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O mundo não está nas mãos de uma força impessoal. O mundo está nas mãos
de um Deus que trabalha. Quando os fariseus recriminaram Jesus por ter curado
no Sábado, Jesus afirmou que o sétimo dia não significava o fim do trabalho
divino. Jesus disse: “Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também” (João
5:17). Deus continua trabalhando no mundo. A isto chamamos de Providência.
Uma boa definição de Providência pode ser: “O permanente exercício da energia
divina, pelo qual o Criador preserva todas as Suas criaturas, opera em tudo que se
passa no mundo e dirige todas as coisas para o seu determinado fim”1 . Nas
Escrituras, podemos ver três formas como a Providência Divina se manifesta:
Preservação, Concorrência e Governo.
Deus preserva todas as coisas
Deus não apenas criou o mundo como também o sustenta. Rigorosamente
falando, o ato criador de Deus terminou no sexto dia. A partir daí iniciou-se a
Providência Divina. O texto de Hebreus 1:1-3 diz que o mundo foi criado através
de Jesus, e que é sustentado igualmente através dele “pela palavra do seu poder”.
É este poder de Deus que sustenta diretamente o mundo. Um Deus que criasse
todas as coisas e as entregasse à sua própria sorte não seria um Deus pessoal,
mas distante, impessoal e despreocupado. A Escritura ensina que Deus se
envolve com tudo aquilo que criou até nos mínimos detalhes. Veja que afirmação
maravilhosa sobre a criação e a Providência de Deus está em Neemias 9.6: “Só tu
és Senhor, tu fizeste o céu, o céu dos céus, e todo o seu exército, a terra e tudo
quanto nela há, os mares e tudo quanto há neles; e tu os preservas a todos com
vida, e o exército dos céus te adora”. Esse também é o entendimento do salmista:
“Em ti esperam os olhos de todos, e tu, a seu tempo, lhes dás o alimento. Abres a
tua mão e satisfazes de benevolência a todo ser vivente” (Salmo 145:15-16). Deus
preserva e sustenta a todos os seres que criou. Quando Deus deixa de sustentá-
los, eles morrem, conforme o salmista constata: “Todos esperam de ti que lhes
dês de comer a seu tempo. Se lhes dás, eles o recolhem; se abres a mão, eles se
fartam de bens. Se ocultas o teu rosto, eles se perturbam; se lhes cortas a
respiração, morrem, e voltam ao pó” (Salmo 104:27-29). O que mais se destaca
neste texto é a partícula “se”, que revela a condição pela qual a natureza continua
existindo. Tal é o controle preservador de Deus sobre sua criação que Jesus
disse: “Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em
celeiros; contudo vosso Pai celeste as sustenta” (Mateus 6:26); e acrescentou
mais tarde: “Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles cairá em
terra sem o consentimento de vosso Pai. E, quanto a vós outros, até os cabelos
todos da cabeça estão contados” (Mateus 10:29-30). Se Deus cuida até dos
passarinhos, alimentando-os e sustentando-os durante toda a vida deles, se Deus
sabe até o número de cabelos que temos na cabeça, então é porque seu
envolvimento é total, desde as menores até as maiores coisas.
O interessante é que isto pode ser visto também nas ações boas dos homens
não-regenerados. Eles também fazem coisas boas, não boas no sentido de
aceitáveis para salvação, mas boas, porque podem ter resultados benéficos para
as pessoas. Podemos ver pela Bíblia, que mesmo essas ações sofrem o
“concursus”. Ciro, o rei da Pérsia, é um grande exemplo disso. Veja o que está
escrito a seu respeito: “Assim diz o Senhor ao seu ungido, a Ciro, a quem tomo
pela mão direita (...). Eu irei adiante de ti, endireitarei os caminhos tortuosos,
quebrarei as portas de bronze e despedaçarei as trancas de ferro” (Isaías 45:1-2).
Deus está dizendo que age na vida de Ciro para o ajudar. Em seguida diz o
motivo: “Por amor do meu servo Jacó e de Israel, meu escolhido, eu te chamei
pelo teu nome e te pus o sobrenome, ainda que não me conheces” (Isaías 45:4).
Deus usou Ciro por amor de seu povo, ainda que Ciro não conhecesse o Senhor.
Ciro foi usado para que o povo pudesse voltar do cativeiro da Babilônia para sua
própria terra. O imperador foi responsável pela ordem que permitia a volta do
povo, e essa foi uma boa ação, mas, ele não fez isso pensando em agradar a
Deus, na verdade, ele estava fazendo uma manobra política, porém, acima de
tudo, estava cumprindo a vontade decretiva de Deus. Ciro agiu em busca de seus
próprios interesses, mas acabou fazendo algo de bom para o povo, e nisso ele foi
dirigido por Deus, que agiu na vida de Ciro.
Todas as boas ações desse mundo sofrem a ação do “concursus” de Deus. Tudo
o que acontece de bom, acontece porque duas coisas participaram: a vontade do
homem e a vontade de Deus. Em sua soberania, Deus não anula a vontade do
homem.
