Você está na página 1de 25

JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

2 ENTRE O “ILUSTRADO” E O “INTELECTUAL PURO”:


CONSIDERAÇÕES ACERCA DAS VIRTUALIDADES E LIMITES DO MODELO
BOURDIANO DE CAMPO PARA ANALISAR A PRIMEIRA GERAÇÃO
MODERNISTA DE MINAS GERAIS

JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES *

* Doutorando do Programa de Pós-


Graduação em Sociologia da USP.
Bolsista do CNPq.
Resumo: O presente artigo explora as virtualidades e limitações do Abstract: This article explores the potentialities and limitations of the
conceito de “campo literário”, de Pierre Bourdieu, para analisar grupos de concept of “literary field” by Pierre Bourdieu to analyze groups of writers
escritores e intelectuais situados em sociedades periféricas. Trata-se de and intellectuals in peripheral societies. The point is the relevance of this
problematizar a pertinência desse conceito para interpretar o significado do concept to interpret the meaning of the modernist movement in Minas
movimento modernista em Minas Gerais. Nesse sentido, com vistas a Gerais. In this sense, in order to bring back the meaning of the
recuperar a “feição própria” do modernismo mineiro, procuro reconstruir o “modernismo mineiro”, I try rebuilding the social space of Belo Horizonte
espaço social de Belo Horizonte nos anos 20 e 30, a fim de que se possa in the 20s and 30s in order to be able to assess both the modernizing role of
avaliar tanto a atuação modernizante dos rapazes dados às letras na boys given to letters in the provincial capital state, as the traces left on
provinciana capital do estado, quanto os traços neles deixados por esta them by the same provincial society within which sought to breathe.
mesma sociedade provinciana em cujo interior buscavam respirar. Keywords: literary field; Pierre Bourdieu; writers; perifheral societies;
Palavras-chave: campo literário; Pierre Bourdieu; escritores; sociedades modernism in Minas Gerais.
periféricas; modernismo mineiro.

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
34
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

Modernismo Mineiro: fruta paulista? de ação da revista: “Ação intensiva em todos os campos: na
literatura, na arte e na política. Somos pela renovação intelectual do

Em julho de 1925, Belo Horizonte, a ainda provinciana Brasil, renovação que se tornou um imperativo categórico.” (Op. cit.,

capital de Minas Gerais, testemunhava o aparecimento de uma p. 12) Renovação, de um lado, “saneamento da tradição”, do outro:

revista modernista dirigida por um grupo de jovens intelectuais que logo de saída, o grupo modernista mineiro declarava seu

se formara no início daquela década. Intitulava-se A Revista e compromisso com a tradição literária e artística de Minas e do

estampava logo nas primeiras páginas um manifesto contendo a linha Brasil. O jovem Drummond informava ainda que a revista

editorial da publicação: funcionaria também como “um órgão político.” (Op. cit., p. 12)
Falando em nome dos letrados que dirigiam e colaboravam com a
O programa desta revista não pode
necessariamente afastar-se da linha estrutural de publicação, ele explicava que os interesses do grupo não eram
todos os programas. Resume-se numa palavra:
Ação. Ação quer dizer vibração, luta, esforço apenas literários, mas também sociais, expressando o desejo dos
construtor, vida. Resta cumpri-lo, e com lealdade jovens letrados mineiros de participarem do processo político.
o confessamos: começam aqui as dificuldades.
Supõe-se que ainda não estamos suficientemente Nascidos na República, assistimos ao espetáculo
aparelhados para manter uma revista de cultura, cotidiano e pungente das desordens intestinas, ao
ou mesmo um simples semanário de bonecos longo das quais se desenha, nítida e perturbadora,
cinematográficos: falta-nos desde a tipografia até em nosso horizonte social, uma tremenda crise de
o leitor. Quanto a escritores, oh! isso temos de autoridade. No Brasil, ninguém quer obedecer.
sobra. (Assim Deus Nosso Senhor mandasse uma Um criticismo unilateral domina tanto nas
epidemia que os reduzisse à metade!) Desta sorte, chamadas elites culturais como nas classes
um injustificável desânimo faz de Belo Horizonte populares. Há mil pastores para uma só ovelha.
a mais paradoxal das cidades: centro de estudos, (...) Contra esse opressivo estado de coisas é que
ela não comporta um mensário de estudos. E se a mocidade brasileira procura e deve reagir,
reponta, aqui e ali, uma tentativa nesse sentido, o utilizando as suas puras reservas de espírito e
coro dos cidadãos experimentados e céticos coração. Ao Brasil desorientado e nevrótico de
exclama: “Qual! É tolice... A ideia não vinga.” E até agora, oponhamos o Brasil laborioso e
como, de fato, a ideia não vinga, o ceticismo prudente que a civilização está a exigir de nós.
astucioso e estéril vai comprar a sua “Revista do Sem vacilação, como sem ostentação. É uma obra
Brasil”, que é de S. Paulo, e, por isso, deve ser de refinamento interior, que só os meios pacíficos
profundamente interessante... (“Para os Céticos”, do jornal, da tribuna e da cátedra poderão
A REVISTA, 1978, p. 11) veicular. Depois da destruição do jugo colonial e
do jugo esclavagista, e do advento da forma
O editorial, de autoria de Carlos Drummond de Andrade, republicana, parecia que nada mais havia a fazer
começava nesse tom debochado e prosseguia informando as linhas senão cruzar os braços. Engano. Resta-nos

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
35
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

humanizar o Brasil. (“Para os Céticos”, A que, segundo Pedro Nava, um dos seus integrantes, “vieram a fazer
REVISTA, 1978, p. 12-13)
parte do pensamento, da intelligentsia, da literatura, da política e da
O grupo que estava à frente da revista modernista de Belo administração do Brasil contemporâneo.” (“Recado de uma
1
Expressão empregada por
Antonio Candido em seu Horizonte era fruto de um esforço de modernização regional que geração”, A REVISTA, 1978, p. 1)
“Depoimento” a Mário Neme em datava dos primeiros anos republicanos. Trata-se de uma geração Ao lado dessa atuação no campo das políticas culturais e
1943. Cf. PONTES, 1998, p. 13.
que teve sua formação iniciada nas cidades do interior do estado e educacionais, uma fração desse grupo de intelectuais teve fôlego
concluída nas faculdades fundadas em Belo Horizonte nos decênios para produzir uma obra literária que alteraria o nosso espaço
anteriores. Nos anos 1930 e 1940, a fração de escritores que literário, integrando-se definitivamente ao panteão nacional. Carlos
compunha essa geração de intelectuais mineiros, uma vez Drummond de Andrade na poesia e na crônica, Emílio Moura, na
reconvertida ao modernismo, publicaria obras que, segundo Maria poesia e na crítica, João Alphonsus, cujo conto “Galinha cega”
Arminda do Nascimento Arruda, junto com aquelas dos outros consta em qualquer antologia de contos brasileiros que mereça esse
escritores provenientes da periferia da nossa república das letras (os nome, autor de inúmeros outros contos e de dois romances
romancistas do Nordeste, do Sul), seriam responsáveis pelo ambientados em BH, e Cyro dos Anjos, cujo romance de estreia, O
“deslocamento do centro da produção literária, que migra das amanuense Belmiro, figura entre os clássicos do gênero. O que hoje
capitais para outras regiões do país” (ARRUDA, 2011, p. 192), nos causa certo espanto é que todos eles tiveram “destinos mistos”1,
“deslocamento” entendido não meramente no sentido geográfico, conciliando a atividade literária com a prestação de serviços político-
afinal as principais casas editoras e instâncias de consagração burocráticos, escrevendo, conforme Cyro dos Anjos, pareceres,
continuavam no eixo Rio-São Paulo, mas a entrada no jogo desses relatórios e discursos “cacetíssimos” ao lado de romances, poemas,
“escritores de província” deslocou realmente o eixo em torno do qual contos e crônicas que nos arrebatam ainda hoje. Entender como isso
gravitava o debate estético nos anos 20. foi possível configura, desde 2013, a minha ambição intelectual.
A minha pesquisa de doutorado, em andamento, concentra-se Um dos caminhos interpretativos possíveis é caracterizar o
nessa geração de intelectuais mineiros que se congregaram nos anos modernismo mineiro enquanto um “modernismo de província”.
20, na provinciana Belo Horizonte de então, e nas duas décadas (MARQUES, 2011, p. 23-47) Desse ponto de vista, o modernismo
seguintes se entregariam de corpo e alma a um trabalho de paulista do início dos anos 1920 teria se espalhado pelas outras
construção institucional que mudaria definitivamente a feição da regiões do país, onde “em cada constelação provinciana, para além
cultura nacional. Trata-se de uma geração de intelectuais mineiros da simples imitação da vanguarda paulista, o movimento foi

