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Agradecimentos:
Agradeço primeiramente meus pais e família por todo apoio e dedicação.
Agradeço minha orientadora Susana Cecília Igayara – Souza pelos 18 meses de trabalho
intenso. Agradeço imensamente a atenção, disponibilidade e a preciosa contribuição dos
entrevistados: Francisco Campos Neto, Raphael Leite Osório, Lucas Paolo Vilalta.
Agradeço também à FAPESP pelo apoio financeiro.
Dedicatória:
Dedico esse trabalho à memória do regente e compositor Carlos Alberto Pinto
Fonseca, importante figura no universo coral do século XX e na minha trajetória enquanto
músico e cantor. Dedico esse trabalho também a todas e todos os Orixás homenageados
nas obras abordadas. Que o Brasil para sempre seja terra onde dançam os Orixás.
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ÍNDICE
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5.7 Postura em apresentações ....................................................................... 42
5.8 Seleção de novos cantores ....................................................................... 42
5.9 Curso de regência para auxiliares do coro ............................................ 44
7. CONCLUSÃO ............................................................................................... 53
8. BIBLIOGRAFIA ........................................................................................... 53
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1. Tradição coral na América Latina
A fim de compreender o desenvolvimento da prática coral na américa latina e no
Brasil durante o século XX, o artigo de Maria Guinand A Hundred Years of Choral
Tradition in Latin America 1908 – 2008 foi consultado. Este artigo desponta como
importante literatura de circulação internacional que trata sobre o tema. Embora apresente
lacunas e informações superficiais acerca das trajetórias de importantes nomes da história
da música latino-americana, a utilização desse material se faz importante. Por meio desse
artigo, o leitor pode compreender a forma como as trajetórias desses nomes é estudada
por autores internacionais e a visibilidade que recebem no cenário da pesquisa musical
no estrangeiro.
Em seu artigo María Guinand informa que a prática da música coral não é uma
atividade característica das culturas nativas da América Latina. A música coral veio ao
continente por intermédio das missões colonizadoras enviadas pelo reino espanhol.
Guinand (2012, p. 130) relata que as catedrais atuavam como provedora da música coral,
oferecendo cursos e grupos vocais onde os fiéis poderiam aprimorar o canto e outras
habilidades musicais. A música era parte importante das festas religiosas e missas. No
Brasil, as festas e eventos religiosos do período colonial criaram um ambiente próspero
para músicos, especialmente ao redor da região mineradora. Os frequentes eventos
organizados pelas irmandades proporcionavam sustento a muitos grupos corais,
instrumentistas e compositores. Segundo Guinand (2012, p. 130), na américa espanhola,
o vilancico e outros ritmos espanhóis foram utilizado como diretrizes para a produção
musical colonial, sendo incorporados nas tradições musicais locais.
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quanto ao acompanhamento instrumental. Chacaro teve uma pequena prática de música
secular.
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produzir uma estética musical que retratasse todas as manifestações artísticas brasileiras
de forma a ser compreensível a ouvintes de todas as culturas.
Para Guinand (2012, p. 136), um dos fatores que criaram no Brasil um ambiente
propício para a prática coral se desenvolver foi o canto orfeônico, idealizado por Villa-
Lobos. Durante parte da primeira metade do século XX, em especial durante os governos
Vargas, o canto orfeônico compôs o currículo de todos os estudantes brasileiros. Um novo
repertório foi composto para as aulas de canto nas escolas. Esse repertório retratava
profissões e elementos do cotidiano dos brasileiros e o nacionalismo. Em seu texto,
Guinand traz a seguinte definição do Canto Orfeônico: “Um elemento intelectual que
procura refinar o bom gosto na música, formando uma elite, contribuindo para a elevação
musical das pessoas e desenvolvendo interesse em uma arte de caráter nacional”
(GUINAND, 2012: 136, tradução nossa). Fonseca compôs peças para canto orfeônico e
coro infantil. Santos (2001, p. 49 – 67) lista em seu catálogo 40 composições para coro
infantil e 7 arranjos para a mesma formação.
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e linguagem harmônica influenciada pelo impressionismo e pela música popular
colombiana. Na Venezuela, o compositor Alberto Grau produziu obras corais de
propósito pedagógico. Segundo Guinand (2012, p. 145), Grau utilizou conceitos da
eurritmia para a composição das rítmicas de suas obras. Entre suas composições, Guinand
cita uma ópera infantil que Grau nomeou de Balada del Riton (2009).
Este breve relato sobre a prática coral latino-americana, a partir da leitura do texto
de María Guinand incluído nesta importante obra recente sobre canto coral (DE
QUADROS, 2012) buscou, portanto, situar internacionalmente a atuação de Carlos
Alberto Pinto Fonseca, como introdução a este trabalho.
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Imagem disponível em https://debidomo.wordpress.com/2010/07/25/edificio-acaiaca-em-belo-horizonte/
Acessado em 03/08/2018 às 8:03.
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Pimenta a integrar-se à universidade como órgão promovedor de extensão cultural. Nessa
ocasião, o grupo teve seu nome alterado para Ars Nova, coral da UFMG, deixou de ter
vínculo com a União Estadual dos Estudantes e passou ser financiado pela universidade.
Uma vez parte da UFMG, passou a ser constituído por membros alunos e funcionários de
diversas áreas. Grande parte dos integrantes não dependiam da música como forma de
sustento, embora se dedicassem grandemente às atividades do coro e possuíssem
formação musical. Segundo informação verbal de Francisco Campos, os coralistas
recebiam da reitoria uma pequena bolsa para ajuda de custo em alimentação.
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Fonte: Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 3) Imagem obtida durante concerto em Arezzo, no Teatro
Petrarca no ano de 1973.
Uma das minhas grandes alegrias, durante os dias que passei em Belo –
Horizonte, foi ouvir “Ars Nova Coral”. Trata-se de um conjunto vocal de
primeira ordem, o melhor que já vi no Brasil, pela sua afinação, precisão rítmica
e perfeito equilíbrio dinâmico. Um coral somente consegue atingir este nível
quando tem à sua frente um regente com sensibilidade artística, competência e
bom gosto musical como é o maestro Carlos Alberto Pinto Fonseca. Minas está
de parabéns, por poder mostrar ao mundo que o Brasil não é só futebol.
