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A questão acerca da tutela provisória de urgência antecipada para cassação de mandato

eletivo

JÚLIO CÉSAR BALLERINI SILVA ADVOGADO,


MAGISTRADO APOSENTADO E PROFESSOR
COORDENADOR NACIONAL DO CURSO DE
PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITO CIVIL E
PROCESSO CIVIL DA ESCOLA SUPERIOR DE
DIREITO – ESD PROORDEM CAMPINAS E DA
PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITO MÉDICO DA
VIDA MARKETING.
O tema em questão envolve aspectos altamente
ideológicos, em visão que tende a ser mais política do que propriamente técnica. É o
mesmo que se dá, por exemplo, com a tal teoria do constitucionalismo popular
discutida na Common Law, em que se entende estar havendo uma judicialização da
política, com o Poder Judiciário se substituindo como constituinte de toga no lugar da
vontade popular (como esclarecido por Marcelo Novelino), tema mais do que atual no
ambiente de fla x flu que vivencia nossa ordem democrática.

Isso porque, temos uma Constituição pródiga em


princípios e conceitos altamente elásticos, veja-se, por exemplo, a questão da
improbidade enquanto instrumento de legal fare como vem sendo apontado por vários
autores de direito administrativo – ser mau educado e não cumprimentar um
subalterno, por exemplo, pode ser tido como ato de preconceito social, logo,
aporofobia e com isso, presto, um gestor ou funcionário inconveniente para o sistema
resta taxado como improbo por violar os princípios da Administração Pública (artigo 11
LIA) tendo manchada sua reputação.

Por exemplo, para um aguerrido libertário, um juiz


conservador é uma ameaça e deve ser linchado por qualquer prisão que tenha
decretado, enquanto que, para um conservador um juiz defensor do aborto seja algo
de improbo, um monstro, um anticristo – não é fácil a vida de agente público no país
chamado Brasil. Tudo é guerra de narrativas (há discussões em torno de fake news e
órgãos de imprensa que revelam verdadeira torcida contra e favor de um dado agente
público por conta de seu viés ideológico).

E lá se vão canais de comunicação a soldo de A, B


ou C achincalhar a vida alheia ou desacreditar a seriedade desta ou daquela pessoa
que ameaça ou seu modo de vida – a improbidade está deixando, por esse
constitucionalismo popular, assim como outros temas de direito público, de ser uma
questão de honestidade ou desonestidade e passando a ser vista como uma questão
de conveniência desta ou daquela ideologia.

Agregue-se a tal quadro a máxima de Joseph


Goebbels, segundo na linha de comando da Alemanha Nazista, considerado por
muitos um gênio da propaganda – no sentido de que de tanto repetir uma mentira ela
se torna em uma verdade, o que, certamente não tem passado despercebido por
alguns blogueiros e sites não tão bem intencionados assim que querem impor a
ditadura de suas visões, criando escândalos onde não existem, por exemplo.
Fantasiam-se de politicamente corretos, distorcem fatos como se fossem objetivos e
saem à cata de sua sanha favorita.

Em síntese, andou muito bem a nova LINDB ao


exigir condutas dolosas, prova inequívoca e análise concreta de dados objetivos para
a imposição de penas de improbidade e mesmo na interpretação de outros fatores e
conceitos de direito público.

Os temas de direito público estão se tornando muito


complexos, como se tem tornado a discussão de nossa própria ordem democrática. E
cada pleito que se descortina no Estado Democrático brasileiro (a Carta Política pátria
privilegia o sistema de sufrágio eleitoral, como é cediço, estabelecendo que o poder
emana do povo com o poder de escolher seus representantes), os juízes eleitorais tem
se deparado com grande número de demandas versando sobre impugnação de
candidaturas e, sobretudo, de forma mais aguda,, de diplomações de candidatos
eleitos pela vontade popular.