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
36
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

adquirindo uma feição particular, determinada pelas condições direções importantes na avaliação do significado do modernismo em
locais.” (Op. cit., p. 9) Segundo essa interpretação, o modernismo Minas. Debruçando-se sobre a Belo Horizonte dos anos 20, define-a
mineiro seria uma espécie de caudatário do modernismo paulista do como uma capital provinciana, com uma população que não chegava
decênio de 1920, como um fenômeno periférico do campo a sessenta mil habitantes, mas que conservava certa importância por
intelectual que despontava no eixo Rio-São Paulo. ser o centro político-administrativo de um estado politicamente
No entanto, se é inegável que o modernismo mineiro foi poderoso durante a República Velha. Uma formação social oscilando
impulsionado pelos modernistas de São Paulo – fato que Drummond, entre a tradição e a modernidade, mas onde “a tradição prepondera.”
Nava, e os demais integrantes da geração modernista de Minas foram (DIAS, 1971, p. 81)
os primeiros a apontar –, a dicção própria que o movimento assumiu A tese desse autor segundo a qual os intelectuais modernistas
no estado só ganha inteligibilidade quando atentamos para o estilo de de Minas desempenharam o “papel de fermentar saudavelmente o
vida que levavam na Belo Horizonte dos anos 20 e 30, para a meio social e político” tem servido de inspiração ao longo de toda a
posição que ocupavam no espaço social da capital mineira. Ao minha pesquisa. Segundo ele:
contrário do que defende Ivan Marques, para quem “é a verificação A tese que aqui levantamos é a de que, em
das obras que permite medir a modernidade de um artista”, defendo Minas, no final da década de 20, (...) tentou-se
fazer de uma oligarquia regional uma elite do
que, como já apontou Sérgio Miceli, a singularidade do modernismo poder. Procurou-se conferir autenticidade e
modernidade à velha oligarquia, que aprofundara
em Minas Gerais deve ser buscada nos caracteres distintivos da
suas raízes no período da República de [18]91. A
“cadeia regional de circunstâncias institucionais e políticas” que os Revolução de 30, em Minas, com todos os seus
equívocos, nos parece expressão desse processo
escritores mineiros tiveram de enfrentar, construindo uma trajetória renovador. E é inegável que isso foi possível, em
diferenciada daquela do grupo modernista de São Paulo. (MICELI, grande parte, porque o meio intelectual mineiro
havia experimentado progressos, graças aos
2004, p. 75) jovens escritores modernistas. (DIAS, 1971, p.
104)
Não se trata de relegar a segundo plano as obras, e sim de
procurar demonstrar que o que os modernistas de Minas escreviam e Os escritores modernistas de Minas, eles mesmos uma fração

como eles escreviam somente podem ser compreendidos quando as da classe dirigente do estado, engajaram-se ativamente no processo

condições sociais e políticas da produção literária na capital mineira de modernização regional, atuando como uma espécie de

são trazidas à luz. Nesse sentido, o livro pioneiro de Fernando destacamento precursor da oligarquia mineira que desempenhou um

Correia Dias sobre o movimento modernista em Minas apontou papel importante na modernização das condutas públicas, do gosto

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
37
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

estético e da maneira de pensar a cultura – esquemas de pensar, agir não foi trabalhado por clivagens internas com força suficiente para
e sentir que posteriormente se tornariam moeda corrente. dissolvê-lo. Mais do que romper com uma geração anterior, o grupo
E, de fato, integrantes dessa geração modernista de Minas, modernista de Minas estabeleceu com ela relações de compromisso e
como Mário Casasanta, Abgar Renault, Gustavo Capanema, Carlos camaradagem – o que não significa que não tenha havido uma boa
Drummond de Andrade, entre outros, tomaram parte na reforma do dose de tensões nessa relação.
ensino e na concretização do sonho das elites mineiras de terem uma Nesse sentido, caberia aprofundar a hipótese de que o
universidade no estado, reforma levada a cabo na segunda metade significado do modernismo mineiro deveria ser buscado não numa
dos anos 20, sob a batuta de Francisco Campos, então Secretário do configuração do tipo antigos x modernos, ou heterodoxia x
Interior. Além disso, praticamente todos os integrantes do grupo ortodoxia, e sim num esforço modernizante que congregou a fração
modernista mineiro participaram ativamente da campanha da ilustrada das elites mineiras e a nova geração que buscava afirmar-se
Aliança Liberal que conduziria à Revolução de 30 e à reorganização como “intelectuais”, ou seja, tentava transformar as atividades
do sistema de dominação no plano federal e nos estados. intelectuais e artísticas em algo mais do que um mero adorno ou um
A primeira geração modernista de Minas formou-se numa lazer cultivado nas horas vagas.
capital ainda bastante provinciana, cuja importância política não No presente artigo, com vistas a recuperar a “feição própria”
encontrava correspondência no plano econômico e cultural. Com do modernismo mineiro, procuro reconstruir o espaço social de Belo
uma população de pouco mais de cinquenta mil habitantes, Belo Horizonte nos anos 20 e 30, a fim de que se possa avaliar tanto a
Horizonte era, nos anos 1920 e 1930, sobretudo um centro atuação modernizante dos rapazes dados às letras na provinciana
administrativo, sendo sua população composta basicamente por capital do estado, quanto os traços neles deixados por esta mesma
funcionários públicos, estudantes e comerciantes, uma sociedade sociedade provinciana em cujo interior buscavam respirar. Antes,
pouco diferenciada e muito tradicionalista. porém, gostaria de explicitar as balizas teórico-metodológicas que
Partindo do pressuposto de que os grupos de intelectuais que orientaram a construção do retrato coletivo dos escritores dessa
se autoproclamam “modernos” buscam afirmar-se contra o grupo já primeira geração modernista de Minas Gerais, apresentado na última
estabelecido dos “antigos”, o modernismo mineiro coloca-nos então seção do texto.
a seguinte questão: contra quem a ironia e os esforços de
diferenciação eram dirigidos? Eles eram “modernos” em relação a Questões de Método
quem? Diferente do grupo modernista de São Paulo, o grupo mineiro

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
38
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

Inspirando-se, de um lado, na sociologia da cultura de Pierre Aplicada ao universo literário, a teoria dos campos permite
2
La condition littéraire: la Bourdieu, centrada nos conceitos de habitus e campo, e, do outro, na estudar as posições ocupadas pelas diferentes editoras e pelos
double vie des écrivains (2006) sociologia das condições práticas de exercício da literatura proposta diferentes autores, as lutas travadas em torno da definição das
e Franz Kafka: éléments pour
une théorie de la création por Bernard Lahire, minha proposta aqui é a de descortinar as hierarquias e da legitimidade literária, permite também apreender as
littéraire (2010)
propriedades estruturais do universo literário belo-horizontino nos diferenças entre o subcampo da produção restrita (viveiro dos
anos 20 e 30, as propriedades objetivas dos agentes desse universo, autores e obras de vanguarda) e o subcampo da grande produção
bem como as condições práticas de exercício da atividade literária. (que congrega os autores e obras mais “acessíveis” ao público de
Para levar a termo essas tarefas, é preciso, de um lado, não-produtores).
compreender as especificidades desse universo literário no período No entanto, como tem mostrado Bernard Lahire em suas
estudado e, do outro, contextualizar e “materializar” os seus agentes, últimas obras2, a teoria dos campos de Pierre Bourdieu padece de
os escritores, amiúde reduzidos pela crítica literária a “seres certos limites para pensar o universo literário. Ainda que ela leve em
desencarnados”. Esse trabalho de materialização dos escritores visa conta a “autonomia relativa” dos universos literários e artísticos,
reinscrevê-los nas condições sociais e econômicas com as quais se subordinados estruturalmente ao campo do poder, a teoria dos
depararam, levando-os a administrarem seu tempo entre atividades campos deixa em segundo plano o fato de que esses universos
literárias e atividades extraliterárias, focalizando as soluções culturais são muito pouco profissionalizados e não asseguram para a
encontradas por esses escritores modernistas de Minas Gerais para maior parte dos seus integrantes autonomia propriamente econômica,
dedicarem-se à literatura em meio às constrições de toda ordem levando-os a se inscreverem em outros universos sociais para
impostas pelo estado embrionário do campo literário e pelo “second garantir a reprodução material de suas vidas. Obrigados amiúde a
métier”, a carreira burocrática, que tendia a desviar o tempo e a exercerem um “second métier” fora do universo literário, os
energia requeridas pelo trabalho literário. escritores assemelham-se mais, segundo Lahire, a “jogadores” do
Esta démarche de materialização dos escritores pressupõe um que a agentes estáveis de um campo.
retorno reflexivo sobre conceitos de campo literário e de habitus, Minha proposta consistirá, então, em colocar em evidência
noções chaves da sociologia da cultura de Pierre Bourdieu, mas que que o conceito de “campo literário” foi criado por Pierre Bourdieu
costumam ser empregadas de uma maneira um tanto quanto para dar conta de um processo histórico muito particular de
irrefletida, sem que seja feita uma avaliação de sua pertinência para autonomização, sempre relativa, das instâncias voltadas para a
o caso empírico estudado. produção, distribuição e recepção de obras literárias. É preciso estar