(Retrospectiva de 15 anos, 1974, p. 2)
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Contou com o auxílio de agentes do Ministério da Cultura em suas viagens
internacionais. Segundo informações verbais cedidas por Francisco Campos em
entrevista, um funcionário do Ministério da Cultura acompanhou o coro em viagem para
a Suíça e Itália em 1973. Segundo o artigo de Chantal Santos (2017), o compositor
brasileiro Francisco Mignone teve relação bastante próxima com o coro Ars Nova,
chegando a compor peças especialmente para o grupo vocal, como Trem de Ferro (1973).
Há no artigo de Chantal, um relato de uma carta enviada a Fonseca por Mignone em 1976,
na ocasião da performance da sua composição Festa das Igrejas (1940).
Durante sua trajetória, o Ars Nova teve à sua frente regentes convidados. Segundo
listado na Retrospectiva de 15 anos (1974, p.5), de sua fundação até a publicação do
encarte, o coro havia sido regido por 5 convidados.
1962 – Carlos Alberto Pinto Fonseca. (primeiro contato de Fonseca com o coro)
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Segundo o encarte, durante os primeiros 15 anos, o Ars Nova contava, além dos
cantores, com um grupo de integrantes que se voluntariavam a formar um corpo
administrativo. Esse corpo era constituído por um diretor artístico, um diretor
administrativo, um secretário e um tesoureiro, além do regente titular. Mais tarde,
segundo informação verbal cedida em entrevista por Raphael Osório, o coro contaria
também com ensaiadores de naipe.
1968 – 1974 – Márcio José Velloso (em exercício na ocasião da produção do encarte)
O um dado importante na história do Ars Nova são as viagens realizadas pelo coro. Ao
longo dos 40 anos de titularidade de Fonseca o Ars Nova viajou para um grande número
de cidades brasileiras e estrangeiras. A Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 7 – 8) lista as
cidades brasileiras visitadas pelo coro de sua fundação até 1974. Durante os anos
seguintes o coro continuou realizando concertos fora de Belo Horizonte. As cidades
listadas no encarte são:
Minas Gerais: Belo – Horizonte, Alfenas, Lavras, Viçosa, Ouro Preto, São João Del Rey,
Sabará, Bom Jesus do Galho, Pedro Leopoldo, Uberaba, Uberlândia, Juiz de Fora,
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Governador Valadares, Montes Claros, Ouro Fino, Araxá, Caeté, Itajubá, Pará de Minas,
Ferros, Visconde do Rio Branco, Itabirito, João Monlevade, Ibirité.
São Paulo: São Paulo, São José dos Campos, São Caetano do Sul, Santo André.
Sergipe: Aracaju.
Goiás: Goiânia.
2.3.1. Argentina
2.3.2. Peru
2.3.3. Itália
2.3.4. França
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2.3.5. Suíça
• Flórida: Miami.
• Nova Iorque: Oneonta, Canton Latham (Albany), Nova Iorque.
• Capital Federal: Washington D.C.
• Connecticut: New Haven, New Britain.
• Pensilvânia: Newtown.
• Virginia: Bridgewater.
2.4. Repertório
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Mauduit, G. Nanino, Willaert, Phillipe de Monte, Othmayr, A. Banchieri, M. Pesenti, T.
Morley, J. Bennet, J. Farmer, J. Wilbye, T. Whythorne, T. Weelkes.
2.4.4. Barroco
2.4.5. Classicismo
2.4.6. Romantismo
2.4.7. Impressionismo
Debussy
2.4.8. Modernos
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maior parte dos compositores citados no encarte são pertencentes a períodos mais antigos
da história da música. Essa informação se relaciona com o fato de Fonseca possuir grande
domínio sobre a composição e regência da polifonia e contraponto, habilidade aprendida
com o educador musical alemão, Franz Joaquim Koelrreutter.
3. Formação e influências
Carlos Alberto Pinto Fonseca nasceu e cresceu em uma casa economicamente
e culturalmente favorecidas na cidade de Belo Horizonte. Foi o primeiro músico de uma
família que ocupava um importante lugar na sociedade da capital mineira durante o século
XX. Segundo Rize Matheus (2010, p. 17), Fonseca recebeu apoio de seus pais quando
decidiu trilhar a carreira de músico. Seu avô, Estevão Pinto, era um grande apreciador da
música erudita e proporcionou os primeiros contatos de Carlos Alberto Pinto Fonseca
com o estilo musical.
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Imagem extraída em Google Imagens.
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Soares e Fernando Coelho. Nesse período, que compreende a década de 40, Fonseca
compôs suas primeiras peças, que segundo Santos (2001 p.16), são O Pretinho Cantador
e O Soldadinho, ambas compostas em 1942.
Fonseca mudou-se de Minas Gerais para São Paulo no segundo semestre de 1954,
para estudar na Escola Livre de Música da Pró-Arte, como relata Chantal (2017). Foi
aluno dessa instituição até 1955, ano em que retornou à Bahia a fim de estudar nos
Seminários de Música da Universidade Federal da Bahia até 1960. Foi nesse período que
estudou com o educador musical alemão Hans-Joachim Koellreutter (1915 – 2005) em
ambas as instituições.
De acordo com Santos (2017) e Matheus (2010, p. 20) Fonseca residiu na Bahia
até completar o curso Seminários de Música da Universidade Federal da Bahia (UFBA)
e mudar-se para Hamburgo, iniciando o período internacional de seus estudos. Em
Hamburgo, durante o ano de 1960 Fonseca estudou regência orquestral com Hans
Schmidt – Isserstedt. Depois desse período, Fonseca mudou-se para Colônia, onde
continuou seus estudos de regência com Wolfgang Sawallisch. Também em Colônia, deu
continuidade aos seus estudos do instrumento piano com Neuhaus.
Após esse período, Fonseca realizou diversos cursos em países da Europa. Chantal
(2017), em seu artigo, lista todos os cursos e instituições em que Fonseca realizou algum
tipo de formação nessa época. Essa informação foi resultado de uma compilação de
documentos da época, informação fornecida pelo autor.
20
-Regência e Percussão em Musikhochschule, Hamburgo, 1962.
