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Questão Fiscal
Rubens Penha Cysne (FGV/EPGE) e Carlos Thadeu de F. Gomes (CNC)y
August 29, 2016
Abstract
Na situação atual do Brasil, a relação entre a dívida pública e o
PIB se eleva não apenas devido à diferença positiva entre o juro real e o
crescimento do produto, mas também devido a um superávit primário
negativo. Isto posto, o ajuste necessário para trazer a relação dívida
líquida/PIB a uma condição de sustentabilidade de longo prazo se
torna cada dia mais difícil, em função do crescimento da dívida. Este
trabalho calcula, para diferentes cenários, trimestre a trimestre, até
o prazo de dois anos e meio contados a partir de junho de 2016, o
custo de se atrasar este ajuste …scal. Tal custo se mede pela elevação
da carga tributária de longo prazo adicional àquela que precisaria ser
feita caso o ajuste tivesse se dado em meados de 2016. Ou, alterna-
tivamente, pela redução adicional de despesas para alcançar o mesmo
objetivo. Dependendo do cenário e se a dívida considerada é a bruta
ou a líquida, o custo de um ano de atraso pode variar entre 0,18% e
0,52% do PIB. O custo pode se situar acima de 0,52% do PIB se, a
partir de meados de 2016, o juro real médio superar 7% ao ano e/ou
o produto crescer abaixo de -0,5% ao ano.
Trabalho preparado por solicitação do Ministro João Paulo dos Reis Velloso, para
apresentação em Setembro de 2016 no Forum Nacional. Os autores agradecem ao Min-
istro Ernane Galveas por conversas sobre o tema. E a Gabriel Dias e Gabriel Lima pela
assistência de pesquisa.
y
Rubens Penha Cysne é Professor da FGV/EPGE. E-mail: rubens@fgv.br. Carlos
Thadeu de Freitas Gomes é Economista Chefe da Confederação Nacional do Comércio
(CNC). E-mail:carlosgomes@cnc.org.br.
1
1 Introdução
2 Modelo
B_ = iB + G + H T (1)
2
derivação de uma fração, temos as conhecida equação de evolução da razão
dívida/PIB:
b_ = (r )b + g + h t (2)
Em (2), r representa a taxa real de juros (r = i ; sendo a taxa de
in‡ação) e a taxa de crescimento do PIB real. Ao longo deste trabalho,
assumiremos sempre que r seja positivo e constante. Neste caso, a equação
diferencial não homogênea (2) pode ser facilmente resolvida utilizando-se o
fator de integração e (r )u : Temos então, fazendo n representar um número
real que denota tempo:
Z n
(r )n
bn = b0 e + (gs + hs ts )e(r )(n s) ds (3)
0
Ou seja, em moeda do instante n, a dívida líquida no período n é dada
pelo montante atualizado (sempre à taxa r ) da dívida no instante zero,
mais o somatório dos dé…cits primários entre o instante zero e o instante n,
capitalizados à taxa (r- ). A mesma equação pode ser escrita em moeda de
poder aquisitivo do instante zero, bastando para isto multiplicar ambos os
membros por e (r )n : Neste caso:
Z n
(r )n
bn e = b0 + (gs + hs ts )e (r )s ds (4)
0
Nos cálculos que se seguem usaremos (5) e (6) sob forma de igualdade.
Uma pergunta interessante decorrente do critério de solvência acima,
dadas as trajetórias temporais de dos gastos g e das transferências h; bem
como os valores de b0 e (r ); diz respeito ao nível constante de impostos
t (0) que assegure ao governo uma trajetória de sustentabilidade a partir do
instante
R 1 zero. t pode ser facilmente obtido de (6), bastando para isto notar
que 0 t e (r )s ds = t =(r ): Tem-se então:
3
Z 1
(r )s
t (0) = (r )[b0 + (gs + hs )e ds] (7)
0
ou, equivalentemente:
Z 1
t (0) (r )s
= (gs + hs + (r )b0 )e ds] (8)
(r ) 0
b0 (r )=t (g + h) (10)
Ou seja, a condição de sustentabilidade passa a se expressar de forma que, a
cada momento no tempo, o pagamento de juros sobre a dívida se iguala ao
superávit primário.
