Você está na página 1de 17

Vermelhos e azuis:

um estudo sobre os determinantes do voto nas


eleições presidenciais brasileiras (2002–2010)

Jairo Nicolau

17 de julho de 2014

Resumo

O propósito do artigo é dimensionar os efeitos de um conjunto de


variáveis sobre o desempenho dos candidatos do PT e do PSDB nas eleições
de 2002, 2006 e 2010. A ideia é investigar em que medida características
socioeconômicas (índice de desenvolvimento humano, proporção de moradores
pentecostais e tamanho da população), padrões de políticas públicas (grau de
participação em programas de transferência de renda) afetam o desempenho
dos candidatos. Outro fator analisado é o papel das regiões: até que que ponto
as eventuais diferenças nas votações do PT e PSDB nas cidades deve-se ao
fato de estas pertencerem a uma determinada região do país e não à outra? A
análise de dados é realizada por intermédio de regressão linear, tomando os
municípios como unidade de análise.

Palavras-chaves: eleições no Brasil; PSDB; PT; eleições presidenciais no


Brasil.

Introdução
Cinco das seis eleições para a Presidência da República realizadas no Brasil
após a redemocratização foram marcadas pela polarização entre os candidatos do
PT e do PSDB. Os nomes das duas legendas ficaram, ora em primeiro lugar, ora em
segundo, nos oito pleitos (se considerarmos os dois turnos) disputados desde 1994. A
polarização entre os dois partidos chama ainda mais atenção em contraste com a alta
fragmentação partidária observada nas eleições para o Congresso no mesmo período.

Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro

1
A permanência dos dois partidos como atores fundamentais na disputa presi-
dencial sugere algumas perguntas: Será que o PT e o PSDB conseguiram estabelecer
redutos eleitorais ao longo do tempo? Será que as duas legendas criaram bases sociais
permanentes no período?
A literatura sobre as eleições presidenciais, baseada em dados agregados
municipais identificou algumas mudanças relevantes no padrão geográfico e social
da votação dos partidos, particularmente a do PT. (SOARES; TERRON, 2008)
mostraram a forte mudança nos padrões espaciais e sociais da votação de Lula,
quando as disputas de 2006 e 2002 são comparadas. (MARZAGÃO, 2013) apresentou
evidências de forte associação entre os redutos de Lula em 2006 com os de Dilma em
2010. Outro tema que mereceu uma atenção especial dos pesquisadores é o efeito do
programa Bolsa Família nos votos do candidato do PT em 2006 e 2010.(NICOLAU;
PEIXOTO, 2007; CARRARO et al., 2007; ZUCCO, 2008; SOARES; TERRON,
2008).
O propósito do artigo é dimensionar os efeitos de um conjunto de fatores
sobre o desempenho dos candidatos do PSDB e do PT, nas três eleições de 2002,
2006 e 2010. A ideia é investigar em que medida características socioeconômicas
(índice de desenvolvimento humano, proporção de moradores pentecostais e tamanho
da população), padrões de políticas públicas (grau de participação em programas
de transferência de renda) afetam o desempenho dos candidatos. Outro fator a ser
analisado será o papel das regiões: até que que ponto as eventuais diferenças nas
votações do PT e PSDB nas cidades deve-se ao fato de estas pertencerem a uma
determinada região do país e não à outra? A pesquisa utiliza os municípios como
unidade de análise.
Em relação à bibliografia anterior sobre o tema, o artigo inova em dois
aspectos. O primeiro é o de analisar comparativamente o desempenho do PT e do
PSDB. Com exceção de Terron (TERRON, 2009) , a literatura que utiliza dados
agregados preocupou-se em explicar exclusivamente o sucesso dos candidatos do PT.
O segundo é a comparação sistemática dos dados do primeiro turno das eleições
presidenciais de 2002, 2006 e 2010. A ideia é utilizar as mesmas variáveis e o mesmo
método (regressão linear), e com isso, garantir uma comparação mais criteriosa do
desempenho dos candidatos de cada partido ao longo do tempo.
O artigo está dividido em três seções. A primeira apresenta as variáveis
independentes e o método que será utilizado na análise dos dados. A segunda mostra
os resultados da análise estatística. A última seção resume os principais resultados.

