Você está na página 1de 9

Direito de trabalho para o curso de contabilidade e finanças

Aula 1.

1. Noção de direito de trabalho


1.1. Terminologia “direito de trabalho”

O direito de trabalho assenta na ideia de trabalho, como prestação de


facto positivo. É com base no termo “trabalho” que podemos retirar a
noção desta disciplina.

O trabalho é entendido no sentido de actividade, embora em tempos ter


sido usado noutros contextos como “ir ao trabalho, emprego ou como
obra, ofício, ocupação”. Na verdade, estes significados não se
relacionam com o objecto desta disciplina.

O trabalho deriva do latim da palavra “tripalis” que significava aparelho


com três paus onde se prendiam os animais, entre os quais as bestas
para serem ferradas. Implicava certo esforço (dar algum trabalho). Em
latim, a palavra correspondente a trabalho é “labor”. Dai muitas vezes
falar-se em direito laboral.

1.2. Pressupostos

Recorrendo ao código civil, no artigo 1152 do CC encontra-se uma


noção do contrato de trabalho “é aquele pelo qual uma pessoa se obriga,
mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual
a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta”. Este artigo foi
reproduzido no artigo 18 da lei de trabalho.

Tendo em conta esta noção de contrato de trabalho, importa dela retirar


o que pode interessar para o objecto da disciplina em estudo.

a) Subordinação

O aspecto principal que podemos retirar da noção é a ideia de “prestar


uma actividade” – que significa prestação de facto positivo. Trata-se de

1
uma actividade que se realiza de forma subordinada – que significa
actividade prestada sob autoridade e direcção de outra pessoa.

Note-se que há prestações positivas que não são subordinadas mas que
o direito de trabalho acolhe. Exemplos: empregados domésticos, não há
subordinação, são contratos equiparados aos contratos de trabalho
para se regular aos contratos.

Orientação ou direção – (poder


de dar ordem para execução do
contrato de trabalho).

Subordinação

Autoridade (poder de sancionar o


trabalhador no caso de
incumprimento contratual).

A actividade subordinada é o objecto desta disciplina.

Só faz parte do objecto do contrato de trabalho as actividades humanas,


ou seja, as actividades desenvolvidas por pessoas. No artigo 1152 e
1152 do CC já diz quais são essas actividades (intelectual ou manual).
Trata-se aqui de desenvolvimento de uma actividade humana,
desenvolvida por uma pessoa, mas a lei não nos diz se é uma pessoa
colectiva ou singular. Teoricamente épossivel que seja uma pessoa
colectiva ou singular, mas é dificil enquadrar a qualidade de poderes
positivos e negativos da pessoa colectiva.

b) Remuneração

O segundo elemento para a essência do contrato de trabalho é a


remuneração – só há contrato de trabalho mediante remuneração. Não
há contrato de trabalho quando não haver uma contrapartida
(remuneração).

No contrato de prestação de serviço já é contrário porque está associado


ao resultado. (por exemplo, eu contrato alguém para construir um
prédio e, digo lhe que só pago o valor quando concluíres a construção.
2
O contrato de trabalho é sempre oneroso.

Em suma, dizer-se- a que o direito de trabalho corresponde ao conjunto


de princípios e normas jurídicas disciplinadoras do contrato de
trabalho, ou seja, que respeitam a uma actividade produtiva exercida
livremente para outrem e de forma subordinada, bem como todas as
restantes normas e princípios que estejam relacionados com o trabalho
subordinado, sempre que tais normas e princípios tenham sido
elaboradas com a finalidade de, directa ou indirectamente, regular o
trabalho subordinado.

Bibliografia:

Menezes Cordeiro, Manual, cit., pp. 15 a 28.

Pedro Martinez, Direito do Trabalho, cit., pp. 33 a 45.

Aula 2.

2. Âmbito de aplicação

O direito de trabalho regula quatro aspectos: as relações individuais de


trabalho (o contrato de trabalho propriamente dito); as relações
colectivas de trabalho; as intervenções do Estado na vida laboral (o
chamado direito das condições de trabalho); o processo de trabalho.

I. A relação individual de trabalho corresponde ao núcleo central


do direito de trabalho. Estão em causa regras e princípios
respeitantes a um negócio jurídico entre o empregador e o
trabalhador: o contrato de trabalho.