A questão trazida no título do presente artigo


envolve aspectos altamente ideológicos, em visão que tende a ser mais política (na
acepção científica do termo) do que propriamente técnica (há inúmeras variáveis
antropológicas a serem cogitadas, envolvendo aspectos religiosos, culturais, filosóficos
e, até mesmo, de índole técnica jurídica, cujas conclusões, no entanto, poderão vir a
variar conforme a matiz ideológica aplicada, o que já se adverte ao leitor do presente
texto - pois isso dependerá da ideia de democracia que se utilizará como premissa
inaugural).

O objeto, no entanto, do presente artigo não é o


esgotamento do tema, o qual se revela mais do que interdisciplinar (seria necessário
que se recorressem a noções sobre história, ciência política, teoria do Estado,
sociologia, ética, direito constitucional etc.), mas, apenas e tão somente a análise da
questão sob o prisma técnico de se deferir, ou não, antecipação de efeitos da tutela,
no que tange ao afastamento de pessoas eleitas (e não a conveniência ou
inconveniência da orientação trazida pela legislação de regência).

Sempre existe, aliás, um certo risco ao se pretender


cogitar de uma abordagem histórica a respeito de qualquer instituto jurídico, eis que,
se algumas cautelas não forem tomadas, como advertia Miguel Reale (1), pode
ocorrer de observar-se a história sob a ótica daquele que escreveu a seu respeito (ou
seja, num exemplo muito simples, se quem escreveu sobre o fato histórico que se
estuda acreditava que o Sol girava em torno da Terra, muito provavelmente, terá tirado
suas conclusões sobre o fato histórico comentado, a partir de tal perspectiva, como
igualmente, se alguém que escreveu sobre juros, na Idade Média, pertencia ao clero e
efetuou empréstimos, tentará a entender que os juros seriam algo de maligno e
espoliador, ao invés de fomentarem o desenvolvimento do câmbio e de mercados
futuros (2)).

Hoje um eleitor do que se considera esquerda e um


de direita tem visões completamente antagônicas de um mesmo fato objetivo. As
ilações que se tiram, e juízes são seres culturais, tem suas ideologias e conjuntos de
valores, é que irão importar para a decisão de uma dada questão – daí o cuidado que
se deve ter com a questão suscitada. Daqui há vinte anos quem analisar os fatos
ocorridos hoje ou há vinte anos atrás, terá uma ideia completamente diferente sobre
os mesmos. Não podemos aplicar, aliás, a lupa de hoje, para medir fatos ocorridos há
décadas.

Com isso, os cuidados que o acadêmico deve ter,


ao abordar textos históricos será nesse sentido, visando coibir que informações
pessoais do autor do texto não levem a conclusões distanciadas da realidade
conceitual contemporânea, buscando uma análise que se revele como a mais
imparcial possível a respeito da forma como se deram os fatos históricos.

E como vem sendo ponderado em outros artigos de


minha autoria, desde há muito, não se pode ter como desconhecido dos operadores
do direito, de um modo geral, o fenômeno do esgotamento paradigmático do
pensamento jurídico fundado a partir da premissa de um direito natural (concepção
tomista que foi empregada por séculos pelos juristas como modo de pensar
dogmaticamente o direito) que encontra inúmeras dificuldades de resolver os
problemas decorrentes da complexidade das relações intersubjetivas, ainda mais em
um mundo que prima pela celeridade decorrente dos próprios avanços tecnológicos
num mundo globalizado, o que não pode ficar á margem do ordenamento jurídico.

Tanto assim que autores como Celso Lafer


propugnam, como proposta inicial para a solução do problema referente ao hiato
apontado, a adoção de um novo modelo paradigmático (3) (o referido autor propõe
chamá-lo de paradigma da filosofia do direito, para permitir um "pensar" menos
dogmático, mais aberto ao "perquerir" ou ao "questionar", tomando, aliás, o dogma
não como um fim em si mesmo (como se dava no modelo paradigmático positivista
então dominante), mas, ao contrário, como um ponto de partida, como, ademais, vinha
sendo sugerido por Tércio Sampaio Ferraz Jr., (4) permitindo-se a interpretação que
autorize abranger fatores interdisciplinares).

