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Fundamentos do Orçamento na Administração Pública

Carla Werle (Profiap/UFGD) carlawerle1983@gmail.com


Caroline Reis Senamatsu (Profiap/UFGD) carolinesenamatsu@ufgd.edu.br
Danielle Krummenacher de Medeiros (Profiap/UFGD) daniellemedeiros@ufgd.edu.br
Eduardo Garcia da Costa Marques (Profiap/UFGD) tem_garcia_@hotmail.com

Resumo:
O presente estudo tem como objetivo conhecer, através do levantamento e pesquisa bibliográficos, as
funções, modelos e conceitos fundamentais do orçamento, na perspectiva do setor público. Inicialmente,
busca conceituar o Orçamento Público, conhecendo suas características e seu uso em busca de atender
as funções do Estado necessárias para o desenvolvimento harmonioso e fundamentado da economia dos
países. A seguir, apresenta sua evolução histórica em nosso país, expondo o desenvolvimento dos
modelos orçamentários no Brasil. Por fim, discorre sobre os diversos princípios orçamentários
envolvidos em sua elaboração, execução e avaliação.
Palavras chave: Orçamento Público; Funções do Estado; Princípios Orçamentários

Budget Fundamentals in Public Administration

Abstract
The present article aims to learn about the functions, models and concepts of public budgeting through
bibliographic survey and research. Initially, the intention is to conceptualize Public Budgeting by
knowing its characteristics and its application in attending the functions of state government, which is
necessary for the development of countries’ economy. Following, the article presents the historical
evolution of public budgeting in our country, exposing the development of budget models in Brazil.
Finally, the study discusses various budgetary principles involved in the formulation, execution and
evaluation of public budgeting.
Key-words: Public Budget; Functions of State Government; Budgetary principles.

1 Introdução
O Orçamento Público é uma importante ferramenta de gestão da Administração Pública.
Inicialmente concebido como um mecanismo de controle político dos órgãos de representação
sobre o Poder Executivo, passou por diversas mudanças no intuito de acompanhar a evolução
das funções do Estado. Adaptando-se às novas realidades, em especial ao imperativo de a
administração ser capaz de lidar com um novo modelo de gestão e, sobretudo, de responder às
necessidades de seus cidadãos, o orçamento é um instrumento de fundamental importância para
o desenvolvimento do país e para a implantação e manutenção das mais diversas políticas
públicas no Brasil.
Segundo Sanches (2006, p.187),
Esse processo articulado, denominado ciclo orçamentário, resulta da singular natureza
do orçamento, que desde as suas mais remotas origens – ao final da primeira metade
deste milênio –, tem sido entendido como instrumento político, por estabelecer
parâmetros para a cobrança de tributos, fixar limites para a realização de gastos
públicos, definir responsabilidades e articular parte expressiva do sistema de checks
and balances constituído pela sociedade para controlar o exercício do poder que
defere ao Estado.
No processo orçamentário no Brasil, a busca pela melhoria das funções orçamentárias,
quais sejam, as funções alocativa, distributiva e estabilizadora, promoveu diversas inovações
com o objetivo de “[...] aumentar a eficiência dos fatores de produção e da qualidade dos
serviços prestados, principalmente com o incentivo à inovação e por meio da revisão de
paradigmas associados aos modelos patrimonial e burocrático de administração pública”
(ABREU; GOMES, 2010, p. 269), resultando em reformas gerenciais em busca de maior
participação e controle social.
O orçamento centraliza todas as receitas e as despesas do Poder Público e sua elaboração
deve observar diversos princípios orçamentários, que se traduzem em instrumentos a serviço
da máxima efetividade das políticas financeiro-orçamentárias do Estado. Tais ferramentas o
tornam mais transparente e suscetível aos controles exercidos pela sociedade, pelo Legislativo
e pelo Tribunal de Contas.
Considerando a importância do assunto para a administração pública, o objetivo deste
trabalho é conhecer, mediante a análise e revisão de bibliografia pertinente, as funções, modelos
e conceitos fundamentais do orçamento, bem como contextualizá-lo na perspectiva do setor
público e de sua evolução histórica em nosso país. Além disso, busca conhecer os diversos
princípios envolvidos em sua elaboração, execução e avaliação orçamentária, os quais conferem
validade e legitimidade ao orçamento público.
