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As idéias keynesianas e o crescimento do produto nas economias locais

Keynesian ideas and product growth in local economies


Las ideas keynesianas y el crecimiento del producto en las economías locales
Jandir Ferrera de Lima*
Sinival Osorio Pitaguari**
Recebido em 04/11/2004; revisado e aprovado em 03/02/2005; aceito em 17/02/2005.

Resumo: Este artigo analisa as principais idéias que compõem o pensamento de John Keynes. Além disso, ele faz
apontamentos sobre a aplicação dos postulados “keynesianos” na dinamização das economias locais, principalmente
na expansão da renda através das atividades de exportação e da intervenção do Estado na economia.
Palavras-chave: Keynes; Teoria Econômica; Emprego; Renda; Economia local.
Abstract: This article analyzes the main ideas that compose the John Keynes thought. Moreover, it makes notes on the
application of the Keynesian postulates in the dynamics of the local economies, mainly in the expansion of the income
through the activities of exportation and of the intervention of the State in the economy.
Key words: Keynes; Economic Theory; Employment; Income; Local Economy.
Resumen: Este artículo analiza las ideas principales que componen el pensamiento de John Keynes. Por otra parte,
hace notas sobre el uso de los postulados Keynesianos en la dinámica de las economías locales, principalmente sobre
el crecimiento de la renta, con las actividades de la exportación y con la intervención del estado en la economía.
Palabras clave: Keynes; Teoría Económica; Empleo; Renta; Economía Local.

1 Os principais postulados da teoria das a partir da grande depressão de 1929,


geral de John Keynes cujos efeitos se perpetuaram na década de
1930. Essa crise assumiu um caráter mundi-
1.1 Introdução al, em grande parte, devido a depressão ins-
taurada nos Estados Unidos da América
Este artigo analisa os principais pos- (EUA). Durante essa crise, em torno de 85
tulados que compõem o chamado pensa- mil empresas e 5 mil bancos faliram somente
mento “keynesiano”, oriundo do marco te- nos EUA. Cerca de um quarto da força de
órico proposto por John Maynard Keynes, trabalho ficou desempregada e a renda na-
na sua obra mais famosa: “Teoria Geral do cional reduziu-se a menos da metade. Neste
Emprego, do Juro e da Moeda”, publicada ambiente, Keynes ganhou campo para expor
originalmente em 1936. Além disso, o artigo suas idéias e causar uma reviravolta nas
aborda o crescimento do produto nas eco- doutrinas econômicas até então.
nomias locais tendo como base alguns con- John Keynes questionou as idéias eco-
ceitos keynesianos. nômicas clássicas, cujos adeptos não aceita-
John Maynard Keynes (1883-1946), vam a possibilidade de erro nos seus postula-
foi o economista mais influente do século dos. A classificação de Keynes, sobre a eco-
XX. Seu pensamento foi um marco na crítica nomia clássica, engloba todos os economistas
ao “laissez-faire” (livre mercado) e aos que o antecederam e que aceitaram como
postulados do equilíbrio geral. Nascido na pressuposto a “lei de Say”, ou seja, a idéia
Grã-Bretanha, ele foi professor no King’s que “a oferta cria sua própria demanda”. O
College de Cambridge, sendo sua formação Conceito de economia clássica que estamos
teórica oriunda da teoria clássica de Adam mais familiarizados é aquele classificado pela
Smith, David Ricardo, entre tantos outros, lei do valor do valor trabalho, oriundos das
e teve como mestre o professor A. Pigou, obras de Adam Smith e David Ricardo. A
sucessor de Alfred Marshall na cátedra de crítica keynesiana baseia-se na tradição
economia política. “marginalista”, também chamada de escola
Apesar de uma intensa vida acadêmica neoclássica.
e pública, as idéias de Keynes serão difundi- Os neoclássicos interpretavam a crise

*
Pesquisador associado do Groupe de recherche et d’interventions régionale (GRIR) da Université du Québec à
Chicoutimi (UQAC) do Canadá, professor adjunto do colegiado de Economia e pesquisador do Grupo de Estudos
e Pesquisas em Desenvolvimento Regional e Agronegócio (GEPEC) da Universidade Estadual do Oeste do Paraná
(UNIOESTE)/Campus de Toledo. (jandir@unioeste.br e jandirbr@yahoo.ca)
**
Professor auxiliar do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). (sinival@uel.br.)

