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Relatório Científico de Progresso

Carlos Alberto Pinto Fonseca (1933 – 2006):


investigando o desenvolvimento de uma escola de
regência brasileira.

Graduação: Licenciatura em Música


Bolsista: Caio Arcolini Jacoe
Data de início da bolsa: agosto/ 2017
Orientadora: Profa. Dra. Susana Cecília Igayara-Souza

Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo

São Paulo, 2018

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Agradecimentos:
Agradeço primeiramente meus pais e família por todo apoio e dedicação.
Agradeço minha orientadora Susana Cecília Igayara – Souza pelos 18 meses de trabalho
intenso. Agradeço imensamente a atenção, disponibilidade e a preciosa contribuição dos
entrevistados: Francisco Campos Neto, Raphael Leite Osório, Lucas Paolo Vilalta.
Agradeço também à FAPESP pelo apoio financeiro.

Dedicatória:
Dedico esse trabalho à memória do regente e compositor Carlos Alberto Pinto
Fonseca, importante figura no universo coral do século XX e na minha trajetória enquanto
músico e cantor. Dedico esse trabalho também a todas e todos os Orixás homenageados
nas obras abordadas. Que o Brasil para sempre seja terra onde dançam os Orixás.

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ÍNDICE

1. TRADIÇÃO CORAL NA AMÉRICA LATINA ....................................... 09

2. HISTÓRIA DO ARS NOVA ........................................................................ 13


2.1 Direção administrativa e cultural ........................................................... 14
2.2 Localidades brasileiras onde o Ars Nova realizou concertos ............... 15
2.3 Localidades estrangeiras onde o Ars Nova realizou concertos ............ 15
2.3.1 Argentina ................................................................................................ 15
2.3.2 Peru ......................................................................................................... 15
2.3.3 Itália ........................................................................................................ 15
2.3.4 França ..................................................................................................... 16
2.3.5 Suíça ........................................................................................................ 16
2.3.6 Estados Unidos ................................................................................ 16
2.4 Repertório .................................................................................................. 16
2.4.1 Idade Média ............................................................................................ 16
2.4.2 Renascença Religiosa ............................................................................. 16
2.4.3 Renascença Profana ............................................................................... 16
2.4.4 Barroco .................................................................................................... 17
2.4.5 Classicismo .............................................................................................. 17
2.4.6 Romantismo ............................................................................................ 17
2.4.7 Impressionismo ....................................................................................... 17
2.4.8 Modernismo ............................................................................................. 17
2.4.9 Composições e arranjos de folclore brasileiro ...................................... 17
2.4.10 Folclore internacional ............................................................................. 17

3. FORMAÇÃO E INFLUÊNCIAS ................................................................. 18

4. ROBERT SHAW, CELIBIDACHE E A FENOMENOLOGIA ................ 22


4.1 Fenomenologia ........................................................................................... 27

5. REGÊNCIA E ORGANIZAÇÃO DO ARS NOVA .................................... 30


5.1 Gestual ........................................................................................................ 31
5.2 Motivação do coro ..................................................................................... 33
5.3 Roteiro de ensaio ....................................................................................... 34
5.3.1 Aquecimento ........................................................................................... 34
5.3.2 Montagem de repertório ........................................................................ 34
5.3.2.1 Repertório novo ........................................................................................... 34
5.3.2.2 Refinamento de repertório ......................................................................... 35
5.3.2.3 Repertório assimilado ................................................................................. 36
5.4 Técnica de canto ........................................................................................ 37
5.5 Exercícios e dinâmicas aplicadas ao coro ............................................... 39
5.6 Trabalho fonético ...................................................................................... 40

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5.7 Postura em apresentações ....................................................................... 42
5.8 Seleção de novos cantores ....................................................................... 42
5.9 Curso de regência para auxiliares do coro ............................................ 44

6. FONSECA COMO COMPOSITOR ........................................................... 45


6.1 Fonseca, Umbanda e Candomblé ............................................................ 46
6.2 Estilos e processos composicionais .......................................................... 47
6.3 Obras afro – brasileiras para coro a capella .......................................... 48
6.4 Obra de Fonseca nos dias de hoje ........................................................... 51
6.4.1 Obras publicadas ................................................................................... 51
6.4.2 Obras gravadas ...................................................................................... 52

7. CONCLUSÃO ............................................................................................... 53

8. BIBLIOGRAFIA ........................................................................................... 53

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1. Tradição coral na América Latina
A fim de compreender o desenvolvimento da prática coral na américa latina e no
Brasil durante o século XX, o artigo de Maria Guinand A Hundred Years of Choral
Tradition in Latin America 1908 – 2008 foi consultado. Este artigo desponta como
importante literatura de circulação internacional que trata sobre o tema. Embora apresente
lacunas e informações superficiais acerca das trajetórias de importantes nomes da história
da música latino-americana, a utilização desse material se faz importante. Por meio desse
artigo, o leitor pode compreender a forma como as trajetórias desses nomes é estudada
por autores internacionais e a visibilidade que recebem no cenário da pesquisa musical
no estrangeiro.

Em seu artigo María Guinand informa que a prática da música coral não é uma
atividade característica das culturas nativas da América Latina. A música coral veio ao
continente por intermédio das missões colonizadoras enviadas pelo reino espanhol.
Guinand (2012, p. 130) relata que as catedrais atuavam como provedora da música coral,
oferecendo cursos e grupos vocais onde os fiéis poderiam aprimorar o canto e outras
habilidades musicais. A música era parte importante das festas religiosas e missas. No
Brasil, as festas e eventos religiosos do período colonial criaram um ambiente próspero
para músicos, especialmente ao redor da região mineradora. Os frequentes eventos
organizados pelas irmandades proporcionavam sustento a muitos grupos corais,
instrumentistas e compositores. Segundo Guinand (2012, p. 130), na américa espanhola,
o vilancico e outros ritmos espanhóis foram utilizado como diretrizes para a produção
musical colonial, sendo incorporados nas tradições musicais locais.

A música coral, importada pelos missionários, teve no primeiro momento uma


função social: ensinar os valores católicos aos nativos e servir como meio de
comunicação. Mesmo que não falassem a mesma língua, colonos e nativos poderiam se
comunicar pela música, inteligível às duas culturas. Segundo Guinand (2012, p. 130), os
estilos de música europeus foram impostos pelos colonos aos nativos e esses foram
educados a apreciar canto gregoriano e, mais tarde, a polifonia. Guinand (2012, p. 131)
relata que duas instituições se estabeleceram como referência no estudo e prática da
música coral: a Escola Mineira e a Escola Chacaro. Segundo Guinand, a Escola Mineira
produziu principalmente música barroca e era constituída por artistas mulatos. A Escola
Chacaro apresentava diferenças em relação as práticas da Escola Mineira, especialmente

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quanto ao acompanhamento instrumental. Chacaro teve uma pequena prática de música
secular.

No Brasil Imperial, a ópera e o melodrama se desenvolvem e sociedades


filarmônicas são fundadas. Guinand (2012, p. 132) relata que a presença de
instrumentistas renomados no Brasil dessa época ampliou o contato do brasileiro com o
repertório europeu. Compositores brasileiros passaram a compor segundo outros estilos
da música erudita: a música sinfônica, música coral e música de câmara. Buenos Aires
durante o século XIX assistiu uma enorme produção de óperas. A cidade contava com 8
teatros, como relata Guinand (2012, p. 132). Segundo a autora, na época haviam casas de
ópera na cidade que estreavam 30 óperas ao ano.

Guinand (2012, p. 132) lista os ritmos mais praticados em alguns países da


américa latina no século XIX: em Cuba, a habanera, a valsa na Venezuela, o candomblé
no Uruguai e a zamba na Argentina. No Brasil, a modinha era o ritmo mais praticado.
Segundo Guinand (2012, p. 133), a maior parte das composições latino - americanas até
a virada do século seguiam os estilos musicais italiano, francês e espanhol.

No século XX, segundo Guinand (2012, p. 133), há um ressurgimento da música


coral na América Latina. O crescimento do pensamento nacionalista na política de
diversos países do continente e a pesquisa etno-musicológica influenciam compositores
a criarem um novo repertório coral. Guinand (2012, p. 134) relata que a música
nacionalista do primeiro quarto do século XX foi grandemente influenciada pela forma
como compositores românticos do leste europeu procuraram retratar o folclore de seus
países em suas composições. No Brasil, o ressurgimento da prática coral no século XX
encontra próspero ambiente para se desenvolver.

Segundo relato de Guinand (2012, p. 135), as primeiras cidades brasileiras que


apresentam produção de música coral de caráter nacionalista foram: São Paulo, Salvador,
Curitiba, Rio de Janeiro, Recife e Belo Horizonte. Para Guinand (2012, p. 136), o projeto
de pesquisa musical desempenhado por Heitor Villa-Lobos (1887 – 1959) e Mário de
Andrade foram de enorme importância para a construção da música nacional. Segundo a
autora, a pesquisa de Villa-Lobos não teve cunho musicológico. Para Guinand (2012, p.
136), a obra de Villa-Lobos procurou expressar o modernismo, que buscava produzir uma
linguagem nacional e, ao mesmo tempo, universal. Segundo a autora Villa-Lobos buscou

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produzir uma estética musical que retratasse todas as manifestações artísticas brasileiras
de forma a ser compreensível a ouvintes de todas as culturas.

Para Guinand (2012, p. 136), um dos fatores que criaram no Brasil um ambiente
propício para a prática coral se desenvolver foi o canto orfeônico, idealizado por Villa-
Lobos. Durante parte da primeira metade do século XX, em especial durante os governos
Vargas, o canto orfeônico compôs o currículo de todos os estudantes brasileiros. Um novo
repertório foi composto para as aulas de canto nas escolas. Esse repertório retratava
profissões e elementos do cotidiano dos brasileiros e o nacionalismo. Em seu texto,
Guinand traz a seguinte definição do Canto Orfeônico: “Um elemento intelectual que
procura refinar o bom gosto na música, formando uma elite, contribuindo para a elevação
musical das pessoas e desenvolvendo interesse em uma arte de caráter nacional”
(GUINAND, 2012: 136, tradução nossa). Fonseca compôs peças para canto orfeônico e
coro infantil. Santos (2001, p. 49 – 67) lista em seu catálogo 40 composições para coro
infantil e 7 arranjos para a mesma formação.

Segundo Guinand (2012, p. 137), outro grande compositor brasileiro do século


XX é Camargo Guarnieri. Guarnieri fundou o Coral Paulistano em 1936 e compôs mais
de 50 peças para como misto a capela de temática afro-brasileira. Guinand destaca o Coral
Paulistano como uma das principais formações corais do Brasil. Guinand faz
considerações sobre o compositor Guerra Peixe como outro importante compositor do
período, produzindo obras com temática ameríndia e afro-brasileira. Guinand (2012, p.
137) cita duas obras de Guerra Peixe, a Série Xavante (1972) e Temas de Carimbó (1973).
Sobre Fonseca, Guinand escreve: “C. A. P. Fonseca, fundou o Madrigal Ars Nova (sic).
seguindo um modelo da música coral brasileira. Inspirado pelas tradições e rituais das
diferentes pessoas que vivem no Brasil, compôs obras como a Missa Afro-Brasileira de
Batuque e Acalanto (1971) e Jubiabá (1973).” (GUINAND, 2012, p.146, tradução nossa).

Segundo Guinand (2012, p. 136), o movimento Música Viva se opõe ao


modernismo e à utilização de elementos folclóricos como inspiração para produção da
música nacional. Os integrantes desse grupo buscavam produzir uma música brasileira a
partir de novas técnicas composicionais. Fonseca relata em entrevista cedida a Santos
(2001, p. 31) que encontrou, na Bahia, críticas ao modo como a música nacionalista era
desenvolvida na década de 60. Segundo Guinand (2012, p. 142), nas décadas de 50 e 60
houve um amadurecimento da prática coral em diversos países. Pela primeira vez, coros
sul-americanos participam de festivais internacionais de coros na Europa, Ásia e América
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do Norte. Entre os pioneiros, Guinand cita o Ars Nova, coral da UFMG, que na década
de 60 vence o Concurso Polifônico Guido d’Arezzo, renomado concurso coral italiano.
Para o Brasil, esse período resultou em uma maior organização da prática coral e conferiu
mais profissionalização à figura do regente. Guinand (2012, p. 142) traz a informação de
que nessa época festivais foram fundados em diversas cidades brasileiras, uma tentativa
de criar maiores oportunidades de contato entre os regentes brasileiros e criar uma rede
de trabalho.

Ao ler o artigo de Guinand, é possível comparar a trajetória da prática coral do


Brasil com a de outros países latino-americanos. Segundo a autora, o fenômeno do
nacionalismo ocorreu na produção da música coral de diversos países da América do Sul.
Entretanto, em nenhum outro país a prática coral foi tão relacionada à política e educação
quanto no Brasil. Aqui, a prática coral se desenvolveu institucionalmente, encontrando
respaldo e financiamento por parte do governo, especialmente durante a era Vargas e o
Estado Novo. Em outros países sul - americanos, seu desenvolvimento se deu por
iniciativa privada e não contou com incentivos governamentais. Segundo Guinand (2012,
p. 133), o movimento coral se desenvolveu de forma heterogênea na América Latina. O
Brasil e a Argentina atuaram como pivôs desse desenvolvimento.

No México, Guinand (2012, p. 139) relata que o nacionalismo aflorou em todas


as manifestações artísticas do início do século. O compositor Carlos Chaves foi pioneiro
na pesquisa da música asteca. Utilizava em suas composições elementos dessa música em
suas composições, buscando expressar uma nova e mais representativa identidade
nacional. Segundo relata Guinand, o compositor desenvolveu uma teoria que possibilitava
compreender os sistemas que regiam as melodias astecas.

Segundo a autora, Cuba possui uma “beleza provincial.” O governo nacionalista


e não globalizado permitiu um enorme desenvolvimento da música tradicional. Guinand
(2012, p. 140) destaca o compositor Edu Sanches Fuentes e sua obra, que mescla
características da música indígena cubana ao verismo italiano. na mesma página,
Guinand cita o Grupo Minorista, muito importante à história da música cubana.
Constituído por músicos a artistas visuais, os Minoristas produziram uma extensa
pesquisa sobre os elementos africanos da arte cubana.

Na Colômbia, Guinand (2012, p. 141) ressalta o compositor e aluno de d’Indy,


Antônio Maria Valência. Segundo a autora, as obras de Valência apresentam contraponto

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e linguagem harmônica influenciada pelo impressionismo e pela música popular
colombiana. Na Venezuela, o compositor Alberto Grau produziu obras corais de
propósito pedagógico. Segundo Guinand (2012, p. 145), Grau utilizou conceitos da
eurritmia para a composição das rítmicas de suas obras. Entre suas composições, Guinand
cita uma ópera infantil que Grau nomeou de Balada del Riton (2009).

Este breve relato sobre a prática coral latino-americana, a partir da leitura do texto
de María Guinand incluído nesta importante obra recente sobre canto coral (DE
QUADROS, 2012) buscou, portanto, situar internacionalmente a atuação de Carlos
Alberto Pinto Fonseca, como introdução a este trabalho.

