiente. Pode-
Contudo, este é um erro comum de inter- ríamos dizer que o comportamento desem-
pretação. A continuidade filogenética ou penha um papel crítico na evolução dos
escala evolutiva não é linear. A continuida- organismos vivos e, por isso, os processos
de filogenética é representada por árvores, de aprendizagem foram selecionados as-
cada galho representando ramificações de sim como outras características adaptativas
linhas prováveis de ascendência evolutiva. (Skinner, 1984). Logo, é possível abstrair das
Uma característica importante da escala é pesquisas com animais não-humanos prin-
a consideração de descontinuidades como cípios que operam na seleção de compor-
resultado da divergência de linhas evoluti- tamentos de qualquer espécie animal. Isto
vas, e a extinção de muitas formas interme- não significa que não hajam singularidades.

241
Capítulo XV | Competição e Cooperação

Entretanto, as singularidades se dão na- pela manipulação da variável independen-


quilo que cada organismo é capaz de fazer te com o mesmo indivíduo. Se a replicação
e dos eventos no mundo que são, e se tor- é bem sucedida com o mesmo indivíduo, e
nam, relevantes para cada espécie (Sidman, com outros indivíduo de uma mesma espé-
1960/1976). cie, então o pesquisador poderia analisar a
generalidade do dado manipulando outros
O segundo ponto responsável pelo parâmetros da variável independente. Após
incomodo é a falta de conhecimento sobre sucessivas replicações o cientista poderia
as táticas de pesquisa em Análise do Com- se questionar se a variável independente
portamento. Os estudantes de Psicologia produziria o mesmo processo em indivídu-
têm em comum a noção errada de que os os de outras espécies. Cada descoberta de
pesquisadores em Psicologia devem traba- similaridades processuais é uma instância a
lhar com humanos em situações mais pró- mais de generalidade (Sidman, 1960/1976).
ximas às reais. Caso o pesquisador opte por
trabalhar com animais não-humanos, os Como o uso de animais não-huma-
experimentos deveriam gerar comporta- nos não compromete a compreensão da
mentos análogos aos dos seres humanos, singularidade humana nem é um proble-
pois esta seria a única maneira de se en- ma para a generalidade dos dados, eles são
contrar generalidade. Entretanto, quando o amplamente utilizados não só na Análise
assunto é a generalidade do dado científico, do Comportamento mas também em ou-
a analogia não é um ingrediente necessário tras ciências. Animais não-humanos são
(Sidman, 1960/1976). utilizados na pesquisa experimental pois o
controle de variáveis independentes pode
Para demostrar a generalidade de ser mais facilmente alcançado, há possi-
um processo, o cientista buscará a replica- bilidade de controle genético e de história
ção experimental do dado. Uma das prin- de vida, além da possibilidade de se in-
cipais características das pesquisas em vestigar os efeitos de variáveis que seriam
Análise do Comportamento é a utilização impossibilitadas por questões éticas em
do próprio comportamento do sujeito ex- pesquisas com humanos (Hake, 1982; Lat-
perimental como fonte de comparação dos tal, 2001). A pesquisa comportamental com
efeitos das variáveis independentes. Mes- animais não-humanos desempenha um
mo que o pesquisador observe mudanças papel central em muitas áreas de interesses
comportamentais em função da introdução humanos, incluindo aprendizagem, psico-
de uma manipulação experimental, ele não patologia e neurofisiologia. Quase todas as
estará seguro até que uma replicação seja técnicas eficazes em uma ampla variedade
feita. Um primeiro passo, seria reproduzir de interesses aplicados tem suas origens na
a mudança comportamental ocasionada pesquisa básica com animais não-humanos

242
Marcelo Borges Henriques

(Domjan & Purdy, 1995). sendo constantemente descritos na litera-


tura comportamental, Skinner ponderou
Até então estivemos apresentan- que seria aconselhável um relato mais ex-
do os motivos e as vantagens de se utilizar plícito dos experimentos. Assim, em 1962,
animais não-humanos em pesquisas com- ele publicou, no Journal of the Experimen-
portamentais. Espera-se que, nesse mo- tal Analysis of Behavior, o artigo que será
mento, o estudante de Psicologia esteja em descrito a seguir. Vale ressaltar que esse ar-
melhores condições de compreender que o tigo não foi o primeiro trabalho na literatura
estudo de questões sociais também podem analítico-comportamental sobre comporta-
ser abordados nos mesmos moldes. O pes- mentos sociais com animais não-humanos.
quisador analista do comportamento po- Daniel (1942) foi um dos primeiros autores a
deria se perguntar sobre a possibilidade de argumentar ter obtido comportamento co-
simular contingências sociais tipicamente operativo em ratos em uma situação expe-
humanas em animais não-humanos. Esta rimental. O que torna o artigo de Skinner
seria uma maneira de investigar variáveis singular é a inclusão de um experimento
relevantes para a ocorrência daquilo que é sobre competição e o tipo de contingência
adjetivado como social. Por exemplo, o pes- cooperativa (i.e., o sistema reforçador mú-
quisador poderia se perguntar se a lingua- tuo). Além do mais, Skinner utilizou pom-
gem é um aspecto essencial das relações so- bos ao invés de ratos, o que por si só torna o
ciais. Porem, se dois animais não-humanos experimento interessante em termos de re-
apresentarem comportamento social tipi- plicação entre espécies e generalidade dos
camente humano, somente pelo controle de dados.
contingências de reforçamento, então esse
aspecto poderia ser questionado como um
critério necessário e suficiente para expli- DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO
car o fenômeno social estudado. Portanto,
a ciência estaria mais próxima de compre- Objetivo e Método
ender as variáveis envolvidas no fenômeno O artigo de Skinner (1962) descreve
humano (Herrnstein, 1964). dois experimentos demonstrativos, utili-
zados para ilustrar princípios comporta-
O exercício de simular contingências mentais para estudantes da Universidade
sociais humanas com animais não-huma- de Harvard. Como os experimentos eram
nos chegou a ser realizado por Skinner, que demonstrativos, não há no artigo um relato
descreveu um experimento sobre coopera- claro dos procedimentos, nem apresenta-
ção com pombos no livro Ciência e Com- ção de dados quantitativos. O objetivo dos
portamento Humano (Skinner, 1953/2000). experimentos foi demostrar que comporta-
Como este e outro experimento estavam mento social análogo ao de humanos pode

243
Capítulo XV | Competição e Cooperação

ser obtido com animais não-humanos por peso corporal. O primeiro passo foi condi-
meio do controle de variáveis ambientais. cionar os pombos, separadamente, a bicar
uma bola de pingue-pongue padrão, fixada
à borda da mesa. O passo seguinte foi al-
O Experimento de Competição ternar a posição da bola ao longo da borda
O primeiro experimento relatado por da mesa e, posteriormente, a bola era dei-
Skinner (1962) procurou simular um jogo xada livre para rolar. No momento em que
de pingue-pongue com pombos, um con- a bola era deixada livre, o comportamento
texto competitivo típico do comportamen- dos pombos somente era reforçado se a bola
to social em humanos. O equipamento foi rolasse para um ponto predeterminado, li-
descrito como uma versão “minimamente” geiramente distante da borda. Depois de o
mecanizada de um equipamento já existen- pombo conseguir jogar a bola para além do
te. O diferencial do equipamento utilizado centro da mesa, o esquema de liberação do
por Skinner era que a bola era movida pelos reforçamento era modificado para ter certa
próprios sujeitos, e não por um dispositivo intermitência (i.e., nem todas as respostas
motor. O equipamento consistia basica- eram reforçadas). Somente após a manu-
mente em uma mesa com altura convenien- tenção do repertório de jogar a bola para a
te aos animais e com uma leve inclinação calha, localizada no lado oposto da mesa,
partindo do centro para ambos os lados. foi que os pombos foram expostos ao siste-
Dois pombos podiam ser posicionados um ma competitivo.
frente ao outro, prevenindo que os pombos
pudessem voar ou se deslocar de suas po- A nova condição experimental im-
sições sobre o equipamento. Uma bola de plicava em colocar ambos pombos um de
pingue-pongue podia ser posicionada no frente ao outro e deixar a bola rolar em dire-
centro da mesa de tal forma que quando ção a qualquer um dos animais, o qual po-
solta, poderia rolar para qualquer um dos deria bicar a bola em direção ao lado opos-
lados. Alguns centímetros antes do final da to. A obtenção dos reforços (i.e., alimento)
mesa, em ambos os lados, havia uma calha fazia analogia à obtenção de pontos no jogo
onde a bola poderia cair. Ao cair na calha, de pingue-pongue. Na contingência com-
um interruptor ali localizado acionava o petitiva o comportamento de um indivíduo
comedouro do lado oposto, fornecendo ali- era reforçado em detrimento do outro, ou
mento para o pombo ali posicionado. seja, a “vitória” de um implicava a “derro-
ta” do outro. Uma vez que a razão de refor-
Os passos para se obter a relação ços produzidos por cada pombo poderia ser
competitiva entre os pombos foram sucin- extremamente desproporcional, o compor-
tamente descritos no artigo. Os pombos tamento do pombo mal sucedido poderia
eram privados de alimento para controle de entrar em extinção. Sendo assim, as parti-

244
Marcelo Borges Henriques

das eram mantidas por meio do controle de acesso ao alimento. Dois pombos privados
peso dos animais, aumentando a privação de alimento foram treinados separadamen-
do pombo frequentemente derrotado ou di- te a bicar os discos. Somente um dos três
minuindo a privação do pombo frequente- discos funcionava por vez de uma maneira
mente bem sucedido. semialeatória. Após o estabelecimento da
resposta de bicar os discos, os pombos fo-
ram colocados juntos no equipamento com
Resultados e Discussão uma nova contingência em vigor. A con-
A descrição de Skinner (1962) é ane- tingência cooperativa não só exigia que os
dótica e relata o que o público em geral pode- pombos “encontrassem” qual dos três dis-
ria observar da situação. Uma vez estabele- cos estava em funcionamento, mas tam-
cida a história de interação com o ambiente bém que as respostas de ambos os pombos
experimental e colocados um de frente ao ocorressem com uma diferença de meio se-
outro, em lados opostos, cada pombo bica- gundo (0,5 s) uma da outra em discos cor-
va efetivamente a bola de pingue-pongue, respondentes. A relação condicional pro-
jogando-a para o lado oposto. Os pombos gramada na contingência cooperativa era a
bicavam a bola de um lado para o outro até seguinte: se bicadas ≤ 0,5 s uma da outra,
que ela eventualmente rolasse para dentro em discos correspondentes, então comida
da calha no lado oposto. Skinner relata que para ambos; se bicadas > 0,5 s uma da outra
os animais rebatiam a bola em sequências ou em discos diferentes, então comida não
de cinco a seis rebatidas. Entretanto, o au- era produzida. Procedimentos de privação
tor não observou evidências de variações foram aplicados a ambos pombos (e.g., um
(e.g., em termos de velocidade ou direção) dos pombos poderia ser submetido a um ní-
nas bicadas dos pombos de modo a produ- vel de privação maior do que o outro), de
zir a derrota do adversário. modo a alterar a frequência e alternância de
bicadas entre eles.

O Experimento de Cooperação
O segundo experimento descrito por Resultados e Discussão
Skinner (1962) foi uma simulação do fenô- Skinner (1962) descreve que após
meno cooperativo. O equipamento consis- uma prolongada exposição à contingência
tia em duas câmaras experimentais uni- cooperativa, os pombos passavam a bicar
das lado a lado, separadas por uma divisão discos correspondentes quase que simulta-
transparente. Em cada compartimento en- neamente. Skinner também observou uma
contrava-se uma fileira vertical de três dis- divisão de trabalho entre os dois pombos.
cos de resposta vermelhos, e abaixo de cada Um dos pombos explorava os discos sendo
arranjo de discos o comedouro que dava sempre o primeiro a bicar, e o outro pombo

245
Capítulo XV | Competição e Cooperação

seguia as respostas do primeiro bicando o DESDOBRAMENTOS


disco correspondente. A divisão de trabalho
foi invertida manipulando o nível de priva- O experimento de Skinner (1962) que
ção. O pombo mais privado aumentava a teve maior influência em pesquisas subse-
frequência de exploração dos discos de for- quentes foi o experimento sobre coopera-
ma que o antigo “líder” passava a seguir os ção. O procedimento e os resultados obtidos
discos bicados pelo pombo agora mais pri- por Skinner estabeleceram o contexto para
vado. Segundo o relato de Skinner, a coor- perguntas sobre os princípios básicos en-
denação dos pombos se tornou tão perfeita volvidos em comportamentos sociais, tais
que dava a impressão de se estar observan- como a cooperação e aprendizagem social,
do um espelho. Em sua interpretação, o por exemplo. Como no estudo de Skinner
primeiro pombo a bicar um disco fornecia (1962) o comportamento do pombo “líder”
estímulos discriminativos para o segundo não foi manipulado assim como é comum
pombo bicar no disco correspondente. em um estudo sobre controle de estímulos,
não é claro em que medida o comporta-
Por último, Skinner (1962) descreve mento do pombo denominado de “segui-
que a dupla de pombos desenvolvia um re- dor” estava sob controle do comportamento
pertório de imitação generalizado em fun- do pombo “líder”. Há a possibilidade de que
ção do controle de privação, que gerava a outros fatores no ambiente experimental
alternância da liderança. A alternância da tenham exercido controle sobre o compor-
liderança estabelecia um contexto em que o tamento dos pombos. Tanto na imitação
comportamento de ambos fosse controlado quanto na cooperação é imprescindível que
pelo comportamento um do outro. Skinner ao menos um dos indivíduos emita respos-
menciona que quando bebedouros eram tas sob controle discriminativo dos com-
disponibilizados para cada pombo na câ- portamentos do outro indivíduo.
mara experimental, eles passavam a beber
água simultaneamente. Se os sujeitos expe- Para pesquisadores como Danson
rimentais fossem colocados do lado opos- e Creed (1970), Hake, Donaldson e Hyten
to aos discos, virados para o fundo trans- (1983), Husted e Mckenna (1966), Wiest
parente das câmaras, ambos começavam a (1969) e Nakashika (2004), o aspecto cen-
fazer movimentos exploratórios como uma tral da análise de interações sociais, como a
imagem no espelho. relatada por Skinner (1962) no experimento
de cooperação, é o controle discriminativo.
O objetivo desses autores foi verificar se
animais não-humanos poderiam ser condi-
cionados a emitir uma resposta sob contro-
le do comportamento de outro indivíduo da

246
Marcelo Borges Henriques

mesma espécie (um estímulo social). Todos zidos). No estudo de cooperação de Skinner,
os autores encontraram evidências de que o reforço era contingente à produção de um
diferentes animais podem discriminar estí- efeito ambiental que só podia ser produzido
mulos sociais de coespecíficos, sejam eles a com o comportamento conjunto dos indi-
presença vs. a ausência de outro indivíduo víduos.
(e.g., Husted & Mckenna, 1966, com ratos),
a diferença na taxa de repostas emitida por Entretanto, os estudos citados aci-
outro indivíduo (e.g., Danson & Creed, 1970, ma (e.g., Danson & Creed, 1970; Husted &
com macacos-esquilo) ou a localização da Mckenna, 1966) são úteis para discutir o
resposta do outro indivíduo (e.g., Nakashi- resultado do estudo sobre cooperação de
ka, 2004, com pombos). Skinner (1962): esses estudos discutem a
dificuldade de se gerar evidências de con-
É verdade que os estudos de Danson trole discriminativo por estímulos sociais.
e Creed (1970), Hake, et.al. (1983), Husted e Quando o estímulo não é o comportamen-
Mckenna (1966), Wiest (1969) e Nakashika to de outro indivíduo, há a possibilidade de
(2004) apresentam uma diferença crucial se controlar diferentes dimensões do estí-
em relação ao experimento de coopera- mulo, de forma que ele seja padronizado de
ção de Skinner (1962). A contingência so- apresentação à apresentação (e.g., intensi-
cial criada pelos autores nestes estudos era dade do comprimento de onda luminosa,
uma contingência individual. Os pesqui- o intervalo de tempo entre apresentações
sadores pré-definiam os papéis desempe- dos estímulos, entre outras). Quando o es-
nhados por cada sujeito no experimento. O tímulo é o comportamento de outro indi-
comportamento de um sujeito servia como víduo, inúmeras propriedades podem ser
fonte de estímulos, e o comportamento do diferentes de ocorrência a ocorrência, além
outro servia como variável dependente do da dificuldade se isolar o evento de outros
treino de controle de estímulos. O animal estímulos não sociais presentes no expe-
cujo comportamento servia como um estí- rimento (e.g., a localização das respostas é
mulo discriminativo estava exposto à sua um estímulo não social que pode exercer
própria contingência. Já o comportamento controle sobre o comportamento do outro
do sujeito experimental era reforçado dife- indivíduo pelo emparelhamento entre lo-
rencialmente para responder a determina- cal e disponibilidade de alimento), dificul-
das características do comportamento do tando interpretações. Hake, et al. (1983), por
sujeito-estímulo (e.g., em Danson & Creed, exemplo, argumentaram que os resultados
1970, a taxa alta de respostas do sujeito-es- dos estudos sobre comportamento social,
tímulo sendo o estímulo discriminativo e a de maneira geral,
taxa baixa sendo o estímulo delta, i.e., na
presença da qual reforços não eram produ-

247
Capítulo XV | Competição e Cooperação

(...) sugerem que as futuras pesquisas dução de consequências?.


sobre interações sociais, tais como
cooperação e competição deveriam Em um estudo mais recente, Tan e
proporcionar o treino e/ou testes de Hackenberg (2016) demostraram preocu-
controle por parte do comportamen- pação com a possibilidade da explicação
to apropriado do outro sujeito ao in- alternativa para o comportamento coope-
vés de assumir que tal controle existe, rativo. Os autores estudaram pares de ratos
como tem sido frequentemente o caso” utilizando caixas experimentais paralelas,
(p. 22). divididas por uma parede de acrílico trans-
parente, e em cada compartimento havia
Sem uma evidência para além do re- somente uma barra. A contingência coope-
lato de aquisição de coordenação entre os rativa era semelhante à de Skinner (1962),
animais não-humanos, é possível questio- pois reforços somente poderiam ser produ-
nar em que medida um sujeito está efetiva- zidos se a pressão à barra de ambos os ratos
mente respondendo ao comportamento do fosse separada por 0,5 s. Cada par foi expos-
outro. Esta pergunta é essencial para que to a três condições em um delineamento do
possamos aceitar o estudo com animais tipo ABACA (i.e. “A” sendo a condição de re-
não-humanos como um modelo experi- forçamento mútuo ou contingência coope-
mental de relações sociais humanas. Se os rativa, “B” um esquema acoplado de tempo
pombos do experimento de cooperação de variável, em que os reforços independiam
Skinner (1962) tivessem adquirido uma alta das respostas, e “C” um esquema acoplado
taxa de respostas alternadas, em função do de intervalo variável, em que os reforços
treino individual anterior, eles poderiam, dependiam das respostas, mas neste caso,
ao acaso, atender ao critério de reforça- sem a contingência cooperativa). As condi-
mento mútuo. A manipulação da privação ções “B” e “C” do estudo serviram como con-
que gerava alternância na liderança poderia dições de controle, pois serviam como fonte
ser somente um caso de mudança na frequ- de comparação do repertório adquirido na
ência de exploração dos discos pelo pombo contingência cooperativa. Se a frequência
anteriormente no papel de seguidor. Neste de cooperação entre os ratos fosse casual,
caso, não haveria relação social ou coope- então a frequência de cooperação deveria
rativa entre os pombos. Portanto, uma per- se manter relativamente inalterada mesmo
gunta que poderia ser derivada do estudo diante de outra contingência. Os esquemas
de Skinner é: A ocorrência da resposta co- acoplados permitem controlar a taxa de re-
operativa foi casual ou ambos indivíduos forços do esquema, tendo com base a taxa
estão efetivamente respondendo ao com- de reforços obtidos em um outro esquema.
portamento um do outro de modo a gerar o Este procedimento permite ao pesquisador
efeito ambiental correlacionado com a pro- verificar se um padrão de comportamento é

248
Marcelo Borges Henriques

função da distribuição de reforços no tem- enfraquece a explicação alternativa de si-


po ou da relação condicional entre o com- multaneidade ao acaso. Mesmo assim, é
portamento e a produção de consequências possível enfatizar a importância de garantir
(ver Catania, 1999, p. 183). No procedimento que o efeito no ambiente seja efetivamente
de Tan e Hackenberg (2016), a resposta de fruto de controle social mútuo. Embora os
um dos ratos abria um intervalo de tempo resultados do estudo de Tan e Hackenberg
que era registrado até que o segundo rato demonstrem que a contingência cooperati-
pressionasse sua barra. Esse registro gerou va foi responsável pelo estabelecimento da
duas unidades de medida: a proporção de resposta grupal, não se pode deixar de des-
intervalos menores do que 0,5 s entre as tacar que o número de respostas coordena-
respostas de ambos os ratos, e o número das fora do critério foi muito maior, mes-
de alternâncias entre as respostas, inde- mo os pesquisadores tendo considerado o
pendentemente do critério de 0,5 s (i.e., nas desempenho em estado estável. Portanto, o
condições “B” e “C”, a ocorrência do reforço cuidado em demostrar que ambos animais
interrompia o registro, independentemente não-humanos estão efetivamente respon-
do segundo indivíduo ter emitido uma res- dendo um ao comportamento do outro per-
posta). manece.

