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FICHAMENTO: Psicologia das massas e análise do Eu

“Então, repentinamente, algo sucede; ele não abandona sua mãe, mas se
identifica com ela, transforma-se nela e procura objetos que possam substituir o
seu Eu, que ele possa amar e cuidar assim como havia aprendido com a mãe”
(p. 50)

“Outro exemplo dessa introjeção do objeto nos é dado pela análise da


melancolia, afecção que tem, entre suas causas mais notáveis, a perda real ou
afetiva do objeto amado. Uma característica maior de casos assim está na
cruel autodepreciação do Eu, unida a uma implacável autocrítica e amargas
recriminações a si próprio. As análises revelaram que essa avaliação e esses
reproches se aplicam ao objeto, no fundo, representando a vingança do Eu
frente a ele.” (p. 51)

“Mas essas melancolias nos mostram ainda algo mais, que pode ser importante
para nossas considerações posteriores. Elas nos mostram o Eu dividido,
decomposto em dois pedaços, um dos quais se enfurece com o outro. Esse
outro pedaço é aquele transformado pela introjeção, e que contém o objeto
perdido” (p. 52)

“Agora é fácil descrever a diferença entre a identificação e o enamoramento


em suas mais desenvolvidas formas, chamadas de “fascínio” e “servidão
enamorada”. No primeiro caso o Eu se enriqueceu com os atributos do objeto,
“introjetou-o”, na expressão de Ferenczi; no segundo ele está empobrecido,
entregou-se ao objeto, colocou-o no lugar de seu mais importante componente
[...]” (p. 56).

“A relação hipnótica é uma irrestrita entrega enamorada em que se acha


excluída a satisfação sexual, enquanto no enamoramento esta é empurrada
temporariamente para trás e fica em segundo plano, como possível meta
futura” (p. 57)

“É interessante ver que justamente os impulsos sexuais inibidos na meta


conseguem criar laços tão duradouros entre as pessoas. Mas isso se entende
com facilidade a partir do fato de não serem capazes de plena satisfação,
enquanto os impulsos sexuais não inibidos experimentam uma extraordinária
redução, mediante a descarga, toda vez que atingem sua meta. O amor
sensual está fadado a se extinguir com a satisfação[...]” (p. 58)
“Trotter faz derivar os fenômenos anímicos observados na massa de um
instinto gregário (gregariousness), inato no ser humano e em outras espécies
animais.” (p. 61)

“As massas humanas exibem novamente a familiar imagem do indivíduo


superforte em meio a um bando de companheiros iguais, também contida em
nossa representação da horda primeva.” (p. 66)

“No princípio da história humana ele era o super-homem, que Nietzsche


aguardava apenas para o futuro. Ainda hoje os indivíduos da massa carecem
da ilusão de serem amados igualmente e justamente pelo líder, mas este não

precisa amar ninguém mais, é-lhe facultado ser de natureza senhorial,


absolutamente narcisista, mas seguro de si e independente” (p.67)

“Cada indivíduo é um componente de muitos grupos, tem múltiplos laços por


identificação, e construiu seu ideal do Eu segundo os mais diversos modelos.
Assim, cada indivíduo participa da alma de muitos grupos, daquela de sua
raça, classe, comunidade de fé, nacionalidade etc., e pode também erguer-se
além disso, atingindo um quê de independência e originalidade. Com seus
efeitos uniformes e constantes, tais formações[...]” (p.71)

“Há indícios bastantes de que o enamoramento só apareceu tarde nas relações


de sexo entre o homem e a mulher, de modo que também a oposição entre
amor sexual e ligação ao grupo se desenvolveu tardiamente” (p.85)

“A investigação psicanalítica das psiconeuroses nos ensinou que os seus


sintomas devem ser derivados de impulsos sexuais diretos que foram
reprimidos, mas permanecem ativos. Pode-se completar esta fórmula,
acrescentando: ou daqueles inibidos na meta, nos quais a inibição não foi
completamente bem-sucedida ou abriu espaço para um retorno à meta sexual
reprimida. Isso condiz com o fato de a neurose tornar associal aquele que
atinge, de retirá-lo das habituais formações de grupo.” (p.86)

“Abandonado a si mesmo, o neurótico é forçado a substituir as grandes


formações de grupos, das quais está excluído, por suas formações de
sintomas. Ele cria para si o seu próprio mundo de fantasia, sua religião, seu
sistema delirante, e assim repete as instituições da humanidade numa
deformação que claramente evidencia a contribuição poderosa dos impulsos
sexuais diretos” (p.87)
Freud, S. (2011). Psicologia das massas e análise do Eu. In S. Freud. Obras
completas (P. C. de Souza, trad., vol. 15, pp. 04-100). São Paulo: Companhia
das Letras. (Trabalho original publicado em 1921).

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