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APÊNDICE A

Data da entrevista: 04 de março de 2021


Entrevistados: Antônio Luzeci Rodrigues dos Santos, presidente da FUNCELCA, e Isabel
Cristina Barbosa dos Santos, diretora financeira da FUNCELCA.
Pergunta: De onde as pessoas que foram os primeiros moradores da Rosalina vieram?
Santos: De vários locais. Tinha o Movimento dos Sem Terra. Nessa época (1994) eram
pessoas que se encontravam na frente do INCRA, de várias localidades do nosso estado.
Isabel: Por exemplo, a minha família era do José Walter, então ‘veio’ todos pra cá, meus tios,
minha mãe, minha vó.
Santos: A Rosalina é formada por gente do interior do estado, a maioria das pessoas aqui é do
interior do estado. E é aquele negócio, veio do interior do estado, deu certo para um e foram
trazendo os outro. Então se conheceram ‘aonde’? Na frente do INCRA nos Movimentos Sem
Terra.
Isabel: MST.
Santos: E quando deu certo, você sabe que um negócio desse dá certo, ele incha, aparece
família de todos os bairros.
Pergunta: Em 2005, aconteceu o programa de pró-moradia e pró-saneamento, o que
aconteceu com esses programas?
Isabel: Seguinte, em 2005 foi a época daquele programa Aceleração de Crescimento da
Dilma e do Lula. E o que foi que aconteceu? Em relação a esse pro-saneamento e essa
pró-moradia, a moradia eles começaram a fazer, tanto que essa obra daqui foi uma obra do
Governo Federal que foi orçada em 44 milhões, eles passaram alguns anos fazendo,
entregaram a primeira etapa da obra, que são essas casas, inclusive esse local que você está
era pra ter sido também inaugurada e aí dessas moradias, só foram entregues 400 que na
época eram 2000 e tantas. Dessas 400 moradias que foram entregues, a segunda etapa, que foi
orçada em 44 milhões, que foi os apartamentos que tem aqui, não terminaram. Foi quando
terminou o mandato da antiga prefeita Luizianne Lins, e o Roberto Cláudio quando entrou, a
prefeitura aumentou o valor, mas ficou por isso mesmo, porque no Ministério da Cidade
consta que a obra de moradia da Rosalina foi concluída. No Governo Federal não tem verba
de habitação para a Rosalina, eu digo isso porque fui várias vezes atrás. Até pra ter aluguel
social aqui não tem porque consta que os moradores estão em suas casas, mas não tem e não
tem nenhuma previsão pelo município de ter algum tipo de fundo de moradia para a Rosalina,
pelo menos foi a última resposta que a gente teve.
Santos: Segunda parte, a segunda parte foi assim, imagina como foi antes, sem ter
fiscalização nem nada, porque antes não tinha essa fiscalização que tem hoje em dia, depois
da Lava Jato. 44 milhões, já tá em 120 milhões. Deixaram uma gôndola de construção
(guindaste) aí dentro, que vale 60 mil reais. E tiramos ela agora cortando ela todinha, porque
era uma tragédia anunciada, se uma empresa deixa em negócio desse dentro é porque num tá
certo. Resumindo, nós fomos mais uma daquelas comunidades que fomos atingidos por falta
de sinceridade. Usurparam o dinheiro da Rosalina. A Rosalina por muitos anos foi usada
como núcleo para um certo partido, tudo vinha para a Rosalina, mas como não tinha
fiscalização nada aconteceu.
Pergunta: Onde vocês foram para ter essa informação?
Isabel: A gente já foi na Habitafor, no gabinete do prefeito consta que não tem verba.
Santos: Mas a Habitafor avisou que a Secretaria das Cidades não tem mais verba pra cá.
Isabel: Porque consta que a obra daqui foi concluída.
Pergunta: A Agenda 21 foi realizada? O que foi feito?
Isabel: Foi realizada. Na verdade, na época, eles faziam cursos de capacitação.
Santos: Não, não se pode falar que foi feito. Eles fizeram um paliativo dentro da comunidade,
com muita enrolação. Curso de capacitação? Mentira. Aqui teve aquele restaurante de 1 real,
chegou a funcionar aqui dentro.