O dado obtido foi favorável à contin-


gência cooperativa. Quando a contingência CONSIDERAÇÕES FINAIS
provia reforçamento para a coordenação
entre as respostas dos ratos, a frequência Pesquisas que simulam interações
de respostas grupais era significativamente sociais humanas com animais não-huma-
maior do que nas outras condições, mesmo nos, como a apresentada neste capítulo,
a distribuição de reforços sendo controlada testam o alcance dos conceitos básicos na
pelo acoplamento em vigor nas condições B explicação de fenômenos sociais e expan-
e C. Quanto ao número médio de respostas dem nossa compreensão dos processos que
de alternância, observou-se que a alterna- seriam relevantes no comportamento hu-
ção de respostas foi maior na condição co- mano. É uma maneira de explorar os limi-
operativa, mas diminuiu consideravelmen- tes dos processos comportamentais ou de
te nas condições dos esquemas acoplados encontrar fenômenos que, em tese, só po-
(i.e., o número de respostas individuais au- deriam ser observados em humanos.
mentou). Os resultados indicam que a con-
tingência cooperativa promovia o entrela- Ao longo do capítulo procuramos
çamento entre as respostas dos animais, exemplificar por meio da apresentação de
ou seja, um rato pressionava a barra sob um artigo clássico (Skinner, 1962), e sua in-
controle da resposta do outro rato. O dado fluência em pesquisas sobre cooperação na

249
Capítulo XV | Competição e Cooperação

Análise do Comportamento, que é possível de determinadas práticas culturais. O mo-


desenvolver pesquisas analítico-compor- delo inovador de programação de relações
tamentais de fenômenos sociais com ani- condicionais no nível grupal vem sendo
mais não-humanos. Pôde-se discutir que testado em novas áreas, como no estudo de
o uso de animais não-humanos em pes- metacontingências (e.g., Henriques, Nava-
quisas analítico comportamentais torna-se rini, Souza & Todorov, 2015, Todorov & Vas-
uma ótima oportunidade de se determinar concelos, 2015, Toledo, et al., 2015, Velasco,
a extensão na qual os princípios compor- Benvenuti & Tomanari, 2012).
tamentais básicos podem se constituir em
explicações válidas sobre o comportamen- Embora a demonstração de controle
to social observado em humanos. Ademais, por estímulos sociais seja, em alguma me-
os trabalhos citados no texto são um bom dida, um desafio para os pesquisadores da
exemplo de que a replicação sistemática e a área (Hake, et al., 1983), o processo de se-
utilização de diferentes espécies de animais leção por consequências continua valendo
não-humanos é o caminho para se ampliar na explicação do comportamento social. O
a generalidade dos princípios comporta- que há de especial em interações sociais é a
mentais básicos aplicados ao estudo de fe- dificuldade de padronização no controle de
nômenos sociais. estímulos. Estímulos sociais são mais difí-
ceis de se manipular do que os não sociais,
O artigo de Skinner (1962) é impor- pois suas dimensões podem não ser tão
tante para a Análise do Comportamento consistentes de uma apresentação à outra
não só por fomentar a pesquisa experimen- e são comumente “contaminados” por es-
tal sobre comportamentos sociais, mas pela tímulos não sociais (e.g., o som produzido
relação condicional inovadora criada no es- pela operação do equipamento; Danson &
tudo. A contingência cooperativa elaborada Creed, 1970; Hake, et al., 1983).
por Skinner possibilita um olhar diferente
para a contingência de reforçamento. En- Entretanto, a dificuldade da tarefa do
quanto esta última diz respeito ao compor- pesquisador não denota que sejam neces-
tamento de organismos individuais, a con- sários constructos psicológicos hipotéticos
tingência cooperativa provê reforços para para se explicar o comportamento social
o comportamento conjunto de organismos. humano. Pesquisas com animais não-hu-
Neste sentido, a unidade de análise não é manos caminham na direção do abando-
mais o comportamento individual, mas o no de constructos hipotéticos por uma ex-
comportamento grupal. Estudos experi- plicação baseada na descrição de relações
mentais sobre seleção de comportamentos condicionais entre o comportamento de
grupais podem contribuir para o melhor en- indivíduos e grupos e variáveis ambientais
tendimento de alguns aspectos da seleção relevantes (Herrnstein, 1964).

250
Marcelo Borges Henriques

PARA SABER MAIS metidos a dois procedimentos: Um procedi-


mento típico, em que cada oportunidade de
Epstein (1981). Este artigo divulga parte das resposta cooperativa era separada por um
pesquisas realizadas no projeto Columban timeout; e um procedimento modificado
Simulations. O projeto consistiu em simu- em que os participantes deveriam respon-
lar, com pombos, comportamentos exclu- der, necessariamente, ao estímulo (i.e., um
sivamente humanos como a “comunicação luz) produzido pelo parceiro para que uma
simbólica”, “insight”, “autoconsciência”, e resposta cooperativa fosse registrada. Por
o “uso espontâneo de memorandos” para meio dos dados foi possível concluir que a
determinar os princípios comportamentais resposta grupal (cooperativa) é dependente
responsáveis pela ocorrência de tais fenô- da presença de estímulos sociais (i.e., even-
menos. O autor discute a implicação dos tos no ambiente experimental gerados pelo
dados para a Psicologia e como o uso de si- comportamento de outro indivíduo). Ou-
mulações com animais não-humanos pode tra conclusão a que se pôde chegar é a ne-
contribuir para uma melhor compreensão cessidade de realçar o estímulo social (em
do comportamento humano. vez de utilizar o deslocamento motor como
estímulo, utilizar produtos físicos do com-
Schmitt (1998). Este capítulo apresenta portamento, como uma luz que se acende
uma contextualização conceitual dos ter- quando uma resposta é emitida por qual-
mos “cooperação” e “competição” como um quer um dos indivíduos) em experimentos
dos principais fenômenos sociais estudados derivados da contingência cooperativa de
pela Análise do Comportamento. Ademais, Skinner.
discute os principais procedimentos utili-
zados com humanos, as variáveis indepen- Łopuch & Popik (2011). O estudo é inte-
dente e dependente e compila os principais ressante por ser uma pesquisa externa à
resultados de pesquisas. Análise do Comportamento. Apesar de uti-
lizar um referencial teórico mais próximo à
Schmitt & Marwell (1968). Os autores uti- etologia, os autores utilizam procedimen-
lizaram uma tarefa experimental similar à tos operantes semelhantes ao de Skinner
de Skinner (1962) com humanos. O objetivo (1962). Os pesquisadores avaliaram o efeito
foi verificar se a estrutura do procedimen- de condições de restrição de contato físico,
to utilizado com animais não-humanos e visual e auditivo sobre a resposta coopera-
humanos poderia oferecer uma explicação tiva. Com base nos dados obtidos foi possí-
alternativa (e.g., a casualidade na coorde- vel concluir que as respostas cooperativas
nação das respostas) ao aumento da fre- foram mais frequentes quanto maior a pos-
quência da resposta cooperativa. Cada um sibilidade de contato social, e que a voca-
dos seis pares de participantes foram sub- lização dos animais pode ter sido um fator

251
Capítulo XV | Competição e Cooperação

facilitador das respostas cooperativas. Behavior Analyst, 5, 21.

Hake, D. F., Donaldson, T., & Hyten, C.


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Marcelo Borges Henriques

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253
Fábio Henrique Baia, Alina B. C. Bianco, Isabella Guimarães Lemes, Poliana Ferreira da Silva

Metacontingências:
investigação experimental
da seleção cultural

Fábio Henrique Baia


Alina Barboza Cabral Bianco
Isabella Guimarães Lemes
Poliana Ferreira da Silva
Universidade de Rio Verde

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“É o efeito sobre o grupo e não as consequências reforçadoras para seus membros, o


responsável pela evolução da cultura”
(Skinner, 1981, p. 215)

254
Capítulo XVI | Cultura

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- consequências. Tal modelo especifica três


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO níveis de seleção comportamental: filoge-
DO EXPERIMENTO nia, ontogenia e cultura.

A Análise do Comportamento é uma A filogenia envolve a história da es-


ciência que tem o comportamento dos orga- pécie (Mayr, 2009). Nesse nível de seleção,
nismos como seu objeto de estudo (Baum, comportamentos que permitiram a sobre-
2006). Para um analista do comportamento, vivência da espécie foram selecionados e
o comportamento não carece de elementos passaram a compor o repertório dos orga-
externos a sua definição para ser compre- nismos (Melo, Dittrich, Moreira, & Marto-
endido (e.g., Skinner, 1974). A definição de ne, 2013). Vejamos o caso do reflexo de suc-
comportamento envolve a relação entre ção. Imagine a situação hipotética de dois
ambiente e organismo (Pierce & Cheney, grupos de recém-nascidos em um período
2008; Skinner, 1953). Portanto, a explicação passado longínquo. Um grupo nasceu – gra-
do comportamento não envolve outros ele- ças à mutação – com a capacidade de sugar
mentos que não sejam eventos ambientais dada a apresentação de algo em sua boca,
e eventos do organismo. Por exemplo, ve- como o seio da mãe. O outro grupo nasceu
jamos o caso de alguém afirmar que o com- sem essa capacidade. Quais bebês tem mais
portamento é causado por “pensamento” chance de sobreviver? Certamente aqueles
ou “sentimento”. Neste caso, “pensamento” do grupo com a capacidade de sugar, já que
ou “sentimento” seriam externos ao com- não terão que aprender esse comportamen-
portamento. E assim, para essas pessoas os to. Esses, portanto, serão capazes de mamar
pensamentos deveriam ser compreendidos segundos após o parto. Esses bebês terão
fora da definição de comportamento. Para mais chance de chegar a fase adulta, se re-
analistas do comportamento pensamentos produzir e transmitir a seus descendentes
são um tipo de comportamento – chama- essa capacidade. Já os outros bebês dificil-
dos eventos privados – que devem ser ex- mente conseguiram mamar e morrerão an-
plicados dentro da definição relacional en- tes mesmo de se chegarem à vida adulta.
tre ambiente e organismo (Tourinho, 2009),
e não como algo que causa essa relação. No A ontogenia diz respeito à história de
Behaviorismo Radical, o termo “radical” faz vida de um organismo. Neste caso, estímu-
referência à “raiz”, isto é, o comportamento los que antes não eram capazes de eliciar
é investigado como um objeto de estudo le- respostas podem adquirir essa capacidade
gítimo (Chiesa, 2006) e não como um aces- se contingenciados a estímulos que eliciam
sório explicativo para outros fenômenos – respostas. No exemplo do choro, o médico
como desejos e sentimentos. Skinner (1981) por si só é incapaz de eliciar o choro em re-
propôs o modelo explicativo de seleção por cém-nascidos. Mas se repetidamente o mé-

255
Fábio Henrique Baia, Alina B. C. Bianco, Isabella Guimarães Lemes, Poliana Ferreira da Silva

dico der tapas no bumbum do bebê, após No caso do choro, uma pessoa pode
algumas tentativas, a mera presença do aprender durante sua história de vida a cho-
médico poderá disparar a resposta de cho- rar se esta resposta produzir como consequ-
ro na criança. Note que bebês não nascem ência retirada da demanda de trabalho. Po-
com a capacidade de chorar dada a mera rém, em um grupo de pesquisas, ao chorar
presença do médico, mas em sua vida, se a após a demanda do orientador, os demais
situação acima ocorrer, então o recém-nas- membros do grupo podem punir o compor-
cido aprenderá a chorar dada a presença do tamento da colega reclamando da mesma.
médico. Assim, o grupo estabelece que tal resposta é
passível de punição. Ou seja, o ambiente so-
Outra possibilidade de aprendiza- cial criado pelos membros do grupo de pes-
gem de comportamentos durante a história quisa estabelece condições para supressão
de vida se dá pela relação contingente entre de comportamentos. Este exemplo ilustra a
respostas e suas consequências. O bebê, ao tradição de analistas do comportamento in-
chorar, é colocado no seio da mãe, com isso teressados no terceiro nível de seleção, que
passa a ter acesso ao leite materno. Essa re- investigam de que modo o comportamen-
lação estabelecerá que a resposta de chorar to individual é determinado pelo ambien-
tem como consequência o alimento (Tou- te social (e.g., Baum, Richerson, Efferson,
rinho, 2009). Portanto, no futuro, em situ- & Paciotti, 2004; Cohen, 1962; Schmitt &
ações nas quais o bebê estiver privado de Marwell, 1968; Schmitt, 1998; Tan & Hacke-
alimento, ele provavelmente emitirá a res- nberg, 2012, 2016). Nesses casos, aspectos
posta de chorar que no passado foi reforça- da cultura são entendidos como variáveis
da com a apresentação de alimento. independentes e os comportamentos são
investigados como variáveis dependentes
O terceiro nível de seleção descrito (Andery, 2011).
por Skinner (1981) é a cultura. Por cultura,
entende-se a manutenção do ambiente so- Porém, a cultura também pode ser
cial de um grupo (Andery, 2011). Nesse sen- entendida como variável dependente. Nes-
tido, comportamentos são selecionados por se caso, o interesse de analistas do compor-
atenderem critérios sociais de reforçamento tamento é compreender como práticas cul-
e punição estabelecidos por um dado grupo turais são mantidas. Práticas culturais são
de indivíduos. Por critérios sociais nos re- comportamentos socialmente aprendidos
ferimos a situações nas quais o comporta- que são similares e que são transmitidos
mento de um organismo é reforçado ou pu- entre diferentes gerações de membros de
nido por consequências que são mediadas um grupo de indivíduos (Glenn, 2004; Sam-
por outros indivíduos. paio & Andery, 2010). Por exemplo, analis-
tas do comportamento tentam explicar por

256
Capítulo XVI | Cultura

quê uma pratica cultural como parar o carro tingência: estímulo discriminativo (SD), res-
diante da faixa de pedestres se inicia (Séné- posta (R) e estimulo reforçador (SR). Note
chal-Machado & Todorov, 2008), ou ainda que são apresentadas duas possibilidades
politicas públicas, como programas de con- de entrelaçamentos, mas existem muitas
trole de reprodução de animais abandona- outras possibilidades. Escolhemos estas
dos e que habitavam as ruas da cidade de pois representam duas situações distintas
São Carlos (Bortoloti & D’Agostino, 2007) . no que se refere a produção de reforços.
Esse tipo de análise tem como objeto o que Na primeira, apresentada no quadro da es-
Skinner (1981) especificou na epígrafe des- querda, a coordenação de respostas produz
se capítulo: a evolução da cultura. Quando diferentes reforçadores para cada organis-
estudamos a evolução da cultura, entende- mo. Este é o caso dos pombos cooperativos
mos que as consequências que selecionam descritos por Skinner (1962). Naquele estu-
práticas culturais agem sobre o grupo e não do, quando os pombos coordenavam suas
como consequências individuais do com- respostas bicando cada qual em um disco
portamento de cada membro do grupo. Mas diferente, porém ao mesmo tempo, reforços
o grupo não é um organismo que se com- eram liberados para cada organismo.
porta. Quem se comporta são os indivíduos
membros do grupo. Assim, teoricamente,
um grupo não pode ser sensível às conse-
quências. Então como pode uma consequ-
ência agir sobre o grupo?

Primeiramente, é preciso ter cla- Figura 1. Diagrama de contingências comportamentais entrelaçadas.


No quadro da esquerda os indivíduos precisam coordenar suas respos-
reza de que o objeto de estudo da Análise tas para produzir reforços para cada organismo. No quadro da direita, a
coordenação de respostas produz um reforço comum que é partilhado
Comportamental da Cultura (ACC) ainda é pelos organismos.

o comportamento e quem se comporta são


os organismos individuais. Porém, esse ob- O quadro da direita da Figura 1 apre-
jeto de estudo não é o comportamento de senta a situação na qual dois organismos
um único individuo, mas o comportamento coordenam suas respostas e produzem uma
de vários indivíduos (que geralmente, mas consequência comum para ambos. O exem-
não necessariamente, recorre entre gera- plo descrito por Sampaio e Andery (2010) é
ções). Nesse caso, as contingências estão uma situação em que vários organismos
entrelaçadas, isto é, as contingências com- precisam coordenar suas respostas para re-
portamentais individuais estão conectadas mover uma pedra de uma tonelada. Note
umas às outras (Skinner, 1953). Como pode que somente um dos organismos atuando
ser visto na Figura 1, o comportamento de sozinho não poderia remover a pedra. A re-
cada indivíduo é descrito pela tríplice con- moção da pedra só é possível pela coorde-

257
Fábio Henrique Baia, Alina B. C. Bianco, Isabella Guimarães Lemes, Poliana Ferreira da Silva

nação das respostas de vários organismos. Glenn (1986, 1988, 1991, 2004) des-
Além disso, a consequência – pedra remo- creveu um tipo de programação de contin-
vida – é partilhada por todos os organismos gências chamada metacontingência para
envolvidos. descrever a seleção de práticas culturais.
Como pode ser visto na Figura 2, o conceito
Em ambos os casos apresentados na descreve uma relação de dependência en-
Figura 1, é o comportamento de organismos tre culturantes e consequências culturais
individuais que é sensível às consequências (Glenn et al., 2016). Culturantes se referem
(Todorov, 2012). Mas no estabelecimento e à contingências comportamentais entre-
manutenção de uma cultura, a produção laçadas (CCEs) e seus produtos agregados
das consequências depende do “conjunto”, (Hunter, 2012). Desse modo, assim como o
do entrelaçamento, dos comportamentos operante é entendido como uma classe de
dos indivíduos. respostas que é controlada por uma mesma
consequência, o culturante seria uma classe
Portanto, não se afirma que o “grupo” de CCEs mais PA que estão sob controle das
é sensível às consequências. A passagem mesmas consequências culturais. O produ-
de Skinner (1981) que serve como epígrafe to agregado (PA) é um efeito ambiental que
desse capítulo ressalta que a recorrência da só pode ser produzido pelo comportamento
prática dependerá dos efeitos sobre o grupo de diversos indivíduos que estão envolvidos
como um todo. Por exemplo, a adoção de em CCEs (Vichi & Tourinho, 2011). Em uma
uma nova prática de pesca dependerá das programação de metacontingência, caso o
consequências para o grupo: mesmo que PA atenda um critério, consequências cul-
um dos membros do grupo tenha menos lu- turais (CC) são produzidas. Essas consequ-
cro individualmente, se o grupo como um ências culturais alteram a probabilidade fu-
todo lucrar mais, é provável que a nova prá- tura de recorrência dos culturantes.
tica se torne mais frequente do que a antiga.
Culturante O caso da pesca ilustra esta situação
(Costa, Nogueira e Vasconcelos, 2012). Ima-
gine um grupo de pescadores que se reúne
para pescar em alto mar. Este grupo de pes-
cadores utiliza a técnica da tarrafa. Tarrafas
são redes artesanais redondas que contém
pesos em suas bordas. Os pescadores jogam
as tarrafas no mar e puxam de volta. Os
Figura 2. Diagrama de uma metacontingência. Os comportamentos pescados ficam presos nessas tarrafas. Nes-
operantes estão envolvidos em contingências entrelaçadas. Em con-
junto, os comportamentos geram um produto agregado (PA). Como o te caso, o barco de pesca possui um capitão
PA atende o critério ambiental uma consequência cultural (CC) é li-
berada. que navega a embarcação, pescadores, lim-

258
Capítulo XVI | Cultura

padores de peixe e pessoas que armazenam xes ficam presos nas redes de arrastro e
os peixes em recipientes refrigerados. Cada são retirados do mar. Novamente, o com-
indivíduo envolvido na pescaria tem seu portamento de cada organismo envolvido
comportamento controlado por uma con- produz sua consequência reforçadora indi-
sequência, mas esses comportamentos in- vidual. Porém, o PA gerado é maior do que
dividuais estão envolvidos em CCEs. Veja, aquele produzido pela técnica de tarrafas.
o capitão tem seu comportamento reforça- Digamos que a técnica de redes de arrastro
do por atingir o local de pesca. O local de gere 3 toneladas de peixe. Logo, a CC será
pesca funciona como SD para o comporta- três mil reais. Neste caso, a prática cultu-
mento dos pescadores de jogarem as tarra- ral selecionada será a de utilizar a técnica
fas e a puxarem de volta. A consequência de redes de arrastro. O problema é que esta
para o comportamento dos pescadores são técnica produz certos efeitos ambientais
os pescados. Os pescados são, por sua vez, deletérios. Redes de arrastro coletam não
SD para o comportamento dos limpadores apenas os peixes de tamanho adulto, mas
de peixes, que tem seus comportamentos também peixes que ainda não atingiram a
reforçados por pescados limpos. Por fim, idade adulta. Outro problema é que peixes
pescados limpos são SD para o comporta- que não são alvo de pesca acabam sendo
mento dos armazenadores de alocarem os pescados e morrem no processo. Com isso,
pescados em recipientes refrigerados. a quantidade de peixes diminui a em médio
e longo prazo e essa técnica de pesca é con-
Além das consequências individuais, siderada predatória e danosa. Mas como
as CCEs geram o PA: quantidade de peixes produz CC de maior magnitude em curto
pescados e limpos, digamos, 1 tonelada. prazo, provavelmente esta técnica é que
Com essa quantidade, os pescadores podem será seleciona.
vender os pescados e assim produzirem mil
reais (CC). Essa quantidade de dinheiro irá Note que quando se programam me-
selecionar (i.e., tornar mais frequente) o tacontingências, os comportamentos indi-
comportamento dos pescadores de se reu- viduais podem ser selecionados por seus
nirem e utilizar tarrafas. reforçadores. Porém, esses comportamen-
tos podem ser alterados sem que se modifi-
Assim como nos níveis filogenético quem as contingencias operantes individu-
e ontogenético, é possível observarmos va- ais. É nesse sentido que se afirma que há um
riação no nível cultural. Por exemplo, além terceiro nível de seleção (cf. Skinner, 1981):
da tarrafa, os pescadores podem fazer uso Diferentes arranjos do tipo [CCEs + PA] →
de redes de arrastro. Neste caso, as redes CC podem produzir mudanças no compor-
são lançadas ao fundo do mar e o barco é tamento dos organismos envolvidos sem
colocado em movimento. Com isso, os pei- que se haja mudanças em cada contingên-

259
Fábio Henrique Baia, Alina B. C. Bianco, Isabella Guimarães Lemes, Poliana Ferreira da Silva

cia operante individual envolvida no entre- comportamento individual não poderiam


laçamento. ser explicadas como efeito de consequên-
cias para o comportamento de indivíduos,
Apesar da proposição do conceito de isto é, por reforçamento. Lembre-se, no re-
metacontingência ter ocorrido em meados forçamento, uma classe de respostas de um
da década de 1980 (Glenn, 1986), apenas em individuo tem sua probabilidade de ocor-
2004 o primeiro trabalho experimental foi rência aumentada por um evento ambien-
realizado. O experimento conduzido por tal contingente. Na programação de Vichi
Christian Vichi fez parte de sua dissertação et al., as respostas de todos os indivíduos
de mestrado e foi publicado incialmente seriam alteradas ao se exigir um tipo espe-
como capítulo de livro (Vichi, 2005) e, mais cífico de interações entre todos os membros
tarde, como artigo, no Behavior and Social do grupo para que as consequências fossem
Issues (Vichi, Glenn, & Andery, 2009). Além liberadas. Desse modo, foi produzida em la-
de ter sido o primeiro trabalho experimental boratório a situação sugerida por Skinner
sobre metacontingência, o estudo tornou- (1981) na epígrafe desse capítulo.
-se clássico por descrever um de delinea-
mento experimental e um procedimento Os participantes do estudo de Vichi
para investigação de práticas culturais em et al. (2009) foram oito universitários de
laboratório. ambos os sexos, distribuídos em dois grupos
com quatro participantes cada. O delinea-
mento utilizado foi intrassujeitos. Os parti-
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO cipantes em cada grupo foram expostos a
diferentes ordens de condições. O Grupo 1
Objetivo e Método foi exposto à ordem A-B-A-B e o Grupo 2 à
Vichi et al. (2009) investigaram se a ordem B-A-B. A programação de diferentes
apresentação contingente de consequên- ordens de condições verificar se há algum
cias culturais (ganhos) a determinado pro- efeito que é função da ordem de exposição
duto agregado (modo de distribuição dos às condições (ver Sidman, 1960). A mudan-
ganhos obtidos, se igual ou desigual) pode- ça de condições envolvia atingir o critério
ria influenciar interações entre indivíduos de estabilidade exigido. Tal critério foi esti-
em pequenos grupos. A engenhosidade dos pulado como 10 distribuições consecutivas
autores foi programar consequências para a de acordo com as exigências programadas
decisão do grupo de como distribuir os ga- para a condição.
nhos, o que só poderia ser produzido pelas
interações de todos os membros do gru- A tarefa utilizada foi baseada no
po e não pelo comportamento individual trabalho de Wiggins (1969). Uma matriz
de cada participante. Assim, mudanças no composta por oito colunas e oito linhas foi