II. As relações colectivas de trabalho, também designadas por


direito colectivo do trabalho, por um lado, regulam e
disciplinam a constituição e actividade dos sujeitos colectivos

3
laborais, como as associações de trabalhadores e de
empregadores. Em segundo lugar, incluem-se normas que
disciplinam a relação colectiva, ou seja, as que dizem respeito
aos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho,
como seja as convenções colectivas de trabalho, elaborados
pelas pessoas colectivas de âmbito laboral, com base nas
atribuições conferidas por lei. Em terceiro lugar, cabem as
relações laborais estabelecidas no âmbito da empresa, dentro
da organização empresarial; por exemplo, a relação que
estabelece entre a empresa e a comissão de trabalhadores. Em
quarto lugar, importa fazer referência aos conflitos laborais
colectivos, em especial a greve. Finalmente serão consideradas
as normas relativas à composição amigável de conflitos, tais
como a conciliação, a mediação e a arbitragem.

III. O direito das condições de trabalho ou da proteção do trabalho


é o campo em que predominantemente, se verifica a
intervenção estadual. O Estado abandona a sua “neutralidade”
e intervém nas relações contratuais em vários aspectos. Por
exemplo quanto à segurança e higiene no trabalho, ao período
normal de trabalho e aos acidentes de trabalho. Estas normas
tem como o destinatário, tanto as entidades patronais, como
os trabalhadores.

IV. Por ultimo, também fazem parte do direito do trabalho as


normas processuais, nas quais se estabelecem
particularidades com respeito ao direito processual civil. São o
direito instrumental em relação ao direito de trabalho,
constituído por direito adjectivo, mas nem todas as regras
processuais constam do Código do Processo de Trabalho.

Bibliografia:

Menezes Cordeiro, Manual, cit., pp. 22 a 28.

4
Pedro Martinez, Direito do Trabalho, cit., pp. 48 a 50.

Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho I, cit., pp. 26 e ss.

Aula 3

3. O Direito do Trabalho como Direito Privado

O direito do trabalho insere-se tradicionalmente no âmbito, não se


colocam dúvidas quanto a qualificação do contrato de trabalho como
negócio jurídico obrigacional e, consequentemente, não se punha em
causa a natureza privatística deste ramo de direito. São vários os
autores que levantam dúvidas, discutindo se o direito do trabalho será
efectivamente um ramo do direito privado. Muitos chegam a conclusão
de que constitui um ramo de direito público, ou então que é uma
situação hibrida, um direito misto de direito privado e de direito
público.

O direito de trabalho, no conjunto das disciplinas do curso de direito


continua a ser considerado como um ramo de direito privado. Quanto a
natureza do sujeito, é sabido que os intervenientes a nível de relações
laborais, tanto na relação individual, como nas relações colectivas, não
são entidades públicas, mas sujeitos de direito privado, isto é, nenhum
dos intervenientes està munido de ius imperii (poder de força). Mesmo
no caso de instrumentos autónomos de regulamentação colectiva de
trabalho não há, verdadeiramente, uma situação de publica potestas. De
facto, verifica-se uma subordinação dos contratos de trabalho, por
exemplo, às convenções colectivas, mas, nestas, nenhuma das partes se
encontra no exercício de um poder público.

Em suma, o direito do trabalho não deve ser entendido como um


composto de direito público e de direito privado, mas antes como um
mero direito privado.

Bibliografia:
5
Pedro Martinez, Direito do Trabalho, cit., pp. 50 a 64.

4. Evolução histórica do direito de trabalho

O direito de trabalho teve o seu início com o conflito social entre as


entidades patronais e os trabalhadores, na segunda metade do séc. XIX,
com revolução industrial. A relação de trabalho não se inicia com a
revolução industrial; antes desta já havia contrato de trabalho. A origem
do direito do trabalho encontra-se no Direito Civil, fazendo parte do
Direito privado comum, as suas raízes históricas estão no direito
romano. De facto, a relação laboral sempre teve na sua base um
contrato, o qual se insere nos negócios jurídicos obrigacionais de fonte
romanística.