Fonseca dirigiu como regente titular outros dois grupos orquestrais: a Orquestra
Sinfônica de Minas Gerais e a Orquestra de Câmarado Modern American Institute.
Segundo Fernandes, à frente do primeiro, Fonseca iniciou suas atividades em 1981 e
realizou diversos repertórios. Fernandes cita em especial a execução do “Ciclo de
Beethoven”. Chantal (2001, p. 28) traz a informação de que Fonseca esteve à frente de
grupos como regente convidado em diversos estados do Brasil: São Paulo, Bahia, Rio
Grande do Sul, Distrito Federal e Rio de Janeiro. Angelo Fernandes (2004, p. 9) traz em
seu texto a informação de que Fonseca fundou, em Belo Horizonte, um grupo orquestral
chamado Orquestra de Câmara Villa – Lobos. Essa orquestra foi financiada pelo Modern
American Institute.
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mas sim uma escolha pessoal e possivelmente racional. Diversas foram as escolas e
influências que permearam Fonseca durante seu período de formação. Todas elas, capazes
de dotar o regente de capacidade para desenvolver uma carreira profissional. Entretanto,
em algum momento de sua vida, Fonseca deixou-se influenciar por uma ou outra escola
com a qual teve contato, construindo ao seu gosto ou oportunidade quem seria enquanto
profissional.
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Estudei com Celibidache, em Siena. Com Celibidache, aprendi a técnica que
possibilita tocar o coro como um instrumento. [...] Podemos desenhar toda a
melodia no ar. SANTOS (2001, p. 19) [...] E no momento em que eu deixo essa
linha significa que algo diferente está acontecendo. Refiro-me às figuras de
marcação dos compassos onde todos os pontos de inflexão situam-se na mesma
linha horizontal. Com isso, tenho a chance de criar no momento da execução.
[...] às vezes, durante a execução, sinto que o coro me segue, respondendo a esta
técnica, amando o que faz, e passando isso para o público também. O mais
importante na história do Ars Nova, é que muitas vezes fazemos com que o
público chore, o que para mim, é mais importante que o aplauso entusiástico,
porque comunicamos algo que emociona as pessoas. (SANTOS, 2001:19 )
Celibidache foi uma influência enorme. A técnica que eu desenvolvi com ele que
possibilita tocar o coro ou a orquestra como se fosse um instrumento eu devo a
ele. O conhecimento profundo das obras, inclusive da fenomenologia de música
que a gente teve com ele, é uma coisa assim inolvidável. (FONSECA, 2005)
apud (MATHEUS, 2010, p.23)
Qual o regente que não gostaria de possuir uma técnica do gesto tão
proporcionada à música que lhe permitisse, literalmente, “tocar” o coro como
um instrumento, capaz de segui-lo nas menores inflexões de sua interpretação da
peça executada? Pois essa técnica estará à disposição de quantos quiserem
construí-la, com dedicação diária e exercícios capazes de torna-la uma “segunda
natureza” nos braços e mãos de quem se dispuser a seguir o método que
aprendemos do grande Sergiu Celibidache. (FONSECA, 1999) apud
(MATHEUS, 2010: 24)
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Fonseca era adepto da mesma visão de Celibidache no que concerne ao respeito
pela partitura: cada mínimo detalhe tinha de ser ouvido, e, para tanto, tinha de
ser ensaiado à exaustão, até que todos os indivíduos participantes distinguissem
claramente todos os extratos da textura musical. Ouvir tudo, distintamente.
Assim, um enorme número de ensaios do mesmo programa era sempre muito
bem – vindo, mesmo tendo o Ars Nova larga experiência e experiência com
repertório realmente difícil. (COELHO, 2009, p.95)
Raphael Osório descreveu de forma bastante clara o gestual de regência que havia
na apostila usada por Fonseca durante suas aulas de regência. Segundo Raphael, essa era
também a forma como Fonseca regia o coro. Segundo ele, “ todas as figuras, binários,
ternários, mesmo em tempos compostos, eram feitas num plano horizontal... o primeiro
tempo no meio, o segundo, vai no centro do corpo, o terceiro, vai ao exterior, do lado de
fora e o quarto vai no meio. Pra levantar e ir pro primeiro de novo. Fica tipo uma cruz.
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No livro tinha até o desenho dos movimentos. Do primeiro para o segundo há um
movimento circular, do segundo para o terceiro, um grande movimento circular e um
pequeno movimento circular de volta que vai para o quarto para subir de novo... essa
técnica eu guardo até hoje” (informação verbal).
Esse gestual apresenta bastante semelhança com o que é proposto por Robert
Shaw e sua escola de regência. Segundo Raphael, a apostila compilada por Fonseca
apresentava todos os movimentos de regência desenhados, recurso também presente no
material de Robert Shaw. Por conta da impossibilidade de acesso a essa apostila, a
comparação com os desenhos impressos no livro de Shaw não foi possível.
Sendo assim, pode-se afirmar que Sergiu Celibidache foi uma grande influência
para Fonseca e plasmou grandemente sua forma de ensaio e de condução do som. Muitas
das práticas do regente mineiro refletem diretamente à técnica de Celibidache e o próprio
Fonseca confessa ter sido influenciado pelo regente romeno. No âmbito da análise, pode-
se perceber influências da Fenomenologia, proposta de análise musical embasada na
filosofia de Edmund Husserl no trabalho de Fonseca, mais uma das muitas evidências de
como Celibidache foi importante ao regente mineiro. Entretanto, a influência que Fonseca
recebeu de Robert Shaw não foi pouco significativa. Pode-se perceber que no tocante ao
gestual, Fonseca tinha grandes consonâncias com o proposto pela escola do regente
estadunidense.
25
O suporte ideal vem do senso de vitalidade
Suporte e controle respiratório inerente à menor partícula de tempo – musical
expresso no som.
Vibrato Permitido.
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propriedades das alturas relacionadas e
implementando outros elementos interpretativos
ao lugar de serem ouvidas por si só.