E isso se torna relevante na medida em que,


igualmente, se tem por inegável que o Direito seja um fenômeno histórico, revestido de
temporalidade e que, nos primórdios da civilização já tinha seu conteúdo intimamente
ligado aos desígnios dos detentores do poder (verbi gratia, no Egito Antigo, no período
conhecido por Antigo Império, ou seja, entre 2.664 a C e 2.155 a C, cunhou-se a
expressão segundo a qual "o justo é o que o faraó ama, e o mal é aquilo que o faraó
odeia" (5), não obstante a ponderação de que o justo e ético, para esse povo se
confundia com a emblemática noção de maat (6)), reforçando-se o entendimento
segundo o qual o direito implica numa evidente técnica de controle social (caráter
igualmente destacado pelo já mencionado Tércio Sampaio) (7).

Essas concepções ligando o Direito ao poder se


tornam uma questão de grande relevo posto que, em um mundo globalizado, em que o
poder econômico se concentra polos globalizantes opostos aos dos globalizados (não
se enganem há uma nova guerra fria em curso, uma disputa ideológica pela riqueza
mundial – populações enormes disputando em softpower os potenciais alimentares e
energéticos do planeta), se pode passar a questionar se fatores intimamente ligados
ao poder não estão colocando em xeque a interpretação que se possa fazer do
ordenamento jurídico como um todo (o que se tem revelado como óbvio numa
concepção geopolítica, não se podendo, ainda, deixar de atentar para fatores como o
financiamento regular, ou irregular (8) de campanhas eleitorais, atuação lícita e ilícita
de lobbies, enquanto grupos de pressão acerca de interesses que possam estar em
jogo, etc...).

Modernamente se tentou, mas o TSE parece não


ter aceito a tese, de que líderes religiosos praticariam abuso de um certo poder
religioso – ideia muito perigosa num momento em que a chamada Cristofobia vem se
tornando frequente no mundo (não escondo, sou cristão – não quero polemizar, não é
esse o foco do artigo – mas esse é um exemplo do que se pretende discutir, sob o viés
perigoso de cassação de mandados por tutelas provisórias antecipatórias). Se alguém
vota em alguém por convicção religiosa parece estar exercendo um direito
constitucional, não se podendo considerar tal ato um ilícito, sempre com a maior vênia
possível.

E em tempos de globalização, com grande


normatização de inúmeros setores da vida cotidiana, com redes intrincadas de normas
das mais variadas matizes e hierarquias, o risco de se esbarrar numa ou outra delas,
num grande espectro de cinzas, ainda mais quando o assunto é política, se revela
grande, recomendando cautela em relação a questões de antecipação dos efeitos da
tutela em questões eleitorais.

Mas não se pode, em questões deste jaez,


pretender o distanciamento ou a flexibilização do rito legal, eis que a matéria referente
ao direito eleitoral está intimamente ligado aos limites ao exercício do poder, o que a
diferencia de outros ramos do direito, em que até se possa estimular interpretações
mais flexíveis do ordenamento jurídico, sob a ótica do princípio da proporcionalidade.