2. História do Ars Nova


Escrito por Márcio José Velloso e publicado pela reitoria da UFMG, o encarte
Retrospectiva de 15 anos (1974) do Ars Nova, coral da UFMG, apresenta informações
sobre os primeiros anos de atividade do coro. Segundo o material, o grupo foi fundado no
ano de 1959 em Belo Horizonte. Inicialmente chamava-se Coro da Juventude
Universitária e segundo Chantal Santos (2001, p. 20), possuía vínculo com a UEE (União
Estadual dos Estudantes) e, em um primeiro momento, atuava exclusivamente em
manifestações estudantis. Segundo o encarte Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 1), o coro
teve como primeiro regente João Gomes de Oliveira, que ensaiava o grupo na residência
de dois integrantes do grupo. No mesmo ano de sua fundação, Sergio Magnani assumiu
a regência do grupo, se tornando o primeiro regente titular. Em pouco tempo, Magnani
cativava dezenas de jovens estudantes da universidade a fazerem parte do coral, que se
estabeleceu definitivamente.

Segundo o encarte Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 1), sob a regência de


Magnani, o Coro da Juventude Universitária recebeu permissão para utilizar como sede
uma sala pertencente à Faculdade de Filosofia localizada no Edifício Acaiaca da
Universidade de Minas Gerais, atual UFMG. Segundo informações verbais cedidas por
Francisco Campos, o coro ocupava o 11º andar do edifício.

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Imagem disponível em https://debidomo.wordpress.com/2010/07/25/edificio-acaiaca-em-belo-horizonte/
Acessado em 03/08/2018 às 8:03.

Inicialmente, os ensaios aconteciam aos domingos. De acordo com o encarte


Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 1), as primeiras apresentações do coro aconteceram
em Belo Horizonte e em cidades do interior de Minas Gerais. Após uma apresentação
para estudantes, o coro foi convidado a fazer parte do “Departamento Musical da entidade
dos universitários de Minas Gerais.”

O encarte Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 2) informa que no ano de1963, por


motivos profissionais, Sergio Magnani se retirou da posição de regente titular do Coro da
Juventude Universitária. No mesmo ano, Carlos Alberto Pinto Fonseca ocupou a
titularidade. Na ocasião, Fonseca havia recém retornado da Europa, onde desenvolveu
grande parte de seus estudos. Já havia regido o Ars Nova em 1962, estreia nacional da
missa Aeterna Christi Munera (1590) de Palestrina.

Em 1964, segundo Santos (2001, p. 21), o coro apresentaria O Messias de Händel


sob regência de Fonseca. Por ocasião do golpe de estado, que ocorreu no dia 31 de Março,
o concerto foi adiado alguns meses. Após sua realização, que segundo o autor obteve
considerável repercussão, o coro foi convidado pelo então reitor da UFMG, Alísio

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Pimenta a integrar-se à universidade como órgão promovedor de extensão cultural. Nessa
ocasião, o grupo teve seu nome alterado para Ars Nova, coral da UFMG, deixou de ter
vínculo com a União Estadual dos Estudantes e passou ser financiado pela universidade.
Uma vez parte da UFMG, passou a ser constituído por membros alunos e funcionários de
diversas áreas. Grande parte dos integrantes não dependiam da música como forma de
sustento, embora se dedicassem grandemente às atividades do coro e possuíssem
formação musical. Segundo informação verbal de Francisco Campos, os coralistas
recebiam da reitoria uma pequena bolsa para ajuda de custo em alimentação.

O coro se estabeleceu como o principal grupo coral de Belo Horizonte, produzindo


bons concertos em meio à pequena prática de música erudita na cidade. Em pouco tempo,
se transformou em referência como grupo vocal nacional. O Ars Nova, coral da UFMG
foi um dos primeiros grupos corais nacionais a se enquadrar na categoria de coro amador
semi-profissional, vanguarda entre os coros de sua época. Foi também pioneiro em
participar de competições e festivais corais internacionais. Ao longo dos anos, o Ars Nova
conquistou prêmios em diversos países. Conquistou o título de grupo coral mais premiado
do Brasil. Carlos Alberto Pinto Fonseca permaneceu como regente titular durante 40 anos.
Ao longo desses anos, o corpo de cantores se modificou grandemente. Segundo o encarte
Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 12), em 1959, o coro contava com 19 vozes. Em 1973,
o coro se apresentou em Arezzo, importante premiação em sua história, com 37 vozes.
Ao final de seu 15º de atividade, 140 pessoas já haviam integrado o grupo.

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Fonte: Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 3) Imagem obtida durante concerto em Arezzo, no Teatro
Petrarca no ano de 1973.

O Ars Nova passou a ter grande notoriedade. No encarte Retrospectiva de 15 anos


há um depoimento do compositor Camargo Guarnieri, onde relata suas impressões após
ouvir um concerto do Ars Nova:

Uma das minhas grandes alegrias, durante os dias que passei em Belo –
Horizonte, foi ouvir “Ars Nova Coral”. Trata-se de um conjunto vocal de
primeira ordem, o melhor que já vi no Brasil, pela sua afinação, precisão rítmica
e perfeito equilíbrio dinâmico. Um coral somente consegue atingir este nível
quando tem à sua frente um regente com sensibilidade artística, competência e
bom gosto musical como é o maestro Carlos Alberto Pinto Fonseca. Minas está
de parabéns, por poder mostrar ao mundo que o Brasil não é só futebol.
(Retrospectiva de 15 anos, 1974, p. 2)

O coro recebeu reconhecimento de grandes autoridades políticas. No encarte


Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 29) , há um depoimento de então vice-presidente da
República Federativa do Brasil, Augusto H. Rademaker Grünewald: "Admirável a
demonstração do Coral Ars Nova. Harmonioso e delicioso. Merece as vitórias já
alcançadas no Brasil e no exterior."

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Contou com o auxílio de agentes do Ministério da Cultura em suas viagens
internacionais. Segundo informações verbais cedidas por Francisco Campos em
entrevista, um funcionário do Ministério da Cultura acompanhou o coro em viagem para
a Suíça e Itália em 1973. Segundo o artigo de Chantal Santos (2017), o compositor
brasileiro Francisco Mignone teve relação bastante próxima com o coro Ars Nova,
chegando a compor peças especialmente para o grupo vocal, como Trem de Ferro (1973).
Há no artigo de Chantal, um relato de uma carta enviada a Fonseca por Mignone em 1976,
na ocasião da performance da sua composição Festa das Igrejas (1940).

Rio de Janeiro, 30/06/1976

Meu caro e jovem colega Carlos Alberto Pinto Fonseca. Estou


chegando em casa e com grande alegria de ter ouvido finalmente as
minhas Impressões Sinfônicas, ‘Festa das Igrejas’, interpretadas tal qual
eu desejo e quero. E olhe que essa obra foi regida pelos maestros
Szenkar, Toscanini, Ormandy e eu próprio: como autor! Você, Carlos
Alberto, captou o espírito da obra e soube dar aquele sabor e
autenticidade que ninguém tinha conseguido. Não há dúvida que a sua
capacidade diretorial é invulgar e invejabilíssima no melhor e mais
amplo sentido da palavra. Obrigado, obrigadíssimo do seu admirador e
amigo, Francisco Mignone. (CHANTAL, 2017)

O Ars Nova executou diversas peças desse compositor. Algumas, segundo


Chantal (2017), contaram com a orientação de Mignone durante os ensaios.

Durante sua trajetória, o Ars Nova teve à sua frente regentes convidados. Segundo
listado na Retrospectiva de 15 anos (1974, p.5), de sua fundação até a publicação do
encarte, o coro havia sido regido por 5 convidados.

1962 – Carlos Alberto Pinto Fonseca. (primeiro contato de Fonseca com o coro)

1962 – Carlos Eduardo Prates.

1965 – Ernst Ulrich Von Kamecke (“Kantor” da Catedral de Hamburgo, Alemanha).

1966 – Henrique Morelembaum ( então regente do Teatro Municipal do Rio de Janeiro).

1971 – Roberto Schnorremberg (então regente do Teatro Municipal de São Paulo).

2.1. Direção administrativa e cultural

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Segundo o encarte, durante os primeiros 15 anos, o Ars Nova contava, além dos
cantores, com um grupo de integrantes que se voluntariavam a formar um corpo
administrativo. Esse corpo era constituído por um diretor artístico, um diretor
administrativo, um secretário e um tesoureiro, além do regente titular. Mais tarde,
segundo informação verbal cedida em entrevista por Raphael Osório, o coro contaria
também com ensaiadores de naipe.

De 1966 até a produção do encarte, o cargo de direção artística havia sido


preenchido pela ex-esposa do regente, Ângela Pinto Coelho. Francisco Campos Neto
ocupou o cargo de secretário e participou da organização para a viagem a Arezzo. Raphael
Osório, após realizar o curso de regência coral oferecido por Fonseca, foi ensaiador de
naipe dos tenores. Segundo ele, Rafael Grimaldi, importante personagem na história do
Ars Nova, foi ensaiador do naipe dos baixos. Após o desligamento de Fonseca ao coro,
Rafael Grimaldi assumiu a regência do Ars Nova. O cargo de diretor administrativo foi
preenchido por 5 membros nos primeiros 15 anos de atividade do coro. Listados na
Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 5) estão:

De 1959 – 1962 – Marcilio Augusto Velloso

De 1962 – 1964 – Márcio José Velloso

De 1694 – 1965 – Derly de Cêa Pereira

1966 – 1967 – Fernando Pinheiro Moreira

1968 – 1974 – Márcio José Velloso (em exercício na ocasião da produção do encarte)

2.2. Localidades brasileiras onde o Ars Nova realizou concertos

O um dado importante na história do Ars Nova são as viagens realizadas pelo coro. Ao
longo dos 40 anos de titularidade de Fonseca o Ars Nova viajou para um grande número
de cidades brasileiras e estrangeiras. A Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 7 – 8) lista as
cidades brasileiras visitadas pelo coro de sua fundação até 1974. Durante os anos
seguintes o coro continuou realizando concertos fora de Belo Horizonte. As cidades
listadas no encarte são:

Minas Gerais: Belo – Horizonte, Alfenas, Lavras, Viçosa, Ouro Preto, São João Del Rey,
Sabará, Bom Jesus do Galho, Pedro Leopoldo, Uberaba, Uberlândia, Juiz de Fora,

14
Governador Valadares, Montes Claros, Ouro Fino, Araxá, Caeté, Itajubá, Pará de Minas,
Ferros, Visconde do Rio Branco, Itabirito, João Monlevade, Ibirité.

Rio de Janeiro: Guanabara, Petrópolis, Pati de Alferes, Niterói.

São Paulo: São Paulo, São José dos Campos, São Caetano do Sul, Santo André.

Paraná: Curitiba, Ponto Grossa.

Rio Grande do Sul: Porto Alegre, Santa Maria.

Distrito Federal: Brasília, Sobradinho.

Sergipe: Aracaju.

Goiás: Goiânia.

2.3. Localidades estrangeiras onde o Ars Nova realizou concertos

O Ars Nova realizou um número notório de apresentações no estrangeiro. O Ars


Nova conquistou prêmios na Itália, Espanha, Grécia, Alemanha. O encarte Restrospectiva
de 15 anos (1974, p. 8) apresenta uma lista das cidades estrangeiras que o Ars Nova se
apresentou desde sua fundação.

2.3.1. Argentina

• Província de Tucumã: San Miguel de Tucumã.


• Província de Buenos Aires: La Plata, Buenos Aires, San Isidro, Mar del Plata.

2.3.2. Peru

• Capital Federal: Lima

2.3.3. Itália

• Toscana: Arezzo, Ravena, Florença.


• Província de Arezzo: Monte S. Salvino, Stia.
• Província de Ravena: Lugo.

2.3.4. França

• Província de Lyon: Pérouges.

15
2.3.5. Suíça

• Cantão Francês: Genebra.

2.3.6. Estados Unidos

• Flórida: Miami.
• Nova Iorque: Oneonta, Canton Latham (Albany), Nova Iorque.
• Capital Federal: Washington D.C.
• Connecticut: New Haven, New Britain.
• Pensilvânia: Newtown.
• Virginia: Bridgewater.

Além desses países, o Ars Nova realizou concertos em convenções nacionais do


American Choral Directors Association, em St. Louis em Março de 1975. Durante a
produção da Retrospectiva de 15 anos, o Ars Nova recebeu convite para realizar a
Tournée pelo Brasil, viagem organizada pelo Plano de Ação Cultural, projeto do
Ministério da Cultura que estava em trâmite no momento da publicação do encarte.
Aprovado o projeto, o coro seria levado em turnê para 17 estados brasileiros.

2.4. Repertório

Durante os primeiros 15 anos de atividade, o Ars Nova apresentou 202 peças


corais. A Retrospectiva de 15 anos (1974, p. 10-11) lista as obras mais notáveis realizadas
durante esse período. Nessa lista, estão presentes obras de diversos estilos e períodos da
história da música.

2.4.1. Idade média

Organus, Motetos, Hinos, Clausuras, fragmentos de missas do século IX ao XV,


incluindo autores como Guilhaume de Machault, John Dunstable e Johannes Ciconia.

2.4.2. Renascença religiosa

Obras de Ockeghem, Palestrina, Arkadelt, Vittoria, Praetorius, Bai, Aichingerm,


Perti.

2.4.3. Renascença profana

Gastoldi, Orazio Vecchi, Orlando de Lasso, Arbot, Josquin de Prés, C. Jannequin,


Passereau, C. Sermisy, P. Certon, Claudio Pari, Gesualdo, J. Perti, F. Azzaiolo, J.

16
Mauduit, G. Nanino, Willaert, Phillipe de Monte, Othmayr, A. Banchieri, M. Pesenti, T.
Morley, J. Bennet, J. Farmer, J. Wilbye, T. Whythorne, T. Weelkes.

2.4.4. Barroco

Schütz, Alessandro Scarlatti, Domenico Scarlatti, A. Vivaldi, Purcell, C.


Monteverdi, G. F. Händel, J. S. Bach.

2.4.5. Classicismo

Gluck, Haydn, W. A. Mozart, Beethoven.

2.4.6. Romantismo

Mendelssohn, Brahms, Schubert

2.4.7. Impressionismo

Debussy

2.4.8. Modernos

Paul Hindemith, Stravisnky, Alberto Ginastera.

2.4.9. Composições e arranjos de folclore brasileiro

Autores: H. Villa-Lobos, Heckel Tavares, Waldemar Henrique, Sérgio Magnani,


Luiz Melgaço, Almirante, C. E. Prates, Kilza Setti, Osvaldo Lacerda, Pedro Marinho,
Francisco Mignone, Camargo Guarnieri, Marlos Nobre, Ernst Widmer, Lorenzo
Fernandes, Henrique de Curitiba, Aloysio Pinto, Carlos Alberto Pinto Fonseca.