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Revista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 11-20, Mar. 2005.
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da década de 1930 como um desajuste cíclico próprias pessoas empregadas) para provocar o
de curto-prazo. Para os neoclássicos não afluxo do volume de mão-de-obra e efetiva-
mente ocupado, com a qualificação de que a
eram suas teorias que estavam erradas, mas igualdade para cada unidade individual de tra-
as interferências artificiais, externas ao mer- balho pode ser alterada por combinações entre
cado, que provocavam as crises. O principal as unidades disponíveis para empregar-se,
desvio, segundo eles, era a inflexibilidade dos analogamente às imperfeições da concorrência
que qualificam o primeiro postulado. ( p. 18)
salários provocada pela interferência dos sin-
dicatos no mercado de trabalho e a influên- Keynes preservou o primeiro postula-
cia danosa do Estado no sistema de merca- do e negou o segundo. Segundo a teoria clás-
do. Essa seria a razão do grande número de sica, o excesso de trabalhadores desempre-
desempregados (HUNT & SHERMAN, gados se deve a sua recusa em trabalhar. Os
1977). Frente a estas interpretações, John trabalhadores desempregados não aceitari-
Keynes começa a construir um corpo teóri- am um salário nominal menor, que permiti-
co capaz de destruir as bases dos pressupos- ria às empresas contratar mais mão-de-obra.
Esse argumento comete a falha técni-
tos neoclássicos e infundir um novo modo
ca de subestimar a diferença entre o salário
de entender a economia, a partir de seus
real e o salário nominal. Tanto que o traba-
agregados.
lhador não estaria disposto a abandonar seu
emprego com a alta dos preços, embora te-
1.2. Teoria Keynesiana do emprego
nha resistência a perda do seu poder de com-
pra. Em outras palavras, o trabalhador co-
John Keynes, em um artigo intitulado nhece sua posição relativa no mercado de
“o fim do laissez-faire”, publicado original- trabalho, por isso, tenta preservar seus be-
mente em 1926, já fazia uma série de críticas nefícios em relação às outras categorias de
as doutrinas liberais. No entanto, na sua trabalhadores. Além disso, num período de
principal obra “A Teoria Geral do Emprego, recessão e altas taxas de desemprego, como
do Juro e da Moeda”, publicada original- a de 1929, os trabalhadores demitidos acei-
mente em 1936, são montados os elementos tariam facilmente ganhar menos num novo
de análise que vão questionar os pressupos- emprego para não ficarem desempregados.
tos neoclássicos e gerar uma nova era no pen- Por outro lado, a idéia de flexibilidade
samento econômico. Na “Teoria Geral”, o dos salários (W), junto com os preços, era
economista inglês começa demostrando que um elemento fundamental para os ajustes
o desemprego não é causado pela recusa do no equilíbrio de mercado. Se os salários fos-
trabalhador em aceitar uma redução de salá- sem rígidos, isto é, se não oferecessem modi-
rio. Ele afirma que a taxa de desemprego ficações rápidas no decorrer do tempo, a idéia
pode variar sem que “haja qualquer mudan- do equilíbrio geral da economia no longo-
ça aparente nos salários reais mínimos exigi- prazo ficaria debilitada. Os ajustes rápidos
dos pelo trabalhador ou na sua produtivida- nos salários possibilitariam com que o siste-
de”. (KEYNES, 1970, p. 22). Assim, ele expõe ma buscasse sempre o ponto de equilíbrio no
da seguinte forma os dois postulados clássi- longo-prazo. A idéia da flexibilidade pode
cos sobre o emprego, que vão ser alvos de ser ilustrada com a figura 01.
duras críticas: Pela figura 1, o ponto de equilíbrio se-
I. O salário é igual ao produto marginal. ria aquele em que o salário real (W/P) possi-
Quer dizer que o salário de uma pessoa bilitasse uma interação entre as curvas de
empregada é igual ao valor que se perderia se
o emprego fosse reduzido de uma unidade
oferta de mão-de-obra (Ns) e a demanda de
(depois de feita a dedução dos outros custos mão-de-obra (Nd), a um dado nível de ocu-
que essa redução de produção evitaria), com a pação da mão-de-obra (N). Assim, o ponto
restrição de que a igualdade pode ser alterada, de equilíbrio possibilitava volumes adequa-
de acordo com certos princípios, pela dos de produção e de demanda, ou seja, a
imperfeição da concorrência e dos mercados”.
igualdade entre a oferta e a demanda. Para
II. A utilidade do salário, quando se emprega
dado volume de capital, é igual à desutilidade
qualquer mudança que retirassem a econo-
marginal desse mesmo volume de emprego . mia do ponto de equilíbrio por-se-iam em
Significa isto que o salário real de uma pessoa é ação forças que conduziriam a economia
o que precisamente basta (na opinião das novamente ao equilíbrio (A). Teoricamente,

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Figura 1: Equilíbrio no Mercado de Trabalho.

W/P
Ns Onde:
N = Nível de
ocupação da
W/P 0
mão-de-obra.
Nd W/P = Salário real.
N Ns = f (W/P)
N0
Nd= f (W/P)-1
Fonte: Keynes, 1970.