Tradução nossa
Sendo assim, torna-se possível afirmar que Sergiu Celibidache foi uma grande
influência para Fonseca e plasmou grandemente sua forma de ensaio e de condução do
som. Muitas das práticas do regente mineiro refletem diretamente à técnica de
Celibidache e o próprio Fonseca confessa ter sido influenciado pelo regente romeno. No
âmbito da análise, pode-se perceber influências da Fenomenologia, proposta de análise
musical embasada na filosofia de Edmund Husserl no trabalho de Fonseca, mais uma das
muitas evidências de como Celibidache foi importante ao regente mineiro. Entretanto, a
influência que Fonseca recebeu de Robert Shaw não foi pouco significativa. Pode-se
perceber que no tocante ao gestual, Fonseca tinha grandes consonâncias com o proposto
pela escola do regente estadunidense.
Não há, em nenhum material consultado, informações que levem à conclusão que,
na área da regência coral, Fonseca teve outra influência tão significativa quanto essas. De
certo, Koellreutter e Kurt Thomas também influenciaram grandemente Carlos Alberto,
assim como diversos outros professores com quem o regente mineiro teve contato ao
longo de sua vida. O acesso a informações sobre Kurt Thomas é restrito, o que dificulta
a obtenção de informações sobre o músico alemão. Seu estudo e possíveis relações com
a construção da formação de Carlos Alberto seguem como um tema a ser estudado.
Entretanto, a construção dos conhecimentos e prática de Fonseca enquanto regente
tiveram como principais influenciadores Sergiu Celibidache e Robert Shaw.
4.1. Fenomenologia
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conceito foi cunhado pelo filósofo Edmund Husserl. “A Fenomenologia é a ciência de
estudar a essência (o que é) através da análise do fenômeno (o que é perceptível)”
(MARIN, 2015, p.5). Segundo as palavras de Husserl:
28
p.14), se fundamenta na compreensão das tensões e relaxamentos presentes na peça em
dois sentidos: vertical (acordes) e horizontal (melodia). O regente que deseja analisar seu
repertório segundo a fenomenologia, deve, de acordo com Marín (2015, p. 17), encontrar
em primeira mão o clímax da peça, ponto de máxima tensão. Esse, segundo essa filosofia,
é o momento mais importante de toda a obra. Essa tensão é criada por quatro parâmetros:
1) ritmo, 2) harmonia, 3) melodia e 4) timbre. Segundo a autora, a segunda análise a ser
feita é encontrar as seções de extroversão (construção de tensão) e introversão
(diminuição da tensão). Após isso, Marín explica que o regente deve compreender as
subseções de tensão/relaxamento que estão presentes dentro das seções.
Em minha visão, música não é algo que possamos entender através de uma
definição baseada na linguagem convencional. Ela não se encaixa em nenhuma
forma de existência perceptível. Em outras palavras, música não é algo. Mesmo
assim, em certas circunstâncias, algo pode ser música. Isso é algo chamado som.
Por outro lado, som não é música, mas em certas condições pode se tornar
música. (MARIN, 2015, p.11, tradução nossa)
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pronúncia de cada palavra.” (informação verbal) Campos relata que Fonseca ensaiava o
coro com a obra analisada desde a leitura.
Ele já vinha com a peça entendida. E só passava: aqui eu quero isso, aqui eu
quero aquilo. Eu quero assim, quero assado. E muito muito muito detalhe. (...)
A gente nem tinha lido e ele queria trazer tudo.” (informação verbal)
Em sua entrevista, Campos informou que até mesmo quando Fonseca executava
a leitura de um repertório que outro regente iria apresentar, ele era minucioso e dirigia
igualmente o coro. Os coralistas, segundo informações obtidas por ambos os
entrevistados, tinham pouca ou nenhuma influência sobre o acabamento sonoro ou sobre
a forma como o regente queria trabalhar as nuances. Esse trabalho trouxe resultados
únicos à sonoridade do coro e à performance do repertório. Diversas fontes falam sobre
a sonoridade do Ars Nova, única no Brasil daquela época. Em entrevista cedida, Francisco
Campos relata:
O Ars Nova tinha em seu favor a sonoridade dele que era absurda. A afinação e
sonoridade do Ars Nova eram absurdas. Assim, os outros corais, era tudo médio
perto do nosso coro. Um coro amador ter aquele som? E Carlos Alberto levava
as nuances às últimas consequências. (informação verbal)
Carlos Alberto Pinto Fonseca era reconhecido por seu singular ferramental de
regência. O regente mineiro construiu a partir de suas influências uma abordagem nova
quanto à análise musical, ensaio, trabalho fonético e gestual de regência. Embora Fonseca
tenha realizado apresentações regendo orquestras, quase a totalidade de sua carreira foi
dedicada à regência coral. Fonseca desenvolveu-se frente ao Ars Nova, coral da UFMG,
coro do qual foi regente titular durante 40 anos.
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Esse capítulo busca relatar os procedimentos básicos que constituíam o ferramental
técnico de regência de Fonseca. Para que a leitura seja facilitada, esse capítulo divide os
procedimentos em áreas que compõem o ferramental técnico de Fonseca.
5.1. Gestual
5.1. Gestual
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levantar e ir pro primeiro de novo. Fica tipo uma cruz. No livro (1) tinha até o
desenho dos movimentos. Do primeiro para o segundo há um movimento
circular, do segundo para o terceiro, um grande movimento circular e um
pequeno movimento circular de volta que vai para o quarto para subir de novo.
Essa técnica eu guardo até hoje. (informação verbal)
Para poder reger nesse campo horizontal imaginário, você tem que ter o braço
esticado. E, desse braço esticado, você dá os movimentos. Se você estiver com
o braço muito perto do corpo, os movimentos são menos claros pois se misturam
com os movimentos do cotovelo. Com essa técnica do braço, quando se faz essa
figura, não se movimenta quase o antebraço. O gesto é bem mais claro. Se for
fazendo gestos muito próximos, o cotovelo já entra no meio. Para uma orquestra,
isso é catastrófico. Fica com o movimento do braço, do antebraço e cria uma
mistura danada. Com o gesto do Carlos Alberto, dá para fazer as nuances, mais
piano, mais forte. O plano de base fica ao horizonte, mas a uma certa distância
do corpo. Inclusive, uma exigência de Carlos Alberto, se for fazer piano, você
faz aproximando do corpo. Se for fazer forte, se faz afastando do corpo.