1 Variáveis e métodos
Os estudos sobre eleições presidenciais brasileiras que utilizam os municípios
como unidade de análise podem ser divididos em dois grupos, segundo os métodos
utilizados. O primeiro grupo emprega os tradicionais métodos estatísticos (correlação
e regressão linear) para dimensionar o impacto de uma série de fatores sobre o voto
dos candidatos nos municípios (NICOLAU; PEIXOTO, 2007; ZUCCO, 2008). Um
segundo grupo enfatiza a dimensão espacial da votação. A ideia é observar padrões de

2
voto pelo território nacional por intermédio de mapas (JACOB et al., 2010), identificar
eventuais redutos e empregar econometria espacial para dimensionar o impacto do
território simultaneamente a outros fatores (TERRON, 2009; MARZAGÃO, 2013).
Este trabalho se alinha à tradição do primeiro grupo e utiliza a regressão
linear para a análise dos dados. O propósito é explorar o efeito de conjunto de
variáveis sobre o voto, levando em conta apenas a região como fator contextual. Em
um segundo momento a ideia é avaliar, por intermédio de modelos de regressão
espacial, em que medida a votação concentrada em municípios contíguos acrescenta
em explicação relação ao modelo linear utilizado neste artigo.
As variáveis independentes selecionadas foram as seguintes: o índice de de-
senvolvimento humano (IDH), a população total (medida em escala logarítmica), o
percentual de membros de igrejas pentecostais, o percentual de famílias beneficiadas
pelo Programa Bolsa Família e a Região.
Os dados do IDH, calculados para os anos censitários de 2000 e 2010, foram
obtidos junto ao site do Ipeadata1 . No lugar de trabalhar com um conjunto de
variáveis socioeconômicas, optei por trabalhar apenas com IDH, já que ele faz uma
síntese excelente da situação social do município. O total da população e o percentual
de pentecostais de cada cidade também foram retirados dos censos de 2000 e 2010.
Análises baseadas em pesquisas de opinião mostraram que pertencer a denominações
evangélicas aumentou a probabilidade de o eleitor votar em Garotinho em 2002, e
em Marina Silva em 2010. (NICOLAU, 2007; PEIXOTO; RENNÓ, 2011). Um tema
ainda pouco explorado nas pesquisas com dados agregados é se o total de evangélicos
de uma cidade estaria associado de alguma maneira ao percentual de votos obtidos
pelos candidatos 2
O efeito do Bolsa Família na eleições presidenciais é provavelmente o tema
mais discutido entre os estudiosos das eleições no Brasil(BOHN, 2011; CARRARO
et al., 2007; NICOLAU; PEIXOTO, 2007; ZUCCO; POWER, 2013). Para mensurar
a abrangência do programa em âmbito municipal, os pesquisadores têm utilizado
diferentes medidas: percentual das famílias beneficiadas; gastos do programa per
capita; razão bolsa família/PIB; média mensal de benefícios por família; razão
gastos do programa por família pobres e por famílias indigentes. Optei por utilizar o
percentual de famílias beneficiadas pelo programa em cada cidade.3
Embora o programa Bolsa Família tenha sido criado apenas no governo
Lula, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso já existiam programas
de transferência de renda (Auxílio Gás, Bolsa Escola e Bolsa Alimentação). Os
números da pesquisa para 2002 representam o somatório de famílias beneficiadas
pelos programas Bolsa Escola e Bolsa Alimentação. Por isso, é possível que eles sejam
superestimados, já que uma família podia participar simultaneamente de ambos;
segundo Zucco (2013), por definição, os beneficiados pelo Auxílio Gás já participavam
de um dos dois programas.
1
http://www.ipeadata.gov.br/
2
O dados incluem apenas os evangélicos denominados pelo IBGE de “evangélicos de origem
pentecostal”.
3
Os dados foram coletados e organizados por Cesar Zucco.