estes ajustes somente seriam possíveis com a essa parte de sua renda que ele poupa, assim
como faz com a parte que ele gasta. Diz-se que
idéia da flexibilidade dos salários e preços ele gasta quando procura obter satisfação
(P), já que o W/P é ponderado sobre o nível presente dos serviços e mercadorias que
geral de preços. Com isso, o equilíbrio de lon- adquire. Diz-se que ele poupa quando ele faz
go-prazo com pleno-emprego dos fatores de com que o trabalho e as mercadorias que ele
produção estaria sempre garantido. No en- compra sejam aplicados na produção da riqueza
de que espera derivar os meios de satisfação do
tanto, para Keynes (1970), os salários não futuro. (MARSHALL, 1988, p. 26-27).
eram flexíveis. Ele vai demonstrar essa idéia
Ora, para a teoria clássica está implíci-
a partir dos seus postulados sobre a deter-
to que a renda não gasta por um indivíduo
minação da renda.
será utilizada pelos empresários. Os empre-
sários investirão essa renda poupada pelas
1.3 Considerações sobre a determinação pessoas na compra de mercadorias e na
da renda. contratação de trabalhadores para o aumen-
to da produção. Em compensação, o poupa-
A economia clássica desde David dor espera receber no futuro, o valor poupa-
Ricardo, com exceção de Thomas Malthus, do acrescido de um ganho extra 1. Porém,
aceitava o postulado de Jean B. Say de que a para Keynes (1970), os clássicos enganavam-
oferta cria sua própria demanda. Além dis- se ao pensar que as decisões de abster-se de
so, os clássicos acreditavam que o total dos um consumo imediato, estão ligadas a de
salários pagos no processo de produção era
prover um consumo futuro, quando não
gasto na compra do produto. J. S. Mill (1986),
existe nenhuma relação simples entre elas.
na sua obra “Princípios de Economia Políti-
Admitida a igualdade entre o preço de pro-
ca”, expressa da seguinte forma essa idéia:
cura e da oferta da produção, deduz-se então
Os meios de pagamento das mercadorias são as
próprias mercadorias. O meio de pagamento uma série de hipóteses sobre a taxa de juros,
de cada pessoa pelas produções de outros indi- sobre o equilíbrio entre demanda e oferta de
víduos, consiste daquilo que ela mesma possui. emprego, sobre o papel da moeda no siste-
Todos os vendedores são inevitavelmente, e
ma e as vantagens do laissez-faire. Para com-
pelo significado da palavra, compradores.
(MILL, 1986, p. 104). provar suas hipóteses, Keynes (1970) propo-
Mill (1986) afirmava que qualquer au- rá o princípio da demanda efetiva.
mento de produção leva necessariamente a
um aumento equivalente dos meios de pa- 1.4 O princípio da demanda efetiva
gamento dessa produção. Como corolário a
essa teoria, Marshall (1988) concluirá que a Antes de tratar do princípio da deman-
abstenção individual do consumo leva ine- da efetiva será ocasional definir alguns con-
vitavelmente a um investimento na produ- ceitos: O primeiro é o de custo de fatores, par-
ção de riqueza. ticularmente o custo do emprego da mão-
O Total da renda de um homem é despendido de-obra. O segundo é o custo de uso, ou seja,
na compra de serviços e de mercadorias. De o custo dos bens comprados a outros empre-
fato, diz-se usualmente que um homem gasta endedores mais o custo da utilização do seu
uma parte de sua renda e poupa a outra parte.
Mas é um familiar axioma econômico que um equipamento. Cabe salientar que a diferen-
homem compre trabalho e mercadorias com ça entre o valor da produção resultante e a

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soma dos custos de fatores e de uso, é o lu- ção de oferta global e a função de procura
cro ou a renda do empreendedor. global seriam iguais. Na suposição que “a
Assim, o custo de fatores é a renda dos oferta cria sua própria procura”, então “o
fatores de produção sob a ótica do empre- preço da procura global (ou produto) sem-
endedor. A soma dos custos de fatores mais pre se ajusta a qual for o valor de N, o pro-
o lucro será a renda total resultante do em- duto D adquire um valor igual ao preço da
prego fornecido pelo empreendedor. Do pon- oferta global Z que corresponde a N”.
to de vista do empreendedor, convém algu- (KEYNES, l970, p.37 e 38). Assim, segundo
mas vezes chamar produto de um dado vo- os clássicos, o volume de emprego é
lume de emprego, ao rendimento global (RE) indeterminado, salvo na medida em que a
que ele resulta, ou seja, o custo dos fatores desutilidade marginal do trabalho lhe fixe
mais o lucro. O preço da oferta global dos um limite superior. Se isso fosse verdade, o
produtos resultantes do emprego é a retri- pleno emprego seria facilmente atingido, pois
buição esperada pelo empresário. O preço a concorrência entre os empresários levaria
da oferta total é líquido do custo de uso, este sempre a um aumento do emprego, até que
só será somado ao preço da oferta total, no a oferta global desse, fosse inelástica. Neste
preço pago pelo comprador. ponto, um aumento da procura efetiva não
Dado o estágio da técnica, dos recur- levaria a um aumento da produção.
sos e dos custos de fatores por unidade de Supondo que os salários nominais e
emprego, o volume deste é fixado pelo mon- outros custos permaneçam sem variação
tante que os empresários esperam receber da monetária, quando o emprego aumenta,
correspondente produção, ou seja, eles fixam aumenta também a renda global. Como a
o emprego no ponto de máximo da diferen- propensão marginal a consumir é menor que
ça entre o produto e o custo de fatores. um (1), o consumo aumentaria, mas não na
A figura 2 ilustra esta relação, onde Z mesma proporção do aumento da renda. A
é a oferta global resultante do emprego de diferença entre o produto e o consumo é a
N homens e D é a função de procura global. poupança. A economia estará em equilíbrio
O volume de emprego fica estabelecido no se a poupança for igual ao investimento re-
ponto de intercessão da função da procura alizado pelos empresários. Quanto a isto,
global com a função da oferta global. Neste Keynes (1970) afirma que a justificativa para
ponto que são maximizadas as previsões de a criação de empregos reside na existência
lucro dos empresários. A procura efetiva é de investimentos que absorvam os exceden-
definida como o valor de D no ponto de in- tes de produção, mantendo ou até mesmo
tercessão da função da procura global com aumentando a receita dos empresários, esti-
a da oferta global. No momento que D for mulando-os a oferta de novos postos de tra-
maior que Z há um estímulo para o aumen- balho. Então, dada a propensão marginal a
to do emprego e a produção de novos bens, consumir, os empresários ampliarão ou re-
até o momento em que Z=D. duzirão o emprego, através do nível de in-
Para a doutrina clássica a qualquer vestimento. O incentivo ao investimento de-
volume de produção e de emprego, a fun- pende da relação entre a escala da eficiên-