2 Orçamento Público
O Orçamento Público pode ser considerado o mais importante e um dos mais antigos
instrumentos de gestão da administração pública. A ferramenta tem como função principal
organizar os recursos financeiros que o governo terá disponível, e no qual são previstas todas
as receitas e fixadas as despesas da administração, referentes aos Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário.
Ao conceituar orçamento podemos encontrar várias definições, porém as mais comuns
levam a ideia de estimativa, cálculo, avaliação e previsão. Segundo Santos (2012, p. 18),
“Orçamento Público reúne, de forma sistemática e organizada, todas as receitas estimadas para
determinado ano e o detalhamento das despesas que o governo espera executar. Na sua forma,
portanto, ele é um documento contábil de receitas e despesas”.
Entretanto, alguns outros autores afirmam que o orçamento é uma das principais bases
da gestão pública. Para Araújo, Arruda e Barreto (2009, p. 2),
No Brasil, desde a Constituição Federal de 1988, o Orçamento Público abrange o
conjunto de elementos técnico-legais, norteadores, integradores e viabilizadores da
função de planejamento das finanças públicas dos entes da Federação (União, estados,
Distrito Federal e municípios), constituído dos planos plurianuais, das diretrizes
orçamentárias e dos orçamentos anuais, este englobando os orçamentos fiscal, da
seguridade social e de investimentos.
Reforçando a importância do Orçamento Público que, vai além da simples visão de
estimativa de receitas e fixação de despesas, Araújo e Arruda (2009, p. 57) afirmam que:
O Orçamento público é a lei de iniciativa do Poder Executivo e aprovada pelo Poder
Legislativo, que estima a receita e fixa a despesa para o exercício financeiro... Apesar
de sua forma de lei, o orçamento, antes de tudo, é um instrumento de planejamento
que permite acompanhar, controlar e avaliar a administração da coisa pública.
Para compreensão do Orçamento Público é necessário, também, conhecer o Plano
Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA),
que, juntos, são um conjunto interligado de instrumentos de programação, efetivação,
monitoramento e análise das ações governamentais em cada uma das esferas de governo.
Partindo das definições anteriores, pode-se afirmar que o orçamento é muito mais que
um instrumento de planejamento contábil para fixação de receitas e despesas porque permite
que os gestores aloquem os recursos de forma mais eficiente. Este mecanismo é, em sua
fundamentação, um instrumento político que permite a aplicação de recursos sociais e
econômicos entre os mais diversos segmentos da sociedade.
Na gestão pública, o orçamento ganha importância a partir do momento que se torna
instrumento para execução de projetos que tenham sentido para comunidade atendida e que
atendam aos interesses públicos. Nas diversas áreas que necessitam a intervenção do governo,
o orçamento deve ser bem planejado e conter os atributos e ações que permitam a obtenção de
resultados que satisfaçam o cidadão - o usuário final das políticas de governo.
Passamos, então, a analisar as características e funções do Orçamento Público.
O Orçamento Público é o principal instrumento que o gestor público dispõe para que
sejam cumpridas as funções públicas. Saber lidar com o orçamento é importante pois:
- As demandas da comunidade por bens e serviços somente poderão ser atendidas se
estiverem contempladas no Orçamento Público.
- As leis que regulamentam as atividades econômicas, sociais, culturais e políticas da
comunidade dependem de recursos do Orçamento Público para sua aplicação.
- Os gastos realizados pelos órgãos públicos não podem se desviar do que está
autorizado no Orçamento Público, nem conflitar com o interesse público. (SANTOS,
2012, p. 16).
Pelas características apontadas podemos dizer que o Orçamento é o instrumento central
para a gestão do governo, traduzindo o planejamento estratégico em programas de execução de
ações.
Nos dias atuais, o orçamento pode ser reconhecido como um instrumento que apresenta
diversas funções, que vão desde a função de controle político, administrativo, gerencial,
contábil, financeiro e de planejamento. Os orçamentos, do ponto de vista macroeconômico,
permitem visualizar a situação fiscal dos governos.
