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Teor de nutrientes em folhas de Vochysia thyrsoidea e Vochysia bifalcata no

Parque Nacional do Caparaó


Ítalo Favoreto Campanharo1, Marcos Vinicius Winckler Caldeira1, Kallil Chaves Castro1, José
Renato Azedias1, Apeles Costa Ribeiro1, Lucas José Mendes1
1
UFES – Universidade Federal do Espírito Santo/Centro de Ciências Agrárias e Engenharias/Departamento de
Ciências Florestais e da Madeira. E-mail: italocampanharo@gmail.com

Resumo
A redistribuição de nutrientes é uma importante estratégia de ciclagem de nutrientes realizada
pelas plantas, pois garante que ela reduza a perda de alguns nutrientes, assim, permitindo o
desenvolvimento em ambientes com solos pobres, contudo pouco se conhece sobre este
mecanismo em espécies nativas da Floresta Atlântica. O presente estudo foi realizado em um
trecho da Floresta Ombrófila Densa, Parque Nacional do Caparaó, ES. O trabalho teve como
objetivo analisar os teores e a redistribuição de macronutrientes em folhas maduras e
senescentes de Vochysia thyrsoidea Pohl. e Vochysia bifalcata Warm. A coleta do material
(folhas senescentes e maduras) procedeu-se em outubro de 2013 realizando-se um mix de
folhas de mesma espécie e estágio vegetativo, assim, totalizando quatro amostras. Dos
macronutrientes, N, K e Ca obtiveram os maiores teores em folhas maduras, K foi o elemento
com maior redistribuição para ambas as espécies estudadas.

Palavras-chave: Retranslocação de nutrientes; ciclagem de nutrientes, Floresta Atlântica.

1. Introdução
A disponibilidade de nutrientes limita o crescimento e estoques de carbono das árvores em
ecossistemas florestais. De forma que a limitação de nutrientes pode ser avaliada por meio de medidas
da disponibilidade de nutrientes no solo vinculados aos teores de nutrientes nos tecidos vegetais
(VITOUSEK, 2004). De acordo com Chapin (1980), plantas que se desenvolvem em solos de baixa
fertilidade podem apresentar maiores teores de nutrientes nas folhas do que plantas de solos com boa
fertilidade. Esta questão, provavelmente, está relacionada ao desenvolvimento de mecanismos
estratégicos de conservação de nutrientes pela espécie vegetal (BREEMEN, 1995), preconizada pela
eficiência na utilização dos nutrientes pelas plantas.
Neste sentido, um importante mecanismo de aproveitamento de nutrientes é a ciclagem
bioquímica (redistribuição de nutrientes). A ciclagem bioquímica transfere determinado nutriente de
um órgão para outro, por exemplo, de uma folha fisiologicamente mais velha para uma folha nova
(SWITZER; NELSON, 1972).
Os teores de nutrientes da biomassa vegetal são influenciados principalmente pela idade da
folha e pela espécie florestal em questão. Assim, a idade está relacionada com a redistribuição dos
nutrientes para tecidos mais novos ou para drenos antes da senescência de tecidos mais velhos
(CALDEIRA; SCHUMACHER; RODRIGUES, 2002). Saur Nambiar e Fife (2000) afirmaram que
estudos de redistribuição de nutrientes para espécies coníferas e espécies decíduas perenes são
abundantes, em contrapartida, poucos são os que buscam avaliar a translocação em espécies folhosas
nativas. Ainda hoje, esta premissa é verdadeira, o que confere uma enorme lacuna de conhecimento a
cerca desta questão.
O Parque Nacional do Caparaó possui grande diversidade biológica, apesar de conter um solo
considerado pobre em nutrientes, com isso, este estudo pode evidenciar a dinâmica de duas espécies
florestais desse ecossistema. Nesse contexto, o trabalho teve como objetivo analisar os teores e a
redistribuição de macronutrientes em folhas maduras e senescentes de duas espécies arbóreas
presentes em um trecho da Floresta Ombrófila Densa, sendo a Vochysia thyrsoidea e Vochysia
bifalcata.
2. Material e Métodos
O estudo foi realizado em um trecho da Floresta Ombrófila Densa localizada no Parque
Nacional do Caparaó. O Parque está localizado divisa dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo,
com área total de 32.000 ha, e coordenadas 20º19’ - 20º37’ S e 41º43’ - 41º53’ W (MAZINE;
SOUZA, 2007) (Figura 1).
O clima da região enquadra-se no tipo Cwb, clima tropical de altitude/subtropical (ALVARES
et al., 2013). A temperatura média anual varia entre 19ºC a 22ºC, com temperaturas máximas
atingindo 25ºC e em cotas acima de 2000 m de altitude as mínimas registradas podem ser de até -4ºC.
A pluviosidade média varia entre 1.000 a 1.500 mm anuais, atingindo até 1.750 mm, sendo mal
distribuídas ao longo do ano, concentradas principalmente durante o verão.
A área do estudo encontra-se distante 2 km do distrito de Santa Marta, no município de
Ibitirama ES, na porção sul do Parque. O trabalho foi realizado em 4 das sete parcelas de 20 x 50 m
demarcadas para o estudo de serapilheira e fertilidade do solo realizado por Castro (2014), sendo
ambos os estudos inseridos do Projeto CNPq processo nº 475471/2011-3, intitulado Diversidade
Biológica e Funcional da Floresta Ombrófila Densa do Parque Nacional do Caparaó, Espírito Santo
(Tabela 1).