(informação verbal)
32
passavam a indicar contornos melódicos. Essa regência é muito mais horizontal que
vertical, ideal para repertórios compostos com pensamento contrapontístico.
5.2. Motivação
1
Esse trocadilho faz referência à sonoridade desejada por Fonseca para a vogal I.
33
5.3. Roteiro de ensaio
Esse tópico procura compreender de que forma Fonseca organizava seu tempo à
frente do coro. O roteiro de ensaio e a organização do tempo são importantes ferramentas
na regência coral, otimizando o tempo de ensaio.
5.3.1. Aquecimento
34
5.3.2.1 Repertório novo
35
5.3.2.2. Refinamento de repertório
Angelo Fernandes, ex-aluno de Carlos Alberto, diz a Coelho (2009, p. 73) que o
regente mineiro deixava para o final do ensaio a execução do repertório assimilado.
Segundo o Fernandes, a leitura e execução de repertório assimilado é uma atividade
prazerosa. Quando o repertório está maturado e tem suas nuances trabalhadas, executá-lo
torna-se realmente fazer música. Terminar o ensaio com uma peça madura traz uma boa
sensação e confere motivação aos coralistas. Segundo Fernandes, cantar o repertório
assimilado exige um nível de aquecimento que o coro só alcança após algum tempo
cantado. Ao início do ensaio, o coro não tem aquecimento para realizar uma peça com
perfeição. As leituras das peças assimiladas aconteciam da capo al fine. Caso houvesse
algum problema durante a execução, a peça seria trabalhada na seção de aprimoramento
do ensaio seguinte.
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É importante que o coro tenha contato esporádico com uma obra do repertório
assimilado. Fonseca exigia do coro um grande detalhamento e equilíbrio. Ensaiar esse
repertório prevenia que o coro perdesse a habilidade vocal e musical necessária para a
execução de uma obra. Fonseca era muito meticuloso no equilíbrio entre as vozes e em
manter a identidade sonora do Ars Nova. A fim de que o nível de qualidade musical fosse
mantido, o repertório não poderia ficar adormecido por grandes períodos.
Quanto a apoio e respiração, por serem aspectos básicos do canto, Fonseca apenas
direcionava a prática dos cantores ao resultado que buscava. O aprendizado da técnica de
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canto era uma atividade confiada ao coralista. Coelho relata que caso algum cantor
apresentasse deficiência técnica ou destoasse do equilíbrio timbrístico do coro, esse seria
convidado por Fonseca afazer aulas de canto. Coelho relata que “para transmitir a
mensagem (indicações de apoio), apenas dizia com ênfase a palavra apoio, sem maiores
explicações.” (COELHO, 2009, p. 87). O autor diz que Fonseca se preocupava muito em
desenvolver no coro uma eficiente respiração coral. O autor especifica que Fonseca não
utilizava esse recurso apenas para criar um fluxo contínuo de som. Ele diz: “Não apenas
onde fosse estritamente necessário, devido a uma frase longa, mas também ligando as
frases umas às outras, principalmente em obras pouco ritmadas.” (COELHO, 2009, p. 87)
Segundo relato de Coelho, os cantores eram orientados por Fonseca a respirar sempre na
última sílaba da palavra e voltar a cantar na primeira sílaba da palavra seguinte. Segundo
o autor, em alguns repertórios específicos, Fonseca apontava onde o coro deveria respirar.
Segundo Coelho, (2009, p. 64) o Ars Nova contou com um preparador vocal, que
auxiliava na construção da sonoridade em a superar dificuldades técnicas.
Segundo Coelho (2009, p. 27), a impostação vocal era outro pilar da unificação
da sonoridade do Ars Nova. Angelo Fernandes relata que Fonseca recomendava que seus
cantores utilizassem “impostação facial da voz e na cobertura da região aguda.”
(FERNANDES, 2005; 69) A sonoridade dos graves, segundo relato do autor, era formada
pela ressonância dos espaços localizados ao fundo da boca. Segundo Fernandes, Fonseca
pedia que os cantores direcionassem sua voz contra o palato duro, o que, segundo o autor,
garante uma sonoridade mais brilhante, independente da dinâmica.
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autor, Fonseca retirava vagarosamente do bolso uma pena ou linha e a deixava cair no
chão, tendo-a soltado em altura acima de sua cabeça. Segundo um entrevistado de Coelho,
o regente dizia: “Então, gente, é esse o piano que eu quero.” (COELHO, 2009; 89)
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criar maior precisão rítmica, Fonseca convidava os cantores a cantarem o repertório com
fonemas escolhidos por ele ou com o texto original da peça, mas de forma portato ou
staccato. Em peças de forte caráter rítmico, segundo o Willsterman Coelho, Carlos
Alberto pedia que os coralistas cantassem “Como se não tivesse vogais, como se tivesse
só as consoantes.” (COELHO, 2009; 86) Para que os cantores não alongassem a duração
das notas, Fonseca fazia uma analogia que Coelho relata em seu texto: “Molhou o dedo,
colocou no ferro [quente], acabou. Ninguém segura o dedo lá no ferro.” (COELHO, 2009,
p. 83) A fim de exercitar o caráter melódico de algumas peças, Coelho relata que Fonseca
indicava ao coro cantar o repertório, mas somente os sons das vogais do texto. Segundo
Coelho, Fonseca procurava que o exercício resultasse em um grande melisma.
Segundo Coelho, a fonética era uma das principais preocupações de Fonseca. Ex-
alunos entrevistados por Coelho, trazem a informação de que Fonseca “...era
extremamente cuidadoso para que todo o texto fosse entendido pelo público falante do
idioma.” (COELHO, 2009, p. 81). O trabalho fonético que Fonseca realizava no coro Ars
Nova não era somente um trabalho de interpretação. O que conferia ao trabalho maior
sucesso, era o equilíbrio entre todos os fonemas. como Willsterman Coelho relata:
40
fonemas, Fonseca modificava algumas sílabas adicionando ou subtraindo algum fonema
para que outro ganhasse mais destaque. Para que os cantores se lembrassem dessas
alterações, Fonseca fazia trocadilhos que remetessem ao som desejado pelo regente no
fonema.