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
39
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

plenamente ciente disso para que esse conceito continue a liberar a Elias, passando por Marx, Durkheim e Weber, o tema da divisão
imaginação científica e forneça pistas heuristicamente valiosas para social do trabalho ocupa uma posição central na teoria social.
a análise de universos sociais distintos daquele que o originou. Como A reflexão durkheimiana sobre a divisão do trabalho social
tentarei mostrar, o conceito de “campo literário” está umbilicalmente inspirou sem dúvida as formulações de Pierre Bourdieu sobre a
ligado à análise levada a efeito por Bourdieu da gênese e da estrutura gênese e a estrutura dos campos de atividade social. A análise,
do campo literário francês estando ancorado numa realidade social empreendida por Durkheim em A divisão do trabalho social, do
histórica e geográfica muito específica. processo histórico de evolução que conduz do estado original de
As propriedades essenciais do campo literário podem ser indistinção e de homogeneidade das sociedades tradicionais – em
sumariadas da seguinte maneira: que o econômico, o político, o religioso, a ciência, o direito etc.
– é um sistema estruturado de posições, que são ocupadas por ainda não haviam se separado – à separação progressiva de todas
agentes conforme o capital específico de que eles dispõem; estas funções sociais, estado este característico das sociedades
– a distribuição desigual do capital específico no seio do modernas e altamente diferenciadas, forneceu um dos esteios da
campo fornece a dinâmica das lutas entre agentes que pretendem teoria dos campos. Assim como o esquema explicativo acionado por
monopolizá-lo ou redistribuí-lo, dando origens a estratégias de Durkheim para dar conta desse processo de diferenciação do mundo
conservação ou de subversão (dominantes x dominados; ortodoxia x social. Segundo ele, trata-se de uma questão de pura morfologia: “A
heterodoxia; antigos x modernos); divisão do trabalho varia na razão direta do volume e da densidade
– os agentes aí inscritos são dotados de um habitus específico das sociedades”, ou seja, à medida que o número de indivíduos em
ao campo, o que os mantém “ligados” nas lutas e apostas que aí são interação aumenta, a divisão de funções e a diversificação das
travadas; relações sociais também aumentam. O aumento do volume e da
– ele é dotado de uma autonomia relativa, ou seja, as lutas “densidade moral” faz surgir a questão do lugar social dos diferentes
travadas no interior do campo possuem uma lógica interna, no indivíduos de uma determinada formação social. Nesse quadro de
entanto, as lutas travadas nos outros campos (econômico, político, “explosão demográfica”, a divisão do trabalho apresenta-se como
social) afetam as relações de força intracampo. uma solução pacífica e socialmente mais interessante do problema da
A teoria dos campos de Pierre Bourdieu situa-se no interior “luta pela vida”:
da reflexão sociológica sobre o processo histórico de separação e A divisão do trabalho é portanto um produto da
diferenciação das atividades sociais. De Herbert Spencer a Norbert luta pela vida: mas trata-se de um desfecho

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
40
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

brando. Com efeito, graças a ela, os rivais não (Eigengesetzlichkeit) de cada uma das esferas de ação social posto
são obrigados a eliminarem-se mutuamente, mas
podem coexistir uns ao lado dos outros. Por isso, em obra por Weber na “Reflexão intermediária”. Em seu comentário
à medida que se desenvolve ela fornece a um sobre esse ensaio de Max Weber, Antônio Flávio Pierucci mostra
número cada vez maior de indivíduos, que em
sociedades mais homogêneas estariam que é nele sobretudo que Weber desenvolve sua teoria da
condenadas a desaparecer, os meios para se
manterem e sobreviverem. (DURKHEIM, 1984, modernização cultural entendida como diferenciação, autonomização
v. II, p. 52) e institucionalização das esferas de valor.
A criação de esferas separadas de atividades diversifica as Com o advento da modernidade e a ruptura dos
possibilidades de “luta pela vida” e de reconhecimento social: “O laços tradicionais por uma série de fatores,
inclusive no plano cultural e no da personalidade,
soldado procura a glória militar, o sacerdote autoridade moral, o Weber diagnostica uma importante inflexão no
processo de racionalização ocidental: agora é
homem de estado o poder, o industrial a riqueza, o cientista o possível conceber a esfera doméstica e a
renome científico; cada um deles pode assim atingir o seu fim, sem economia, a política e o direito, a vida intelectual
e a ciência, a arte e a erótica, independentemente
impedir os outros de atingirem o seu.” (DURKHEIM, 1984, v. II, p. das fundamentações axiológicas religiosas. Cada
esfera de valor, ao se racionalizar, se justifica por
48) si mesma: encontra em si sua própria lógica
O que não impede que haja luta e concorrência entre agentes interna – uma legalidade própria
[Eigengesetzlichkeit] – que a leva a se
que desempenham funções relativamente próximas: “Nunca o institucionalizar autonomamente e a se consolidar
e se reproduzir socialmente pela formação de
magistrado concorre com o industrial; mas o fabricante de cerveja e
seus próprios quadros profissionais, encarregados
o produtor de vinhos, o fabricante de panos e o de sedas, o poeta e o de garantir precisamente sua autonomia.
(PIERUCCI, 2003, p. 138)
músico esforçam-se muitas vezes por se suplantarem mutuamente.”
(DURKHEIM, 1984, v. II, p. 48-49) Algo próximo, por exemplo, à Conforme a abordagem weberiana, a diferenciação das

luta travada entre sociólogos e historiadores ou filósofos. Há esferas de atividade leva à tomada de consciência da lógica interna

igualmente lutas intensas entre os agentes que desempenham as de cada uma delas.

mesmas funções: “Quanto àqueles que se entregam exatamente à A racionalização e a sublimação conscientes das
relações humanas com as diferentes esferas de
mesma função, não podem prosperar senão em detrimento uns dos posse de bens, exteriores e interiores, profanos e
outros.” (DURKHEIM, 1984, v. II, p. 49) religiosos, obrigou o homem, segundo leis
próprias interiores de cada uma das esferas, a se
Bourdieu inspirou-se também na sociologia das religiões de conscientizar das consequências de suas ações e,
com isso, fez com que entrassem em tensão
Max Weber, sobretudo no conceito de “legalidade própria”
aquelas esferas que até então estabeleciam

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
41
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

relações ingênuas com o mundo exterior. Trata-se de um espaço estruturado de posições que são ocupadas por
(WEBER, 2013, p. 512-513)
agentes portadores das disposições (habitus) por elas requeridas.
Eis o esquema interpretativo da “lógica interna” e “imanente” Aplicado ao universo da produção simbólica, o conceito de “campo”
utilizada por Bourdieu para definir o modo de funcionamento dos permitiria superar a oposição entre “leituras internas” e “leituras
campos. Coerente com o esquema durkheimiano da divisão do externas”: contra ambas, Bourdieu buscava, pelo emprego desse
trabalho social e a análise weberiana da diferenciação e conceito, chamar a atenção para os microcosmos sociais,
autonomização das esferas de valor, Bourdieu opera com um relativamente autônomos e regidos por uma lógica interna, nos quais
conceito de intelectual enquanto um agente de um campo dotado de os produtores de bens simbólicos estão encerrados. Na prática, isso
autonomia relativa que, a partir da posição ocupada no campo significa que a sociologia da cultura e da arte deve evitar dois tipos
intelectual, intervem nas lutas políticas e sociais – sendo a atuação de reducionismo: de um lado, as diversas modalidades de “leitura
de Émile Zola no affaire Dreyfus o modelo implícito que ele tem em criadora” que tendem a tratar as obras de arte e de cultura como
mente. entidades autônomas, sujeitas às suas próprias leis; do outro, os
No entanto, como analisar as tomadas de posição nas lutas diversos tipos de reducionismo sociológico que pretendem relacionar
políticas e sociais de intelectuais situados em espaços provincianos diretamente as propriedades formais das obras às propriedades
que não podem contar com um campo intelectual minimamente sociais da fração de classe de seus autores.
autônomo, nem com um capital específico que legitime suas tomadas
A noção de campo permite superar a oposição
de posição nas lutas que são travadas no campo do poder local? entre leitura interna e análise externa sem perder
nada das aquisições e exigências dessas duas
No caso dos intelectuais modernistas de Minas Gerais, sua abordagens, tradicionalmente percebidas como
trajetória social define-se pela necessidade de conciliar espaços inconciliáveis. Conservando o que está inscrito
na noção de intertextualidade, isto é, o fato de
sociais com lógicas distintas, cindidos como estavam entre a atuação que o espaço das obras apresenta-se a cada
momento como um campo de tomadas de posição
ativa no projeto de modernização regional e a entrega a uma estética
que só podem ser compreendidas
modernista que deles exigia uma ruptura com suas raízes regionais. relacionalmente, enquanto sistema de variações
diferenciais, pode-se levantar a hipótese
A questão do “habitus clivado” dos intelectuais foi pouco trabalhada (confirmada pela análise empírica) de uma
por Bourdieu, como veremos. homologia entre o espaço das obras definidas em
seu conteúdo propriamente simbólico e, em
A vinculação entre “campo” e “habitus” no modelo de análise particular, em sua forma, e o espaço das posições
no campo da produção (...); com efeito, em razão
elaborado por Bourdieu confere a ele plasticidade e dinamismo. do jogo das homologias entre o campo literário e

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
42
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

o campo do poder ou o campo social em seu As reflexões de Bourdieu sobre os campos de produção
conjunto, a maior parte das estratégias literárias é
sobredeterminada e muitas das “escolhas” têm simbólica atingiriam sua forma mais bem acabada em seu trabalho
dois alvos, são a um só tempo estéticas e sobre a gênese e a estrutura do campo literário francês na segunda
políticas, internas e externas. (BOURDIEU,
1996, p. 234) metade do século XIX com base num estudo de caso do escritor

No entanto, como tem ressaltado Bernard Lahire em seus Gustave Flaubert. Trata-se, sem dúvida, de uma análise brilhante,

últimos trabalhos, pretendendo combater o reducionismo sociológico portadora de um programa de pesquisa que tem se mostrado bastante

que postula uma relação direta entre a posição de classe do autor e as promissor. No entanto, isso não nos deve fazer esquecer suas

propriedades formais da sua obra, Pierre Bourdieu acaba incorrendo, limitações e seu “campo” de pertinência. A principal restrição diz

por seu turno, em outra forma de reducionismo que consiste em respeito ao encerramento das trajetórias sociais dos produtores e da

concentrar a análise no papel de instância de mediação exercido pelo explicação de suas obras nos limites da posição ocupada no campo

campo da produção deixando em segundo plano as propriedades da produção.