2.4.10. Folclore internacional

Segundo o encarte Retrospectiva de 15 anos, o Ars Nova apresentou composições


folclóricas pertencentes aos folclores português, hebraico, escocês, francês, boliviano,
russo, italiano, alemão, chileno, argentino, tchecoslovaco, japonês, austríaco e
estadunidense. O Ars Nova estreou todas as peças afro-brasileiras de composição de
Fonseca. Essas composições foram inspiradas na música dos terreiros de Umbanda e
Candomblé. O Ars Nova foi notório em festivais no exterior ao apresentar parte da cultura
e da religião afro-brasileira.

Em seus primeiros 15 anos, o Ars Nova levou ao palco um repertório bastante


variado, englobando compositores de diversas nacionalidades e períodos. Entretanto, a

17
maior parte dos compositores citados no encarte são pertencentes a períodos mais antigos
da história da música. Essa informação se relaciona com o fato de Fonseca possuir grande
domínio sobre a composição e regência da polifonia e contraponto, habilidade aprendida
com o educador musical alemão, Franz Joaquim Koelrreutter.

Foi um coro pioneiro ao se estabelecer como um coro brasileiro amador semi-


profissional. O Ars Nova se formou como um coral composto por pessoas de diversas
profissões. Seu nível técnico e o repertório que apresentou nos 40 anos em que esteve sob
regência de Fonseca se assemelha ao de grupos corais profissionais. Hoje, a categoria de
grupo coral amador semi-profissional se encontra mais desenvolvida e conta com grupos
em diversos estados do Brasil. Alguns desses grupos são regidos por ex-alunos de Carlos
Alberto.

O Ars Nova, após o falecimento de Fonseca, passou por um período de


instabilidade. Hoje, encontra-se em atividade, sob a regência de Lincoln Andrade, regente
titular desde 2016, informação contida no site do Ars Nova. Atualmente o coro tem
enfoque na performance de música contemporânea de compositores nacionais e
estrangeiros, e busca executar peças que ainda sejam inéditas no país. O Ars Nova segue
vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais e hoje tem sua sede no Conservatório
de Música da UFMG.

3. Formação e influências
Carlos Alberto Pinto Fonseca nasceu e cresceu em uma casa economicamente
e culturalmente favorecidas na cidade de Belo Horizonte. Foi o primeiro músico de uma
família que ocupava um importante lugar na sociedade da capital mineira durante o século
XX. Segundo Rize Matheus (2010, p. 17), Fonseca recebeu apoio de seus pais quando
decidiu trilhar a carreira de músico. Seu avô, Estevão Pinto, era um grande apreciador da
música erudita e proporcionou os primeiros contatos de Carlos Alberto Pinto Fonseca
com o estilo musical.

18
Imagem extraída em Google Imagens.

O período de formação de Fonseca deu-se em diversas instituições e sob a


orientação e influência de grande número de professores e escolas. Segundo Mauro
Chantal¹ (2017), que dedicou um parágrafo de seu artigo Artistas inesquecíveis: Carlos
Alberto Pinto Fonseca, maestro para tratar do período de formação de Fonseca, o maestro
iniciou seus estudos musicais aos 7 anos através do piano. Foi orientado inicialmente pela
compositora Jupyra Duffles Barreto em sua classe de canto orfeônico. Santos traz a
informação de que Fonseca, na ocasião de um programa de apresentações promovido por
Jupyra Barreto, compôs um prelúdio para piano, no ano de 1949. Tanto Santos (2001)
quanto Coelho (2009) relatam que Carlos Alberto tinha um grande apreço pela escultura.
Chantal (2017) apresenta a informação de que esse apreço pela escultura se deu por conta
do contato que Fonseca teve com a artista belga Jeanne Milde.

Após Fonseca decidir seguir a carreira de músico, foi aluno do Conservatório


Mineiro de Música onde, segundo Santos (2017) estudou com Pedro Castro, Hostílio

19
Soares e Fernando Coelho. Nesse período, que compreende a década de 40, Fonseca
compôs suas primeiras peças, que segundo Santos (2001 p.16), são O Pretinho Cantador
e O Soldadinho, ambas compostas em 1942.

Fonseca mudou-se de Minas Gerais para São Paulo no segundo semestre de 1954,
para estudar na Escola Livre de Música da Pró-Arte, como relata Chantal (2017). Foi
aluno dessa instituição até 1955, ano em que retornou à Bahia a fim de estudar nos
Seminários de Música da Universidade Federal da Bahia até 1960. Foi nesse período que
estudou com o educador musical alemão Hans-Joachim Koellreutter (1915 – 2005) em
ambas as instituições.

De acordo com Santos (2017) e Matheus (2010, p. 20) Fonseca residiu na Bahia
até completar o curso Seminários de Música da Universidade Federal da Bahia (UFBA)
e mudar-se para Hamburgo, iniciando o período internacional de seus estudos. Em
Hamburgo, durante o ano de 1960 Fonseca estudou regência orquestral com Hans
Schmidt – Isserstedt. Depois desse período, Fonseca mudou-se para Colônia, onde
continuou seus estudos de regência com Wolfgang Sawallisch. Também em Colônia, deu
continuidade aos seus estudos do instrumento piano com Neuhaus.

De acordo com o artigo de Mauro Chantal (2017), fixou residência em Paris no


ano de 1962. Estudou com Eduardo Lindenberg na Casa do Brasil. Sob essa orientação,
Fonseca foi finalista do Concurso Internacional para Jovens Regentes em Besançon.
Chantal diz que, segundo Fonseca, durante esse período ele realizou diversos cursos na
Itália entre os anos 1960 e 1962. Um deles, muito importante para a trajetória do regente,
foi o curso de Siena na instituição Accademia Musicale Chigiana. Nesse período, estudou
com Franco Ferrara e Sergiu Celibidache, sendo o último considerado um dos maiores
influenciadores de Carlos Alberto Pinto Fonseca enquanto regente coral, juntamente com
Robert Shaw. Estudou também direção de ópera com Bruno Rigacci e Gino Bechi na
mesma cidade.

Após esse período, Fonseca realizou diversos cursos em países da Europa. Chantal
(2017), em seu artigo, lista todos os cursos e instituições em que Fonseca realizou algum
tipo de formação nessa época. Essa informação foi resultado de uma compilação de
documentos da época, informação fornecida pelo autor.

- Regência em Staatliche Hochschule für Musik Köln, Colônia, 1960/1961.

20
-Regência e Percussão em Musikhochschule, Hamburgo, 1962.

- Regência orquestral em Accademia Musicale Chigiana, Siena, 1962/1966).

-Interpretação de ópera em Accademia Musicale Chigiana, Siena, 1966).

-Aperfeiçoamento em regência de orquestra em Teatro Comunale, Bolonha,


1973).

Segundo Santos, os estudos desenvolvidos na Accademia Musicale Chigiana


foram os mais significativos na fase de estudos internacionais para a formação de
Fonseca. O autor relata que nessa instituição, Fonseca teve aula com os seguintes
professores: “...regência de orquestra com Franco Ferrara (1911 – 1985) e Sergiu
Celibidache (1912 – 1996), e direção de ópera e interpretação com Bruno Rigacci (s.d.)
e Gino Bechi (1913 – 1993).” (CHANTAL, 2017)

Segundo Chantal, em 1964, Fonseca estudou regência orquestral com Eleazar de


Carvalho, então diretor artístico e regente titular da Orquestra Sinfônica de São Paulo.
Em 1965, Fonseca funda a Orquestra de Câmara da UFMG, com recursos da
universidade. Essa orquestra, durante seus nove anos de atividade regular, atingiu não só
o meio universitário, mas proveu uma orquestra para a cidade de Belo Horizonte. Segundo
o artigo de Chantal, o trabalho de regente orquestral de Fonseca foi reconhecido pelo
compositor Francisco Mignone.

Fonseca dirigiu como regente titular outros dois grupos orquestrais: a Orquestra
Sinfônica de Minas Gerais e a Orquestra de Câmarado Modern American Institute.
Segundo Fernandes, à frente do primeiro, Fonseca iniciou suas atividades em 1981 e
realizou diversos repertórios. Fernandes cita em especial a execução do “Ciclo de
Beethoven”. Chantal (2001, p. 28) traz a informação de que Fonseca esteve à frente de
grupos como regente convidado em diversos estados do Brasil: São Paulo, Bahia, Rio
Grande do Sul, Distrito Federal e Rio de Janeiro. Angelo Fernandes (2004, p. 9) traz em
seu texto a informação de que Fonseca fundou, em Belo Horizonte, um grupo orquestral
chamado Orquestra de Câmara Villa – Lobos. Essa orquestra foi financiada pelo Modern
American Institute.

É importante, no contexto de uma pesquisa biográfica que busca compreender


como o ferramental técnico de Carlos Alberto Pinto Fonseca foi formado, salientar que a
possibilidade de receber fecundamente uma influência não é um acontecimento passivo,

21
mas sim uma escolha pessoal e possivelmente racional. Diversas foram as escolas e
influências que permearam Fonseca durante seu período de formação. Todas elas, capazes
de dotar o regente de capacidade para desenvolver uma carreira profissional. Entretanto,
em algum momento de sua vida, Fonseca deixou-se influenciar por uma ou outra escola
com a qual teve contato, construindo ao seu gosto ou oportunidade quem seria enquanto
profissional.

4. Robert Shaw, Sergiu Celibidache e a Fenomenologia.


Ao consultar a bibliografia deste trabalho, depara-se com dois nomes que se
destacam como grandes influenciadores na formação de Fonseca. São eles: o regente
romeno Sergiu Celibidache (1912 – 1996) e o regente estadunidense Robert Shaw (1916
– 1999).

Informações verbais colhidas na bibliografia consultada e em entrevistas


realizadas apontam que o maior influenciador de Fonseca enquanto regente coral, foi
Celibidache. O regente romeno foi autor de uma nova escola de análise musical e
regência. Suas inovações técnicas se fundamentam na Fenomenologia, vertente filosófica
de autoria de Edmund Husserl (1859 – 1938). Embora ambos os ex-alunos entrevistados
tenham respondido não conhecer o termo Fenomenologia, pode-se perceber em relatos e
em textos acadêmicos que diversas práticas de Fonseca são consoantes com as propostas
na técnica de Celibidache. Segundo informações verbais de Raphael Osório, Fonseca
era discreto sobre sua história durante os ensaios e não falava muito sobre seus
influenciadores. No máximo, fazia uma digressão e contava uma história do passado.
Segundo Osório, alguns integrantes estavam lá porque gostavam de cantar, mas não se
interessavam pelo mundo da regência. Nas aulas de regência, acontecia o oposto. Fonseca
falava bastante de seus ex-professores. Nessas aulas, falava em termos técnicos. Falava
bastante sobre Koellreutter e sobre o tempo que passou com Celibidache.

Informações verbais colhidas falam sobre como os anos de estudo de regência


com o romeno moldaram a técnica de Fonseca. Em entrevista cedida, Francisco Campos,
ex-coralista do Ars Nova e atual professor de canto da USP, amigo pessoal de Fonseca e
de sua esposa diz que “o grande professor dele foi Celibidache, durante o tempo em
Siena.” (Informação verbal) O próprio regente diz em entrevista cedida a Mauro Santos
ser grandemente influenciado por Celibidache.

22
Estudei com Celibidache, em Siena. Com Celibidache, aprendi a técnica que
possibilita tocar o coro como um instrumento. [...] Podemos desenhar toda a
melodia no ar. SANTOS (2001, p. 19) [...] E no momento em que eu deixo essa
linha significa que algo diferente está acontecendo. Refiro-me às figuras de
marcação dos compassos onde todos os pontos de inflexão situam-se na mesma
linha horizontal. Com isso, tenho a chance de criar no momento da execução.
[...] às vezes, durante a execução, sinto que o coro me segue, respondendo a esta
técnica, amando o que faz, e passando isso para o público também. O mais
importante na história do Ars Nova, é que muitas vezes fazemos com que o
público chore, o que para mim, é mais importante que o aplauso entusiástico,
porque comunicamos algo que emociona as pessoas. (SANTOS, 2001:19 )

Rize Matheus traz em seu trabalho um trecho de outra fala do regente:

Celibidache foi uma influência enorme. A técnica que eu desenvolvi com ele que
possibilita tocar o coro ou a orquestra como se fosse um instrumento eu devo a
ele. O conhecimento profundo das obras, inclusive da fenomenologia de música
que a gente teve com ele, é uma coisa assim inolvidável. (FONSECA, 2005)
apud (MATHEUS, 2010, p.23)

Adiante, Matheus traz um trecho de um artigo que Fonseca escreveu na ocasião


da Convenção Internacional de Regentes de Coros, realizada em Brasília em 1999.

Qual o regente que não gostaria de possuir uma técnica do gesto tão
proporcionada à música que lhe permitisse, literalmente, “tocar” o coro como
um instrumento, capaz de segui-lo nas menores inflexões de sua interpretação da
peça executada? Pois essa técnica estará à disposição de quantos quiserem
construí-la, com dedicação diária e exercícios capazes de torna-la uma “segunda
natureza” nos braços e mãos de quem se dispuser a seguir o método que
aprendemos do grande Sergiu Celibidache. (FONSECA, 1999) apud
(MATHEUS, 2010: 24)

Willsterman Coelho adjetiva a influência de Celibidache sobre Fonseca como


pessoal, e não bibliográfica. Coelho traz em seu texto diversas evidências dessa
influência. Segundo o autor, a capa da Apostila de Regência, publicação de autoria de
Fonseca, continha uma foto do regente romeno. Segundo o autor, a grande quantidade de
ensaios exigida por Fonseca buscava dar tempo para todos os músicos perceberem todas
as sutilezas do repertório, buscando assim, a transcendência. Sobre análise musical e
interpretação, Coelho diz:

23
Fonseca era adepto da mesma visão de Celibidache no que concerne ao respeito
pela partitura: cada mínimo detalhe tinha de ser ouvido, e, para tanto, tinha de
ser ensaiado à exaustão, até que todos os indivíduos participantes distinguissem
claramente todos os extratos da textura musical. Ouvir tudo, distintamente.
Assim, um enorme número de ensaios do mesmo programa era sempre muito
bem – vindo, mesmo tendo o Ars Nova larga experiência e experiência com
repertório realmente difícil. (COELHO, 2009, p.95)

Através da revisão bibliográfica e de informações obtidas em entrevistas


realizadas, pode-se perceber que uma segunda figura desponta como importante
influência na formação de Fonseca: o regente estadunidense Robert Shaw (1916 – 1999),
que desenvolveu um importante trabalho no âmbito da regência coral em seu país. Fundou
uma das principais escolas de regência dos Estados Unidos.

