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RESUMO
Este ensaio expõe o caminho percorrido pela imagem do
feminino ao longo da história das organizações familiares, a
ferida pai-filha no perfil do pai, a ferida mãe-filha no perfil
da mãe e o reflexo dessas influências na postura feminina
diante de si mesma e em relação ao outro. Nesse objetivo,
foi elaborado um estudo de revisão bibliográfica aliado a
reflexões e buscas sobre inquietações femininas,
verificadas no exercício diário da profissão de psicóloga,
para concluir que a mulher se constitui num misto dessa
herança imposta tanto pelo masculino quanto por suas
próprias mãos e estão nela a força e a capacidade de
libertar-se.
Palavras-chave: Feminino. Patriarcado. Papéis pai e mãe.
1
Psicóloga formada pela Universidade São Francisco-SP, pós-graduada v. 4, n. 3, dezembro/2012,
e professora do curso de Psicologia do Centro Universitário UnirG-TO. UnirG, Gurupi, TO, Brasil
ABSTRACT
This essay exposes the way followed by the feminine
image through history in the family organizations, the
wound father - daughter in the profile of the father, the
wound mother-daughter in the mother´s profile and the
reflex of these influences in the feminine position looking to
herself but also in relation to the other. According to this
goal, a study reviewing the literature was elaborated
combined with reflections and searches on female
concerns, verified in the daily exercise of the profession of
psychologist, and in was concluded that the woman is
constituted by a mixture from this heritage imposed in
part by the masculine and also by her own hands in which
the force and capacity to be free can be found.
Key-words: Feminine. Patriarchal. Father and mother´s
role.
v. 4, n. 3, dezembro/2012,
UnirG, Gurupi, TO, Brasil
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filha não consiga formar uma noção de autora, alguns pais pecam por
limites, valores e de autoridade. Ele indulgência, não estipulando limites a si
pode até apaixonar-se próprios, não desenvolveram sentido
inconscientemente pela filha, de sua própria autoridade interna por
mantendo-a presa a ele. Pode não terem estabelecido um critério de
depreciar o feminino porque seu ordem e disciplina, servindo de
próprio lado feminino foi sacrificado aos modelos inadequados ao feminino –
ideais de poder e autoridade macho- são os “eternos meninos”.
masculinos. Pode ser trabalhador, bem Os eternos meninos vivem no
sucedido, mas passivo em casa, um verão e primavera e são incapazes de
pai desligado. (LEONARD, 1997). vivenciar o outono e inverno, isto é,
Ainda segundo a autora, se o pai leves e superficiais, incapazes do
estiver envolvido com a filha de modo aprofundamento, impacientes e
comprometido e responsável, imediatistas, deixando a evidência da
colaborando para seu desenvolvimento impossibilidade de “agüentar”, de
nas esferas intelectual, profissional e suportar, indicando e salientando sua
espiritual, valorizando a singularidade fragilidade e não servindo de suporte e
feminina, isso resultará em um dano, direção à filha.
“ferida”, no espírito feminino da jovem. A consequência para filha é a
A ferida pai-filha é um evento fragilidade, vergonha, insegurança,
que acontece nas vidas das mulheres falta de autocontrole, disciplina e
como indivíduos: é cultural. Uma perseverança.
atitude autoritária, patriarcal, que Os pais duros erram pela rigidez,
desvaloriza o feminino, reduzindo-o a são frios, indiferentes, autoritários,
um número de papéis, qualidades enfatizam a obediência, o dever e a
relacionadas à imagem feminina racionalidade, insistindo para que suas
proposta, o pai coletivo está presente, filhas tenham a mesma atitude. A visão
subjugando pela força, impedindo o positiva deste tipo paterno é que pode
desenvolvimento a partir da sua gerar uma sensação de segurança,
essência. (LEONARD, 1997). estabilidade e estrutura, e a negativa é
A ferida precisa ser confrontada, a tendência a arrasar as qualidades
transformada e, para tal, é necessária a femininas de sensibilidade, doçura e
sua conscientização. Segundo a espontaneidade.