260
Capítulo XVI | Cultura

impressa e fixada em uma parede da sala os ganhos eram distribuídos entre os parti-
experimental. A junção entre colunas e li- cipantes no final da tentativa anterior. Na
nhas formavam células (ao todo, 64 células). condição A, caso os participantes distribu-
Metade das células foram preenchidas com íssem seus ganhos igualmente (i.e., a mes-
símbolos de adição (+) e as demais com sím- ma quantidade para cada membro) na ten-
bolo de subtração (–). Cada sessão foi com- tativa anterior, o pesquisador escolhia uma
posta por 30 ciclos. Um ciclo era compos- coluna que necessariamente resultaria em
to por apostas, nas quais cada participante adição (i.e., produzindo como ganho para o
entregava fichas para compor a aposta do grupo o dobro do valor apostado na tenta-
grupo, o anuncio de uma das linhas pelos tiva). Distribuições desiguais de ganhos na
participantes, o anuncio de uma das colu- tentativa anterior (i.e., cada participante re-
nas pelo pesquisador, e o anuncio de ga- cebia diferentes quantidades de fichas) leva-
nhos e distribuição de ganhos. Assim, no vam o pesquisador a selecionar um símbolo
começo de cada ciclo, cada participante en- de subtração (i.e., produzindo como ganho
tregava uma quantidade de fichas a seu cri- para o grupo metade do valor apostado na
tério para compor a aposta do grupo. Após tentativa). Na condição B, as programações
todos os participantes terem entregado sua foram invertidas: caso os participantes dis-
quantidade de fichas para a aposta, o expe- tribuíssem seus ganhos desigualmente (i.e.,
rimentador solicitava que fosse realizada diferentes quantidades para cada membro)
escolha consensual dos participantes por na tentativa anterior, o pesquisador esco-
uma linha da matriz. Tendo sido declara- lhia uma coluna que necessariamente re-
do acordo consensual por uma das linhas, sultaria em adição (i.e., produzindo como
o pesquisador declarava a escolha de uma ganho para o grupo o dobro do valor apos-
das colunas. Caso a junção entre linha e tado na tentativa). Distribuições iguais de
coluna fosse um símbolo de adição, os par- ganhos na tentativa anterior (i.e., cada par-
ticipantes recebiam o dobro do total (i.e., ticipante recebia a mesma quantidades de
a soma das apostas individuais) apostado. fichas) levavam o pesquisador a selecionar
Se a junção entre linha e coluna fosse um um símbolo de subtração (i.e., produzindo
símbolo de subtração, os participantes re- como ganho para o grupo metade do valor
cebiam metade do valor total apostado. Por apostado na tentativa).
fim, os participantes distribuíam os ganhos
da aposta entre todos os membros do grupo. A exposição sucessiva do mesmo
grupo à diferentes condições possibilitou
A escolha do pesquisador por uma investigar se o modo como os participantes
coluna não era aleatória. O pesquisador es- distribuíam seus ganhos poderia ser altera-
colhia uma coluna que resultasse em adição do por mudanças nas metacontingências
ou subtração a depender da maneira como sem que houvesse mudanças nas contin-

261
Fábio Henrique Baia, Alina B. C. Bianco, Isabella Guimarães Lemes, Poliana Ferreira da Silva

gências operantes. Por um lado, se os re- tidos demandaram a realização de uma in-
sultados indicassem que a distribuição de tervenção: o pesquisador informava que era
ganhos não foi alterada a despeito das dife- necessário reter parte dos ganhos para “o
rentes metacontingências (i.e., as condições banco” (i.e., quem pagava as apostas). Esse
A e B descritas anteriormente), isso signi- “confisco” foi uma estratégia desenvolvida
ficaria que as consequências para o grupo pelos pesquisadores durante o experimento
não eram capazes de selecionar diferentes para produzir contato com a metacontin-
práticas (i.e., a distribuição de ganhos entre gência em vigor na condição B.
participantes ao final de cada tentativa). Por
outro lado, caso a distribuição de ganhos Em algumas situações experimentais
se alterasse dadas as alterações nas meta- é necessário realizar intervenções de modo
contingências, seria demonstrado que as que o comportamento do organismo ocorra
consequências providas pelo pesquisador e entre em contato com as contingências em
estavam selecionado as práticas sem que vigor. Reflita, se o comportamento nunca
houvesse interferência nas contingências ocorrer, como as consequências poderiam
operantes. seleciona-lo? Assim, forçamos a ocorrência
do comportamento para garantir que, ao
O procedimento de Vichi et al. (2009) menos uma vez, o comportamento entre em
estabeleceu que o culturante fosse compos- contato com as contingências. Vejamos o
to pelas respostas verbais dos participantes caso de estudos onde o participante precisa
(CCEs) que geravam a escolha consensual realizar escolhas. Nesse experimento hipo-
por uma linha (PA) que, se atendesse o cri- tético, o participante pode ganhar um real
tério da condição, produzia o dobro ou me- por escolher o cartão azul ou três reais por
tade do valor apostado (CC). escolher o cartão vermelho. Se no começo
do experimento o pesquisador não forçar o
participante a realizar ao menos uma esco-
Resultados e Discussão lha em cada opção, como podemos afirmar
De modo geral, os dois grupos dis- que a escolha estava sob controle de uma
tribuíram seus ganhos de acordo com a variável como a magnitude (quantidade) de
metacontingência programada em cada reforços (i.e., um real vs. três reais)?
condição. Porém, na condição B, na qual a
metacontingência exigia distribuição desi- É possível que os participantes do
gual, os pesquisadores precisaram intervir estudo de Vichi et al. (2009) tenham tendi-
já que os participantes incialmente tendiam do a realizar distribuições igualitárias para
a não realizar distribuições desiguais. Tal evitar conflitos entre os membros do grupo
estratégia não foi prevista quando o expe- sobre quem ganharia mais. Afinal os parti-
rimento foi delineado. Porém, os dados ob- cipantes eram colegas de turma na mesma

262
Capítulo XVI | Cultura

universidade. Nesse caso, a história pré-ex- participante individualmente. Portanto, as


perimental dos participantes (isto é, apren- metacontingências foram responsáveis por
dizagem anteriores ao experimento) pode alterar as interações entre os membros do
ter atuado na determinação do comporta- grupo .
mento durante o experimento. Quando o
pesquisador forçou a distribuição desigual
por meio da intervenção, os participantes DESDOBRAMENTOS
entravam em contato com o fato de que essa
distribuição gerava maiores ganhos. Assim, Após o estudo de Vichi et al. (2009)
os efeitos da história pré-experimental dos diversos estudos sobre a seleção cultural fo-
participantes podem ser minimizados em ram conduzidos. Martone (2008), por exem-
função de arranjos experimentais adicio- plo, conduziu uma replicação sistemática
nais. Vichi et al. (2009) precisaram intervir do experimento de Vichi et al. num estudo
23 vezes na condição B para o Grupo 1 e 30 com quatro experimentos. O objetivo foi in-
vezes para o Grupo 2, na mesma condição. vestigar se as práticas de distribuição igua-
A intervenção também aconteceu na con- litária e desigual seriam mantidas após a
dição A (distribuição igualitária) para o Gru- substituição de participantes em cada gru-
po 1, mas apenas duas vezes. po. Ou seja, no estudo de Martone investi-
gou-se não apenas a seleção de culturantes,
Em geral, uma vez que os participan- mas também a transmissão de comporta-
tes entravam em contato com a metacon- mento entre gerações. Uma das principais
tingência, poucas interferências do pesqui- diferenças entre os trabalhos de Vichi et al.
sador foram necessárias. Você se lembra do e Martone é que no segundo a matriz foi
cuidado metodológico de expor cada grupo apresentada em um programa de computa-
a diferentes ordens de condições? Pois bem, dor. A cada nova tentativa os símbolos de
os experimentadores também observaram adição e subtração eram apresentados em
que a história de exposição influenciou os diferentes células. Além disso, havia outras
resultados. Em ambos os grupos, na segun- diferenças entre os estudos, como o nú-
da exposição à condição B, se comparada mero de participantes por grupo e o modo
a primeira, precisou de menos tentativas como o pesquisador intervinha para propi-
para que a distribuição se tornasse estável ciar o contato com a metacontingência. Os
(ocorresse por 10 tentativas consecutivas). resultados de Martone sugerem indícios de
seleção das práticas culturais mas, segundo
Esses resultados indicam que a prá- o autor, não de forma contínua. Isto porquê,
tica de distribuir os ganhos, se igual ou de- para alguns grupos de participantes, não foi
sigual, dependeu das consequências pro- observado um padrão de distribuição de
gramadas para o grupo e não para cada acordo com a metacontingência em vigor.

263
Fábio Henrique Baia, Alina B. C. Bianco, Isabella Guimarães Lemes, Poliana Ferreira da Silva

Os culturantes por vezes atendiam as exi- apresentam este cuidado, incluindo o jogo
gências ambientais mas não se mantinham da matriz). Diversos estudos foram realiza-
estáveis. Esse resultado é diferente do ob- dos utilizando esse procedimento (e.g., Baia,
servado por Vichi et al. Azevedo, Segantini, Macedo, & Vasconce-
los, 2015; Bullerjhann, 2009; Caldas, 2009;
Por outro lado, os resultados de Mar- Saconatto & Andery, 2013; Vieira, 2010).
tone (2008) indicam que a substituição de De modo geral, os estudos encontraram
participantes não afetou o padrão de dis- que culturantes são selecionados por con-
tribuição dos grupos. Mesmo após a troca sequências culturais. Isto é, os organismos
de participantes, os grupos tendiam a con- tendem a coordenar suas ações de modo a
tinuar a apresentar o padrão de distribuição gerar um produto agregado que atenda as
desenvolvido pelas gerações anteriores. exigências ambientais para liberação de
consequências culturais.
Uma das principais contribuições do
estudo de Vichi et al. (2009) foi apresentar A investigação experimental da se-
um procedimento para a análise experi- leção por metacontingências é um campo
mental de metacontingências. Diversos ou- de pesquisa recente. Por este motivo, dife-
tros estudos utilizaram o “jogo da matriz” rentes procedimentos existem atualmente
descrito em seu artigo (e.g., Borba & Glenn, (e.g., Costa et al., 2012; Hunter, 2012; Neves,
2014; Borba et al., 2014; Cavalcanti, Leite, Woels, & Glenn, 2012; Ortu, Becker, Woelz,
& Tourinho, 2014; Franceschini, Samelo, & Glenn, 2012; Sampaio et al., 2013). Em
Xavier & Hunziker, 2012; Pavanelli, Leite, geral, os procedimentos envolvem tentati-
& Tourinho, 2014; Soares, Cabral, Leite, & vas discretas – situação na qual o respon-
Tourinho, 2012). Novas questões de pesqui- der é restringido a períodos de observação
sa e procedimentos foram desenvolvidos. seja removendo o acesso dos participantes
Pereira (2008), por exemplo, tentou isolar ao equipamento ou à possibilidade de res-
experimentalmente os efeitos da programa- ponder (Perone, 1991). Nos experimentos
ção de contingências individuais e meta- que usam o jogo da matriz, os participan-
contingências na seleção de comportamen- tes precisam aguardar o pesquisador auto-
tos envolvidos em entrelaçamentos como rizar o novo ciclo de apostas. Já no proce-
aqueles no experimento de Vichi et al. Para dimento do jogo dos números, após todos
tanto, Pereira (que trabalhou no mesmo la- participantes terem inserido seus números,
boratório da PUC-SP no qual Vichi havia o computador libera as consequências e re-
realizado seu estudo) desenvolveu o “jogo aliza um intervalo (em geral é de 0,8 s) an-
dos números”, no qual é possível programar tes do início de uma nova possibilidade de
diferentes consequências individuais e cul- os participantes inserirem os números. Um
turais (atualmente diversos procedimentos ponto importante em relação a esses pro-

264
Capítulo XVI | Cultura

cedimentos que usam tentativas discretas é de tentativas discretas).


que a sessão termina comumente em fun-
ção do número de tentativas. Assim, os par- A condução de experimentos sobre
ticipantes deve sempre responder, não sen- metacontingências é de suma importância
do possível que respostas não ocorram. Esse para a perspectiva analítico-comportamen-
aspecto do procedimento dificulta a análise tal da seleção cultural. Há críticas sobre a
de efeitos da suspensão das consequências necessidade do conceito de metacontin-
culturais (Baia et al., 2015). Tal dificuldade gências (e.g., Gusso & Kubo, 2007). Con-
pode ser minimizada ao se utilizar procedi- tudo, sendo a Análise do Comportamento
mentos similares ao operante livre. uma ciência indutiva, a validade dos con-
ceitos depende da sua demonstração empí-
Há ao menos dois procedimentos rica (Harzem & Miles, 1978).
que foram desenvolvidos utilizando méto-
do similar ao operante livre: O jogo do xa-
drez (Vasconcelos & Todorov, 2015) e o cul- CONSIDERAÇÕES FINAIS
turante livre (Toledo et al., 2015). Nesse tipo
de procedimento os organismos são livres O estudo de Vichi et al. (2009) inau-
para responder – podem ou não emitir os gurou o campo de investigações experi-
comportamentos alvo de análise sem res- mentais sobre metacontingências. Além
trições ao acesso dos participantes ao equi- disso, os resultados do estudo sugerem que
pamento ou à possibilidade de responder é possível alterar comportamentos de pes-
(Perone, 1991). O uso desses procedimentos soas em pequenos grupos sem que as alte-
permite verificar, por exemplo, o que ocorre rações sejam nas contingências operantes.
com culturantes em situações nas quais as Essa é uma importante demonstração de
consequências são programadas de modo seleção cultural. Esse tipo de explicação do
intermitente, ou ainda em situações em que comportamento é alinhada aos princípios
não há relação de dependência entre cul- da seleção por consequências (Skinner,
turantes e consequências culturais. Outra 1981).
vantagem de estudos cujo o procedimento
é similar ao operante livre é que os efeitos Um grupo não se comporta, não é
da suspensão das relações condicionais en- sensível à consequências, mas seus mem-
tre culturantes e consequências culturais bros se comportam e são sensíveis a mu-
(como extinção) podem produzir resultados danças ambientais. O conceito de metacon-
mais confiáveis, já que os participantes po- tingência não afirma que é possível uma
dem não se engajar na emissão de compor- seleção do comportamento de grupos, mas
tamentos sem alterar a exposição ao proce- que é possível alterar comportamentos que
dimento (como ocorre em procedimentos estejam envolvidos em CCEs ao programar

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Fábio Henrique Baia, Alina B. C. Bianco, Isabella Guimarães Lemes, Poliana Ferreira da Silva

diferentes consequências culturais (i.e., do que estabelecer contingências operantes


programando-se diferentes relações con- para o comportamento de cada usuário do
dicionais entre os diferentes culturantes e sistema de abastecimento. Nesse contexto,
as consequências culturais). É apenas neste o conceito de metacontingência pode ser
sentido que diz-se que o grupo esteve sob promissor para aplicações. Até o momen-
controle das exigências comportamentais. to, o que temos são análises interpretativas
O mesmo acontece quando alguém diz “o (e.g., Bortoloti & D’Agostino, 2007; Perossi &
rapaz ficou sob controle dos reforços so- Carrara, 2012; Sénéchal-Machado & Todo-
ciais”. É importante ressaltar que, em ambos rov, 2008). Esperamos que no futuro o con-
os casos, quem está sob controle das conse- ceito seja útil para análise de problemas da
quências são os comportamentos, seja dos sociedade, além da elaboração de interven-
membros do grupo ou do indivíduo. ções comportamentais no nível cultural.
Por exemplo, o consumo e gestão da água é
Quando falamos em programar me- um problema que talvez possa ser aborda-
tacontingências estamos mais interessados do no nível supra-organismo (i.e., cultural).
em alterar os comportamentos envolvidos Seria algo muito bom se o conhecimento
em CCEs sem intervir nas contingências experimental básico sobre seleção cultural
operantes que mantém cada comporta- pudesse ajudar a resolver problemas sociais
mento individual. Imagine a quantidade que demandam a intervenção simultânea
de recursos envolvidos para alterar contin- no comportamento de muitos indivíduos.
gências operantes numa situação na qual as
CCEs envolvem o comportamento de mi-
lhares de pessoas. Portanto, se for possível PARA SABER MAIS
alterar o comportamento desses indivíduos
ao se estabelecer metacontingências, sem Martone & Todorov (2007). Artigo que
que seja necessário manipular cada contin- apresenta o desenvolvimento do conceito
gência operante, então o conceito de me- de metacontingência desde sua proposição
tacontingências pode se mostrar útil. Isso por Glenn (1986).
porque, neste caso, a intervenção se daria
no nível cultural e não no operante. Veja- Sampaio & Andery (2010). Apresentação
mos um exemplo. de conceitos e possibilidades de análise de
fenômenos sociais na Análise do Compor-
Em uma situação de escassez de tamento.
água – como a vivida na cidade de São
Paulo em 2014 e 2015 – pode ser mais efi- Saconatto & Andery (2013). Programação
ciente ocupar-se de programações que ge- de metacontingências com contingências
rem o PA, quantidade de água consumida, aversivas. Nessa pesquisa as consequências

266
Capítulo XVI | Cultura

culturais foram caracterizadas por evitar a 326.


perda de bônus para todo o grupo.
Borba, A., & Glenn, S. S. (2014). Establishing
Gusso & Kubo (2007). Neste artigo os auto- the macrobehavior of ethical self-control in
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271
André A. B. Varella, Maria Carolina Correa Martone, Carolina Coury Silveira

“Pare com isso menino!”:


análise funcional de
problemas de comportamento

André A. B. Varella
Universidade Católica Dom Bosco

Maria Carolina Correa Martone


Universidade Federal de São Carlos; Fundação Panda

Carolina Coury Silveira


Universidade Federal de São Carlos

Iwata, B. A., Dorsey, M. F., Slifer, K. J., Bauman, K. E., & Richman, G. S. (1982). Toward a functio-
nal analysis of self-injury. Analysis and Intervention in Developmental Disabilities, 2, 3-20.

“A alma não tem segredo que o comportamento não revele”


Lao Tsé

272
Capítulo XVII | Análise Funcional

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- entre outras topografias potencialmente


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO perigosas. Entretanto, nesse período, a ABA
DO EXPERIMENTO ainda não havia desenvolvido recursos
tecnológicos para compreender a função
A Análise do Comportamento Apli- desses problemas de comportamento, ou
cada (ou ABA, do inglês Applied Behavior seja, quais consequências mantinham esses
Analysis) se caracteriza como uma ciência comportamentos ocorrendo em certos con-
dedicada à aplicação da Análise Experi- textos. Naturalmente, as intervenções nes-
mental do Comportamento na solução de se período não eram baseadas na função
problemas socialmente relevantes (Baer, do comportamento e eram implementadas
Wolf, & Risley, 1968). Enquanto uma ciência a partir do conhecimento sobre comporta-
aplicada, a ABA historicamente se ocupou mento operante produzido até aquele perí-
com diversos problemas humanos, dentre odo pela Análise Experimental do Compor-
eles o estudo e desenvolvimento de inter- tamento.
venções para reduzir ou eliminar problemas
severos de comportamento, tais como com- Estes estudos iniciais foram impor-
portamentos agressivos, de automutilação, tantes por terem demonstrado que esses
ingestão de objetos não comestíveis, entre comportamentos eram operantes; ou seja,
outros. Indivíduos com autismo, deficiên- poderiam ser explicados pelos princípios da
cia intelectual, transtornos psiquiátricos e Análise do Comportamento e seriam sen-
até mesmo pessoas com desenvolvimento síveis à manipulação de estímulos antece-
típico apresentavam comportamentos que dentes e de suas consequências. Por exem-
poderiam colocar em risco a sua saúde e de plo, Wolf, Risley e Mees (1964) relataram
outras pessoas, o que demandava, portanto, sucesso na redução da frequência de birras
intervenções rápidas e eficazes. de uma criança com autismo. As birras in-
cluíam topografias de respostas como esta-
A partir do final da década de 1950, pear o rosto, arrancar fios de cabelo, bater
começaram a ser publicados estudos so- a cabeça e arranhar o rosto. Os autores ob-
bre intervenções em problemas de com- tiveram uma medida da linha de base das
portamento, de diversas topografias. Esses topografias identificadas e implementa-
primeiros estudos procuraram intervir em ram uma contingência de timeout (time out
comportamentos como escalar móveis e lo- from positive reinforcement, ou suspensão
cais perigosos (Risley, 1968), ferir a própria discriminada de contingências de reforço;
cabeça e braços com batidas (Lovaas, Frei- Ferster, 1958). Quando a criança emitia o
tag, Gold, & Kassorla, 1965), desferir tapas comportamento, ela era imediatamente re-
no próprio rosto e introduzir os dedos na movida do ambiente em que estava e co-
cavidade ocular (Corte, Wolf, & Locke, 1971), locada dentro de uma sala, sozinha, até o

273
André A. B. Varella, Maria Carolina Correa Martone, Carolina Coury Silveira

comportamento cessar. O procedimento de O desconhecimento sobre as variá-


timeout poderia funcionar como uma con- veis relacionadas aos problemas de com-
tingência de punição: a emissão da resposta portamento tinha importantes implicações
resultava na inserção do indivíduo em uma para as intervenções comportamentais. Por
sala pequena, o que restringia drasticamen- não considerar a função, muitas delas não
te suas possibilidades de se engajar em al- eram bem-sucedidas ou não se mantinham
guma atividade reforçadora. após a retirada da intervenção, o que pro-
longava o tempo em que o indivíduo era
A eficácia das técnicas de modifi- exposto a situações que o levavam a emitir
cação do comportamento na redução de tais comportamentos. Nesse contexto, Carr
problemas comportamentais foi sendo (1977) publicou um importante trabalho
demonstrada cumulativamente nos anos de revisão dos estudos sobre intervenções
1960 e 1970. Os procedimentos envolviam em comportamentos autolesivos e levan-
desde o uso de contingências aversivas tou hipóteses que poderiam explicá-los.
(Kohlenberg, 1970; Pendergrass, 1972) até Os comportamentos autolesivos seriam (a)
intervenções baseadas em reforçamento comportamentos operantes mantidos por
de comportamentos alternativos e social- reforçamento positivo em forma de reforço
mente adequados (Bailey, Wolf, & Philips, social, (b) operantes mantidos por reforça-
1970; Bostow & Bailey, 1969). Todavia, as mento negativo em forma de interrupção
intervenções ainda não consideravam a de estimulação aversiva, ou (c) operantes
função que os comportamentos-problema que produziam autoestimulação. Ainda,
apresentavam, uma vez que não existiam outras duas hipóteses extraídas dos estu-
procedimentos desenvolvidos para identi- dos revisados supunham que os comporta-
ficar quais consequências mantinham esses mentos autolesivos (d) eram causados por
comportamentos. Quando o comportamen- alterações fisiológicas ou (e) eram produto
to-alvo era identificado, as intervenções de processos psicodinâmicos relacionados
eram conduzidas na tentativa de modificá- ao ego ou redução de culpa.
-lo; na maioria das vezes por meio de con-
tingências aversivas, ou por reforçadores O estudo de Carr (1977) propôs que
artificiais (e.g., economia de fichas) para es- comportamentos de autolesão poderiam
tabelecer comportamentos alternativos e/ ser controlados por múltiplas variáveis e,
ou incompatíveis. Em outras palavras, pou- inclusive, sugeriu o desenvolvimento de
co se sabia sobre os reforçadores que manti- modelos animais experimentais para, futu-
nham os comportamentos-problema, quais ramente, permitir a validação de procedi-
estímulos os controlavam e qual história de mentos de avaliação das hipóteses levanta-
reforçamento estabeleceu tal aprendizagem das. Em 1982, Iwatta, Dorsey, Slifer, Bauman
(Mace, 1994). e Richman publicaram o que veio a ser um