Figura 2: Demanda Efetiva

RE Z

Onde,
D Z= f (N) = oferta global.
R E0 D= f (N) =Demanda global.
RE = Rendimento global.
N= Nível de ocupação da
mão-de-obra.
N
N0

Fonte: Keynes (1970).

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cia marginal do capital e o complexo das 1.5 Poupança, taxa de juros e


taxas de juros inerentes aos empréstimos de investimento.
prazos e riscos diversos.
Assim só pode haver um nível de em- Se a satisfação dos indivíduos é a re-
prego compatível com o equilíbrio: Renda = muneração pelo seu trabalho, se o lucro é a
Consumo + Investimento. Caso contrário, a remuneração pelo seu investimento, então
procura global e a oferta global seriam dife- os juros são a remuneração pela renda não-
rentes. Este nível de emprego pode estar gasta, isto é, pela poupança. Na verdade do
abaixo, mas não superior ao pleno empre- mesmo modo que o lucro é a “recompensa”
go. Este fato atesta a relação mútua entre a ao capitalista por ele se comportar como ca-
propensão marginal a consumir e os incen- pitalista produtivo, os juros são a “recom-
tivos para investir. pensa” do capitalista pelo seu desejo de con-
Frente a este aspecto, não é a tinuar sendo capitalista, ainda que não seja
desutilidade marginal do capital, expressa capitalista produtivo. Ele é recompensado
em salários reais, que determina o nível de por se recusar a reter dinheiro na forma lí-
emprego. O nível de emprego é determina- quida, estéril, ou como afirma Keynes (1970),
do pela propensão marginal a consumir um prêmio por não entesourar sua renda.
mais o investimento, que determina também No entanto, para haver equilíbrio na
o nível dos salários reais. Caso a propensão economia é preciso que a demanda por in-
marginal a consumir e o montante do inves- vestimentos cresça em magnitude igual ao
timento resultem numa insuficiência da pro- acréscimo da oferta global menos o acrésci-
cura efetiva, o volume do emprego cai até mo do consumo. O problema é que ninguém
ficar abaixo da oferta de mão-de-obra dis- garante que isso ocorre, pois depende das
posta a trabalhar pelo salário real em vigor. expectativas dos empresários. Os empresá-
Ocorre assim uma situação de desemprego rios comparam o lucro esperado do investi-
involuntário. Este fato explica o paradoxo mento com a taxa de juros. Eles verificam a
da “pobreza em meio à abundância”, pois a eficiência do investimento frente às alterna-
insuficiência de procura efetiva não permite tivas de aplicação do capital e ao custo de
à economia de chegar ao seu ponto de ple- tomar este capital junto aos bancos
no-emprego. Para Keynes (1970, p. 42) “a (KEYNES, 1987a).
insuficiência da procura efetiva porá um Por outro lado, na teoria clássica a taxa
freio ao processo de produção, ainda que o de juros seria o preço de desequilíbrio entre
valor do produto marginal da mão-de-obra a oferta de recursos existentes para o inves-
continue superior a desutilidade marginal timento e a procura destes pelos investido-
desse volume de emprego”. res. Qualquer taxa de juros daria pleno em-
Keynes (1970) observa também a ten- prego e garantiria o equilíbrio entre a pou-
dência de se alargar a distância entre o pro- pança e o investimento. Não se aceitava uma
duto real e o produto potencial quanto mais desigualdade entre ambos. Mas, para Keynes
rica for a nação. Um país pobre tenderá a (1987, 1987a), a poupança depende muito
consumir quase toda a sua produção, sendo mais do nível de renda, do que da taxa de
assim, um pequeno investimento garante o juros. Esta por sua vez, seria definida pela
pleno emprego. Num país rico, a poupança relação entre a oferta (em geral inelástica,
será muito maior, pois a propensão margi- no curto-prazo) de moeda e sua procura. O
nal a consumir é mais fraca. Da mesma ma- dinheiro não é visto meramente como um
neira, a dificuldade para que a poupança seja numerário, mas como elo entre o presente e
totalmente investida na produção será mai- o futuro, como reserva de valor. O dinheiro
or, com a agravante do capital acumulado como reserva de valor é estéril, não rende
ser muito grande. nem lucro nem juros. O desejo de manter o
dinheiro como reserva de valor é um barô-
metro do grau de incerteza ao futuro. Com
isso, a contrapartida exigida para o indiví-
duo separar-se dele destaca o montante de
sua inquietação quanto aos dias que virão.