Isabel: Eu sei que a Agenda 21 foi um paliativo. Eles traziam muitos brinquedos infláveis
para crianças.
Santos: Mas não foi feito projeto, mais uma vez a Rosalina foi usurpada.
Pergunta: Não achei notícias sobre a Rosalina entre 2007 e 2013. Aconteceu algo?
Isabel: Não aconteceu nada. O único acontecimento de 2013, foi invasão do pessoal nesses
apartamentos que foi quando a atual presidente da Associação de Moradores tentou fazer um
pequeno movimento, gravando entrevista, falando que existia tantas moradias lá dentro
precisando desse recurso e que estava sendo invadido
Santos: Desde 2012, em cinco anos que não tinha nada. Até nós chegar em 2017, não teve
nada, ficou apagada a Rosalina, apagou-se do mapa.
Pergunta: Inauguraram o Posto de Saúde e a Creche?
Isabel: Sim, que não é aqui, é no Loteamento Expedicionários, serve para a Rosalina, mas
não é dentro da comunidade.
Pergunta: Falaram que depois foi retomada a construção das habitações.
Isabel: Na primeira gestão do Roberto Cláudio, foi o que lhe falei. Essa obra, de 44 milhões,
passou a 120 milhões, só que ficou por isso mesmo, não deu continuidade. A gente não sabe
o que aconteceu.
Santos: Eles foram lá, aumentaram o valor, o orçamento. Ninguém sabe até hoje, se a Caixa
chegou a repassar ou se não repassou. Os 44 milhões a gente sabe que a Caixa repassou, mas
os 120 milhões nós não sabemos.
Pergunta: E não foi construído?
Santos: Nada.
Isabel: O programa de habitação entregou 400 casas para mais de 2000 famílias. Que no caso
era mais de 2000 habitações e só foi entregue 400.
Pergunta: Essas habitações foram entregues completas?
Isabel: Pela metade, aqui a maioria das casas não tem reboco. As pessoas que vão fazendo
por si, mas elas foram entregues só no tijolo.
Santos: Não foram nem entregues. A maioria das pessoas começaram a entrar.
Isabel: Sem contar que na época, algumas pessoas que faziam parte desse movimento,
pegaram as casas melhores, de esquina, de várias pessoas que tinha mercadinho que tinham
direito a casa da esquina. E teve que ter confusão para eles poderem dar, porque eles não
davam, davam só o que eles queriam. Teve uma liderança que pegou cinco casas dizendo que
era para a família, sendo que não era, enquanto tinha muita gente lá embaixo que precisava.
Santos: A Comunidade Rosalina tanto foi usurpada pelo Poder Público, como foi usurpada
pelas lideranças que se rotulam estar ali dentro.
Pergunta: Agora, falando sobre as pessoas que vivem na comunidade, como era o
cotidiano antes da pandemia e agora?
Isabel: Bom, na realidade, a maioria da renda daqui é o Bolsa Família, muitas pessoas
dependem dessa verba do Governo Federal, chamada de Bolsa Família. Existe uma parcela
de catadores, existe outra de bordadeiras, que são aquelas mulher que colocam aquelas
bolinhas nas roupas.
Santos: E a maioria dos homens vivem de bicos.
Isabel: Alguns têm emprego definido, mas poucos, acho que uns 30% da comunidade tem
emprego fixo.
Santos: A Rosalina em si vive dos pequenos comércios. Se você entrar nas ruas da Rosalina
quase toda rua tem no mínimo dez comércios pequenos.
Pergunta: Como são as pessoas em termos de vizinhança?
Santos: Existe seus conflitos, porque nós vivemos em becos. É muito bonito ver só essas
quatro, cinco ruas que tem aqui fora, mas são quarenta e dois becos lá dentro. Becos mesmo,
estou falando de becos de 1,5 metro a 2 metros. Aí não tem como não ter conflito, criança,
adolescente, jovem, droga, falta de comida, não tem um canto de lazer.
Isabel: E nenhum incentivo.