274
Capítulo XVII | Análise Funcional

dos estudos mais influentes na ABA, com observado de forma repetida e sistemática,
importantes implicações para a pesquisa em uma série de condições bem definidas.
e aplicação. O artigo, intitulado “Em dire- O estudo foi conduzido com nove partici-
ção a uma análise funcional da autolesão” pantes com atraso no desenvolvimento e
(“Toward a functional analysis of self-in- com taxas de respostas autolesivas, que
jury”), foi originalmente publicado em 1982 variavam entre moderadas a altas. As topo-
na revista Analysis and Intervention in De- grafias mais frequentes observadas foram
velopmental Disabilities e republicado em (a) bater a cabeça em algum objeto; (b) bater
1994 em uma edição especial no Journal of na própria cabeça; (c) morder-se; (d) puxar
Applied Behavior Analysis (JABA). orelhas; (e) apertar os olhos; e (f) puxar ca-
belos.
O estudo de Iwata et al. (1982/1994)
ofereceu uma contribuição substancial à O estudo ocorreu em uma sala do
ABA ao propor uma importante metodolo- hospital pediátrico ligado à Universidade
gia para identificar variáveis controladoras de medicina Johns Hopkins. As observa-
dos comportamentos autolesivos. Com base ções foram realizadas em uma sala contí-
nos resultados dessa metodologia, denomi- gua, contendo um espelho unidirecional. De
nada Análise Funcional Experimental, era forma a avaliar os efeitos do ambiente sobre
possível identificar as consequências que os comportamentos estudados, foi permi-
mantinham esses comportamentos. Portan- tido que os participantes engajassem em
to, intervenções poderiam ser planejadas a comportamentos autolesivos; entretanto,
partir das variáveis que os mantinham. Se os pesquisadores seguiam protocolos para
antes elas eram realizadas de forma arbitrá- garantir a segurança dos participantes. Por
ria (no sentido de que ignoravam a função exemplo, havia acompanhamento médico
do comportamento), agora se tornava pos- constante e as sessões eram interrompidas
sível planejar e executar intervenções que frente a qualquer risco maior de dano físico
poderiam produzir mudanças na relação do (emissão de comportamentos autolesivos
comportamento com o ambiente, aumen- que pudessem machucar os participantes
tando consideravelmente sua eficácia. de forma mais grave). As observações mos-
traram que os participantes engajavam em
pelos menos duas ou mais formas de com-
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO portamentos autolesivos. A ocorrência dos
comportamentos foi registrada em inter-
Objetivos e Método valos de 10s. A variável dependente era o
O estudo de Iwatta, et al. (1982/1994) percentual de intervalos em que respostas
descreveu um protocolo de avaliação em autolesivas foram registradas.
que o comportamento dos participantes era

275
André A. B. Varella, Maria Carolina Correa Martone, Carolina Coury Silveira

Os participantes eram expostos a chucar”), com um breve e suave contato fí-


quatro condições, por oito sessões diárias sico (e. g., tocando o ombro do participante).
(duas para cada condição). Um delinea- Quaisquer outras respostas emitidas pelo
mento de tratamentos alternados (Barlow & participante eram ignoradas. Esta condi-
Hayes, 1979) foi empregado para organizar a ção, portanto, criava uma situação na qual
apresentação das quatro condições, em or- os participantes não tinham a atenção do
dem não sistemática e que variava ao lon- experimentador. Ela foi proposta conside-
go dos dias. Cada condição tinha a duração rando que desaprovação social e contato
de 15 min. O procedimento permanecia em físico, contingentes a emissão de compor-
vigor até que fosse observada: (a) a estabi- tamentos autolesivos são situações comuns
lidade dos comportamentos autolesivos, (b) em ambientes naturais. Assim, elas pode-
instabilidade nos níveis das respostas au- riam inadvertidamente manter tais com-
tolesivas por cinco dias seguidos em todas portamentos por reforçamento positivo.
as condições, ou (c) que 12 dias de sessões
tivessem decorrido. Cada condição tinha Condição Demanda Acadêmica: O
como objetivo avaliar o efeito de uma vari- objetivo dessa condição era avaliar se as
ável específica. As variáveis foram manipu- respostas autolesivas apresentavam fun-
ladas de forma sistemática pela alternân- ção de fuga de demandas. Nessa condição,
cia das diferentes condições. Frequências algumas atividades escolares foram dispo-
elevadas de respostas autolesivas em uma nibilizadas para os participantes. A escolha
determinada condição indicariam que a das atividades baseava-se em informações
variável em questão estaria funcionalmen- fornecidas pelas escolas, sendo seleciona-
te relacionada ao comportamento-alvo. As das aquelas que os participantes raramente
quatro condições serão descritas a seguir. completavam. O experimentador solicitava
a realização de alguma atividade e aguarda-
Condição Desaprovação Social: Nes- va uma resposta por 5 segundos. As instru-
sa condição, o experimentador e o partici- ções atendidas pelo participante eram se-
pante entravam em uma sala com brinque- guidas de elogios. Se respostas autolesivas
dos espalhados pelo chão. O participante ocorressem, a atividade era interrompida e
tinha livre acesso aos materiais e recebia o experimentador virava-se de costas por
uma instrução para brincar, enquanto o ex- 30s. Embora, a consequência programada
perimentador ficava em um canto da sala nessa condição pudesse se assemelhar a
fingindo ler uma revista. Quando o com- um procedimento de extinção, ela procura-
portamento autolesivo ocorria, o experi- va avaliar se as respostas autolesivas foram
mentador fornecia atenção ao participante, mantidas por reforçamento negativo (isto é,
demonstrando preocupação ou desaprova- fuga e esquiva das demandas acadêmicas,
ção (e. g., “não faça assim, você vai se ma- Carr, 1977; Carr, Newsom, & Binkoff, 1976;

276
Capítulo XVII | Análise Funcional

Jones, Simmons, & Frankel, 1974; Measel possível avaliar se as respostas autolesivas
& Alfieri, 1976). Frequências maiores nessa eram mantidas por reforçamento automá-
condição em comparação às outras pode- tico, ou seja, pela própria consequência
riam indicar que as respostas autolesivas sensorial produzida pela resposta. A obser-
apresentavam função de fuga de demandas. vação de altas taxas de respostas autolesi-
vas nessa condição sugeriria, portanto, um
Condição Brincadeira Não-estrutu- comportamento mantido por reforçamento
rada: Nessa condição, o experimentador automático.
ficava próximo ao participante e permitia
que ele se movimentasse livremente pela
sala, engajando em brincadeiras sociais ou Resultados e Discussão
solitárias. O experimentador ainda fornecia Para cada participante foi calculada
elogios e breve contato físico contingen- uma média geral da porcentagem dos in-
te a qualquer comportamento socialmente tervalos no período total de 15 minutos em
apropriado a cada 30 segundos. Essa etapa que ocorreram comportamentos autolesi-
teve por objetivo “enriquecer” o ambien- vos, além de médias dos participantes para
te dos participantes, de modo a diminuir as condições experimentais, separadamen-
a probabilidade de ocorrência de compor- te. Assim, os dados permitiram uma análise
tamentos autolesivos, funcionando como do responder geral entre os participantes,
condição controle. Nessa condição não fo- assim como comparações entre condições
ram apresentadas demandas, havia livre por participantes diferentes. Foram identi-
acesso aos brinquedos, o experimentador ficadas variações tanto na taxa de respos-
fornecia atenção social constantemente e tas entre os participantes (com médias de
demonstrações de preocupação ou desa- 4,5% a 91,3% de intervalos com ocorrências
provação não foram fornecidas se respostas de respostas autolesivas) quanto nas qua-
autolesivas ocorressem (extinção). tro condições experimentais, o que sugeriu
influência das variáveis manipuladas nas
Condição Sozinho: Nesta condição, o condições. Para seis dos nove participan-
participante foi colocado na sala de avalia- tes, altas taxas de respostas autolesivas fo-
ção sozinho, sem acesso a interação social, ram consistentemente associadas com uma
brinquedos e materiais que pudessem servir condição experimental específica.
como fonte reforçamento. O propósito des-
sa condição era simular um ambiente “em- Com base nesses resultados, os auto-
pobrecido”, com poucos estímulos sociais e res identificaram cinco padrões de respostas
físicos. Assim, tal contexto poderia estabe- gerais para os participantes deste estudo. O
lecer a ocasião para que comportamentos primeiro padrão consistia em uma baixa
autoestimulatórios ocorressem, tornando apresentação de respostas autolesivas du-

277
André A. B. Varella, Maria Carolina Correa Martone, Carolina Coury Silveira

rante a condição Brincadeira não-estrutu- rem que para um indivíduo que cutuca seu
rada. Todos os oito participantes expostos a olho em função de produzir estimulação
esta condição (o participante 1 foi excluído) visual (reforçamento automático), o uso de
exibiram porcentagens iguais ou abaixo de massagem ocular de maneira contingente
sua média geral. O segundo padrão, obser- à ausência de respostas autolesivas pode-
vado nas respostas de quatro participantes, ria ser uma intervenção eficaz (Favell et al.,
foi uma maior ocorrência durante a condi- 1982), visto que tal intervenção produziria
ção Sozinho, indicando a autoestimulação a consequência reforçadora sem que o in-
como uma variável relevante. O terceiro divíduo engajasse em respostas autolesivas.
padrão foi obtido com dois participantes e Entretanto, se tais respostas autolesivas
consistiu na baixa frequência de respostas fossem mantidas por fuga de demandas (re-
em todas as condições experimentais, ex- forçamento negativo), a massagem ocular
ceto a condição Demanda. O quarto padrão, seria ineficaz. Nesse caso, intervenções que
identificado no participante 5, consistiu na incluíssem períodos sem nenhuma deman-
apresentação de uma taxa mais alta de res- da poderiam ser mais eficazes.
postas autolesivas durante a condição de
Desaprovação Social. O quinto e último pa- Pode-se dizer que um dos achados
drão, observado em dois participantes, foi mais relevantes deste experimento foi que
classificado como “indiferenciado” e con- a variabilidade na taxa de respostas autole-
sistiu em taxas de respostas similares en- sivas em um mesmo sujeito não é um pro-
tre as condições ou altas taxas em duas ou cesso aleatório. A utilização de condições
mais condições experimentais. Como pre- experimentais bem definidas, análogas ao
visto por Carr (1977), os padrões identifica- contexto natural e em um delineamento de
dos evidenciaram que respostas autolesivas sujeito único (que permitiu verificar efeitos
poderiam ser mantidas por diferentes refor- da manipulação de variáveis sobre o com-
çadores (diferentes funções). portamento-alvo de cada participante) foi
fundamental para este achado. Foi possível,
Os resultados do experimento foram portanto, identificar variáveis relaciona-
importantes por demonstrarem a possibili- das ao estabelecimento e/ou manutenção
dade de identificar variações nas taxas de de comportamentos autolesivos a partir da
respostas autolesivas ao se manipular sis- comparação das taxas de respostas de uma
tematicamente algumas variáveis ambien- mesma pessoa, entre diferentes condições.
tais (e.g., retirada de demandas, atenção Deste modo, o presente estudo ofereceu
social). Se diferentes reforçadores poderiam uma metodologia eficaz para investigar
manter respostas autolesivas, intervenções múltiplos efeitos do ambiente na ocorrên-
comportamentais deveriam considerar es- cia de autolesivos.
sas variáveis. Por exemplo, os autores suge-

278
Capítulo XVII | Análise Funcional

Duas limitações foram apontadas implementar alguma condição de trata-


pelos autores no estudo de Iwata et al., mento (Iwata et al., 1982/1994). Além disso,
1982/1994. A primeira é que a metodologia a exposição dos participantes por curto pe-
pode não ter isolado completamente todas ríodo de tempo não foi maior que o perío-
as variáveis que poderiam influenciar as do típico de situações usuais em que esses
respostas autolesivas. Por exemplo, para indivíduos engajavam em respostas auto-
um comportamento em que atenção social lesivas e, mesmo assim, o procedimento de
funciona como reforçador, taxas altas de avaliação forneceu dados para uma ampli-
respostas autolesivas na condição Sozinho tude de variáveis que afetam estas respos-
poderiam indicar não necessariamente ser tas. Estes dois aspectos dão suporte à incor-
função de reforço automático (autoestimu- poração dessa metodologia em pesquisas
lação), mas sim o primeiro estágio de uma que investiguem o tratamento de respostas
curva de extinção, visto que nessa condi- autolesivas.
ção o reforçamento social era suspenso.
Isto porque, uma resposta operante pode
ocorrer em altas taxas durante os estágios DESDOBRAMENTOS
iniciais de um procedimento de extinção,
antes que seja vista uma diminuição sig- As evidências empíricas de que res-
nificativa de sua ocorrência, e ser assim postas autolesivas poderiam ocorrer em
caracterizada a extinção da resposta. A se- função de diferentes fontes de reforçamento
gunda limitação se refere à possibilidade de tem implicações diretas para o planejamen-
a análise realizada ter sido incompleta. Por to do tratamento de problemas de compor-
exemplo, respostas autolesivas que ocor- tamento. Por exemplo, suponhamos uma
ressem majoritariamente na condição De- pessoa que apresenta respostas autolesivas
manda levantariam a hipótese de reforça- na escola, mantidas por fuga de demanda
mento negativo (fuga de demandas). Porém, (reforçamento negativo, por ex., por escapar
alterações no comportamento a partir de al- de atividades escolares). Alguém com pou-
terações nas contingências (e.g., suspender co ou nenhum conhecimento de Análise do
o reforço do comportamento de fuga) acres- Comportamento poderia propor que o pro-
centaria maiores evidências da função de fessor colocasse a pessoa “de castigo” todas
reforçamento negativo. as vezes que ela emitisse o comportamento,
na expectativa de que essa consequência
Apesar dessas limitações, os resul- reduzisse o comportamento de frequência
tados sugeriram grande utilidade da meto- (ou seja, funcionasse como punição). Entre-
dologia, tendo em vista a possibilidade de tanto, como o reforçador do comportamen-
identificar empiricamente variáveis que to é exatamente escapar de determinadas
afetam respostas autolesivas antes de se tarefas escolares, a intervenção teria efeito

279
André A. B. Varella, Maria Carolina Correa Martone, Carolina Coury Silveira

contrário: ao emitir o comportamento auto- CONSIDERAÇÕES FINAIS


lesivo, o castigo removeria a tarefa escolar
(ou a atrasaria), funcionando como reforço. A metodologia da Análise Funcio-
A intervenção, portanto, deveria considerar nal Experimental desenvolvida por Iwata
que o comportamento autolesivo é manti- et al. (1982/1994) consistiu em um impor-
do por reforçamento negativo relacionado tante avanço em relação às intervenções
a tarefas escolares. A partir dessa informa- baseadas nas estratégias de Modificação
ção, pode-se planejar intervenções como do Comportamento (Hanley, 2012). A par-
mudanças nas atividades em que o com- tir de seus resultados, é possível aumentar
portamento ocorre com maior frequência as chances de sucesso da intervenção ao
(tornando-as mais reforçadoras), ensinar a se tomar decisões mais fundamentadas a
pessoa a pedir por breves pausas ao longo seu respeito, evitando escolhas de proce-
do período de realização das atividades, dimentos apenas com base em palpites ou
aumentar gradativamente a frequência de resultados obtidos com outras pessoas no
comportamentos de cooperação, entre ou- passado. Ainda, segundo Hanley, conduzir
tras possibilidades (para uma discussão so- uma análise funcional envolve questões
bre intervenções em comportamentos au- importantes como considerar as particula-
tolesivos, cf. Varella, 2016). ridades do comportamento e da história de
reforçamento de cada pessoa. A realização
O estudo de Iwata et al. (1982/1994) de uma análise funcional evita a imple-
também se estendeu para outras topogra- mentação de contingências arbitrárias sem
fias. A metodologia também se mostrou antes se fazer a pergunta mais importante:
útil na identificação de variáveis ambien- por que o comportamento-alvo ocorre? E a
tais relacionadas a agressões físicas (Nor- ABA, enquanto uma ciência aplicada e em
thup et al., 1991), escapar repentinamente constante desenvolvimento, dispõe hoje
de cuidadores sem autorização (elopement, de metodologias empiricamente validadas
Piazza, Hanley, Bowman, Ruyter, Lindauer, para responder a essa pergunta.
& Saiontz, 1997), comportamentos destru-
tivos e opositores (Fisher, Ninness, Piazza,
& Owen-Schryver, 1996), entre outros. De PARA SABER MAIS
acordo com Beavers, Iwata e Lerman (2013),
mais de 2.000 artigos foram publicados Hanley, Iwata, & McCord (2003). Apresen-
após o estudo de 1982, o que demonstra seu ta uma excelente revisão de literatura sobre
grande impacto na Análise do Comporta- os estudos envolvendo análise funcional
mento. do comportamento até o ano 2000. Discu-
te importantes implicações para o planeja-
mento e condução das condições análogas.

280
Capítulo XVII | Análise Funcional

Beavers, Iwata, & Lerman (2013). Apre- Barlow, D. H., & Hayes, S. C. (1979). Alterna-
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283
Hernando Borges Neves Filho

Recombinação de repertórios:
criatividade e a integração de
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Hernando Borges Neves Filho


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“Uma tarde, contrariando meus hábitos, tomei café preto e não consegui dormir.
Multidões de ideias surgiram; senti-as colidindo até que pares se interligaram, for-
mando uma combinação estável, por assim dizer”
(Poincaré, 1913, p. 387)

284
Capítulo XVIII | Criatividade

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- uma banana estava fora do alcance, sus-


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO pensa por uma corda, e caixotes estavam
DO EXPERIMENTO disponíveis no ambiente. Diversos animais
tinham acesso a essa situação simultanea-
A criatividade tem sido uma fonte mente. Diversos chimpanzés pularam e es-
inesgotável de especulações filosóficas e ticaram seus braços em direção a banana,
científicas. Seu escrutínio empírico tem sido sem alcança-la. Até que, subitamente um
um trabalho constante na Psicologia desde destes sujeitos, chamado Sultão, se aproxi-
o início do século XX, e a Análise do Com- ma de uma caixa e a carrega em direção a
portamento vem dando uma contribuição banana, coloca-a abaixo da posição da ba-
importante ao estudo deste tema a partir da nana, sobe na caixa e agarra a banana dian-
análise de processos comportamentais rela- te do olhar atento da plateia (de chimpanzés
cionados com a origem de comportamentos e humanos). Rapidamente foram traçadas
novos. analogias antropomorfizadas que tratavam
o desempenho de Sultão como similar ao
No início do século XX, uma das dis- “a-há!” que humanos em uma cultura oci-
cussões mais acaloradas no meio científico dental costumam emitir ao resolver subi-
tratava do que separava animais humanos tamente um problema (Jung-Beeman et al.,
de não humanos, e que tipo de diferenças 2004). Na época em que Köhler lançou seu
eram essas (Mas, 2015). Toda essa discussão livro, seus dados empíricos e suas manipu-
era suplantada pela efusiva eclosão da teo- lações experimentais contrastaram com a
ria da evolução de Darwin, que começava forma anedótica com a qual a inteligência
a ganhar adeptos eminentes na Psicologia animal era usualmente tratada em livros
(Boakes, 1984). Nesse contexto, um traba- clássicos de Psicologia Comparada (Boakes,
lho pioneiro e lembrado com frequência em 1986; Delage & Carvalho Neto, 2010), e con-
livros texto é o de Wolfgang Köhler (1948) sequentemente seu método de teste siste-
com chimpanzés (Pan troglodytes). Köhler mático de resolução de problema animal
expôs chimpanzés a diferentes tarefas de chamou a atenção de outros pesquisadores1.
resolução de problemas e, em alguns casos,
descreveu uma solução súbita da tarefa em
questão como um “insight”. Este “insight” 1
Köhler foi um pioneiro do estudo empírico da cognição animal, mas
não foi o único. Pelo menos três de seus contemporâneos foram tam-
foi descrito por Köhler como uma topogra- bém pioneiros em suas metodologias empíricas: E. L. Thorndike, L.
fia de resolução de problema súbita, que Hobhouse e R. Yerkes. Köhler (1948, p. 22) contrasta sua metodologia
e seus dados aos dados obtidos por Thorndike com gatos em caixas
ocorria em um lampejo, de forma fluída e problema. Köhler alinha e encontra pontos de confluência com às pro-
postas de Hobhouse e Yerkes. Esta polarização gerou um longo debate
direcionada a uma meta (a solução do pro- sobre dois supostos tipos de resolução de problemas distintas: uma re-
solução tentativa e erro (como a obtida por Thorndike) ou uma resolu-
blema). Um exemplo deste desempenho ção súbita por Insight (Delage & Carvalho Neto, 2006). A Universidade
de Würzburg disponibiliza online em seu website algumas filmagens
se deu em uma situação problema na qual originais dos experimentos de Köhler (1948) com chimpanzés.

285
Hernando Borges Neves Filho

Ao longo dos anos, e com a vasta Project3 (Epstein, 1981). Foram abordados
repercussão dos trabalhos de Köhler, uma fenômenos comportamentais como o auto
série de estudos sobre a resolução de pro- reconhecimento e a formação de self (Eps-
blemas foi realizada com chimpanzés e ou- tein, Lanza & Skinner, 1981), uso de memo-
tros animais em diferentes situações (Neves randos (Epstein & Skinner, 1981), comunica-
Filho, 2015). O debate acerca do “insight” ção (Epstein, Lanza & Skinner, 1980), e até
chegou até mesmo a chamar a atenção de mesmo o comportamento de mentir (Lanza,
Pavlov e seus colegas, que adquiriram um Starr & Skinner, 1982). Dentre estes estudos,
casal de chimpanzés com o objetivo de re- um que ganhou reconhecido destaque foi o
plicar os achados de Köhler (para uma des- que se propôs a identificar quais as variá-
crição detalhada da série de estudos de veis históricas responsáveis pelo “insight”
resolução de problemas em chimpanzés, re- (Epstein, Kirshnit, Lanza & Rubin, 1984).
alizados nos laboratórios de Pavlov, conferir Publicado no tradicional periódico Nature,
Razran, 1961; Ladygina-Kots & Dembovskii, este estudo trouxe à comunidade científi-
1969; Windholz, 1984; Windholz & Lamal, ca um novo processo comportamental de-
1985; Reznikova, 2007). A maioria dos estu- monstrado empiricamente, a recombinação
dos focava a capacidade de animais de dife- de repertórios (ou interconexão de repertó-
rentes espécies resolverem tarefas em uma rios), e elencou com clareza qual o papel da
primeira apresentação, de forma criativa. aprendizagem na resolução súbita de um
Uma menor parcela de estudos, não menos problema, e alguns dos processos compor-
relevante, teve como objetivo explorar qual
2
Em geral, o termo “comportamento complexo” é pouco claro e cria
o efeito da aprendizagem sobre o desem- uma distinção pouco útil (comportamento simples e comportamento
complexo). Entretanto, os autores utilizam este termo na série de ar-
penho súbito de resolução de problemas tigos do Columban Simulation Project para chamar a atenção de Psi-
cólogos Cognitivos (Epstein, 1996). Em uma visão analítico comporta-
(Maier, 1931; 1937; Birch, 1945). Foi apenas mental, a dicotomia comportamento complexo vs. simples é eliminada,
na medida em que se parte do pressuposto de que o que distingue di-
uma questão de tempo até que pesquisado- ferentes comportamentos são suas variáveis de controle antecedente e
res de viés analítico comportamental des- consequente, e que em geral, chama-se de “complexo” comportamen-
tos dos quais pouco se sabe sobre suas variáveis de controle (Donahoe
sem suas contribuições sobre este tópico. & Palmer, 2004, p. 3).