Assim, para que não se questione acerca de


qualquer vício de parcialidade do Julgador, em processos eleitorais, convém que o
mesmo se abstenha de buscar exegeses que se distanciem do devido processo legal
(o due process of law preconizado pela doutrina federalista anglo-saxã, desde o
advento da Carta Foral conhecida como Magna Charta Libertatum, da Inglaterra, de
1.215, editada pelo Rei João Sem Terras, numa tentativa de pôr fim a um levante de
barões insurreitos), ainda mais em questões como a versadas no presente estudo, no
que se refere à impossibilidade jurídica de se pretender burlar os efeitos recursais e a
expressa letra da legislação de regência sob a égide da antecipação dos efeitos da
tutela.
Isso se dá na medida em que, como é sabido, a
legislação eleitoral, na sua acepção lato sensu, prevê dois gêneros principais de ações
de impugnação, quais sejam, aquelas referentes a impugnações de registro de
candidaturas e aquelas referentes a impugnações de exercícios de mandatos com
recursos contra diplomações e investigações eleitorais (cujas transgressões
pertinentes ao abuso do poder econômico, origem de valores pecuniários, abuso do
poder político em detrimento da liberdade de voto - ou sufrágio como
constitucionalmente asseverado - vem disciplinada pelo advento da norma contida nos
artigos 19 a 25 da conhecida Lei Complementar nº 64/90 (9)).

E não obstante exista expressa determinação


constitucional a respeito do tema, como se pode observar pelos parágrafos do artigo
14 da Constituição Federal, parece haver consenso entre os doutrinadores no que se
refere ao fato de que se deva empregar, tanto num caso, como em outro, o rito da
ação de impugnação de registro de candidatura. (10)

Sob tal perspectiva, tem-se que o rito legal a ser


observado, em cumprimento do mencionado procedural due process of law, seja
aquele estabelecido, para este tipo de situação, no Código Eleitoral (a conhecida Lei
nº4.737/65 - com normas dispondo sobre direito material e direito processual, a revelar
que se trata de lei especial que não pode, num juízo a priori¸ ser considerada por leis
gerais de mesma hierarquia), que possui regra expressa em relação a este aspecto,
qual seja, aquela contida no advento do seu artigo 216, cuja a transcrição seria a
seguinte:

"Enquanto o Tribunal Superior não decidir o recurso interposto contra a


expedição do diploma poderá o diplomado exercer o mandato em toda a
plenitude".
Tal consectário legal, portanto, parece não deixar
dúvidas a respeito do fato de, pouco importa o fundamento, ou seja, o mérito das
razões de impugnação, não se pode deferir, enquanto não houver reexame pelo
Areópago Superior, qualquer pedido antecipatório da tutela que vise impedir atos de
posse ou que venha a esvaziar efeito suspensivo recursal, sob pena de se macerar a
letra expressa da lei.

Ocorre que a Reforma Eleitoral de 2015 incluiu o


§2º ao art. 257, estabelecendo que o recurso ordinário interposto contra decisão
proferida por juiz eleitoral ou por Tribunal Regional Eleitoral que resulte em cassação
de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo será recebido pelo
Tribunal competente com efeito suspensivo. Surge, então, o efeito suspensivo
automático, já conhecido pelo art. 216 do Código Eleitoral para o recurso contra a
expedição de diploma. A partir da mudança, o candidato cassado aguarda no cargo
até o julgamento do recurso.

Apesar de o art. 257 do Código Eleitoral


estabelecer a eficácia imediata das decisões, a jurisprudência, inicialmente, fazia uma
leitura integrada do art. 15 da Lei Complementar nº 64/90,5 exigindo o trânsito em
julgado para a efetividade da decisão de cassação. Mas o TSE mudou seu
entendimento transformando a exceção em regra:

AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. NEGATIVA DE


SEGUIMENTO. REPRESENTAÇÃO POR CAPTAÇÃO ILÍCITA DE
SUFRÁGIO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. AÇÃO CAUTELAR.
EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO ELEITORAL. DEFERIDA A
LIMINAR. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. AUSÊNCIA. 5 “Art. 15. Transitada
em julgado ou publicada a decisão proferida por órgão colegiado que
declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou
cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se já
expedido”. R. bras. dir. Eleit. – RBDE | Belo Horizonte, ano 9, n. 17, p. 181-
190, jul./dez. 2017 183 Cassação de mandato pela Justiça Eleitoral.
Avanços e retrocessos da reforma eleitoral (Debate realizado... 1. Os
argumentos trazidos no recurso não são suficientes a ensejar a
modificação do decisum agravado. 2. As decisões fundadas no artigo 41-A
da Lei 9.504/97 merecem execução imediata. Entretanto, nada impede que
a Corte Regional, usando do seu poder geral de cautela, defira liminar em
cautelar e conceda efeito suspensivo ao recurso eleitoral. 3. O mandado
de segurança não é via adequada para conferir a suspensão dos efeitos de
acórdão de tribunal regional, sujeito a recurso para este Tribunal Superior.
4. Desprovimento.