Santos: Se tranque dentro de um quarto e não possa sair, é assim que as pessoas da Rosalina
se sentem, porque vai para onde? Não tinha onde ir. Agora foi inaugurada uma Areninha, que
também não tem nada de lazer. As pessoas que praticam esporte tem um lazer lá dentro, que
são aquelas pessoas marcadas, porque tem que ter horário, então é uma parcela muito
pequena que é atendida e pode usufruir da Areninha. Então, a Rosalina vivia presa num
quarto, com seus conflitos, que você sabe muito bem que se você não tem uma área de lazer,
uma área para ir, fica pior, fica com a cabeça vaga, aí vem as confusões, a Rosalina sempre
passou por isso. Com a pandemia piorou, a gente passou o ano da pandemia (2020) fazendo
assistencialismo, foram mais de 4 mil cestas básicas, 721 códigos de 200 reais que foram
gastos nos 15 comércios mais desenvolvidos da comunidade, a gente cadastrou esses
comércios, cada morador foi beneficiado de receber 200 reais em código para comprar dentro
da comunidade que era para fazer o dinheiro circular dentro da comunidade. Esse foi um
trabalho feito por Santos e Isabel e de lá para cá as coisas pioraram, esses tipos de ajuda
como CUFA, o Supera Fortaleza acabou e nós não sabemos o que vai ser feito agora. Hoje
mesmo, já atendi nove pessoas com fome.
Isabel: O pedintes aumentou. Porque até ano passado tinha o auxílio, mas a partir do mês de
janeiro que esse dinheiro não entra mais, o número de pedintes, de pessoas que realmente
estão passando fome, aumentou.
Santos: Mas não são pessoas que estão pedindo, porque querem pedir não, é porque não tem
emprego, não tem o que fazer. Foram desempregadas, a gente acompanha a comunidade, são
gente que perdeu o emprego, são gente que tão catando latinha para viver, e é a maior
dificuldade, e agora é que nós não sabemos o que fazer com esse lockdown que foi dado, nós
estamos loucos aqui, porque nós fazemos parte do assistencialismo da comunidade.
Isabel: E a gente não quer fechar, mas tem que fechar.
Santos: Chegou falando que as vizinhas dela não sabem mais o que vão fazer. Aqui, na
Rosalina, as meninas muito novas têm bebés, então já constituem uma família, então são
muitas famílias e muitas famílias passando necessidade. Ela me pediu pra ir andar lá, e eu
disse que não tinha condições de andar lá nessas ruas, porque são uns becos lá no Campo do
Palito, onde ta o foco mesmo dos necessitados, então tá difícil, está sendo muito difícil, mas a
gente vai ter que fechar as portas, porque antes nós tínhamos parceiros para ajudar e agora
não foi dado uma prévia, se vai ter alguma ajuda, porque assim, a gente só faz emprestar o
local para eles virem distribuir essas cestas, algum benefício, e até agora não tem nenhuma
prévia para a gente.
Pergunta: Não estão com nenhuma parceria? Auxílio do governo?
Isabel: A gente nunca deu nenhuma cesta básica aos custos do governo do estado, nem do
município. Usamos o terceiro setor e as empresas. Nós demos as cestas através de parceiros.
A CUFA foi um parceiro muito grande, ela doou 400 cestas básicas para a comunidade, mas
esse ano mesmo a gente não teve. Aí teve o Supera Fortaleza que ajudou bastante.
Santos: Nossa maior ajuda foi o Supera Fortaleza, que é um grupo de empresários.
Isabel: Um grupo de empresários que tinha a frente o Edson Queiroz e a Ticiane, esposa dele,
porque ela tem um grupo que se chama Somos Um, ela acha que se todo mundo se reunir e
tiver o mesmo pensamento, a gente vira um só e consegue abranger muitas coisas. Esse
projeto é até do Bom Jardim, se chama Somos Um, e eles ficaram a frente e juntaram vários
empresários de Fortaleza, vários fizeram doações para o programa Supera Fortaleza e dentro
dessas doações eles tiraram algumas comunidades para fazer esse Supera Fortaleza para
ajudar as famílias, inicialmente ia ser com a SDHDS (​Secretaria Municipal dos Direitos
Humanos e Desenvolvimento Social​) da prefeitura, onde as pessoas ligavam e aí ia dar essas
cestas básicas.