3
A Figura 1 mostra a mediana de famílias cobertas pelos programas de
transferência de renda nos municípios brasileiros, segundo a regiões, nos três anos
eleitorais. Ainda que os dados de 2002 provavelmente estejam super estimados,
podemos observar um crescimento acentuado do percentual de famílias cobertas a
partir da criação do Bolsa Família no primeiro governo Lula. Entre 2006 e 2010 os
números praticamente se estabilizam, com exceção da região Norte, onde a mediana
de famílias beneficiadas pelo Bolsa Família nos municípios passou de 35,4% para
45,9%.
Alguns estudos incluíram o partido do prefeito eleito na eleição municipal
antecedente como um fator que poderia estar associado ao voto nas eleições presi-
denciais (MARZAGÃO, 2013; ZUCCO, 2008) A ideia é baseada em duas premissas.
A primeira é que redutos de um partido nas eleições municipais tenderiam a se
manter nas eleições nacionais. Neste caso, o argumento serviria, particularmente,
para os partidos que lançaram candidatos à presidência. A segunda premissa é que o
prefeito tenderia a utilizar a máquina municipal para o candidato que ele apoia para
presidente.

Figura 1 – Percentual de famílias que recebem o Bolsa Família.


As barras mostram o percentual mediano de famílias que recebem os programas de transferência de
renda (2002) e o Bolsa Família (2006 e 2010) nos municípios de cada região.

As Figuras 2, 3 e 4 apresentam o percentual mediano de votos obtidos pelos


candidatos à Presidência nas cidades governadas por seis partidos (PP, PFL/DEM,
PT, PSDB, PMDB e PT), respectivamente em 2002, 2006 e 2010.4 Os dados mostram
4
Os partidos são os dos prefeitos no momento da eleição municipal que antecede a presidencial.

4
claramente que o desempenho do PSDB e do PT não tem nenhuma associação com as
prefeituras conquistadas dois anos antes das eleições em nenhum dos anos analisados.
Curiosamente, nas eleições de 2006 e 2010, Lula e Dilma tiveram votações medianas
maiores nas cidades governadas pelo DEM do que nas cidades governadas pelo PT.
Por esta razão, decidi não incorporar o partido do prefeito na análise estatística que
será apresentada na seção seguinte.

Figura 2 – Votação para presidente, segundo o partido do prefeito, 2002.


As barras mostram o percentual mediano da votação obtidas por Lula e Serra nas cidades, cujo
prefeito foi eleito (2000) por um dos partidos selecionados.

2 Os resultados
O percentual de votos no primeiro turno - incluindo brancos e nulos no
cômputo total - foi tomado como variável dependente. Deste modo, foram construídos
seis modelos: Lula (PT-2002), Serra (PSDB-2002), Lula (PT-2006), Alckmin (PSDB-
2006), Dilma (PT-2010) e Serra (PSDB-2010). Os resultados são apresentados de
duas maneiras. No texto, optei por apresentar os coeficientes de cada modelo por
intermédio de gráficos. Desta forma, é mais fácil visualizar os efeitos e comparar
os modelos de cada candidato. As tradicionais tabelas com os resultados completos
para cada um dos modelos estão disponibilizadas em anexo.
Eventuais mudanças de legenda por troca ou substituição do prefeito pelo vice de outro partidos
não são consideradas.

5
Figura 3 – Votação para presidente, segundo o partido do prefeito, 2006.
As barras mostram o percentual mediano da votação obtidas por Lula e Serra nas cidades, cujo
prefeito foi eleito (2004) por um dos partidos selecionados.