Figura 1 – Área de estudo no Parque Nacional do Caparaó: microbacia, hidrografia, e posição das
parcelas (Fonte: Castro, 2014).
O Parque apresenta relevo que varia entre fortemente ondulado a montanhoso, com solos em
sua maioria de baixa e média fertilidade (Latossolo Vermelho Amarelo Distrófico, Latossolo
Vermelho Distrófico e Argissolo Vermelho Amarelo Neossolo Regoítico Húmico Típico, Neossolo
Litólicos Húmico Típico, Organossolos Háplico Sáprico Tipico, e Cambissolos Húmicos Distróficos
Típicos, e Latossolo Amarelo Distrófico húmico) (RODRIGUES, 2011; EMBRAPA, 2013; CASTRO,
2014).
Tabela 1 – Altitude, declividade média e face de exposição das parcelas utilizadas para o estudo de
redistribuição de nutrientes em um trecho da Floresta Ombrófila Densa, no Parque Nacional do
Caparaó, ES. (Fonte: adaptado de Castro 2014).
Parcela Altitude (m) Declividade Média (%) Face de exposição* Espécie presente
P1 1.112 69,55 N/L V. thyrsoidea
P3 1.302 75,00 NE V. bifalcata
P4 1.319 75,00 L V. thyrsoidea
P5 1.391 48,24 N V. bifalcata
*N=Norte, L=Leste e NE=Nordeste.
As coletas das folhas maduras foram realizadas de acordo com o procedimento no estudo de
Caldeira et al (1999), coletando-se as folhas de ramos localizados em pontos ortogonais da parte
intermediária dos vegetais previamente selecionadas de três diferentes indivíduos por parcela. As
folhas senescentes foram coletadas sobre o solo logo abaixo da projeção da copa dos indivíduos. As
coletas das folhas maduras e senescentes foram realizadas em outubro de 2013. As amostras foram
encaminhadas para o laboratório de Ecologia do Departamento de Ciências Florestais e da Madeira em
Jerônimo Monteiro, ES e secas em estufa de circulação e renovação de ar a 65ºC até massa seca
constante. As amostras foram moídas em moinho do tipo Wiley, passadas em peneiras de malha 1,0
mm e enviadas para análise química de nutrientes no laboratório de Ecologia Florestal/UFSM
(TEDESCO et al., 1995; MIYAZAWA et al., 1999).
O cálculo para estimar a redistribuição dos nutrientes seguiu a fórmula proposta por Negi e
Sharma (1996) e adaptada por Chuyong, Newbery e Songwe (2000), que leva em consideração a
redistribuição do Ca como referência, por este ser um nutriente considerado imóvel na planta.