Pergunta: Como é a população daqui da comunidade?
Isabel: Tipo o índice do IBGE? Eu tentei muitas vezes ter acesso. Mas crianças a gente tem
cerca de 3 mil, crianças de 0 a 12 anos, entre 12 até 18 anos, que são os adolescentes, têm
menos do que crianças. Adultos têm mais do que crianças e idosos, acima de 50 anos, deve
ter uns 2 mil.
Pergunta: Como está em relação à saúde?
Isabel: É muito complicado, apesar que tem outros postos com a situação pior que a nossa.
Mas a gente tem uma grande área descoberta na Rosalina. O que é área descoberta? É aquela
área que não tem médico, não tem agente de saúde e não tem enfermeiro. Por exemplo, eu
moro na Rosalina há nove anos, eu tive bebe, minha filha já vai fazer quatro anos e eu nunca
tive uma visita de um ACS (agente comunitário de saúde), a SUCAM foi na minha casa uma
vez. É uma área descoberta, então tem poucas ruas que tem médico, agente de saúde ou
enfermeiro. Eu, no meu caso, tenho que ir para o posto e só vou ser atendida se tiver uma
equipe disponível, se eu passar do acolhimento e for preciso ir, eu vou, mas não tenho
diretamente um enfermeiro, um médico ou um agente de saúde, diretamente para minha rua.
Pergunta: E a educação?
Isabel: A gente tem a Escola de Ensino Municipal Infante Rosalina que pega do 1º ao 6º ano.
Tem o SER Infante Rosalina Rodrigues, que é de um a três anos. Temos a Erasmo
Pitangueira que atende de 40% a 50% da Rosalina, no Loteamento. Tem o colégio Abdenal,
no Parque Dois Irmãos, que já pega crianças do primeiro ensino, 4º a 6º ano. Que quando
você acaba o 6º você tem que ir lá para o Vicentino Campos, no final do Parque Dois Irmãos,
para do 7º ao 9º. Quando você termina isso tudo, você, se quiser estudar, tem que procurar o
José Walter, Montese. Aí eis a grande preocupação, que eu já levei ao poder público, tem
mães que não tem condições de dar a passagem, aí muitos adolescentes terminam o Ensino
Fundamental e não fazem o Ensino Médio, porque não tem como se deslocar com a passagem
para ir para os outros bairros, aí pediram para a gente uma demanda, uma pesquisa para que
fosse feito uma escola de Ensino Médio, porque isso compete ao Governo do Estado, não ao
Município. Fizemos essa pesquisa para ver até se daqui a dois, três anos quantos adolescentes
aim ter para o Ensino Médio, porém ainda não obtivemos respostas, tivemos uma roda de
conversa com o atual vice prefeito, Élcio Batista, inclusive ele saiu daqui com isso na cabeça
de pensar sobre os adolescente que ou tem que ter algum incentivo do município através da
passagem para que eles possam ir, ou que tenha uma escola de Ensino Médio aqui.
Pergunta: Como são as pessoas em relação à violência?
Isabel: Já se acostumaram. Mas se você olhar a Rosalina de oito anos atrás, você vê que
mudou muito, o índice de criminalidade baixou, não é mais o mesmo, isso é fato. Se você
pesquisar vai ver que antigamente tinha reportagem quase todo dia
Santos: Semana passada nós fizemos três matérias na tv Jangadeira, mostrando trabalho, nada
de violência.
Pergunta: Sobre assalto e furto?
Isabel: Aqui dentro não pode ter isso.
Santos: Aqui é o lugar mais tranquilo que pode ter, pode dormir de porta aberta.A Rosalina
passou muito tempo sendo a Rosalina do “vish”. Tu mora onde? Na Rosalina. Vish. Graças a
Deus, você tá de frente a duas pessoas que lutou para esse índice acabar. Lutou como?