A Figura 5 mostra os resultados dos modelos para Lula e Serra nas eleições de
2002. Os círculos em cada linha representam os valores do coeficiente (b) produzidos
pelos modelos. Um primeiro dado que chama a atenção é o efeito dos programas de
transferência de renda. A variável bolsa tem associação positiva com a votação de
Serra. Embora os efeitos sejam reduzidos, o sentido positivo da associação chama
a atenção, sobretudo se lembrarmos que o candidato do PSDB procurou fazer
uma campanha descolada dos projetos do governo Cardoso e pouco mencionou os
programas de transferência de renda em sua campanha. Por outro lado, a votação
de Lula tem uma associação negativa com os programas de transferência de renda.
Outra dado que chama a atenção em 2002 é o efeito do nível de desenvol-
vimento social dos municípios. A variável idh-2000 está positivamente associada
tanto para Lula quanto para Serra. Ou seja, ambos tendem a ser melhor votados
nas cidades com maior desenvolvimento social. A diferença é que esta associação é
muito mais expressiva no caso de Lula. Em relação ao percentual de pentecosatais,
observamos uma associação negativa para os dois candidatos, com um coeficiente
um pouco mais expressivo para Serra.
O efeito das regiões foi dimensionado tomando a região Sudeste como categoria
de comparação. Destaca-se o bom desempenho de Lula na região Sul, onde ele
obteve, em média, 4,4 pontos percentuais a mais de votos comparativamente ao
Sudeste, e o mal desempenho de Serra no Nordeste, onde ele obteve, em média,
7,2 pontos percentuais a menos de votos. Vale a pena lembrar que dois outros

6
Figura 4 – Votação para presidente, segundo o partido do prefeito, 2010.
As barras mostram o percentual mediano da votação obtidas por Dilma e Serra nas cidades, cujo
prefeito foi eleito em 2008 por um dos partidos selecionados.

candidatos à Presidência – Garotinho (PSB) e Ciro Gomes(PPS) – obtiveram


votações concentradas, respectivamente, nas regiões Nordeste e no Sudeste do país,
e com isso afetaram o padrão de votos de Lula e Serra. Por fim, observa-se que a
votação de Lula manteve o padrão, verificado em eleições anteriores, de associação
positiva com o tamanho da população do município (ver variável logpopulação-2000 ).
Em contraste, o candidato do PSDB tende a ter maior votação nas pequenas cidades.
As eleições de 2006 assinalam uma expressiva mudança em relação as eleições
de 2002, mudança esta já assinalada por outros trabalhos (NICOLAU; PEIXOTO,
2007; ZUCCO, 2008; SOARES; TERRON, 2008). A correlação entre votação de Lula
e o índice de desenvolvimento humano passou a ter o sinal negativo: o candidato
do PT tende a ter um percentual de votos nas cidades de menor desenvolvimento.
Para Alckmin observamos um aprofundamento da votação nas cidades de maior
desenvolvimento social. O primeiro turno de 2006 foi a mais polarizado e com maior
divisão social do voto entre os já disputados no país. A ausência de outros candidatos
com votação expressiva colaborou por aprofundar esta tendência.
A Figura 6 mostra os resultados dos coeficientes dos modelos de regressão
para Lula e Alckmin nas eleições de 2006 - os resultados completos das regressões são
apresentados na Tabela 2, em anexo. A votação de Lula tende a ser muito mais alta
nos municípios que obtiveram alta cobertura do programa, enquanto a de Alckmin
tende a ser menor nestas cidades. Como já assinalado, este é um tema bastante
estudado e com evidências consistentes a respeito dos efeitos observados no gráfico –

7
para exceções ver:(BOHN, 2011; CARRARO et al., 2007).

Eleições, 2002

Model Lula Serra_02

bolsa_2002

regiaoSul

regiaoNorte

regiaoNordeste

regiaoCentro−Oeste

idh_2000

pentecostal_2000

logpopulacao_2000

(Intercept)
−20

20

40
0

Figura 5 – Coeficientes da regressão linear. Variável dependente: percentual dos votos do PT e


PSDB nos municípios.
As esferas mostram os valores dos coeficientes de cada variável independente. As linhas laterias
indicam os erros das estimativas; a mais grossa um erro padrão, a mais fina dois erros padrão.

O efeito do programa Bolsa família observado na Figura 6 sugere duas questões.