3 Dados Utilizados
4
utilizam também a dívida bruta do setor público. Nos termos das expressões
desenvolvidas na seção II, isto equivale a supor um valor igual a zero para a
remuneração líquida, período a período, dos ativos do setor público.
Tendo em mãos ambos os resultados, o leitor pode tomar a média pon-
derada dos mesmos que achar a mais adequada.
Relativamente a junho de 2016, os dados do Banco Central apontam
uma dívida líquida do governo geral de 43,4% do PIB; e uma dívida bruta
de 68,5% do PIB. Para os gastos do governo como percentual do PIB, in-
cluindo transferências ((g+h)*100), utilizaremos 37,7%. Tal percentual é
obtido somando-se a carga tributária (trabalhamos aqui com 35% do PIB)
ao dé…cit primário esperado para 2016 (2,7% do PIB).
Cenários:
Para efeito de evolução futura do crescimento do PIB real, in‡ação e juros
SELIC, utilizaremos três cenários. São estes: F (Favorável), I (Intermediário)
e D (Desfavorável). Os cenários são construídos tendo como base os próximos
dois anos e meio, ainda que os grá…cos apresentados se estendam até os
próximos cinco anos. De forma resumida:
5
Para os três cenários anteriores, apresentamos na Tabela 2 os valores do
índice de sustentabilidade assumindo g + h e t constantes no tempo e iguais
aos valores atuais. O mesmo se aplica a r :
Ao longo da apresentação de todos os resultados neste trabalho, os dados
entre parênteses são baseados na dívida bruta, sendo colocados do lado direito
daqueles relativos à dívida líquida.
Tabela2
4 O Custo do Atraso
Atualmente, a dívida pública cresce tanto pelo excesso dos juros reais so-
bre a taxa de crescimento do PIB, quanto pelo fato de as contas primárias
mostrarem dé…cit.
6
Para o claro entendimento do que de…nimos aqui como custo do atraso,
tomemos, a título de exemplo, a taxação adicional de 5,5% do PIB a que
faz menção o cenário intermediário da Tabela 2. Este número corresponde
a quanto se deveria elevar a taxação em junho de 2016, como percentual
do PIB, mantidos constantes os gastos públicos, para atender à condição de
sustentabilidade da dívida em um cenário de t e g+h constantes.
Como a taxação atual gira em torno de 35% do PIB, conclui-se que esta
teria que ser elevada para 40,5% do PIB (ou, equivalentemente, como vimos,
o gasto total do governo teria que se reduzir de 37,7% do PIB para 32,2% do
PIB).
Suponha agora que este tipo de ajuste não se dê no ponto do tempo
considerado (junho de 2016), mas sim em um espaço de tempo contado
a partir desta data. Ao se postergar o ajuste …scal de um montante de
tempo > 0, a dívida terá aumentado de b0 para b : Isto implicará maior
pagamento de juros e, consequentemente, um maior esforço …scal a ser feito
para atender à condição de sustentabilidade no futuro.
A nova carga tributária implicada pela condição de sustentabilidade da
dívida no cenário 2 será, portanto, superior aos 40,5% do PIB calculados
anteriormente. Alternativamente, mantida a carga tributária, o esforço de
redução de despesa teria que levar a um resultado ainda inferior aos 32,2%
do PIB calculados acima.
Ao esforço …scal de longo prazo a ser efetuado a partir do tempo para
assegurar a condição de sustentabilidade da dívida damos aqui a designação
de t ( ).
De…ne-se então o Custo do Atraso como:
C( ) = t ( ) t (0) (12)
onde t (0) é dado por (7). Observe que se trata de uma diferença entre
a carga tributária quando do ajuste, em percentual do PIB, e aquela que
precisaria ser feita tivesse o ajuste se dado em junho de 2016, também em
percentual do PIB. Em outras palavras, C( ) mede o custo de se postegar o
ajuste …scal por um tempo :
Calcularemos aqui, para diferentes cenários e para os dois conceitos de
dívida utilizados, C( ) trimestre a trimestre, até o prazo máximo de dois
anos e meio a partir de junho de 2016 (o que equivaleria, grosso modo, a
postergar o ajuste para um novo governo a se instalar a partir de janeiro de
2019). Apresentamos também alguns grá…cos com o horizonte de cinco anos.