Os governos atuam de diversas formas na economia do país, podendo tal atuação se dar
através da administração de empresas estatais, pela condução da política monetária,
regulamentação de mercados privados, e principalmente pela condução de sua atividade
orçamentária. Estas ações são formas de participação do governo e refletem diretamente nas
atividades econômicas.
Os Orçamentos Públicos, além de serem instrumento para ordenamento e financiamento
da Administração Pública, viabilizam que o Estado cumpra as funções necessárias para o
desenvolvimento harmonioso e fundamentado da economia dos países. São elas a função
alocativa, a distributiva e a estabilizadora, que se dão da seguinte forma:
Na função alocativa, o Estado direciona a utilização dos recursos da economia para
a oferta de bens públicos, criando incentivos para aceleração do desenvolvimento de
certos setores econômicos em relação a outros.
A função distributiva ou redistributiva refere-se ao ajustamento da distribuição da
renda das pessoas e empresas, para alcançar determinadas situações consideradas
socialmente justas. Por meio dessa função o Estado busca equalizar os desiquilíbrios
regionais e sociais, promovendo o desenvolvimento das regiões e classes menos
favorecidas.
Já a função estabilizadora está relacionada às escolhas orçamentárias visando a plena
utilização dos recursos econômicos da sociedade, à estabilidade de preços, ao
equilíbrio da balança de pagamentos e das taxas de câmbio, e à estabilidade do
crescimento econômico, com vistas ao desenvolvimento sustentável do País, com a
redução das desigualdades e o pleno emprego.” (ARAÚJO; ARRUDA; BARRETO,
2009, p. 8, grifo do autor).
Quando os governos exercem as funções acima mencionada, estão exercendo as suas
funções de Estado que são possíveis de serem efetivadas através do Orçamento Público. A
função alocativa é desempenhada através da construção de estradas, escolas, hidrelétricas, etc;
a função distributiva, de fundamental importância para o crescimento equilibrado do país, é
aquela com a qual o governo deve combater os desequilíbrios sociais e regionais, promovendo
o desenvolvimento das regiões e classes menos favorecidas; e a função estabilizadora é a que
busca o pleno emprego dos recursos econômicos, o controle das taxas de juros e câmbios, entre
outros.
Nos últimos anos, a economia tornou-se muito complexa, e isso se deve principalmente
à força que a economia privada, na qual prevalece a busca pelo lucro, adquiriu. O Estado tem a
função de ser um contrapeso dessa força, alocando, distribuindo e estabilizando os recursos
produzidos em todo o seu território em busca do bem estar da sociedade, promovendo políticas,
projetos, ações e programas que o tornem possível.
3 Evolução Histórica dos Modelos Orçamentários na Administração Pública
O Orçamento Público, ou sistema orçamentário, evoluiu progressivamente com o passar
dos anos, mas sempre tendo como requisitos assegurar o controle dos gastos, estabilizar a
economia e promover a eficiência na prestação de serviços. O mesmo foi pautado por estes
norteadores, que foram se amoldando, desde sua primeira aparição na Inglaterra, no século XIII.
O orçamento é uma consequência do advento do regime representativo e cabe à
Inglaterra a glória de tê-lo introduzido, em primeira mão, no seu direito público, aí
pelo ano de 1215. A sua evolução está ligada às grandes lutas constitucionais
registradas pela História. Com efeito, foram questões orçamentárias a origem da luta
pela independência dos Estados Unidos da América do Norte; das lutas entre os
Estados Gerais e a monarquia na França (1789) e da que se travou na Inglaterra entre
a Monarquia e o Parlamento, a qual teve seu desfecho com a revolução de 1688,
triunfando o último. (MARTINS, 1988, p. 213)
Apesar de sua vasta história no cenário internacional, foi apenas no século XIX que tal
ferramenta foi implementada no país. Segundo Martins (1988, p. 214):
Cita-se como primeira lei orçamentária brasileira a de 14 de dezembro de 1827, a
despeito de já conter a Constituição do Império, promulgada em 25 de março de 1824,
disposição expressa nesse sentido. A razão dessa preferência reside em que o
dispositivo inserto na Constituição de 1824 jamais foi executado.
A partir deste início o orçamento público brasileiro passou por diversas evoluções,
sempre orientado pelas Cartas Magnas e passando por três fases distintas: o orçamento
tradicional, o orçamento desempenho e, por fim, o orçamento programa.