A primeira é até que ponto o programa foi responsável direto pelo voto em Lula.
Sabemos que o seu primeiro governo implementou uma série de programas sociais
focados na população de baixa renda, entre eles, destacam-se, o ProUni, programa de

8
financiamento universitário para jovens de baixa renda, e o Luz para Todos, projeto
de eletrificação que favoreceu, sobretudo, os moradores da zona rural. Durante o
Governo Lula, o salário mínimo subiu 46,4% acima da inflação, medida pelo IPCA, o
que favoreceu o consumo da população de menor renda (QUEIROZ, 2014). Por que
creditar ao Bolsa Família, e não aos outros programas o excelente desempenho de
Lula nos municípios mais pobres do país em 2006? E mais, os resultados não seriam
fruto de um conjunto de fatores e não de um programa específico?
Obviamente, é impossível saber se as áreas mais pobres do país passaram a
votar no PT em 2006 especificamente por terem sido beneficiadas pelos programas
sociais. Mas a abrangência do Bolsa Família - que chegou ao fim do governo atendendo
cerca de 11 milhões de famílias - e a amplitude da cobertura nos municípios mais
pobres fizeram com que ele se tornasse o principal programa do governo. Por esta
razão, acredito que o Bolsa Família seja um excelente indicador global das políticas
sociais do governo Lula.5
A segunda questão sugerida pelo Figura 5 diz respeito a uma possível associa-
ção entre o IDH e o Bolsa Família, o que eventualmente poderia afetar os resultados
da regressão. Como o programa é considerado eficaz em alcançar as famílias mais
pobres (SOARES; RIBAS; SOARES, 2009), poderíamos estar diante um caso em que
as duas acabariam se confundindo, e expressariam de maneiras diferentes o mesmo
fenômeno. Pelo menos estatisticamente esta hipótese está descartada. O teste que
mede a eventual colinearidade entre as variáveis mostrou que nenhuma das utilizadas
estão fortemente associadas de modo a afetar os resultados dos modelos para 2006.6
Em 2006, a região passou a ser um fator muito mais importante para distinguir
os candidatos do PT e PSDB. Mantido constante os efeitos das outras variáveis, a
votação de Lula é, em de pontos percentuais, maior nos municípios do Nordeste (5.7),
do Norte (3.3) e menor nos do Centro-Oeste (-4.9) e do Sul (-3.5). Alckmin obtém,
em média, menos 7.7 pontos percentuais nas cidades do Nordeste e um desempenho
melhor no Centro-Oeste (5.9) e no Sul (3.9). Lembre-se que estes dados usam o
Sudeste como categoria de referência. Apesar de observarmos um novo padrão na
distribuição regional do voto, a relação entre o tamanho da população e o voto não se
altera em 2006. A votação do candidato do PT continua a ter uma relação positiva
com o tamanho da população, enquanto o inverso ocorre em relação ao candidato do
PSDB.
A Figura 7 mostra os coeficientes dos dois modelos de regressão para as
eleições de 2010; os resultados completos estão apresentados na Tabela 3, em Anexo.
O primeiro dado que chama a atenção é a permanência do efeito do programa Bolsa
Família como principal fator associado ao voto em Dilma e Serra. A direção e a força
da associação são as mesmas observadas dois anos antes: quanto maior é a cobertura
do programa, maior tende ser a votação do candidato do PT e menor tende a ser
5
Outra vantagem em trabalhar com o dados do Bolsa Família é que diferentemente dos outros
programas, tais como o Prouni e o Luz para Todos que atingem segmentos específicos é sua
implementação em todos municípios do país, com ampla base de dados disponível para consulta.
O aumento do salário mínimo também uma política que beneficiou moradores de todo o país é
mais difícil de ser operacionalizada.
6
Para avaliar o grau de colinearidade entre as variáveis utilizei o teste de VIF para os dois
modelos (Alckmin e Lula).

9
Eleições, 2006

Model Alckmin Lula_06

bolsa_2006

regiaoSul

regiaoNorte

regiaoNordeste

regiaoCentro−Oeste

idh_2010

pentecostal_2010

logpopulacao_2010

(Intercept)
−25

25

50
0

Figura 6 – Coeficientes da regressão linear. Variável dependente: percentual dos votos do PT e


PSDB nos municípios.
As esferas mostram os valores dos coeficientes de cada variável independente. As linhas laterias
indicam os erros das estimativas; a mais grossa um erro padrão, a mais fina dois erros padrão.

a do PSDB. Em linhas gerais, o argumento desenvolvido anteriormente serve para


2010. O programa Bolsa Família funcionaria também como o um indicador síntese
para as políticas sociais do segundo governo Lula. E os números deixam claro que o
programa Bolsa Família produziu novamente um efeito decisivo nos resultados das
eleições deste ano.