3
O Columban Simulation Project foi uma resposta a febre cognitiva
que tomou conta da psicologia experimental estadunidense na épo-
Na década de 1980, B. F. Skinner e ca. Neste momento das ciências cognitivas, estava em voga a metá-
fora do computador, que tinha como pressuposto básico o uso de um
alguns colaboradores publicaram uma sé- computador para simular e estudar fenômenos mentais (Cisek, 1999;
Teixeira, 2008). O Columban Simulation Project visava dar uma alter-
rie de experimentos cujo objetivo foi estu- nativa biologicamente mais sensata e parcimoniosa: simular e estudar
fenômenos tidos como mentais em organismos vivos, no caso, pombos
dar fenômenos complexos2, ordinariamente (Epstein, 1981). O Columban Simulation Project hoje é apenas uma nota
de rodapé em livros de história, mas seu pressuposto básico de estudar
chamados de cognitivos, em um tradicio- processos ditos mentais em organismos e não em máquinas, tem volta-
nal espécime do laboratório de Análise do do a ter destaque nas ciências cognitivas, na medida em que a metáfora
do computador perdeu força (Lopes, Lopes & Teixeira, 2004), e as abor-
Comportamento: o pombo (Columba livia). dagens evolutivas do comportamento vem novamente ganhando vigor
(Chemero, 2009; Horik, Clayton & Emery, 2012). Um documentário de
Esses estudos faziam parte do que ficou 1982 sobre o projeto, com a apresentação de B. F. Skinner, está disponí-
vel na íntegra no site de R. Epstein: http://drrobertepstein.com/index.
conhecido como o Columban Simulation php/videos

286
Capítulo XVIII | Criatividade

tamentais básicos envolvidos no desempe- to, e os animais foram mantidos em regime


nho criativo. de privação alimentar durante o período
do experimento. Foram também realizadas
sessões de extinção de voar em direção ao
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO alvo. Nestas sessões o alvo ficava disponí-
vel, fora do alcance e sem a caixa, e nenhu-
Objetivo e Método ma resposta era consequenciada.
Epstein et al. (1984) adaptaram uma
das situações problemas do pioneiro traba- O treino da habilidade de empurrar
lho de Köhler (1948) aos pombos. A tarefa direcionado consistia na modelagem de
consistiu em empurrar uma caixa em di- respostas de empurrar a caixa em direção a
reção a uma banana de plástico afixada no um alvo verde, que ficava afixado em uma
teto da câmara experimental, subir na cai- das paredes da câmara, em posições alter-
xa, e bicar a banana. A banana foi escolhida nadas a cada tentativa, na altura do piso.
sarcasticamente para mostrar que pombos, Também foram realizadas sessões de extin-
dado o treino adequado, poderiam exibir o ção de empurrar na ausência do alvo verde.
mesmo desempenho que os chimpanzés de O alvo do teste final (a banana de plástico)
Köhler. A essa situação problema, deu-se não esteve presente em nenhuma das ses-
o nome de teste de deslocamento de caixa sões desta etapa.
(Cook & Fowler, 2014). Os autores mani-
pularam explicitamente o treino que estes Durante o treino da habilidade de su-
pombos receberam antes de serem expos- bir e bicar o alvo, a caixa permanecia fixa
tos a situação de teste. no piso da câmara, logo abaixo da posição
onde o alvo estava afixado no teto. Tenta-
Onze pombos participaram do expe- tivas de empurrar e caixa e bicar a mesma
rimento, e diferentes números de sujeitos não foram consequenciadas. A posição da
receberam diferentes histórias experimen- caixa e da banana foi aleatorizada a cada
tais antes de serem expostos a situação pro- apresentação. Durante o treino, nenhum
blema. Quatro sujeitos receberam o treino critério de aprendizagem foi utilizado, e
independente (não encadeado) de dois re- os autores apenas afirmam que o teste foi
pertórios pré-requisito: (a) treino de empur- realizado após os sujeitos emitirem respos-
rar direcionado (na qual uma caixa deveria tas de empurrar direcionado e subir e bicar
ser empurrada em direção a um alvo verde), confiavelmente na presença de cada estí-
e; (b) subir na caixa e bicar um alvo (uma mulo (empurrar na situação caixa e alvo,
banana de plástico afixada no teto da câ- subir na situação caixa e banana). Poste-
mara experimental). Todas as respostas fo- riormente, Epstein (1996) afirma que a não
ram consequenciadas com acesso a alimen- utilização de critérios de aprendizagem foi

287
Hernando Borges Neves Filho

intencional, para assegurar que nenhuma os mesmos padrões de “confusão” do início


das duas respostas treinadas adquirisse um do teste. Após estes momentos de “confu-
forte controle discriminativo durante o trei- são” os sujeitos se aproximaram da caixa, e
no. prontamente começaram a empurrá-la em
direção à banana. Todos os sujeitos deste
Além dos quatro pombos que recebe- grupo guiavam seus empurrões em direção
ram o treino completo dos dois repertórios à banana olhando para a mesma a cada em-
pré-requisito, dois outros sujeitos aprende- purrão, corrigindo a rota de deslocamento
ram somente a bicar o alvo, mas não a subir da caixa se necessário. Todos os sujeitos
na caixa. Outros dois sujeitos aprenderam a pararam de empurrar a caixa quando ela
subir na caixa e bicar o alvo, mas não a em- estava abaixo da banana, ou próximo dela,
purrar a caixa. Um terceiro par de sujeitos e em seguida subiram na caixa e bicaram a
aprendeu a subir na caixa e bicar o alvo e banana, resolvendo o problema.
a empurrar a caixa, mas de forma não di-
recionada (sem o alvo verde), e um último Dos sujeitos que não receberam um
sujeito passou pelo treino completo (subir treino completo dos dois repertórios pré-re-
na caixa e bicar a banana, e empurrar di- quisito, os que não haviam sido treinados
recionado), mas não recebeu as sessões de a subir na caixa, não resolveram a tarefa, e
extinção de respostas de voar. Cada uma passaram a maior parte da sessão tentan-
destas histórias de treino produziu um de- do alcançar a banana esticando-se em di-
sempenho particular na situação de teste. reção a ela. No teste dos sujeitos que não
aprenderam a empurrar a caixa, nenhuma
resposta de empurrar foi registrada durante
Resultados e Discussão as sessões, logo, a tarefa não foi resolvida.
Os resultados dos quatro sujeitos Os sujeitos que não tiveram um treino de
que receberam o treino completo foram empurrar direcionado passaram a maior
similares e consistentes entre si. No início parte do tempo das sessões empurrando a
do teste, os animais exibiram um padrão caixa, em diversas direções, tendo inclusive
de respostas que os autores categorizaram passado pelo local onde estava pendurado
como um estado de “confusão”. Este padrão o alvo. Um destes sujeitos resolveu a tare-
consistia em o sujeito ficar parado, entre a fa eventualmente, após 14 minutos, o outro
caixa e o alvo, emitindo respostas de olhar apenas empurrou a caixa durante toda a
alternadamente para a caixa e para a alvo. sessão. O último sujeito, que recebeu o trei-
Após a “confusão”, os sujeitos passaram a no de subir a caixa e bicar o alvo e empurrar
ir em direção à banana e tentar alcança- direcionado, mas não passou pelas sessões
-la (nunca pulando ou voando), sem êxito. de extinção de voar em direção a banana,
Após isso, novamente os sujeitos emitiram apresentou várias respostas em direção à

288
Capítulo XVIII | Criatividade

banana, como pular e voar, por diversos está abaixo da banana, a resposta de subir
minutos, até que, após essa etapa inicial, não produz o reforço, portanto entra em
começou a empurrar a caixa em direção à extinção. Na extinção, o empurrar ocorre
banana, subiu na caixa e bicou a banana. por ressurgência (Epstein & Skinner, 1980),
e é controlado pela posição da banana, que
Os resultados deste estudo identifi- adquire controle sobre o empurrar a partir
caram o papel da história de treino, como de um processo que os autores chamam de
uma variável decisiva na resolução súbita generalização funcional. A generalização
de uma tarefa, já que os animais sem al- funcional seria distinta da generalização
gum dos pré-requisitos comportamentais tradicional, já que neste caso, não há se-
não resolveram o problema, ou o resolve- melhança física entre os estímulos, apenas
ram acidentalmente, ao passo que os ani- um compartilhamento de função. Ao passo
mais que receberam o treino completo dos que o animal empurra a caixa na direção da
repertórios pré-requisitos, solucionaram a banana, o ambiente vai sendo progressiva-
tarefa com topografia similar à clássica to- mente modificado, até que a caixa fique em
pografia de “insight”. Köhler foi um pioneiro baixo (ou próxima) da banana. Este novo
ao mostrar que chimpanzés exibiam com- estímulo (caixa em baixo da banana), pro-
portamentos originais e criativos em situ- duzido pelo sujeito, controla a segunda res-
ações problemas criadas em um ambiente posta, o subir, que é, na palavra dos autores,
controlado. Epstein et al. (1984) mostraram encadeada automaticamente ao empurrar,
a origem e uma forma de se construir estes e produz a solução da tarefa. O animal para
comportamentos originais a partir de uma de empurrar a caixa assim que ela está pró-
história de treino controlada. xima da banana pois ao produzir o estímulo
“caixa em baixo da banana”, o subir se torna
Epstein et al. (1984) também forne- mais provável. O conjunto destes processos
ceram uma análise ponto a ponto da solu- resultava no que os autores chamaram de
ção do problema. No início da resolução, o recombinação de repertórios.
estado de “confusão” do sujeito é efeito do
controle de duas respostas pelo contexto do A recombinação de repertórios é o
problema. O alvo, a banana pendurada no processo comportamental pelo qual reper-
teto, controla respostas de bicar, e a caixa tórios aprendidos independentemente um
controla respostas tanto de subir como de dos outros (ou seja, não encadeados) podem
empurrar. A “confusão” é resultado da nova ser recombinados em uma forma ou sequ-
configuração dos estímulos, no caso, bana- ência nova, dada um controle discriminati-
na e caixa presentes, com a caixa afastada vo (situação problema) adequada. A recom-
da banana. Alguns dos sujeitos começam a binação de repertórios passou a ser então
sessão subindo na caixa, como a caixa não uma nova maneira que a AC desenvolveu

289
Hernando Borges Neves Filho

para lidar com a criatividade, ou a origem balho de “insight” (Epstein et al. 1984), em
de comportamentos novos, ao lado de ou- geral acusando que o mesmo se tratava de
tros processos básicos como a generalização um simples encadeamento de respostas (El-
de estímulos, a indução, a variabilidade, a len & Pate, 1986). Esta crítica não procede,
modelagem e o encadeamento de respos- já que a rigor não se trata de um treino de
tas. Além disso, a recombinação de reper- encadeamento, dada a natureza indepen-
tórios, quando estudada em procedimentos dente dos treinos das habilidades pré-re-
de resolução de problemas, é também um quisito (um treino encadeado asseguraria
modo de descrever os processos compor- que a consequência de uma resposta seria
tamentais envolvidos na solução súbita de também discriminativo de outra). Outra crí-
um problema, tradicionalmente conhecido tica (Ettlinger, 1984) aponta que não houve
na literatura de Psicologia como um “insi- manipulação de variáveis paramétricas de
ght”, desde que Köhler (1948) popularizou treino (como treinos de repertórios em con-
o termo a partir de seus experimentos com textos distintos), o que sugere que o dado
chimpanzés. obtido possa ser um artefato metodológico
(i.e. a resolução não passa de algo que pom-
bos fazem por não haver outras coisas a não
DESDOBRAMENTOS ser uma caixa e uma banana na situação de
teste). A crítica de Ettlinger (1984) não se
Todos os trabalhos do Columban Si- sustenta, graças aos dados com os pombos
mulation Project produziram muitas con- de Epstein et al. (1984) que não resolveram a
trovérsias. Franz de Waal, um eminente tarefa com um treino incompleto dos reper-
primatologista, chegou a comentar que o tórios pré-requisito, portanto, apesar dos
trabalho de auto reconhecimento em pom- autores não terem testado variáveis adicio-
bos (Epstein, Lanza & Skinner, 1981) é uma nais, o efeito do treino é claro. Sem o treino,
das “maiores bizarrices da ciência compor- não há resolução.
tamental” (de Waal, 2001, p. 60)4. Diversas
críticas foram também direcionadas ao tra- Apesar destas críticas, maiores fo-
ram os impactos positivos do trabalho so-
4
O principal ponto da crítica formulada por de Waal (2001) se pauta no bre a comunidade científica, tanto que
fato de que primatas que apresentam o comportamento de auto reco-
nhecimento em espelhos precisam de pouco ou nenhum treino explí- Shettleworth (2012, pg. 217), especialista em
cito para que isso ocorra, ao passo que os pombos de Epstein, Lanza e
Skinner (1981) precisaram de um treino direto de repertórios pré-requi- cognição animal, coloca o trabalho de Eps-
sito. A crítica passa ao largo do ponto principal do trabalho de Epstein,
Lanza e Skinner (1981), que é construir em laboratório os pré-requisitos
tein et al. (1984) como uma das maiores des-
ontogenéticos para que esse desempenho seja observado, independen-
te da espécie. O autor da crítica (de Waal, 2001) também aponta que
cobertas das ciências comportamentais do
replicações do estudo de Epstein, Lanza e Skinner (1981) não obtive- século XX, ao lado do pioneiro trabalho de
ram o mesmo resultado. Considerações acerca dessas replicações po-
dem ser encontradas no recente estudo de Uchino e Watanabe (2014) Köhler (1948).
que replicaram adequadamente o trabalho original de Epstein, Lanza
e Skinner (1981).

290
Capítulo XVIII | Criatividade

Desta forma, diversos trabalhos adi- solução de problema e criatividade (Neves


cionais sobre a recombinação de repertó- Filho & Carvalho Neto, 2013). A publicação
rios foram publicados ao longo dos anos do artigo de Epstein et al. (1984) trouxe uma
que se seguiram a publicação do trabalho nova linha de pesquisa para a Análise do
original de Epstein et al. (1984). Com pom- Comportamento, e a recombinação de re-
bos, em variações do teste de deslocamen- pertórios tem o potencial de ser um mode-
to de caixa, Cook e Fowler (2014) e Neves lo animal para o estudo de comportamen-
Filho (2015) replicaram os achados originais tos novos (Kubina, Morrison & Lee, 2011;
de Epstein et al. (1984) envolvendo a recom- Leonardy, Andery & Rossger, 2011; Murari
binação de dois repertórios. Epstein (1985) e & Henklain, 2013). Assim como procedi-
Luciano (1991) demonstraram a recombina- mentos comportamentais bem estabeleci-
ção de três repertórios, a partir do desmem- dos, como os esquemas de reforçamento,
bramento do treino de subir e bicar em dois são amplamente utilizados em pesquisas
repertórios independentes, e Epstein (1987) de neurociências e farmacologia (McKim,
demonstrou a recombinação de quatro re- 2007), a recombinação de repertórios, como
pertórios, adicionando uma porta que, se um modelo animal de criatividade, tem o
aberta, dava acesso a caixa. potencial de servir aos mesmos propósitos.
Na medida em que um procedimento pro-
A recombinação de repertórios tam- duz a recombinação de repertórios, novas
bém foi observada em diferentes tarefas, variáveis podem ser introduzidas, como o
para além do teste de deslocamento de cai- efeito de drogas. Será que um animal que
xa, e com diferentes espécies como: maca- aprenda uma das habilidades pré-requisito
cos-prego (Delage & Galvão, 2010; Neves de um problema sob o efeito de álcool apre-
Filho, 2010; Delage, 2011; Neves Filho, Car- senta uma topografia de solução igual a um
valho Neto, Barros, & Costa, 2014), ratos al- animal sóbrio? E se o animal estiver sob
binos (Delage, 2006; Tobias, 2006; Ferreira, efeito da droga somente no teste? Estas são
2008, Leonardi, 2012; Neves Filho, Stella, perguntas empíricas ainda em aberto.
Dicezare & Garcia-Mijares, 2015), corvos
da Nova Caledônia (Taylor, Elliffe, Hunt & Algumas variáveis de treino já ma-
Gray, 2010; Neves Filho, 2015) e humanos peadas indicam que se as habilidades pré-
(Sturz, Bodily & Katz, 2009). -requisito são treinadas com reforços dife-
rentes (água ou comida), a recombinação de
repertórios não ocorre em pombos na tare-
CONSIDERAÇÕES FINAIS fa de deslocamento de caixa (Neves Filho,
2015). Com macacos-prego, em uma tarefa
A recombinação de repertórios é um de dois repertórios (encaixar ferramentas e
processo comportamental relacionado a re- alcançar alimento usando uma ferramen-

291
Hernando Borges Neves Filho

ta) a recombinação ocorre se os repertórios recombinações em diferentes tarefas. Este


forem treinados e testados em um mesmo amadurecimento da área e do que se sabe
ambiente (Neves Filho, 2010), porém não sobre a recombinação de repertórios produz
ocorre da mesma maneira se ao menos um o contexto ideal para começarmos a aplica-
dos repertórios é treinado em um local di- ção do que sabemos, e observar, treinar e
ferente do local onde a recombinação é tes- facilitar a recombinação em ambientes fora
tada (Neves Filho, Carvalho Neto, Barros, do laboratório, como escolas, ambientes de
& Costa, 2014), o mesmo efeito de contexto educação à distância, empresas e organiza-
distinto de treino e teste não é observado ções. Este é o desafio do momento.
em corvos da Nova Caledônia de vida li-
vre5 (Neves Filho, 2015). Uma série de ou-
tras variáveis ainda precisa ser analisada, e PARA SABER MAIS
processos como a generalização funcional e
o encadeamento automático precisam ser Epstein (1996). Coletânea de artigos de Ro-
mais bem estudados e definidos (Luciano, bert Epstein sobre a recombinação de re-
1991). De qualquer forma, todos estes dados pertórios e criatividade. No livro constam
sobre os efeitos de variáveis de treino so- todos os experimentos do Columban Simu-
bre a recombinação de repertórios apontam lation Project nos quais Epstein esteve en-
que, de fato, para cada situação problema e volvido. O livro apresenta diversos comen-
espécie estudada, um conjunto de variáveis tários sobre o tema e a proposta do autor de
de treino podem ter efeitos distintos sobre uma “teoria generativa do comportamento”,
a topografia de solução do problema. Dife- baseada na recombinação de repertórios.
rentes tipos de treino produzem diferentes
soluções, ou as inviabilizam. Desta forma, Leonardy, Rossger, & Andery (2011). Artigo
é possível, em tese, mapear que variáveis discutindo a importância da recombinação
de treino produzem uma melhor recombi- de repertórios para a Análise do Comporta-
nação, em uma tarefa específica, de modo mento a partir de uma revisão de diversas
a criar uma “tecnologia de insight”, ou uma dissertações de mestrado que utilizaram ra-
“tecnologia da criatividade”, pautada em tos como sujeitos.
um método de aprendizagem que facilite
Neves Filho & Carvalho Neto (2013). Uma
5
Vida livre aqui indica que os animais que participaram do estudo não introdução à recombinação de repertórios
estavam em um laboratório. Neste estudo (Neves Filho, 2015), corvos
da Nova Caledônia (Corvus moneduloides) foram capturados em seu
e alguns exemplos interpretativos de onde
ambiente natural e foram alojados em um aviário, no qual a coleta de
dados ocorreu. Ao final da coleta, os animais foram liberados no mes-
podemos encontra-la em diversos produtos
mo local onde ocorreu a captura. Para mais informações sobre estudos artísticos humanos.
de cognição animal em animais de vida livre, em especial corvos da
Nova Caledônia, conferir Taylor, Elliffe, Hunt e Gray (2010). E para uma
sugestão de algumas vantagens do estudo de animais de vida livre para
a Análise do Comportamento, conferir Pritchard et al. (2016). Murari & Henklain (2013). Artigo discutin-

292
Capítulo XVIII | Criatividade

do como a Análise do Comportamento lida Pará, Belém, Pará.


com a criatividade, apresentando diversos
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297
Capítulo XIX | Condicionamento Pavloviano

INTRODUÇÃO À ÁREA DE PES- tomas de uma doença mais grave tenham


QUISA E CONTEXTUALIZAÇÃO um curso de tempo predeterminado (não sei
DO EXPERIMENTO se é verdade, mas fazia sentido para mim na
época). Então, como poderia ter mais certe-
Alguns anos atrás, houve uma pro- za do meu próprio diagnóstico? Voltando a
moção de uma franquia de café na minha tomar café comum! Dito e feito, os sintomas
cidade. Por cada copo de café que você to- voltaram. Pouco depois voltei a tomar café
masse, os atendentes carimbavam um papel descafeinado por um tempo, até desintoxi-
e, se você juntasse um número específico car-me completamente, e os sintomas vol-
de carimbos, era possível ganhar prêmios. taram a desaparecer. Este tipo de situação
Como eu já gostava do café que eles faziam na qual uma variável é introduzida e poste-
e me interessava conseguir um prêmio em riormente retirada se conhece comumente
particular, passei a tomar café duas ou três como delineamento de reversão.
vezes ao dia nesse estabelecimento em vez
de duas ou três vezes na semana (um teste- Esse é só um exemplo anedótico de
munho de que esquemas de reforçamento uma inferência causal, algo que todas as
funcionam ou de que necessito encontrar pessoas fazem constantemente. Por exem-
outro passatempo). Alguns dias depois que plo, quando alguém nos trata mal, podemos
eu comecei meu novo regime “cafeínico”, supor que essa pessoa “é assim com todo
senti que certas coisas não andavam bem mundo” ou que “tem passado por algu-
no meu corpo. Pesquisei na internet algu- ma experiência desagradável nos últimos
mas causas relacionadas ao que eu estava tempos”. O tipo de suposição que fazemos
sentindo e descobri como possível causa a pode ter a ver com o grau de intimidade
intoxicação por cafeína (deixarei com vocês que temos com a pessoa: Se a conhecemos
a escolha de investigar o que é se quiserem). bem, talvez saibamos que ela não é assim
Acreditando que essa poderia ser a causa normalmente e supomos que algo fora do
mais provável, resolvi mudar meu consumo comum aconteceu; se não a conhecemos
do café comum para descafeinado e os sin- bem, é possível que suponhamos, talvez er-
tomas desapareceram em poucos dias. roneamente, que este é seu “temperamento
normal”. A pergunta que nos interessa – e
Normalmente, apresento compor- que todos deveríamos fazer antes de acabar
tamentos que poderiam ser classificados com a reputação de alguém por algo que
como hipocondríacos, como acreditar que pode ser um evento isolado – é como pode-
qualquer coisa no meu corpo é sintoma de mos ter certeza de nossas suposições.
algo muito mais grave e pensei: Poderia ser
só coincidência que os sintomas tenham No exemplo do meu problema com o
desaparecido? Afinal, é possível que os sin- café, o pequeno “experimento” que realizei