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A taxa de juros é apenas um dos con- 1950 vários trabalhos científicos convergiram
dicionantes do investimento, o outro é o lucro na adaptação dos conceitos keynesianos
esperado do investimento, o que Keynes cha- para explicar a dinâmica da economia regi-
ma de eficiência marginal do capital. Quando onal e urbana. Desses trabalhos, pode-se ci-
o capitalista espera alcançar uma taxa de re- tar os estudos clássicos de North (1956),
torno (em forma de lucro) com o investimen- Hirschman (1964), Isard (1972), Perroux
to em bens de capital, matéria prima e mão- (1982) e Lopes (1987). Conseqüentemente,
de-obra maior do que a taxa de juros, ele cer- essas análises clássicas forneceram elemen-
tamente optará pelo investimento, como tos para a compreensão da dinâmica da eco-
mencionado anteriormente. Keynes (1970, nomia local. Para o caso brasileiro, pode-se
1987a) estabelece então expectativas, basea- citar como referência os estudos de Souza
do nas premissas que os agentes econômicos (1981), Haddad (1989), Rippel e De Lima
formam na tentativa de prever o movimento (1999) e De Lima et all (2004). Esses estudos
das variáveis econômicas, já que o seu ambi- têm como elo comum a aplicação da análise
ente é de incerteza. Num debate, Keynes regional e dos pressupostos keynesianos para
(1987, p.151) afirmaria, que esta taxa de juros interpretar a dinâmica regional do Brasil e
“... equipara as vantagens da posse do di- de algumas regiões ou municípios brasileiros.
nheiro e do direito futuro sobre este”. Esses estudos partem do pressuposto
O investimento flutua por razões dife- que nenhuma região ou economia local é
rentes daquelas que determinam a propen- fechada, ou seja, elas interagem com a es-
são a consumir. Assim, só por coincidência trutura produtiva de outras regiões ou es-
a “brecha” entre o consumo e a renda será paços. Nesse sentido, as economias locais
preenchida pelo investimento. Dada a pro- mantêm uma estrutura de comércio inter-
pensão marginal a consumir (curto prazo), regional para dinamizar sua demanda efe-
o volume de consumo está determinado pelo tiva. Sem contar é claro com a participação
nível de renda. Mas, a renda é determinada do setor público, através da política pública,
pela produção de bens de consumo e de bens visando a expansão do emprego e da renda.
de capital. No entanto, decorre que os empre- Assim, a base produtiva de exportação e os
sários acharão que vale a pena produzir uma investimentos do setor público são elemen-
quantidade de bens de consumo que vai de- tos essenciais na dinamização das economi-
pender da quantidade de bens de capital que as regionais ou locais.
eles estão produzindo. Tomando como exemplo a economia
Portanto, é o montante de investimen- local, no caso da base produtiva de exporta-
to que determina o nível de emprego. E se o ção, ela utiliza as atividades de exportação
emprego e a renda global aumentam, nem ou de base como elemento-chave do seu cres-
todo emprego adicional será requerido para cimento econômico. Nesse sentido, o produ-
satisfazer as necessidades do consumo adici- to agregado local pode ser expresso pela se-
onal. Este aumento do emprego só será van- guinte equação:
tajoso se um novo investimento vier a pre-
Y= I + G + C + (X – M) (01)
encher a nova “brecha”. Daí que Keynes
(1985) admite que a regulação do investimen- Na equação (01), I são os investimen-
to corrente não pode ficar abandonada ape- tos ou gastos dos empresários, G os gastos
nas à iniciativa privada, caso contrário, as do setor público, C o consumo das famílias,
tendências às crises seriam mais freqüentes, X as exportações e M as importações. As-
vinculada um fluxo circular que poderia cau- sim, um aumento nessas variáveis causará
sar até mesmo uma depressão, até o momento uma expansão na renda ou produto da eco-
que um fato novo viesse reverter o processo. nomia, expresso por Y. Por exemplo, uma
expansão nas exportações (X) de um setor
1.6 As idéias de Keynes e o crescimento específico (a) estimulara a oferta de empre-
do produto nas economias locais. gos. Por sua vez, novos postos de trabalho
significam mais salários pagos e um aumen-
A análise keynesiana opera no campo to no consumo das famílias. O acréscimo no
da macroeconomia. No entanto, a partir de consumo das famílias representa um aumen-