disposicionais e as experiências sociais dos produtores, em suma, seu Os escritores acabam reduzidos à posição – e às tomadas de

habitus. posição estéticas, políticas, éticas – ocupada no campo da produção,

Tudo se passa como se a vinculação original entre os redução tanto mais problemática no caso de um microcosmo pouco

conceitos de “campo” e “habitus” fosse progressivamente sendo profissionalizado como é o caso do campo literário, o que obriga os

deixada de lado em favor de uma análise centrada nas homologias escritores a assegurarem sua reprodução material em outros

entre o campo do poder e o campo da produção simbólica. Quer universos sociais, regidos por outras lógicas internas. Além disso, as

dizer, a posição ocupada no campo da produção “comanda” a forma suas obras são amiúde explicadas unicamente em função da posição

e o conteúdo da obra. que seus autores ocupam no campo da produção, como se se tratasse
de estratégias (ainda que inconscientes) de que lançassem mão para
Assim, as produções simbólicas devem suas
propriedades mais específicas às condições maximizar suas chances de obter lucro material e simbólico.
sociais de sua produção e, mais precisamente, à
A ênfase excessiva no momento de reconstrução do campo da
posição do produtor no campo de produção. Este
último comanda, por meio de diferentes produção levou Bourdieu a negligenciar as experiências sociais dos
mediações, tanto o interesse expressivo, a forma
e a força da censura que lhe é imposta, como escritores, assim como as disposições e as competências que eles
também a competência que lhe permite satisfazer adquiriram nas diversas instâncias de socialização: na família, no
esse interesse no limite de tais constrangimentos.
(BOURDIEU, 2008, p. 133) percurso escolar, em sua inserção profissional fora do campo

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
43
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

literário, nos grupos de amigos, etc. Bourdieu reduz amiúde a oposição entre leitura interna e análise externa, a hipertrofia do seu
trajetória social dos escritores a uma série de posições ocupadas no emprego levou Bourdieu a minimizar ou negligenciar as
campo literário, e sua socialização passada a algumas disposições experiências sociais e as disposições constitutivas do habitus dos
genéricas (ascetismo, aristocratismo, modéstia, ambição, agentes desse campo, os escritores, que não estavam diretamente
conservadorismo, vanguardismo). relacionadas ao campo da produção. Cada vez mais, a lógica interna
Essa postura confere ao modelo do campo literário um caráter do campo literário, pensado como universos de especialistas
fortemente legitimista – “legitimista” no sentido em que o funcionando como microcosmos relativamente autônomos, como
pesquisador adota o ponto de vista dominante sobre a criação espaços estruturados de relações objetivas entre posições, passou a
literária, dispensando pouca atenção seja aos escritores que ocupam funcionar como o único príncipio explicativo levado em conta:
posições dominadas no campo da produção, seja às experiências “essas relações [objetivas entre posições] são o verdadeiro príncipio
sociais extra-artísticas dos escritores mais legítimos. Assim fazendo, das tomadas de posição dos diferentes produtores, da concorrência
o sociólogo acaba reproduzindo em seu modelo de análise uma que os opõe, das alianças que estabelecem, das obras que
clivagem interna ao campo, qual seja a distinção entre as obras mais reproduzem ou que defendem.” (BOURDIEU, 1996, p. 232, grifado
“puras”, mais “legítimas”, e as obras “impuras”, “comerciais”, entre por mim)
os escritores mais “puros” e “criativos” e os escritores mais Essa tomada de posição teórico-metodológica levou Bourdieu
“comerciais” ou “epigonais”. No entanto, relegando a segundo plano a reduzir as disposições socialmente constituídas dos escritores a
a análise da sociogênese das disposições e competências dos suas origens sociais retraduzidas na lógica do campo; a negligenciar
escritores mais legítimos, o que implicaria reconstruir as a sociogênese dessas disposições; a considerar estas disposições
experiências sociais extra-artísticas dos escritores mais legítimos – sociais sinteticamente definidas como princípio explicativo da forma
das experiências familiares às experiências profissionais, passando e do conteúdo das obras literárias e artísticas. Dessa forma, o
pelas experiências religiosas, políticas, etc. –, o sociólogo acaba universo literário é representado sob a forma de um espaço
reproduzindo o mito oitocentista do “gênio criador”, fixando-se nas hierarquizado de possibilidades estilísticas e temáticas cuja escolha
disposições e competências ligadas à sua pertença ao campo de pelos autores é guiada pelas suas disposições incorporadas.
produção. Às diferentes posições no campo de produção,
Enfim, se o modelo do campo literário foi criado enquanto tais como estas podem ser definidas levando-se
em conta não só o gênero praticado, a categoria
uma tentativa de fundar um programa de pesquisa que superasse a nesse gênero, identificada através dos lugares de

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
44
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

publicação (editora, revista, galeria, etc.) e dos inconscientes) adotadas em função da posição ocupada no espaço
3
No texto “A ilusão biográfica”, Bourdieu índices de consagração, ou, simplesmente, da
afirma que “Tentar compreender uma vida antiguidade de entrada no jogo, mas também os dos modos de expressão possíveis. Confere-se, então, um primado ao
como uma série única e, por si só, indicadores mais exteriores, como a origem
suficiente de acontecimentos sucessivos,
contexto (as relações objetivas entre as posições no campo literário)
social e geográfica, que se retraduzem nas
sem outra ligação que a vinculação a um posições ocupadas no interior do campo, em detrimento das disposições e do passado incorporado dos
„sujeito‟ cuja única constância é a do nome
correspondem as posições tomadas no espaço dos
próprio, é quase tão absurdo quanto tentar escritores.
explicar um trajeto no metrô sem levar em
modos de expressão, das formas literárias e
conta a estrutura da rede, isto é, a matriz artísticas (alexandrino ou um outro metro, rima Tudo se passa como se a teoria dos campos de Bourdieu
das relações objetivas entre as diversas ou verso livre, soneto ou balada, etc.), dos temas
estações.” (BOURDIEU, 2011, p. 81) e, evidentemente, de todos os tipos de índices pretendesse deduzir cada obra literária nova da posição do seu autor
formais mais sutis que a análise literária
no espaço estruturado de posições, como se ela não fosse senão o
tradicional há muito tempo assinalou. Em outros
termos, para ler adequadamente uma obra na desenvolvimento de potencialidades inscritas no campo num
singularidade de sua textualidade, é preciso lê-la
consciente ou inconscientemente na sua momento dado, possibilidades percebidas e interpretadas a partir de
intertextualidade, isto é, através do sistema de
uma posição singular no interior do campo de produção, posição
desvios pelo qual ela se situa no espaço das obras
contemporâneas; mas essa leitura diacrítica é ocupada conforme o cabedal de disposições sociais com que ele aí
inseparável de uma apreensão estrutural do
respectivo autor, que é definido, quanto às suas ingressa.
disposições e tomadas de posição, pelas relações Postura teórica que, por seu turno, é tributária da ruptura
objetivas que definem e determinam sua posição
no espaço de produção e que determinam ou sistemática com o método biográfico, considerado como uma forma
orientam as relações de concorrência que ele
mantém com os demais autores e o conjunto das de psicologismo que isolaria o indivíduo e que buscaria explicar sua
estratégias, sobretudo formais, que o torna um trajetória social enquanto o desdobramento de um destino ou de um
verdadeiro artista ou um verdadeiro escritor – por
oposição ao artista ou ao escritor “ingênuo”, “projeto original” nos moldes da análise sartriana de Flaubert. No
como o douanier Rousseau e Brisset, que,
propriamente falando, não sabem o que fazem.
entanto, o programa de pesquisa inscrito na teoria dos campos
(BOURDIEU, 2004, p. 177-178) pressupõe uma abordagem até certo ponto biográfica, esta última
Perdoem-me esta citação um tanto longa, mas absolutamente entendida enquanto método de reconstrução da sociogênese das
necessária pela limpidez cristalina com que o modelo teórico de disposições dos escritores, daquilo que define seu habitus.
Bourdieu é apresentado. Com efeito, nela podemos perceber que os Disposto a romper com a “ilusão biográfica”3, noção do
estilos e temas são reduzidos às tomadas de posição num campo senso comum considerada incompatível com a démarche
literário hierarquizado. Os problemas e apostas formais e temáticas sociológica, Bourdieu exclui uma abordagem que se mostra
dos escritores são explicadas como estratégias (conscientes ou indispensável para levar a termo sua própria definição de habitus.