Trazendo projetos sociais, porque o grupo que trabalha com a gente acredita que através do
mecanismo educação, cultura e lazer, nós vamos tirar essas crianças. Hoje nós estamos com
880 crianças cadastradas em nossos projetos. Se nós conseguirmos fazer o que Santos fez
antes no Pirambu, tiramos 30% da marginalidade, já vai ser muito, e aqui nós vamos tirar
mais, porque aqui o jovem quer. Escola de música vai começar assim que terminar esse
lockdown, muay thai, capoeira, dança, balé, DJ, escolinha de futebol. Só a escolinha de
futebol tem mais de 500 crianças que quando chegam aqui os olhos brilham quando dou
chuteira a eles, então eu tenho certeza, se o poder público quisesse era fácil. Num é fazer uma
copa área, mostrar para a mídia isso aí, é trabalhar o diário, o cotidiano dessas crianças. Uma
secretaria de esporte atuante, uma secretaria de cultura e lazer, coisas que não tem.
Isabel: Pelo menos aqui não.
Santos: Os CUCAs, cadê a passagem? Isso devia ser era o poder público que devia se juntar,
mas eu sei, porque não se junta, porque as lideranças são picaretas mesmo, mas o pessoal
tinha que trazer para projetos sociais de pessoas que realmente querem trabalhar e ter
fiscalização. Tudo precisa ser fiscalizado. Infelizmente, no Brasil tem que ser fiscalizado,
você tem país aí que você chega, você compra, despacha e vai embora, precisa nem de
fiscalização, aqui não, aqui até o dinheiro público tem que ser fiscalizado, uma verba que vier
para uma associação, uma ONG, precisa ser fiscalizado, infelizmente o grande índice não é
só dos governantes não, é nosso, das pessoas que não sabem trabalhar com o poder público.
Pessoas que pegam qualquer investimento e colocam no bolso, para você ver, uma ONG
grande dessas que ganha milhões para fazer um trabalho e não desenvolve, é errado. Porque
se você colocar seu trabalho, colocar essas crianças fazer esse trabalho agora. Com certeza é
uma frase que eu gosto de dizer muito “não vamos punir os homens”
Isabel: Na verdade é assim eu costumo dizer que se as políticas públicas de qualidade fossem
igualitárias e de qualidade na primeira e na segunda infância são exatamente as crianças
menores a 6 anos e de 6 até 12 anos, se tivesse um incentivo público de qualidade para elas, a
gente diminuiria muito os gastos nos presídios. Entendeu, porque nessa linha de pensamento,
por que se você trabalhar com adolescente até 14 anos, e ele tiver aquilo ali desde a primeira
infância vendo aquilo, sendo incentivado a aquilo, quando ele passar para a segunda infância
ele vai continuar naquilo, então o índice de criminalidade, dele virar um marginal, ou algo
assim ou ir para um presídio. O problema é que aqui não tem políticas públicas de qualidade.
Santos: Isso daí envolve três projetos nossos, inclusive um dos professores tá até aqui, Muay
Thai, capoeira e a escolinha do Robson (futebol). Nós temos crianças que estão agora fazendo
18 anos. Tem criança que começou no Robson com 7 anos de idade, e já vai fazer 18 anos, já
vai passar a ser de maior, e tá lá 24 horas, jogando bola, só pensa em bola, porque? Por que
foi botado, foi plantado dentro da cabeça dele quando era criança aquela cultura. Aqui no
Muay Thai, a gente tinha alguns meninos que eram meio danados, hoje em dia são nossos
campeões de Muay Thai, hoje em dia são nossos atletas que trazem troféus pra Rosalina, e
que é muito orgulho, se não fosse essa pandemia, nós íamos estar em Santa Catarina para
representar a gente, batalhando por um cinturão, você tá vendo o tamanho do nosso projeto,
isso é bonito, nossa capoeira tem meninos se formando e formados e sendo professores de
capoeira hoje em dia, como o Mestre Paulo. E o mestre Paulo só veio conseguir fazer uma
faculdade agora, e agora tá terminando, e nós que damos incentivo pra ele, por que não tinha,
mas tá terminando a faculdade agora, ele é mestre da capoeira, tem a mulher dele que já é
contra mestre, já tem outros núcleos formados por ele. Entenda, se a gente trabalhasse isso
em todo canto, não ia ter esse índice de criminalidade não, a gente não ia gastar essa ruma de
dinheiro nos presídios, na polícia, eu acho que é por aí. Mas até a gente levar isso e abrir os
olhos…
Isabel: Por que é assim, na realidade, nós somos uma pequena parte da população de
Fortaleza que tem uma mente que pode fazer a diferença, por que se todos tivessem o mesmo
pensamento nós viveríamos em uma comunidade em um país melhor, mas na nossa pequena
parte além da gente, fazer a diferença ainda tem muita perseguição, muitas coisinhas, porque
se você ta fazendo algo de bom e que tá tendo visibilidade, que você sabe que tá resgatando
vida das pessoas. É uma frase que eu costumo dizer “quem tem bondade no coração, tem que
ter sabedoria pra lidar com a ingratidão e também com a perseguição".