Os danos à filha são além de por sua vez filha de outra e mais outra,
imediatos como futuros na medida em indicando uma herança de longo
que ela cresce e vai se firmando com tempo. Por este motivo, as colocações
mulher e as feridas se manifestando estão sob a ótica da filha, já que sua
seja na forma como ela se sente em mãe também é uma mulher ferida.
relação a si própria, como mulher, ser A mãe é responsável por uma
humano, seja como em seus considerável influência na visão de
relacionamentos com os homens e mundo de seus filhos e filhas, sendo o
outras mulheres. primeiro ser humano com quem estes
Muitas expectativas ou formas estabelecem relação de dependência,
de relacionamentos dessas mulheres o que leva a pensar o quanto a sua dor
são pautadas nesta primeira dinâmica é passada a eles.
da relação pai-filha e todos os Mãe e filha pautam uma relação
significados intrínsecos e individuais de sentimentos emaranhados e quando
que se formaram. entram em conflito muito se pode
Nota-se que a primeira relação, perceber a partir de sua natureza.
seja com o pai real ou simbólico Mesmo na aparente tranquilidade das
impregnado do patriarcado, influencia relações, podem-se observar emoções
decisivamente na forma com que essa conflitantes, dissimuladas, o que
filha vai lidar com sua feminilidade e na complica a relação deste par íntimo.
formação da sua identidade feminina. Elas não têm apenas que lidar com os
fatores pessoais e familiares que as
A RELAÇÃO MÃE-FILHA: A FERIDA confundem, como também com as
Eu estou em pé, no centro expectativas que vem do patriarcado.
da cidade morta
e amarro os sapatos vermelhos... (LEONARD, 2003).
Eles não são meus,
são de minha mãe Deve-se esclarecer que a
e antes foram da mãe dela,
e vão passando como herança, influência do patriarcado sofrida pela
mas escondidos, como cartas mãe a contaminou a ponto de torná-la
vergonhosas.
(ANNE SEXTON, apud LEONARD, sua representante, mesmo que
2003, p. 51).
inconscientemente.
Antes de qualquer colocação Segundo Leonard (2003), são
deve ser lembrado que a mãe é mulher quatro os padrões femininos maternos:
e antes de tudo foi filha de uma mulher a Mãe Dragão que é intensa, explosiva,
furiosa, raivosa; a Mãe Doente que membros da família de modo que ela
controla a todos ao seu redor com a possa ser o centro, pois ela mesma
ameaça de sua fragilidade; a Mãe está partida em pedaços”. A filha desta
Santa e sua necessidade de ser boa e mãe doente, sentindo que precisa viver
mantém uma personalidade superficial com cautela, foi educada para sentir-se
e martirizada, esperando que os filhos culpada e insegura e ainda temendo
sigam seus passos; a Mãe Rainha desencadear o problema médico ou
Gelada que é dominadora, punitiva e emocional de sua mãe.
faminta por poder. A Mãe Santa ou mãe agradável
A mãe Dragão intimida suas demais parece gentil e positiva, e quer
filhas por meio do medo e as oprime conscientemente fazer o bem às suas
com raiva. Quando encontra oposição, filhas. Segundo Leonard (2003) as fere
reage exageradamente com emoção na medida em que instrui suas filhas a
extrema – às vezes lágrimas, às vezes reprimirem sentimentos naturais,
raiva. (LEONARD, 2003). Este tipo de especialmente raiva.
mãe grita, vocifera, e usa ameaças Frequentemente, as filhas carregam a
raiva não reconhecida de suas mães, e
para dominar e está sempre pronta ao podem ter consciência da raiva, mas
não de sua causa. [...] A filha, que
ataque. Isto é, “[...] se a filha é suave, carrega a raiva inconsciente da mãe,
não teve nenhum modelo feminino para
ela se sente terrivelmente humilhada e ajudá-la a aprender a canalizar esta
envergonhada pela insensibilidade de energia (LEONARD, 2003, p. 54).
REFERÊNCIAS
______. 1937. E a louca tinha razão!: canalizando a explosão dos instintos para uma
vida criativa. São Paulo: Summus, 2003.
PERERA, Sylvia Briton. Caminho para a iniciação feminina. São Paulo: Paulinas,
1985.
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Recebido em: 06 out. 2012
Aprovado em: 04 dez. 2012