298
Cristiano Valério dos Santos

comigo mesmo me deu mais confiança de da ignorância sobre quais variáveis devem
que os sintomas que eu apresentava se de- ser controladas. A revisão feita por Rescorla
viam à natureza das bebidas que eu estava (1967) sobre os protocolos de controle expe-
consumindo. Contudo, essas bebidas são rimental em estudos de condicionamento
produtos compostos por vários elementos respondente reflete bem essa questão.
e a causa dos meus sintomas pode ter sido
a cafeína ou qualquer outro componente O condicionamento respondente,
presente na bebida. Para saber com mais também conhecido como condicionamen-
certeza ainda qual era o componente res- to clássico ou pavloviano, refere-se a uma
ponsável, não bastaria que eu deixasse de mudança comportamental que é resultado
tomar café; eu teria que continuar toman- da relação sistemática entre dois estímulos
do as bebidas que geralmente consumia, (ver M. Lattal, 2013, para uma revisão ampla
com todos os seus componentes menos o sobre o tema). Um desses estímulos evoca
elemento que eu achava que estava relacio- uma resposta no organismo com uma alta
nado ao que me estava acontecendo, neste probabilidade, geralmente sem que o orga-
caso a cafeína. Por isso, tive a ideia de con- nismo tenha uma experiência prévia com
sumir a mesma bebida, porém sem cafeína. ele, e é denominado estímulo incondicio-
Como os sintomas desapareceram e a única nado (US). O outro estímulo inicialmente
variável alterada tinha sido a cafeína, pos- evoca outras respostas no organismo, po-
so dizer com boa precisão que a cafeína foi rém, como resultado da relação com o es-
responsável pelos sintomas. tímulo incondicionado, passa a evocar res-
postas diferentes que não evocava antes.
Esse tipo de situações nas quais Por exemplo, se uma pessoa ingerir uma
mantemos constantes todos os elementos comida que esteja contaminada com bac-
que não nos interessam num determinado térias nocivas ao organismo, a presença
momento e que poderiam invalidar a minha dessas bactérias evocará uma série de res-
inferência causal se conhece como controle postas fisiológicas com uma probabilidade
experimental e é a âncora de qualquer ciên- muito alta, tais como febre, náuseas, vômito
cia. No entanto, às vezes não é tão simples e diarreia. Como essas respostas fisiológi-
saber o que temos que controlar, principal- cas ocorreram como resultado da ingestão
mente quando o objeto de estudo é novo e de uma comida específica (i.e., não ocorre-
as variáveis das quais o fenômeno é função ram como resultado da ingestão de outro
são pouco conhecidas. O estudo sistemá- tipo de comida), é provável que ocorra uma
tico do comportamento dos organismos é mudança comportamental como resultado
relativamente recente em comparação com dessa relação: a pessoa provavelmente sen-
outros objetos de estudo e, portanto, ainda tirá náusea ao ver esse alimento específico
é mais suscetível de padecer do problema e evitará consumi-lo, mesmo que não es-

299
Capítulo XIX | Condicionamento Pavloviano

teja contaminado. Esse é, a propósito, um mento do organismo. O segundo é apresen-


dos principais procedimentos usados para tação de um estímulo condicionado novo,
estudar condicionamento respondente no que não se apresenta antes das tentativas
laboratório, conhecido como aversão a sa- do teste para avaliar se houve condiciona-
bores (Garcia, Kimeldorf, & Koelling, 1955). mento de fato, com o objetivo de estimar o
efeito incondicionado do estímulo. O ter-
Considera-se que o condicionamen- ceiro é a apresentação apenas do estímulo
to respondente, portanto, é resultado da re- incondicionado o mesmo número de vezes
lação entre os dois estímulos. O problema que se apresenta ao grupo experimental,
neste tipo de procedimento é que a apre- para avaliar possíveis efeitos de sensibi-
sentação dos estímulos pode por si só pro- lização ou habituação ao estímulo incon-
duzir efeitos no comportamento que não dicionado (sensibilização e habituação se
necessariamente são resultado da relação referem ao aumento ou diminuição, respec-
entre eles, que é a condição necessária para tivamente, da probabilidade ou magnitude
se falar de condicionamento respondente. de uma resposta como resultado da mera
Na situação com a comida, por exemplo, é apresentação repetida de um estímulo). O
possível que o alimento por si mesmo pos- quarto é o procedimento explicitamente
sa causar náusea na pessoa sem que esteja desemparelhado. Nesse procedimento, o
contaminado (eu tenho esse problema com estímulo incondicionado nunca é apresen-
o aipo). Para ter certeza de que as mudanças tado de maneira temporalmente próxima ao
no comportamento se devem à relação en- estímulo condicionado. O quinto é o empa-
tre os estímulos e não à mera apresentação relhamento reverso, no qual se apresenta o
dos estímulos, pesquisadores e pesquisado- estímulo incondicionado antes do estímulo
ras desse fenômeno desenvolveram alguns condicionado. Finalmente, o sexto é o con-
protocolos experimentais de controle que dicionamento discriminado, no qual um es-
permitem descartar os efeitos que não são tímulo condicionado é apresentado de ma-
resultados da manipulação de interesse. neira contígua ao estímulo incondicionado,
Rescorla (1967) faz uma revisão de seis des- enquanto que outro estímulo é apresentado
ses protocolos de controle. explicitamente desemparelhado.

O primeiro deles é apresentação ape- Rescorla (1967) defendeu que um cri-


nas do estímulo condicionado a um grupo tério lógico para avaliar um procedimento
diferente de sujeitos o mesmo número de de controle adequado é se o procedimento
vezes que se apresenta ao grupo experi- retém o maior número possível de caracte-
mental. Este protocolo de controle foi criado rísticas similares ao procedimento experi-
para avaliar os efeitos de familiaridade com mental, somente eliminando algum aspecto
o estímulo condicionado sobre o comporta- importante. No caso do condicionamento,

300
Cristiano Valério dos Santos

tanto respondente como operante, a variá- do e o incondicionado, ao mesmo tempo in-


vel que supomos ser responsável pelas mu- troduzem uma relação negativa entre eles,
danças comportamentais é a relação que se isto é, sempre que o estímulo condicionado
estabelece entre os estímulos ou entre uma estiver presente, o estímulo incondicionado
resposta e uma consequência, respectiva- nunca o seguirá.
mente. Considerando esse critério, todos
os seis protocolos de controle padecem de Para contornar esses problemas,
problemas e, segundo Rescorla, todos es- Rescorla (1967) propôs outro tipo de proto-
ses problemas têm uma origem comum: A colo de controle, que ele chamou de verda-
crença de que a variável mais importante deiramente aleatório. Nesse caso, os dois
no condicionamento respondente é a con- estímulos são programados de maneira
tiguidade temporal entre os estímulos. completamente aleatória e independente,
de tal forma que o grupo controle é exposto
O primeiro protocolo, apresentação à mesma quantidade de apresentações de
do estímulo condicionado sozinho, tem o ambos estímulos que o grupo experimental
problema de que os sujeitos do grupo con- e, inclusive, alguns emparelhamentos aci-
trole não são expostos à mesma quantidade dentais entre estímulos podem ocorrer. A
de apresentações do estímulo incondicio- única diferença é a ausência de uma contin-
nado, além de que as apresentações repe- gência temporal regular entre eles. A maior
tidas do estímulo condicionado sem o es- vantagem desse procedimento, segundo o
tímulo incondicionado podem não gerar o autor, é que os seis protocolos descritos an-
mesmo nível de habituação que quando se teriormente, de alguma forma, foram cria-
apresenta junto com o estímulo incondicio- dos para excluir fatores específicos, como a
nado. O segundo protocolo, apresentação de sensibilização ao estímulo incondicionado
um novo estímulo condicionado, além dos ou a familiaridade com o estímulo condi-
problemas anteriores, também não controla cionado; o procedimento verdadeiramente
o fato de os sujeitos do grupo experimen- aleatório permite excluir todos os fatores
tal já terem a experiência com o estímulo que não estão relacionados ao condiciona-
condicionado. O terceiro protocolo, apre- mento respondente, sem ter a necessidade
sentação do estímulo incondicionado sozi- de especificar a priori quais seriam esses
nho, tem o problema de que os sujeitos do fatores.
grupo controle não são expostos à mesma
quantidade de apresentações do estímulo Subjacente à ideia do procedimento
condicionado. O quarto, o quinto e o sexto de controle verdadeiramente aleatório en-
protocolos têm um problema similar: Esses contra-se a noção de contingência, que é
três protocolos, apesar de removerem a re- definida como uma relação de dependência
lação positiva entre o estímulo condiciona- entre eventos. A ocorrência de um evento

301
Capítulo XIX | Condicionamento Pavloviano

A é contingente, ou depende da ocorrência houvesse condicionamento respondente. O


de outro evento, B, se a probabilidade do estudo de Rescorla de 1968 foi constituído
primeiro condicional à presença do segun- de dois experimentos e o primeiro deles ti-
do [p(A/B)] é diferente da probabilidade do nha como objetivo isolar os efeitos da conti-
primeiro condicional à ausência do segun- guidade temporal dos efeitos da contingên-
do [p(A/~B)]. Um aspecto importante dessa cia entre os estímulos. Para alcançar esse
definição é que a relação de contingência se objetivo, 24 ratos Sprague-Dawley foram
expressa num continuum que inclui desde expostos a um procedimento de supres-
relações negativas, quando p(A/B) é menor são condicionada (Estes & Skinner, 1941)
que p(A/~B), até relações positivas, quando em caixas operantes tradicionais, com uma
p(A/B) é maior que p(A/~B). Isso abre espa- barra de resposta, um comedouro, uma luz
ço para o estudo de relações entre estímulos para iluminação geral, um alto-falante pelo
tanto excitatórias (i.e., quando a ocorrên- qual o experimentador poderia apresentar
cia do estímulo aumenta a probabilidade um tom e um gerador de choques elétricos
de ocorrência da resposta) como inibitó- que poderia eletrificar o piso da caixa. Nes-
rias (i.e., quando a ocorrência do estímulo se procedimento, os ratos foram treinados
diminui a probabilidade de ocorrência da inicialmente a pressionar uma barra e re-
resposta), além de situações nas quais não cebiam pelotas de comida de acordo com
há contingência entre eventos [i.e., p(A/B) um esquema de reforçamento intervalo va-
= p(A/~B)]. Para ilustrar a importância des- riável (VI) 2 min. Depois de cinco dias de
sas relações, será descrito um estudo de treino, as barras foram removidas da caixa
Rescorla (1968), que foi o primeiro a realizar e cinco sessões de condicionamento res-
manipulações paramétricas dessas proba- pondente foram realizadas. Para um grupo
bilidades, e abriu as portas para o estudo de de ratos, denominado R-1 (n=8), 12 tons de
relações de contingência negativa, como no dois minutos de duração (CS) foram apre-
experimento posterior de Rescorla (1969). sentados mais ou menos a cada oito min e
outros 12 choques elétricos de 0,5 s de du-
ração e 0,9 mA de intensidade (US) foram
DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO apresentados aleatoriamente e de maneira
independente dos tons [p(choque/tom) =
Objetivo e Método p(choque/ ~tom)]. Um segundo grupo, de-
Até a publicação do trabalho de Res- nominado G, passou por um procedimento
corla (1968), existia a noção de que a conti- similar, exceto que todos os choques que
guidade temporal entre os estímulos, defi- ocorreriam na ausência dos tons foram eli-
nida como a ocorrência dos estímulos em minados. Assim, os ratos do grupo G rece-
proximidade temporal um com o outro, era beram a mesma quantidade de choques na
a variável necessária e suficiente para que presença do tom que os ratos do grupo R-1,

302
Cristiano Valério dos Santos

mas nenhum choque na ausência do tom, taxa de respostas durante o estímulo con-
o que caracterizou diferentes probabilida- dicionado em comparação com a taxa de
des de choque na presença e na ausência respostas em um período equivalente an-
do tom e, portanto, uma relação de con- tes do estímulo; quanto maior a supressão,
tingência positiva [p(choque/tom) > p(cho- mais forte o efeito do condicionamento. No
que/ ~tom)]. Contudo, os ratos do grupo G primeiro experimento, observou-se supres-
receberam menos choques do que os ratos são no grupo G, o qual havia sido exposto
do grupo R-1 e, para controlar essa diferen- a diferentes probabilidades de choque em
ça, um terceiro grupo, denominado R-2, foi presença ou ausência do estímulo, e não
exposto à mesma quantidade de choques houve supressão para os outros dois gru-
que o grupo G, mas apresentados de ma- pos, expostos ao procedimento verdadei-
neira aleatória e independente do tom. De- ramente aleatório, independentemente da
pois da fase de condicionamento, os ratos quantidade total de choques recebidos. No
foram expostos a 10 sessões semelhantes às segundo experimento, esse resultado foi re-
sessões de treino, com a exceção que houve plicado: Quanto menor a probabilidade de
quatro apresentações do tom sobrepostas choque na ausência do tom, mais forte era a
ao esquema de reforçamento VI 2 min, sem supressão. Por outro lado, quando a proba-
a apresentação de choques depois de cada bilidade de choque na presença ou ausên-
tom. cia do tom era igual, não houve supressão.

No segundo experimento, Rescor- Esses resultados apoiaram forte-


la realizou um estudo paramétrico com mente a ideia de que a contingência entre
10 grupos de ratos. Cada grupo foi expos- os estímulos é a variável principal na deter-
to a um par de probabilidades distinto, por minação do condicionamento respondente
exemplo 0,4-0,4, 0,4-0,2, 0,2-0,0, entre ou- e não a ocorrência dos dois estímulos em
tros. O primeiro valor se referia à probabili- contiguidade temporal.
dade de choque durante o estímulo condi-
cionado (tom) e o segundo valor se referia
à probabilidade de choque na ausência do DESDOBRAMENTOS
estímulo condicionado. Os demais detalhes
do procedimento foram como no primeiro A proposta de Rescorla (1967), que
experimento. inicialmente começou como uma discussão
acerca dos tipos de protocolos de controle
existentes em pesquisas sobre condicio-
Resultados e Discussão namento respondente, e a sugestão de um
A medida principal usada no estu- protocolo mais adequado, serviu de base
do foi a razão de supressão, que se refere à para que se questionasse uma ideia muito

303
Capítulo XIX | Condicionamento Pavloviano

arraigada em psicologia experimental até (Dinsmoor, 2001). Por outro lado, defenso-
essa época: a noção de que a contiguida- res de uma postura molar buscarão encai-
de temporal entre os eventos era suficien- xar o efeito variáveis localmente definidas
te para que se produzissem mudanças no em padrões comportamentais mais amplos,
comportamento dos organismos. como por exemplo a análise de Rachlin
(2000) sobre o autocontrole. Essas questões
Atualmente, essa discussão continua têm gerado debates acirrados sobre a natu-
em vigor em diferentes áreas da Análise do reza mesma dos fenômenos psicológicos e
Comportamento, no que se conhece como a sobre a melhor maneira de estudá-los.
discussão entre a postura molar e a postura
molecular (Baum, 2002; Dinsmoor, 2001). A Um segundo desdobramento impor-
ideia de que o comportamento dos organis- tante é que a noção de contingência como
mos é influenciado por contingências entre diferença de probabilidades (Rescorla, 1967,
estímulos se alinha com uma postura molar 1968) abriu as portas para o estudo de ou-
de comportamento, a qual defende que tan- tros fenômenos até então pouco discutidos,
to o comportamento como as variáveis que como é o caso da inibição condicionada. A
o afetam são fenômenos que se estendem inibição condicionada se refere aos efeitos
no tempo, em contraposição com a postura inibitórios de um estímulo que foi previa-
molecular, que centra suas explicações em mente apresentado com o estímulo incon-
relações de contiguidade espaço-tempo- dicionado em uma contingência negativa,
ral. É claro que nem a postura molar ignora ou seja, a probabilidade do estímulo incon-
efeitos de variáveis locais contíguas à ocor- dicionado dada a ausência do estímulo con-
rência de respostas específicas, como de- dicionado é maior que a probabilidade do
monstrado na análise que fizeram Davison estímulo incondicionado dada a presença
e Baum (2000) do comportamento de esco- do estímulo condicionado. Por exemplo, se
lha, nem a postura molecular ignora o efeito os choques ocorrem mais frequentemente
de variáveis claramente estendidas no tem- na ausência de um tom que em sua presen-
po, como a probabilidade ou a contingência. ça, haveria uma contingência negativa en-
No entanto, mesmo que reconheçam o efei- tre o tom e o choque. Posteriormente, quan-
to dessas variáveis, os defensores de uma do se apresenta esse estímulo junto com
postura molecular buscarão explicar como outro estímulo que já havia adquirido pro-
os organismos são afetados por essas vari- priedades excitatórias, observa-se uma di-
áveis estendidas no tempo apelando a pro- minuição da probabilidade da resposta ante
cessos contíguos à ocorrência de respostas o estímulo que era excitatório (Rescorla,
discretas temporalmente definidas, como 1969). Antes da proposta de Rescorla (1967,
o caso das teorias bifatoriais propostas 1968), o fenômeno de inibição em condicio-
para explicar o comportamento de esquiva namento respondente não tinha um lugar

304
Cristiano Valério dos Santos

certo, devido em grande parte à ideia de anteriores à publicação desse artigo, mas a
que o condicionamento respondente era re- forma como o tema era apresentado nos li-
sultado somente da contiguidade temporal vros de Psicologia não havia acompanhado
entre os estímulos. Se isso fosse correto, en- a evolução da área. Esse problema deveu-se,
tão apresentar o estímulo incondicionado em parte, a que acreditamos já saber tudo
na ausência do estímulo condicionado não o que é possível saber sobre o fenômeno.
deveria resultar em nenhum tipo de efeito Afinal, é só um estímulo que se relaciona a
e, portanto, não fazia sentido perguntar o outro e adquire nova função. No entanto, a
que aconteceria nesse caso. natureza simples do condicionamento res-
pondente é enganosa e ainda é necessário
Outro desdobramento interessante responder muitas perguntas.
é que, embora o procedimento verdadeira-
mente aleatório tenha sido proposto como A primeira delas tem a ver com as
uma condição de controle para a aprendiza- condições que produzem o condicionamen-
gem, com a suposição de que não se apren- to respondente. A análise feita por Rescorla
deria nada ao estar exposto a apresentações e seus experimentos posteriores junto com
independentes de dois estímulos, estudos outros fenômenos como o bloqueio (Ka-
posteriores mostraram que essa suposição min, 1968), o sombreamento (Mackintosh,
é falsa. Poucos anos depois dos trabalhos de 1974), a inibição latente (Lubow, 1973) e a
Rescorla, foram encontradas evidências de inibição condicionada (Rescorla, 1969), en-
que a exposição à ausência de contingência tre outros, revelam que o condicionamento
entre dois estímulos dificulta a aprendiza- respondente pode ocorrer ou não depen-
gem posterior quando se estabelece uma dendo de muitos outros fatores que não só
relação de contingência entre os mesmos a contiguidade temporal entre os estímulos.
estímulos, e esse efeito parece não ser re- A segunda pergunta tem a ver com o que
sultado somente da apresentação isolada é aprendido. Por exemplo, estudos sobre
de qualquer dos dois estímulos por si sós condicionamento de segunda ordem, nos
(Baker, 1976; Baker & Mackintosh, 1979). quais um estímulo neutro se relaciona a um
Este fenômeno hoje se conhece como irre- estímulo condicionado, têm sugerido que,
levância aprendida. com estímulos compostos, o comportamen-
to do organismo é controlado por relações
hierárquicas entre os estímulos, e não pela
CONSIDERAÇÕES FINAIS soma dos efeitos dos elementos que com-
põe um estímulo agindo em paralelo (Res-
Em um texto de 1988, Rescorla ar- corla, 1980). Além disso, há evidências que
gumentou que o condicionamento respon- sugerem que, quando um estímulo sinaliza
dente havia mudado muito nos 20 anos uma relação entre outros dois estímulos (o

305
Capítulo XIX | Condicionamento Pavloviano

que se conhece como “occasion-setting”), O condicionamento responden-


os estímulos podem ter funções tanto exci- te também pode estar relacionado a fenô-
tatórias como inibitórias ao mesmo tempo menos psicológicos que normalmente não
com diferentes elementos da relação (Res- pensaríamos estar relacionados. Numa
corla, 1980). Esses dados têm sido usados revisão da literatura sobre juízos de cau-
como evidência que apoia a ideia de que os salidade, Allan (1993) argumentou que a
estímulos, em lugar de eliciar uma respos- maneira como julgamos se dois eventos
ta, como tradicionalmente se pensava, mo- estão relacionados ou não, se um influen-
dulam sua ocorrência. Todos esses dados cia o outro, ou a efetividade de uma vari-
mencionados, em conjunto, sugerem que o ável sobre outra, pode ser entendida como
fenômeno de condicionamento responden- uma relação entre estímulos semelhante ao
te é muito mais complexo do que se imagi- condicionamento respondente. Inclusive as
nava. variáveis que fazem que um estímulo con-
dicionado adquira mais fortemente a ca-
Além disso, é amplamente reconhe- pacidade de evocar a resposta condiciona-
cido o papel que o condicionamento res- da parecem ser as mesmas que fazem com
pondente tem tanto no desenvolvimento que julguemos como mais forte a relação de
como no tratamento de muitos problemas causalidade entre dois eventos (ver Allan,
psicológicos, como transtornos de ansieda- 1993 para uma revisão dos experimentos
de ou disfunções sexuais (Bellack, Hersen, realizados sobre o tema).
& Kazdin, 1990). Menos conhecido, mas
igualmente importante, é o papel do con- Especificamente relacionada a noção
dicionamento respondente em fenômenos de contingência, uma prática muito comum
fisiológicos como a imunologia. Desde já no contexto clínico ou educativo é o que se
algumas décadas, sabe-se que a resposta conhece como reforçamento diferencial de
imunológica é afetada pela apresentação de outras respostas (DRO), que se define como
estímulos previamente emparelhados com a entrega do reforçador após períodos espe-
substâncias imunossupressoras ou facilita- cíficos de tempo durante os quais uma res-
doras (ver Ader, Cohen, & Felten, 1995 para posta específica não ocorreu. Essa prática é
uma revisão da literatura) e esse fato já foi um exemplo claro de contingência negativa
usado como coadjuvante no tratamento de entre uma resposta específica e um reforça-
doenças autoimunes como o lúpus (Olness dor putativo e ilustra o poder dessas con-
& Ader, 1992). Igualmente, há propostas tingências que até então haviam sido pouco
plausíveis de desenvolvimento de tolerân- estudadas.
cia à drogas que se baseiam nos princípios
do condicionamento respondente (Poulos, Por fim, embora os efeitos comporta-
Hinson, & Siegel, 1981). mentais de eventos independentes da res-

306
Cristiano Valério dos Santos

posta já tivessem sido analisados em pes- PARA SABER MAIS


quisas sobre condicionamento operante,
como no caso do trabalho de Skinner (1948) Rescorla (1969). Um dos primeiros estudos
sobre superstição em pombos, seu uso no qual as relações de contingência nega-
como estratégia de controle experimental tiva entre estímulos foram avaliadas siste-
não era tão difundido, salvo honrosas ex- maticamente.
ceções, como Skinner (1938) e Herrnstein e
Hineline (1966). Contudo, para poder falar Rescorla & Wagner (1972). Neste texto, os
de condicionamento operante, também é autores apresentam o modelo de Rescor-
necessário ter certeza de que as mudanças la-Wagner para explicar os fenômenos do
no comportamento são produto da relação condicionamento respondente. Neste mo-
de contingência entre a resposta e a conse- delo, os autores introduzem o conceito de
quência. Um exemplo desse tipo de proce- discrepância e defendem que o condicio-
dimento é o estudo de Stein, Xue e Belluzi namento respondente é resultado desse fe-
(1993), no qual os autores queriam estudar nômeno. Esse conceito tem sido muito útil
o condicionamento operante in vitro re- para diferentes modelos e teorias em dife-
forçando as respostas das células pirami- rentes áreas.
dais com microinjeções de dopamina. Para
que a demonstração pudesse ter êxito, era Miller, Barnet, & Grahame (1995). Uma re-
necessário demonstrar que o aumento na visão dos pressupostos básicos, sucessos e
taxa de respostas das células era resultado fracassos do modelo de Rescorla-Wagner.
da contingência entre responder e receber
dopamina e não devido a um aumento in- Ader & Cohen (1975). Este experimento
discriminado do responder pela presença foi o primeiro a testar sistematicamente os
de mais dopamina no sistema. Portanto, foi efeitos do condicionamento respondente
realizada uma condição de controle na qual nas respostas imunológicas.
as microinjeções de dopamina ocorriam de
maneira aleatória, sem relação com a res- Rescorla (1980). Neste livro, Rescorla des-
posta dos neurônios. Comparando os dados creve uma série de experimentos sobre
dessa condição de controle com a condição condicionamento de ordem superior. Com
na qual as microinjeções de dopamina ocor- essa preparação experimental, foi possível
riam de maneira contingente às respostas, responder a muitas perguntas sobre o que
os autores puderam concluir que os efeitos é aprendido no caso do condicionamento
reforçadores dos agentes dopaminérgicos respondente.
podem ser verificados in vitro.