Santos: E nós somos perseguidos. O nosso lema é transparência, aqui tudo é aberto, ele via
chegar pela porta e a gente vai receber, eu não vou aqui pegar um carro e pegar lá do outro
lado da têxtil.
Isabel: Como acontecia. A comunidade era muito violenta, o caminhão do exército trazia as
coisas e ia deixar lá na têxtil, por que não entrava aqui dentro.
Santos: Quando a gente ganhou a liderança, os comerciantes chegaram pra mim “Ei quando
começar a vender as coisa aí, tu me avisa” e eu “Que coisa?” “As coisas que vende” aí foram
me contar que os caminhão não pode entrar porque aqui a galera toma, e aí vendia, para os
próprios comerciantes, teve uma liderança daqui que fez um mercantil dentro de casa, com os
produtos dados, que era pra ser pra comunidade.
Isabel: Então por isso que hoje nós somos perseguidos, por desmascarar e não aceitar esse
certo tipo de atitude.
Santos: Esse nome “Nova liderança” foi o diferencial, é o novo, ela foi pra uma reunião onde
eu não tava, só os deputados, aí o cara olhou pra cara dela.
Isabel: “Você faz parte da quadrilha da Rosalina?” me perguntou isso, aí eu cheguei contei
pra ele isso, e ele disse “Não, agora vamos mudar, nova liderança, gente nova” tinha um
cinema que gastava dois mil reais aqui, por semana, um cinema que eu nunca vi essa
televisão.
Pergunta: Quanto às habitações? Como são as habitações daqui, da comunidade?
Isabel: São precárias. A gente tem até um projeto que se chama Reformando sonhos, que
semana passada a gente entregou. No começo era construindo, porque em 2017 a gente
entregou uma casa, 2018 outra, 2019 outra, cada ano a gente fazia uma casa do zero. A última
casa que a gente fez foi de um reciclador, Seu Valdo, que ele morava só em um vão que era
só de papelão e a gente fez a casa dele do zero, esse ano a gente tá com um projeto que é o
Reformando Sonhos que já tem a casa mas é em situações precárias, aí a gente dá a reforma,
a primeira a gente entregou semana passada. Por que? Por que a situação das casas aqui são
bastante precárias, quando tá na quadra chuvosa muitas casas alagam.
Pergunta: E quanto a acesso a rede de esgoto?
Isabel: Não tem. Então quando chove, eu tenho vídeo de pessoas com cocô dentro de casa,
por que as fossas que são clandestinas transbordam devido a chuva e a acaba entrando pra
dentro de casa.
Pergunta: As pessoas têm o documento de posse da casa?
Isabel: Não. Sobre isso daí, a gente tem uma solicitação perante a Habitafor de regularização
fundiária, dois moradores, porém até agora não obtivemos retorno e a antiga secretária da
Habitafor, a gente tinha um projeto de que a partir desse ano iremos fazer como em alguns
bairros de Fortaleza de comunidade como a Rosalina na qual durante o dia as pessoas saem
pra trabalhar e a prefeitura terminava a obra, não sei se você sabe, mas aconteceu isso no
Pirambu, Luciano Barroso. A gente tinha esse projeto pra esse ano, infelizmente, com essa
mudança de gestão, do novo prefeito, mudou todos os secretários. Então até agora eu não tive
a oportunidade de conversar com a atual secretária, até por que eles entraram agora, não estão
atendendo ninguém, pandemia, e tals. Então assim, eu não sei como vai ficar. A gente tinha
um diálogo muito bom com a Habitafor, em relação de alguns projetos, esse prédio que você
está, era um prédio que foi invadido mas era da Habitafor, e fiquei 5 anos lutando, porque
achei que esse espaço poderia ser usado para a comunidade, e aí em setembro do ano passado
a gente recebeu a chave com um documento de posse em nome da FUNCELCA, e nós
estamos aqui.
