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― Ben Jon!

É a segunda vez que meu pai grita do primeiro andar. Desisto de lidar
com aquela última luz e sopro o ar dos pulmões para fora. Ele me deu uma
tarefa e estou tentando cumprir. Na realidade, estou tentando me distrair,
enganando a mim mesmo para que eu esqueça o quanto estou nervoso por
causa do dia de Ação de Graças com os Scott. Com ela.
― Pelo amor de Deus, Ben Jon!
― O que é? ― Grito de volta, esfregando os cabelos com força e soltando
a luz roxa no chão. ― Estou tentando ajustar os feixes!
Estou prestes a sair do meu quarto e irromper pelo corredor no meu
mais ensaiado surto de quem não gosta de ser interrompido. Mas a voz que
entra pela porta não é a do meu pai. É a de May Rose Scott.
― Pelo amor de Deus, Ben Jon. ― Ela repete, cruzando os braços e
encostando-se no batente. ― Por que não responde o seu pai? Ele estava me
anunciando!
Quando fala isso, May Rose abre os braços e sorri, erguendo o queixo
de maneira petulante. O que, merda, me faz sorrir feito um babaca e ela sabe
que estou parecendo um cara prestes a babar por ela porque eu tenho feito
isso por malditos, ah, ok, eu não sei quanto anos foram. Desde que nos vimos,
talvez. Quando eu ainda era um garotinho.
― Não é hoje o dia de Ação de Graças, é? ― Sim, eu digo isso porque
estou completamente nervoso.
― Não.
May Rose acha graça. Ela sabe quando está me controlando. Entendam,
May Rose Scott é uma sacana. Ela sabe, internamente, o que faz comigo. Ela
finge que não, mas eu vejo como ela fica satisfeita em me deixar inibido.
Porque Ben Jon Bullock nunca fica inibido. A não ser quando estou com ela.
― O que você está fazendo?
― Ah! ― Aponto para as luzes no chão. ― Só ajustando os feixes de LED
dessas luzes. Meu pai tem uma encomenda. Alguma reforma em limusine.
Ok, Bullock. É só uma maldita garota. Aja como você. É o que eu faço.
Ofereço passagem para May Rose e pronto. Eu a peguei. Eu gosto desse nosso
jogo. De quando consigo virá-lo. Porque às vezes eu estou nas mãos dela, mas
eu sempre dou o meu jeito de deixá-la assustada. O que é bom. Porque eu me
sinto o leão. E ela a gazela. Mas não tão bom se ela fugir. E ela não foge.
May Rose Cruza os braços de novo e se aproxima, analisando todas as
luzes espalhadas pelo chão do meu quarto. Falta um dia para o jantar de Ação
de Graças. Nós já meio que nos beijamos centenas de vezes e eu ainda me
pergunto se ela vai correr se eu tocar nela. Mas o cheiro dela é tão bom e
irresistível. Alguma coisa com rosas e frutas. Então vale a pena a tentativa.
Quando me aproximo para abraçá-la, May Rose se vira num átimo e se
choca comigo, socando a lateral esquerda do meu corpo. Solto um som de dor
contido.
― Machucou? Desculpa... ― Ela arregala os olhos. ― Ah, qual é,
Bullock? Você aguenta pancadas piores com os Tornados. E foi sem querer...
― Não, é que... ― Então levanto a barra da camiseta e mostro a ela o
enorme hematoma se espalhando como um buraco negro pela minha barriga.
― Coisas do jogo.
― Oh! ― A expressão dela me causa uma reviravolta interna. Porque
não sei se ela está com pena do machucado ou impressionada com o bom
trabalho que tenho feito na musculação. As duas opções inflam meu ego, o que
me faz conter um sorriso. Ela finalmente diz: ― Me desculpa.
Os dedos dela pousam ali e é como se eles estivessem entrando com
muita força nos meus pulmões porque paro de respirar. May Rose está bem
perto e totalmente concentrada no estrago que Brian Finn fez em mim no
último treino.