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to da demanda efetiva, principalmente nos tos públicos. Uma expansão na propensão a


setores que produzem para o mercado in- consumir do setor público (G) também cau-
terno. Por isso, o efeito expansivo no produ- sará um efeito de crescimento sobre a renda
to local (Y) só será reduzido se um aumento local. No entanto, esses gastos públicos são
nas importações (M) for mais expressivo que dependentes da capacidade de financiamen-
as exportações (X). A dinâmica da renda lo- to do Estado e da natureza da despesa pú-
cal, estimulada pelo setor exportador, será blica. Por exemplo, uma expansão do gasto
expresso pela equação (02): público na mesma proporção de um aumen-
to nos impostos não surtirá um efeito
∂Y = ∂X (1/ ∂S + ∂M) / ∂Y = ∂X (1/ S a + Ma) multiplicador sobre a renda total. Keynes
Na equação (02), “a” representa o se- (1970) caracteriza essa situação como o
tor exportador e S o saldo da balança co- teorema do orçamento equilibrado. Por ou-
mercial (X-M). Sa e Ma representam a pro- tro lado, se o gasto público for efetuado para
pensão marginal para a formação de um criar uma infra-estrutura capaz de diminuir
excedente de exportação. Esse excedente de os custos de produção e viabilizar o setor
exportação será o resultado da diferença produtivo, então a economia local melhora-
entre a demanda efetiva local e o total pro- rá suas condições estruturais de crescimen-
duzido na economia. As exportações seriam to e desenvolvimento.
um canal para complementar a demanda Para Keynes (1970), através de algu-
efetiva e garantir o dinamismo da economia mas políticas econômicas e dos dispêndios
local a longo-prazo. do governo, é possível obter-se o pleno-em-
Nessa lógica, a produção local pode ser prego ou chegar o mais próximo dele, utili-
dividida em produção para consumo inter- zando-se da manipulação de algumas vari-
no local e excedente de exportação. A pro- áveis macroeconômicas, como segue:
pensão para a produção de bens para o con- 1) A quantidade de moeda: Ela é tida como
sumo interno local será: uma variável exógena, mas governo pode
influir na taxa de juros, variando a oferta
∂I=∂Yia=∂X (ia/Sa+Ma) (03) de moeda. Adotando que aumentam a
oferta de moeda como, por exemplo, di-
Aceitando-se que as atividades expor- minuindo a taxa de redesconto bancário,
tadoras são capazes de dinamizar a econo- a taxa de juros do mercado deverá cair. Se
mia local, então 1/Sa +Ma é o efeito multi- a taxa de juros for baixa em relação à efi-
plicador da economia local, onde i represen- ciência marginal do capital, a economia
ta a taxa de juros. Esse efeito multiplicador tende ao pleno emprego. No entanto, para
é causado pela expansão das atividades ex- Keynes (1985), estas medidas deveriam ser
portadoras ou de base. efetivadas de forma a não deturpar a
Deve-se ressaltar que o multiplicador credibilidade da moeda, o que poderia cau-
keynesiano, transposto para as economias sar até mesmo a ruína da nação.
locais, é um instrumento simples para as 2) O efeito multiplicador do investimento: Ele
generalizações do crescimento econômico depende da propensão a consumir e a pou-
local. Seu sucesso vai depender em muito do par. Quanto mais concentrada for a ren-
sucesso da escolha dos setores exportadores, da nacional, menor será a propensão a
da capacidade desses setores em gerarem consumir e maior a propensão a poupar
excedentes, do perfil do consumo local ao da sociedade como um todo, portanto o
longo do tempo e da capacidade da econo- efeito do multiplicador do investimento
mia local em manter os superávits na balan- será reduzido. Adotando uma política fis-
ça comercial. Por isso, a hipótese da cal distributiva de renda, o governo estará
dinamização da produção e da demanda possibilitando uma elevação da propensão
local, através da base de exportação, requer marginal à consumir, com isso, permitin-
saldos positivos na balança comercial. do que a economia possa chegar ao pleno
O segundo elemento de dinamização emprego. Dado a distribuição de renda e
da demanda efetiva e da produção local é a a propensão ao consumo, se o governo não
ação do setor público, em particular dos gas- conseguir baixar a taxa de juros, com sua

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política econômica , o remédio é o próprio marginal do capital, além da elevação na