4.1. Direito Romano

No direito romano, o contrato de trabalho enquadrava-se numa figura


genérica, designada locação. A locação era um negócio jurídico que
poderia ter por objecto o uso de coisas, mas também a prestação de
actividade por pessoas. Os homens livres, tanto podiam locar uma
coisa, como resultado de uma actividade (obra) ou a sua força de
trabalho. No direito romano, entre os vários contratos – ao lado da
emptio venditio, da societas – encontrava-se a locatio conductio
operarum, que corresponde ao contrato de prestação de serviços, no
qual se incluía o trabalho subordinado e o independente. Em
contrapartida o conductor – tinha que pagar a outra – o locator – uma
contrapartida em dinheiro, designada merces.

No direito romano encontramos as regras precursoras do actual


contrato de trabalho na locatio conductio operarum, prevista no Digesto
(livro 19).

IV.1.2. Direito intermédio

A partir do seculo IX, mas, durante todo o período de direito intermedio


e com raízes de direito romano, verificou-se um grande desenvolvimento

6
do associativismo profissional, que veio a ser designado por
corporativismo. A partir do momento em que o desenvolvimento
económico e a estabilidade política justificavam a existência de homens
dedica-tos a um só oficio passou a ser frequentemente os trabalhadores
associarem se em corporações profissionais da sua actividade.

O principal objectivo das corporações era o de defesa dos interesses e


direitos da classe profissional que a constituía, relativamente a todas
pessoas e entidades que pudessem opor-se a sua progressão e
dignificação.

As corporações tinham regulamentos, regras precisas de orientação,


que determinavam como deveriam os membros atuarem nas relações
entre eles, disciplinando, por exemplo, a progressão na carreira ou o
tratamento que os mestres deveriam dar aos aprendizes e vice-versa. Ao
direito de trabalho interessa entre outros aspectos, a questão da
limitação das horas de trabalho – a regra de trabalhar sol a sol (entre o
nascer ao por do sol), não era nenhum exagero tendo em conta o que se
passou no seculo XIX, quando foram usuais períodos de trabalho 12, 14
e 16h por dia. De facto no período intermedio as limitações a duração
da jornada laboral, estabelecida a nível das corporações, sempre
evitavam períodos de trabalho desumanos.

As normas disciplinadoras das corporações algumas derivadas dos usos


e outras dos estatutos também se encontravam regras respeitantes ao
descanso nos domingos e feriados, quanto a contratação de aprendizes,
ao trabalho noturno e especialmente em relação ao despedimento dos
prestadores de trabalho.

Estas regras visavam a defesa da relação do trabalho, limitando as pré


potencias que se poderiam efectuar, nomeadamente, através de
despedimento sem justa causa. O direito de trabalho era visto antes
como regulador de uma relação de colaboração, num quadro
comunitário. Não é que não pudessem surgir conflitos, e houve-os mas
não se pretendia estabelecer um conjunto de regras que visassem a

7
defesa de uma classe contra a outra. O direito de trabalho era visto
antes como relação de colaboração do que como relação de conflitos.

IV.1.3. A Revolução Industrial

Como foi referido, parte dos autores retrocedem na explicação histórica


do direito de trabalho a revolução industrial relacionando a origem
deste ramo de direito com a outra classe então gerada. Foi sem dúvida a
partir da revolução industrial que se estabeleceu uma nova perspectiva
dando origem ao moderno direito de trabalho, mas o contrato de
trabalho não teve aqui a sua origem.

A questão da proteção dos trabalhadores mais desfavorecidos, crianças,


mulheres e doentes foi tida em conta aconselhando se limitações e
dispensas de trabalho assim como a protecção para os que adoeciam ou
sofriam acidentes de trabalho.

De facto foi no seculo XX após a primeira Guerra e em especial depois


da segunda Guerra Mundial que a produção jurídica no domínio laboral
teve o maior incremento, que a partir de então deixar de ser só para a
resolução de problemas pontuais, presentando-se, antes, em termos
abrangentes para além de uma internacionalização institucionalizada
dos problemas laborais através da OIT. Depois de uma época de grande
produção legislativa, de caracter imperativo, hoje, a tendência, aponta
para um flexibilização das regras de direito do trabalho, admitindo-se
por exemplo, com maior facilidade, o despedimento ou aceitando se
uma certa meabilidade na fixação do horário do trabalho.

Bibliografia:
Menezes Cordeiro, Manual, cit., pp. 41 a 49.

Pedro Martinez, Direito do Trabalho, cit., pp. 69 a 87.

8
9

Você também pode gostar