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A EXORTAÇÃO “A ALEGRIA DO AMOR” DO PAPA FRANCISCO

A Exortação Apostólica Pós Sinodal Amoris Laetitia é o documento que o Papa


Francisco elaborou após os dois Sínodos que ele convocou em 2014 e em 2015 para
pensar a família no contexto do mundo contemporâneo.

O Título, traduzido em português como “A Alegria do Amor” já indica a chave de leitura


do Papa Francisco: ele fala do amor como fonte de alegria e de realização humana,
especialmente quando é vivido segundo o desígnio de Deus, como relação entre um
homem e uma mulher que constituem uma família fundada no matrimônio e aberta
para gerar filhos e educá-los, com o compromisso de viver um amor que se doa e que
tem a característica de ser único e exclusivo.

O Papa não se limita a anunciar o evangelho da família, a boa nova que é constituída
pela família, ele enfrenta com realismo e coragem as situações de sofrimento, de
rupturas que provocam feridas nos diversos membros da família. Sua intenção é, de
um lado, fazer com que os jovens, que manifestam um forte desejo de família, tenham
entusiasmo para formar uma família que pode proporcionar a alegria de que fala o
título. De outro lado, ele quer dizer que ninguém deve sentir-se excluído do amor de
Deus, do abraço de ternura e da misericórdia que Deu quer dar a todos os seus filhos,
especialmente os que estão marcados por grandes sofrimentos.

O Sínodo de outubro passado do qual tive a graça de participar, consistiu em três


semanas de intenso trabalho feito em assembleia pelos quase 200 padres sinodais
vindos do mundo inteiro, cada um tendo a possibilidade de apresentar algum aspecto
da família. O Papa Francisco esteve presente em todas as Assembleias, menos uma
em que ele encontrava o povo na Praça de São Pedro. Além dessas Assembleias,
uma boa parte do trabalho foi feita em grupos linguísticos.

Cada um dos dois Sínodos terminou com a elaboração de uma relação final que foi
entregue ao Papa, como primeiro material para ele elaborar a Exortação. De fato, a
Amoris Laetítia faz muitíssimas referências a essas relações.

A Exortação apresenta uma continuidade e uma inovação. A continuidade é com a


doutrina católica a respeito do Matrimônio e da Família. O próprio Papa repete em
diversos lugares que a doutrina permanece intocada, porque nos seus aspectos mais
importantes vem diretamente de Jesus. Por isso, ele reafirma a necessidade de
anunciar a boa notícia da família segundo o desígnio de Deus como o melhor caminho
para viver o amor também nos dias atuais. Assim, no n. 330, a Exortação nos diz:
“Não se devia esperar do Sínodo ou desta Exortação uma nova normativa geral de
tipo canônico, aplicável a todos os casos. É possível apenas um novo encorajamento
a um responsável discernimento pessoal e pastoral dos casos particulares.”
A grande inovação está na postura da ação pastoral, isto é, no convite a acolher todas
as pessoas sem condenar quem por circunstâncias diversas não conseguiu viver bem
a realidade de sua família e chegou a romper os vínculos através do divórcio e a criar
uma segunda união.

Nesse sentido o Papa recomenda acompanhar, discernir e integrar a fragilidade das


pessoas. O tema do acompanhamento é particularmente querido pelo Papa e retorna
em muitos seus textos. Na Exortação, recomenda acompanhar as famílias de recém-
casados, nos primeiros anos de sua caminhada, que não se vejam sozinhos quando
devem enfrentar situações adversas que podem constituir grandes problemas. O
convite a acompanhar retorna quando o Papa fala das pessoas divorciadas que
realizaram uma segunda união de tipo familiar, para que não se sintam excluídas da
comunhão eclesial. Elas podem ser acompanhadas num caminho de conversão e de
discernimento para compreender melhor sua situação. Devem ser levadas em conta
as diversas circunstâncias que podem atenuar a responsabilidade de cada um,
buscando a integração. A palavra integração é o contrário de exclusão. O Papa afirma:
“Trata-se de integrar a todos, deve-se ajudar cada um a encontrar a própria maneira
de participar na comunidade eclesial, para que se sinta objeto de uma misericórdia
imerecida, incondicional e gratuita” (297).

A Exortação, retomando a relação final do Sínodo, afirma: “Os batizados que são
divorciados e recasados devem ser integrados mais intensamente nas comunidades
cristãs, de várias maneiras possíveis, evitando todas as ocasiões de escândalo” (299).

Alguns leem a insistência do Papa na integração como uma abertura para que
recebam a eucaristia, mas em momento nenhum ele apresenta esta possibilidade de
maneira explícita. Tratando-se de matéria tão importante não parece legítimo atribuir
ao texto, por dedução, o que ele não traz e fazer dizer ao Papa o que ele mesmo não
quis ou não pôde afirmar explicitamente. Esta observação nada retira da grandeza da
proposta de Papa Francisco, na linha da misericórdia como a característica de Deus e
como a marca da Igreja dos nossos tempos. Este acolhimento que busca integração
no caminho da orientação pastoral é a grande novidade da Exortação, que pelo resto
permanece no horizonte da grande doutrina católica relativa ao matrimônio e à família.

Dom João Carlos Petrini

Bispo de Camaçari - Bahia

Presidente do Regional NE3 da CNBB

Diretor da Seção Brasileira do Pontifício Instituto

João Paulo II para Estudos sobre Matrimônio e Família

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