Mas tudo que eu consigo pensar é que preciso beijá-la imediatamente
antes que comece a pensar mais coisas que não devo pensar. Quando ela ergue
o queixo para me perguntar algo, seguro o rosto dela com as duas mãos e a
beijo. Os lábios dela estão frios, úmidos e doces. Como uma cereja em cima de
um sorvete. No momento em que May Rose entreabre os lábios e minha língua
passa entre seus dentes, os dedos dela sobem sem querer com a minha blusa.
E aí já era, porque eu estou começando a pensar no que não devo pensar.
E, sim, meu corpo está respondendo a isso de forma imediata porque
nosso beijo acelera. Ela vacila para trás, me obrigando a abraçá-la com força.
Seus seios macios se chocam contra meu peito e, puta merda, estou xingando
em pensamentos enquanto beijo May Rose porque, puta merda de novo, os
seres humanos nunca deveriam ter inventado as roupas. Ela arfa, quando viro
o rosto de lado para tocar o céu de sua boca com a ponta da minha língua. Sua
língua percorre a parte interna da minha bochecha. Estou apertando os dedos
contra as costas dela tão forte quanto o meu coração está batendo. E não é só
ele que começa a ficar agitado. Meu corpo todo está rígido. Estou falando no
total.
Só estou esperando May se afastar e ficar assustada por me deixar
excitado tão rápido, mas tudo que ela faz é enfiar os dedos nos meios dos meus
cabelos, deitando a cabeça de lado e gemendo quando sua língua desliza na
minha. Deixo alguns sons primais escaparem, a mão escorregando pela curva
do quadril dela, a respiração cada vez mais espaçada. May Rose não consegue
parar de me beijar e sorrio sem querer. Ela parece gostar, porque procura
minha língua de volta, erguendo o corpo na ponta dos pés. Antes de deixá-la
pegar a minha língua de novo, mordo seu lábio inferior e o arrasto devagar.
Isso a desperta.
Ela puxa a cabeça para trás, respirando com dificuldade e escorregando
as mãos para o meu peito.
― Isso não vai acontecer, ok? ― É tudo que ela diz. Está nervosa. Mas
seus olhos estão acesos. Aliás, não só os seus olhos, porque eu consigo ver os
seus mamilos quando olho para baixo e sinto a minha cueca ficar mais
apertada. ― Benjamin!
May Rose segura o meu queixo com força e empurra minha cabeça,
forçando-me a olhar para meu teto sem graça.
― Ah! ― Solto um grunhido, dando um passo para trás. ― Que fique
claro que a culpa é toda sua.
May Rose ri e encolhe o ombro como se eu houvesse dito que ela era
responsável por ganhar o prêmio de maior gostosa da década. Mas ela é
mesmo. Quero dizer, pelo que consegui ver e sentir. Porque ela é um completo
mistério para mim além dos limites de todas aquelas roupas dos anos 80.
― Tá bom. ― Ela joga os cabelos desgrenhados para trás. Sua boca está
vermelha e inchada e isso faz com que seus olhos fiquem com um tom de verde
ainda mais intenso. ― Então vamos continuar trabalhando nisso. Nas luzes.
― Tá bom.
É melhor, porque eu sei que não vai rolar nada. Meu pai está no
primeiro andar. E o pai dela está na casa ao lado. Eu sou um jovem respeitável,
apesar de tudo. É o legado da minha mãe e, apesar do meu pênis mal criado
querer o contrário, eu sou compreensivo e educado com garotas virgens.
Principalmente com a garota pelo qual estou apaixonado.
― Por que está rindo? ― May quebra o silêncio.
― Estou? ― Ergo os dedos até os lábios enquanto me abaixo pegando
outro feixe de luz. ― É, parece que sim. Parece que também é culpa sua.
― Se eu ajudar você com isso eu passo da condição de culpada para
perdoada?
Fecho um dos olhos, fingindo pensar. Então encaixo o último feixe de
LED e balanço a cabeça, fazendo que não.
― Porque eu já dei um jeito nas luzes. Você vai ter que se redimir com
outra coisa.
― Que jeito? ― May Rose olha para minhas paredes repleta de
penduricalhos coloridos unidos por fios elétricos e continua sem entender. ―
Não aconteceu nada!
Não consigo evitar rir dela. May Rose é tão nerd na Quirky, mas o
cérebro dela trabalha tanto nas complexidades que ela não percebe a coisa
mais simples de todas.