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
45
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

Contra o Sartre de Questões de método, contra a leitura problemas que sua situação presente lhes colocava. Problemática que
existencialista levada a a cabo por ele a fim de reconstruir o “projeto não pode ser reduzida a questões formais, envolvendo também uma
original” de Flaubert, Bourdieu aposta todas as suas fichas no dimensão existencial que marcou aquela geração de escritores e os
“campo literário”, na posição que Flaubert ocupava no campo levou a pesquisar a forma mais adequada para exprimir suas
literário francês da segunda metade do século XIX, terminando por inquietudes existenciais.
reduzir Flaubert a algumas poucas propriedades definidas A hipótese que procuro corroborar é a de que as experiências
sinteticamente e por negligenciar os elementos mais constitutivos e sociais sucessivas dessa geração modernista de Minas funcionam
estruturantes de sua experiência social, ou melhor, de suas como matriz formal das suas obras e das suas escolhas estéticas.
experiências sociais sucessivas. Trazer para o primeiro plano da análise as inquietudes existenciais
Tudo se passa como se o romance L’Éducation sentimentale dessa geração não significa retomar o modelo do projeto criador,
de Flaubert não fosse outra coisa que a transposição literária das uma vez que os elementos constitutivos dessa inquietude não
relações objetivas, e tensas, entre o campo do poder e o campo precisam estar necessariamente presentes na consciência desses
literário na Paris da segunda metade do século XIX, como se escritores. Ao contrário, são essas inquietudes que trabalham essa
Flaubert não tivesse mobilizado senão suas experiências enquanto geração de escritores mineiros que, ao escrever, ao transpô-las para o
escritor, como se as experiências de socialização vividas na infância, plano literário, em prosa e verso, esforça-se por libertar-se delas.
na adolescência, no universo escolar, no seio da família, nas lutas A este universo literário, que, a despeito de ser objeto de
políticas da época não tivessem nenhum papel na conformação do investimentos pessoais intensos e de lutas “de vida ou morte” entre
seu “projeto criador”. Mas Flaubert não nasceu “no campo literário”, os agentes nele inscritos, funciona como um espaço social
e sim no seio de uma família burguesa, no interior da qual ocupava fracamente institucionalizado e que “paga mal”, caracterizando-se
uma posição singular, de forma que não se pode reduzir sua praticamente, na maioria dos casos, como um empreendimento de
experiência social àquela vivida enquanto escritor. risco, Lahire chama de “jogo literário”. Com o conceito de “jogo
A esta imagem um tanto quanto formalista e abstrata do literário”, Lahire pretende dar conta de um universo que não possui
universo literário e dos escritores aí inscritos, minha hipótese, os meios econômicos necessários para converter todos os seus
inspirada no belo trabalho de Lahire sobre Franz Kafka, é a de que participantes em agentes em tempo integral – diferente do que ocorre
os escritores modernistas de Minas Gerais encaravam a sua produção em campos mais bem dotados institucional e economicamente, como
literária como uma maneira de lidar com um certo número de é o caso do campo acadêmico.

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
46
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

Em função, portanto, dessa situação específica do campo os escritores vivem grandes frustrações, obrigados a deixar
em estado de vigília suas disposições mais profundamente
literário, é preciso evitar sobretudo reduzir os escritores à condição constituídas, e a lidar com uma pluralidade problemática
de agentes permanentes do “campo literário”. A situação de dupla de investimentos, seus engajamentos literários,
paraliterários e extraliterários entram em concorrência e às
vida, o escritor alternando a prática literária com um ofício vezes mesmo em contradição. (LAHIRE, 2006, p. 11,
tradução minha)
extraliterário que lhe assegura a renda necessária para se dedicar à
literatura, é muito comum nesse universo tão pouco Assim, para dar conta dessa situação de “double vie”, faz-se
institucionalizado. necessário contextualizar e materializar os escritores, amiúde
No entanto, se o universo literário é, do ponto de vista tratados como “criadores desencarnados”. Isso implica examinar as
econômico, pouco profissionalizado e de remuneração incerta, ele condições sociais e econômicas dos escritores, suas práticas literárias
não deixa de ser tão absorvente quanto os outros universos sociais e extraliterárias e as condições materiais e temporais do trabalho de
tidos como mais sérios e recompensadores do ponto de vista escrita. Não se compreende as representações que os escritores
financeiro. Em virtude disso, fazem de sua própria atividade, nem as suas obras, se não levamos
em conta os diferentes aspectos de sua condição literária.
Os escritores são amiúde levados a efetuar um vai-e-vem
permanente e a dividir seu tempo entre o universo literário Nesse ponto, é preciso reconhecer que o conceito de campo
e o universo do seu “second métier”, sem falar das
circulações entre esses dois universos e o universo literário, de Pierre Bourdieu, é mais pertinente na análise dos
conjugal ou familiar. O escritor com “second métier” agentes aí inscritos que dispõem de condições econômicas e sociais
constitui um bom exemplo de pertencimento múltiplo; um
exemplo também particularmente interessante para refletir que lhes permitem viver a tempo pleno para (mas não da) a
sobre a divisão do trabalho e de funções em uma sociedade
altamente diferenciada cuja lógica não pode de forma
literatura, sendo Gustave Flaubert o modelo por excelência do
alguma resumir-se a uma fórmula do tipo: um lugar para escritor que vive de rendas e por isso pode viver integralmente para
cada um e cada um em seu lugar. (LAHIRE, 2006, p. 11,
tradução minha) a literatura. Mas, que fazer então com toda uma linhagem de
escritores – que inclui Balzac, Mallarmé, Kafka, Joyce, Faulkner,
Somente uma sociologia atenta às variações intraindividuais
Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade, e tantos outros –
de comportamentos, à pluralidade das disposições incorporadas e à
que desenvolveram uma atividade literária de altíssima qualidade
variedade de contextos de atualização dessas disposições, pode ser
mesmo sem fazer da literatura sua atividade principal? Seria
capaz de apreender as tensões e as estratégias dos indivíduos
razoável, então, analisar, como o faz Bernard Lahire (2006) em seu
submetidos a essas condições de pertenças múltiplas.
livro, o conjunto de agentes do universo literário, dos mais “puros”
Segundo Lahire,

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
47
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

4
aos mais “amadores”, a partir de suas condições reais de existência, ideologias. As origens intelectuais da Revolução
“Totalmente ao contrário da filosofia e o caráter de sua política podem ser melhor
alemã, que desce do céu à terra, aqui se do tempo dedicado a e do lugar ocupado pela literatura em suas compreendidos se descermos da Encyclopédie ao
eleva da terra ao céu. Quer dizer, não se
vidas. underground, lá onde homens como Brissot
parte daquilo que os homens dizem,
imaginam ou representam, tampouco dos produziam jornais e panfletos, cartazes e
homens pensados, imaginados e Para dar conta dessa situação de dupla vida, faz-se necessário caricaturas, canções, boatos e libelles. Aquelas
representados para, a partir daí, chegar aos coisas que transformavam intrigas pessoais, e
contextualizar e materializar os escritores da primeira geração rivalidades de facções, em combate ideológico
homens de carne e osso; parte-se dos
homens realmente ativos (...) Não é a modernista de Minas, amiúde tratados na crítica literária como pelo destino da França (DARNTON, 1987, p.
consciência que determina a vida, mas a 76).
vida que determina a consciência.” “criadores desencarnados”. Esse trabalho de contextualização
MARX, 2007, p. 94 Partindo, então, do conselho metodológico de Darnton, já
implica examinar as condições sociais e econômicas dos escritores,
enunciado por Marx n‟A ideologia alemã4, e das ponderações de
suas práticas literárias e extraliterárias e as condições materiais e
Christophe Charle e de Bernard Lahire, é preciso partir do terreno
temporais do trabalho de escrita. Somente ao termo desse trabalho
das condições sociais de existência dos escritores do grupo
de situá-los sociologicamente, as representações que os escritores
modernista mineiro, atento à dupla vida que eles levavam, em
mineiros fazem de sua própria atividade em suas obras ganham
constante zigue-zague entre os campos intelectual e político, para
inteligibilidade.
que se compreenda o que se passa no plano das representações,
Quanto a esse aspecto, a análise de Robert Darnton sobre a
imagens, identidades, presentes em seus escritos autobiográficos,
boêmia literária na França do século XVIII é exemplar. Esforçando-
memorialísticos.
se em fornecer o contexto social do ideário iluminista na França pré-
Os escritores modernistas de Minas também fizeram carreira
revolucionária, ele procura distinguir os “homens de carne e osso,
após a Revolução de 30, engajando-se nas lutas políticas e, mais
que precisavam sustentar a família, satisfazer ambições, buscar
especificamente, no processo de rotinização do modernismo dos
prazeres” da imagem social que eles visavam construir de si mesmos
anos 20, alçado a estética oficial. Nos anos 20 e 30, davam seus
e do seu grupo através dos seus escritos – autoimagem que certos
primeiros passos no universo literário belo-horizontino, centro
autores tomam por moeda corrente.
cultural periférico se comparado a capitais como Rio de Janeiro ou
Seus malogros e frustrações sob a velha ordem
serviram de medida para sua dedicação sob a São Paulo, por sua vez, situadas na periferia do campo intelectual e
nova, e a Revolução pode ser compreendida, sob artístico transnacional.
o ponto de vista destes homens, como carreira.
Estudar carreiras, método que parece antiquado e A reconstrução da trajetória dos escritores de campos
meramente biográfico, poderia oferecer útil
contrapartida ao estudo, mais abstrato, de ideias e literários periféricos, ou, no meu caso, da periferia da periferia, exige