Fonseca se atentava às consonantes fricativas mudas, tal como |f| e |s|. Segundo
Coelho, a sonoridade dessas consoantes é “...brilhante, pois produz frequências muito
agudas, muito acima dos registros da voz humana, e por isso, pode ser ouvido com
facilidade num contexto de música coral.” (COELHO, 2009, p. 82). Coelho relata que a
fim de que as consoantes |l|, |m| e |n| não fossem encobertas pelos outros fonemas, Fonseca
pedia aos cantores que adicionassem uma vogal neutra à essa consoante. Segundo o autor,
o Shwa era utilizado, algo entre a sonoridade dos fonemas |ê| e |á|. Coelho relata que esse
procedimento também era aplicado na ocasião de encontros consonantais onde uma
consonante de menor intensidade sonora antecede uma de maior intensidade.
Em notas muito agudas, Carlos Alberto substituía o fonema |g| por |k| segundo
relato de Coelho. O autor dá o exemplo da palavra latina gratia, que nessa situação, seria
pronunciada |kratia|. Esse mesmo procedimento poderia ser aplicado com a consonante
|b|, que seria substituída por |p| e por |d| que seria substituída por |t|. A fim de evitar
“golpes” na passagem do fonema |p| para a vogal, Coelho informa que Fonseca
recomendava a inserção de um pequeno |f| antes do |p|, de forma que o ataque fosse
suavizado e permitisse mais precisão. O mesmo, segundo o autor, pode ser aplicado com
os fonemas |t| e |k|, onde um fonema fricativo poderia ser inserido de forma discreta antes
da vogal.
Willsterman Coelho (2009, p. 84) relata que para Fonseca o fonema |r| deveria ser
sempre alveolar quando em idioma estrangeiro. Coelho diz em seu texto que a escolha de
usar o |r| velar quando em português brasileiro era uma escolha interpretativa que
resultava em padronização de sonoridade, e não somente uma escolha de dicção. Coelho
obteve acesso a materiais fonográficos raros do coro Ars Nova. Comparando gravações,
o autor percebeu que durante as décadas à frente do coro, Fonseca teve opiniões diversas
sobre o |r| velar e alveolar. Hora tendendo a um em todas as ocasiões, hora modificando
sua característica sonora de acordo com o repertório. A fim de que o público ouvisse uma
articulação melhor definida nas apresentações, Willsterman Coelho (2009, p. 86) relata
que Fonseca pedia a um ou dois coralistas para que cantassem um |l| em todas as
mudanças de notas, enquanto os outros integrantes cantam o texto original. Coelho (2009,
41
p. 88) relata que Fonseca, em determinadas ocasiões, recomendava que os cantores
modificassem a cor de uma vogal específica. Algumas vezes, especificava exatamente
como queria a sonoridade daquela sílaba. Segundo o autor, se houvesse um cantor
destoando em relação ao grupo, Fonseca faria recomendações para aquele cantor em
específico.
42
Através de informações verbais colhidas nas entrevistas realizadas com os ex-
alunos Raphael Leite Osório e Francisco Campos Neto foi possível mapear as
características da prova de seleção de novos cantores do Ars Nova. Ambos os
entrevistados fizeram considerações sobre essa seleção e ambos ressaltaram as
dificuldades do processo de seleção. Segundo informações verbais cedidas pelos
entrevistados, os integrantes do Ars Nova deveriam se encaixar a um perfil de sonoridade
muito particular e característica, elemento identitário do grupo. Caso o cantor não se
encaixasse, ele ou não seria aceito ou seria recomendado a procurar aulas de canto.
Raphael Osório fala acerca das habilidades musicais que os candidatos deveriam ter para
ter bom resultado na seleção. “Imagino que ele escolhia os coristas pela diversidade. Se
não fosse leitor de música, tinha uma voz mais interessante” (informação verbal) Esse
relato possibilita compreender que leitura musical não era uma obrigatoriedade.
Era uma banca. Carlos Alberto, Angela, obviamente e as vezes o Ming Feres,
que era nosso amigo e foi aluno da frauline Vinterfeldt, foi meu professor
também. Às vezes a mim e uns três ou quatro do coro. Isso, formando a banca.
Aí, o candidato entrava para cantar. Tinha a leitura a primeira vista e canto.
Depois, na sala do coro propriamente dita, o coro estava lá. O candidato ia à sala
do coro para entrevista. A entrevista era com os colegas. Não era formal. Na sala,
todo mundo sentado. Perguntava-se o que faz, estuda, essas coisas. Cada um
perguntava uma coisa. Não tinha nada arrumado, não. Aí, aprovado lá e cá,
entrava. Recebia uma pasta com partituras dos próximos dois meses.
(informação verbal)
43
Era um júri, e esse júri que decidia quem passava ou não para o coro. Inclusive,
quando passei, tinha passado como suplente. Na época, era uma prática. Tinham
os que passavam efetivamente, e os como eu. Quando passei, tinha uma vaga
para tenor e seis meses adiante, teria uma viagem para a Europa. Um corista
antigo do Ars Nova ganhou esse concurso que prestei. Ele ganhou a vaga e eu
fiquei como suplente. Três meses depois, teve um corista que teve uma
iluminação e se mudou para um monastério no Rio de Janeiro e liberou a vaga.
No lance eu acabei ganhando a vaga e a viagem à Europa. (informação
verbal)
Raphael relata que todo o curso era ministrado tendo como guia uma apostila.
Segundo ele, esse material apresentava um gestual de regência bastante específico,
propondo a marcação de tempos posicionados no espaço, orientados por um plano
horizontal. Segundo o entrevistado, esse livro era de autoria do educador alemão Joaquim
Koellreutter. “Do Koellreutter, eu lembro que tinha um livro que não existe mais.
Fotocopiei o livro inteiro de regência coral. Nesse livro, tinha um gesto bem específico”.
(informação verbal) Essa informação contrasta com o que dizem Santos (2001) (2017) e
44
Coelho (2009). Pelo que se sabe, Koellheutter não produziu nenhum material de regência
em seus anos de atividade.