governo acrescentar seus gastos públicos, taxa de juros, dado o aumento da incerteza
elevando a demanda efetiva para não frus- e da inquietude em relação ao futuro. Neste
trar as expectativas em que se baseia a efi- caso, a economia entra em recessão e se ini-
ciência marginal do capital. De forma irô- cia um processo cumulativo de retração de
nica Keynes (1970, p.129) propõe: gastos e, portanto, do emprego. A saída da
A construção de pirâmides, os terremotos e até crise está na recuperação da eficiência mar-
as guerras podem contribuir para aumentar a ginal do capital.
riqueza, se a educação dos nossos estadistas nos
princípios da economia clássica impedem uma
Neste sentido, deve-se ressaltar que a
solução melhor (...) Se o Tesouro se dispusesse própria crise prepara sua recuperação quan-
a encher velhas garrafas usadas com notas de do “a escassez do capital pelo uso, a deteri-
bancos, as enterrassem a profundidades conve- oração e a obsolescência se torne bastante
nientes em minas de carvão - abandonadas -
que logo se cobririam com os detritos urbanos
óbvia para aumentar a eficiência marginal”
e deixasse à iniciativa privada, de acordo com (KEYNES, 1970, p. 303). O problema é que
os bens experimentados princípios do laissez- ela não se recupera tão violentamente como
faire, o cuidado de desenterrar novamente as cai. Assim, o período de crise pode ser dolo-
notas, o desemprego poderia desaparecer e, com
a ajuda das repercussões, é provável que a renda
roso demais. O que pode ser feito para ace-
real da comunidade bem como a sua riqueza lerar a recuperação? Na “Teoria Geral”, John
em capital fosse sensivelmente mais altos do Keynes sugere medidas que modifiquem o
que o são atualmente. Claro que seria mais padrão de renda da população, no sentido
ajuizado construir casas ou algo semelhante;
mas se a tanto se opõe dificuldades políticas e
de melhorá-la, favorecendo a tendência ao
práticas, o recurso citado não deixa de ser consumo. A propensão a consumir condu-
preferível a nada. ziria a um aumento das atividades produti-
Considerando as “dificuldades políti- vas e ao crescimento econômico, melhoran-
cas e práticas”, referidas por Keynes (1970), do também os ganhos dos empresários.
a produção de “inutilidades” como as pirâ- Com isso, frente à insuficiência de de-
mides, perdem o sentido de desperdício e manda, ou dos próprios investimentos, o Es-
servem como soluções. O importante é que tado assumiria um papel preponderante e
os investimentos públicos não aumentem a anticíclico na economia. Keynes (1970,
capacidade de produção da economia. Nes- p.356) só não admite que o Estado se envolva
sa situação os investimentos têm que ser im- no setor produtivo, afirmando que “(...) não
produtivos. A contribuição principal que o é a propriedade dos meios de produção que
Estado poderia dar ao aumento da produ- convém ao Estado assumir”. Ao Estado
ção seria garantir a demanda efetiva aos in- intervencionista caberia aquilo que a inicia-
vestidores privados. Frente a esta necessi- tiva privada não pudesse ou não quisesse
dade, a insuficiência de consumo é o grande fazer.
causador de crises. Deve-se ressaltar que as alterações na
O próprio Keynes (1970, p.309-310) demanda efetiva, advinda da expansão das
reconhece que dada as dificuldades de elevar atividades de exportação ou da despesa pú-
o investimento, não há “outros meios de me- blica, têm três efeitos sobre a renda da econo-
lhorar o nível de emprego além do de aumen- mia local: um efeito direto associado à remu-
tar o consumo”. E mais adiante, “é impro- neração das famílias, que dependem do setor
vável que o pleno emprego possa ser manti- exportador; um efeito indireto, que vai esti-
do com a propensão à existente, façamos o mular a produção dos setores não exporta-
que fizermos com respeito ao investimento”. dores; um efeito induzido pelo acréscimo de
A crise surge quando as expectativas, renda causado pela expansão do emprego
que geraram um determinado nível de efici- nos setores exportadores e não exportadores.
ência marginal do capital são frustradas, Portanto, esses dois elementos de dina-
eram falsas ou exageradas. O resultado é um mização da economia local não são únicos.
sobre investimento seguido de um corte na Na realidade, a análise pormenorizada do
demanda efetiva (pela retração do investi- crescimento econômico, a partir dos postula-
mento e, portanto, do próprio consumo), o dos keynesianos, foi proposta por Harrod
que significa um mergulho na eficiência (1966) com seu modelo Harrod-Domar. No

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As idéias keinesianas e o crescimento do produto nas economias locais 19