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
48
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

que se preste atenção aos seus investimentos literários e dimensão literária de suas trajetórias mas também ao trabalho de
extraliterários no espaço social belo-horizontino, cujo baixo grau de construção institucional no qual eles estavam metidos.
diferenciação social e a fraca institucionalização das práticas
literárias e artísticas torna problemática a aplicação do modelo Retratos de escritores quando jovens
bourdiano de campo. Em seu artigo sobre o universo da produção
intelectual em Santiago del Estero nos anos 1920 e 1930, região Nesta última seção, analiso a imbricação, e as tensões daí
periférica do campo intelectual porteño, Ana Teresa Martínez resultantes, entre a atividade literária e a prestação de serviços
chegou a conclusões semelhantes. Uma análise em termos de políticos que marcou a trajetória da primeira geração de intelectuais
“campo intelectual” apresenta limitações para se pensar essas modernistas de Minas Gerais nos anos 1920 e 1930. As obras dos
formações sociais pouco diferenciadas, em que as esferas de escritores mais expressivos dessa geração de intelectuais – Carlos
atividade se interpenetram. Segundo Martínez, o modelo dos campos Drummond de Andrade (1902-1987), Emílio Guimarães Moura
de produção cultural à Bourdieu “no es automáticamente aplicable (1902-1971), João Alphonsus de Guimaraens (1901-1944) e Cyro
en cualquier espacio social en que existan agentes en pugna” Versiani dos Anjos (1906-1994) – possuem forte teor autobiográfico,
(MARTÍNEZ, 2006, p. 219). dando pistas sobre as inquietações de uma geração de letrados que
No caso do modernismo mineiro, onde a ausência de um teve de dividir-se entre as lides burocráticas e o exercício literário,
campo literário dotado de autonomia relativa, combinada a uma dupla vida que não era destituída de frustrações.
conjuntura política de franca concorrência entre as elites do estado, Meu objetivo, então, é mostrar que essas obras transpuseram
constrangiam a liberdade criativa dos escritores, levando-os a para o plano literário a experiência de uma geração de escritores
colocarem sua pluma a serviço da legitimação simbólica das mineiros que, situada numa região periférica do ponto de vista
pretensões dessas elites a que estavam ligados por laços familiares e econômico, encontrou na cultura um caminho para se inserir num
de amizade, as observações acima mostram-se bastante pertinentes. país em via de modernização e cuja atuação foi decisiva na
Nesse sentido, a situação específica dos modernistas mineiros estruturação do campo cultural nacional em processo de constituição
somente pode ser apreendida se relacionamos as representações e naquele período. Para atingir tal objetivo, examino a trajetória desses
imagens presentes em seus escritos autobiográficos às suas quatro escritores modernistas de Minas com vistas a compreender os
condições materiais de existência e às redes de relações no interior custos emocionais e sociais envolvidos na tensa conciliação entre
das quais eles estavam inseridos, concedendo atenção não somente à literatura e política.

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
49
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

Nos parágrafos seguintes, apresento de forma condensada a Silva Campos, Mário Casassanta e Milton
Campos. Era o chamado Grupo do Estrela – do
trajetória desse grupo de letrados ao longo dos anos 20 e 30, nome do café em que se reuniam. Dele fiz parte
esboçando a traços largos um retrato coletivo da primeira geração desde os primeiros momentos, assim como
vieram a completá-lo mais tarde, Ascânio Lopes,
modernista de Minas Gerais. Ciro dos Anjos, Dario de Almeida Magalhães,
Guilhermino Cesar e Luis Camilo de Oliveira
O grupo dos modernistas era formado por jovens vindos do Neto. A aglutinação de personalidades tão
interior do estado para iniciar seus estudos superiores na capital. A diferentes deve-se à amizade que os ligava
unanimemente a Alberto Campos, Carlos
maioria ingressou na Faculdade de Direito: Francisco Martins de Drummond de andrade, Emílio Moura e Milton
campos. Deles alguns já se tinham iniciado na
Almeida, João Alphonsus de Guimaraens, Aníbal Monteiro literatura mas os outros eram também rapazes
Machado, Gustavo Capanema, Milton Campos, Abgar Renault, preocupados com poesia, prosa, arte e filosofia.
(“Recado de uma geração”, A REVISTA, 1978, p.
Gabriel de Rezende Passos, Emílio Guimarães Moura, Cyro Versiani 1)
dos Anjos. Pedro da Silva Nava cursou Medicina e Carlos
Formavam uma espécie de boêmia literária, cujos arroubos de
Drummond de Andrade, Farmácia. Além do fato de serem todos
juventude eram tratados de maneira paternalista pela oligarquia, que
estudantes, havia outros traços comuns que concorreram para que
logo logo os acomodaria na burocracia estadual através de sinecuras
eles se aproximassem. Vinham quase todos de pequenas cidades de
e prebendas. Carlos Drummond de Andrade, considerado pelos
Minas, oriundos de ramos decadentes da oligarquia rural do estado.
outros membros, o líder do Grupo do Estrela, já contou, em suas
Havia também um interesse compartilhado pela literatura, pela arte e
confissões no rádio, como era o cotidiano do grupo:
pela política. Além disso, todos eles desempenhavam funções
Estudavam, trabalhavam em funções modestas:
modestas na burocracia e se dedicavam ao jornalismo. no escritório da estrada de ferro, o Abgar
Como testemunha Pedro Nava, um dos integrantes do Renault; na secretaria do Tribunal de Justiça, o
Mílton Campos; na Saúde Pública, o Nava; na
“núcleo duro” do grupo modernista mineiro: repartição das Finanças do Estado, o João
Alphonsus, lugares assim. À tarde passavam pela
Desde 1921 constituiu-se em Belo Horizonte Livraria Francisco Alves, na Rua da Bahia,
numeroso grupo de moços integrado pelos nomes assistindo à abertura dos caixotes de novidades
de Abgar Renault, Alberto Campos, Carlos francesas, que iam de Anatole France a Romain
Drummond de Andrade, Emílio Moura, Rolland, passando por Gourmont. Compravam a
Francisco Martins de Almeida, Gabriel de crédito o que lhes apetecia, e, à noite, papo em
Rezende Passos, Gustavo Capanema Filho, redor da mesinha de mármore do Café Estrela, na
Hamilton de Paula, Heitor Augusto de Souza, mesma sagrada rua intelectual de Minas Gerais,
João Alphonsus de Guimaraens, João Guimarães diante da cerveja glacée ou frappée
Alves, João Pinheiro Filho, Mário Álvares da

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
50
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

cuidadosamente verificada no grau de frigidez derivando daí “certa disposição dupla para a ousadia das inovações e
(ANDRADE, 2003, p. 1224-1225).
5
Trata-se da viagem empreendida a fidelidade (embora transformadora) ao passado literário.”
por Mário de Andrade, Oswald de A partir de 1924, com a visita dos modernistas de São Paulo a (CANDIDO, 2004, p. 14, grifos meus). No texto citado, Antonio
Andrade e seu filho, Tarsila do 5
Amaral e Olívia Penteado às Minas , iniciaria-se a amizade entre os integrantes dos dois grupos. Candido, buscando os traços distintivos do modernismo mineiro, faz
cidades históricas de Minas Gerais Num artigo de 1962, publicado no jornal carioca Correio da Manhã,
na Semana Santa de 1924, por menção à “curiosa modernidade mineira, feita com o sumo dos
ocasião da visita do poeta franco- Drummond, após declarar que os rapazes “dados às letras” da capital clássicos...” (CANDIDO, 2004, p. 15).
suíço Blaise Cendrars ao Brasil.
Nessa viagem, os modernistas de mineira não tomaram conhecimento da Semana de 22, conta que a Na correspondência de Mário de Andrade com o grupo
São Paulo passaram por Belo passagem da “caravana de modernistas de São Paulo” por Belo mineiro, o autor de Pauliceia Desvairada acusava o excesso de boa
Horizonte e conheceram os rapazes
do Grupo do Estrela. Horizonte em 1924 foi para ele e os outros membros do grupo uma educação no ar de Minas, o espírito mobiliado à francesa da
espécie de segunda semana de arte moderna, pois naquela ocasião mocidade literária mineira, que, ao fim e ao cabo, precisava
tiveram a oportunidade de conhecer Mário de Andrade: deseducar-se um pouco. O correspondente contumaz da Lopes
Mário foi para nós, mais do que a Semana, o Chaves explicava aos rapazes de Minas que era preciso dar uma
Tempo modernista, sua encarnação e
exemplificação mais direta e empolgante. O
alma ao Brasil, combater o pessimismo nutrido na literatura francesa
acontecimento intelectual mais relevante de tomando gosto pela vida e sabendo vivê-la:
minha vida, insisto em dizê-lo, foram as cartas
que recebi dele, anos a fio; pude testar-lhes a Apesar de todo o ceticismo, apesar de todo o
eficácia provocativa através da impressão que pessimismo e apesar de todo o século 19, seja
causaram, 30 anos depois, a uns poucos escritores ingênuo, seja bobo, mas acredite que um
jovens a quem mostrei (Apud SENNA, 1996, p. sacrifício é lindo. O natural da Mocidade é crer e
307). muitos moços não crêem. Que horror! Veja os
moços modernos da Alemanha, da Inglaterra, da
Os integrantes do “núcleo duro” do grupo modernista mineiro França, dos Estados Unidos, de toda a parte: eles
não fizeram viagens à Europa, como foi o caso de alguns dos crêem, Carlos, e talvez sem que o façam
conscientemente, se sacrificam. Nós temos que
integrantes do grupo paulista. Tampouco suas elites, com poucas dar ao Brasil o que ele não tem e por isso até
agora não viveu, nós temos que dar uma alma ao
exceções. Morando numa capital provinciana, “fez parte da Brasil e para isso todo sacrifício é grandioso, é
formação deles algum atraso de gosto, misturado ao interesse ativo sublime (ANDRADE, 2002, p. 51).