Willsterman Coelho (2009, p. 101) dedica um tópico de seu texto à comparação


das diferentes escolas estadunidenses de regência e como elas poderiam imprimir
influências na técnica de regência de Fonseca. A relação mais óbvia é a escola de Robert
Shaw. Segundo o autor Robert Shaw dividia os “recursos da técnica coral” em cinco
parâmetros : 1) afinação, 2) sonoridade, 3) dinâmica, 4) enunciação e 5) ritmo. Em seu
texto, Coelho traz a informação de esses parâmetros eram trabalhados por Shaw durante
os ensaios. Isso vai de encontro com a prática desenvolvida por Fonseca. Shaw, segundo
Coelho, define três parâmetros como “forças musicais”, que influenciam diretamente a
sonoridade do coro. Esses são: afinação, enunciação e ritmo, que o autor considera como
a mais poderosa. Coelho diz que segundo Shaw, a precisão rítmica era de enorme
importância pois “Todo instante musical é dramático.” (COELHO, 2009, p.1-2). Segundo
Coelho, essa prática identifica-se com a prática desenvolvida por Fonseca. O autor diz: “
Acentuar a força do ritmo era uma de suas (Fonseca) predileções na construção da
sonoridade do Ars Nova; desde o momento da leitura de uma peça, ele deixava
absolutamente trabalhadas como recurso de expressão em que o cantor devia se
posicionar ativamente.” (COELHO, 2009, p.102)

Raphael Osório descreveu de forma bastante clara o gestual de regência que havia
na apostila usada por Fonseca durante suas aulas de regência. Segundo Raphael, essa era
também a forma como Fonseca regia o coro. Segundo ele, “ todas as figuras, binários,
ternários, mesmo em tempos compostos, eram feitas num plano horizontal... o primeiro
tempo no meio, o segundo, vai no centro do corpo, o terceiro, vai ao exterior, do lado de
fora e o quarto vai no meio. Pra levantar e ir pro primeiro de novo. Fica tipo uma cruz.

24
No livro tinha até o desenho dos movimentos. Do primeiro para o segundo há um
movimento circular, do segundo para o terceiro, um grande movimento circular e um
pequeno movimento circular de volta que vai para o quarto para subir de novo... essa
técnica eu guardo até hoje” (informação verbal).

Esse gestual apresenta bastante semelhança com o que é proposto por Robert
Shaw e sua escola de regência. Segundo Raphael, a apostila compilada por Fonseca
apresentava todos os movimentos de regência desenhados, recurso também presente no
material de Robert Shaw. Por conta da impossibilidade de acesso a essa apostila, a
comparação com os desenhos impressos no livro de Shaw não foi possível.

Sendo assim, pode-se afirmar que Sergiu Celibidache foi uma grande influência
para Fonseca e plasmou grandemente sua forma de ensaio e de condução do som. Muitas
das práticas do regente mineiro refletem diretamente à técnica de Celibidache e o próprio
Fonseca confessa ter sido influenciado pelo regente romeno. No âmbito da análise, pode-
se perceber influências da Fenomenologia, proposta de análise musical embasada na
filosofia de Edmund Husserl no trabalho de Fonseca, mais uma das muitas evidências de
como Celibidache foi importante ao regente mineiro. Entretanto, a influência que Fonseca
recebeu de Robert Shaw não foi pouco significativa. Pode-se perceber que no tocante ao
gestual, Fonseca tinha grandes consonâncias com o proposto pela escola do regente
estadunidense.

Em seu capítulo do livro Coral Conducting A Symposium (1973, p. 37 - 38),


Roward Swan faz um detalhado relato sobre os procedimentos gerais das principais
escolas estadunidenses em forma de tabelas. Para a realização deste trabalho, a tabela
sobre a escola de Robert Shaw foi utilizada com tradução própria. Através dela, é possível
obter um panorama de procedimentos propostos por Shaw que possivelmente
influenciaram a regência de Fonseca.

Elementos tonais na voz Técnica de ensaio: princípios e prática

A relação dos fatores rítmicos de cada frase tem


Fonação e relaxamento deve estar relacionada ao final da frase e ao início
da seguinte.

25
O suporte ideal vem do senso de vitalidade
Suporte e controle respiratório inerente à menor partícula de tempo – musical
expresso no som.

Todas as vogais devem ser cantadas na cabeça do


tempo. As consoantes soam para encontrar as
Pronúncia e articulação
necessidades de pulso e tempo. Cada som
pronunciado tem uma duração.

A altura carrega a emoção, não o som. Para


Cor, timbre e textura repertório com tonalismo estendido, cor e textura
são variáveis.

Ensaie com nível leve de dinâmica. A amplitude


Amplitude
vem do aumento da vitalidade da altura.

Vibrato Permitido.

Elementos tonais no coro Técnicas de ensaio: princípios e prática

Cada cantor deve aprender a pronunciar a sílaba


Blend precisamente ao mesmo tempo que os outros
cantores.

Nos ensaios, exigir constantemente a memória da


Entonação altura. Entonação pobre é em parte causada por
pobre senso rítmico.

Pronunciar todos os sons das palavras e não as


Direção
palavras.

As alturas são a representação aural de todos os


elementos rítmicos na partitura. As alturas
possuem movimento, direção, precisão, vitalidade
Vitalidade rítmica em urgência em ter uma direção. Pratique
procurando o sentimento das menores unidades de
tempo, a separação de notas pontuadas e a relação
entre música e movimento físico.

Alturas vigorosas; elasticidade, elementos rítmicos


soando tal como são concebidos e sentidos pelos

Queremos ouvir cantores; a dicção sendo usada em primeiro lugar


para dar forma à frase musical; evidências de som
sempre em movimento; variabilidade e
surpreendentes utilizações de cores; as

26
propriedades das alturas relacionadas e
implementando outros elementos interpretativos
ao lugar de serem ouvidas por si só.

Tonalidade explorada como uma experiência


estética; ênfase sobre as qualidades expressivas do
Não queremos ouvir rubato e mudanças de tempo; a acentuação das
palavras em favor do significado; interpretação e
sonoridade divorciados da partitura.

Tradução nossa

Sendo assim, torna-se possível afirmar que Sergiu Celibidache foi uma grande
influência para Fonseca e plasmou grandemente sua forma de ensaio e de condução do
som. Muitas das práticas do regente mineiro refletem diretamente à técnica de
Celibidache e o próprio Fonseca confessa ter sido influenciado pelo regente romeno. No
âmbito da análise, pode-se perceber influências da Fenomenologia, proposta de análise
musical embasada na filosofia de Edmund Husserl no trabalho de Fonseca, mais uma das
muitas evidências de como Celibidache foi importante ao regente mineiro. Entretanto, a
influência que Fonseca recebeu de Robert Shaw não foi pouco significativa. Pode-se
perceber que no tocante ao gestual, Fonseca tinha grandes consonâncias com o proposto
pela escola do regente estadunidense.

Não há, em nenhum material consultado, informações que levem à conclusão que,
na área da regência coral, Fonseca teve outra influência tão significativa quanto essas. De
certo, Koellreutter e Kurt Thomas também influenciaram grandemente Carlos Alberto,
assim como diversos outros professores com quem o regente mineiro teve contato ao
longo de sua vida. O acesso a informações sobre Kurt Thomas é restrito, o que dificulta
a obtenção de informações sobre o músico alemão. Seu estudo e possíveis relações com
a construção da formação de Carlos Alberto seguem como um tema a ser estudado.
Entretanto, a construção dos conhecimentos e prática de Fonseca enquanto regente
tiveram como principais influenciadores Sergiu Celibidache e Robert Shaw.

4.1. Fenomenologia

Para compreender o que é a Fenomenologia e como Celibidache a utilizava como


ferramenta de análise musical o trabalho de Lucia Marin foi consultado. Em seu texto,
Marin faz uma detalhada análise sobre o pensamento filosófico em questão. Segundo a
autora, fenomenologia é uma vertente filosófica ligada à filosofia do leste europeu. Seu

27
conceito foi cunhado pelo filósofo Edmund Husserl. “A Fenomenologia é a ciência de
estudar a essência (o que é) através da análise do fenômeno (o que é perceptível)”
(MARIN, 2015, p.5). Segundo as palavras de Husserl:

Fenomenologia é a doutrina universal da essência, onde a essência da ciência do


conhecimento encontra seu lugar. Ela descreve a ciência, um link entre diferentes
áreas da ciência, mas ao mesmo tempo, se refere a um método e a uma atitude
intelectual. (MARIN, 2015, p.5)

A análise que a fenomenologia busca desenvolver sobre os fatos, segundo a


autora, se baseia em “não tomar nada como certo". Segundo Marin,

Sua (fenomenologia) abordagem é perceber os objetos antes de qualquer crença


ou julgamento, a fim de explorar abertamente as essências dos objetos que
podem estar escondidas por interpretações subjetivas e reações.” (MARIN,
2015, p.6)

No caso da música, segundo a autora, permite ao regente desenvolver um novo


ponto de vista sobre uma obra que já foi amplamente explorada e analisada por diversos
outros regentes.

Segundo a autora (2015, p. 7), a análise fenomenológica se dá por dois passos


fundamentais: 1) Redução Transcendental, que é a construção do ego, que nos permite
conectar diretamente com o mundo fenomenal sem emitir julgamento. E 2) Redução
Eidética, que consiste na absorção do conhecimento através do fenômeno pela
consciência.

Outros filósofos desenvolveram pensamentos muito parecidos à fenomenologia.


Dois exemplos, segundo a autora, são: Georg Hegel (1770 – 1831), filósofo alemão que
utilizou um pensamento bastante parecido em sua obra e Aristoxenus de Tarentum (335
a.c – 300 a.c.), filósofo grego que utilizou uma linha de pensamento que segundo a autora
poderia ser fenomenológica. Utilizou essa linha de pensamento para se opor aos conceitos
de Pitágoras. Outro exemplo dado pela autora, é o de Santo Agostinho (354 – 415), que
em seus livros De Música e Confissões utiliza uma linha de pensamento fenomenológica.

Segundo Marin, aplicada à análise do texto musical, a análise fenomenológica


busca compreender os sons e sua relação com o humano e sua compreensão. O método
fenomenológico busca medir e compreender principalmente a percepção do som de forma
direta ou experiencial. Todo o pensamento fenomenológico, segundo a autora (2015,

28
p.14), se fundamenta na compreensão das tensões e relaxamentos presentes na peça em
dois sentidos: vertical (acordes) e horizontal (melodia). O regente que deseja analisar seu
repertório segundo a fenomenologia, deve, de acordo com Marín (2015, p. 17), encontrar
em primeira mão o clímax da peça, ponto de máxima tensão. Esse, segundo essa filosofia,
é o momento mais importante de toda a obra. Essa tensão é criada por quatro parâmetros:
1) ritmo, 2) harmonia, 3) melodia e 4) timbre. Segundo a autora, a segunda análise a ser
feita é encontrar as seções de extroversão (construção de tensão) e introversão
(diminuição da tensão). Após isso, Marín explica que o regente deve compreender as
subseções de tensão/relaxamento que estão presentes dentro das seções.

Segundo a autora, Celibidache teve grande contato com o pensamento


fenomenológico em sua vida e o transmitiu a seus alunos. Em seu texto, Marin traz
palavras de Celibidache que permitem que se compreenda como o regente via a música e
sua compreensão.

Em minha visão, música não é algo que possamos entender através de uma
definição baseada na linguagem convencional. Ela não se encaixa em nenhuma
forma de existência perceptível. Em outras palavras, música não é algo. Mesmo
assim, em certas circunstâncias, algo pode ser música. Isso é algo chamado som.
Por outro lado, som não é música, mas em certas condições pode se tornar
música. (MARIN, 2015, p.11, tradução nossa)

Sendo a análise musical fenomenológica uma tentativa de análise do fenômeno


musical e da forma como esse fenômeno se insere na peça como elemento do discurso
musical, sua aplicação passa necessariamente por um intenso e cuidadoso trabalho das
nuances e detalhes. Francisco Campos e Raphael Osório trazem em suas entrevistas,
informações que possibilitam compreender como Carlos Alberto aplicava essa forma de
análise em seu trabalho. Segundo informações verbais de Francisco Campos, ao reger
uma obra, Fonseca já a havia estudado e possuía um grande conhecimento sobre ela.
Especialmente peças do período da renascença, como afirma Campos em entrevista
cedida. Segundo os entrevistados, ele era muito minucioso quanto às nuances e detalhes.
Sobre isso, Osório diz: “Me lembro que era muito exigente com a equalização das vozes.
Um naipe era quase que uma voz só. Todas as vozes iam para uma mesma cor. Uma das
principais regras do coro era essa unidade.” (informação verbal) Ainda segundo o
entrevistado, esse trabalho era iniciado desde a leitura. “Eu achava que ele já era bastante
perfeccionista no ensaio de naipe separadamente. Perfeccionista com as nuances, a

29
pronúncia de cada palavra.” (informação verbal) Campos relata que Fonseca ensaiava o
coro com a obra analisada desde a leitura.

Ele já vinha com a peça entendida. E só passava: aqui eu quero isso, aqui eu
quero aquilo. Eu quero assim, quero assado. E muito muito muito detalhe. (...)
A gente nem tinha lido e ele queria trazer tudo.” (informação verbal)

Em sua entrevista, Campos informou que até mesmo quando Fonseca executava
a leitura de um repertório que outro regente iria apresentar, ele era minucioso e dirigia
igualmente o coro. Os coralistas, segundo informações obtidas por ambos os
entrevistados, tinham pouca ou nenhuma influência sobre o acabamento sonoro ou sobre
a forma como o regente queria trabalhar as nuances. Esse trabalho trouxe resultados
únicos à sonoridade do coro e à performance do repertório. Diversas fontes falam sobre
a sonoridade do Ars Nova, única no Brasil daquela época. Em entrevista cedida, Francisco
Campos relata:

O Ars Nova tinha em seu favor a sonoridade dele que era absurda. A afinação e
sonoridade do Ars Nova eram absurdas. Assim, os outros corais, era tudo médio
perto do nosso coro. Um coro amador ter aquele som? E Carlos Alberto levava
as nuances às últimas consequências. (informação verbal)

Outros fatores também foram importantes ferramentas para a formação da


sonoridade do coro. O intenso e minucioso trabalho com as vogais, a técnica de canto e
impostação vocal são trabalhados por Coelho e Fernandes como pilares da sonoridade
que o Ars Nova construiu ao longo dos anos. Entretanto, esses fatores eram trabalhados
como fruto de uma análise do texto musical; análise essa fundamentada na
fenomenologia.

5. Regência e organização do Ars Nova

Carlos Alberto Pinto Fonseca era reconhecido por seu singular ferramental de
regência. O regente mineiro construiu a partir de suas influências uma abordagem nova
quanto à análise musical, ensaio, trabalho fonético e gestual de regência. Embora Fonseca
tenha realizado apresentações regendo orquestras, quase a totalidade de sua carreira foi
dedicada à regência coral. Fonseca desenvolveu-se frente ao Ars Nova, coral da UFMG,
coro do qual foi regente titular durante 40 anos.

30
Esse capítulo busca relatar os procedimentos básicos que constituíam o ferramental
técnico de regência de Fonseca. Para que a leitura seja facilitada, esse capítulo divide os
procedimentos em áreas que compõem o ferramental técnico de Fonseca.