Na fase do orçamento tradicional, ou clássico, a peça orçamentária dava ênfase apenas
no que a administração comprava, sendo caracterizado por ser um documento estritamente de
previsão de receitas e autorização de despesas, distribuídas pelos diversos órgãos, para o
período de um ano.
Esta foi a primeira fase do orçamento no Brasil, que se iniciou com a Constituição
Imperial de 1824, quando surgiram as primeiras exigências no sentido da elaboração de
orçamentos formais por parte das instituições imperiais. Tal formato inicial era previsto na letra
da Constituição de 1824, elucidado por Gontijo (2004) da seguinte maneira:
De acordo com seus termos, só a lei poderia autorizar o gasto e tal lei deveria ser
votada pelo parlamento (Reserva Legal). Era de responsabilidade do Executivo a
elaboração do orçamento, que, depois de pronto, seria encaminhado para aprovação
pela Assembléia Geral (Câmara dos Deputados e Senado). Entretanto, as leis sobre
impostos seriam de iniciativa exclusiva da Câmara dos Deputados.
Com o advento da Constituição de 1891 ocorreram novas mudanças no orçamento. A
fase tradicional se mantinha, porém foi conferido ao Legislativo a elaboração do orçamento e
ao Executivo a tomada de contas. A Constituição de 1934 também trouxe mudanças,
principalmente quanto a elaboração e aprovação do orçamento. A competência para a
elaboração da proposta orçamentária foi atribuída ao Presidente da República, enquanto o
Legislativo encarregava-se da votação do orçamento e do julgamento das contas do Presidente,
com o auxílio do Tribunal de Contas. Além disso, não havia limitações ao poder de emendar a
proposta por parte dos legisladores, caracterizando, assim, uma coparticipação entre os dois
poderes, executivo e legislativo, na elaboração da lei orçamentária. (GONTIJO, 2004).
Já na Constituição de 1937 a proposta orçamentária seria elaborada por um
Departamento Administrativo junto à Presidência da República e votada pela Câmara dos
Deputados e pelo Conselho Federal, este último uma espécie de Senado com dez membros
nomeados pelo Presidente da República.
Encerrando a fase tradicional tem-se a Constituição de 1946. Neste período, o
orçamento voltou a ser do tipo misto, no qual o Executivo elaborava o projeto de lei do
orçamento e o encaminhava para discussão e votação nas casas legislativas, que poderiam
participar através das emendas.
Apesar de passar por diversas Cartas Magnas, na fase tradicional não havia nenhuma
preocupação com as reais necessidades da administração ou da população, e não se
consideravam objetivos econômicos e sociais na elaboração da peça orçamentária. Além disso,
o orçamento era corrigido de acordo com o que se gastava no exercício anterior.
Foi na tentativa de corrigir tais erros que se iniciou, a seguir, a fase do orçamento
desempenho. Nesta nova etapa, o governo deixa de se preocupar com o que compra e passa a
se preocupar com o que faz. O Estado passa a focar a realização de suas tarefas e as necessidades
da população.
Pellini (2003) salienta que a Lei Federal n.º 4.320/64 foi um marco nas finanças públicas
e considerado um ponto de mudança no pensamento sobro orçamento público. Segundo a
autora,
Em 17 de março de 1964, a edição da Lei Federal nº 4.320, em vigor até hoje,
representou um marco em termos de finanças públicas, tendo estatuído normas gerais
de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União,
dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Quanto ao orçamento, inovou
em vários aspectos, porém os mais relevantes são os que dizem respeito às
previsões plurianuais e ao orçamento-programa. Introduziu a exigência de
elaboração do orçamento plurianual de investimentos, relativo a um período de três
anos. (PELLINI, 2003, p. 11, grifo nosso)
A Constituição de 1967 retirou prerrogativas do Legislativo no que diz respeito à
iniciativa de leis ou emendas que criem ou aumentem despesas, incluindo emendas ao projeto
de lei do orçamento, o mesmo se aplicando para modificações em sua natureza e objetivo
(GONTIJO, 2004).