pela novidade” (CANDIDO, 2004, p. 14). Assim, liam com igual Para os jovens letrados de Minas, todos na casa dos vinte
entusiasmo Anatole France, Remy de Gourmont e as obras das anos, dotados de sensibilidade e de um pouco de insastifação,
vanguardas europeias que por ventura lhes caíam nas mãos, educados “pelo claro gênio francês” de sabor oitocentista ou fin-de-

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
51
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

siècle, as cartas de Mário de Andrade, “torpedos de pontaria p. 238). No início dos anos 1920, os integrantes dessa primeira
infalível”, lembra Drummond, ficariam constituindo o geração modernista nutriam certa hostilidade pelo monopólio
acontecimento mais formidável da vida intelectual do grupo. político do Partido Republicano Mineiro, cuja comissão executiva
Assim, nos primeiros anos da década de 1920, os “rapazes era apelidada de “Tarasca”.
dados às letras” de Minas eram estudantes e modestos funcionários E, foi no auge da dominação perremista que o pequeno grupo
das repartições públicas da capital mineira, formando um grupo de intelectuais modernistas começou a introduzir, meio à sorrelfa, no
boêmio que frequentava a Livraria Francisco Alves para se inteirar jornal governista Diário de Minas, a “pimenta modernista”. Cyro dos
das “novidades francesas” e se reunia à noite, após o expediente, nos Anjos, em suas memórias, explicou que, nos anos 1920, o
cafés da cidade para discutir as últimas leituras e mostrar os últimos modernismo literário praticado em Belo Horizonte “fez-se em
versos escritos. Nesse período, constituíam uma geração de rapazes surdina, pois a ordem mineira, pesada e conservadora, não apreciava
bem-nascidos – não havia moças no grupo – de famílias importantes badernas, ainda que literárias” (ANJOS, 2010, p. 545). A classe
do interior, alguns deles pertencentes ao seleto grupo das “famílias dirigente, reunida em torno do PRM, apesar de avessa a tomadas de
governamentais de Minas”, que vivia “represada em suas aspirações posição mais explícitas, “não trepidaria, contudo, e de imediato em
de influência e poder”, olhando “inevitavelmente com rancor e decidir-se pelo verso parnasiano, disciplinado, torneado, cadenciado,
desesperança para as oportunidades que os velhos oligarcas do avesso a afoitezas e novidades” (Op. cit., p. 545).
palácio da Liberdade lhes negavam” (BOMENY; COSTA; Nas memórias e textos autobiográficos dos integrantes do
SCHWARTZMAN, 2000, p. 46).1 grupo ressuma certo ressentimento, algo como orgulho ferido ante a
Nessa fase boêmia, a dimensão antiburguesa da estética indiferença dos mandachuvas do PRM:
modernista caiu como uma luva aos propósitos do grupo do Estrela Além de confusamente tratados de futuristas,
de escandalizar a Tradicional Família Mineira, que lhes sonegava éramo-lo também de nefelibatas – expressão
exumada dos velhos insultos aos simbolistas e
suas filhas e os postos cobiçados. Pelas mãos de Mário de Andrade e servindo agora para nós que éramos os que
andávamos com os pés fora do chão em vez de
de um pequeno círculo de letrados de vocação mais cosmopolita,
casqueá-lo solidamente a quatro patas, da praça
como era o caso de Aníbal Monteiro Machado, os letrados de Minas da Liberdade ao Bar do Ponto (...) Pois futuristas
e nefelibatas não éramos considerados melhor
foram começando a “apartar a Poesia da merda rala que o burguês que os habitués das tascas, os frequentadores dos
considera poético e que é justamente o seu contrário” (NAVA, 2013, cabarés, a ralé... (NAVA, 2013, p. 241).

1
A expressão “famílias governamentais de Minas” é de Cid Rebelo Horta.

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
52
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

A situação dos modernistas de Minas mudaria ainda nos anos Com a fundação de Belo Horizonte, já em 1898 a Faculdade
20. No governo de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada (1926-1930), Livre de Direito tranferia-se para a nova capital. Nas duas primeiras
a maioria dos integrantes do grupo do Estrela viria a ocupar postos décadas do século XX, seriam criadas ainda a Escola de Odontologia
na burocracia estadual. Tributária de um programa de modernização e Farmácia, a Faculdade de Medicina e a Escola de Engenharia. Em
conservadora, a administração Antônio Carlos foi responsável pelas 1902, a fração ilustrada das elites mineiras reunia-se em Belo
reformas no ensino primário e normal e pela criação da Universidade Horizonte para discutir a criação de uma Faculdade Livre de
de Minas Gerais. Medicina. Aurélio Pires, um dos intelectuais envolvidos nessa
Desde o início do século, as elites ilustradas de Minas Gerais, investida, pronunciou um discurso que fornece pistas importantes
baseadas num diagnóstico pessimista acerca do atraso econômico e sobre o projeto intelectual que animava as elites do estado:
cultural da região, vinham tomando iniciativas no sentido da criação Senhores, desde longa data, a pátria mineira
de instituições que promovessem o desenvolvimento regional e acaricia uma aspiração sublime: – a de fechar o
círculo dentro do qual se encerram os grandes
estancassem a sangria de recursos e talentos que migravam para problemas do saber humano. (...) Para
satisfazerem, em parte, a essa necessidade
outros estados, sobretudo Rio de Janeiro e São Paulo, em busca de
incoercível, muitíssimos dos nossos patrícios têm
melhores oportunidades. A própria fundação de Belo Horizonte, no corrido a regiões inóspitas e ingratas; e dezenas –
que digo eu! – e centenas deles lá têm ficado,
final do século XIX, pode ser interpretada como uma tentativa de devorados pelo Minotauro terrível, cujo hálito
criar um novo centro político, econômico e cultural que colocasse pestífero nos tem crestado tantas esperanças em
flor, cujos pés impiedoso têm esmagado talentos
Minas na trilha do progresso e da civilização. tão robustos, promessas tão bem fundadas! (...) É
tempo de erguermos bem alto o nosso grito de
No âmbito da cultura, esse esforço institucional traduziu-se angústia; de atroarmos, com o rumor das grandes
na criação de instituições de ensino e de associações culturais. Ainda águas, todo este vasto território mineiro. E que
este grito repercuta por todas estas quebradas, e
em 1892, antes portanto da criação de Belo Horizonte (1897), era que esses clamores abalem todos os corações,
dizendo-lhes, em nome dos que se foram e em
fundada em Ouro Preto, então capital do estado, a Faculdade Livre nome dos que hão de vir, a grande, a inadiável, a
de Direito de Minas Gerais. Nessa e nas iniciativas subsequentes, os imperiosa necessidade que sentimos de uma
Faculdade de Medicina em nosso Estado!
argumentos invocados pelas elites ilustradas de Minas diziam (PIRES, 1939, p. 239-240)
respeito à “conquista da emancipação intelectual e do progresso da
E o orador terminava seu discurso com as palavras de ordem
região.” (DIAS, 1997, p. 33)
que estiveram por trás de todo esse esforço institucional no campo da

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
53
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

cultura: “VIVA A AUTONOMIA INTELECTUAL DO ESTADO intelectuais e homens do poder público. Essas relações infiltravam-se
DE MINAS GERAIS!!” (PIRES, 1939, p. 241) nos ares de Belo Horizonte da época” (ARRUDA, 2001, p. 287).
Os letrados mineiros participariam do processo de Para muitos deles, era o início da carreira burocrática e da
implementação da reforma de ensino conduzida por Francisco dupla vida que levariam ao longo das suas trajetórias, conciliando a
Campos, então Secretário do Interior (à época encarregado das vida na repartição com as demandas da atividade literária. Em 1941,
questões relacionadas ao ensino público) e Mário Casasanta. A numa entrevista ao jornal A Gazeta, Drummond, após fazer menção
criação da Universidade de Minas Gerais (1927) era o ponto às três coletâneas de poemas publicadas até o momento, fala:
culminante desse programa de reformas. Pedro Nava, Abgar Renault, Mas a grande produção, aquela que será a suma e
Mário Casassanta, entre outros modernistas de Minas, tomaram parte a explicação da minha vida, consiste nos milhares
de ofícios, cartas, cartões, papeletas, ordens de
ativa nesse empreendimento institucional. (DIAS, 1984, p. 103-111) serviço, despachos e telegramas, com que, desde
1929, venho inundando os arquivos das
No entanto, o alcance dessas reformas empreendidas no
repartições onde tenho trabalhado... Eis aí o traço
governo Antônio Carlos seria pequeno, uma vez que, como já fundamental da minha biografia. Um bom
resumo estaria nas seguintes palavras: “Este foi
mostrou Maria Arminda do Nascimento Arruda, “não existia em burocrata”. (...) Da burocracia tenho vivido e ela
Minas Gerais quer uma elite intelectual com grau de autonomia para nunca me impediu de ser eu mesmo, em grande
parte, é claro, pela profunda humanidade dos
realçar suas aspirações culturais (...), quer uma sociedade com um chefes que tenho servido, entre eles Mário
Casasanta e Gustavo Capanema, dois intelectuais
grau de complexidade para criar demandas profissionais novas...” típicos que não perderam na administração
(ARRUDA, 2001, p. 286). nenhuma das qualidades exemplares que os
distinguiam quando simples estudantes. Com o
Se não teve a amplitude e o fôlego das reformas educacionais primeiro trabalhei dois anos. Com o segundo
trabalho há dez anos e sua vida é para mim uma
do decênio seguinte, nem a envergadura social e institucional do lição comovedora de simplicidade, pureza,
projeto que resultou na criação da Universidade de São Paulo nos dignidade sem afetação, trabalho sem ênfase e
sem esmorecimento e total esquecimento de si
anos 30, teve, no entanto, efeitos duradouros na organização da vida mesmo (Apud RIBEIRO, 2011, p. 28-29).
intelectual em Minas. A participação dos modernistas mineiros nas
Assim, abrigados à sombra do governo estadual e
reformas do ensino nos anos 20 reforçou uma relação que começara
estimulados pelo grupo modernista de São Paulo, sobretudo por
a se esboçar desde fins do Império e que deixaria vincos profundos
Mário de Andrade, os jovens intelectuais do grupo modernista de
na vida intelectual de Minas, qual seja, “o trânsito contínuo entre
Belo Horizonte buscaram combinar as idéias estéticas do
modernismo que lhes chegavam ao conhecimento com o