10
Coeficientes − regressão OLS, 2010

Model Dilma Serra

bolsa_2010

regiaoSul

regiaoNorte

regiaoNordeste

regiaoCentro−Oeste

idh_2010

pentecostal_2010

logpopulacao_2010

(Intercept)
−25

25

50

75
0

Figura 7 – Coeficientes da regressão linear. Variável dependente: percentual dos votos do PT e


PSDB nos municípios.
As esferas mostram os valores dos coeficientes de cada variável independente. As linhas laterias
indicam os erros das estimativas; a mais grossa um erro padrão, a mais fina dois erros padrão.

Uma mudança expressiva ocorreu na disputa de 2010. Ao contrário do pleito


de 2006 – em que o IDH foi negativamente associado à votação de Lula –, em 2010
observamos que esta variável praticamente deixa de ter efeito sobre a votação do PT.
De outro lado, o sinal se inverte para o candidato do PSDB. Que fatores poderiam
explicar esta mudança? Uma hipótese é que a ampliação do Programa Bolsa Família

11
pode ter reduzido o efeito do IDH como variável autônoma. De fato, a correlação
entre o desenvolvimento humano e a cobertura do programa passou de 0.78 em 2006
para 0.83 em 2010. Uma segunda hipótese é que em contraste com as eleições de
2006, quando a polarização entre os dois principais partidos foi acentuada, as de
2010 tiveram a presença de uma terceira candidata, Marina Silva (PV), que obteve
votação expressiva em muitos municípios.
O efeito da variável região foi mais intenso no modelo do PSDB. Em com-
paração aos votos obtidos no Sudeste, Serra recebeu as seguintes votações (média
para os municípios) em pontos percentuais na regiões: Sul (+1,7), Norte (+4,4),
Centro-Oeste (+5,1) e Nordeste (-3,6). Novamente, o Nordeste aparece como a
região de pior desempenho do PSDB. Diferentemente de 2006, a Região Sul teve
um efeito positivo para o PT; Dilma obteve 4,9 pontos percentuais a mais de votos
comparativamente ao Sudeste. Mas em outras regiões, o efeito não foi expressivo.
Uma comparação entre as Figuras 6 e 7 mostra que em 2006 a dimensão regional
teve um peso mais decisivo na votação dos candidatos do que em 2010.
Por fim, vale observar os efeitos da relação entre o percentual de pentecostais
nas cidades e a votação para presidente. As associações apontada pelos pesquisadores
a partir de micro-dados nas eleições de 2002 e 2010 não se confirmam com a mesma
intensidade na análise com dados agregados. Controlando pelos efeitos de outras
variáveis, o percentual de pentecostais tem um efeito muito reduzido, e com sinal
oscilando no tempo, na votação do PT e PSDB. De qualquer modo, um quadro
completo dos eventuais efeitos da religião necessita uma análise da votação dos
candidatos evangélicos nas disputas anteriores: Garotinho(2002) e Marina (2010).

Considerações finais
Este artigo procurou comparar de maneira sistemática o desempenho dos
candidatos do PT e do PSDB nas eleições presidencias recentes. A ideia foi dimensi-
onar os efeitos de um mesmo conjunto de variáveis independentes sobre a votação
obtida pelos candidatos do PT e do PSDB no primeiro turno das eleições brasileiras
de 2002, 2006 e 2010.
Entre as variáveis selecionadas, a que mais chamou a atenção foi a que
dimensionou o efeito dos programas de transferência de renda, particularmente
o Programa Bolsa família. Minha sugestão é que este deve ser interpretado não
apenas como um programa específico, mas como um proxy das políticas sociais
implementadas pelos governos do PT. Em 2002, antes da criação do Bolsa Família, os
dados dos programas de transferência de renda mostraram uma associação positiva
com a votação do PSDB, ainda que o candidato do partido (Serra) não tenha
explorado o tema durante a campanha. Já em 2006 e 2010 o novo programa foi o
principal fator para explicar a variação da votação dos candidatos à Presidência nos
municípios.
O grau de desenvolvimento social dos municípios – medido pelo IDH – afetou
de maneira variada a votação dos candidatos. Um aspecto relevante foi a mudança de
perfil nas duas eleições vencidas por Lula. Em 2002, mantidos constantes os efeitos