E nem se venha pretender suscitar qualquer


discussão acerca do fato de que a antecipação de tutela seria instituto decorrente de
inovação legislativa do ano de 1.994 (com alteração no ano de 2.002), com nova
redação do artigo 273 e seus consectários do Código de Processo Civil de 1973 hoje
colocados nos artigos 300 e 305 CPC atual na roupagem de tutela provisória de
urgência antecipada, sendo diploma posterior, eis que, ao contrário, não obstante o
Código Eleitoral date de cerca de três datas antes da referida inovação, o fato é que o
mesmo implica em diploma legal especial em relação ao Código de Processo Civil,
que, por essas razões não pode ser tido como revogado pelo mesmo.

Tanto assim que a redação do artigo 216 do Código


Eleitoral tem sido prestigiada, em situações versando sobre este tipo de controvérsias,
pelo E. Superior Tribunal Eleitoral, como se pode observar pelos seguintes Julgados:
Ac - TSE nº 1.049/2002; 1.277/2003; 21.403/2003, 1.320/2004 e Ac. TSE de
28.6.2006, na MC nº 1.833. No mesmo sentido, assim se manifestou o E. Tribunal
Regional Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro, no sentido de que:

"IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO - ANTECIPAÇÃO DA TUTELA -


NÃO PROVIMENTO - Inexistência de prova inequívoca do alegado e
inocorência do convencionado do julgador quanto à existência de
verossimilhança; hipótese em que o requerimento de antecipação de tutela
encontra óbice no art. 216 do Código Eleitoral, que assegura ao diplomado
o exercício do mandato até o trâsito em julgado do recurso contra a
diplomação; As alegações dos recorrentes são as mesmas que já foram
rechaçadas quando da denegação da ordem em mandado de segurança
impetrado contra o MM. Juízo da 104ª Zona Eleitoral, que determinou a
diplomação dos ora agravados." TRE-RJ - AI 56 (21.525) - Itaboraí - Rel.
Dês. Valmir Martins Peçanha, j. 20.08.2.001.

Com relação a tanto, inclusive, de se continuar a


pedir vênia para a transcrição do entendimento de Fernando Montalvão, que destaca
trecho de transcrição parcial de decisão do TRE-CE, bastante oportuna a respeito da
questão que se alivanha no presente trabalho:

"No Tribunal Superior Eleitoral domina o entendimento de que se deve


evitar o rodízio de administradores na pendência da lide. Evita-se, assim, a
insegurança jurídica e a perplexidade dos eleitores (AgRgMs nº 3.345, Rel.
Min. Humberto Gomes de Barros, 19.05.2.005 MC nº 1.302, Rel. Min.
Barros Monteiro, de 6.11.2.003, AgRgMC nº 1.289, Rel. Min. Fernando
Neves, de 16.09.2.003, MC nº 1.049, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, de
21.05.2.002)". Diante dos princípios constitucionais, a melhor interpretação
é aquela que entende que se possa aceitar como razoável a decisão do
eleitorado." Recurso Eleitoral nº 12.951, TRE-CE, voto-vista do Juiz José
Filomeno de Moraes, 27.12.2.004".