entanto, os dois elementos apresentados fa- amento causando a elevação da carga tri-
zem uma ilustração das possibilidades de butária sobre salários e lucros.
adaptação dos postulados keynesianos em Keynes (1970, 1985) defendia três ti-
escala local. pos de intervenção do Estado na economia:
a política monetária, para controle da taxa
1.7 A crise do keynesianismo de juros, de forma a garantir a eficiência
marginal do capital; a política fiscal, para
A política econômica keynesiana pode intervenção na distribuição de renda, de for-
amenizar as crises do capitalismo, pode re- ma a controlar a propensão marginal a con-
tardar seu surgimento e acelerar sua recu- sumir a poupar e a investir; e por fim, a po-
peração. Porém, a intervenção do Estado tem lítica de gastos públicos, para sustentação da
limites econômicos e políticos, impedindo demanda efetiva. Destarte, a partir da II
que as crises e os ciclos econômicos sejam Guerra Mundial, incorporou-se ao receituá-
eliminados. Mais grave ainda é que as polí- rio keynesiano, o investimento público em
ticas econômicas de que dispõe o Estado ca- empresas estatais, normalmente em setores
pitalista tendem a agravar as contradições menos rentáveis e de um prazo maior para
que levarão a crises mais graves e profun- maturação dos investimentos. Essas empre-
das no futuro. Neste sentido, deve-se ressal- sas normalmente produzem insumos, que
tar as duas maiores contradições da política são vendidos a preços subsidiados às empre-
econômica keynesiana, quais sejam: sas privadas.
Em primeiro lugar, a possibilidade de O conjunto dessas políticas leva ao
o capitalismo manter a economia no pleno crescimento do endividamento do Estado e
emprego é impossível, a menos que sejam a possibilidade de “espiral” inflacionária,
eliminadas as inovações técnicas nos meios quando o financiamento dos gastos públi-
de produção e no processo de trabalho. No cos se dá pela emissão desordenada de moe-
entanto, são essas inovações que permitem da. Assim, a partir de um momento o Esta-
o aumento dos lucros. do já não é mais capaz de continuar finan-
Mesmo que fosse possível a manuten- ciando a acumulação de capital. Nesse mo-
ção do pleno emprego, isso traria sérios pro- mento a própria política keynesiana, passa
blemas aos capitalistas, pois traria um maior ser responsabilizada pela crise. Todos se vol-
poder de barganha aos trabalhadores, para tam contra o Estado esbanjador, como o prin-
obter ganhos de salários reais. Isso faria bai- cipal culpado pelo déficit público, pela in-
xar a taxa de lucro, ou a eficiência marginal flação e pela crise. Nesse momento a crise
do capital, diminuiria os investimentos e a econômica assume também, o conteúdo de
economia poderia entrar em crise. Para não uma crise política de Estado, levando a uma
falar na possibilidade de acirramento da luta reflexão sobre o seu real papel.
pelo poder político entre os trabalhadores e De certa forma, os acontecimentos que
os proprietários dos meios de produção. A se seguiram após a década de 1970, em que
manutenção do pleno emprego, numa eco- a economia mundial mergulhou num pro-
nomia capitalista não só é impossível, como cesso de estagflação, contribuiu para questi-
é indesejável, aos capitalistas. Normalmen- onar os “remédios’ keynesianos na atualida-
te, os curtos períodos onde a economia che- de. Fato que processou a retomada dos
ga próxima ao pleno emprego, apenas pre- paradigmas rechaçados pela “Teoria Geral”
coniza a crise que vem logo a frente. . O retorno dos postulados clássicos, agora
Em segundo lugar, a política de inter- com uma “roupagem” mais moderna, vem
venção do Estado na economia, em favor da de encontro a uma ciência econômica em
acumulação de capital, mais cedo ou mais crise, principalmente frente aos “velhos”
tarde, esbarra no limite da capacidade de problemas, como desemprego e inflação,
financiamento do próprio Estado. De acor- cujas soluções temporárias não tem garanti-
do com Sutcliffe (1979), apesar dos dispên- do o seu extermínio no longo-prazo.
dios do Estado fomentar o consumo de pro-
dutos e realizar a mais-valia gerada no sis-
tema produtivo, as mesmas exigem financi-

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2 Conclusão Referências
DE LIMA, Jandir F.; PIACENTI, Carlos A.; ALVES, Lucir
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foi tornar a ciência econômica novamente Sociologia Rural (SOBER), Cuiabá. Anais... Cuiabá:
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quentemente está à mercê das intervenções métodos de análise. Fortaleza: BNB/ETIENE, 1989.
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ção por si só estabelece que o sistema não Équilibre économique. Paris : Dunod, 1972.
tende “necessariamente” a um equilíbrio KEYNES, John M. A teoria ex ante da taxa de juros. In:
Literatura Econômica, 9 (2): 165-172, 1987.
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econômicos. Em vista disso, a espera de uma _____. Inflação e deflação. São Paulo: Abril Cultural, 1985.
(Os Economistas).
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_____.Teorias Alternativas da Taxa de Juros. In:
poderia conduzir a crises profundas no cur- Literatura Econômica, 9 (2): 147-158, 1987a.
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_____.Teoria geral do emprego, do juro e da moeda (Tradução
Junto ao postulado da demanda efeti- do original em inglês 1936). São Paulo: Atlas, 1970.
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Presses universitaires de Grenoble, 1982.
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RIPPEL, Ricardo; DE LIMA, Jandir F. Encadeamentos
ca, a obra de Keynes serve como marco refle- produtivos e desenvolvimento regional no município
xivo para a viabilidade das transformações de Toledo (PR): o caso da Sadia-Frigobrás e das
que vem sendo postas em marcha nos mer- indústrias comunitárias. In: CASIMIRO FILHO, F.;
cados emergentes, em especial o Brasil. SHIKIDA, P. F. A. (org.). Agronegócio e desenvolvimento
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Nota: SOUZA, Nali J. de. Estrutura espacial da indústria


gaúcha 1975-1979. In: Perspectiva econômica. v. 11, n. 34,
1
Na versão moderna da teoria clássica, elaborada já pp. 39-100, 1981.
no inicio do século XX, não se encontra na ação da SUTCLIFFE, Brian. O keynesianismo e a estabilização
moeda, um fator que pudesse distorcer gravemente das economias capitalistas. In: NORE, P & GREEN, F.
a teoria da produção elaborada por Mill (1986) sobre (org.) A economia: um antitexto. Rio de Janeiro: Zahar,
uma base de trocas reais. 1979, p. 195-214.

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