12
de outras variáveis, a votação de Lula tinha uma tendência de aumentar nas cidades
mais prósperas. Já em 2006, a votação foi negativamente associada ao IDH. Na
eleição seguinte, ainda que positivo, o IDH teve um efeito muito reduzido na votação
de Dilma. Em contraste, a votação do PSDB manteve-se positivamente associada ao
IDH em 2002 e 2006, mas em 2010, os resultados se inverteram.
Em relação às outras variáveis, destaca-se o efeito da região. As eleições
de 2006 foram as que a dimensão regional mais dividiu os candidatos. As regiões
Nordeste e Norte fizeram diferença positiva para Lula e negativa para Alckmin. Já
nas regiões Sul e Centro-Oeste o padrão se inverteu. Na disputa de 2010, houve um
declínio do efeito da região no resultado.
Este artigo é faz parte de um projeto mais amplo, cujo propósito é de analisar
os resultados das eleições presidenciais brasileiras em âmbito municipal. Os próximos
passos da pesquisa envolverão: a ampliação da comparação com as três primeiras
eleições do período democrático (1989, 1994 e 1998); a utilização de novos métodos
de análise estatística, tais como pareamento (matching) e regressão espacial; e,
eventualmente, a incorporação de novas variáveis independentes.

13
Referências

BOHN, S. R. Social policy and vote in Brazil: bolsa família and the shiftes in Lula’s
electoral base. Latin Amarican Research Review, v. 46, n. 1, p. 54–69, 2011. Citado
2 vezes nas páginas 3 e 8.
CARRARO, A. et al. "É a economia, companheiro!": uma análise empírica da
reeleição de Lula com base em dados municipais. 2007. Citado 3 vezes nas páginas
2, 3 e 8.
JACOB, C. R. et al. A geografia do voto nas eleições presidenciais do Brasil:
1989-2006. Petrópolis: Vozes, 2010. Citado na página 3.
MARZAGÃO, T. A dimensão geográfica das eleições brasileiras. Opinião Pública,
v. 19, n. 2, p. 270–290, 2013. Citado 3 vezes nas páginas 2, 3 e 4.
NICOLAU, J. An Analysis of the 2002 Presidential elections Using Logist Regression.
Brazilian Political Science Review, v. 1, n. 1, p. 125–135, 2007. Citado na página 3.
NICOLAU, J.; PEIXOTO, V. Uma disputa em três tempos: uma análise das bases
municipais nas eleições presidenciais de 2006. In: XXI Encontro Anual da ANPOCS.
Caxambu: [s.n.], 2007. Citado 3 vezes nas páginas 2, 3 e 7.
PEIXOTO, V.; RENNÓ, L. Mobilidade social ascendente e voto: as eleições
presidenciais de 2010 no Brasil. Opinião Pública, v. 17, n. 2, p. 304–332, 2011.
Citado na página 3.
QUEIROZ, L. R. Salário Mínimo no Brasil - ganho real entre 1995 e 2014.
poucodeprosa.wordpress.com, fev. 2014. Citado na página 9.
SOARES, G. A. D.; TERRON, S. Dois Lulas: a geografia eleitoral da reeleição
(explorando conceitos, métodos e técnicas de análise geoespacial). Opinião Pública,
v. 14, n. 2, p. 269–301, 2008. Citado 2 vezes nas páginas 2 e 7.
SOARES, S.; RIBAS, R. P.; SOARES, F. V. Focalização e cobertura do Programa
Bolsa-Família: qual é o significado dos 11 milhões de famílias? 2009. Citado na
página 9.
TERRON, S. A composição de territórios eleitorais no Brasil: uma análise das
votações de Lula (1989-2006) . Tese (Doutorado) — Departamento de Ciência
Política - IESP/UERJ, Rio de Janeiro, 2009. Citado 2 vezes nas páginas 2 e 3.
ZUCCO, C. The President’sNew’Constituency: Lula and the Pragmatic Vote in
Brazil’s 2006 Presidential Elections. Journal of Latin American Studies, 2008.
Citado 3 vezes nas páginas 2, 4 e 7.
ZUCCO, C.; POWER, T. J. Bolsa Família and the Shift in Lula’s Electoral Base,
2002–2006: A Reply to Bohn. Latin American Research Review, v. 48, n. 2, p. 3–24,
2013. Citado na página 3.