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
54
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

tradicionalismo político dos próceres do PRM. Essa mescla de os escritores mineiros tiveram de se haver, construindo uma
modernidade estética e conservadorismo político esteve presente nas trajetória diferenciada daquela do grupo modernista de São Paulo
páginas do Diário de Minas; nos três números da revista que (MICELI, 2004, p. 75).
publicaram em 1925, na tipografia do jornal governista; e acabou por Assim, ainda nos anos 20, mas sobretudo nos anos 30 e 40, os
marcar toda a obra dos que conseguiram engatar uma carreira modernistas seguiriam abrindo caminho, conquistando terreno à
literária ao lado das atribuições burocráticas. velha geração literária e ocupando postos na administração estadual
Nos anos 30 e 40, os letrados modernistas de Minas seriam e federal. Seu relacionamento com as classes dirigentes
absorvidos pelo processo de modernização conservadora em curso e caracterizava-se por certa ambivalência – se, de um lado, estavam a
acabaram ou abandonando as letras ou praticando-as de uma forma elas ligados por laços de amizade e familiares, e por certo sentimento
esporádica. de dívida para com seus protetores; de outro, suas ligações com as

Abertas as comportas do sistema político com a elites políticas eram fonte de constrangimentos no campo literário
Revolução de 30, estes jovens, em sua maioria, em formação naquele período.
lançaram-se com todas as forças à vida política,
sem trair, mas na realidade cumprindo sua Otto Lara Resende, o grande cronista mineiro da geração
vocação de intelectuais. Poucos, como os poetas
seguinte, captou, a meu ver, muito bem o destino social desse grupo
Emílio Moura e Drummond, teriam o talento e as
condições pessoais adequadas para fazerem da de letrados mineiros:
literatura não somente um estilo, um adorno ou
um traço a mais de sua cultura, mas sua forma A rapaziada divertia-se, divertia-se consigo
mais alta de realização pessoal. Para os demais, a mesma e divertia-se com os outros, sobretudo
política foi o caminho (BOMENY, COSTA & com os mais velhos, inclusive com os políticos
SCHWARTZMAN, 2000, p. 46). que, com a conhecida astúcia mineira, não
demoraram a pescar os estróinas para a vida de
No entanto, uma análise do modernismo mineiro não pode se funcionários públicos, deles fazendo excelentes
oficiais-de-gabinete, austeros pais de família e
contentar em atribuir ao “talento” e às “condições pessoais”, de resto
conspícuos servidores da ordem vigente (LARA
inegáveis, o investimento dos escritores modernistas de Minas numa RESENDE, 1994, p. 34).

“carreira literária”, com todos os custos emocionais e sociais a ela Esta breve exposição traz, in nuce, as questões históricas e
associados. Antes, como já apontou Sérgio Miceli, a singularidade sociológicas envolvidas na pesquisa do significado da atuação
do modernismo mineiro deve ser explicada em função da “cadeia literária e política da primeira geração modernista de Minas: o da
regional de circunstâncias institucionais e políticas”, em função dos difícil e lenta formação de um campo literário em Minas Gerais; a
laços de lealdade a grupos dirigentes com perfis distintos, com a qual impossibilidade de viver da literatura, dos lucros auferidos com a

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
55
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

publicação e venda de seus escritos, a pressão social exercida no BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação.
Campinas, SP: Papirus, 2011.
sentido de tratar a literatura como um lazer cultivado, atividade
recreativa, um jogo sofisticado e prazeroso mas sem muita BOURDIEU, Pierre. Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004.
importância e praticado de um modo economicamente
BOURDIEU, Pierre. As Regras da Arte. São Paulo: Companhia das
desinteressado, sem dele esperar retornos materiais; as relações Letras, 1996
ambíguas e problemáticas entre o campo intelectual e o campo do
CANDIDO, Antonio. “Drummond prosador”. In: Recortes. Rio de
poder – eis a teia de constrições sociais no interior das quais várias Janeiro: Ouro sobre Azul, 2004
gerações de escritores mineiros buscaram se movimentar.
DARNTON, Robert. Boemia literária e revolução: o submundo das
letras no Antigo Regime. São Paulo: Companhia das Letras, 1987
Referências Bibliográficas DIAS, Fernando Correia. O Movimento Modernista em Minas.
Brasília: Editora de Brasília, 1971

ANDRADE, Carlos Drummond de. “Para os céticos”. In: A Revista, DIAS, Fernando Correia. Líricos & Profetas. Temas da Vida
edição fac-similar. São Paulo: Metal Leve, 1978. Intelectual. Brasília: Thesaurus Ed., 1984

ANDRADE, Carlos Drummond de. Carlos e Mário: DIAS, Fernando Correia. Universidade Federal de Minas Gerais:
correspondência entre Carlos Drummond de Andrade – inédita – e projeto intelectual e político. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1997
Mário de Andrade: 1924-1945. Rio de Janeiro: Bem-Te-Vi, 2002
DURKHEIM, Émile. A divisão do trabalho social. Lisboa: Editorial
ANDRADE, Carlos Drummond de. Confissões de Minas: Carlos Presença, 1984, v.II
Drummond de Andrade. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
LAHIRE, Bernard. La Condition littéraire. La double vie des
ANJOS, Cyro dos. A menina do sobrado. São Paulo: Globo, 2010 écrivains. La Découverte, Laboratoire des sciences sociales, Paris,
2006.
ARRUDA, Maria Arminda do Nascimento. “A Modernidade
Possível: Cientistas e Ciências Sociais em Minas Gerais”. In: LAHIRE, Bernard. Franz Kafka. Éléments pour une théorie de la
História das Ciências Sociais no Brasil, vol. 1/ Sérgio Miceli (org.). création littéraire. La Découverte, Laboratoire des sciences sociales,
São Paulo: Editora Sumaré, 2001 Paris, 2010.

ARRUDA, Maria Arminda do Nascimento. “Modernismo e LARA RESENDE, Otto. O príncipe e o sabiá e outros perfis. São
regionalismo no Brasil: entre inovação e tradição”. Tempo Social, Paulo: Companhia das Letras: Instituto Moreira Salles, 1994.
São Paulo, v. 23, n. 2, nov. 2011
MICELI, Sérgio. “Sociologia do modernismo mineiro”. In: Teoria &
sociedade (Revista dos Departamentos de Ciência Política e

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
56
JOÃO IVO DUARTE GUIMARÃES

Sociologia e Antropologia – UFMG), número especial. Belo


Horizonte, 2004. PIRES, Aurélio. Homens e fatos do meu tempo. São Paulo:
Companhia Editora Nacional, 1939 (Coleção Brasiliana, nº 146).
MARQUES, Ivan. Cenas de um modernismo de província:
Drummond e outros rapazes de Belo Horizonte. São Paulo: Ed. 34, PONTES, Heloísa. Destinos mistos: os críticos do Grupo Clima em
2011 São Paulo (1940-1968). São Paulo: Companhia das Letras, 1998

MARTÍNEZ, Ana Teresa. “Entre el „Notable‟ y el „Intelectual‟. Las RIBEIRO, Larissa Pinho Alves. Carlos Drummond de Andrade.
Virtualidades del Modelo de Campo para Analizar una Sociedad en Coleção Encontros. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2011
Transformación (Santiago del Estero 1920-1930)”, Cuadernos
FHyCS-UNJu, n° 30, 2006, p. 213-231 SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena Maria Bousquet;
COSTA, Vanda Maria Ribeiro. Tempos de Capanema. São Paulo:
MARX, Karl. A ideologia alemã: crítica da mais recente filosofia Paz e Terra: Fundação Getúlio Vargas, 2000
alemã em seus representantes Feuerbach, B. Bauer e Stirner, e do
socialismo alemão em seus diferentes profetas (1845-1846). Karl SENNA, Homero. República das Letras: entrevistas com vinte
Marx & Friedrich Engels. São Paulo: Boitempo, 2007 grandes escritores brasileiros. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
1996.
NAVA, Pedro. “Recado de uma geração”. In: A Revista, edição fac-
similar. São Paulo: Metal Leve, 1978 WEBER, Max. “Reflexão intermediária – Teoria dos níveis e
direções da rejeição religiosa do mundo”. In: BOTELHO, André
NAVA, Pedro. Beira-mar. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. (org.). Essencial sociologia. São Paulo: Penguin Classics Companhia
das Letras, 2013.
PIERUCCI, Antônio Flávio. O desencantamento do mundo: todos os
passos do conceito em Max Weber. São Paulo: USP, Curso de Pós-
Graduação em Sociologia: Ed. 34, 2003.

Dossiê Literatura e Memória


Arquivos do CMD, Volume 3 N.2. Ago/Dez 2015
57

Você também pode gostar