6. Fonseca compositor
Enquanto compositor, Carlos Alberto Pinto Fonseca deixou uma produção que
totaliza 169 obras, como afirma Cristina Yollanda Gallo. Em sua tese de mestrado,
Elementos umbanda y candomblé en la obra para coro mixto ―a capella compuesta por
Carlos Alberto Pinto Fonseca. Aportes para su interpretación, Cristina Gallo identifica
as obras de Fonseca por forma e instrumentação:
Lá se observa que, das 169 obras compostas e arranjadas por Fonseca, 53 foram
compostas para coro misto a capela, 40 são arranjos para coro misto, 33
compostas para coro infantil e 7 são arranjos para a mesma formação coral.
Compôs 17 obras para canto e piano. Quanto às obras instrumentais, 9 são para
piano e 2 para guitarra. A produção de música de câmara é constituída por 3
obras para canto, piano e flauta. 1 para orquestra de cordas, 2 para quarteto de
cordas, 1 para 3 vozes e percussão y outra para 11 vozes, soprano solista,
platillos, bumbo, tantã e piano. (GALLO, 2011, p. 32)
Segundo Gallo, as composições para coro a capela, canto e piano, violão solo,
piano e flauta, canto solo, e coro acompanhado com outras instrumentações, constitui a
maior parte da herança de Carlos Alberto enquanto compositor.
45
Drummond de Andrade enviou a Fonseca parabenizando-o, na ocasião da composição de
O Poema da Purificação (1974), que utiliza como texto versos do poeta.
Você me proporcionou uma alegria muito especial com sua composição e sua
carta. Aquele poeminha de purificação ficou sendo um resíduo mais ou menos
esquecido de minha mocidade, com seus problemas e angústias. E você pegou
dessa peça quase arqueológica e edificou sobre ela uma pura e comovedora obra
musical, de alta categoria. Sua carta, igualmente, é daqueles testemunhos que
melhor espelham o artista e o homem, tão criativo aquele, e tão correto este...
(SANTOS 2001: 39)
Muito notórias entre suas composições, Fonseca produziu uma série de 16 obras
influenciadas pela música feita nos terreiros de Umbanda e Candomblé. Santos apresenta
em seu texto um trecho de entrevista cedida por Fonseca onde o regente mineiro explica
o início de seu interesse em compor música com influência afro-brasileira:
O livro citado por Fonseca foi publicado no ano 1962 pela Editora Eco. Lucas
Vilalta, Filósofo e umbandista consultado, reconheceu essa publicação como um catálogo
de pontos cantados, textos de orações escritas para serem cantadas durante as giras do
terreiro. Algumas das letras contidas no livro eram utilizadas no terreiro frequentado por
Vilalta. No capítulo Introdução do livro 400 pontos cantados riscados de Umbanda e
Candomblé, José Ribeiro de Souza explica a funcionalidade do ponto cantado dentro do
ritual da Umbanda utilizando um trecho do livro de seu confrade José Antônio Barbosa,
Manual dos chefes de terreiros:
46
estamos a rezar cantando, chamamos assim nossos guias as falanges protetoras
que devem assistir o ritual. (...) os pontos cantados apresentam a alta vibração da
nossa Umbanda. É com eles que as falanges vêm se comunicar conosco na terra,
e suavizar os nossos sofrimentos através de seus sábios conselhos. (400 Pontos
Cantados Riscados de Umbanda e Candomblé, s/n)
47
as seguintes palavras de Fonseca: “Minhas experiências vão da música impressionista ao
dodecafonismo.” (SANTOS, 2001, p. 29)
Santos, em seu texto, relata uma fala do regente Sergio Magnani onde ele faz
considerações sobre a atuação de Fonseca enquanto compositor: “Um compositor
brasileiro que não se afasta das origens da musicalidade brasileira, embora tendo
experimentado, e valiosamente, as linguagens contemporâneas.” (SANTOS 2001, p. 29)
Raphael Osório em entrevista cedida, fez considerações sobre o tratamento de vozes nas
composições de Fonseca. Segundo o ex – aluno:
Ele (Fonseca) tinha uma grande preocupação com as diferentes vozes da peça.
Se preocupava que todos os motivos fossem ouvidos. Sobre o tratamento de
vozes na composição de Fonseca, Raphael Osório disse em entrevista cedida:
“...Tudo o que ele compunha, tinha sempre uma voz que destacava da outra. A
polifonia dele era sempre muito clara. Ele nunca privilegiava só uma voz. [...]
percebemos que o importante para se obter este resultado é ressaltar as vozes que
estão com a melodia, não deixando apenas o soprano se sobressair, como em
muitos arranjos existentes. (informação oral)
Cristina Gallo (2011, p. 42) contabilizou em sua dissertação 16 composições para coro
misto a capella com temática afro-brasileira. Essas peças retratam em suas rítmicas e
textos características da música feita em terreiros de Umbanda e Candomblé. Grande
48
parte dos textos utilizados nessas composições foi retirado do livro 400 Pontos Cantados
Riscados de Umbanda e Candomblé (1962). Segundo a autora, essas composições são:
4) Jubiabá (1973)
9) Inhãçã (1988)
15) Orixás
Segundo Cristina Gallo (2011, p. 42), as últimas 4 composições listadas tiveram suas
partituras perdidas. Gallo informa em seu texto que Ponto de Caboclo da Falange de
Oxóssi (1997) foi publicada pelo XVIII Festival Internacional de Coros, em Porto Alegre,
como recompensa por ter sido escolhida como composição vencedora do festival.
Entretanto, até a conclusão de sua tese, a pesquisadora não a havia encontrado e a família
não a tem em sua posse.
49
tambores aos quais Fonseca faz referência são os atabaques. Segundo informações verbais
colhidas em entrevista com Lucas Vilalta, existem três tipos de atabaques: Rum, Rumpí e
Lé. O Rum é o mais grave e mais importante dos atabaques. Nele, se orienta o passo do
Orixá.