5.1. Gestual

5.2. Motivação do coro

5.3. Roteiro de ensaio

5.4. Técnica de canto

5.5. Exercícios e dinâmicas aplicados ao coro

5.6. Trabalho fonético

5.7. Postura em apresentações

5.8. Seleção de novos cantores

5.9. Curso de regência para auxiliares do coro

5.1. Gestual

Diversas fontes relatam que o gestual utilizado por Fonseca apresentava


peculiaridades. Um cantor estranho a esse gestual poderia ficar desorientado a princípio.
Segundo informação verbal, Raphael Leite Osório, ex-aluno entrevistado, o gestual de
Fonseca apresentava diferenças em comparação ao gestual proposto pela escola italiana
tradicional. Através da comparação de informações presentes na bibliografia disponível
sobre o Carlos Alberto, pode-se supor que seu gestual, quando dando indicações de
tempo, apresentasse relação com o gestual proposto pelo regente estadunidense Robert
Shaw, fundador de uma importante escola de regência em seu país. Fonseca também
utilizava o gestual desenvolvido por Sergiu Celibidache, que permite “desenhar toda a
melodia no ar” (SANTOS 2009, p. 19), utilizando um plano horizontal. Esse gestual
conferia a Fonseca maior clareza e permitia modelar a sonoridade e trabalhar as nuances.
Sobre a posição dos tempos no espaço no gestual de Fonseca, Raphael diz:

Todas as figuras, binários, ternários, mesmo em tempos compostos, eram feitas


num plano horizontal... o primeiro tempo no meio, o segundo, vai no centro do
corpo, o terceiro, vai ao exterior, do lado de fora e o quarto vai no meio. Pra

31
levantar e ir pro primeiro de novo. Fica tipo uma cruz. No livro (1) tinha até o
desenho dos movimentos. Do primeiro para o segundo há um movimento
circular, do segundo para o terceiro, um grande movimento circular e um
pequeno movimento circular de volta que vai para o quarto para subir de novo.
Essa técnica eu guardo até hoje. (informação verbal)

Segundo Raphael Osório, essa forma de marcação de tempos possibilita ao regente


adquirir grande precisão em seus gestos. Além dos tempos marcados de forma diferente
do proposto pelas técnicas tradicionais, esse gestual recomenda uma posição de braços
que permite que o movimento da regência não provoque movimento com o cotovelo, o
que resulta em uma regência coral mais precisa. Essa precisão, segundo o entrevistado,
permite ao regente trabalhar nuances com maior detalhamento

Para poder reger nesse campo horizontal imaginário, você tem que ter o braço
esticado. E, desse braço esticado, você dá os movimentos. Se você estiver com
o braço muito perto do corpo, os movimentos são menos claros pois se misturam
com os movimentos do cotovelo. Com essa técnica do braço, quando se faz essa
figura, não se movimenta quase o antebraço. O gesto é bem mais claro. Se for
fazendo gestos muito próximos, o cotovelo já entra no meio. Para uma orquestra,
isso é catastrófico. Fica com o movimento do braço, do antebraço e cria uma
mistura danada. Com o gesto do Carlos Alberto, dá para fazer as nuances, mais
piano, mais forte. O plano de base fica ao horizonte, mas a uma certa distância
do corpo. Inclusive, uma exigência de Carlos Alberto, se for fazer piano, você
faz aproximando do corpo. Se for fazer forte, se faz afastando do corpo.
(informação verbal)

É possível relacionar o relato de Raphael com dois parâmetros do trabalho de


Fonseca que foram importantes na construção do reconhecimento conferido ao regente
mineiro: o trabalho com as nuances e polifonia e a precisão na regência. Segundo
Raphael, o trabalho das nuances era presente desde o início da aprendizagem do
repertório. Fonseca conseguia retratar nos gestos o que desejava com grande clareza.
“Sempre integrou no gestual, além da clareza, a interpretação das nuances. (...) Eu achava
que ele já era bastante perfeccionista no ensaio de naipe separadamente. Perfeccionista
com as nuances, a pronúncia de cada palavra.”(informação verbal)

Fonseca relata em entrevista cedida a Santos que também utilizava a técnica de


Sergiu Celibidache, com quem Fonseca teve aulas durante o período em que morou na
Europa. Fonseca relata que essa técnica permite tocar o coro como um instrumento. Ao
utilizar essa técnica, os gestos de Fonseca paravam de indicar marcações de tempo e

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passavam a indicar contornos melódicos. Essa regência é muito mais horizontal que
vertical, ideal para repertórios compostos com pensamento contrapontístico.

Diversas referências fazem considerações positivas acerca da habilidade de Carlos


Alberto quanto a interpretação de peças do período da renascença, repertório que
apresenta fortes características contrapontísticas e polifônicas. Segundo Francisco
Campos, composições da renascença eram a especialidade do Ars Nova, como relata
Campos. Ambos os ex-alunos entrevistados fazem menção ao exaustivo trabalho de
equalização de vozes que Fonseca desenvolvia com o coro durante os ensaios. Ambos os
entrevistados falam acerca da busca de Fonseca por um minucioso balanceamento entre
as vozes, de forma que a polifonia e todos os elementos da peça fossem ouvidos.

Segundo Willsterman Coelho (2009, p. 60), Fonseca regia todo o repertório de


memória. Saber o repertório de memória permitia ao maestro maior liberdade e
entendimento para explorar questões interpretativas. Segundo o autor, todos os aspectos
de interpretação eram exaustivamente trabalhados.

5.2. Motivação

A motivação dos coralistas é fundamental para desenvolver um trabalho de


qualidade. Fonseca se preocupava em manter seus cantores motivados. O Ars Nova era
um coro amador e seus integrantes frequentavam os ensaios pela vontade de fazer música.
Fonseca sempre foi conhecido por ser um homem muito bem – humorado. Segundo
Willsterman Coelho (2009, p. 59), Fonseca ganhou o apelido de “rei dos trocadilhos”.
Segundo o autor, Carlos Alberto utilizava esse recurso tanto para alegrar os coralistas
quanto para aliviar tensões pré-apresentação. Por vezes, o regente utilizava trocadilhos
para dar alguma orientação técnica ou interpretativa de forma descontraída. Um exemplo
disso é o trocadilho “I raso é um arraso”1 que Coelho apresenta em seu texto. Fonseca
fazia também brincadeiras para aliviar momentos de tensão. Uma brincadeira clássica do
regente mineiro é mostrar a embalagem de um creme dental “Sorriso” para o coro
momentos antes de iniciar a apresentação. Esse trocadilho é utilizado até hoje por ex-
alunos de Fonseca, como Angelo Fernandes. Embora Fonseca tivesse um espírito sociável
e piadista, não admitia questionamentos sobre suas escolhas como regente. Os cantores
deveriam seguir suas orientações sem emitir julgamento.

1
Esse trocadilho faz referência à sonoridade desejada por Fonseca para a vogal I.

33
5.3. Roteiro de ensaio

Esse tópico procura compreender de que forma Fonseca organizava seu tempo à
frente do coro. O roteiro de ensaio e a organização do tempo são importantes ferramentas
na regência coral, otimizando o tempo de ensaio.

Comparando as informações verbais colhidas nas entrevistas realizadas, percebe-


se que Fonseca modificou sua forma de regência e questões estruturais do coro ao longo
dos anos. Raphael relata que os ensaios eram realizados com o coro separado em naipes.
Cada naipe contava com um chefe de naipe. Essa função era conferida a um membro que
tenha realizado um curso de regência oferecido por Fonseca. Os ensaios aconteciam com
o auxílio de um piano. Osório relata também a existência de um preparador vocal que
auxiliava na construção da sonoridade do Ars Nova. Segundo informação verbal do
entrevistado, a sonoridade era marca importante da identidade do coro. Durante os anos
em que Francisco Campos integrou o Ars Nova, os ensaios aconteciam com os naipes
juntos e sem o auxílio de piano. Segundo informação verbal de Campos, Fonseca utilizava
uma escaleta como referência, e somente em momentos de grande necessidade. Não havia
chefes de naipe e o entrevistado não menciona o curso de regência oferecido por Fonseca
e realizado por Raphael Osório.

5.3.1. Aquecimento

Segundo Willsterman Sotani Coelho (2009, p. 71), Fonseca utilizava um roteiro


de ensaio convencional, (aquecimento, seção de aprimoramento e repertório pronto). Os
encontros se iniciavam com a seção de aquecimento. Willsterman Coelho (2009, p. 64)
relata que a seção de aquecimento não era dirigida por Fonseca. Segundo informações
verbais de Raphael Osório, nos momentos em que o coro ensaiava dividido em naipes,
Fonseca ficava com o naipe das sopranos.

5.3.2. Montagem de repertório

O ensaio tinha sequência com a seção de montagem de repertório. Segundo o


Willsterman Coelho, essa seção podia ser dividida em três partes:

5.3.2.1. repertório novo,

5.3.2.2. refinamento de repertório e

5.3.2.3. repertório assimilado.

34
5.3.2.1 Repertório novo

O primeiro contato do coro com o repertório em ensaio, segundo Willsterman


Coelho, era através de uma contextualização histórica feita por Fonseca. Essa
contextualização continha informações histórica sobre a peça, sobre o compositor e sobre
seu estilo. Francisco Campos relata em entrevista que Fonseca por vezes era
excessivamente meticuloso para a primeira leitura. “Ele queria que tudo já viesse.”
(informação verbal) Fonseca exigia que o coro respeitasse marcações de dinâmica e
andamento desde a primeira leitura. Coelho (2009, p. 72) traz um relato de entrevista
realizada com Angelo Fernandes, ex-aluno de Fonseca. Nesse relato, o entrevistado
afirma que a leitura de repertório novo é uma atividade que exige grande atenção e é
cansativa. É ideal que ocorra ao início do ensaio. Aguiar, ex-coralista entrevistado por
Willsterman Coelho, relata que Fonseca desejava que a primeira leitura não fosse de
grande êxito. Ele dizia: “Uma primeira leitura tem de fracassar.” (COELHO, 2009, p.78).
Segundo o entrevistado, Fonseca acreditava que se o coro se sentisse muito confortável
com o repertório logo na primeira leitura, o nível de atenção diminuiria e comprometeria
o ensaio.

Segundo Willsterman Coelho, caso a leitura fosse de um repertório mais familiar


ao coro, a primeira leitura seria realizada com todas as vozes cantando simultaneamente.
Os cantores poderiam ser instruídos a cantar com nomes de notas, um fonema específico
ou com o próprio texto da partitura. Segundo Coelho, o regente desejava do coro desde a
primeira leitura precisão das notas e rítmica. Após um tempo de ensaio de naipe, uma
nova leitura conjunta era realizada. Caso a leitura fosse de uma peça que apresentasse
homofonia e harmonia complexa, Fernandes diz em entrevista cedida a Coelho que
Fonseca “agregava os naipes um a um, do mais grave até o mais agudo, até completar o
coro.” (COELHO, 2009, p.76). Por fim, segundo Coelho, caso a leitura fosse de um
repertório polifônico, o regente agregava os naipes de acordo com as entradas indicadas
na partitura. A fonética também era orientada por Fonseca desde os primeiros contatos
com o repertório. Fonseca adotava procedimentos diferentes para cada língua. Quando
um membro do coral era falante da língua a ser cantada, orientava os demais quanto à
pronúncia correta.

35
5.3.2.2. Refinamento de repertório

Com a leitura já maturada, Fonseca trabalhava as alturas e a afinação. Para isso,


segundo Willsterman Coelho, Fonseca fazia uso constante de piano ou teclado eletrônico.
Segundo alguns ex – coralistas entrevistados por Coelho (2009, p. 78), o uso do piano
tornava o coro dependente do instrumento. Caso houvesse dificuldade em alguma
passagem específica do repertório, Fonseca o repetiria quantas vezes fosse necessário, até
que o problema fosse resolvido. Existem muitos relatos sobre a paciência de Fonseca em
repetir até que o coro compreendesse como ele desejava. Fernandes diz a Coelho (2009,
p. 72) que Carlos Alberto era muito objetivo quanto à escolha de passagens específicas
para serem trabalhadas na seção de aprimoramento, e . Segundo Coelho (2009, p. 79 –
80), alguns parâmetros eram utilizados por Fonseca na construção da sonoridade do Ars
Nova: 1) cor do naipe, 2) fluência do estilo, 3) inflexão da frase musical, 4) andamento e
5) expressão corporal e facial do coro.

Segundo Coelho, (2009, p. 75), Fonseca realizava alterações na disposição e na


composição de naipes. Francisco Campos relata verbalmente que Fonseca determinava a
disposição dos integrantes no coro. Anos depois, segundo relato verbal de Raphael
Osório, os coralistas podiam escolher seus lugares. Coelho (2009, p. 86) relata em seu
texto que caso o coro não conseguisse manter o pulso em uma passagem, Fonseca
indicava aos coralistas “sentir cada colcheia" e tomassem conhecimento da real duração
das notas.

5.3.2.3. Repertório assimilado

Angelo Fernandes, ex-aluno de Carlos Alberto, diz a Coelho (2009, p. 73) que o
regente mineiro deixava para o final do ensaio a execução do repertório assimilado.
Segundo o Fernandes, a leitura e execução de repertório assimilado é uma atividade
prazerosa. Quando o repertório está maturado e tem suas nuances trabalhadas, executá-lo
torna-se realmente fazer música. Terminar o ensaio com uma peça madura traz uma boa
sensação e confere motivação aos coralistas. Segundo Fernandes, cantar o repertório
assimilado exige um nível de aquecimento que o coro só alcança após algum tempo
cantado. Ao início do ensaio, o coro não tem aquecimento para realizar uma peça com
perfeição. As leituras das peças assimiladas aconteciam da capo al fine. Caso houvesse
algum problema durante a execução, a peça seria trabalhada na seção de aprimoramento
do ensaio seguinte.

36
É importante que o coro tenha contato esporádico com uma obra do repertório
assimilado. Fonseca exigia do coro um grande detalhamento e equilíbrio. Ensaiar esse
repertório prevenia que o coro perdesse a habilidade vocal e musical necessária para a
execução de uma obra. Fonseca era muito meticuloso no equilíbrio entre as vozes e em
manter a identidade sonora do Ars Nova. A fim de que o nível de qualidade musical fosse
mantido, o repertório não poderia ficar adormecido por grandes períodos.

5.4. Técnica de canto


A unidade sonora do Ars Nova foi um fator que conferiu grande reconhecimento
ao coro durante os anos de titularidade de Fonseca. Diversas referências compreendem
essa conquista como resultado de um exaustivo e dedicado trabalho técnico e fonético. O
Ars Nova adquiriu uma sonoridade única, elemento que se tornou parte da identidade do
grupo. O coro desenvolveu, sob a orientação de Fonseca, unidade timbrística entre as
vozes. Raphel Osório relata em informações verbais colhidas em entrevista que essa
unidade era tão desenvolvida que “...um naipe era quase que uma voz só. Todas as vozes
iam que para a mesma cor. Uma das principais regras do coro era essa unidade”
(informação verbal). Segundo Willsterman Coelho (2009, p. 65), Fonseca se pautava nos
conhecimentos e no ferramental técnico de canto de Eládio Pérez-Gonzáles, barítono
paraguaio radicado no Brasil.