― Eu vou mostrar a você! ― Ergo o dedo, impulsionando o corpo para
cima e apagando a luz do quarto. ― Se prepara.
Assim que ligo o conjunto de luzes na tomada, tenho um lampejo de
orgulho do meu próprio trabalho. Meu pai havia me entregado um
emaranhado de fios e lâmpadas. Eu o transformei em lanternas de todas as
cores, que fazem reflexo por todo o meu quarto.
May Rose ri, soltando um suspiro, me lembrando de sua presença. Ergo
os olhos para ela e May Rose está sorrindo, de lábios fechados, admirando o
arco-íris dançando contra seu moletom branco, a calça jeans justa, os tênis
claros. Ela está linda. Como é que pode usar um pijama e ficar gata?
― Você calculou? ― Ela gira. ― Onde cada feixe ia ficar? Para dar o
efeito de arco-íris, quero dizer.
Ah, não. Calcular não era o meu forte. Só havia colocado uma luz do
lado da outra seguindo o padrão de cores do arco-íris.
― Claro. ― Pisco, arrastando a boca e fazendo um barulho ao puxar o
ar com os dentes. ― Cada centímetro.
― Você é um gênio da física, Benjamin?
― Você não sabia?
May Rose morde o lábio inferior, balançando a cabeça negativamente,
erguendo o corpo na ponta dos pés algumas vezes. Atravesso o quarto,
puxando-a contra mim assim que a alcanço. Não é difícil levantá-la do chão, o
que a faz rir ao enlaçar o meu pescoço. Todo seu cabelo cai sobre mim,
trazendo seu perfume, aquele de flores e frutas. Giro com ela e jogo-a sobre
minha cama. O corpo dela dá um pequeno salto ao cair sobre o colchão, macio,
mas ela ri, abrindo as mãos contra o meu peito.
― Não...
― Eu me desequilibrei!
Menti, me inclinando sobre ela. As mãos dela cedem, me deixando
descer. Mas assim que meu rosto chega perto do dela, seus dedos se fecham
em torno da minha blusa e seu pé firma o meu estômago. É um golpe perfeito
quando May Rose me joga para o lado. Caio como um tronco no colchão,
olhando para o teto iluminado.
― É Krav Maga. ― Ela ri, sentando-se. Sorrio, fitando as costas dela e
empurrando seu moletom para cima. May Rose o puxa, curvando-se para
frente e arrancando a blusa fofa. Por baixo há uma regata preta bem colada.
Engulo em seco, revirando os olhos.
― Se não vai tirar o resto das roupas é melhor não tirar nenhuma. ―
Estou com calor! ― Ela protesta com ênfase no que está sentindo, deitando-se
de novo ao meu lado. ― Acho que são todas essas luzes.
― São. É claro que sim. ― Finjo concordar.
― Ben Jon. ― Espero, ainda encarando o teto. May Rose se equilibra no
antebraço e se inclina sobre mim. Entreabro os lábios, respirando pelo nariz e
inalando seu perfume devagar. Ela sorri quando toco seu rosto, encaixando os
dedos na base de sua mandíbula, deixando o meu polegar afagar sua bochecha.
― Nós poderíamos nos beijar sem pensar em fazer outra coisa?
Meu rosto empurra um sorriso para fora por causa da inocência dela.
Claro que eu quero transar com May Rose Scott. Eu penso muito no assunto,
inclusive. Mas não sou um maníaco desenfreado. Assinto, empurrando o rosto
contra o dela e tocando seus lábios.
Dessa vez, eles estão quentes. May pressiona a boca contra a minha bem
devagar. Umedeço seus lábios, trazendo-os comigo assim que coloco a cabeça
no travesseiro. Ela se afunda um pouco mais nos meus braços, deixando a
língua deslizar pela minha. Empurro a mão pelo seu rosto, segurando seus
cabelos e afagando o seu braço com a outra mão. Tudo no nosso beijo parece
inocente. Mas ele começa a me excitar mais do que eu estou planejando.
― May. ― Sussurro, esquivando o rosto para o lado. ― Diga coisas
fofinhas.