O orçamento desempenho foi um passo muito importante, contudo se encontrava
desvinculado de um planejamento central das ações do governo, ou seja, embora fosse a
conexão entre os objetivos do governo e os gastos previstos, não poderia, ainda, ser considerado
um orçamento-programa, visto que lhe faltava uma característica essencial: a vinculação ao
Sistema de Planejamento. Fez-se necessário, então, uma técnica mais elaborada, que traduziu-
se no Orçamento-Programa.
Esta fase foi consolidada com a Constituição de 1988:
A Constituição de 1988 trouxe duas novidades na questão orçamentária. Devolveu ao
Legislativo a prerrogativa de propor emendas sobre a despesa no projeto de lei de
orçamento e reforçou a concepção que associa planejamento e orçamento como elos
de um mesmo sistema. A CF 88 determinou que questões como: exercício financeiro,
prazos, vigência, elaboração, organização dos orçamentos, das normas de gestão
financeira e patrimonial seja objeto de disciplinamento de Lei Complementar, até hoje
em discussão no CN. A elaboração de planos plurianuais passou obrigatoriamente
a abranger as despesas de capital e demais programas de duração continuada.
Tornou obrigatória também o encaminhamento anual ao Legislativo do projeto
de lei de diretrizes orçamentárias. (GONTIJO, 2004, grifo nosso)
Destarte, a Carta Magna atual preocupou-se em dar características de planejamento ao
orçamento, introduzindo a obrigatoriedade da Lei de Diretrizes Orçamentárias, bem como o
Plano Plurianual, cujo escopo é embasar a Lei Orçamentária Anual. Evidencia-se, então, o zelo
do constituinte para com o planejamento das ações do governo
4 Princípios Orçamentários
Princípio é uma “proposição elementar e fundamental que serve de base a uma ordem
de conhecimento [...] sobre a qual se apoia o raciocínio.” (HOUAISS, 2001, p. 2299).
Contextualizando o conceito no sistema financeiro-orçamentário, para Sanches (1997), os
princípios são orientações que balizam os processos e as práticas orçamentárias para dar-lhes
estabilidade e consistência.
O orçamentário público concentra todas as receitas e as despesas estatais, logo, a
fidedignidade da atividade orçamentária condiciona-se à estrita observância das diretrizes que
alicerçam a contabilidade pública. Estes preceitos contribuem para a transparência e o controle
das operações financeiras do Estado, conferindo validade e legitimidade ao processo de
elaboração, execução e avaliação do orçamento público.
Com a observância dos princípios orçamentários, o orçamento retrata os ideais do
governo, bem como contribui para solução de problemas locais, para o desenvolvimento
econômico e social e, consequentemente, para satisfação das aspirações da sociedade
(KOHAMA, 2006, p. 41).
Passamos, então, a estudar os princípios aplicados ao orçamento público.
O Princípio da Legalidade está expresso na Constituição Federal, em seus artigos 5º,
inciso II e artigo 37, caput. Com o advento do Estado de Direito, todas as esferas públicas
sujeitaram-se ao controle de legalidade, tal como o sistema financeiro-orçamentário, pois “o
princípio da legalidade em matéria orçamentária tem o mesmo fundamento do princípio da
legalidade geral, segundo o qual a administração se subordina aos ditames da lei” (SILVA,
1973, p. 153).
De acordo com este princípio, todas as previsões de receita e despesa precisam ser
precedidas de expressa autorização legislativa (SANCHES, 2004, p. 274-275). Por este motivo,
o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual
(LOA) são projetos de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo que, após serem
referendadas pelo Poder Legislativo, são convertidas em lei em sentido estrito.
Tal como o princípio anterior, o Princípio da Publicidade, previsto no artigo 37, caput,
da Constituição Federal, norteia toda a atividade pública. Destarte, no âmbito contábil, tal
preceito valida o orçamento público assegurando amplo acesso às informações necessárias para
a fiscalização dos recursos públicos. Segundo Silva (1973, p. 155), a publicidade “é um
princípio básico da atividade do poder público no regime democrático, aplicando-se também
ao orçamento, que é a peça fundamental da atividade governamental”. Por isso, este princípio
deve nortear todas as fases do orçamentário público, quais sejam, a preparação, a execução e o
controle (SILVA, 1988, p. 39).