Segundo Coelho, um dos pilares da “unificação da sonoridade” que Fonseca


adquiriu em seu coro foi o tratamento dado às vogais. Segundo relato de Coelho relata
que “todas as vogais tinham de ter a mesma abertura, para não haver diferença de
impedância” (COELHO, 2009; 82). Segundo relato do autor, a medida de um dedo entre
os dentes do maxilar e da mordedura era a medida que, com os lábios relaxados, os
cantores deveriam cantar as notas graves, médio graves e médio agudas. A fim de realizar
os fonemas |u| e |o|, os cantores poderiam mover a lateral da boca formando uma
embocadura mais arredondada. A abertura lateral, que lembra um sorriso, não era um
artifício muito recomendado. Sobre a abertura da boca recomendada por Fonseca, Coelho
diz: “...quanto mais agudo, mais aberto, mas, em cada registro, todas as vogais deveriam
manter essa mesma abertura.” (COELHO, 2009, p. 82) Francisco Campos, em suas aulas
de canto, faz recomendações similares a seus alunos.

Quanto a apoio e respiração, por serem aspectos básicos do canto, Fonseca apenas
direcionava a prática dos cantores ao resultado que buscava. O aprendizado da técnica de

37
canto era uma atividade confiada ao coralista. Coelho relata que caso algum cantor
apresentasse deficiência técnica ou destoasse do equilíbrio timbrístico do coro, esse seria
convidado por Fonseca afazer aulas de canto. Coelho relata que “para transmitir a
mensagem (indicações de apoio), apenas dizia com ênfase a palavra apoio, sem maiores
explicações.” (COELHO, 2009, p. 87). O autor diz que Fonseca se preocupava muito em
desenvolver no coro uma eficiente respiração coral. O autor especifica que Fonseca não
utilizava esse recurso apenas para criar um fluxo contínuo de som. Ele diz: “Não apenas
onde fosse estritamente necessário, devido a uma frase longa, mas também ligando as
frases umas às outras, principalmente em obras pouco ritmadas.” (COELHO, 2009, p. 87)
Segundo relato de Coelho, os cantores eram orientados por Fonseca a respirar sempre na
última sílaba da palavra e voltar a cantar na primeira sílaba da palavra seguinte. Segundo
o autor, em alguns repertórios específicos, Fonseca apontava onde o coro deveria respirar.
Segundo Coelho, (2009, p. 64) o Ars Nova contou com um preparador vocal, que
auxiliava na construção da sonoridade em a superar dificuldades técnicas.

Segundo Coelho (2009, p. 27), a impostação vocal era outro pilar da unificação
da sonoridade do Ars Nova. Angelo Fernandes relata que Fonseca recomendava que seus
cantores utilizassem “impostação facial da voz e na cobertura da região aguda.”
(FERNANDES, 2005; 69) A sonoridade dos graves, segundo relato do autor, era formada
pela ressonância dos espaços localizados ao fundo da boca. Segundo Fernandes, Fonseca
pedia que os cantores direcionassem sua voz contra o palato duro, o que, segundo o autor,
garante uma sonoridade mais brilhante, independente da dinâmica.

Quanto ao treino das dinâmicas, Willsterman Coelho relara que Fonseca se


preocupava em treinar especialmente os pianíssimos. Segundo o autor, alguns exercícios
eram propostos ao coro pelo regente a fim de que o coro tivesse condições de ter grande
controle e aptidão para cantar em diversas dinâmicas. Um dos exercícios propostos por
Foseca era um vocalise, que segundo as palavras de Coelho, era “desenhado em saltos de
oitava, em pianíssimo, com mudanças arbitrárias de vogal cantada.” (COELHO, 2009, p.
89) Segundo o Wisllsterman Coelho, esse exercício beneficiava especialmente a região
aguda. Afim de trabalhar a região grave, o autor diz que Fonseca aplicava o mesmo
exercício em fortíssimo. Coelho também relata que, a fim de trabalhar os dois registros,
Carlos Alberto aplicava o exercício propondo uma dinâmica intermediária. Coelho, nas
entrevistas que realizou com ex-coralistas do coro Ars Nova, coletou o relato de um
procedimento que Fonseca utilizava para ilustrar o pianíssimo que desejava. Segundo o

38
autor, Fonseca retirava vagarosamente do bolso uma pena ou linha e a deixava cair no
chão, tendo-a soltado em altura acima de sua cabeça. Segundo um entrevistado de Coelho,
o regente dizia: “Então, gente, é esse o piano que eu quero.” (COELHO, 2009; 89)

5.5. Exercícios e dinâmicas

Fonseca exigia um grande nível de concentração dos cantores durante o ensaio.


Para melhorar a habilidade de concentração e de reatividade à regência, Carlos Alberto
utilizava exercícios. Coelho relata esses exercícios eram vocalises realizados de duas
formas: 1) vocalise em cânone ou com 2) alterações de dinâmica, andamento e
articulação.

A fim de treinar os coralistas a cantarem um repertório sem os gestos do regente,


Fonseca fazia um exercício que consistia em reger sem mexer os braços. Fonseca iniciava
uma peça e parava de reger com os braços, passando a dar somente sinais visuais. Como
forma de incentivar que os cantores estudassem o repertório, Fonseca realizava
verificações em quartetos nos ensaios do Ars Nova. Segundo Coelho (2009, p. 69),
qualquer cantor poderia ser chamado a compor um quarteto em qualquer ensaio.

Fonseca se preocupava em manter os cantores motivados e felizes em integrar o


coroe se preocupava que os cantores tivessem boa relação entre si. Fonseca aplicava
dinâmicas ao coro que permitiam a criação de confiança e cumplicidade entre os
coralistas. Segundo Coelho, “a presença de muitas pessoas numa única sala, em silêncio
e com as luzes apagadas é uma maneira de levar as pessoas à desinibição e à confiança
mútua.” COELHO (2009, p. 70) Fonseca propunha improvisações musicais com as luzes
apagadas. Essa dinâmica aproximava os membros do coro, tirando a inibição e criando
sentimento de unidade. A fim de criar unidade de grupo e reatividade, Coelho (2009, p.
70) relata que Fonseca utilizava a dinâmica do aperto de mão em roda. Nessa dinâmica,
todos os integrantes do coro deveriam ficar em roda. Um aperto de mão deveria passar
por todas as mãos até retornar ao seu ponto de origem.

A fim de treinar o coro a interpretar diversos estilos de música, compreendê-los


e proporcionar versatilidade, Coelho informa que Fonseca adaptava peças do repertório
do coro para outros estilos. Um exemplo dado no texto é “transformar uma peça lenta em
um jazz.” (COELHO, 2009, p. 79) Os cantores deveriam interpretar o repertório com
essas alterações. A fim de treinar a percepção rítmica do coro, Fonseca criava diversas
sílabas percussivas que deveriam se cantadas pelo coro no lugar do texto original. Para

39
criar maior precisão rítmica, Fonseca convidava os cantores a cantarem o repertório com
fonemas escolhidos por ele ou com o texto original da peça, mas de forma portato ou
staccato. Em peças de forte caráter rítmico, segundo o Willsterman Coelho, Carlos
Alberto pedia que os coralistas cantassem “Como se não tivesse vogais, como se tivesse
só as consoantes.” (COELHO, 2009; 86) Para que os cantores não alongassem a duração
das notas, Fonseca fazia uma analogia que Coelho relata em seu texto: “Molhou o dedo,
colocou no ferro [quente], acabou. Ninguém segura o dedo lá no ferro.” (COELHO, 2009,
p. 83) A fim de exercitar o caráter melódico de algumas peças, Coelho relata que Fonseca
indicava ao coro cantar o repertório, mas somente os sons das vogais do texto. Segundo
Coelho, Fonseca procurava que o exercício resultasse em um grande melisma.

Segundo Coelho (2009, p. 80), Carlos Alberto incentivava o coro a ter


movimentos corporais que refletissem o ritmo da peça. Segundo relatos de ex-coralistas
que Coelho reúne em seu texto, o próprio regente se balançava em frente ao coro. Os ex-
coralistas também relatam que Fonseca recomendava ao coro que interpretasse o
repertório incluindo expressões faciais. Esse recurso auxiliava a transmissão de sentido
da peça. Segundo relatam os ex-alunos, Fonseca exigia que enquanto um naipe não
estivesse cantando, momento que o regente nominou de “pausa de expressão”, os
coralistas daquele naipe deveriam manter a expressão facial, interpretando o texto da
peça, mesmo que em silêncio.

5.6. Trabalho fonético

Segundo Coelho, a fonética era uma das principais preocupações de Fonseca. Ex-
alunos entrevistados por Coelho, trazem a informação de que Fonseca “...era
extremamente cuidadoso para que todo o texto fosse entendido pelo público falante do
idioma.” (COELHO, 2009, p. 81). O trabalho fonético que Fonseca realizava no coro Ars
Nova não era somente um trabalho de interpretação. O que conferia ao trabalho maior
sucesso, era o equilíbrio entre todos os fonemas. como Willsterman Coelho relata:

Aparentemente, Fonseca partia do princípio de que deveria haver equilíbrio entre


todos os fonemas executados, de modo que nenhum ficasse mais audível ao
menos audível que os outros, mas ao mesmo tempo, conferindo às palavras a
devida acentuação tônica e às frases a inflexão correta. (COELHO, 2009, p. 81).

Um importante parâmetro do ferramental de Fonseca é o equilíbrio, tanto nas


vozes quanto nos fonemas. Coelho relata que a fim de criar esse equilíbrio entre os

40
fonemas, Fonseca modificava algumas sílabas adicionando ou subtraindo algum fonema
para que outro ganhasse mais destaque. Para que os cantores se lembrassem dessas
alterações, Fonseca fazia trocadilhos que remetessem ao som desejado pelo regente no
fonema.

Fonseca se atentava às consonantes fricativas mudas, tal como |f| e |s|. Segundo
Coelho, a sonoridade dessas consoantes é “...brilhante, pois produz frequências muito
agudas, muito acima dos registros da voz humana, e por isso, pode ser ouvido com
facilidade num contexto de música coral.” (COELHO, 2009, p. 82). Coelho relata que a
fim de que as consoantes |l|, |m| e |n| não fossem encobertas pelos outros fonemas, Fonseca
pedia aos cantores que adicionassem uma vogal neutra à essa consoante. Segundo o autor,
o Shwa era utilizado, algo entre a sonoridade dos fonemas |ê| e |á|. Coelho relata que esse
procedimento também era aplicado na ocasião de encontros consonantais onde uma
consonante de menor intensidade sonora antecede uma de maior intensidade.

Em notas muito agudas, Carlos Alberto substituía o fonema |g| por |k| segundo
relato de Coelho. O autor dá o exemplo da palavra latina gratia, que nessa situação, seria
pronunciada |kratia|. Esse mesmo procedimento poderia ser aplicado com a consonante
|b|, que seria substituída por |p| e por |d| que seria substituída por |t|. A fim de evitar
“golpes” na passagem do fonema |p| para a vogal, Coelho informa que Fonseca
recomendava a inserção de um pequeno |f| antes do |p|, de forma que o ataque fosse
suavizado e permitisse mais precisão. O mesmo, segundo o autor, pode ser aplicado com
os fonemas |t| e |k|, onde um fonema fricativo poderia ser inserido de forma discreta antes
da vogal.

Willsterman Coelho (2009, p. 84) relata que para Fonseca o fonema |r| deveria ser
sempre alveolar quando em idioma estrangeiro. Coelho diz em seu texto que a escolha de
usar o |r| velar quando em português brasileiro era uma escolha interpretativa que
resultava em padronização de sonoridade, e não somente uma escolha de dicção. Coelho
obteve acesso a materiais fonográficos raros do coro Ars Nova. Comparando gravações,
o autor percebeu que durante as décadas à frente do coro, Fonseca teve opiniões diversas
sobre o |r| velar e alveolar. Hora tendendo a um em todas as ocasiões, hora modificando
sua característica sonora de acordo com o repertório. A fim de que o público ouvisse uma
articulação melhor definida nas apresentações, Willsterman Coelho (2009, p. 86) relata
que Fonseca pedia a um ou dois coralistas para que cantassem um |l| em todas as
mudanças de notas, enquanto os outros integrantes cantam o texto original. Coelho (2009,
41
p. 88) relata que Fonseca, em determinadas ocasiões, recomendava que os cantores
modificassem a cor de uma vogal específica. Algumas vezes, especificava exatamente
como queria a sonoridade daquela sílaba. Segundo o autor, se houvesse um cantor
destoando em relação ao grupo, Fonseca faria recomendações para aquele cantor em
específico.

5.7. Postura à frente do Ars Nova

Segundo informações verbais colhidas em entrevista de Raphael Osório, Fonseca


era uma pessoa humilde e muito educada. Segundo o entrevistado, a forma como Carlos
Alberto apresentava o repertório ou se dirigia ao público era bastante característica e
agradava tanto a plateia quando fazia com que os cantores se sentissem incluídos. Raphael
Osório confessa ter adotado a forma de apresentar o coro e o repertório de Fonseca.

... guardei de Fonseca também de certa forma, a forma de se apresentar em


público com o coro. A forma de agradecer os aplausos, a forma de apresentar o
coro. Os coros daqui (Suíça), inclusive, apreciam muito. Eles se sentem
incluídos. Carlos Alberto era muito claro nesse sentido. Tem maestros que
chegam no palco com o coro, o povo aplaude e ele sai do palco com o coro.
Carlos Alberto não. Ele fazia o gesto para mostrar o coro. O coro não saudava,
mas ele o mostrava. Sempre quando ele falava de composições dele, ele sempre
usava a primeira pessoa do plural. Dizia “a nossa composição”. Sempre de uma
grande elegância. (informação verbal)

Ao início do concerto Fonseca se virava para o público e fazia as apresentações.


Apresentava o coro, o repertório, seu histórico e a tradução das letras. Falante de francês,
alemão e inglês. Fonseca realizava essas introduções mesmo no estrangeiro.

Sobre a postura de Fonseca em frente ao coro, Willsterman Coelho aponta que


Fonseca era muito respeitado e possuía grande autoridade. Por meio de entrevistas com
os ex-coralistas Antoniol e Silva, afirma: “A simples presença dele alterava o
comportamento dos cantores, sem necessidade de palavras” COELHO (200958). os
entrevistados de Coelho também relatam:

Maestro Fonseca chegava em silêncio à sala e assumia a regência mesmo durante


a execução de uma peça, e o som do Coro mudava completamente. Observando
outros aspectos da personalidade de Fonseca, podemos inferir como ele
conseguiu adquirir essa autoridade. (COELHO, 2009, p. 59)

5.8. Seleção de novos cantores

42
Através de informações verbais colhidas nas entrevistas realizadas com os ex-
alunos Raphael Leite Osório e Francisco Campos Neto foi possível mapear as
características da prova de seleção de novos cantores do Ars Nova. Ambos os
entrevistados fizeram considerações sobre essa seleção e ambos ressaltaram as
dificuldades do processo de seleção. Segundo informações verbais cedidas pelos
entrevistados, os integrantes do Ars Nova deveriam se encaixar a um perfil de sonoridade
muito particular e característica, elemento identitário do grupo. Caso o cantor não se
encaixasse, ele ou não seria aceito ou seria recomendado a procurar aulas de canto.
Raphael Osório fala acerca das habilidades musicais que os candidatos deveriam ter para
ter bom resultado na seleção. “Imagino que ele escolhia os coristas pela diversidade. Se
não fosse leitor de música, tinha uma voz mais interessante” (informação verbal) Esse
relato possibilita compreender que leitura musical não era uma obrigatoriedade.