Pergunta: Como é a Rosalina em época chuvosa? E o abastecimento de água?
Isabel: Alaga, não tem pra onde a água escoar, então quando chove foi aquilo que eu acabei
de lhe falar, a maioria das fossas clandestinas enche, ai você liga pra defesa civil, defesa civil
manda acionar o SIOPS, por que como eles falam que a comunidade é uma comunidade de
alto índice de criminalidade, então só entra se vier com a polícia, e aí teve uma ano que só eu,
durante 3 meses abri 185 protocolos, e nenhuma vez a defesa civil veio. Em relação ao
abastecimento de água, não falta, porque pegam água da rua, não tem ligação da CAGECE,
as pessoas pegam do cano da rua.
Pergunta: Quais eram os projetos que existiam antes da Nova Liderança?
Isabel: Não tinha nenhum.
Pergunta: Quais eram os projetos da Nova Liderança?
Isabel: Eram 21 projetos. Começou com o Correspondência em Casa, Juntos somos Capazes,
que foram voluntários da própria comunidade que a gente juntou pra qualquer evento que
tivesse eles serem os voluntários. Tinha a Capoeira, Balé, a gente levantou uma bandeira da
parada LGBT, pela diversidade sexual, que a gente acha muito importante respeitar as
diferenças das pessoas. A gente tem um projeto que se chama Evangelização e Missão, que
todas as crianças são evangelizadas, a gente não incentiva elas a ‘tarem’ dentro da igreja ou
escolher uma religião, seja ela católica ou evangélica, a gente incentiva elas a se aproximar
dos mandamentos de Jesus, por exemplo, eu sou católica, mas no nosso projeto tem muita
gente evangélica. A gente tem o projeto Melhor Idade, que são os idosos, a gente se reunia
uma vez por semana, todos os meses a gente conseguia dar o produto de higiene, ou panetone
ou cesta básica, a gente fazia o café da manhã dos idosos. A gente tinha o projeto Somos
Todos Iguais, que eram crianças autistas ou com algum tipo de alergia alimentar, que a gente
também dava cesta básica e para as crianças com alergia, trazia biscoito sem lactose, leite,
tudo isso. Aí tinha o Balé, a Capoeira, o Muay Thai, a Escolinha de Futebol, juntando tudo a
gente tinha 21 projetos. A gente tinha o projeto Deu a Luz, que são mãezinhas que vão ter
bebe e não tem nenhum tipo de enxoval, não tem fralda, não tem nada. A gente faz o kit e ia
deixar.
Pergunta: Hoje, quais são os projetos da comunidade e os da FUNCELCA?
Isabel: Os nossos são 11 projetos diretos que a gente tá, que escolhemos pra fazer de
imediato. Dentro da Associação de Moradores, pelo que a gente sabe, é que não tem mais o
Correspondência em Casa e a gente viu que eles entraram em parceria com o CCF, que é uma
instituição do Jardim União que eles vão uma vez por semana e tem capoeira e uma vez na
semana tem aula de balé.
Pergunta: Quais são esses 11 projetos?
Isabel: Hoje a gente tá com o projeto Sou Mãe, que são um dos maiores projetos, que são
mães que vivem em extrema vulnerabilidade social, a maioria são mães solteiras que tem
filho até 4 anos, aí esse projeto de 15 em 15 dias a mãe recebe leite, e no último sábado do
mês a gente dá uma cesta básica, essas mães de 3 em 3 meses recebe um gás também. A
gente tá com o projeto Deu a Luz, Reformando Sonhos, foram projetos criados por nós, então
a Liderança não podia dar continuidade lá, porque não autorizei.
Santos: Esses projetos sempre foram da FUNCELCA. Apenas habitavam dentro do prédio da
Associação de Moradores.
Isabel: E Capoeira, Muay Thai, que a gente continua. O Goleada na Vida, que é escolinha de
futebol, Evangelização e Missão.