A publicidade formal, isto é, a mera divulgação do texto orçamentário nos diários
oficiais, é insuficiente para atender o princípio em pauta. O orçamento precisa da publicidade
real, consubstanciada na difusão de resumos claros e comentados da proposta orçamentária que
permitam que o maior número de cidadãos possam inteirar-se das realizações pretendidas pela
administração pública (GIACOMONI, 2010, p. 83)
Já o Princípio da Unidade ou Totalidade (art. 165, §5º, da CF e art. 2º da lei n.º
4.320/1964) enseja a chamada “unidade de caixa”, ou seja, a proposta de “agrupar, pelo menos
na contabilidade, através de uma conta única, a entrada e a saída de dinheiro” (ANGÉLICO,
1989, p. 47). Sua finalidade é coibir orçamentos paralelos e/ou extraordinários, isto é, não
previstos em lei, bem como eventuais entraves para os controles interno e externo.
No entanto, o aumento da complexidade da sociedade e, consequentemente, do Estado,
impossibilitou que uma única peça concentrasse todo o orçamento público. Adiante, após o
processo de descentralização da estrutura estatal, os órgãos e entidades do Poder Público com
autonomia financeira reconhecida em lei tornaram-se responsáveis por elaborar a sua própria
proposta orçamentária.
Por esta razão, o Princípio da Unidade evoluiu para o Princípio da Totalidade
(ANGÉLICO, 1989, p. 47-48), o qual passou a legitimar múltiplos orçamentos públicos, desde
que cada pessoa jurídica de direito público tenha apenas um orçamento e que as peças
orçamentárias da mesma esfera (Federal, Estadual, Distrital ou Municipal) e da mesma natureza
(orçamentos fiscal, de investimento de empresas estatais e da Seguridade Social) sofram o
processo de consolidação. Assim, segundo Giacomoni (2010, p. 67), “múltiplos orçamentos são
elaborados de forma independente, sofrendo, entretanto, a consolidação que possibilita o
conhecimento do desempenho global das finanças públicas.”
Para que o controle das atividades financeiro-orçamentárias do Estado seja completo,
todas as receitas e as despesas devem estar previstas na peça orçamentária. Do contrário, abrir-
se-ia um precedente para que uma parcela dos recursos públicos não fosse referendada pelos
representantes do povo. Eis do que trata o Princípio da Universalidade (arts. 2º, 3º e 4º da lei
n.º 4.320/1964).
Para Silva (1962, p. 14), é um princípio que permite ao Poder Legislativo apreciar todas
as receitas e despesas governamentais, autorizando-as ou vetando-as, bem como limitar as
receitas tributárias ao quantum necessário para cobrir as despesas.
O Princípio do Orçamento Bruto (art. 6º da lei n.º 4.320/1964) está intimamente ligado
com o anterior, porquanto, ao vetar quaisquer deduções dos valores que representam a receita
e a despesa na lei orçamentária, pretendeu impedir que eventuais omissões de gastos e/ou
arrecadações comprometessem o completo controle legislativo sobre a contabilidade pública.
Segundo Silva (1962, p.13-14), não há razão para subtrair uma despesa qualquer ao controle do
Legislativo e, por isso, é vedado que na LOA conste apenas o saldo positivo ou negativo
resultante do cotejo entre receitas e despesas de um determinado setor público.
O Princípio da Anualidade ou Periodicidade (art. 2º, inciso III, e art. 34, ambos da lei
n.º 4.320/1964) “obriga o Poder Executivo a pedir, periodicamente, nova autorização para
cobrar tributos e aplicar o produto da arrecadação” (ANGÉLICO, 1989, p. 45).
A vigência da lei orçamentária não poderia ser perpétua nem muito longa, sob pena de
a receita e a despesa pública nunca serem revistas; tampouco muito curta, sob pena de a
execução orçamentária ser inviabilizada. De acordo com o art. 34, da lei n.º 4.320/1964, a
autorização legislativa para executar o orçamento público deve coincidir com o ano civil (1º de
janeiro a 31 de dezembro do mesmo ano).