Segundo informação verbal de Francisco Campos a seleção tinha duas etapas: a


primeira, uma prova de canto e leitura. A segunda, uma entrevista. Campos relata em
entrevista cedida:

Era uma banca. Carlos Alberto, Angela, obviamente e as vezes o Ming Feres,
que era nosso amigo e foi aluno da frauline Vinterfeldt, foi meu professor
também. Às vezes a mim e uns três ou quatro do coro. Isso, formando a banca.
Aí, o candidato entrava para cantar. Tinha a leitura a primeira vista e canto.
Depois, na sala do coro propriamente dita, o coro estava lá. O candidato ia à sala
do coro para entrevista. A entrevista era com os colegas. Não era formal. Na sala,
todo mundo sentado. Perguntava-se o que faz, estuda, essas coisas. Cada um
perguntava uma coisa. Não tinha nada arrumado, não. Aí, aprovado lá e cá,
entrava. Recebia uma pasta com partituras dos próximos dois meses.
(informação verbal)

Segundo Francisco Campos, esses dois meses eram um período probatório.


Depois desse tempo haveria uma segunda prova: cantar o repertório todo em quartetos.
“Tinham de cantar tudo! Inteiro. E eram os antigos que vinham junto. Não era um quarteto
de novatos.” (informação verbal)

Através da trajetória de Raphael Osório no Ars Nova, é possível compreender que


haviam os que tinham os melhores resultados na seleção e eram efetivamente aprovados
a cumprirem os dois meses e serem novamente avaliados e os que eram aprovados para
se tornarem suplentes. No caso de um cantor do Ars Nova precisar se desligar, um
aprovado à suplência ocuparia sua vaga.

43
Era um júri, e esse júri que decidia quem passava ou não para o coro. Inclusive,
quando passei, tinha passado como suplente. Na época, era uma prática. Tinham
os que passavam efetivamente, e os como eu. Quando passei, tinha uma vaga
para tenor e seis meses adiante, teria uma viagem para a Europa. Um corista
antigo do Ars Nova ganhou esse concurso que prestei. Ele ganhou a vaga e eu
fiquei como suplente. Três meses depois, teve um corista que teve uma
iluminação e se mudou para um monastério no Rio de Janeiro e liberou a vaga.
No lance eu acabei ganhando a vaga e a viagem à Europa. (informação
verbal)

Segundo informação verbal de Campos, a avaliação em quartetos era frequente e


acontecia em quase todos os ensaios. Segundo o entrevistado, a possibilidade de ser
chamado a qualquer momento fazia com que todos estudassem o repertório. Segundo os
entrevistados, Fonseca era muito rigoroso com a presença nos ensaios, pontualidade e
estudo. Segundo Campos, os ensaios aconteciam duas vezes por semana. As presenças
eram computadas e repetidas faltas poderiam resultar em um convite de desligamento do
Ars Nova.

5.9. Curso de regência para auxiliares do coro


Segundo informações verbais cedidas Raphael Osório, Fonseca contava com
ensaiadores de naipe. Os ensaiadores de naipe eram membros do coral, estudantes de
regência que se voluntariavam a ter aulas de regência coral com Fonseca e auxiliá-lo
durante o aquecimento e leitura de repertório. Caso um membro desejasse atuar como
ensaiador de naipe no Ars Nova, a realização do curso era obrigatória. Não era um curso
vinculado à universidade. Os que o realizavam, ganhavam ao fim um certificado que
Carlos Alberto fazia a próprio punho. Segundo as palavras de Raphael Osório, “Ele me
deu aulas de regência. Eu não tenho diploma de regência dado pela universidade. Foi um
curso que ele me deu durante dois anos como integrante do Ars Nova. Ele me deu um
certificado escrito da mão dele. Nada credenciado.” (informação verbal)

Raphael relata que todo o curso era ministrado tendo como guia uma apostila.
Segundo ele, esse material apresentava um gestual de regência bastante específico,
propondo a marcação de tempos posicionados no espaço, orientados por um plano
horizontal. Segundo o entrevistado, esse livro era de autoria do educador alemão Joaquim
Koellreutter. “Do Koellreutter, eu lembro que tinha um livro que não existe mais.
Fotocopiei o livro inteiro de regência coral. Nesse livro, tinha um gesto bem específico”.
(informação verbal) Essa informação contrasta com o que dizem Santos (2001) (2017) e
44
Coelho (2009). Pelo que se sabe, Koellheutter não produziu nenhum material de regência
em seus anos de atividade.

Segundo Willsterman Coelho (2009, p. 94), Fonseca compilou um material que


utilizava como apostila em suas aulas de regência. Intitulado “Material de Regência”, o
autor conta que o material tinha como capa uma foto de Sergiu Celibidache. Informações
verbais relatadas por Raphael Osório reforçam a relação desse material com Celibidache.
Segundo o entrevistado, nele se orientava realizar as marcações de tempo tomando como
base o plano horizontal, assim como propunha o regente romeno. Hoje, essa apostila se
encontra indisponível e até o fechamento desse trabalho, não foi possível localizar esse
material.

6. Fonseca compositor
Enquanto compositor, Carlos Alberto Pinto Fonseca deixou uma produção que
totaliza 169 obras, como afirma Cristina Yollanda Gallo. Em sua tese de mestrado,
Elementos umbanda y candomblé en la obra para coro mixto ―a capella compuesta por
Carlos Alberto Pinto Fonseca. Aportes para su interpretación, Cristina Gallo identifica
as obras de Fonseca por forma e instrumentação:

Lá se observa que, das 169 obras compostas e arranjadas por Fonseca, 53 foram
compostas para coro misto a capela, 40 são arranjos para coro misto, 33
compostas para coro infantil e 7 são arranjos para a mesma formação coral.
Compôs 17 obras para canto e piano. Quanto às obras instrumentais, 9 são para
piano e 2 para guitarra. A produção de música de câmara é constituída por 3
obras para canto, piano e flauta. 1 para orquestra de cordas, 2 para quarteto de
cordas, 1 para 3 vozes e percussão y outra para 11 vozes, soprano solista,
platillos, bumbo, tantã e piano. (GALLO, 2011, p. 32)

Segundo Gallo, as composições para coro a capela, canto e piano, violão solo,
piano e flauta, canto solo, e coro acompanhado com outras instrumentações, constitui a
maior parte da herança de Carlos Alberto enquanto compositor.

Os textos utilizados nas composições e arranjos de Fonseca eram extraídos de


diversas fontes. Segundo Chantal Santos (2001, p. 30), foram usados por Carlos Alberto
textos de Drummond de Andrade, Manuel Bandeiras, Rabindranat Tagore, Pablo Neruda,
trechos da bíblia e textos relacionados às religiões afro – brasileiras Umbanda e
Candomblé. Chantal Santos traz em seu texto uma citação de carta que o poeta Carlos

45
Drummond de Andrade enviou a Fonseca parabenizando-o, na ocasião da composição de
O Poema da Purificação (1974), que utiliza como texto versos do poeta.

Caro Carlos Alberto

Você me proporcionou uma alegria muito especial com sua composição e sua
carta. Aquele poeminha de purificação ficou sendo um resíduo mais ou menos
esquecido de minha mocidade, com seus problemas e angústias. E você pegou
dessa peça quase arqueológica e edificou sobre ela uma pura e comovedora obra
musical, de alta categoria. Sua carta, igualmente, é daqueles testemunhos que
melhor espelham o artista e o homem, tão criativo aquele, e tão correto este...
(SANTOS 2001: 39)

Segundo Chantal Santos, Fonseca trocou correspondências com Drummond de


Andrade durante as décadas de 70 e 80.

6.1. Fonseca, a Umbanda e o Candomblé

Muito notórias entre suas composições, Fonseca produziu uma série de 16 obras
influenciadas pela música feita nos terreiros de Umbanda e Candomblé. Santos apresenta
em seu texto um trecho de entrevista cedida por Fonseca onde o regente mineiro explica
o início de seu interesse em compor música com influência afro-brasileira:

Meu interesse em escrever música de inspiração afro-brasileira surgiu depois de


ouvir um conjunto chamado Cantores de Céu, com uma sonoridade fascinante,
incluindo vozes graves. Depois de ouvir este conjunto, ganhei um livro contendo
400 pontos riscados, cantados e dançados de Umbanda. Comecei a partir dos
textos deste livro a criar melodias por conta própria. (SANTOS, 2001, p.30)

O livro citado por Fonseca foi publicado no ano 1962 pela Editora Eco. Lucas
Vilalta, Filósofo e umbandista consultado, reconheceu essa publicação como um catálogo
de pontos cantados, textos de orações escritas para serem cantadas durante as giras do
terreiro. Algumas das letras contidas no livro eram utilizadas no terreiro frequentado por
Vilalta. No capítulo Introdução do livro 400 pontos cantados riscados de Umbanda e
Candomblé, José Ribeiro de Souza explica a funcionalidade do ponto cantado dentro do
ritual da Umbanda utilizando um trecho do livro de seu confrade José Antônio Barbosa,
Manual dos chefes de terreiros:

O ponto cantado é de suma importância no ritual da Umbanda, é uma invocação


ou fórmula de chamada ou de expulsão, podendo atrair um espírito benévolo ou
servir para afastar um intruso ou zombeteiro. Ao cantar o ponto, (curimba)

46
estamos a rezar cantando, chamamos assim nossos guias as falanges protetoras
que devem assistir o ritual. (...) os pontos cantados apresentam a alta vibração da
nossa Umbanda. É com eles que as falanges vêm se comunicar conosco na terra,
e suavizar os nossos sofrimentos através de seus sábios conselhos. (400 Pontos
Cantados Riscados de Umbanda e Candomblé, s/n)

Em palestra ministrada em evento do GEPEMAC, Cristina Gallo demonstrou trecho de


uma entrevista onde Fonseca falou sobre quanto seu interesse pelo repertório afro –
brasileiro teve início.

Olha, eu li Jorge Amado antes de ir prá Bahia. Eu li o Mar Morto. Quando eu


cheguei lá, eu sentia como se os atabaques estivessem tocando no fundo do
mundo, entendeu, que havia aquele mistério no ar, aquela coisa, e, desde então,
eu tive assim, muita atração pelo repertório afro. Eu acho que é uma riqueza
cultural e folclórica do nosso país que não tem tamanho. Uma coisa que não tem
igual em lugar nenhum. (informação oral)

Em entrevista cedida a Mauro Chantal Santos, na ocasião da elaboração de sua


dissertação de mestrado, Angela Coelho relata a importância da Bahia na trajetória de
Fonseca, especialmente como compositor. Segundo ela,

Profundo admirador de Jorge Amado, Carlos Alberto se permitiu sofrer todas as


influências da cultura do estado da Bahia, no período em que estudou lá, absorvendo
importantes elementos, presentes em sua produção artística brand sun cialis. (SANTOS,
2001, p. 17)

Segundo o autor, todas as peças de temática afro-brasileira de Fonseca foram


compostas após o período em que morou na Bahia. Santos traz em seu texto um relato
onde Fonseca considera que o período em que morou na Bahia influenciou toda a sua
produção composicional. “... mas a música de inspiração afro-brasileira marcou toda a
minha produção como compositor e arranjador.” (SANTOS, 2001: 31)

6.2. Estilos e processos composicionais

Segundo Mauro Chantal Santos, Fonseca não se considerava um compositor


adepto a um estilo de música. Em seu texto, Santos relata a resposta que recebeu de
Fonseca quando o perguntou sobre a qual estilo pertencia enquanto compositor. “Não se
descrevendo como um compositor nacionalista, mas um compositor eclético, afirma que
não possui um único estilo de compor. (SANTOS, 2001, p. 29) Sobre isso, Santos relata

47
as seguintes palavras de Fonseca: “Minhas experiências vão da música impressionista ao
dodecafonismo.” (SANTOS, 2001, p. 29)

Santos, em seu texto, relata uma fala do regente Sergio Magnani onde ele faz
considerações sobre a atuação de Fonseca enquanto compositor: “Um compositor
brasileiro que não se afasta das origens da musicalidade brasileira, embora tendo
experimentado, e valiosamente, as linguagens contemporâneas.” (SANTOS 2001, p. 29)

Em sua dissertação, Santos (2001, p. 35) traz a informação de que as obras e


arranjos para canto a capella de Fonseca eram compostas segundo uma técnica que o
regente mineiro intitulou de “Fio Azul”. Essa técnica, consiste em um tratamento
contrapontístico onde o compositor cria uma melodia principal que se desenvolve em
todas as vozes da composição, migrando de uma para outra. Não há uma voz principal,
tampouco uma hierarquia entre as vozes. Santos traz em seu texto uma citação de
entrevista realizada com Fonseca, onde o compositor explica como compões suas
melodias.

Divido a melodia em trechos, escrevendo-a segundo a tessitura das vozes. Com


contraponto preencho as outras vozes, seguindo assim um conselho que recebi
de Koellreutter, utilizando a técnica do contraponto renascentista ao invés de
pensar em apenas acordes. (SANTOS, 2001, p. 35)

Raphael Osório em entrevista cedida, fez considerações sobre o tratamento de vozes nas
composições de Fonseca. Segundo o ex – aluno:

Ele (Fonseca) tinha uma grande preocupação com as diferentes vozes da peça.
Se preocupava que todos os motivos fossem ouvidos. Sobre o tratamento de
vozes na composição de Fonseca, Raphael Osório disse em entrevista cedida:
“...Tudo o que ele compunha, tinha sempre uma voz que destacava da outra. A
polifonia dele era sempre muito clara. Ele nunca privilegiava só uma voz. [...]
percebemos que o importante para se obter este resultado é ressaltar as vozes que
estão com a melodia, não deixando apenas o soprano se sobressair, como em
muitos arranjos existentes. (informação oral)

6.3. Obras afro-brasileiras para coro a cappella

Cristina Gallo (2011, p. 42) contabilizou em sua dissertação 16 composições para coro
misto a capella com temática afro-brasileira. Essas peças retratam em suas rítmicas e
textos características da música feita em terreiros de Umbanda e Candomblé. Grande

48
parte dos textos utilizados nessas composições foi retirado do livro 400 Pontos Cantados
Riscados de Umbanda e Candomblé (1962). Segundo a autora, essas composições são:

1) Ponto de Oxúm – Iemanjá (1965)

2) Estrela d' Alva (1971)

3) Cântico para Iemanjá (1971)

4) Jubiabá (1973)

5) Xirê Ogun (1977)

6) Cobra Corá (1977)

7) Ponto Máximo de Xangô (1978)

8) Oxóssi Beira – Mar (1978)

9) Inhãçã (1988)

10) Ponto de Oxalá (1992)

11) Vam‘ Saravá (1994)

12) Pontos de Caboclos da Falange de Oxóssi (1997)

13) Ponto de São Jorge: Ogum Guerreiro

14) Ogum Megê

15) Orixás

16) Preto Velho III (Pai João)

Segundo Cristina Gallo (2011, p. 42), as últimas 4 composições listadas tiveram suas
partituras perdidas. Gallo informa em seu texto que Ponto de Caboclo da Falange de
Oxóssi (1997) foi publicada pelo XVIII Festival Internacional de Coros, em Porto Alegre,
como recompensa por ter sido escolhida como composição vencedora do festival.
Entretanto, até a conclusão de sua tese, a pesquisadora não a havia encontrado e a família
não a tem em sua posse.