307
Capítulo XIX | Condicionamento Pavloviano

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309
Kennon A. Lattal

The check is in the mail:


examining how delayed
reinforcement affects
performance

Kennon A. Lattal
West Virginia University

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under delayed reinforcement. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 7, 159-162.

“… a delay of reinforcement is not a static parameter in the effect of reinforcement


on behavior”
(C. B. Ferster, 1953)

310
Capítulo XX | Delay of Reinforcement

INTRODUCTION TO THE RE- ery of that reinforcer are described in two


SEARCH AREA AND CONTEXT OF places in The Behavior of Organisms. The
THE EXPERIMENT delays investigated by Skinner (1938) were
unsignaled, that is, there was no stimulus

Delay of reinforcement, even in change that accompanied the delay inter-
1964, was a long-standing problem of inter- val. In the first experiment (described on pp.
est in the psychology of learning (e.g., Kim- 73-74), a response released “a timing pen-
ble, 1961; Renner, 1964). Thorndike (1911) set dulum which operates the magazine at the
the stage for future inquiry when he noted end of the desired interval”. Skinner (Fig-
that “responses accompanied or closely fol- ure 6, p. 73) showed the acquisition data for
lowed by satisfaction to the animal” (p. 244) eight rats using delays of 1-4 s with differ-
would be strengthened. It was left to oth- ent pairs of rats, which, with one exception,
ers to explore the limits and implications he noted were comparable to acquisition
of “closely” for the response-reinforcer re- with immediate reinforcement. It is unclear
lation. The general theme was explored by whether these delays reset if subsequent re-
all of the major learning theorists who fol- sponses occurred during the delay interval,
lowed Thorndike. Guthrie (1935) empha- but it seems that they did not, that is, the
sized the overriding importance of tempo- delays were nonresetting (cf. Lattal & Glee-
ral contiguity between events in learning, son, 1990). He stated that “[a] new interval
but no reinforcement theorist was he! Hull must be begun [when a second response
(1943) discussed the problem of delay of re- occurs] or the second response will be rein-
inforcement at length in his book Principles forced too quickly, but this means that the
of Behavior, with a particular emphasis on first response must go unreinforced” (p. 73).
the mechanisms responsible for maintain- His subsequent comments suggested that
ing behavior challenged by delays of rein- he did not solve this problem in this first
forcement (see also Spence, 1947). Delay of experiment.
reinforcement also appears as a research
problem in Skinner’s (1938) book The Be- A little later in the book he described
havior of Organisms. In contrast to Hull’s two other experiments involving delay of
attempt to infer theoretical mechanisms reinforcement. He began by repeating the
underpinning the delay of reinforcement drawback to the aforementioned procedure:
gradient, Skinner’s analysis was, predict- “[n]o provision is made against the possi-
ably, more empirical. ble coincidence of a second response with
a delayed reinforcement” (Skinner, 1938, p.
Experiments concerned with impos- 138), thereby making it likely that the ob-
ing a temporal delay between the response tained delay would be less than the nomi-
that produces the reinforcer and the deliv- nal or programmed delay. He also noted a

311
Kennon A. Lattal

second difficulty, having to do with the rats ment was the research of Ferster (1953).
holding the lever down. The delay started Most learning theorists, including Skinner,
with a lever depression, but sometimes the focused on the detrimental effects of delay-
lever continued to be held down during the ing reinforcement on learning and perfor-
delay and was released at the end of the in- mance. Ferster turned the question around
terval, leading Skinner to question whether and asked how one might sustain behavior
this would result in immediate or delayed despite the presence of a delay between
reinforcement. The apparatus used in this the reinforcer and the response that pro-
experiment was the same as that used in duced it. He conducted a series of experi-
the experiment described above; however, ments with pigeons in which he first main-
he noted one change: “[t]he device has this tained key-peck responding (pecking at
important property: if a second response is small plastic disc with the beak) with vari-
made during the delay interval, the timing able-interval (VI) reinforcement schedules.
begins again, so that a full interval must Against this baseline, in his first and second
again elapse before reinforcement occurs” experiments delays signaled by blackouts
(p. 139). Thus, instead of a nonresetting of the chamber occurred between the re-
delay, in this experiment delays were re- inforcer and the response that produced it.
setting, that is, the delay interval restarted The blackouts were used “to prevent S from
with each response after the one that ini- responding” (p. 219), taking advantage of
tiated the delay. Using this resetting delay the fact that pigeons typically don’t peck re-
procedure, rats “were conditioned in the sponse keys when the chamber and the key
usual way” (p. 140; presumably by this Skin- are dark. Of course, darkening the cham-
ner meant with immediate reinforcement) ber was an immediate consequence of the
to respond, ultimately on a fixed-interval response, making the blackout a stimulus
(FI) 5-min schedule. After this training, ultimately correlated with reinforcer deliv-
delays of 2, 4, 6, or 8 s were in effect with ery. As a result, delay of reinforcement was
different rats for three sessions. Rates of confounded with the potential conditioned
responding were reduced when the delays reinforcing function of the blackout. This
were in effect, with the two shorter delays confound questions this experiment, and
reducing responding less than the two lon- all experiments involving signaled delays
ger ones. In a final delay of reinforcement of reinforcement, as a test of a “pure” de-
experiment, Skinner examined the effects lay of reinforcement on responding. In his
of various changes in the training and im- first experiment, Ferster observed that 60-s
plementation of the delays. delays caused a “small decline” in response
rates, but under a 120-s delay, responses
The next major development in the rates fell to about half of what they were
experimental analysis of delay of reinforce- when immediate reinforcement was used.

312
Capítulo XX | Delay of Reinforcement

In his second experiment, Ferster next tried administration. He helped me answer


to sustain high response rates by introduc- queries, write reports, and evaluate
ing the delays gradually, increasing their my pupils’ progress. He prepared me
duration from 1 to 60 s over a 90-hr train- for important meetings, posted me on
ing period. He reported that “[t]he three Ss new developments, and protected me
that did maintain normal rates of response from annoyances of any kind.” (p. 248)
under 60-sec. delays were continued under
the same procedure for several hundred ex-
perimental hours each. They exhibited no
tendency to slow down” (p. 222). Respond-
ing of the fourth pigeon was not sustained,
according to Ferster, because the delays
“were increased too rapidly.” (p. 222). He
presented no quantitative data in his re-
port of the experiments, but relied instead
on verbal descriptions of what happened,
supported by only a few sample cumulative
records of the pigeons’ performance.

These two lines of research (Skinner,


1938; and Ferster, 1953) provide the segue to Figure 1. Photograph of (left to right) Rodolpho Azzi, Fred Keller, Maria
Amélia Matos, Carolina Martuscelli Bori, and Andrés Aguirre with ap-
the subject of this chapter: the experiment paratus, December, 1961.

by Azzi, Fix, Rocha e Silva and Keller (1964).


An important part of the story behind the Soon after Keller started teaching, he
experiment by Azzi et al. is Fred Keller’s received a shipment of research equipment
love affair with Brazil, which began with that he had ordered from the Grason-Stadler
his arrival as a Fulbright Teaching Fellow Company in Waltham, Massachusetts. He
at the University of São Paulo early in 1961. remembered that the apparatus
He was assigned as his research assistant
Rodolpho Azzi, shown with Keller and two “… carried no instructions with it, so
other Brazilian psychologists in Figure 1. Of we had to determine its uses by trial
Azzi, Keller (2008) observed: and error. Rodolfo [sic][Azzi] and I,
together with Mario Guidi, a student
“He quickly became my counselor and in our course, worked for days before
guide, he acquainted me with every- we finally discovered how to automate
thing I should know about my pupils, a long-term study of the effects of dif-
members of the faculty, and officers of ferent delays of reinforcement on the

313
Kennon A. Lattal

lever-pressing response of three white without the required response at the end of
rats (named Alpha, Beta, and Gam- the interval, and a DRO schedule is essen-
ma by Rodolfo [sic]). The results were tially a resetting delay procedure, but with-
published later in the Journal of the out the delay requirement of a response to
Experimental Analysis of Behavior” initiate each DRO interval (the reinforcers
(Keller, 2008, p. 250). occur so long as the target response is ab-
sent, and if a target response does occur it
One can only speculate about why resets the DRO interval). Mix all of these
delay of reinforcement was the topic of the ideas together, add in the fact that Ferster
first research paper published in Journal of (one of Keller’s doctoral students at Colum-
the Experimental Analysis of Behavior with bia) had previously studied the effects of
a Brazilian first author (Azzi). Let’s go back signaled delays of reinforcement and, voi-
to Skinner’s second-reported experiment la, the procedures used by Azzi et al. (1964)
on delay of reinforcement in The Behavior emerge. We cannot know precisely how the
of Organisms. Recall that he used a resetting idea for the experiment developed, but it
delay procedure such that each response certainly, and unsurprisingly, can be close-
after the one initiating the delay restarted ly tied to some of the earlier work of Keller
the delay interval. He used a similar pro- and his students at Columbia.
cedure to reduce high rate responding [“no
response was ever reinforced if it had been
preceded within fifteen seconds by anoth- DESCRIPTION OF THE EXPERI-
er response” (p. 306)], thus giving birth to MENT
the differential-reinforcement-of-low-rate
(DRL) schedule of reinforcement. Wilson Goals and Method
and Keller (1953) thereafter studied the ef- Azzi et al. (1964) set out to do two
fects of DRL schedules on lever pressing things: (a) investigate operant responding
of rats across a range of “delay” (i.e., DRL under conditions where the interval be-
schedule) values. The Wilson and Keller ex- tween a reinforcer and the response that
periment grew out of an earlier demonstra- produced it was varied and (b) compare
tion of what was basically a differential-re- conditions where the delay was either ac-
inforcement-of-other-behavior (DRO) companied by a stimulus change (a signal)
schedule, in which the onset of an SD peri- or occurred without any change during
od occurred only if there were no response the delay interval (unsignaled). Thus, the
in the immediately preceding S-delta period experiment was basically a comparison of
for a specified time period (cf. Skinner, 1938, two different conditions - unsignaled and
p. 161). A resetting delay of reinforcement signaled delays of reinforcement – that had
contingency is essentially a DRL schedule been observed in two separate experiments

314
Capítulo XX | Delay of Reinforcement

conducted by, respectively, Skinner (1938) delay interval (a resetting delay), and there
and Ferster (1953). was no stimulus change during the delay
period. There followed several manipula-
To this end, three rats first were tions of delay durations for two of the rats.
trained to lever press under a fixed-ratio The third rat apparently was exposed only
(FR) 1 schedule, where the reinforcer was to a DRL 20-s schedule with immediate re-
access to water. It seems reasonable to as- inforcement. In the second, as in the first,
sume that at this time neither the food pel- part of the experiment, the schedule in ef-
lets used with rats in many experiments by fect technically was a tandem FR 1 DRO t-s
Skinner and others, nor the means for de- schedule, where t was 20 s for ten days, fol-
livering these pellets – i.e., a pellet dispens- lowed by six days with t = 30 s. For half of
er – were available in Brazil. Water was easy each session, “each animal worked within
to obtain and Keller had brought with him a dimly lighted chamber” (p. 160). For the
what he called a “Brenner dipper”1 for de- other half, however, “darkness was in effect
livering water reinforcers. After the initial during each delay interval … each time a re-
training, “within a dimly lighted response sponse was made to the lever, the light in
chamber, each [rat] was exposed succes- the chamber went off” (p. 160, italics orig-
sively to reinforcement delays of 1, 3, 5, 7.5, inal) and did not come back on until a re-
10, 15, and 20 s[econds], in that order, with a inforcer had been delivered. Lever presses
total of 150 reinforcers at each delay” (Azzi in the dark chamber extended the darkness
et al., 1964, p. 159). The schedule of rein- until the delay duration lapsed and a rein-
forcement thus was, technically speaking, a forcer occurred. Thus, in the second part of
tandem FR 1 DRO t-s schedule, where t cor- the experiment, a delay interval correlated
responded to one of the delay values given with the presence and absence of a stimu-
above. A tandem (the Latin word for “one lus change were compared.
right after the other”) schedule is identical
to a chained schedule in that two or more
components schedules must be completed Results and Discussion
in a fixed sequence for reinforcement; how- There were two main findings. Re-
ever, in the chained schedule each compo- sponding maintained under a tandem FR 1
nent is associated with a different stimulus DRO t- s schedule was a negatively decel-
but in the tandem schedule the stimuli as- erating function of delay duration. That is,
sociated with each component are identical. rate of responding dropped precipitously as
In Azzi et al.’s (1964) procedure, each delay the delay was increased from 1 to 10 s, but
restarted if a response occurred during the it asymptoted at that point, not dropping
further when delays were 15 or 20 s long.
1
Brenner was the name of the instrument maker at Columbia Univer-
sity who fabricated these water delivery devices. This relation is referred to as a delay of rein-

315
Kennon A. Lattal

forcement gradient, and it is characteristic licated when a number of different sched-


of the relation between response measures ules of reinforcement have been used to
and delay duration across a wide range of maintain responding (Elcoro & Lattal, 2011,
delay of reinforcement and reinforcement FI; Jarmolowicz & Lattal, 2013, FR; Rich-
schedule parameters (cf. Lattal, 2010). Dark- ards, 1981, DRL and VI; Sizemore & Lattal,
ening the chamber during the delay “pro- 1978, VI) and across a wider range of delay
duced an appreciable effect, regularizing values (Pierce, Hanford, & Zimmerman,
and increasing the response rate [relative to 1972; Richards, 1981; Sizemore & Lattal,
that observed in the unsignaled delay con- 1978). Azzi et al. also anticipated several
dition] in all but a few instances” (Azzi et al., subsequent comparisons of signaled and
1964, p. 160). unsignaled delay of reinforcement, with
more or less the same results: Signaled de-
The discussion addressed the role lays maintain more robust responding than
of mediating behavior in sustaining re- do unsignaled ones (Richards, 1981). A par-
sponding during the delay, an observation ticularly appealing feature of Azzi et al. is
made earlier by Ferster (1953). In what sub- that the comparisons of signaled and un-
sequently became a standard analysis, the signaled delays of reinforcement occurred
role of the signal was interpreted to func- within individual subjects. They are the first
tion as a conditioned reinforcer, maintain- to simultaneously (within session) compare
ing responses that produce it. This still is the effects of signaled and unsignaled de-
a popular interpretation of the role of the lays of reinforcement (cf. Lattal, 1984; Lat-
signal in signaled delay of reinforcement tal & Ziegler, 1982; Richards, 1981). Long
procedures. This interpretation, however, after Azzi et al., Reilly and Lattal (2004)
has more recently been questioned by in- developed a method for generating delay
terpreting the role of the signal to be one of of reinforcement gradients within individ-
either bridging or marking the delay (e.g., ual subjects during a single session. They
Williams, 1991), rather than strengthening maintained responding on a VI schedule
the behavior that precedes it. and, at the beginning of each session, intro-
duced a short delay before a reinforcer was
delivered. Each subsequent reinforcer was
IMPACT delivered after a progressively increasingly
longer delay.
Both outcomes of the experiment
qualify Azzi et al.’s (1964) as a seminal ex- Azzi et al.’s (1964) experiment was
periment in the study of delay of reinforce- conducted in the Columbia University tra-
ment. The delay of reinforcement gradients dition of systematic parametric analysis
reported by Azzi et al. (1964) have been rep- of the controlling variables of behavior. In

316
Capítulo XX | Delay of Reinforcement

this instance, delay durations were varied and Azzi et al. (1964) to investigate the ac-
across successive conditions. Because there quisition of responding by naïve rats and
was no return to baseline between the suc- pigeons under unsignaled resetting and
cessive delay value increases, subsequent nonresetting delays to reinforcement when
delays were imposed on varying rates of the operant response was not shaped or
responding across manipulations, with un- otherwise trained, but left to develop with-
known effects on the delay of reinforcement out any such intervention by the investiga-
gradient. These delay of reinforcement gra- tors. Robust responding developed under
dients, however, are quite similar in shape these conditions, attesting to the power of
to those obtained with rats’ lever pressing or delayed reinforcement in developing and
pigeons’ keypecking maintained under oth- sustaining operant behavior. This is anoth-
er reinforcement schedules (Elcoro & Lat- er way of saying that immediate reinforce-
tal, 2011; Pierce, et al., 1972; Richards, 1981; ment is not necessary for learning to occur.
Sizemore & Lattal, 1978), suggesting that the That said, however, immediate reinforce-
baseline response rates may play less of a ment results in much more robust respond-
role in the form of the gradient than the de- ing. It is an open question as to whether
lay value itself. response acquisition is “faster” with imme-
diate versus delayed reinforcement of re-
One potential confounding variable sponses.
in the experiment was that of reinforcement
rate. Like so many other early experiments
involving reinforcement delays, reinforce- FINAL CONSIDERATIONS
ment rate under each delay value was not
reported by Azzi et al. (1964). It is almost Delay of reinforcement is one of the
certainly the case that reinforcement rates major parameters of reinforcement that af-
differed as the delays were increased in the fects its efficacy in developing and main-
first part of the experiment and in the pres- taining behavior (Kimble, 1961). For this rea-
ence and absence of a signal in the second son, its role both alone and in combination
part. Subsequent research, however, has with other reinforcement parameters, such
shown that reinforcement rate differences as reinforcer magnitude, has been inves-
generally do not account for the differences tigated extensively. One outcome of such
in response rates brought about when delay interactive analyses is delay discounting,
durations are changed (Lattal, 1982; Rich- in which systematically increasing delays
ards, 1981; Sizemore & Lattal, 1978). of reinforcement for a larger magnitude or
more probable reinforcer are pitted against
Lattal and Gleeson (1990) used a pro- a fixed, smaller magnitude or less proba-
cedure similar to that of both Skinner (1938) ble reinforcer to determine, among other

317
Kennon A. Lattal

things, the indifference point where either the responses that produce them. Basic re-
alternative is equally likely to be chosen search on delay of reinforcement suggests a
(see Green, Myerson, & Vanderveldt, 2014, number of conditions under which delays
for a contemporary summary of these find- will (e.g., longer or unsignaled delays) or will
ings). Studies of delay discounting offer in- not (e.g., shorter or signaled delays) reduce
sights into how different combinations of responding, but there has been little applied
reinforcement parameters might be scaled. research to expand on these findings as they
Similarly, delay of reinforcement (some- might relate to treatment programs (but cf.
times also called “gratification” in nonbe- Stromer, McComas, & Rehfeldt, 2000).
havior-analytic experiments on the phe-
nomenon) plays an important role in the One particularly important unre-
development of self-control or self-man- solved issue in the analysis of delayed rein-
agement strategies. Indeed, the foundation forcement with humans in either research
of this area of research and application is or applied settings is that of the mediation
the experimental analysis of delay of rein- of behavior during delays by verbal behav-
forcement. ior. Both Ferster (1953) and Azzi et al. (1964)
suggested that behavior is sustained during
Yet another area where delay of re- delays of reinforcement to the extent that
inforcement research has been important is certain stereotyped behavior patterns
in the study of conditioned reinforcement. emerge during the delay that result in a
A major theory of such reinforcement is the chain of behavior developing such that the
delay reduction theory, which suggests that response that initiates the delay is followed
stimuli function as reinforcers to the extent by some regular behavior pattern (not re-
that they indicate a reduction in the time of quired, but maintained by adventitious re-
access to (primary) reinforcement (Fantino, inforcement) that ends contiguously with
1977). reinforcement. Such superstitious chains
thus ensure a “connection” between the ini-
The lessons of delay of reinforce- tiating operant response and the reinforcer
ment have not been lost in applied behavior at the end of the delay. Verbal behavior of
analysis, where the importance of reinforcer humans, it has been suggested, also could
immediacy following appropriate behavior mediate delays. Something a person does
continues, with good reason, to be empha- now may not have an effect for an hour, a
sized. Although immediate reinforcement day, or even longer, yet the two events re-
may be optimal in both treatment and gen- main linked and the person continues to
erally in managing human behavior, much engage in the behavior reinforced after the
of human behavior is maintained even delay. Perhaps it is related to things that ei-
though its reinforcers are delayed from ther the person tells himself or others tell

318
Capítulo XX | Delay of Reinforcement

him during the intervening delay interval. perspectives on the use and implications of
Or perhaps not. Some contemporary crit- delay of reinforcement for the understand-
ics of such contiguity-based interpretations ing of the reinforcement process.
of delay of reinforcement have suggested
that temporal proximity between response Lattal (2010). Reviewed basic research on
and reinforcer plays a relatively minor role delay of reinforcement conducted in the
in the acquisition and maintenance of re- behavior-analytic tradition from Skinner to
sponding relative to the fact that there is an the time of his review.
overall correlation between response rate
and the reinforcer that accrue, either im- Renner (1964). Is an important early re-
mediately or after delays (see Baum, 1973). view of delay of reinforcement with a broad
The Lattal and Gleeson (1990) experiment learning-theory perspective on the topic.
described above illustrates that learning
can occur when there is only a correlation Stromer, McComas, & Rehfeldt (2000).
between responding and reinforcement, Considered some of the applied implica-
but not response-reinforcer contiguity. This tions of research on delay of reinforcement.
latter point raises the broader, unanswered
question of whether reinforcers occurring Tarpy & Sawabini (1974). Critiqued re-
after a delay are more usefully character- search on delay of reinforcement conduct-
ized as delayed from specific responses or ed from the time of Renner’s review until
correlated with groups of responses orga- their own.
nized as response rates or time allocated to
responses of particular topographies.
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Hiroto Okouchi

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Hiroto Okouchi
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special properties for that reason”
(Skinner, 1953, p.257).