Mas em fim, cada atabaque tem uma função também, e dependendo do ritmo, essas
funções mudam. Normalmente que dobra, varia é o Rum, que é o grande, o grave. Esse
deslocamento de tempo no grave é algo muito interessante, porque ele convida o paço do
orixá a se deslocar. Mais uma vez, desloca a marcação fazendo orixá não dançar no ritmo
marcado, mas dança no que o Rum está fazendo. Um bom Ogã Alabê vai saber os
momentos certos em cada cantiga que dobrar, acelerar, diminuir, parar; as vezes de olhar
para o orixá ele percebe o que o orixá está pedindo. Se ele dobra numas partes que não
tem nada a ver o orixá vai parar e não vai dançar. Pode-se improvisar e variar muito, mas
isso dentro da função ritual. (informação oral)
Onomatopeias que remetem ao som do instrumento retratado por cada voz constituem
a letra em uma seção da obra. O restante do texto, foi retirado do romance de Jorge
Amado. Em Jubiabá (1973), Fonseca retrata musicalmente uma Xirê ou Gira, ritual da
Umbanda. A gira é o momento onde os humanos se comunicam com os orixás. Há na
obra a parte B, onde o compositor retrata os sons do momento em que a mãe e pai de
santo recebem seus Orixás no Xirê. Segundo Chantal Santos, o compositor desejava com
isso criar uma atmosfera que ilustrasse trecho do enredo do livro homônimo de Jorge
Amado.
50
6.4. Obra de Fonseca nos dias de hoje
Chantal Santos (2001, p. 40) apresenta em Carlos Alberto Pinto Fonseca: dados
biográficos e catálogo de obras uma lista das peças que se encontram publicadas.
Segundo o autor, elas são:
5) Seven Brazilian Etudes (1978). Editadas pela Columbia Music Co. Estados
Unidos.
51
7) Pontos de Caboclo da Falange de Oxóssi (1997). Editada pelo Segundo
Concurso de Composições de Canto Coral João de Souza Ribeiro. Premiação de terceiro
lugar. Brasil.
Santos (2001, p. 42 – 43) traz em seu texto uma lista de composições e arranjos
de Fonseca que se encontram disponíveis em gravação. Segundo o autor, elas são:
7) Haec Dies, Cântico para Iemanjá, Jubiabá e arranjos Minha Ciranda, É a Ti Flor
do Céu. (1993) Disponível na fita – cassete Ars Nova na Europa. Contém
gravações realizadas no Concurso de Marktoberdorf (1991) e no Concurso Guido
D’Arezzo (1993)
8) Cobra Corá (1999). Disponível no DC Pelos Quatro Cantos do Brasil, de autoria
do Coral BDMG. A gravação não é regida por Fonseca.
9) Jubiabá, Cântico para Iemanjá, Xirê Ogum, Trenzinho e os arranjos É a Ti Flor
do Céu, Muié Rendera (1999). Disponível no CD Antologia, gravado em
comemoração aos 40 anos do Ars Nova, coral da UFMG.
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trabalho, Profa. Dra. Susana Cecília Iagayara – Souza e do Prof. Dr. Marco Antônio
da Silva Ramos.
7. Conclusão
Grande parte dos registros disponíveis sobre as práticas do regente mineiro foram
produzidos por ex-alunos ou ex-integrantes do Ars Nova, coral da UFMG. Poucas são as
publicações produzidas por Fonseca e o acesso a esse material é bastante restrito.
Tomando como base todo o material colhido durante a elaboração desse trabalho, não é
possível afirmar a criação de uma escola de regência brasileira por parte de Fonseca.
Entretanto, seu legado é notório. A utilização do gestual que toma como base o plano
horizontal e a utilização da fenomenologia como método de análise formal são práticas
pouco comuns entre os regentes brasileiros até os dias de hoje.
8. Referências
BLOCKER, Robert (ed). The Robert Shaw Reader. New Haven & London: Yale
University Press, 2004.
53
BOWEN, Antonio (ed). The Cambridge Companion to Conducting. Cambridge:
Cambridge University Press, 2003.
DECKER, Harold A.; HERFORD, Julius. Choral Conducting Symposium. 2nd Edition.
New Jersey: Prentice Hall, 1988.
GUINAND, Maria. A hundred years of choral music in Latin America 1908–2008. The
Cambridge Companion To Choral Music, p. 130-148, 2012.
MARIN, Lucia. Basic fundamentals of phenomenology of music by Sergiu Celibidache
as criteria for the orchestra conductor. 31p. Tese (Doutorado em Música). University of
Kentucky, Lexington, 2015.
MATHEUS, Rize Lorentz. Elementos Impressionistas na obra composicional de Carlos
Alberto Pinto Fonseca. 100p. Dissertação (Mestrado em Música). Escola de Música da
UGMG, Belo Horizonte, 2010.
OLIVEIRA, Carolina Andrade. O regente-arranjador e a circulação do repertório de
arranjos nos coros brasileiros. 194 p. Dissertação (D em Música). Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2017.
SANTOS, Mauro Camilo de Chantal. Carlos Alberto Pinto Fonseca: dados biográficos
e catálogo de obras. 80p. Dissertação (Mestrado em Música). Escola de Música da
UFMG, Belo Horizonte, 2001.
54
STRIMPLE, Nick. Choral music in the twentieth century. Amadeus Press, 2005.
Livros
GILIOLI, Renato de Sousa Porto. Representações do negro no modernismo brasileiro:
artes plásticas e música. São Paulo: Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo/
Best Books, 2008. p. 129-164.
Entrevistas
FONSECA, Carlos Alberto Pinto. Belo Horizonte: 2005. Entrevista concedida a Heloísa
Greco e Shirley Ferreira para a pesquisa “Memória da Música Erudita em Belo
Horizonte” desenvolvida pela coordenação de Projetos e Pesquisa – CRAV/FMC/PHB).
JACOE, Caio Arcolini. Entrevista de Francisco Campos Neto em 10/05/2018. São Paulo.
Registro de informação verbal.
JACOE, Caio Arcolini. Entrevista de Raphael Leite Osório em 20/02/2018. Via Skype.
Registro de informação verbal. /JACOE
JACOE, Caio Arcolini. Entrevista de Lucas Vilalta em 06/08/2017. São Paulo. Registro
de informação verbal.
Notas:
¹ Duas publicações de Mauro Chantal Santos foram utilizadas na elaboração desse
trabalho. Em sua dissertação de mestrado (2001), o sobrenome Santos é utilizado. Em seu
artigo (2017), o autor utiliza o sobrenome Chantal.
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