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8 fevereiro 2021
CORBIS
A acusação de fraude contra o professor Glen Snyman por marcar a alternativa "sul-
africano" em uma seleção para um emprego em 2017 jogou luz sobre o problema atual da
África do Sul com a classificação racial. Snyman havia sido definido pelo governo como
"mestiço" (que significa "herança racial mista").
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19/02/2021 As categorias raciais do apartheid que ainda são usadas oficialmente na África do Sul - BBC News Brasil
Quase quatro anos depois, a questão levantada pelo caso não desapareceu.
A classificação foi revogada em 1991, quando o país passou a se mover rumo à governança
democrática, o que ocorreu de fato em 1994. Mas ela continua sendo uma parte importante
da esfera de debate no país, embora seja contestada por ativistas.
O governo ainda usa a terminologia do apartheid para coletar dados que ajudem a corrigir os
desequilíbrios flagrantes de renda e de oportunidades econômicas, que são um legado do
racismo oficial do passado.
'Se minha mãe pegar covid-19, não sei se terei leito para
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https://www.bbc.com/portuguese/internacional-55975204 2/11
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Mas muitos no país, incluindo Snyman, que fundou a organização "People Against Racial
Classification" (Povo contra a Classificação Racial) em 2010, acreditam que o uso das
categorias não tem lugar em uma África do Sul democrática.
"A remoção da Lei de Registro da População retira dos funcionários de recrutamento de mão
de obra e de qualquer governo ou sistema privado o direito legal de classificar os sul-
africanos por raça", escreveu ele em uma apresentação à Comissão de Direitos Humanos do
país.
Embora Snyman reconheça que ainda existam enormes desequilíbrios que precisam ser
corrigidos, ele sugere que o governo use uma medida de renda para substituir a classificação
racial.
"O governo não precisa saber a identidade das pessoas por grupos, ele precisa conhecer as
pessoas que precisam de serviços, empregos ou o que for necessário", explica.
"O governo e o setor privado devem entregar a todos os sul-africanos igualmente e não
discriminar com base em sua identidade", diz ele.
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Ryland Fisher, ex-editor do jornal Cape Times que iniciou o projeto "One City, Many Cultures"
(Uma cidade, muitas culturas, em tradução literal), da Cidade do Cabo, concorda com a
avaliação.
GETTY IMAGES
As leis do apartheid privilegiavam os brancos e separavam os sul-africanos por raça, como mostra
essa placa antiga
"E se você diz que vai se consertar os problemas com base na classe, um negro que viveu
uma vida privilegiada não se qualificará para oportunidades econômicas por meio das
políticas de ação afirmativa do governo", detalha.
Hoje, a agência oficial de estatística da África do Sul aponta que a população do país, de 57,7
milhões de pessoas, é composta por 80,9% de negros, 8,8% de mestiços, 7,8% de brancos e
2,5% de indianos.
Durante a década de 1970, quando a luta contra o apartheid estava ganhando força —
inspirada pelo Movimento da Consciência Negra, liderado pelo famoso ativista Steve Biko e
pela Organização de Estudantes da África do Sul —, muitas das pessoas marginalizadas do
país (africanos, negros e indianos) se identificaram como negros em uma declaração de
solidariedade com a luta pela derrubada do regime do apartheid.
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E é nesse sentido que Snyman recebeu o apoio do maior sindicato de professores do país, o
Democratic Teachers Union of South Africa, quando se autodeclarou como "sul-africano" em
um processo seletivo.
"Muitos de nós tomamos uma decisão consciente de não nos identificarmos com a
classificação racial prescrita pelo regime do apartheid. Nós nos consideramos negros,
africanos, sul-africanos", diz Jonavon Rustin, porta-voz do sindicato dos professores de Cabo
Ocidental, uma das províncias da África do Sul.
Destacando uma compreensão muito mais matizada de identidade, ele acrescenta que
"algumas pessoas adotam a classificação étnica de cor: Khoisan, Africano, Xhosa, Zulu,
Branco, Camissa Africano, Korana Africano, Griqua, Europeu, africâner e muitos outros."
GETTY IMAGES
A solidariedade de alguns grupos durante a luta contra o apartheid gerou novas tensões
Alguns, entretanto, fazem uma distinção entre uma identidade política ou cultural e a
necessidade de lidar com os desequilíbrios criados pelo apartheid.
Zodwa Ntuli, comissária do Broad Based Black Economic Empowerment (Base Ampla de
Empoderamento Econômico dos Negros), argumenta que, embora a classificação racial seja
uma anomalia em um país que tenta se afastar de seu passado baseado em raça, os
reguladores e o governo só podem medir o progresso social e econômico da população por
meio de estatísticas de acordo com as velhas categorias.
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Mas ela ressalta que "ninguém na África do Sul está autorizado a usar a classificação racial
ou de gênero para excluir qualquer cidadão do gozo dos direitos no país, isso seria ilegal".
Kganki Matabane, que chefia o Conselho Empresarial Negro, concorda. Para ele, embora o
governo democrático tenha quase 27 anos, ainda é cedo para abandonar as velhas
categorias.
Uma vez que o apartheid discriminava a população com base na raça, essa é a única maneira
de abordar as questões da atualidade, e não a classe social, acrescenta.
"Só podemos ter uma cláusula de caducidade (da classificação racial) quando a economia
refletir a demografia do país. Até chegar lá, será prematuro falar sobre o fim do
empoderamento econômico dos negros", afirma.
Novos problemas
Na Cidade do Cabo, um grupo de ativistas que se identificam como negros fundou um equipe
de lobby chamado Gatvol em 2018.
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AFP
Fisher, ex-editor do jornal Cape Times, disse que as pessoas classificadas como mestiças
ficam felizes em lutar ao lado dos negros na luta contra o apartheid. Mas ele culpa o governo
do Congresso Nacional Africano (ANC) pelo agravamento das diferenças raciais.
"O que aconteceu nos últimos anos é que a maioria (no Cabo Ocidental) decidiu levantar a
voz e fazer valer seu direito de se identificar como negro", acrescenta.
"O ANC realmente não levou esses tipos de nuances em consideração. Eles alienaram
pessoas que se identificavam como pessoas de cor. O que isso significa é que essas pessoas
identificaram os tipos de coisas que poderiam afirmar sua identidade, incluindo elementos
relacionados à cultura, comida, música e idioma ", explica ele.
Ele e outros acusam o governo liderado pelo ANC de não fazer o suficiente pelos negros e de
ter como alvo a maioria nacional, que é oficialmente classificada como africana ou negra.
Saths Cooper, um psicólogo próximo a Steve Biko durante seus dias de estudante na década
de 1970, argumenta que a imposição de uma classificação racial impediu a formação de uma
identidade verdadeiramente comum.
"Nós sempre colocamos uma cor, colocamos atributos externos e então colocamos talvez a
linguagem e a crença, e isso permite mais divisão. Essa narrativa é então perpetuada",
explica Cooper.
"Não demos às pessoas motivos suficientes para dizer que nos identificamos como sul-
africanos", lamenta.
Enquanto isso, Snyman, através de Parc, continua a luta para banir a classificação racial do
apartheid.
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"Tomaremos todas as medidas, inclusive as legais, para livrar a África do Sul desse flagelo
que mais uma vez gerou discriminação contra aqueles que não atendem aos critérios
preferenciais do atual governo", afirma.
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