3. Resultados e Discussão
Observando o resultado das análises para o teor de macronutrientes do presente estudo tem-se
que para folhas maduras de V. thyrsoidea a ordem de teor foi N>K>Ca>Mg>S>P e para folhas
senescentes N>Ca>Mg>K>S>P, para V. bifalcata em folhas maduras N>Ca>K>Mg>S>P e para folhas
senescentes a ordem foi a mesma observada em V. thyrsoidea (tabela 2). A porcentagem de cada
macronutriente redistribuído em ambas as espécies seguiu a mesma ordem, K>P>N>Mg>S (tabela 3).
Tabela 2 – Teores médios de macronutrientes em folhas maduras e senescentes de Vochysia
thyrsoidea e Vochysia bifalcata em um trecho da Floresta Ombrófila Densa, no Parque Nacional do
Caparaó, ES.
Macronutiente (g kg-1)
Espécie Folha
N P K Ca Mg S
Maduras 13,67 0,62 4,33 3,24 2,02 0,90
Desvio padrão 0,44 0,05 0,12 0,22 0,13 0,11
V. thyrsoidea
Senescentes 9,52 0,24 1,59 3,42 1,61 0,86
Desvio padrão 0,15 0,01 0,03 0,12 0,15 0,05
Maduras 19,21 0,77 5,01 6,70 4,37 1,20
Desvio padrão 0,41 0,02 0,31 0,20 0,02 0,12
V. bifalcata
Senescentes 10,12 0,21 1,17 5,14 4,17 0,80
Desvio padrão 0,52 0,01 0,05 0,15 0,05 0,01

Tabela 3 – Redistribuição de nutrientes de Vochysia thyrsoidea e Vochysia bifalcata em um trecho da


Floresta Ombrófila Densa, no Parque Nacional do Caparaó, ES.
Redistribuição do macronutriente (%)
Espécie
N P K Ca Mg S
V. thyrsoidea (P1/P4) * 33,96 64,02 65,08 - 24,54 1,44

V. bifalcata (P3/P5) 31,27 64,60 69,47 - 24,63 12,58

*P = parcela
A redução no teor dos nutrientes (N, P, K, Mg e S) nas folhas senescentes em relação as folhas
maduras confirmam a ocorrência de redistribuição destes nutrientes de tecidos fisiologicamente mais
velhos para os mais novos, pois diversos estudos em florestas nativas apresentam o mesmo
comportamento (CAI; BONGERS, 2007). O N foi o nutriente mais abundante nas duas espécies e em
ambos os estágios vegetativos das folhas, os valores nas folhas maduras estão dentro da faixa
nutricional adequada para o desenvolvimento de espécies florestais (12,0 - 50,0 g kg-1) (PREZOTTI,
2007). Em contrapartida, o P, foi o macronutriente com menores teores, o que pode ser justificado pelo
fato de ser um elemento pouco móvel nos solos tropicais (FURLANI, 2004) e disponível em pequena
quantidade, devido à baixa fertilidade dos mesmos. Assim, ambas as espécies estudadas necessitam de
mecanismos eficientes na utilização deste elemento para suprir as suas demandas fisiológicas, que
pode ser observado pela alta eficiência na redistribuição deste elemento (64,02% em V. thyrsoidea e
64,60% em V. bifalcata).
Como o Ca está associado à lignificação das paredes celulares, este não é redistribuído para as
partes novas da planta, acumulando-se nos tecidos mais velhos (FURLANI, 2004), fato que pode ser
observado nas folhas de V. thyrsoidea. Contudo, o K, para ambas as espécies, foi o nutriente que teve
a maior redistribuição (65,08% em V. thyrsoidea e 69,47% em V. bifalcata) que pode ser explicado
pelo fato deste nutriente permanecer na forma iônica no interior do vegetal, sendo facilmente
translocado (MALAVOLTA, 1980). Porém, o S apresentou a menor redistribuição dentre os
macronutrientes, para as duas espécies. Lancher (2000) classifica o S na sua forma iônica como tendo
mobilidade restrita, corroborando com os resultados encontrados neste estudo. O Mg foi o
macronutriente com a segunda menor redistribuição para as espécies, com um valor considerável
(24,54% em V. thyrsoidea e 24,62% em V. bifalcata). Lanc classificou o MG como tendo mobilidade
restrita, por sua vez, Malavolta (2006) relata como móvel. Esta contradição entre estudos acerca da
mobilidade do Mg ocorre porque ela varia entre espécies (MALAVOLTA, 2006).

4. Conclusões
O N apresentou maior teor nas folhas maduras e senescentes de ambas às espécies, seguidas
pelo K e Ca. O teor de todos os nutrientes nas folhas maduras de V. bifalcata foi mais elevado do que
nas folhas de mesmo estágio em V. thyrsoidea e a redistribuição foi maior em K e P, respectivamente,
para as duas espécies estudadas.

5. Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq processo nº 475471/2011-3 pelo financiamento do projeto
Diversidade biológica e funcional da Floresta Ombrófila Densa do Parque Nacional do Caparaó, ES.

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