14
Tabela 1 – Modelos de regressão linear (OLS). Votos para presidente, 2002

Variável dependente:
Lula Serra
(1) (2)
logpopulacao_2000 1.253∗∗∗ −2.148∗∗∗
(0.128) (0.131)
pentecostal_2000 −0.137∗∗∗ −0.395∗∗∗
(0.028) (0.029)
idh_2000 29.957∗∗∗ 5.040
(3.748) (3.833)
regiaoCentro-Oeste −2.108∗∗∗ 3.225∗∗∗
(0.531) (0.543)
regiaoNordeste −1.500∗∗ −7.211∗∗∗
(0.583) (0.596)
regiaoNorte −0.101 1.075∗
(0.595) (0.608)
regiaoSul 4.423∗∗∗ −1.049∗∗∗
(0.382) (0.391)
bolsa_2002 −19.324∗∗∗ 3.039
(2.087) (2.134)
Constante 7.564∗∗ 47.395∗∗∗
(3.061) (3.130)
Observações 5,507 5,507
R2 0.244 0.169
R2 Ajustado 0.243 0.168
∗ ∗∗ ∗∗∗
Nota: p<0.1; p<0.05; p<0.01

15
Tabela 2 – Modelos de regressão linear (OLS). Votos para presidente, 2006

Variável dependente:
Lula Alckmin
(1) (2)
logpopulacao_2010 1.252∗∗∗ −1.892∗∗∗
(0.130) (0.131)
pentecostal_2010 0.148∗∗∗ −0.105∗∗∗
(0.025) (0.025)
idh_2010 −30.245∗∗∗ 38.222∗∗∗
(5.555) (5.595)
regiaoCentro-Oeste −4.980∗∗∗ 5.932∗∗∗
(0.538) (0.542)
regiaoNordeste 5.711∗∗∗ −7.403∗∗∗
(0.577) (0.581)
regiaoNorte 3.299∗∗∗ −0.226
(0.605) (0.609)
regiaoSul −3.457∗∗∗ 3.899∗∗∗
(0.397) (0.400)
bolsa_2006 38.441∗∗∗ −36.761∗∗∗
(1.269) (1.279)
Constante 43.612∗∗∗ 40.877∗∗∗
(4.751) (4.785)
Observações 5,562 5,562
R2 0.579 0.611
R2 Ajustado 0.578 0.610
∗ ∗∗ ∗∗∗
Nota: p<0.1; p<0.05; p<0.01

16
Tabela 3 – Modelos de regressão linear (OLS). Votos para presidente, 2010

Variável dependente:
Dilma Serra
(1) (2)
logpopulacao_2010 −0.329∗∗∗ −1.102∗∗∗
(0.117) (0.116)
pentecostal_2010 −0.203∗∗∗ 0.045∗∗
(0.023) (0.022)
idh_2010 1.067 −10.207∗
(5.336) (5.308)
regiaoCentro-Oeste −0.058 5.072∗∗∗
(0.491) (0.488)
regiaoNordeste −0.093 −3.659∗∗∗
(0.546) (0.543)
regiaoNorte −1.156∗∗ 4.375∗∗∗
(0.575) (0.572)
regiaoSul 4.908∗∗∗ 1.742∗∗∗
(0.363) (0.361)
bolsa_2010 49.821∗∗∗ −38.588∗∗∗
(1.292) (1.285)
Constante 35.971∗∗∗ 62.284∗∗∗
(4.583) (4.558)
Observações 5,547 5,547
R2 0.542 0.534
R2 Ajustado 0.541 0.533
∗ ∗∗ ∗∗∗
Nota: p<0.1; p<0.05; p<0.01

17

Você também pode gostar