Silva (1988. p. 35) aduz que “a regra da anualidade do orçamento tem fundamentos
econômicos e institucionais”. Quanto ao fator econômico, o mercado é flutuante, assim, é
inviável prever receitas e gastos por um período de tempo superior a um ano. Já o aspecto
institucional é preservado ante o sistema de “freios e contrapesos” dos três Poderes, o qual
impõe que o controle legislativo sobre a contabilidade pública deve ser cíclico.
Já o Princípio da Exclusividade (art. 165, § 8º, da CF) controla o conteúdo da lei
orçamentária vetando “matéria estranha à previsão da receita e à fixação da despesa”
(SANCHES, 2004, p. 149). O objetivo desta restrição é “disciplinar a votação do orçamento
nas Assembleias Legislativas, impedindo que elas se utilizem de um processo legislativo mais
rápido e sujeito a prazos fatais, para conseguirem a aprovação, sem maior exame ou discussão,
de medidas estranhas à matéria financeira.” (SILVA, 1962, p. 31)
A aprovação da peça orçamentária envolve muita “barganha” política, pelo que, a
inclusão de matérias sem natureza orçamentária culminaria no retardamento da votação do
orçamento propriamente dito, bem como na chamada “cauda orçamentária” (SILVA, 1973,
p.108), isto é, na aprovação de questões desprovidas de conteúdo financeiro indevidamente
inseridas no orçamento público.
A interpretação do Princípio da Não-Vinculação da Receita de Impostos, prevista no art.
167, inciso IV, da CF, aduz que o legislador não deve vincular a receita orçamentária, isto é,
atrelá-la ao custeio de uma despesa específica, porque cabe à “própria administração, em sua
atividade discricionária na execução da despesa pública, espaço para determinar os gastos com
os investimentos e as políticas sociais.” (TORRES, 1995, p.208)
Este preceito tutela a competência privativa do Poder Executivo de elaborar o orçamento
sem prévias amarrações do Poder Legislativo. Contudo, a própria Constituição Federal enseja
exceções à regra da não-vinculação, tais como nas atividades de administração tributária,
transferência tributária, operações de crédito por antecipação de receita, prestação de garantia
ou contra garantia à União, saúde e ensino, previstos no art. 37, inciso XXII, arts. 158 e 159,
art. 165, § 8º, art. 167, § 4º, art. 198, § 2º e art. 212, respectivamente.
Com o advento do ‘Estado Social’, o orçamento público transformou-se em um
poderoso instrumento para assegurar a execução de políticas perseguidas pelo Estado. No
entanto, as despesas públicas “[...] são ‘elásticas’ (crescem em maior proporção que a renda
interna)” (GIACOMONI, 2010, p. 81), e, em contrapartida, as receitas “apresentam alto grau
de inflexibilidade, isso em função da incapacidade e do baixo grau de desenvolvimento das
forças produtivas nacionais.” (GIACOMONI, 2010, p. 81). Daí a necessidade de parâmetros
que assegurem que a despesa não seja superior à previsão da receita, ou seja, que os
investimentos estatais não redundem em endividamento público, de forma a atender o Princípio
do Equilíbrio Orçamentário (art. 167, incisos II, III e V, da CF e arts. 48, 48-A e 49 da Lei
Complementar n.º 101/2000 (LRF))
O Princípio da Discriminação, Especialização ou Especificação, aduzido do art. 5º e 15
da lei 4320/64, facilita o controle da execução do orçamento vetando que a lei orçamentária
contenha dotações globais, ou seja, que enseje a “inclusão de valores globais, isto é, de valores
sem discriminação” (SILVA, 1988, p. 38). Desta forma, os valores devem ser discriminados
com um mínimo de elementos que evidenciem a sua origem e a sua destinação.
Segundo Silva (1988, p. 38), esta regra tem origem na prolongada luta entre os Poderes
Executivo e Legislativo. Corroborando este entendimento, Giacomoni (2010, p. 78) enfatizou
o caráter político do Princípio da Discriminação, bem como a sua importância para a efetividade
do controle legislativo, afirmando que “um orçamento altamente especificado fornece
condições ideais para a fiscalização parlamentar, além de inibir a expansão das atividades
governamentais [...] O enfoque clássico do princípio é, pois, político.”