Mesmo em sede doutrinária, poder-se-ia aduzir o


quanto ponderado por Joel José Cândido, acerca da questão em comento:

"Em qualquer das instâncias eleitorais, os recursos contra as decisões que


julgarem procedente a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo tem efeito
suspensivo, podendo o titular do mandato exercê-lo em toda sua plenitude,
enquanto não se operar a coisa julgada. Aplica-se, aqui, o art. 216, e o não
o art. 257, ambos do Código Eleitoral. A jurisprudência já aceitou esta
proposta. E também entendemos assim por três razões: a) se no RCD isso
ocorre, na AIME a solução deve ser a mesma eis que igual é o objetivo de
ambas as medidas processuais: b) à mingua de dispositivo legal específico
regulando a matéria, deve-se aplicar o remédio jurídico existente no
ordenamento que melhor atenda os interesses do impugnado, por ser
menor o prejuízo em eventual caso de erro, já que a questão envolve
direitos políticos. Aqui, o interesse público genérico cede ante a
possibilidade de lesão a direito constitucional específico. c) e, por último,
porque a presunção de correção da prestação jurisdicional provisória é
bem menos expressiva do que a presunção de correção da escolha do
titular do mandato impugnado, pela vontade manifestada pelo sufrágio, e a
preservação desta última, e não daquela, deve ser sempre o principal
escopo do Direito Eleitoral." (11)

Tal entendimento não se revela isolado, eis que,


coadunando com o mesmo, seria de se invocar o quanto asseverado por Tito Costa
(12), que entende que a orientação do artigo 216 do Código Eleitoral encontra
respaldo no artigo 15 da Lei Complementar nº 64/90, e mesmo em Pinto Ferreira (13),
que defende que, em casos como tal, ainda que se acolha recurso contra diplomação,
o candidato com mandato impugnado, enquanto não se verificar a coisa julgada
acerca de tal condenação, continuará a exercer o seu mandato, de forma plena.

E, na medida em que, como asseverado acima, tais


postulações devem ser feitas por advogados (não se aceita o jus postulandi dos
legitimados para essas demandas, afora a legitimação ministerial, pelo óbvio), não se
pode esquecer de que se deva tomar o máximo cuidado com pedidos deste jaez
(como é cediço, a legislação pátria acolheu o vetusto, porém assaz pragmático,
brocardo de direito romano, que chegou aos dias atuais pelo esforço dos glosadores
medievais, de acordo com o qual ignorantia legis nemo excusat, e que, em tradução
literal implica a ideia de acordo com a qual a ninguém será dado alegar a ignorância
da lei, muito menos, obviamente, o será permitido aos operadores do direito, como se
observa pelo teor da norma contida no artigo 3º da Lei de Introdução ao Código Civil),
posto que, como sabido, a irresponsabilidade em pedidos desta natureza, sem
prejuízo de medidas cíveis indenizatórias e administrativas (14), implicam em
situações que possam ser tidas como ilícitos criminais, nos estritos termos
preconizados pelo advento da norma contida no artigo 25 e seus consectários da Lei
Complementar nº 64/90 (em situações de ações movidas de forma temerária ou de
má-fé - não se podendo deixar de entender que pleitos expressamente vedados pela
legislação não sejam temerários - havendo expressa dificuldade para os operadores
do direito invocarem o desconhecimento da legislação de regência, em situações
deste jaez (15)).

Mas não é só ! A Reforma Eleitoral trazida pela Lei


nº 13.165/2015 incluiu o §2º do art. 257 do Código Eleitoral, revogando a eficácia
imediata das decisões de cassação de mandato. Também foi incluído o §3º ao art. 224
do Código Eleitoral, estabelecendo que a decisão da Justiça Eleitoral que importe a
cassação do diploma de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito
em julgado, a realização de novas eleições.

A regra é clara no sentido de exigir o trânsito em


julgado, o que, ademais, seria decorrência do princípio da presunção de inocência
(artigo 5º, LVII CF) antes flexibilizado agora não mais, pelo STF na polêmica questão
da prisão em segunda instância de conhecido ex presidente.