― Por que? ― Seu riso é maravilhoso quando diz isso.
― Porque assim eu serei fofinho.
― Ok. ― Ela se endireita, deitando o peito sobre o meu, acariciando meu
cabelo com uma das mãos e afagando meu rosto com a outra. ― Minha mãe
vomitou quatro bolinhos azuis da tia Jojo hoje.
Gargalho, segurando-a pelas costas para que ela não escorregue.
― Isso é o seu conceito de fofinho?
― Não sei. Estou nervosa. ― May Rose confessa.
― Eu também. ― Sussurro.
Eu também estou. Quero deixá-la feliz. Mesmo que eu esteja me
esforçando muito para controlar os meus ânimos.
― Ok. ― Suspiro. ― Minha vez.
― Tá. ― May Rose apoia o queixo no meu peito e ergue os olhos.
― Acho fofinho quando você fica dando pulinhos de felicidade. ― Ela
sorri. Por causa das luzes, não consigo ver seu rosto ficar vermelho. Mas eu sei
que está pelo modo como suas bochechas se contraem. ― É como se você não
tivesse perdido a sua verdadeira essência.
― Infantil?
― Não. Ah, sei lá. Não é infantil. É só você. As garotas elas ficam
fingindo ser muito maduras e duronas. Você faz isso também.
― Não mesmo! ― Ela ergue a cabeça.
― Faz! ― Aperto-a um pouco mais contra mim, tomando consciência
do quanto ela se encaixa bem sob o meu corpo. ― Mas aí você se esquece e dá
esses pulinhos.
Acho que consigo deixá-la feliz, porque May Rose me abraça tão forte
que não sei qual foi a última vez que ela me abraçou daquele jeito. Talvez no
dia do aniversário da minha mãe. Talvez no dia em que ela escolheu a mim e
não ao Hawkins. Mas algo é diferente naquele abraço. Porque daquela vez, ela
está feliz.
Viro-me de lado com cuidado, deitando-a no colchão. Ela me olha por
alguns segundos em silêncio e eu juro, pela minha mãe, que vou fazer o
possível para deixá-la feliz. Até outro dia todo o meu propósito era fazer May
Rose entender que eu gostava dela, mesmo sabendo que ela poderia não
corresponder. E agora, todo o meu pensamento estava voltado para fazer
aquela garota feliz. Porque quando ela fica feliz, eu estou feliz.
― O que foi? ― Ela sussurra, parecendo tímida.
― Só gosto de te olhar com essas cores.
― I see your true colors shining through.
E no mesmo momento em que ela está cantando, eu estou beijando May
Rose novamente. Lentamente. Sentindo a língua espalhar estímulos nervosos
pelo meu corpo. Deixando meu coração esmagar minha traqueia. Amando
May Rose Scott. Uma das mãos dela escorrega para o bolso de trás da minha
calça e puxa o meu celular. Afasto nossos lábios, ouvindo um gemido de
reprovação dela. Isso me faz sorrir. May me entrega o aparelho.
― A senha, senhor.
Digito, entregando o aparelho a ela novamente. Não tenho ideia do que
ela planeja, então May Rose ergue o braço, com a câmera direcionada para nós
e sorri. Mas antes que eu possa sorrir para a nossa selfie, a boca dela toca a
minha novamente e estamos nos beijando de novo, de olhos fechados, rostos
deitados no travesseiro, respirações entrecortadas.
― Aqui. ― May Rose se afasta, me mostrando a foto. ― A foto do
momento em que você me tirou da condição de culpada porque viu as cores
em mim.
― Ok. ― Seguro o telefone, admirando a foto. ― Hora do mundo saber
que suas cores verdadeiras são lindas.
May Rose apenas me observa, um sorriso tímido brotando nos lábios.
Apesar de odiar exposições públicas, ela não protesta quando posto a foto no
meu Instagram. Sua mão desliza pelo meu peito e acha o meu coração,
deslizando-o para frente e para trás sobre a pele. Ele bate com força em
resposta. Eu até poderia ter o dom de conseguir ver as verdadeiras cores de
May Rose Scott. Mas é ela quem tem meu coração nas mãos.

Pricilla Caixeta

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