Santos: Na verdade, já são seis escolinhas de futebol. Nós temos a maior, que é o núcleo com
120 crianças, que é a do Robson, que tem criança que é sub-10, sub-15, sub-17, sub-20, já tá
participando até do Cearense infantil.
Isabel: Vou falar os projetos pra tu saber na sequência: Sou Mãe, Balé, Capoeira, Muay Thai,
Melhor Idade, Somos Todos Iguais, Evangelização e Missão, Reformando Sonhos, Goleada
na Vida, Deu a Luz e Pacto de Mãe. E agora a gente vai ter aula de música, que vão ser 12
projetos.
Pergunta: Esse projeto é em parceria com alguma empresa?
Isabel: Não, até agora não, é independente. A gente corre para um lado, corre para o outro,
vai fazendo o que dá. Por exemplo, no sábado que era pra entregar dia 28, na sexta a gente
teve que comprar quinze cestas básicas e foi passado R$600 no cartão dele, porque precisava
comprar as cesta para fazer a entrega.
Pergunta: Me fala um pouco mais sobre o Reformando Sonhos.
Santos: A Comunidade Rosalina é enorme para os moradores, se você entrar ali, agora, de
surpresa, se você passar nas ruas, você vai de cara ver logo que nós vivemos numa loucura.
Pequenas obras feitas com o tempo das chuvas, é alagamento na certa. Telhados caindo. Aí
vem a demanda. “Seu Santos, meu banheiro afundou”, “Seu Santos, meu telhado”, “Seu
Santos, meu quarto melou tudo” “Seu Santos, perdi tudo”. Já não tinha nada e perdeu tudo.
Tem córregos dentro da Rosalina.
Isabel: São as águas pluviais que você vê na nascente e vão pro riacho.
Santos: Esse é um projeto grandioso, você não gasta menos de 5 mil reais numa reforma.
Mexeu aqui, caiu ali. Tirou essa parede, mexeu naquela. Mexeu ali, os buracos dos ratos são
do tamanho daquele tambor. Porque nós vivemos numa comunidade esquecida, abandonada,
desprezada.
Isabel: Aqui tem muitos bichos peçonhentos, tem escorpião, rato, aranha.
Santos: Deus bota a mão por cima para essas crianças. Porque não sei como, não tem
tragédia.
Isabel: A gente descobriu que aqui tem uma cobra enorme nesses apartamentos, porque o
pessoal encontra só a pele dela. Enorme.
Santos: Então, nessa demanda começaram “Seu Santos, uma reforma disso”. Eu nunca
prometo nada a ninguém, eu digo que vou correr atrás. Conversei com uns amigos meus e
disse “cara, é muito difícil esse projeto, porque tudo é caro”. Os materiais de construção. Aí
começamos o sonho de fazer esse projeto, uma amiga da gente teve um sonho com a gente e
disse que via aquelas casinhas bem bonitinhas e disse que ia tentar se juntar com mais
amigos. Porque você sabe que a força vem da união, um deu um tijolo, um deu isso, um deu
aquilo e chegou aqui no final e executou, com certeza, vai ter produção, é assim que a gente
faz. Muitas coisas eu tiro do bolso, mas a gente também tem muitos amigos.
Pergunta: Quais são os projetos da Prefeitura atualmente?
Isabel: Não tem nada.
Santos: Nós passamos quatro anos na liderança e não conseguimos um bombom, através de
política.
Isabel: Nunca demos uma bola através da Secretaria de Esporte.
Santos: Você sabe uma bola? Ela custa, a mais barata, 50 reais. Nunca demos uma bola
dessas através da Secretaria de Esporte, nem para a Areninha.
Isabel: Nós estamos tentando colocar aqui o Atleta Cidadão e estamos esperando o edital da
FETRIECE e talvez nem sejamos contemplados.
Santos: Eu me vi na minha loucura e comprei 500 chuteiras, 500 meiões e 120 bolas. Fiz o
material. Botei tudo isso aí no chão e pedi para as crianças do projeto escolherem. Para que
escolhessem a cor, o tamanho, e foi a coisa mais linda para mim.

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