A história de José do Egito é novamente útil para entendermos isso. José era o
filho preferido de Jacó e seus irmãos tinham ciúmes dele. Num certo dia,
aproveitaram uma ocasião e venderam-no a alguns mercadores que iam para o
Egito. Aquele foi um ato muito mau da parte dos irmãos. José enfrentou muitos
problemas por causa disso, pois tornou-se um escravo no Egito, chegando até
mesmo a parar na prisão. Porém o Senhor agiu na vida de José que acabou
chegando ao cargo mais importante do Egito logo após o Faraó. Com isso, anos
mais tarde José pôde ajudar sua família que passava dificuldades com a grande
seca que se abateu sobre a terra. Quando se encontrou novamente com seus
irmãos, José disse-lhes: “vós, na verdade, intentastes o mal contra mim; porém
Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora, que se conserve muita
gente em vida” (Gênesis 50:20). Tal foi o entendimento de José daquela situação
que até mesmo declarou: “Não fostes vós que me enviastes para cá, e, sim, Deus,
que me pôs por pai de Faraó, e senhor de toda a sua casa” (Gênesis 45:8).
Vender José foi uma ação má dos irmãos, e eles eram responsáveis por aquela
ação. Eles agiram segundo seus impulsos pecaminosos, porém, a Bíblia diz que,
em última instância, Deus havia planejado tudo. Deus não foi o autor do pecado
dos irmãos, mas agiu na vida deles, para que seu propósito maior se cumprisse.
Eles fizeram o que desejavam, pecaram e foram punidos, mas não deixaram de
fazer também o que Deus desejava. Embora esta não seja uma coisa fácil de
entender, precisa ser aceita pela fé. Deus quis que os irmãos vendessem José,
mas, o pecado foi somente deles, pois ao agir daquela forma, não estavam
obedecendo a uma ordem de Deus, e sim a sua própria vontade pessoal.
Ainda mais difícil é entender como Deus atua nos atos maus dos próprios
homens maus. Sempre imaginamos os irmãos de José como membros da Aliança,
e por isso não os consideramos ímpios. Agora veja o que a Bíblia fala sobre o
caso de Nabucodonozor, o ímpio rei da Babilônia. Esse rei invadiu Judá e
cometeu atrocidades, porém, a Bíblia diz que Deus é quem o trouxe e determinou
que fizesse aquilo (Jeremias 25:9-11). Nabucodonozor agiu conforme sua
iniqüidade determinava, por causa da sua sede de conquistas, entretanto, Deus
determinou que aquilo acontecesse, usando Babilônia, império de
Nabucodonozor, segundo seus propósitos, como ele próprio declara: “Tu,
Babilônia, eras meu martelo e minhas armas de guerra; por meio de ti, despedacei
nações e destruí reis; por meio de ti, despedacei o cavalo e o seu cavaleiro;
despedacei o carro e o seu cocheiro; por meio de ti, despedacei o homem e a
mulher, despedacei o velho e o moço, despedacei o jovem e a virgem; por meio
de ti, despedacei o pastor e o seu rebanho, despedacei o lavrador e a sua junta de
bois, despedacei governadores e vice-reis” (Jeremias 51:20-23). Note que Deus
diz que ele havia feito toda aquela destruição. Porém, Babilônia pagaria, pois
havia agido conforme ela própria desejava, pois Deus declara: “Pagarei, ante os
vossos próprios olhos, à Babilônia e a todos os moradores da Caldéia toda a
maldade que fizeram em Sião, diz o Senhor” (Jeremias 51:24). A culpa era da
Babilônia, pois agiu conforme sua cobiça, entretanto, em última análise, agiu como
Deus havia determinado. Não resta dúvidas, Deus usou Babilônia e
Nabucodonosor, agindo na vida deles para que fizessem aquilo que era seu plano
que acontecesse. Ao mesmo tempo, porém, Babilônia e seu imperador agiram
conforme seus próprios desejos infames, e seriam castigados por Deus por causa
disto. Isto é surpreendente.
Falta-nos espaço para tratar de Jeroboão (1Reis 14:10; 15:27-30); de Roboão (1
Reis 12:13-15; 22-24); do rei da Assíria (Isaías 10:5-15); de Absalão (2 Samuel
16:20-23; 12:11-12; 17:14) e de tantos outros casos que demonstram o mesmo
que aconteceu com Nabucodonozor. Em todos estes casos, os homens ímpios
agiram conforme seus desejos pecaminosos e são culpados por isto, porém, ao
agir daquela forma, estavam fazendo o que a vontade decretiva de Deus havia
determinado.
Tudo o que acontece nesse mundo, acontece debaixo do olhar e do comando
eficaz de Deus, nada foge ao seu controle, porém, tudo o que o homem faz, faz
porque sua vontade deseja. O “concursus” nos ajuda a entender a maneira como
Deus age neste mundo e também como os homens agem. Há uma concorrência
entre os dois, porém, não uma junção de forças, como se o homem fizesse
metade e Deus o resto. O fato é que Deus age no homem, levando-o a fazer a
Vontade Suprema, mas sem ferir a responsabilidade pessoal do homem por cada
ato seu, e sem ser o autor do pecado dos homens. No caso do pecado, todo ato
pecaminoso ocorre por ação do homem. Porém é inegável que o pecado do
homem esteja incluído no decreto permissivo de Deus.
Deus governa todas as coisas