Um efeito frequentemente utilizado por Fonseca em suas composições de temática


afro-brasileira é a imitação da sonoridade de elementos da natureza ou do universo dos
terreiros de Umbanda e Candomblé. Um exemplo dessa pode ser encontrado na
dissertação de Santos, que traz um relato onde Fonseca fala sobre como aplicou essa
ferramenta em sua composição Jubiabá (1963). “... todas as vozes graves representam
instrumentos de percussão. Os baixos representam o surdo, os barítonos representam os
tambores mais agudos, os contraltos representam o agogô.” (SANTOS, 2001, p. 31)os

49
tambores aos quais Fonseca faz referência são os atabaques. Segundo informações verbais
colhidas em entrevista com Lucas Vilalta, existem três tipos de atabaques: Rum, Rumpí e
Lé. O Rum é o mais grave e mais importante dos atabaques. Nele, se orienta o passo do
Orixá.

Mas em fim, cada atabaque tem uma função também, e dependendo do ritmo, essas
funções mudam. Normalmente que dobra, varia é o Rum, que é o grande, o grave. Esse
deslocamento de tempo no grave é algo muito interessante, porque ele convida o paço do
orixá a se deslocar. Mais uma vez, desloca a marcação fazendo orixá não dançar no ritmo
marcado, mas dança no que o Rum está fazendo. Um bom Ogã Alabê vai saber os
momentos certos em cada cantiga que dobrar, acelerar, diminuir, parar; as vezes de olhar
para o orixá ele percebe o que o orixá está pedindo. Se ele dobra numas partes que não
tem nada a ver o orixá vai parar e não vai dançar. Pode-se improvisar e variar muito, mas
isso dentro da função ritual. (informação oral)

Onomatopeias que remetem ao som do instrumento retratado por cada voz constituem
a letra em uma seção da obra. O restante do texto, foi retirado do romance de Jorge
Amado. Em Jubiabá (1973), Fonseca retrata musicalmente uma Xirê ou Gira, ritual da
Umbanda. A gira é o momento onde os humanos se comunicam com os orixás. Há na
obra a parte B, onde o compositor retrata os sons do momento em que a mãe e pai de
santo recebem seus Orixás no Xirê. Segundo Chantal Santos, o compositor desejava com
isso criar uma atmosfera que ilustrasse trecho do enredo do livro homônimo de Jorge
Amado.

Embora as composições de Fonseca retratem elementos característicos da música feita


nos terreiros de Umbanda e Candomblé, ela não possui função ritualística e, portanto, não
é sacra. Segundo Vilalta, para a música ter função ritualística na Umbanda, ela necessita
veicular o Axé, energia vital. Segundo o entrevistado, o Axé é veiculado através da
dualidade entre ordem e desordem, por ter relação com Exú. Para que o Axé seja
veiculado, “... reorganizando a energia do universo...” (informação verbal), é necessário
que haja uma desordem de alguns elementos. A rítmica deslocada feita no Rum, o canto
feminino em uníssono, mas com variação de microtons entre as vozes, o que cria
dissonâncias são exemplos de características que uma música necessita ter para veicular
Axé e ter função ritualística. As composições de Fonseca, embora retratem essas
características, estão escritas segundo um pensamento musical contrapontístico, europeu
e erudito. Tratam-se de composições corais com inspiração afro-brasileira, destinada às
salas de concerto.

50
6.4. Obra de Fonseca nos dias de hoje

Diversos autores são unânimes em dizer que a maior parte da produção


composicional de Fonseca não se encontra editada e, portanto, não publicada. Algumas
peças foram publicadas por companhias estrangeiras. Chantal Santos (2001, p. 40) lista 8
obras publicadas, frente a um total de 169 composições. Hoje a obra composicional de
Fonseca está sob posse de sua família, assim como seus direitos autorais. O acesso às
partituras de Carlos Alberto é restrito, o que dificulta muito que composições e arranjos
de Fonseca integrem programas de concerto no Brasil e no estrangeiro. A preservação da
memória de Fonseca está confiada ao Instituto Carlos Alberto Pinto Fonseca,
administrado por sua família e sediado em Belo Horizonte. Ex-alunos e pesquisadores
exercem um importante papel na preservação da memória de Fonseca, com a produção
de trabalhos acadêmicos, relatos, entrevistas e publicações.

6.4.1. Obras publicadas

Chantal Santos (2001, p. 40) apresenta em Carlos Alberto Pinto Fonseca: dados
biográficos e catálogo de obras uma lista das peças que se encontram publicadas.
Segundo o autor, elas são:

1) O Poema da Purificação (1974). Editada por Lawson – Gould Music Publisher


Inc. Integrou uma série intitulada The LG Sacred Choral Series. Estados Unidos.

2) Os Sinos (1978). Editada pela FUNARTE, no PROMEUS (Memória Musical


Brasileira). Brasil.

3) Coletânea Cancioneiro Pernambucano (1978). Editada pela Secretaria da


Cultura do Governo do Estado de Pernambuco. Brasil.

4) Missa Afro-Brasileira e Kyrie (publicado separadamente) (1971). Editada pela


Lawson – Gould Music Publisher Inc.. Estados Unidos

5) Seven Brazilian Etudes (1978). Editadas pela Columbia Music Co. Estados
Unidos.

6) Trenzinho, cânone a 4 vozes (1985). Editada pela MusiMed Editora e


Distribuidora. Brasil

51
7) Pontos de Caboclo da Falange de Oxóssi (1997). Editada pelo Segundo
Concurso de Composições de Canto Coral João de Souza Ribeiro. Premiação de terceiro
lugar. Brasil.

8) Orixás (1992). Editada no Álbum de Partituras do Primeiro Concurso Nacional


de Obras Corais, em Belo – Horizonte. Brasil.

6.4.2. Obras gravadas

Santos (2001, p. 42 – 43) traz em seu texto uma lista de composições e arranjos
de Fonseca que se encontram disponíveis em gravação. Segundo o autor, elas são:

1) Galo Garnizé. Gravada (1969). Disponível no LP comemorativo do Second


International University Choral Festival. Lincoln Center, Nova Iorque, Estados
Unidos.
2) Arranjos de Nesta Rua, É a Ti Flor, Flor do Céu e Amo-te Muito (1981). Gravado
no LP Madrigale. A gravação foi financiada pela TELEMIG.
3) Missa Afro – Brasileira de Batuque e Acalanto (1989). Gravado em LP lançado
pelo Coral Ars Nova.
4) Cântigo para Iemanjá (1982). Disponível no LP comemorativo do 7º Festival
Internacional de Coros.
5) Arranjo de Tira – Coco ( 1983). 8º Festival Internacional de Coros.

6) Jubiabá (1985). Disponível em LP gravado no 4º Encontro de Corais Mineiros.

7) Haec Dies, Cântico para Iemanjá, Jubiabá e arranjos Minha Ciranda, É a Ti Flor
do Céu. (1993) Disponível na fita – cassete Ars Nova na Europa. Contém
gravações realizadas no Concurso de Marktoberdorf (1991) e no Concurso Guido
D’Arezzo (1993)
8) Cobra Corá (1999). Disponível no DC Pelos Quatro Cantos do Brasil, de autoria
do Coral BDMG. A gravação não é regida por Fonseca.
9) Jubiabá, Cântico para Iemanjá, Xirê Ogum, Trenzinho e os arranjos É a Ti Flor
do Céu, Muié Rendera (1999). Disponível no CD Antologia, gravado em
comemoração aos 40 anos do Ars Nova, coral da UFMG.

A obra Jubiabá (1973) também está disponível em gravação no cd Romaria, pelo


coro Gonville and Caius College de Cambridge, com consultoria da orientadora desse

52
trabalho, Profa. Dra. Susana Cecília Iagayara – Souza e do Prof. Dr. Marco Antônio
da Silva Ramos.

7. Conclusão

Portanto, tendo como base todas as informações apresentadas anteriormente,


torna-se possível concluir que o ferramental técnico e gestual de regência de Carlos
Alberto Pinto Fonseca, principalmente influenciado por Sergiu Celibidache e Robert
Shaw foi singular entre os regentes de sua época. Ao longo de sua trajetória, por meio de
cursos particulares, Fonseca transmitiu seu conhecimento e suas práticas a muitos alunos.
Hoje, seu ferramental e sua memória se mantém vivos através do trabalho desses ex-
alunos.

Grande parte dos registros disponíveis sobre as práticas do regente mineiro foram
produzidos por ex-alunos ou ex-integrantes do Ars Nova, coral da UFMG. Poucas são as
publicações produzidas por Fonseca e o acesso a esse material é bastante restrito.
Tomando como base todo o material colhido durante a elaboração desse trabalho, não é
possível afirmar a criação de uma escola de regência brasileira por parte de Fonseca.
Entretanto, seu legado é notório. A utilização do gestual que toma como base o plano
horizontal e a utilização da fenomenologia como método de análise formal são práticas
pouco comuns entre os regentes brasileiros até os dias de hoje.

Na construção do conhecimento em Música, diversos são os saberes necessários


e as metodologias empregadas. Utilizada como ferramenta, na perspectiva da análise
qualitativa, a entrevista é vista também como forma de produção de conhecimento e
instrumento de formação do graduando, ao lado da formação técnica (vocal, de regência),
do desenvolvimento de habilidades específicas necessárias ao músico (leitura e percepção
musical, performance musical), dos conhecimentos teóricos (história da música, teoria e
análise musical) e pedagógicos.

8. Referências

Artigos, dissertações e teses

BLOCKER, Robert (ed). The Robert Shaw Reader. New Haven & London: Yale
University Press, 2004.

53
BOWEN, Antonio (ed). The Cambridge Companion to Conducting. Cambridge:
Cambridge University Press, 2003.

CHANTAL, Mauro. Artistas inesquecíveis: Carlos Alberto Pinto Fonseca, maestro.


Publicado online, 2017. Disponível em: <http://www.movimento.com/2017/06/artistas-
inesqueciveis-carlos-alberto-pinto-fonseca-maestro/ >. Acesso em: 29/07/2018.
COELHO, Willsterman Sottani. Técnicas de ensaio coral: reflexões sobre o ferramental
técnico do Mastro Carlos Alberto Pinto Fonseca. 132p. Dissertação (Mestrado em
Música). Escola de Música da UFMG, Belo Horizonte, 2009.
DE QUADROS, André, ed. The Cambridge companion to choral music. Cambridge
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DECKER, Harold A.; HERFORD, Julius. Choral Conducting Symposium. 2nd Edition.
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FERNANDES, Ângelo José. Missa afro-brasileira (da batuque e acalanto) de Carlos


Alberto Pinto Fonseca: aspectos interpretativos. 158p. Dissertação (Mestrado em
Música). Instituto de Artes da UNICAMP, Campinas, 2004.

FONSECA, Carlos Alberto Pinto. Considerações sobre a técnica do gesto na Regência.


Anais da Convenção Internacional de Regentes de Coros, Brasília, p.15 -18, Julho –
Agosto, 1999.
GALLO, Cristina Yolanda. Elementos umbanda y candomblé en la obra para coro mixto
―a capella compuesta por Carlos Alberto Pinto Fonseca. Aportes para su
interpretación. Dissertação (Mestrado em Música). Facultad de artes e diseño da
Universidad Nacional de Cuyo,
GEORGE, Vance. Choral Conducting. In: BOWEN, Antonio (ed). The Cambridge
Companion to Conducting. Cambridge: Cambridge University Press, 2003, p. 45-64.

GUINAND, Maria. A hundred years of choral music in Latin America 1908–2008. The
Cambridge Companion To Choral Music, p. 130-148, 2012.
MARIN, Lucia. Basic fundamentals of phenomenology of music by Sergiu Celibidache
as criteria for the orchestra conductor. 31p. Tese (Doutorado em Música). University of
Kentucky, Lexington, 2015.
MATHEUS, Rize Lorentz. Elementos Impressionistas na obra composicional de Carlos
Alberto Pinto Fonseca. 100p. Dissertação (Mestrado em Música). Escola de Música da
UGMG, Belo Horizonte, 2010.
OLIVEIRA, Carolina Andrade. O regente-arranjador e a circulação do repertório de
arranjos nos coros brasileiros. 194 p. Dissertação (D em Música). Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2017.
SANTOS, Mauro Camilo de Chantal. Carlos Alberto Pinto Fonseca: dados biográficos
e catálogo de obras. 80p. Dissertação (Mestrado em Música). Escola de Música da
UFMG, Belo Horizonte, 2001.

54
STRIMPLE, Nick. Choral music in the twentieth century. Amadeus Press, 2005.

Capítulo de livro ou verbete assinado em enciclopédia


SWAN, Howard. The Development of a Choral Instrument In: DECKER, Harold A.;
HERFORD, Julius (Ed.). Choral conducting: A symposium. Prentice-Hall, 1973.

Livros
GILIOLI, Renato de Sousa Porto. Representações do negro no modernismo brasileiro:
artes plásticas e música. São Paulo: Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo/
Best Books, 2008. p. 129-164.

PENNA, Maura. Construindo o primeiro projeto de pesquisa em educação musical.


Porto Alegre, Editora Sulina, 2015.
SOUZA, José Ribeiro de. 400 pontos cantador riscados de Umbanda e Candomblé. 3.
edição. Editora Eco, Rio de Janeiro, 1962.

Entrevistas
FONSECA, Carlos Alberto Pinto. Belo Horizonte: 2005. Entrevista concedida a Heloísa
Greco e Shirley Ferreira para a pesquisa “Memória da Música Erudita em Belo
Horizonte” desenvolvida pela coordenação de Projetos e Pesquisa – CRAV/FMC/PHB).
JACOE, Caio Arcolini. Entrevista de Francisco Campos Neto em 10/05/2018. São Paulo.
Registro de informação verbal.
JACOE, Caio Arcolini. Entrevista de Raphael Leite Osório em 20/02/2018. Via Skype.
Registro de informação verbal. /JACOE
JACOE, Caio Arcolini. Entrevista de Lucas Vilalta em 06/08/2017. São Paulo. Registro
de informação verbal.

Notas:
¹ Duas publicações de Mauro Chantal Santos foram utilizadas na elaboração desse
trabalho. Em sua dissertação de mestrado (2001), o sobrenome Santos é utilizado. Em seu
artigo (2017), o autor utiliza o sobrenome Chantal.

55

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