Portanto, quando um Juiz Eleitoral se deparar com


pedidos desta natureza, ou seja, antecipações de tutela que possam implicar em burla
à expressa orientação do artigo 216 do Código Eleitoral, devem se abster de lançar
decisões que possam ser tidas como vulneradoras do devido processo legal, até para
que não se venha pretender invocar a responsabilidade civil do Estado, que é objetiva,
em situações de expresso descumprimento do texto legal.

Ou seja, conclui-se, sem maior dificuldade, que a


atividade antecipatória de tutela em pleitos eleitorais, não pode contrariar regras
expressas, mas somente seria admissível em situações em que as lacunas, de modo
excepcional, autorizem a utilização da extensão analógica, desde que o interesse
público, as exigências do bem comum e os fins sociais a que a lei se destinam sejam
passíveis de ser invocados, nos estritos termos preconizados pelo advento das
normas contidas nos artigos 4º e 5º LINDB.

Mesmo fora da diploma a cassação de mandatos


dificilmente tem sido obtida em sede antecipatória de tutela, ainda mais em situações
in liminis litis et inaudita altera pars (o contraditório deve ser assegurado – não há
espaço em nossa ordem democrática para justiciamentos sumários ainda mais por
conta de pressões midiáticas).

Para que não se cometam impropriedades, deve-se


mover recurso de agravo contra medidas deste jaez (artigo 1015 CPC) não sendo
cabível, via de regra, o sucedâneo recursal conhecido como suspensão de liminar.
Assim, aliás, vem decidindo o STF a respeito do tema (SL 882, Rel. Ministro Ricardo
Lewandowski):

Na decisão que negou seguimento ao pedido, o ministro Lewandowski


afirmou que o prefeito afastado não detém legitimidade para pedir a
suspensão de liminar, porque só excepcionalmente se podem admitir
pessoas físicas no polo ativo desse tipo de demanda, nos termos da Lei
8.437/1992. E, no caso, avaliou que os interesses defendidos são de
ordem exclusivamente pessoal.

Referências Bibliográficas:

CÂNDIDO. Joel José. Direito Eleitoral Brasileiro. Bauru: Edipro, 4ª edição, Brasil,
1.994.

COSTA, Tito. Recursos em Matéria Eleitoral. São Paulo: Revista dos Tribunais, Brasil,
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FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. São Paulo: Atlas,
Brasil 1.988.

GILLISEN, John. Introdução Histórica ao Direito. Lisboa: Calouste Gubenkian,


Portugal, 1.987.

LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos. São Paulo: Companhia das
Letras, Brasil, 1.991.

MONTALVÃO, Fernando. Impugnação ao Registro de


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PINTO FERREIRA, Código Eleitoral Comentado. São Paulo: Saraiva, Brasil, 1.991.

REALE, Miguel. Horizontes de História e do Direito, São Paulo: Saraiva, 1.978, Brasil,
3ª edição.

ROBERTS, J. M. O livro de Ouro da História do Mundo. Rio de Janeiro: Ediouro,


Brasil, 2.001, p. 100.

SCHUMPETER, Joseph Alois. A Teoria do Desenvolvimento Econômico. São Paulo:


Nova Cultural, Brasil, 1.988.

SILVA, Júlio César Ballerini. Considerações acerca da utilização do mandado de


segurança para exame de atos judiciais. Revista Eletrônica da Escola Paulista da
Magistratura. Disponível em www.tj.sp.gov.br.

Notas:

1 - REALE, Miguel. Horizontes de História e do Direito, São Paulo: Saraiva, 1.978,


Brasil, 3ª edição.

2 - SCHUMPETER, Joseph Alois. A Teoria do Desenvolvimento Econômico. São


Paulo: Nova Cultural, Brasil, 1.988, p. 120.
3 - LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos. São Paulo: Companhia das
Letras, Brasil, 1.991.

4 - FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. São Paulo: Atlas,
Brasil 1.988.

5 - ROBERTS, J. M. O livro de Ouro da História do Mundo. Rio de Janeiro: Ediouro,


Brasil, 2.001, p. 100.