322
Capítulo XXI | Private Events

INTRODUCTION TO THE RE- an extensive body of knowledge on lawful


SEARCH AREA AND CONTEXT OF relations among such public events (Ferster
THE EXPERIMENT & Skinner, 1957; Honig, 1966; Honig & Stad-
don, 1977; Iversen & Lattal, 1991; Madden,
A lot of people, not only psycholo- 2013).
gists but also laymen, are interested in un-
derstanding the “mind.” Behavior analysts Behavior analysts assume that pri-
have a unique view of it. One example is vate events follow the behavioral principles
that based on radical behaviorism (Skinner, discovered by the experimental analysis
1945). of public events. According to this view-
point, for example, even describing one’s
A hypothetical entity that usually has own feelings is a result of contingencies of
been called “mind” is related with one of the reinforcement. Skinner (1945) argued that
behavior-analytic concepts, private events. verbal responses under the control of pri-
Private events generally have been defined vate stimuli are established and maintained
structurally as events that occur within the mostly by the contingencies of reinforce-
skin of a person (Catania, 1992, p.388) and ment arranged by other people. Suppose
functionally as events that are directly ac- that a “depressed” person (a speaker) says,
cessible to only one person (Skinner, 1953, “I am depressed.” If someone (a listener)
p.257). Feelings, such as “depressed” and listened to and understood the complaint
“excited”, are private events not only struc- (i.e., if the listener belonged to the same
turally but also functionally, because they verbal community that the speaker did
occur within the skin of a person and are and could react appropriately to what the
directly accessible only to him or her. Such speaker said), and if the listener knew that
feelings, in general, are regarded as “ele- the speaker had experienced an event that
ments of mind” (The Oxford English Dictio- usually elicits depressed feelings (e.g., loss
nary, 2004, pp.1047-1048). of a significant other), the listener may say,
“I know exactly how you feel.” Behavioral-
As the opposite of private events, ly, the depressed feeling, the complaint “I
events that occur outside the skin of a per- am depressed,” and the words of comfort “I
son and/or events that are directly accessi- know exactly how you feel,” respectively,
ble to more than the individual person may are a discriminative stimulus, a response,
be called public events. Rat’s lever-pressing and a reinforcer to the speaker’s verbal be-
and the delivery of a food pellet during op- havior. As a verbal response (e.g., “red”) to
erant-conditioning experiments are typical a public stimulus (e.g., a red card) can be es-
examples of public events. The experimen- tablished by reinforcement given by others
tal analysis of behavior has accumulated (e.g., “Right, that is the color of the card.”),

323
Hiroto Okouchi

behavior analysts presume that describing internal milieu.


one’s own feelings (e.g., being depressed),
also is learned (e.g., Skinner, 1953, pp.257- Subjects were five experimental-
282). ly naïve female White Carneau pigeons
distributed into two groups, referred to as
Skinner (1945) also argued that a per- “manders” (two pigeons) and “tacters” (three
son’s report of a private stimulus occurs not pigeons).
by direct reinforcement but through gener-
alization. A person may describe his or her Two contiguous experimental cham-
novel feeling as “depressed” if he or she has bers, separated by a transparent Plexiglas
learned that the word “depressed” is used divider which allowed the pigeons to see
when something (e.g., a lever) was pushed one another, were used (see Figures 1 and 2).
down (generalization from public events to The manders were trained in the left cham-
private ones, Skinner, 1957, pp.132-133) or it ber, the tacters in the right. Before being
is used when he or she has experienced a placed in their chambers simultaneously,
feeling that is similar to the novel one (i.e., each pigeon was trained individually.
generalization from known private events
to unknown ones). The tacters, which were food and wa-
ter deprived during the experiment, were
In contrast to plenty of conceptu- trained in a two-component chain in which
al analyses (e.g., Leigland, 2014; Schlinger,
2011; Tourinho, 2006), experimental anal-
yses of private events have received rela-
tively little attention. The experiment by
Lubinski and Thompson (1987) is one of the
rare cases in which an experimental anal-
ysis of private events has been conducted.

DESCRIPTION OF THE EXPERI-


MENT

Goals and Method


The goal of Lubinski and Thompson’s
(1987) experiment was to assess whether Figure 1. Adjoining work panels of the chambers for the two groups
of pigeons. Work panels were separated by a Plexiglas divider. The
nonhuman animals could learn to interact manders were trained in the left chamber; the tacters were trained in
the right chamber (reproduced from Lubinski & Thompson, 1987, with
communicatively, based on events in their permission of John Wiley and Sons).

324
Capítulo XXI | Private Events

Figure 2. A two-pigeon communicative exchange based on the drug state (internal state) of one of the pigeons. From left to right, the five frames (A-E)
show the successive components of the procedure. The pigeons on the left and the right in each frame were the mander and the tacter, respectively
(reproduced from Lubinski & Thompson, 1987, with permission of John Wiley and Sons).

the first component involved an arbitrary with food and water, respectively.
matching-to-sample task (the procedure
of this training will be summarized later). The matching-to-sample task the
After this training, the established chain tacters experienced is known as a drug dis-
was as follows: (a) The tacter was injected a crimination procedure: Reinforce one type
depressant (pentobarbital), a stimulant (co- of activity following drug administration
caine) or isotonic saline solution; (b) three and reinforce some other activity following
response keys, each labeled with a letter “D”, administration of either no drug or some
“N”, or “Σ” were illuminated (Figure 1); (c) other drug (Branch, 1991). With no differ-
the tacter’s key pecks matching the inject- ential exteroceptive stimuli correlated with
ed substance (the “D” key for pentobarbi- any activity, choices that produced reinforc-
tal, the “Σ” key for cocaine, and the “N” key ers more frequently than chance levels and
for saline) were followed by presentation could be attributed to interoceptive stimuli
of a flashing blue light above the response arising from the administrated substance
keys; (d) responses on a key above a food (e.g., the drug or the saline solution). Thus,
dispenser (food key) and on a key above a the tacters in the Lubinski and Thompson’s
water dispenser (water key) were reinforced (1987) experiment were trained to “report

325
Hiroto Okouchi

their feelings” by the matching-to-sample water deprived and 4 hr food deprived). By


task. Approximately seven months were alternating these two conditions in an A-B-
required for the tacters to respond reliably A-B fashion, the tacters chose food and wa-
(i.e., at least 80% of correct responses) in ter indifferentially when the blue light was
this task. flashing.

A second goal of the Lubinski and A mand, a more primitive unit of ver-
Thompson’s (1987) experiment was to as- bal behavior, is “a verbal operant in which
sess whether the pigeons’ responses to their the response is reinforced by a characteris-
internal (private) events could function as a tic consequence and is therefore under the
tact, which was examined on the final part functional control of relevant conditions of
of the experiment (described later). A tact, a deprivation or aversive stimulation” (Skin-
unit of verbal behavior, is “a verbal operant ner, 1957, pp.35-36). Saying “Candy” is an
in which a response of given form is evoked example of a mand when reinforced by ac-
(or at least strengthened) by a particular cess to candy, and the response “Candy”
object or event or property of an object or will be more likely to occur after a period
event” (Skinner, 1957, pp.81-82). Quoting of candy/food deprivation (Skinner, 1957,
several other authors (e.g., MacCorquodale, p.35). The manders, which were maintained
1969; Skinner, 1957, pp.81-82), Lubins- at 85% of their free-feeding weights by food
ki and Thompson stated that tacts are not deprivation, were trained in a three-com-
maintained by particular reinforcers, nor ponent chain in which the third component
do they covary with the individual’s state involved an arbitrary matching-to-sample
of deprivation or aversive stimulation, but task. The established chain for the mander
are maintained by generalized conditioned was as follows: (a) A key with English letters
reinforcers (e.g., saying “Right” when some- arranged to form words “How Do You Feel?”
one correctly names the color of a red card was illuminated (Figure 1); (b) the mander’s
by saying “Red”). In order to reach this sec- pecking the “How Do You Feel?” key was
ond goal, therefore, Lubinski and Thomp- followed by the illumination of another key
son attempted to establish the flashing blue labeled “Thank You”; (c) when the mander
light as a generalized conditioned reinforc- pecked the “Thank You” key, a letter “D”,
er that could maintain the behavior of the “N”, or “Σ” was projected onto a sample key;
tacters. The tacters were deprived of food (d) pecking the sample key and then peck-
more strictly than they were deprived of ing the comparison key containing the cor-
water on one day (i.e., 28 hr food deprived rect matching response (a key labeled “P” to
and 4 hr water deprived), and they were de- the letter “D”, a key labeled “C” to the letter
prived of water more strictly than they were “Σ”, and a key labeled “S” to the letter “N”)
deprived of food on another day (i.e., 28 hr produced food.

326
Capítulo XXI | Private Events

After both manders and tacters inde- It should be noted that the Lubinski
pendently acquired the necessary accuracy and Thompson’s (1987) experiment had two
(i.e., at least 80% of correct responses) on additional phases (Phases 2 and 3). In Phase
their chain performance, individual tacters 2, the tacters were injected novel drugs,
and manders were placed in their chambers chlordiazepoxide and d-amphetamine,
simultaneously. As Figure 2 illustrates, which share pharmacological properties
the behavioral interaction required of each with pentobarbital and cocaine, respec-
mander-tacter pair was as follows; (a) The tively, as a generalization test. In Phase 3,
mander’s “How Do You Feel?” was illumi- the authors examined whether the tacters’
nated and the mander pecked it; (b) all of responses to their private events actually
the tacter’s comparison keys (i.e., the “D”, functioned as tacts. The tacters’ perfor-
“N”, and “Σ” keys) were illuminated and the mances were tested when the tacters were
tacter pecked the comparison key correlated placed in their experimental chamber after
with the injected substance (or the tacter’s receiving 24 hr free access to both food and
own “feelings”); (c) the “Thank You” key in water (the tacters were satiated with food
the mander’s chamber was illuminated and and water), and when their correct respons-
the mander pecked it; (d) the letter (“D”, “N”, es flashed the blue light only, but did not
or “Σ”; i.e., the drug “name” or the tacter’s produce water or food anymore (the tacters’
report of its feelings) previously pecked by correct responses produced only a condi-
the tacter appeared on the mander’s sam- tioned reinforcer).
ple key and the blue light started to flash in
the tacter’s chamber; the mander pecked
the sample key and then pecked the cor- Results and Discussion
rect comparison key; the tacter pecked the Results of Phase 1
food key or the water key, producing either Because only a single substance
food or water; (e) the mander received food. (pentobarbital, cocaine, or saline) was in-
If the tacter pecked a comparison key un- jected prior to each session, the correct
correlated with the injected substance (an choice for the tacter was the same across
incorrect response), the houselights were all trials within a session. Thus, the perfor-
dimmed for 4 s and the initial link of the mance of the tacters on the first trial of a
chain (a) was reinstated. Thus, the sample session was important in this experiment.
stimulus presented to the mander was al- Both the mander and the tacter responded
ways correct. Both manders worked with correctly (e.g., the tacter injected the pento-
each of the tacters. Pigeons were tested barbital pecked the “D” key and the mander
under this interaction for 40 experimental pecked the “P” key) on the first trial in 70-
sessions. 100% of the sessions, whereas the percent-
age of a correct discrimination happening

327
Hiroto Okouchi

by chance was approximately 11% (i.e., the eralization obtained in Phase 2 qualifies
product of the two individual performances as an example of extended tacts and ex-
happening by chance, i.e., .33 x .33). These emplifies with nonhumans Skinner’s de-
results suggest that the pigeons learned to scription of how humans come to report on
interact communicatively based on events novel feelings; (d) Lubunski and Thomp-
in their internal milieu. son’s results demonstrate that covert be-
havior (e.g., thoughts, feelings, and images),
Results of Phases 2 and 3 which has been one of the candidates for
The performances observed in Phase nonhuman-animal experimental models
1 persisted in Phase 2, suggesting that the (Epstein, 1984) but has resisted empirical
tacters’ responses to their private events analysis, is amenable to objective analysis;
arising from training drugs (pentobarbital (e) the performances studied by Lubinski
and cocaine) generalized to those of similar and Thompson may not constitute an ex-
private events arising from untrained drugs ample of “linguistic activity” as the term is
(chlordiazepoxide and d-amphetamine). usually understood, but share features with
The performances observed in Phases 1 and those activities seen in very young chil-
2 persisted in Phase 3, suggesting that the dren or individuals diagnosed with devel-
tacters’ accurate responses to their private opmental disabilities; (f) Savage-Rumbaugh
events were not maintained by particular (1984) claimed that behavior controlled by
reinforcers (food or water), nor did they co- the contingencies imposed by electronic
vary with the tacters’ states of deprivation, circuity rather than by another individual
but were maintained by a generalized con- could not be characterized as “communica-
ditioned reinforcer (the flashing blue light). tion.” However, human dyadic exchanges
of responses often are mediated by external
The discussion of Lubinski and events such as telephone connections and
Thompson (1987) may be summarized as computer bulletin boards, and we are still
follows: (a) The tacters’ behavior involved content to refer to such exchanges as “ver-
tacting private events; (b) the tacters bal.”
learned to tact private events under a con-
tinuous reinforcement schedule with 100%
accuracy, that is, by a contingency in which IMPACT
every correct response produced a reinforc-
er and any incorrect response produced no The experiment by Lubinski and
reinforcer; in contrast, humans are consid- Thompson (1987) has received great at-
ered to learn to tact private events by an tention (e.g., Catania, 1992, pp.219-220). In
intermittent reinforcement schedule with 1993, the journal Behavioral and Brain Sci-
weak accuracy (Skinner, 1945); (c) the gen- ences devoted space to a debate on it, with

328
Capítulo XXI | Private Events

commentaries by 27 behavioral and nonbe- C0 incorrect. Similarly, when placebo (A2)


havioral scholars (see Lubinski & Thomp- was the sample, correct comparisons were
son, 1993). B2 and C2. Following the establishment
of A1B1, A1C1, A2B2, and A2C2 condition-
The Lubinski and Thompson’s (1987) al relations by such a drug discrimination
experiment, however, has not been repli- training, untrained B1C1 and B2C2 relations
cated directly or systematically. Probably, emerged. These results demonstrate that
this may be due to practical reasons. The private events can emerge as members of
experimental apparatus used by Lubins- an equivalence class as public ones do (Sid-
ki and Thompson was very different from man & Tailby, 1982), and, as Lubinski and
standardized operant chambers. Psychoac- Thompson showed, provide evidence that
tive drugs are not accessible to all research- behavioral principles operating on public
ers. In addition, this kind of experiments events operate on private ones, too (Skin-
takes a long time. As described in the pres- ner, 1953, pp.257-258).
ent chapter’s Goals and Method section, in
fact, Lubinski and Thompson spent seven An experiment conducted by Okou-
months to teach the tacters the drug dis- chi (2006) is another case relevant to the
crimination. topic. As in the Lubinski and Thompson’s
experiment, in Okouchi’ s experiment re-
Two studies may be regarded as suc- sponses to private stimuli of one individ-
cessors to Lubinski and Thompson (1987). ual resulted in sample stimuli for another
One was conducted by DeGrandpre, Bick- individual. Different from the Lubinski
el, and Higgins (1992). They also used the and Thompson’s experiment, however, pri-
drug discrimination procedure as Lubinski vate stimuli were not interoceptive stimuli
and Thompson did, and examined whether but exteroceptive, visual, stimuli that only
equivalence relations can emerge between one individual of a pair of undergraduates
interoceptive stimuli (activated by drugs) could see. According to the functional defi-
and exteroceptive stimuli. Adult humans nition of private events as events that are
were trained drug discriminations with directly accessible to only one person (Skin-
triazolam (reducing self-reports of anxi- ner, 1953, p.257), events that occur outside
ety) and placebo (lactose-filled capsules) as the skin of a person can be private (Rachlin,
sample stimuli and visual stimuli as com- 2003, called this type of private events as
parison stimuli. When the triazolam (A1) Privacy B and distinguished it from Privacy
was administered, choosing a visual stimu- A, which are events that occur under a per-
lus B1 was correct and visual stimuli B2 and son’s skin).
A0 incorrect; or choosing a visual stimulus
C1 was correct and visual stimuli C2 and Employing the functional definition

329
Hiroto Okouchi

of private events, Okouchi (2006) exam- In Okouchi’s (2006) experiment, two


ined one of Skinner’s (1945) interpretations of eight pairs showed the expected perfor-
of how verbal responses under the control mances that the learners mastered the AC
of private stimuli are established: the re- conditional discriminations from the in-
port of a private stimulus (e.g., pain) may structors who had no access to the A stimuli.
be established by reinforcement from other Subsequently, Sonoda and Okouchi (2012)
people who infer the private stimulus from replicated the results of Okouchi using a re-
collateral public responses (e.g., hand to vised procedure. They used abstract stim-
jaw, facial expressions, groans) to the stim- uli and a computer, for example, whereas
ulus. Eight of 16 participants, referred to Okouchi used geometric stimuli, nonsense
as instructors, first learned BC conditional syllables, and color stimuli and controlled
discriminations with the B stimuli as the the experiment manually. Sonoda and Ok-
samples and the C stimuli as the correct ouchi obtained the expected performances
comparisons. Then, the other eight partici- from all of 26 pairs of undergraduates.
pants, referred to as learners, were exposed
to modified matching-to-sample trials in
which the responses of the learners were FINAL CONSIDERATIONS
reinforced or punished not by the respons-
es of the experimenter but by those of the Perhaps, simulating the behavior of
instructors. AC conditional discriminations reporting private events by nonhuman ani-
were to be established for the learners, in mals may be one of the most significant ac-
which the sample stimuli As were present- complishments of Lubinski and Thompson
ed simultaneously with the B stimuli so that (1987). Epstein (1981, 1984) insisted that an-
the instructors could see the Bs but not the imal simulations, or experimental models,
As. According to the functional definition synthesizing so-called “complex” human
of private events, the A stimuli were pri- behavior with nonhuman animals, could
vate for the instructors. Thus, the sample lend insight into what kinds of variables
stimuli As and the sample-correlated stim- constitute some of these “complex” behav-
uli Bs corresponded, respectively, to private iors in humans. Epstein (1984) listed four
stimuli and their collateral overt responses classes of behaviors that had resisted anal-
in Skinner’s interpretation. Okouchi exam- yses and, therefore, had been regarded as
ined whether the learners’ reports (Cs) of “complex”: (a) covert behaviors (“thoughts,”
their own stimuli (As) would be established “feelings,” and “images”); (b) typically hu-
by differential reinforcement from other man behaviors (language, behavior that
people (the instructors) who could access comes under the rubric of “self,” and prob-
only the collateral stimuli (Bs) and the re- lem-solving behavior); (c) behaviors con-
ports (Cs). trolled by temporally remote stimuli (“mem-

330
Capítulo XXI | Private Events

ory”); and (d) novel behaviors (“creativity,” or not.


and “productive thinking”). Except for the
class of covert behaviors, some behaviors
in each class were simulated and studied TO LEARN MORE
experimentally (e.g., Epstein, 1981; Epstein,
Lanza, & Skinner, 1980; Epstein & Skinner, DeGrandpre, Bickel, & Higgins (1992).
1981). The work by Lubinski and Thompson This article reports an experiment in which
may be regarded as a success of an animal human private events were manipulated by
simulation of covert behaviors or private psychoactive drugs.
events (“feelings”).
Kohlenberg, & Tsai (1991). This book de-
As the title of their article implies, scribes how private events, such as emo-
two practices illustrating a model of how tions, memories, cognitions, and beliefs,
to examine private events also may be are conceptualized and managed in a be-
significant accomplishments by Lubinski havior-analytic psychotherapy.
and Thompson (1987). First, they showed
that drug discrimination procedures can Okouchi (2006). This article discusses how
be used in experiments on private events. events outside a participant’s skin and not
One of the difficulties in the experimenta- accessible to another participant but to an
tion on private events is the manipulation experimenter may contribute to experi-
of the private events. Presentation and mental analyses of private events and re-
nonpresentation of a “feeling”, for exam- ports an experiment that examined one of
ple, is not easy, whereas those of a colored Skinner’s (1945) interpretations of the way
light have been commonly implemented in in which humans learn to report private
behavioral experiments. The use of psy- events.
choactive drugs would be one of the few
methods for manipulating feelings relative- Rachlin (2003). This book chapter describes
ly reliably (but see Branch, 1991, for a dis- how teleological behaviorism views private
cussion of difficulties in using drugs as dis- events. Teleological behaviorism excludes
criminative stimuli). Second, Lubinski and internal events (events under an organism’s
Thompson conducted an experiment on skin) from the analysis of behavior and
private events in the context of interindi- looks for controlling variables of behavior
vidual interactions. This practice is useful widely into the organism’s temporally ex-
because, according to the functional defini- tended environment.
tion of private events (Skinner, 1953, p.257),
whether an event is private or not depends Skinner (1945). This is a classic on private
on whether it is accessible to other persons events. You MUST read it if you would

331
Hiroto Okouchi

study private events based on a behavioral the analysis of behavior. Behaviorism, 12,
point of view. 41-59.

Sonoda & Okouchi (2012). This article re- Epstein, R., Lanza, R. P., & Skinner, B. F.
ports experiments that replicated the re- (1980). Symbolic communication between
sults of Okouchi (2006), using a revised two pigeons (Columba livia domestica). Sci-
procedure. In Experiment 2, the learners ence, 207, 543-545.
learned to tact “private events” by rein-
forcement not with 100%, but with 83.3% Epstein, R., & Skinner, B. F. (1981). The
accuracy, illustrating a laboratory analogue spontaneous use of memoranda by pigeons.
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