Para que o controle sobre a atividade orçamentária pública seja efetivo, o orçamento
precisa ser inteligível, logo, deve ser apresentado em linguagem clara e compreensível a todas
as pessoas que precisem ou queiram manipulá-lo (GIACOMONI, 2010, p. 83). Trata-se do
Princípio da Clareza.
A clareza do texto orçamentário amplia o grau de compreensão e de difusão do seu
conteúdo, tanto para o exercício do controle social (população) quanto técnico (Poder
Legislativo e Tribunal de Contas), haja vista que o poder de comunicação do documento
influenciará sua utilização de forma ampla, bem como sua difusão será tanto mais abrangente
quanto maior for a sua clareza (KOHAMA, 2006, p. 43).
Por fim, trazemos o Princípio da Programação ou do Planejamento, contido nos arts. 16
a 18 do Decreto-lei n.º 200/1967. Com o passar do tempo, as ações governamentais foram se
tornando cada vez mais planejadas e assumiram o formato de “programas”, ao passo que se
tornaram instrumentos de integração dos esforços dos governos em busca da concretização dos
seus objetivos (GIACOMONI, 2010, p. 166).
De acordo com Kohama (2006, p. 41), programar consiste em “selecionar objetivos que
se procuram alcançar, assim como determinar as ações que permitam atingir tais fins e calcular
e consignar os recursos humanos, materiais e financeiros para a efetivação dessas ações.”
Conforme vimos, este formato de peça orçamentária foi denominado de “orçamento-
programa”, conjugando metas e objetivos governamentais com o sistema de planejamento das
finanças. Assim, o Plano Plurianual (PPA) fixa parâmetros para a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) que, por sua vez, condiciona a Lei Orçamentária Anual (LOA). Adiante,
a LOA organiza-se em programas, os quais se desdobram em projetos e planos de ação para
maximizar os seus efeitos e otimizar a distribuição dos recursos públicos.
5 Considerações Finais
O orçamento é um instrumento de fundamental importância para o desenvolvimento do
país e também para implantação e manutenção das mais diversas políticas públicas no Brasil.
Trata-se de uma poderosa ferramenta de fiscalização, participação e controle das ações do
governo, uma vez que é através dele que as necessidades da população são priorizadas, tais
como serviços de saúde, segurança, educação, transporte, assistência social e as mais diversas
áreas que necessitam de atenção do Estado.
A busca pelo atendimento a tais necessidades é feita pelo Estado através do exercício
de suas funções alocativa, distributiva e estabilizadora, as quais podem ser efetivadas através
do orçamento.
O orçamento centraliza todas as receitas e as despesas do Poder Público, e, em sua
confecção, além da observância aos regramentos básicos do sistema contábil, devem ser
observados os princípios orçamentários, que são instrumentos a serviço da máxima efetividade
das políticas financeiro-orçamentárias do Estado, uma vez que conferem legalidade e
legitimidade ao orçamento público amarrando-o ao interesse coletivo.
A aplicação dos princípios orçamentários evidencia o significado e o alcance das normas
orçamentárias e torna a peça orçamentária mais transparente e suscetível aos controles
exercidos pela sociedade, pelo Legislativo e pelo Tribunal de Contas, de suma importância para
sua efetiva aplicação.
Atualmente, todavia, observa-se que as barganhas políticas podem comprometer a
finalidade do orçamento ao utilizá-lo para atender os interesses particulares. Este
desvirtuamento afeta a garantia do mínimo existencial, ou seja, dos recursos indispensáveis
para assegurar a dignidade da pessoa humana, bem como obsta avanços sociais na educação,
saúde, segurança, etc.
A evolução histórica do orçamento no Brasil demonstra a crescente preocupação com o
atendimento das demandas dos cidadãos, tanto que o Orçamento-Programa passou a vincular a
proposta orçamentária ao planejamento central das ações do governo e à previsão de gastos. No
entanto, esta corrupção precisa ser compelida desde o fomento da LOA no Poder Executivo, do
contrário, a população sofrerá prejuízos diversos pela má distribuição dos recursos públicos.
O orçamento ideal é aquele que, em consonância com os anseios dos cidadãos e
observando os princípios fundamentais para sua elaboração, promove o desenvolvimento da
sociedade e a satisfação dos interesses e necessidades dos seus cidadãos.
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