6 - GILLISEN, John. Introdução Histórica ao Direito. Lisboa: Calouste Gubenkian,


Portugal, 1.987, p.67.

7 - FERRAZ JR.. Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. São Paulo: Atlas,
Brasil 1.988.

8 - Como fartamente destacado pelos meios de comunicação de massa, os mass


media, e cita-se, aí, como exemplo, uma série de artigos de autoria de Diogo Mainardi,
na Revista Veja, a evidenciar como esses lobbies ou grupos de pressão atuam,
algumas vezes, de modo indevido e prejudicial ao Estado Democrático de Direito -
dados, aliás, que não podem ser colocados à margem, numa análise do papel do
ordenamento jurídico neste novo modelo paradigmático.

9 - Com a questão da legitimidade para a propositura de tais ações investigativas,


inclusive dos partidos políticos, desde que por advogados (não se tem reconhecido
que tais entes tenham jus postulandi, não havendo, portanto, lei que tenha disciplinado
de modo diverso em relação ao artigo 133 CF no que tange ao juízo eleitoral), como
se pode observar pelo advento da norma contida no seu artigo 22 da referida Lei
Complementar. E não se esqueça de que a legitimidade para o recurso contra diploma
encontra supedâneo legal no advento da norma contida no artigo 262 e seus
consectários do Código Eleitoral. E, ainda mais, não se pode deslembrar que o
Ministério Público, não obstante tenha legitimidade para algumas dessas medidas, se
não ele próprio parte nos respectivos procedimentos, deverá ser sempre ouvido como
custus legis, ou, como queiram, fiscal da lei, sob pena de nulidade.

10 - MONTALVÃO, Fernando. Impugnação ao Registro de


Candidatura. www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto,asp?id= 1499

11 - CÂNDIDO. Joel José. Direito Eleitoral Brasileiro. Bauru: Edipro, 4ª edição, Brasil,
1.994, pp; 244-245.
12 - COSTA, Tito. Recursos em Matéria Eleitoral. São Paulo: Revista dos Tribunais,
Brasil, 2.000, p.137.

13 - PINTO FERREIRA, Código Eleitoral Comentado. São Paulo: Saraiva, Brasil,


1.991, p. 232.

14 - Como visto, pelos entendimentos doutrinários susoapontados, tem-se que a


questão envolve o exame de matéria afeita a direitos políticos, portanto, princípios
constitucionais insculpidos como garantias dos cidadãos, sendo sempre grande a
exposição pública e a repercussão de decisões deste jaez, o que recomenda sempre
grande cautela em relação ao tema, até porque, como sabido, a responsabilidade civil
do Estado se revela como objetiva nos estritos termos preconizados pela própria Carta
Política de 05.10.1.988 (art. 37, parágrafo 6º).

15 - Sempre se lembrando que, em se tratando de ações penais de iniciativa pública


incondicionada, se encontram regidas e disciplinadas pelos princípios da oficialidade e
oficiosidade da ação penal, tal como preconizados por Fernando Capez, em seu
conhecido Curso de Processo Penal, da Ed. Saraiva, 2.007, estando, nessas
condições, tais posturas, se detectadas pelo Juiz Eleitoral, em situação de remessa de
peças ao Ministério Público, para a adoção das providências que o dominus litis
poenalis julgar adequadas nos termos preconizados pelo advento da norma contida no
artigo 40 do Código de Processo Penal.

16 - Verbi gratia, aí podem ser inseridas medidas como a busca e apreensão de


materiais, panfletos, livros escriturais, notas fiscais, material de campanha, ordens de
exibição de documentos, produção antecipada de provas se necessário for,
justificações prévias, interpelações, notificações etc....

17 - COSTA, Tito. op. cit., p. 85.

18 - SILVA, Júlio César Ballerini. Considerações acerca da utilização do mandado de


segurança para exame de atos judiciais. Revista Eletrônica da Escola Paulista da
Magistratura. Disponível em www.tj.sp.gov.br.

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