Dedução de C( )
Supondo constantes no tempo g+h e t obtém-se diretamente de (10):
C( ) = (r )(b b0 ) (13)
7
De (4):
Z
(r )
b b0 = (e 1)b0 + (g + h t)e(r )( u)
du (14)
0
b0 (r )+g+h t
b b0 = ( 1 + e(r )
)( ) (16)
(r )
C( ) = t ( ) t (0) = ( 1 + e(r )
)(t (0) t) (18)
Tabela 3
Custo do Atraso
8
T rimestre Cen:F: Cen:I: Cen:D:
1 0; 04 (0,05) 0; 09 (0,11) 0; 10 (0,13)
2 0; 09 (0,11) 0; 18 (0,23) 0; 20 (0,26)
3 0; 13 (0,16) 0; 27 (0,35) 0; 30 (0,39)
4 0; 18 (0,22) 0; 36 (0,46) 0; 40 (0,52)
5 0; 23 (0,28) 0; 45 (0,58) 0; 51 (0,66)
6 0; 27 (0,33) 0; 55 (0,71) 0; 61 (0,80)
7 0; 32 (0,39) 0; 64 (0,83) 0; 72 (0,94)
8 0; 37 (0,45) 0; 74 (0,96) 0; 83 (1,08)
9 0; 41 (0,51) 0; 84 (1,09) 0; 94 (1,23)
10 0; 46 (0,57) 0; 94 (1,22) 1; 06 (1,38)
Tome-se, por exemplo, algo entre cinco e seis trimestres, contados a partir
de junho de 2016. Isto nos coloca entre outubro e dezembro de 2017). O valor
de C( ) no cenário intermediário é igual a 0,45% do PIB no caso de cinco
trimestres e de 0; 55% do PIB no caso de seis semestres.
Observe-se, a título de curiosidade, que a média destes valores coincide
aproximadamente com o que se esperarava da arrecadação do CPMF. Ou
seja, a condição de dinâmica da dívida neste cenário Intermediário é tal que
a receita de uma possível volta do CPMF cobriria apenas o Custo do Atraso
por algo entre cinco e seis trimestres.
Pela tabela 2, considerando também o cenário Intermediário, a carga
tributária para o ajuste deveria sofrer um ajuste de 5,5%, o que sugere uma
carga tributária de 40,5% do PIB para imediata satisfação da condição de
sustentabilidade da dívida. Mas, isto, se tal ajuste fosse feito em junho de
2016.
Passando-se, entretanto, de junho de 2016 para outubro de 2017, deve-se
somar a este montante o Custo do Atraso. O nível de carga tributária é
então majorado de 40,5% para 40,95% do PIB. Destes, 35% do PIB referem-
se à carga tributária em junho de 2016 (t(0)); 5,5% do PIB ao ajuste para
sustentabilidade, se efetuado em junho de 2016 (totalizando 40,5%); e os
0,45% restantes representam o Custo de Atraso (chegando-se aos 40,95% do
PIB.
Dependendo do gosto pelo cenário e tipo de dívida, a tabela permite ao
leitor a obtenção de 6 diferentes números para o Custo de Atraso para cada
trimestre, para um total de 10 trimestres.
Observe-se que o pior cenário (cenário D) assumido na Tabela 1 considera
um juro real de 7% e crescimento do produto de -0,5%. Os custos podem
ainda se situar acima daqueles dispostos pela Tabela 3 caso, a partir de
meados de 2016, o juro real médio supere 7% ao ano e/ou o produto cresça
abaixo de -0,5% ao ano.
9
Os grá…cos 1, 2 e 3 abaixo oferecem uma visualização mais geral do Custo
do Atraso, assumindo que os valores relativos a cada cenário se mantenham
por um período de cinco anos. Traçamos na ordenada uma paralela ao eixo
das abcissas relativa ao valor de 0,5% do PIB, o que caracteriza o ponto no
qual o atraso equivale ao valor esperado da CPMF.
Grá…co 1
Grá…co 2
10
Grá…co 3
5 Conclusões
11
Extensões deste trabalho poderiam relaxar algumas das hipóteses restri-
tivas efetuadas, com o objetivo de obter resultados mais exatos.
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